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PONTA GROSSA
2020
EGILSON DIEGO BELUZZO DE LARA
PONTA GROSSA
2020
EGILSON DIEGO BELUZZO DE LARA
BANCA EXAMINADORA
Resumo: o artigo analisa a obrigatoriedade da ação penal no novo Código de Processo Penal
brasileiro, com foco nos fundamentos doutrinários considerados para a sua manutenção em
um sistema de base acusatória não obstante a sua tradicional vinculação aos sistemas de base
inquisitiva. A estruturação do novo sistema destoa, especialmente, quando inserida no
contexto das reformas processuais latino-americanas. Por meio da análise documental, revisão
bibliográfica e método hipotético-dedutivo, foram resgatados conceitos essenciais para o
adequado desenvolvimento do tema: como a noção de sistema processual, a diferenciação
entre sua estruturação dogmática e legislativa, e o cotejo das principais características dos
órgãos responsáveis pela acusação, nas principais reformas processuais regionais
implementadas. A abordagem trazida no presente estudo mostra-se relevante para a
compreensão da peculiaridade do sistema brasileiro e da insustentável manutenção de alguns
argumentos doutrinários.
1
Graduado em Direto pelo Centro de Ensino Superior dos Campos Gerais – CESCAGE, e pós-graduando em
Direito Processual Penal e Pratica Forense Penal pela Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG).
2
Mestre em Ciência Jurídica pela Universidade do Vale do Itajaí (2004) e Doutor em Direito pela Universidade
Católica de Santa Fé na Argentina (2016)
2
Abstract: The article assays the compulsory prosecution in the new Brazilian Code of Criminal
Procedure, focusing on the fundamentals reasons for its maintenance in an accusatory system,
although traditionally connected to inquisitive-based systems. The structuring of the new system
distinguishes itself, especially when inserted in the context of Latin American procedural
reforms. From a literature review, document analysis and hypothetical-deductive method
essential concepts were recovered for the adequate development of the theme: such as the notion
of procedural system, the differentiation between its dogmatic and legislative structuring and the
comparison of the main characteristics of the regard to the prosecution, in the main regional
procedural reforms implemented. The approach brought up in this study is relevant for
understanding the peculiarity of the Brazilian system and the unsustainable maintenance of some
doctrinal arguments.
Keywords: Compulsory prosecution, discretion, procedural systems, civil law, common law,
prosecutor
1. INTRODUÇÃO
3
Rosimeire Ventura Leite aponta outros três países, El Salvador, Costa Rica e Honduras (LEITE, 2009, p. 121)
3
4
Não é outro o objeto da tese do professor Rodrigo Chemim: “[...] Nessa discussão política a respeito do sistema
acusatório é preciso compreender que a opção de deixar a gestão da prova nas mãos das partes visa evitar a quebra
de uma já naturalmente frágil imparcialidade judicial. Porém, é preciso também compreender que a inércia absoluta
do juiz, alijando-o de qualquer atividade complementar, provoca um efeito de não aproveitamento de toda a
potencialidade dos princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório e continua premiando, mesmo que
num primeiro momento pareça o inverso, o paradigma filosófico da consciência.” (GUIMARÃES, 2015, p. 404).
6
mas “[...] somente a partir da concepção racional kantiana [...] [recebeu] precisão conceitual ainda
não superada [...].” (GUIMARÃES, 2015, p. 229).
Assim, da referência kantiana provém a concepção mais adequada, hodiernamente, de
sistemas processuais.
Como ensina o professor Jacinto Coutinho, para Immanuel Kant, sistema é o conjunto de
elementos vinculados por ideia única. Essa ideia única é determinada pela finalidade do conjunto,
o que se denomina de princípio unificador. A finalidade do sistema, por sua vez, confere
significado ao princípio unificador, de modo que o sistema inquisitório terá princípio unificador
inquisitivo, e o sistema acusatório o princípio unificador dispositivo (COUTINHO, 2009).
É nessa linha que também sustenta, o professor, serem todos os sistemas processuais
mistos, não por deterem princípio unificador misto, o que epistemologicamente seria impossível,
dada a ideia kantiana de princípio reitor (indivisível), mas sim, porque, uma vez sendo o sistema
regido por um determinado princípio, inquisitivo ou dispositivo, invariavelmente terá associado
a si elementos do outro sistema. É exemplo o vigente Código de Processo Penal Brasileiro, o qual
é regido pelo princípio inquisitivo e possui elementos provenientes do princípio dispositivo
(COUTINHO, 2009).
