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UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ

FACULDADE DE DIREITO
DEPARTAMENTO DE DIREITO PÚBLICO
CRIMINOLOGIA
PROFESSOR DR. SAMUEL MIRANDA ARRUDA
ALUNO: DEIVID PEREIRA GOMES - 377865

Questões - Criminologia

1. Diferencie para as três escolas iniciais - Clássica, Positivista e Ecológica - os conceitos


de criminoso, elaborando também quais as medidas e soluções possíveis para sancioná-
lo.
Cesare Beccaria foi o iniciador da Escola Clássica da Criminologia. A qual,
segundo Dias e Andrade (1997), foi a primeira reflexão sistemática e coerente acerca do
ato criminoso. De acordo com essa teoria, o indivíduo que comete o crime o faz após
substancial reflexão. Ou seja, trata-se de uma escolha feita livremente e racionalmente
após análise sobre os prós e contras que podem advir do cometimento do delito. A partir
de um sopesamento, o indivíduo calculará se cometer o ato é mais ou menos vantajoso.
Essa escola entende que o indivíduo poderia ter optado pelo bem, mas preferiu fazer o
mal. Todavia, mesmo assim, deveria ser punido a partir da lei, sendo afastado de
tratamento atroz, desumano.
Já para a Escola Positiva, fundada a partir de 1871, com a obra O homem
delinquente, de Cesare Lombroso, a ação criminosa era entendida a partir de um viés
positivista, de caráter cientificista. Segundo o entendimento da obra deste autor, o
criminoso era considerado um indivíduo anormal, que não evoluiu para o estado
civilatório de então. Seria, assim, alguém atrasado, ultrapassado, preso numa mentalidade
medieval bárbara. Ainda de acordo com o pensador, o delinquente poderia ser
cientificamente reconhecido por características e traços físicos provenientes de um
atavismo, uma herança genética, as quais originariam o comportamento criminoso. Uma
espécie de deformação genética caracterizava o criminoso. O qual poderia ser estudado
por medidas antropométricas, como o estudo do crânio e do cérebro, por exemplo.
Por sua vez, para a Escola Ecológica, as condutas criminosas estavam diretamente
ligadas a condicionantes sociais excludentes. A partir da observação da alta incidência de
delinquência em determinadas regiões mais pobres e desiguais de um determinado
território, os estudiosos constataram que a população de tais espaços estariam muito mais
propensas ao cometimento de crimes. Assim, para Escola Ecológica, o criminoso é uma
espécie de produto do meio corrompido, podre, desigual e possivelmente perigoso em
que vive. Tal pensamento não leva em conta os casos de criminalidade cometidos por
indivíduos com maior poder econômico e que vivem fora dos territórios considerados
“conflagrados”.
A respeito da figura do criminoso, Shecaira (2014) afirma que tal indivíduo é um
ser complexo, detentor de uma história de vida singular, um ser enigmático, sobre o qual
não se pode fechar uma classificação definitiva. Na visão do doutrinador, trata-se de um
indivíduo geralmente comum, dotado de vontade própria, ciente de suas escolhas, mas
que pode sofrer influência e até ser, de certo modo, condicionado. Todavia, tal
condicionamento e influências não são capazes de suplantar sua capacidade de auto-
determinação.
Portanto, a sanção ao criminoso deve levar em conta que tal indivíduo não é
alguém inferior, intrinsecamente mau, sujo, ruim, animalesco. A sanção penal deve levar
em consideração o estrito respeito à legislação atual. A qual deve ser pensada de modo a
ajudar a enfrentar possíveis problemas que ajudaram a forjar o caráter de tal indivíduo.
Durante o cumprimento da sentença, é fundamental que o Estado garanta dignidade ao
apenado, com a construção de casas de detenção dotadas de espaço e infraestrutura
suficientes para todos; com alimentação de qualidade; com a disponibilização de
processos formativos que possam ajudar quando do retorno do indivíduo à sociedade;
com a oferta de espaços e ações de lazer, esporte e cultura, de modo a promover uma
“desbrutalização” do indivíduo ex-detento; e, o mais importante, o acompanhamento
constante da vida dessa pessoa. Além do direcionamento dela para o trabalho.

BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das penas. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian.
1998, pp. 35 e 38.
DIAS, Jorge de Figueiredo; ANDRADE, Manoel da Costa. Criminologia. O homem
delinquente e a sociedade criminógena. Coimbra:Coimbra Editora, 1997.

LOMBROSO, Cesare. O homem delinquente. Rio de Janeiro: Editora Rio, 1983.

SHECAIRA, Sérgio Salomão. Criminologia. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,


2014

2. Comente sobre os efeitos da política criminal estadounidense neoclássica - década de


80/90, relacionando os efeitos e repercussões desses posicionamentos na política criminal
brasileira.

