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SUMÁRIO

SANTO ATANÁSIO DE ALEXANDRIA ................................................................. 02

SANTO AGOSTINHO DE HIPONA ........................................................................ 04

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SANTO ATANÁSIO DE ALEXANDRIA (CA. 296 - 373)

Nascido em Alexandria em cerca de 296, Atanásio em tenra idade foi


adotado como filho espiritual de Santo Alexandre, bispo daquela cidade,
e escolhido para sucedê-lo em 326. Dotado de talentos reconhecidos em
vida e por toda a posteridade, cultivados por uma excelente educação,
Atanásio era um espírito vasto, elevado, dotado de vivacidade e
penetração, inteiramente aplicado ao trabalho.

As décadas seguintes demonstrariam que suas virtudes não eram


humanas, como a dos grandes governantes do passado, mas divinas,
sobrenaturalizadas pela vida mística à qual fora elevado ainda jovem.
Santo antes dos vinte e cinco anos, consumido de um amor incandescente
por Deus e pela Igreja: é por isso que Atanásio foi tão grande.

Grande combatente do arianismo, foi perseguido, injuriado, caluniado de


mil maneiras, insultado e humilhado, exilado cinco vezes, chorou e sofreu
mais do que qualquer um de nós é capaz de imaginar, mas se manteve de
pé. Nenhum inimigo: governadores, generais, bispos e até imperadores...
nenhum o dobrou, nenhum o derrotou.

Tentaram matá-lo várias vezes, mas ele morreu de velhice, no conforto


de seu leito. Expulsaram-no cinco vezes de Alexandria, mas ele sempre
voltava, e nesta cidade entregou a alma a Deus. “Das profundezas das
cavernas e tumbas onde muitas vezes foi obrigado a se esconder”, diz
Henrion, “mesmo que apoiados por todo o poder imperial, Atanásio fazia
seus perseguidores tremerem”.

Autor prolífico, chamado a escrever antes por necessidade do que por


gosto, Santo Atanásio nos legou um monumento doutrinário, historiográfico
e espiritual que é difícil de mensurar, geralmente esquecido em favor dos
aspectos naturalmente mais chamativos de sua vida ativa.

Sobre seu impacto doutrinário, escreveu Quasten que um de seus maiores


méritos consistiu em “ter defendido o cristianismo tradicional contra o
perigo de helenização oculto na heresia de Ário e de seus seguidores”.
Diz ainda que Atanásio, “contra as tendências racionalistas de seus
adversários, provava a primazia da fé sobre a razão. Essa última não
pode ser juíza em assuntos metafísicos. Somente pela razão o homem é
incapaz de investigar sua própria natureza e as coisas do mundo, quanto
mais a natureza inefável de Deus.”

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Santo Atanásio pertencia à grande geração dos Padres e Doutores
daquele século de transição, responsáveis por fazer a grande síntese da
fé cristã com os elementos de verdade contidos nos antigos sistemas de
pensamento, fazendo desaguar, na expressão de Daniel-Rops, “toda a
cultura antiga do imenso oceano de Cristo”.

Sabe-se que o grande nome de tal síntese foi Santo Agostinho (345-430),
no entanto, ao se estudar suas obras em comparação às de Atanásio,
percebe-se uma linha de continuidade, não indireta, mas direta, entre o
seu pensamento e as respostas dadas a certos problemas filosóficos e
teológicos e as respostas que dera o arcebispo de Alexandria décadas
antes.

Dentre as obras de Santo Atanásio, deve-se dar um destaque especial


ao legado da “Vida de Santo Antão”, seu livro mais lido e traduzido, que
exerceu na espiritualidade católica um impacto equivalente ao que sua
teologia sobre a Trindade, sobre a Encarnação e sobre a Redenção
exerceram sobre a dogmática. É um dos alicerces da espiritualidade
católica, e foi fonte de inspiração para almas de cristãos em todos os
tempos. Com esse livro, diz Tillemont, “Santo Atanásio contribuiu deveras
para a expansão dessa santa maneira de viver em toda a extensão da
Igreja na sequência dos séculos, e Deus quis que essa excelente obra
fosse conservada até nós.”

Os mosteiros, que seriam os sustentáculos da civilização nos tempos


bárbaros, só puderam frutificar no Ocidente por causa de Atanásio.
Discípulo de Santo Antão, Atanásio, em seu 2º exílio, em 340, em Roma,
trouxe para o Ocidente as narrativas heroicas das vidas dos monges,
incentivando uma multidão de almas generosas a abraçarem aquela
vocação. Vinte anos mais tarde, escreveu a “Vida de Santo Antão”,
que seria para sempre um dos clássicos da espiritualidade católica, e o
responsável pela difusão daquele modo de vida no Ocidente através dos
séculos.