Observe-se que, ao vincular a caracterização dos sistemas à sua finalidade ou princípio
reitor, surge a necessidade de desenhar os contornos desses princípios unificadores. E é aqui que
o ocorre a dispersão e indefinição da doutrina, sendo permanente a luta retórica e indefinição do
que seja o melhor critério5 caracterizador e diferenciador dos sistemas processuais
(GUIMARÃES, 2015, p. 404). Chegando ao ponto de a própria ideia de se trabalhar com sistemas
seja colocada em cheque.6
Ocorre que o novo Código de Processo Penal brasileiro prevê expressamente, no artigo 4º,
tanto do Projeto de Lei 156/09 quanto do PL 8.045/2010, da Câmara dos Deputados, que o
processo penal terá estrutura acusatória. A discussão processual, portanto, no que concerne a
5
Não obstante a diversidade da doutrina, dois critérios são os mais recorrentes para definir os princípios unificadores
dos sistemas acusatório e inquisitório: a orientação pela gestão da prova e o critério da separação de funções. Neste
critério, “[...] inquisitorial seria o sistema em que as funções de acusação e de julgamento estariam reunidas em uma
só pessoa (ou órgão), enquanto o acusatório seria aquele em que tais papéis estariam reservados a pessoas (ou órgãos)
distintos [...].” (OLIVEIRA, 2011, p. 9). No critério da gestão da prova é “[...] inquisitório quando a gestão da prova
ficar nas mãos do juiz e [...] acusatório quando a gestão da prova ficar ao encargo das partes.” (GUIMARÃES, 2015,
p. 250).
6
Juan Montero Aroca (AROCA, 1997, p. 29-30) citado por Gustavo Ávila: “[...] os chamados ‘sistemas processuais
penais’ são ‘conceitos do passado’, que hoje não possuem valor algum, servindo unicamente para confundir ou
obscurecer a claridade conceitual.” (ÁVILA, 2013, p. 25).
7
Como Rubens Casara, que faz coro à ideia de que o Ministério Público imparcial acabou
se chocando com a concepção atual de processo penal, pelo surgimento do Ministério Público
como “[...] órgão estatal, submetido aos princípios da legalidade e da impessoalidade, com as
mesmas prerrogativas da magistratura, que deve agir na defesa dos interesses da sociedade e, ao
mesmo tempo, buscar a realização da justiça [...]. (CASARA, 2015, p. 160).
Contudo, o professor Aury Lopes Jr. adverte: “[...] o conceito de pretensão não se reduz à
construção carneluttiana. Ou seja, existe vida (inteligente) para além do conceito de Carnelutti,
que é apenas um ponto de partida, não de chegada ou conclusão.” (JR., 2012, p. 145).
Importante observar que inexiste menção constitucional expressa determinando o modo
de atuação ao Ministério Público, e o novo código de proceso penal não colocou ponto final a
discussão.
No entanto, e, ao que parece ser a intenção preponderante do projeto (haja vista não ter
pacificado a questão), o amplo leque de atribuições constitucionais, maior que os dicotômicos
papéis parte ou custos legis, pesou a favor da manutenção desse papel conferido ao órgão no
processo penal.
É isso que explica o professor Lenio Streck, sobre sua concepção, próxima a do
entendimento do Ministro Carlos Ayres Brito, a de custos juris: “[...] quem é custus juris é fiscal
do próprio regime democrático e do cumprimento das leis e da Constituição. Então ele não é parte;
é mais do que isso!”. (STRECK, 2009, p. 134).
É nesse sentido que o professor Eugênio Pacelli, Relator-Geral da Comissão de Juristas
instituída pelo Senado Federal para elaborar o anteprojeto do PL 156/2009, sustenta, ao comentar
a lege ferenda, não ser compatível o processo penal brasileiro ao modelo de partes, tampouco,
com a concessão da disponibilidade do conteúdo do processo ao Ministério Público:
Contudo, não obstante as diversas referências, nas redações do novo código de processo,
ao Ministério Público como parte, preponderou o seu dever de imparcialidade, dotado da
obrigatoriedade da ação, como regra. E como aludida, a amplitude das atribuições constitucionais,
pesou nesse entendimento. O que veremos melhor a seguir.
