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Antonio Augusto Gorni et al.

Metalurgia & Materiais

Aços alternativos ao HY-80 sem a


necessidade de aplicação
de têmpera e revenido
Antonio Augusto Gorni
Dr., Analista do Suporte Técnico da Laminação a Quente, COSIPA
E-mail: gorni@cosipa.com.br

Paulo Roberto Mei


Professor-Doutor, Departamento de Engenharia Mecânica, UNICAMP
E-mail: pmei@fem.unicamp.br

Resumo Abstract
A competitividade cada vez mais acirrada entre as The fierce competition between different steelworks
diversas usinas siderúrgicas e também entre diferentes and between different alloy design approaches keep
tipos de materiais continuam promovendo o desenvolvi- promoting the development of new microalloyed
mento de novos aços estruturais microligados que aten- structural steels which must satisfy increasingly severe
dam a requisitos de resistência mecânica e tenacidade mechanical strength and toughness requirements.
cada vez mais severos. Outros aspectos igualmente de- Another equally desirable aspects for these new
sejáveis, como a supressão de tratamentos térmicos e materials are the supression of heat treatments and
melhor soldabilidade do produto, tornam essa evolução better weldability, which makes this evolution even more
ainda mais complexa. Como a melhoria da soldabilidade complex. As weldabiliby improvement requires
do produto exige a minimização do teor de carbono do minimization of the carbon content of the steel, these
material, esses novos aços precisam dispor de mecanis- new steels must present hardening mechanisms which
mos de endurecimento que dispensem a presença desse does not require the presence of this element. Up to this
elemento. As alternativas mais viáveis são os aços endu- moment, the most feasible answers to this challenge are
recíveis por precipitação de cobre, do tipo HSLA-80 ou steels hardened by copper precipitation, like HSLA-80
ASTM A710, ou os aços bainíticos com teor extra-baixo or ASTM A710, and the so-called Ultra Low Carbon
de carbono, do tipo ULCB. Bainite (ULCB) steels.
Palavras-chave: HY-80, aço microligado, propriedades Keywords: HY-80, microalloyed steel, mechanical
mecânicas. properties.

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Aços alternativos ao HY-80 sem a necessidade de aplicação de têmpera e revenido