A partir da leitura de Camargo (2010), pode-se afirmar que, nas décadas de 80 e


90 do século XX, os Estados Unidos recrudesceram fortemente a sua política criminal,
sinalizando transformações que iriam influenciar a política criminal de outras nações,
como o Brasil. Ancorada numa conjuntura social e política neoliberal, consolida-se uma
mentalidade punitivista, a fim de assegurar o acúmulo de capital proveniente do processo
globalista em franca expansão, por meio da mão forte de um Estado repressor dos grupos
excluídos, que conviviam com o desemprego, precarização das relações de trabalho, a
desigualdade e a falta de equipamentos de inclusão social.
Nesse contexto de esfacelamento do tecido social urbano em grandes cidades dos
Estados Unidos, como Nova Iorque, por exemplo, ao invés de tomar medidas para a
promoção do desenvolvimento social e humano, como a criação de empregos, o Estado
optou pelo endurecimento do controle de grupos específicos – marginalizados e sem a
cobertura estatal necessária - e pela repressão feroz da criminalidade urbana. Deste modo,
a partir da gestão Reagan, é instaurada uma política de encarceramento massivo, tornando
a sentença de prisão como a primeira resposta a uma problemática social importante e
complexa.

Assim, o Estado punitivista americano reinventou-se, inovando nas formas de


repressão, controle e vigilância das populações marginalizadas, aumentando
exponencialmente o número de presos, passando uma falsa sensação de justiça, pois
nessa lógica, quanto mais se prende, mais se tinha a prender. Política que estende-se até
os dias atuais, tanto nos Estados Unidos quanto no Brasil, o qual copiou fielmente o
modelo americano. O modelo implantado nos anos 80 e 90 permanece sólido, impávido
reacionário, espetacularizado, seletivo e simbólico. Em nosso país, nunca antes a Justiça
Penal teve tanto destaque, mobilizando uma parcela enorme da população. A qual
comprou e defende ferrenhamente tal política prisional, sem pensar nos prejuízos e
irracionalidade de tais medidas. Nunca se viu tantos presos encarcerados nos dois países.
No Brasil, o excesso de presidiários, além das mais terríveis denúncias de privações de
direitos, chegam à mídia internacional frequentemente. Nos Estados Unidos, segundo
Veras (2016), um em cada três jovens negros já esteve preso ou respondeu a alguma
medida judicial; no Brasil, 70% da população carcerária é composta por gente negra ou
parda, oriunda de territórios vulneráveis dos grandes centros urbanos. Uma história que
se repete num looping eterno.

CAMARGO, Maria Clara de Lima. O novo estado punitivo norte-americano : políticas


criminais, reformas penalógicas e o encarceramento massivo. 2010. 12 f. Dissertação
(Mestrado em Ciências Criminais) - Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do
Sul, Porto Alegre, 2010.
VERAS, Ryanna Pala. Política Criminal e a criminologia humanista. Pontíficia
Univerdade Católica de São Paulo. 2016. Disponível em: <https://tede.
pucsp.br/bitstream/handle/19876/2/Ryanna%20Pala%20Veras.pdf>. Acesso em: 14 fev.
2021.

3. Analise as notícias abaixo e discuta de que forma tais fatos sociais atualíssimos podem
contribuir e contribuem para formar um quadro de Anomia no momento atual. De que
forma a anomia influencia o comportamento criminoso? Quais outros aspectos da
sociedade pós-pandemia também compõem este quadro? Cite exemplos.
Chile tem protestos violentos após morte de artista de rua pela polícia
(https://g1.globo.com/mundo/noticia/2021/02/06/chile-tem-protestos-violentos-apos-
morte-de-artista-de-rua-pela-policia.ghtml)
Artista foi morto a tiros à queima roupa, em uma abordagem pela
verificação de seus documentos de identidade. Vídeo da ação
policial viralizou rapidamente na internet.
Vários prédios públicos de Panguipulli, na região mapuche no sul
do Chile foram incendiados na noite dessa sexta-feira (5). A
população saiu às ruas da cidade para protestar contra a morte de
um artista de rua por um policial.
O artista foi morto a tiros à queima roupa, em uma abordagem
pela verificação de seus documentos de identidade. O vídeo da
violenta ação policial viralizou rapidamente na internet.
As imagens, gravadas por testemunhas da cena, mostram o
homem sendo visado por vários policiais armados, no meio da rua
e em pleno dia. De repente, o artista se aproxima de um dos
agentes que atira, primeiro, em seus pés e depois, em seu peito. O
jovem morreu na hora.
A polícia alegou "legítima defesa", afirmando que o artista estava
armado com um sabre. No entanto, várias testemunhas da cena
garantem que ele carregava espadas de circo, cujas lâminas são
cegas para evitar qualquer risco de ferir as pessoas.
Muitos moradores da pequena cidade de apenas 35 mil habitantes
ficaram indignados e foram às ruas protestar contra a violência
policial. A prefeitura de Panguipulli foi a primeira a ser atacada e
foi completamente incendiada, assim como a delegacia e o
Tribunal de Justiça da cidade.
A onda de indignação e emoção ganhou o país. O policial
responsável pelos disparos foi detido e o governo chileno pediu
que a polícia forneça todas as informações disponíveis sobre o
caso. A oposição de esquerda denuncia essa nova violência
policial.
Nos últimos anos, a popularidade da polícia chilena está em forte
queda. A corporação é muito criticada após vários escândalos de
corrupção e a onda de repressão brutal contra o movimento social
de outubro de 2019, quando milhares de chilenos saíram às ruas
denunciando as desigualdades no país.
Com fim do Auxílio Emergencial, Brasil tem 2 milhões de novos pobres só em janeiro
(https://g1.globo.com/economia/noticia/2021/02/06/com-fim-do-auxilio-emergencial-
brasil-tem-2-milhoes-de-novos-pobres-so-em-janeiro.ghtml)

