Você está na página 1de 5

11/01/2022 14:42 O drama de São José

Pesquisar...
MENU

Texto da aula Aulas do curso

Glorioso São José

O drama de São José


Enquanto José pensava em deixar Maria em segredo, eis que um anjo do Senhor apareceu-lhe em sonhos, para o
confirmar na fé e mostrar que, se a misericórdia divina não permite que o justo sofra além do necessário, nem por
isso o priva da graça de, sofrendo, unir-se às dores do único e verdadeiro Justo.

imprimir

Vimos na nossa aula passada o casamento entre S. José e a Virgem Maria. Eles já tinham se
casado, mas não moravam juntos, ou seja, não se havia celebrado a segunda fase do casamento
judaico, que é a coabitação. Isso é colocado com muita clareza pelo evangelista S. Mateus, que
diz assim logo no início do Evangelho: “Jacó gerou José, o esposo de Maria”. José já é chamado
de esposo de Maria (o termo, no original grego, é o “homem” de Maria, assim como se diz que a
esposa é a “mulher” do marido), “da qual nasceu Jesus que é chamado o Cristo”. 

Continua S. Mateus: “Eis como foi a origem de Jesus Cristo: sua mãe Maria, desposada com
José, antes de conviverem...”. Aqui estão claramente marcados os dois momentos do
matrimônio: no primeiro momento, em que já havia o contrato de casamento, os dois estavam
casados; mas, antes de conviverem (segundo momento), ela “achou-se grávida pela ação do
Espírito Santo” (Mt 1, 18). Sabemos que, como os dois já eram oficialmente casados, não havia
admiração nenhuma por parte da população ao ver que Maria estava grávida.

Sabemos que ela concebeu e, depois, foi passar três meses com Isabel até o nascimento de S.
João Batista. Não sabemos se S. José foi com a Virgem SS. Olhando para a santidade dele e de
Nossa Senhora, e levando em conta que os dois já estavam casados, existe uma grande
probabilidade de que S. José tenha acompanhado a Virgem Maria até a casa de Isabel. Afinal
era uma longa viagem, e Maria estava se expondo a riscos e perigos. Ora, que marido deixaria a
esposa viajar sem amparo e proteção? Olhando para as virtudes de S. José, provavelmente ele
acompanhou a Virgem SS., embora não tenhamos certeza histórica disso porque em lugar
nenhum se menciona a presença de São José. No entanto, em várias representações artísticas,
em pinturas e quadros na imaginação popular, se vê ao fundo a presença de José, enquanto
Maria, em primeiro plano, entra na casa de Isabel. Nisso, podemos ter nossa opinião pessoal.

https://padrepauloricardo.org/aulas/o-drama-de-sao-jose 1/5
11/01/2022 14:42 O drama de São José

Os dois, então, retornam para Nazaré. Não sabemos como foi. O fato é que, realmente, Maria foi
MENU
“encontrada como grávida”. Como São José ficou sabendo disso? Existe uma boa probabilidade
de que ele não tenha descoberto a gravidez pela própria Virgem Maria, ou seja, por uma palavra
dela. 

De fato, existe um poema de S. Teresinha dedicado à Virgem Maria, Marie, pourquoi je t’aime?
— “Maria, por que eu te amo?” —, uma de cujas estrofes fala do eloquente silêncio da Virgem
Maria diante do drama de S. José. Maria teria visto o sofrimento de S. José, mas nada teria dito,
não por falta de amor, mas porque ela sabia que era convidada ao silêncio e a confiar em Deus.
S. Teresinha diz que aquele silêncio de Maria ensina a onipotência de uma alma orante, de
uma alma que reza, confia e espera a sua ajuda somente do céu. Com efeito, a Virgem SS.
estava diante de um drama do qual as forças humanas, a prudência dos homens, as palavras
humanas não dariam conta... 

O fato é que houve ali um momento de provação para S. José, e nós podemos nos perguntar:
“Por que Deus deixou S. José sofrer desse jeito?”

Quanto às razões espirituais, podemos pensar em várias possibilidades, mas uma coisa é certa:
quando Jesus morreu na Cruz, S. José já tinha falecido e, portanto, não pôde participar
diretamente do sacrifício do Calvário como a Virgem Maria, que esteve lá de pé, ao lado da
Cruz. Por isso, Deus na sua bondade e providência, quis que S. José participasse de outra forma
desse sacrifício. Pode soar estranho, mas só o é para quem não conhece as bondades de Deus.
Ora, nós nascemos para amar, e um homem tão agraciado e santo como S. José amava a Deus e
precisava participar de algum modo, mesmo sem se dar conta, do sacrifício do Calvário,
unindo-se a Cristo. Deus permitiu esta oblação, esta entrega de S. José. 

