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O Estado em Poulantzas - Uma Análise Da Constituição Da Hegemonia Na Sociedade de Classes
O Estado em Poulantzas - Uma Análise Da Constituição Da Hegemonia Na Sociedade de Classes
O Estado em Poulantzas - Uma Análise Da Constituição Da Hegemonia Na Sociedade de Classes
Vicente Rodriguez
Professor (PPGE/Unicamp)
GT 2 - Os marxismos
1
Poulantzas (1936-1979), marxista e membro do Partido Comunista da Grécia, nasceu em Atenas.
Transferiu-se para Paris em 1960. Lecionou no departamento de sociologia da Universidade de Vincennes
e depois na Escola de Altos Estudos em Ciências Sociais. Foi aluno de Louis Althusser, do qual recebeu
forte influência. Em suas últimas obras, Poulantzas, afasta-se da influência, estruturalista, do mestre,
aspecto que pode ser apreendido na leitura do seu artigo “O Estado capitalista: uma resposta a Miliband e
Laclau”, de 1976, recentemente publicado no Brasil, na revista Crítica Marxista e no livro O Estado, o
poder e o socialismo, publicado na França, em 1978, e, no Brasil, dois anos depois, pela Edições Graal.
relações de classe não só rompe com o “determinismo estruturalista althusseriano”, como
também contribui com a atualização da teoria marxista sobre o Estado.
Ao conceituar o Estado como a condensação de uma relação, Poulantzas ([1978]
1985) ajuda-nos a evitar os impasses do pseudodilema da discussão sobre o Estado, no
qual acentua duas interpretações básicas: o Estado concebido como coisa-instrumento e
o Estado concebido como sujeito.
Nesse sentido, Poulantzas nitidamente vai rechaçar a ideia de que o Estado seria
uma entidade de direito exclusivo, ou seja um instrumento a serviço da arbitrariedade de
uma única classe e passa a evidenciar as contradições constitutivas que perpassam as
relações de forças ou, mais precisamente, “a condensação material e específica de uma
relação de forças entre classes e frações de classes” (Id., 1985, p.148).
Destarte, a abordagem relacional do Estado no capitalismo monopolista, permitiu
a Poulantzas atualizar a forma de analisar o Estado o que, em parte, demonstra a influência
de Gramsci no seu processo de amadurecimento intelectual.
É necessário destacar que para Poulantzas o Estado enquanto “condensação
material de uma relação contraditória” não organiza a unidade do bloco no poder ao
contrário “é o jogo dessas contradições na materialidade do Estado que torna possível,
por mais paradoxal que possa parecer, a função de organização do Estado” (Id., Ibid., p.
153). Assim, as contradições de classes que constituem o Estado fornecem elementos para
a compreensão do seu aspecto material.
Nessa linha de pensamento, Poulantzas ([1968] 1977) sintetiza o conceito de bloco
no poder como uma unidade contraditória e dinâmica entre distintas classes e/ou frações
de classes, sob a hegemonia de uma dessas frações ou classes.
Deste modo, as contradições de classe representam a base material e
organizacional do Estado que se concentra mediante o hiato de duas questões que se
condensam: a relação do Estado com as classes dirigentes e a relação do Estado com as
classes dirigidas, ou seja, as massas.
Nestas condições, o Estado capitalista se fundamenta exclusivamente pelas
contradições intrínsecas às tensas relações de classes que são refuncionalizadas para o
estabelecimento da hegemonia. Deste modo, apesar do Estado servir para organizar as
classes dominantes e para desorganizar as classes dominadas este pode, por meio de
contestações organizadas e recorrentes das classes subordinadas, ser disfuncional aos
interesses intransigentes da burguesia (Id., 1985).
Destarte, “o Estado concentra não apenas a relação de força entre frações do bloco
no poder, mas também a relação de forças entre estas e as classes dominadas” (Poulantzas,
1985, p. 162) na qual a autonomia relativa do Estado é necessária para a organização da
hegemonia.