O fim do Auxílio Emergencial já levou 2 milhões de brasileiros


para a pobreza apenas em janeiro. Ao todo, 13% da população do
país, ou 26 milhões de pessoas, estão sobrevivendo com uma
renda per capita de apenas R$ 250 por mês. [...]
Com o Brasil enfrentando uma severa crise fiscal desde 2014,
manter o pagamento do Auxílio Emergencial passou a ser uma
conta difícil de ser fechada pela equipe econômica. Nas últimas
semanas, o debate pela volta do benefício ganhou força com a
piora dos números da pandemia.
No ano passado, com todas as medidas adotadas pelo governo
federal, a dívida bruta alcançou 89,3% do Produto Interno Bruto
(PIB), uma alta de 15 pontos percentuais em relação a 2019.
O nível do endividamento brasileiro já é considerado elevado para
um país em desenvolvimento. Na média, as economias similares à
brasileira têm um patamar de dívida próximo a 65% do PIB. O
tamanho da dívida bruta é um indicador bastante analisado por
investidores e pelas agências de classificação de risco.
Desempregado que caminhava mais de 25 km para entregar currículos em Natal viraliza
na internet e consegue entrevistas: 'só quero um trabalho' (https://g1.globo.com/rn/rio-
grande-do-norte/noticia/2021/02/06/desempregado-que-caminhou-mais-de-25-km-para-
entregar-curriculos-em-natal-viraliza-na-internet-e-consegue-entrevistas-so-quero-um-
trabalho.ghtml)
Longas caminhadas sem alimentação e com um único objetivo:
encontrar um trabalho. Desempregado há 11 meses, seu Wladmir
Rodrigues, de 57 anos, chegou a andar mais de 25 quilômetros a
pé, em um único dia, entregando currículos em empresas de Natal
e da região metropolitana. Na última quarta-feira (3), porém, a
história dele ganhou a internet e gerou muitas mudanças. Ele
agora tenta administrar mais de 200 entrevistas de emprego
agendadas.
Natural do Rio de Janeiro, o homem disse que mora há 28 anos
no Rio Grande do Norte. Em Natal, trabalhou 18 anos como
maqueiro em um hospital que fechou em 2016. Ele diz que até
hoje tenta receber os direitos trabalhistas.
"Fiquei trabalhando com bicos na construção civil, mas com a
pandemia, ficou mais difícil. Passei 11 meses sem trabalhar e fui
despejado da casa onde estava. Outra pessoa me ajudou alugando
um a casa onde estou há poucos dias sem eu precisar depositar
nenhum valor", contou.

4. O clássico filme Bicycle Thieves (1948) retrata a jornada do personagem Antonio -


chefe de uma família de 4 - que para trabalhar precisa de uma bicicleta, mas não tem
dinheiro para adquirí-la, o que leva sua mullher a penhorar seu próprio dote, comprando,
com o penhor, a bicicleta. Antonio no seu primeiro dia de trabalho tem a bicicleta furtada
por um jovem e tenta de todas as maneiras reavê-la. Sem esperança, ao final do dia
Antonio não conseguindo recuperar sua própria, resolve roubar uma bicicleta - fato este
que faz com que a população o reprima, impedindo o feito.
À luz da teoria da aprendizagem social, comente a sinopse do filme e discuta - dentre
outros exemplos no meio cultural - de que forma políticas criminais e carcerárias podem
influenciar na criminalidade. Cite possíveis soluções e explique os principais elementos
da teoria da aprendizagem social

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