Vamos, pois, aos dados que estão no Evangelho de São Mateus porque, dos dois Evangelhos da
infância (Mateus e Lucas), só o primeiro narra o drama e a provação de S. José, a “paixão de
José”, no sentido de sofrimento. Escreve S. Mateus (cf. 1, 19): “José, seu esposo prometido,
sendo justo, e não querendo expô-la, cogitou em despedi-la secretamente. Enquanto assim
ponderava, apareceu-lhe em sonho um anjo do Senhor que lhe disse: ‘José, filho de Davi, não
temas receber Maria tua mulher, pois o que nela foi gerado vem do Espírito Santo. Ela dará à
luz um filho e tu lhe porás o nome de Jesus, pois Ele salvará o seu povo de seus pecados’”. Aqui
termina o episódio, mas a continuação mostra que é aqui que S. Mateus introduz a profecia de
Isaías: “Tudo isso aconteceu para se cumprir o que havia sido dito pelo Senhor por meio do
profeta: ‘Eis que a virgem ficará grávida e dará à luz um filho. Ele será chamado pelo nome de
Emanuel que significa: Deus conosco’. Ao despertar do sonho, José fez o que o anjo do Senhor
lhe havia ordenado e acolheu sua mulher e não conviveu com ela enquanto não deu à luz o
filho ao qual ele pôs o nome de Jesus”.

https://padrepauloricardo.org/aulas/o-drama-de-sao-jose 2/5
11/01/2022 14:42 O drama de São José

Antes de examinar as interpretações que existem destes versículos, é preciso deixar bem claro
MENU
que a solução aqui apresentada não é a única possível. Muitos SS. Padres da Igreja debateram
sobre o assunto e adotaram posições diferentes, que se podem resumir a três: duas extremas e
uma mais “moderada”, e é a que nós vamos adotar, embora todos sejam livres para seguir a que
preferirem, porque qualquer uma delas possui santos entre seus partidários.

A primeira posição é a de S. Ambrósio, e talvez a menos aceitável. Ambrósio diz que S. José
teria suspeitado da honestidade da Virgem Maria, ou seja, ele teria ficado escandalizado diante
de sua gravidez. Por que essa posição é a mais improvável? Porque os santos se reconhecem, e
José, sendo santo, não iria suspeitar da Virgem Maria. S. Tomás de Aquino resolve o problema
e descarta a posição de Ambrósio, ao lembrar que na suspeição há sempre algo de malícia. Ou
seja: quando se suspeita de uma pessoa, há neste ato um julgamento malicioso. Pois a suspeita
é o mesmo que julgar sem indícios suficientes. Ora, o Evangelho nos diz que S. José era justo,
que é o maior elogio que a Bíblia pode fazer a alguém. Ora, se ele era justo — isto é, santo —, não
julgaria sem indícios suficientes. José não tinha motivos para pensar mal da Virgem Maria.

A segunda posição, que tende para o outro extremo, é a de Orígenes. Lembremos o trecho de
Isaías: “Eis que a virgem conceberá e dará à luz um filho. Ele será chamado pelo nome de
Emanuel”. Ora, essa profecia nos coloca diante do fato de que o povo de Israel, de uma forma
geral, aguardava o Messias nascido de uma parthenos (παρθένος), de uma virgem. Por isso diz
Orígenes que, assim como Isabel, ao receber em casa a Virgem Maria, viu claramente por
inspiração do Espírito Santo que o Messias estava ali — daí sua exclamação: “De onde me vem
que a mãe do Meu Senhor venha me visitar?” —, assim também José teve uma inspiração e viu
o mesmo que Isabel. No entanto, se aceitarmos que S. José acompanhou a Virgem Maria à casa
de Isabel, nada impede que ele tenha ouvido a saudação da velha parenta e tenha descoberto,
naquele momento, que sua esposa estava grávida. Para essa posição, além disso, S. José, ao
saber da gravidez, teria olhado para Maria como Moisés olhou para a sarça ardente: sentindo-
se indigno de aproximar-se desse grande mistério, preferiu, por humildade, recolher-se “à
própria insignificância” e ir embora.

São duas soluções extremas: para uma, S. José suspeitou da Virgem Maria; para outra, S. José
teve uma inspiração divina, ou um conhecimento não atestado, sentiu-se indigno e, por isso,
resolveu sair. Mas existe uma terceira posição, intermediária, que é a de S. Jerônimo, para
quem S. José teria ficado perplexo e, por isso, ele suspendeu o juízo, sem saber exatamente o
que fazer. Foi um debate interior. No original grego (em português nem sempre se nota isso) se
lê: “José, seu esposo, sendo justo, e não querendo expô-la, cogitou em despedi-la secretamente.
Enquanto isso ponderava, apareceu-lhe em sonho um anjo do Senhor”. Algumas traduções, no
lugar de “cogitou”, dizem “decidiu”, o que rompe a continuidade com o versículo seguinte, que
diz: “Enquanto ele ponderava…”.

https://padrepauloricardo.org/aulas/o-drama-de-sao-jose 3/5
11/01/2022 14:42 O drama de São José

Ora, se ele ponderava, é porque ainda não tinha se decidido; estava ainda se debatendo
MENU
interiormente, com agonia, com uma divisão interior. José queria em tudo fazer a vontade de
Deus, mas naquela situação, por permissão divina, ele não tinha luzes suficientes para ver com
clareza onde estava a vontade de Deus, e isso o dilacerava interiormente.