Outro elemento que Poulantzas destaca, no processo de condensação das relações
socioeconômicas é o poder de classe, tido, como categoria importante no
desenvolvimento das relações sociais de produção e do Estado. A esse respeito,
Poulantazas (Ibid., p. 41) atesta que o “processo econômico é luta de classes e portanto
relações de poder (e não somente de poder econômico) [...]” mas também poderes
“político-ideológicos”. A conjugação de tais formas de poder, relacionam-se aos lugares
de classes, conforme a divisão social do trabalho. Assim:
Para Poulantzas (Id., Ibid., p. 179), “essas lutas se revestem de formas específicas:
moldam-se no arcabouço material do Estado, segundo a trama de sua autonomia relativa”.
E nesse sentido, o Estado capitalista estrito, a fim de preservar os interesses hegemônicos
da classe burguesa, utiliza um duplo e unificado processo ideológico: o efeito de
isolamento, que converte, através do sistema jurídico, os agentes sociais membros de uma
classe em indivíduos particulares, sujeitos de direito, pessoas “livres e iguais” entre si; e
o de representação da unidade, que consiste na capacidade do Estado de apresentar-se
como unificador das classes sociais em função de “preservar os interesses” de uma parcela
da sociedade e com isso se apresentar como mediador da vontade geral do povo nação
(Id., 1977). De outro modo, Poulantzas vai entender que é inviável compreender a forma
de organização estatal, sem levar em conta o seu papel de mediador de conflito entre as
classes.
Nesse sentido, outra estratégia de manutenção da divisão social de classes é o
direito. Para Poulantzas, o direito, entendido como constructo de legitimação de relações
sociais, apresenta uma dupla e unificada forma ideológica jurídica que se expressa nas
contradições que perpassam as lutas de classes. No primeiro momento, Poulantzas vai
relacionar direito e repressão e deduzir que o Estado capitalista não os dissocia, ao
contrário, utiliza de maneira “legitima” o uso da violência como mecanismo de
estabelecimento do controle das relações sociais. No segundo momento, vai acrescentar
que a utilização do direito serve, de forma expressiva, como estratégia de manutenção
dos indivíduos na classe de origem, ou seja, como legitimador das desigualdades
socioeconômicas típicas do modo de produção capitalista (Id., Ibid.).
Deste modo, é observado que a lei é apresentada como a própria encarnação da
razão e que somente na análise meticulosa da divisão socioeconômica do trabalho e da
produção é que poderemos encontrar o significado apropriado do direito.
Com efeito, Poulantzas vai asseverar que quando as desigualdades sociais ganham
dimensões que extrapolam os limites do consenso forjado, que têm no direito sua
expressão jurídica, entra em evidência a autonomia relativa, constituída de igual forma,
como monopólio privado do Estado capitalista de classes.
Deste modo, a autonomia relativa do Estado entendida como “relação entre
Estado, de um lado, capital monopolista e conjunto da burguesia, de outro, relação que se
coloca sempre em termos de representação e de organização política de classe”
(Poulantzas, 1975, p. 174), consolida o bloco no poder na medida em que é “necessária
igualmente para a organização da hegemonia” (Id., 1985, p. 161). Portanto, as
contradições entre classes dominantes e classes dominadas se realizam dentro e fora do
Estado.
Poulantzas (Ibid., p. 165) vai afirmar ainda que apesar da presença das classes
populares nos distintos aparelhos do Estado, fato histórico incontestável, mas que tomado
em si mesmo e logo sem a superação da divisão socioeconômica, apesar de necessária,
pouco modificaria a estrutura capitalista de organização estatal, na medida em que “a ação
das massas populares no seio do Estado é a condição necessária para sua transformação,
mas não é o bastante”, pois é evidente que:
REFERÊNCIAS
POULANTZAS, Nicos. Poder Político e Classes Sociais. São Paulo: Ed. Martins Fontes,
1977.
POULANTZAS, Nicos. O Estado, o poder, o socialismo. 2. ed. Rio de Janeiro: Graal,
1985.