A posição do Ministério Público nos sistemas processuais até recentemente era de absoluta
irrelevância, não à toa o professor argentino Julio B. J. Maier compara a história da instituição a
de um adolescente (MAIER, 1993, p. 36).
“Historicamente, a tradição jurídica que tem dominado nos países da América Latina tem
estado enraizada em um esquema de política criminal de sesgo inquisitivo [...]” (POSTIGO, 2017,
p. 16) que atribuía funções secundárias ao Ministério Público. Chegando ao ponto de, no “[...]
Chile, os promotores de justiça de primeira instância [terem sido] suprimidos em 1927 [...].”
(DUCE, 2011, p. 130-131).
No entanto, com as recentes reformas processuais penais o Ministério Público ganhou
protagonismo inédito, e diversas atribuições foram agregadas ao órgão, para além da tradicional
titularidade da ação penal pública (DUCE, 2005).
Diante desse protagonismo uma das questões mais discutidas foi quanto ao
posicionamento do Ministério Público na estrutura do Estado. A opção adotada pela maioria das
reformas foi posicionar o Ministério Público como órgão autônomo ou extrapoder, independente
do Poder Judiciário ou do Executivo (DUCE, 2011)7.
Importante destacar, neste ponto, ao se realizar a comparação do posicionamento do
Ministério Público brasileiro, em contraposição às reformas recentes empreendidas na América
Latina, o que se observa é a vanguarda da estruturação do Estado brasileiro.
7
“No âmbito regional, há dois modelos de autonomia do Ministério Público. O primeiro modelo é aquele que o
posiciona como um órgão independente dos poderes do Estado; ou seja, um órgão localizado fora dos poderes
tradicionais do Estado, opção seguida pela maioria dos países da região, entre eles Argentina, Bolívia, El Salvador,
Guatemala, Honduras, Peru, Venezuela e Chile.” (DUCE, 2011, p. 135).
10
[...] o Ministério Público chileno é uma instituição voltada e focada de maneira quase
exclusiva ao exercício de misteres criminais. Quando se compara tal dispositivo com as
normas constitucionais e legais que estabelecem as funções e poderes do Ministério
Público no Brasil, vê-se que o constituinte chileno foi bastante tímido [...].” (ARRUDA,
2014, p. 71).
11
A instituição ministerial brasileira, por outro lado, “[...] possui uma maior gama de
atribuições, tanto na esfera cível (tutela dos interesses difusos, coletivos e individuais
homogêneos) como no âmbito criminal [...]” (ALMEIDA, 2014, p. 159).
Depreende-se, portanto, tanto pela localização do Ministério Público na estrutura do
Estado brasileiro quanto pela amplitude de sua missão, que se comparada a maioria dos países os
quais apontamos como parâmetro, indicam uma instituição mais complexa, mais antiga e com
poderes mais amplos. A estruturação do novo sistema acusatório brasileiro, portanto, teve de
abarcar essa realidade e prever os necessários mecanismos de controle, como veremos a seguir.
8 Ponte e Demercian apontam para opção similar adotada pelo Estado Italiano, onde se manteve a obrigatoriedade
da ação penal como uma garantia mínima da independência dos membros do Ministério Público à ingerência externa
do Poder Executivo (PONTE e DEMERCIAN, 2016, p. 32).
12
2002).
Importante ressaltar a reforma chilena, sobretudo, por ela se destacar como a reforma mais
ambiciosa da região, sendo vista por muitos autores como paradigmática.
Ademais, a partir do estudo do sistema acusatório chileno é possível estabelecer
contraponto em dois aspectos essenciais para o presente trabalho, a organização institucional do
Ministério Público chileno fundada no princípio hierárquico e a ampla discricionariedade dos seus
membro no exercício da ação penal.
O professor Eugênio Pacelli, é claro ao vincular a manutenção da obrigatoriedade da ação
penal, no novo sistema acusatório brasileiro, à independência funcional dos membros do
Ministério Público, prevista no §1º, do art. 127 da Constituição Federal.9
As redações do novo código de processo mantiveram, desde o pré-projeto do Senado
Federal até a redação que tramita na Câmara do Deputados, respectivamente, nos art. 50, art. 49
e art. 46, o disposto: “o Ministério Público não poderá desistir da ação penal”.