No original grego se diz que José ἐβουλήθη λάθρᾳ ἀπολῦσαι, o que se pode traduzir por “decidiu
secretamente” (isto é, não receber Maria), mas logo em seguida vem: ταῦτα δὲ αὐτοῦ
ἐνθυμηθέντος, ou seja, “considerando essas coisas”, revolvendo-as na mente, no coração, na
alma etc., S. José, tendo considerado tudo, foi deitar-se de tão cansado. O anjo então lhe
aparece em sonhos. Aqui, a solução intermediária nos deixa um pouco no mistério, sem
explicar tudo.

Se adotamos a posição de S. Ambrósio, já sabemos o que aconteceu; se a de Orígenes, também;


mas, se seguimos a intermediária, parece que o evangelista S. Mateus quis deixar-nos na
mesma perplexidade vivida por S. José, sem saber realmente o que estava acontecendo. Essa
passagem não narra apenas o drama interior de José; é um drama também para nós, que
amamos José e não podemos ler esse relato sem sentir a mesma aflição que ele. É como se
Deus nos quisesse fazer sentir a mesma experiência espiritual.

É por isso que a posição média de S. Jerônimo é preferível, sem afirmar demais nem afirmar de
menos. Ela nos deixa como que o pé em falso, sem ter muito onde se apoiar, sem saber
exatamente o que aconteceu na interioridade de S. José. E essa parece ser a grande lição que
se pode tirar do drama dele: eles acontecem também conosco. Claro, não com a grandeza e a
santidade de José nem com a extrema dramaticidade do momento. O fato é o seguinte: S. José,
sabendo que a Virgem Maria estava grávida, sem pensar mal dela em momento algum, ficou
perplexo, como perplexos ficam os justos e santos quando não sabem o que está acontecendo
nem qual é a vontade de Deus. 

Em termos filosóficos, poderíamos dizer que S. José realizou uma epokhé, ou seja, não emitiu
juízo, mas permaneceu naquela situação tão dolorosa em que não se sabe como conciliar o
próprio mundo interior. José, por assim dizer, foi lançado de um lado para outro. Essa posição
é, de fato, a mais dramática, mas também a que melhor corresponde a este momento da
“paixão de São José”, chamado a viver algo semelhante à agonia de Cristo no Horto das
Oliveiras.

Com efeito, é de admirar que José não tenha suado sangue nesta participação tão intensa na
Paixão de Cristo! Não se quer dizer com isso que o drama de São José tenha sido idêntico ao
que Jesus viveu no Horto das Oliveiras. No curso de Cristologia, explica-se com mais detalhes
o que Jesus passou no Getsêmani, dentro do grande mistério da Redenção. Trata-se aqui de um

https://padrepauloricardo.org/aulas/o-drama-de-sao-jose 4/5
11/01/2022 14:42 O drama de São José

drama análogo e, como o de Jesus, o drama de um sofrimento também misterioso, à sua


MENU
maneira.

O que sabemos é que Deus, misteriosa e bondosamente, na sua providência, quer que todos nos
configuremos ao seu Filho crucificado e ressuscitado: “Faça-se em mim conforme a tua
palavra”, disse a Virgem Maria. Esta é a forma de S. José dar o seu sim, de dizer o seu fiat, e o
Anjo manifesta isso com toda a clareza ao dizer: “Não tenhas medo, José”. Dentro de S. José
havia medo. Ora, o que o justo mais teme? Não fazer a vontade de Deus! Este era o medo de
José. Mas o Anjo diz: “Não tenhas medo de receber Maria, a tua esposa”. Também nós, não
tenhamos medo de fazer a vontade de Deus!

Junte-se a nós! Nome E-mail


Receba novos artigos, vídeos e lançamentos de
Digite seu nome Digite seu e-mail Enviar
cursos diretamente em seu e-mail.

MINHA CONTA SOBRE O SITE CURSOS PROGRAMAS REDES SOCIAIS

Entrar Nossa missão Espiritualidade Homilias Youtube


Meus dados Padre Paulo Ricardo Teologia Pregações Facebook

Meus cursos Política de privacidade Família A Resposta Católica Instagram


Minha assinatura Termos de uso História Programa ao vivo Twitter

Fale conosco Mariologia Conselhos Paternos


Cultura e sociedade Direção Espiritual

Sagradas Escrituras

Christo Nihil Præponere


“A nada dar mais valor do que a Cristo”

https://padrepauloricardo.org/aulas/o-drama-de-sao-jose 5/5

Você também pode gostar