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BRASILEIRO:
A contribuição da obra de João-Francisco Ferreira
INTRODUÇÃO
Em 1955, a direção da Faculdade de Filosofia da então Universidade do Rio
Grande do Sul1, a qual era vinculado o Curso de Letras Neolatinas, concluiu que a
disciplina de Literatura Hispano-americana necessitava de uma reformulação em sua
biblioteca, bem como da produção de uma obra voltada especificamente para o ensino
da matéria aos alunos deste curso. Para suprir essa demanda, coube ao professor
João-Francisco Ferreira, titular da disciplina, a escrita do livro Capítulos de Literatura
Hispano-americana. Publicada em 1959, o principal objetivo da obra era instigar o
interesse dos estudantes e mostrar a importância do aprendizado dessa matéria.
Talvez pelo fato da disciplina ser oferecida no último ano do curso, era tratada com
certo desdém por parte dos alunos, o que resultava em um aproveitamento muito
baixo por parte destes. O próprio Ferreira exprime essa preocupação no prefácio do
livro:
[...] seu ensino [de Literatura Hispano-americana] não tem
alcançado os resultados que se esperariam de uma matéria
que, além dos valores que lhe são próprios, contém
elementos que poderiam facilmente servir de base para uma
mais real comunicação com os países americanos de língua
espanhola. Salvo raras exceções, o que importa ao
estudante é cumprir a rotina do currículo; a dedicação
necessária para evitar uma surpresa capaz de atrasar ou lhe
impedir a conclusão do curso. (FERREIRA, 1959: s/p).
1
Em dezembro de 1950, a Universidade do Rio Grande do Sul, URGS, foi federalizada,
passando à esfera administrativa da União. Denominou-se a partir de então Universidade
Federal do Rio Grande do Sul, UFRGS.
panorama sobre essa literatura, pois está redigida em uma linguagem simples,
apresenta comparações com autores brasileiros, contextualiza historicamente as obras
literárias e expõe trechos dos textos que ilustram os capítulos. Esses aspectos
mostram que o livro não é somente uma análise literária de autores e textos
específicos, mas sim, a base para a construção do conhecimento acerca da história da
literatura hispano-americana.
Após a leitura e a análise do livro, propusemos o seguinte esquema de
divisão dos capítulos: escola literária, autor(es) ou autor(as), período de tempo e
temática. Dessa maneira, o caráter didático de Capítulos... é reforçado, apresentando
o conteúdo de maneira clara do ponto de vista cronológico e eficiente nas
informações.
A escassez de histórias da literatura hispano-americana no Brasil é grande.
Basicamente, além de Capítulos... há outros dois livros que se dedicam ao tema:
Literatura Hispano-americana, de Manuel Bandeira (1949) e História da Literatura
Hispano-americana, de Bella Jozef (1971). É importante destacar, que as três obras
foram publicadas antes ou muito próximas ao chamado "boom" da literatura hispano-
americana; ou seja, parte vital da área, o romance da segunda metade do século XX,
está ausente ou mencionado muito brevemente nesses três livros. Tantos anos
depois, é de se estranhar o fato de não haver uma obra mais atualizada escrita em
português2. Os hispanistas brasileiros seguiram seus estudos e suas publicações,
porém o fenômeno da super-especialização acadêmica, tão comum ao nosso tempo,
faz com que existam muitas publicações sobre autores e obras específicas, deixando
de lado a preocupação com pesquisas mais panorâmicas sobre a literatura hispano-
americana.
Sobre a biografia, sabe-se pouco de João-Francisco Ferreira. Nasceu em
Pelotas, mas ainda na adolescência passou a residir em Porto Alegre, onde foi
professor de Literatura Hispano-americana na Federal do Rio Grande do Sul. Também
atuou em universidades norte-americanas, foi diplomata no México e aventurou-se
como autor de poesia. Sua importância deve ser reconhecida como um dos primeiros
a tratar da literatura da América hispânica no Brasil e por ter produzido, até hoje, um
manual confiável de consulta para esta área.