Explica o professor que, sendo o Ministério Público órgão independente, não submetido à
nenhum dos três poderes do Estado, caso optasse o novo sistema processual pelo modelo de ação
penal discricionária não submeteria os membros do parquet a nenhuma forma de controle,
(OLIVEIRA, 2009) o que somado as amplas atribuições conferidas ao órgão, conforme acima
referido, culminaria, certamente, em configuração ministerial teratológica.
“O princípio da obrigatoriedade ou da legalidade da ação penal submete o caso à
jurisdição penal, independente da posição final do órgão público da acusação [...].” (OLIVEIRA,
2011, p. 450). Pode-se dizer, portanto, tão logo estejam reunidos os elementos suficientes de
autoria e a materialidade delitiva, deverá o promotor promover a acusação, adequando na
denúncia as diferentes situações fáticas, tipificadas como delituosas.
Diferente ocorre nos países regidos pelo princípio da oportunidade, onde a atividade dos
promotores vai além dessa perícia jurídica, pois sua autonomia para decidir quanto à promoção
da acusação deve considerar, inclusive, outros fatores, como a suficiência de provas, a extensão
do dano, a proporção da pena autorizada em relação ao crime cometido e até, em relação ao
criminoso, quanto à sua cooperação seja na detenção, seja em delações, tudo visando mensurar o
9 E segue: “O Ministério Público brasileiro não é eleito. E mais. Sequer o Procurador-Geral da República, no âmbito
do MP Federal, e os Procuradores-Gerais dos Estados, indicado (o primeiro) e escolhido (o segundo) pela Chefia do
Executivo – esse, sim, eleito – detém qualquer poder hierárquico sobre os demais membros” (OLIVEIRA, 2009, p.
70).
13
O novo código de processo penal brasileiro, em ambas as redações, art. 283 e ss. do
PL156/09 aprovado pelo Senado e art. 308 e ss. do PL8045/2010 da Câmara dos Deputados, prevê
peculiar espécie de bargaining, aplicável aos crimes cuja sanção máxima cominada não ultrapasse
14
oito anos, ocasião em que se mitigará o princípio da obrigatoriedade da ação penal (COUTINHO,
2009).
Trata-se do Procedimento Sumário que poderá ter requerida a sua aplicação até o início
da audiência de instrução e julgamento, e permitida pelo juiz, caso preenchidas condições
específicas, como a confissão do acusado, dispensa de produção de provas, renúncia de
impugnação material da sentença homologatória, a qual terá natureza de sentença penal
condenatória (REIS, 2019).
Muitas críticas ao Procedimento Sumário foram recentemente empreendidas pela doutrina
nacional, em clara reação, ao observado na conhecida “Operação Lava-Jato”10, onde se pode
observar a utilização da Colaboração Premiada11, instituto também derivado do plea bargainig
norte-americano, de modo absolutamente teratológico.12
Todavia, como bem apontam Suxberger e Filho, “[...] o modelo que se pretende adotar no
Brasil guarda mais semelhança com os institutos de negociação da sentença penal incorporados
em países da Europa, ou seja, com notável controle judicial na homologação dos acordos.”
(SUXBERGER e FILHO, 2016, p. 389). Para os autores, com o devido controle judicial na
homologação dos acordos, os principais problemas advindos desse institutos podem ser
mitigados.
É também a posição da professora Yue Ma, ao analisar o desenvolvimento dos institutos
de justiça negocial nos sistemas processuais penais da França, Alemanha e Itália, aponta que “[...]
continua válido afirmar que a discricionariedade dos promotores continentais está sujeita a
controle e supervisão muito mais estritos do que a dos promotores norte-americanos.” (MA, 2011,
p. 216).
Ademais, a implantação desses institutos, para a autora, se estabeleceu de modo a não
conferir aos promotores largas vantagens transacionais: “[...] a despeito da emergência neles da
transação penal, nenhum país de direito continental permitiu que esse instituto fosse conduzido
de modo a exercer fortes pressões sobre os réus.” (MA, 2011, p. 216).
10 Definida por Suxberger e Filho como: “conjunto de investigações e processos criminais de corrupção, lavagem de
dinheiro e outros crimes econômicos, envolvendo recursos desviados da Petrobrás, que redundou acordos de
colaboração, denúncias, processos, condenação, com forte impacto no cenário político nacional” (SUXBERGER e
FILHO, 2016, p. 388).