Nas suas lutas contra o arianismo e contra os governantes arianos, a


vida de Atanásio foi um constante protesto contra os anseios imperiais
de controlar a Igreja. O “Dê a César o que é de César e a Deus o que
é de Deus” encontrou nele seu mais valoroso defensor. A resistência de
Santo Atanásio contribuiu para definir os limites da autoridade imperial e
estruturar a ordem política cristã.

Morreu em Alexandria, em 373.

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SANTO AGOSTINHO DE HIPONA (354-430)

Agostinho nasceu na província romana da África, na cidade de Tagaste,


em 13 de novembro de 354. Dotado de um forte temperamento sanguíneo,
desde muito jovem demonstrou um caráter agitado, indisciplinado e
intemperante, estudante pouco propenso à paciência nos estudos, mas
de uma inteligência fora do comum.

Sua mãe, Santa Mônica era ardentemente católica. Lamentava muito


que o marido continuasse pagão, mas esperava ao menos que os filhos
fossem católicos. Agostinho recebeu dela uma educação cristã, apesar
de não o ter batizado, e abandonou a fé católica aos 19 anos.

Os pais o enviaram muito jovem para estudar na cidade de Madaura e


depois em Cartago, desejando que ele tivesse a prestigiosa carreira de
retórico. Lá também contato com todo tipo de filosofia, religião, heresia
e cisma. Porém, Santa Mônica depositara nele o germe de algo que
não desapareceria, ao contrário, que em Cartago frutificou: a busca, a
inquietação pela verdade.

Entre os 20 e os 29 anos viveu como retórico primeiro em Tagaste e


depois em Cartago, militando em favor da heresia maniqueísta, alojado na
casa de um amigo rico e embriagado na boa vida do luxo e dos prazeres.

Entediado com a vida que levava, partiu para Roma em 383, mas lá não
encontrou o que esperava. Pensou em voltar para a África quando surgiu
a oportunidade da carreira de retórico em Milão, para onde partiu em 384.

O estudo das artes liberais, em especial da filosofia, o convenceu da


inconsistência do maniqueísmo (doutrina herética que adotara até então)
e ele o deixou, mas não pensou em voltar à Igreja Católica e nem abraçou
uma corrente de filósofos, cedendo ao ceticismo.

Precisava de uma doutrina, pois Milão era capital imperial e o governo


não via com bons olhos o ensino maniqueísta e cético, afinal, fazia pouco
tempo que Teodósio proclamara o catolicismo religião de estado. Tornou-
se então catecúmeno na Igreja Católica.

As pregações e os escritos de Santo Ambrósio, bispo de Milão, a


cujo estudo passou a se dedicar, dissiparam as dificuldades que
o maniqueísmo tinha infundido em sua mente, deram uma chave de
leitura para a interpretar o Antigo Testamento. Ele então entendeu a

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necessidade da fé para alcançar a sabedoria, e chegou à convicção de
que a autoridade em que se apoiava a fé é, por um lado a Escritura, mas
que esta, por outro, é apresentada e lida pela Igreja. Ele descobria agora
que o caminho para ir a Cristo era precisamente a Igreja. Em suma, ele
descobriu com Santo Ambrósio uma autoridade que não era irracional,
mas que não era apenas a da razão, e desejou aderir a essa realidade
ao mesmo tempo humana e sobre-humana, a Igreja.

Ele desejou então tornar-se católico, mas a muralha dos seus próprios
vícios se ergueu diante dele. Os velhos hábitos o puxavam pela
vestimenta da carne e ser católico exigia uma mudança de vida. A
conversão definitiva se deu em 386, quando ele tinha 32 anos. Estava
na sua casa com seu amigo Alípio. É o episódio do “Toma e lê.”

Na noite de 24 para 25 de abril de 387 recebeu o batismo das mãos de


Santo Ambrósio, juntamente com seu amig Alípio e seu filho. Resolveu
deixar tudo, incluindo a carreira de retórico, e voltar pra África. Voltando
para a África, vendeu todos os seus bens, distribuiu tudo aos pobres e se
instalou, com alguns amigos fiéis, em um mosteiro.

No começo de 391 sua presença foi reclamada na cidade de Hipona.


Lá impressionou muitas pessoas pela sua sabedoria e santidade, sendo
ordenado padre pelo bispo Valério por insistência da multidão. Logo depois
o bispo Valério associou-o a coadjutor e, em 396, quando da morte dele
foi ordenado bispo de Hipona, cargo que exerceu por 34 anos até sua
morte em 430.

Agostinho travou durante 40 anos um combate incessante por Cristo e


pela sua Igreja. As várias formas de inteligência, tal como diríamos hoje,
dedicadas a determinado tipo de estudo, foram possuídas por ele. A obra
de Agostinho abarcou todos os domínios e penetrou todos eles até dá-los
uma nova forma.

Era por um lado um metafísico, um homem orientado para a especulação,


para a discussão de problemas abstratos de teologia e de filosofia; mas
era ao mesmo tempo um dialético, que se dedicava à exaustão às mais
ferozes discussões sobre os mais diversos temas. Ao todo, escreveu
ao menos 232 livros, isso sem contar seus muitos sermões e cartas. De
sermões sobraram quase 400, e cartas quase 300, de uns milhares que
deve ter escrito.