2
O livro de Bella Jozef teve outras três edições em 1982, 1989 e 2005. Nelas, a autora atualiza
o texto incluindo autores que foram aparecendo ao longo do tempo, no entanto, não modifica a
estrutura organizacional do livro.
ESTRUTURA DO LIVRO
Autor
Os capítulos de autor, ou seja, aqueles que Ferreira batizou com nomes de
um ou mais escritores específicos, são dezessete: Capítulo I - Colombo, primeiro
cronista; Capítulo II - Crônica dos conquistadores: Hernán Cortéz; Capítulo III -
Crônica dos soldados: Bernal Díaz del Castillo; Capítulo IV - Crônica dos missionários:
Bartolomé de las Casas; Capítulo V - Garcilaso de la Vega: Historiador Inca; Capítulo
VI - Ercilla e "La Araucana"; Capítulo VIII - Sóror Juana Inés de la Cruz; Capítulo IX -
Juan Ruiz de Alárcon e o Teatro do Século de Ouro; Capítulo XI - Olmedo, Andrés
Bello, Heredia; Capítulo XIII - Echeverría e José Mármol; Capítulo XIV - Sarmiento e
Alberdi; Capítulo XVI - José Hernández e o Martín Fierro; Capítulo XVII - Ricardo
Palma e as "Tradiciones Peruanas"; Capítulo XIX - Rubén Darío; Capítulo XX -
Significado da obra de José Enrique Rodó; Capítulo XXI - Florêncio Sanchez e o
Teatro do Rio da Prata; e Capítulo XXV - Pedro Henriquez Ureña e Alfonso Reyes.
Nestes, a escrita literária, repleta de adjetivos, e a opinião pessoal do professor
predominam, assim como a utilização da biografia dos autores. Para a análise e
compreensão de algumas obras, se faz necessário o estudo biográfico, porém, em
certos momentos, essa exposição parece excessiva.
Para exemplificar, podemos citar o capítulo Juan Ruiz de Alarcón e o Teatro
del Siglo de Oro. Neste capítulo, podemos observar tanto a questão biográfica quanto
a linguagem adotada pelo escritor de Capítulos.... O teatrólogo possuía uma
deformidade física e essa condição influenciou muito em seus escritos. Atribui-se a
condição de ser corcunda, o fato de o mexicano desconhecer o sexo feminino, tanto
física quanto espiritualmente:
Sofrendo a dor de suas deformações, e talvez humilhado pelas
mulheres desejadas com que conviveu, procurou Alarcón,
numa concepção terna e generosa do amor, salientar valores
mais amplos e significativos; era a única maneira de vencer o
isolamento e as perturbações que lhe causavam as
insuficiências do corpo; era superar o atroz ressentimento.
(FERREIRA, 1959: 153)
Segmentos como "vencer o isolamento e as perturbações do corpo" e "atroz
ressentimento", deixam claro o estilo poético da escrita de João-Francisco. Outras
passagens demonstram a opinião do professor sobre a obra de Juan Ruiz: “O
mexicano, por inexperiências, desgosto ou amargura - para não dizer por misoginia,
como querem alguns -, não realça em suas criações a graça, a sedução e o encanto
próprio do sexo.” (FERREIRA, 1959: 156). Sendo assim, no trecho citado percebemos
duas características da escrita de Ferreira: a tendência a adotar um estilo mais literário
(influência, talvez, de sua atuação como poeta) e o largo uso de dados biográficos de
autor para explicar sua obra.
No capítulo dedicado a poeta Sóror Juana Inés de la Cruz, aparece algo
semelhante. Ferreira exagera nos adjetivos para descrever tanto a obra quanto a
escritora deixando, mais uma vez, clara a sua opinião sobre ambas:
A fama de sua graciosa beleza já correra por toda a parte,
como a de seus conhecimentos e devoção ao saber. [...] A
princípio devia ser esplêndida e alegre sua vida em palácio […]
Juana deslumbraria nos bailes, certamente, ao mesmo tempo
que imporia respeito por seus variados conhecimentos.
(FERREIRA, 1959: 129)
ACERTOS DO AUTOR
Contextualização histórica
CONCLUSÃO
REFERÊNCIAS