11 Regulada pela Lei n. 12.850 de 2012, no art. 4º e ss.
12 Sobre a banalização da Colaboração Premiada, o professor Aury Lopes Jr. aborda em sua obra e na 13ª CPMI da
JBS, segundo notas taquigráficas disponível em: “https://www12.senado.leg.br/multimidia/evento/77425”.
15
13 Jéssica Freitas desenvolve importante estudo crítico sobre o instituto chileno denominado juicio abreviado, o qual
pode ser comparado ao Procedimento Sumário previsto nos projetos de reforma brasileiro. A partir dos dados
publicados referentes a 01 de janeiro e 29 de setembro de 2017, a autora indica o percentual de 97% (noventa e sete
por cento) de sentenças condenatórias proferidas por meio de juízo simplificado e/ou abreviado (FREITAS, 2018, p.
192). A autora demonstra, assim, a eficiência dos institutos de justiça negocial em contribuir com a capacidade
punitiva do Estado e tomar o protagonismo dentro do sistema de justiça criminal.
14 É exemplo o instituto do juicio abreviado, que, somado a outros requisitos, é aplicado quando o promotor exige a
imposição de uma pena privativa de liberdade não superior a cinco anos, momento em que pode o promotor modificar
16
a acusação e a pena prevista ao crime visando a aplicação do instituto negocial (HORVITZ LENNON e MASLE,
2004, p. 520). Depreende-se, portanto, a utilização de pena não superior a cinco anos, em concreto, como parâmetro.
17
de maneira radical provocando, segundo o autor, mudança da sua lógica e a partir disso um
subsistema de aplicação do instituto de direito negocial no chile: “[...] la ley 20.931 [...] ha venido
a establecer una segmentación en nuestro sistema de justicia penal que rompe el principio de
unidad del sistema y permite, en consecuencia, el desequilibrio del mismo.”15 (RIEGO, 2017, p.
1098-1099).
Os cotejamento dos dados acima mencionados reafirmam a expansão suscitada e
demonstram o protagonismo do Juicio Abreviado no sistema acusatório chileno, hodiernamente.
Algumas diferenças entre e o Juicio Abreviado chileno e o Procedimento Sumário,
portanto, podem ser destacadas.
Primeiramente, não poderá o Ministério Público brasileiro alterar o conteúdo da denúncia,
tampouco a pena, haja vista a regra da obrigatoriedade da ação penal e a ausência de previsão
legal autorizando tais exceções. As redações do art. 283 do texto aprovado no Senado, e o art. 308
do PL 8045-2010, que tramita na Câmara, são claras quanto a esses pontos. A aplicação do
Procedimento Sumário, portanto, ficará adstrita aos crimes cuja pena em abstrato não ultrapasse
a oito anos.
A fixação de critério por pena em abstrato pelos redatores, se contraposta a previsão
chilena, sugere hipóteses de incidência mais restritas. Não poderá, portanto, o Promotor brasileiro
requerer aplicação do Procedimento Sumário a crime previsto com pena máxima superior a oito
anos, diferente do que ocorre no Chile, onde o crime de homicídio simples, por exemplo, apenado
de 10 a 15 anos, pode ter requerida aplicação do juicio abreviado pelo Fiscal chileno, desde que,
somados aos outros requisitos, a pena sugerida não ultrapasse a cinco anos.
Contudo, feita a comparação entre os institutos de oportunidade da ação é possível
depreender outras peculiaridades dos papéis a serem exercido pelos Ministérios Públicos, e como
o novo sistema de processo penal brasileiro prevê mecanismos de controle mais amplos que os
existentes no sistema chileno. Tais mecanismos, vale destacar, podem ser subvertidos ou
enrijecidos após a sua inserção no sistema, a exemplo do que ocorreu com o instituto chileno.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
15 “[...]a lei 20.931 [...] veio a estabelecer uma segmentação em nosso sistema de justiça penal que rompe o princípio
de unidade de sistema e permite, em consequência, o desequilíbrio do mesmo.” (RIEGO, 2017)
18
institutos negociais dentro dos sistemas de justiça, inclusive no sistema acusatório brasileiro,
ainda que a previsão no sistema nacional, preveja mecanismos de controle mais amplos que os
existentes no sistema chileno.
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