Enfim, ele foi uma personalidade completa e profunda: foi filósofo, teólogo,
místico, poeta, orador, polemista, escritor e pastor de almas, qualidades

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essas que se completavam e formavam uma só pessoa.

Altaner, por sua vez diz que: “Unia em si este grande bispo a potência
criadora de Tertuliano, a vasta inteligência de Orígenes, o profundo
amor de São Cipriano pela Igreja, a aguda dialética de Aristóteles com o
idealismo alado de Platão; o sentido prático dos latinos com a inteligência
especulativa dos gregos. Por isso é o maior filósofo da era patrística, e
até se pode afirmar que é o mais importante e mais influente teólogo de
toda a Igreja”.

Promoveu a primeira grande síntese da filosofia e não houve campo


da teologia dogmática que Agostinho não deu sua contribuição, seja na
doutrina da graça, na teologia da Trindade, da redenção, da Igreja, dos
sacramentos, da escatologia. Explicou abundantemente a doutrina moral,
centrada no amor; a doutrina social e política; defendeu os caminhos do
ascetismo e explorou os pontos mais altos da mística.

Foi um polemista formidável, pois profundamente convencido da verdade


e da originalidade da doutrina católica, a defendeu contra todos – pagãos,
judeus, cismáticos e hereges – com o recurso da fé da razão. Foi um
mestre da retórica, da música, da gramática, e influenciou profundamente
na consolidação do latim eclesiástico.

Mas Agostinho foi mais do que um gênio: foi um santo. Isso significa dizer
que ele era um homem que pensava e escrevia o que vivia: a união com
um Deus que se revelou e se deu a amar. Agostinho, sobretudo, amava:
uma das palavras que mais saíram de sua pena é “amor”, caritas. Ele
é o Doutor do Amor, que dedicou sua obra à verdade que ele conhece
e ama, Jesus Cristo. O que domina Santo Agostinho é o amor de Deus.
Não se pode penetrar de maneira nenhuma nesse gênio se se perde de
vista, por um segundo sequer, que ele foi ao mesmo tempo e acima de
tudo um santo.

Desde o instante em que se entregou a Ele até seu último suspiro,


Agostinho nunca pensou que seu fim pudesse ser outro que não o de
unir-se a Ele. N’Ele, aquele coração inquieto, encontrou a paz.

Escreve Calderón Bouchet que: “Sua atuação como escritor e


posteriormente como bispo de Hipona pertence à história doutrinal da
Igreja Católica e à vida intelectual de todo o Ocidente cristão. Neste duplo
sentido deve-se reconhecer sua influência: como doutor da Igreja e como
pai da nossa civilização, como pai do ocidente cristão”.

Agostinho reordenou, à luz da fé cristã, o exercício do intelecto humano,

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amparando com a fé e orientando-o a Deus, primeiro princípio de todas
as coisas. Todas as ciências e estudos estão agora imbuídos de um novo
espírito: descobrir as pegadas divinas deixadas pelo Criador e, tão logo
descobertas, encontrar a Deus. E seguindo o “itinerário da mente para
Deus”, olhar para si mesmo, contemplar sua própria alma e descobrir nela
os traços de Deus com sua perfeição trinitária, para depois transcender a
si próprio e encontrar a Santíssima Trindade, a arché, o primeiro princípio.

E mostrou que também os Estados, as nações e os povos, assim como os


indivíduos, devem ordenar-se a Deus, tendo sua lei por base, e auxiliando
sua Igreja na sua missão de levar a salvação a todos os seres humanos.
E as sociedades devem remeter tudo a Deus, tudo deve ser instaurado
em Cristo. Só assim reinará a justiça: se Cristo for o centro e rei de todas
as coisas. Isso porque é próprio do homem ser homo viator, homem que
caminha para o céu.

Deus estabeleceu uma ordem no universo, e as sociedades humanas


devem orientar-se de acordo com tal ordem, com cada um exercendo seu
papel e sua função pelo bem-comum, pelo bem de todos. Diz Bouchet: A
autoridade, que vem de Deus, deve governar pelo bem de seus súditos
e não para a glória do príncipe. O propósito ao qual toda hierarquia tende
é a salvação das almas: ajudar os fiéis a elevarem-se gradualmente até
a perfeição natural à qual foram chamados: eis a razão de ser dos Papas
e dos Reis. O Sacerdote tem o dever de comunicar aos homens as
verdades salvadoras que recebeu de Deus, enquanto o Rei deve prestar
sua colaboração judicial à Igreja.

Santo Agostinho foi de fato o pai da Cristandade Medieval, daquela


civilização que a Igreja construiria depois do colapso do mundo antigo.
Ele apontou à Igreja Católica quais seriam os caminhos que ela deveria
seguir pelos séculos seguintes e até mais além.

Morreu em Hipona, em 430.

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