1. Introdução O desenvolvimento de ligas para tos de liga [Nakasuji, 1980, Fumimaru,


uso naval militar baseado nestes dois 2000]. Ainda não há registros de sua uti-
O vertiginoso desenvolvimento dos novos conceitos é bastante interessan- lização real em embarcações militares,
aços microligados, particularmente no te, pois os requisitos específicos desta provavelmente por duas razões. O ad-
campo das aplicações estruturais, navais aplicação são muito severos, o que mo- vento dos aços HSLA-80 e HSLA-100
e petrolíferas, se deve basicamente às tivou a realização de estudos bastante
melhores características de tenacidade deve ter diminuído a necessidade do
detalhados. desenvolvimento de novas ligas simila-
desses materiais para níveis relativamen-
te altos de resistência mecânica e boa No caso específico dos aços utili- res. Além disso, o aço ULCB é um pro-
soldabilidade. Além disso, seu preço é zados em navios de guerra, particular- duto tipicamente japonês, uma vez que
menor que o dos materiais tratados ter- mente submarinos, verificou-se nessa apenas as usinas siderúrgicas daquele
micamente, uma vez que suas caracterís- última década a substituição da liga uti- país conseguem produzir este tipo de liga
ticas mecânicas finais são conseguidas lizada tradicionalmente (aços da série HY, com teor extra-baixo de carbono de for-
diretamente do calor de laminação. Sob temperados e revenidos) por materiais ma econômica e confiável.
este aspecto, a laminação controlada se microligados, da chamada série HSLA,
A situação estratégica brasileira
revelou um tratamento termomecânico contando com a precipitação de cobre
como principal mecanismo endurecedor. quanto a esse tipo de material é crítica.
indispensável para se conseguirem tais
características a partir das ligas microli- Um exemplo desta nova família é o aço De fato, limitações técnicas impediram a
gadas ao Nb, Ti e/ou V. Desse modo, HSLA-80 [Wilson, 1988]. produção, no Brasil, das chapas de aço
tornou-se possível a produção de cha- HY-80 que foram utilizadas nos submari-
Essas novas ligas apresentam, por nos construídos pela Marinha no final
pas grossas adequadas à fabricação de
si só, menor custo que os da série HY, da década de 1980. Tal material teve de
tubos petrolíferos segundo as normas
em função de seu menor teor de elemen- ser importado da Alemanha. Surge aí um
API 5L-X60, X70 e até mesmo X80, des-
tos de liga. Contudo, a grande vantagem
de que sua espessura de parede não ul- problema potencialmente grave: há res-
decorrente de sua utilização é a soldabi-
trapasse 20 mm. trições políticas bastante severas que
lidade muito superior desses novos aços,
dificultam enormemente a importação de
Por outro lado, aplicações que exi- que permite redução de até 50% nos cus-
jam níveis ainda maiores de resistência aços que possam ter propósitos milita-
tos totais de construção das embarca-
mecânica ou chapas de maior espessu- ções [Montemarano, 1986]. Esse aumento res. A maior potência siderúrgica mun-
ra, com boa tenacidade, requerem a utili- de soldabilidade se deve ao baixo teor dial, o Japão, de fato restringe severa-
zação de aços microligados mais com- de carbono dessa nova família de ligas. mente a exportação de aços que com-
plexos. Pode-se citar como exemplos De fato, esses aços vêm sendo cada vez provadamente venham a ser utilizados
componentes para pernas de platafor- mais aplicados nos Estados Unidos em nesse sentido. Desse modo, um boicote
mas marítimas móveis, válvulas e cone- navios de guerra mas, apesar de todo o conjunto de fornecedores internacionais
xões para oleodutos, peças para veícu- sucesso observado, sua aplicação ain- de aços especiais poderia eventualmen-
los militares e caminhões fora-de-estra- da é vedada em submarinos. Por outro te estrangular qualquer programa brasi-
da, equipamentos para poços de petró- lado, já há registros da aplicação exten- leiro na área militar, inclusive naval, que
leo e componentes estruturais em vasos siva de aços microligados em submari- dependa desse material.
de guerra, incluindo submarinos. Além nos, inclusive nucleares, na França, In-
de características mecânicas balancea- glaterra, Suécia, Austrália e, possivel-
das, este tipo de material deve ser de mente, na antiga União Soviética, ainda 2. Motivação para o
fácil processamento para o cliente, o que que na forma de chapas temperadas e
inclui fácil soldabilidade, mesmo que se
desenvolvimento de
revenidas.
encontre na forma de chapas grossas ligas microligadas
pesadas, ou seja, com espessuras entre Uma outra possibilidade de substi-
tuição da família HY está nos chamados alternativas ao HY-80
25 e 100 mm.
aços ULCB, que podem apresentar re- Tradicionalmente chapas grossas
Dois conceitos de liga foram pro- sistência mecânica e tenacidade compa- temperadas e revenidas de aços HY-80 e
postos para se responder a esse desa- ráveis às ligas originais, mas com nível HY-100 - especificadas de acordo com a
fio: aços microligados endurecíveis por de soldabilidade muito superior. Tam- norma MIL-S-16216 - são utilizadas em
precipitação de cobre (ASTM A710 e bém, neste caso, essa melhoria do mate- aplicações navais militares críticas, como
HSLA-80) ou pela formação de estrutura rial pode ser creditada ao teor extra-bai- áreas de conveses altamente solicitadas
bainítica tenaz com teor ultra-baixo de xo de carbono, enquanto que a resistên- do ponto de vista mecânico, superfícies
carbono (ULCB - Ultra Low Carbon cia mecânica é proporcionada pela mi- que determinam o curso de belonaves,
Bainite). Eles foram originalmente desen- croestrutura bainítica aliada ao endure- cascos submetidos à pressão e paredes
volvidos para atender aplicações de tu- cimento por solução sólida de elemen- de tanques em submarinos convencio-
bos e conexões petrolíferas.
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nais. Após o tratamento térmico de têm- dos/revenidos ou normalizados são fun- croestrutura bainítica, que forma uma
pera e revenimento, esses materiais atin- ção de seu teor de carbono. Logo, a ques- subestrutura de discordâncias, e pela
gem limites de escoamento da ordem de tão crucial passa a ser como conseguir solução sólida de elementos de liga.
550 ou 690 MPa, respectivamente. suficiente resistência mecânica numa liga São comumente designados pela si-
que apresente teor de carbono baixo o gla ULCB (Ultra Low Carbon Bainite),
Embora estes materiais apresentem
suficiente para assegurar fácil usinabili- ainda que seu teor de carbono não seja
ótimo desempenho em serviço, o custo
dade e boas propriedades no cordão de tão baixo assim [Nakasuji, 1980].
de fabricação dos componentes feitos
solda [Wilson, 1988].
com eles é muito alto. A principal razão Note-se que os mecanismos de en-
deste fato está associada à sua solda- A busca de soluções para este pro- durecimento atuantes nestas duas ligas
gem, particularmente quanto aos seve- blema levou ao desenvolvimento de li- são relativamente independentes de seu
ros pré-requisitos para se garantir a boa gas alternativas que apresentassem me- teor de carbono, ao contrário do que
execução desse processo. Caso essas lhor soldabilidade que os aços da família ocorre na família HY.
recomendações não forem seguidas o HY, mas sem sacrifício da resistência
As ligas da família A710 podem ser
risco de vultosos prejuízos é muito alto, mecânica ou tenacidade.
produzidas conforme três rotas de fabri-
seja devido ao sucateamento da peça ou
Até 1980 apenas aços martensíti- cação diferentes: laminado e envelheci-
à sua falha prematura em serviço.
cos apresentavam alta resistência mecâ- do (Classe 1), normalizado e envelheci-
De fato, sob este aspecto as carac- nica aliada à boa tenacidade sob baixas do (Classe 2) e temperado e envelhecido
terísticas dos aços HY são péssimas, temperaturas na forma de chapas gros- (Classe 3). A Marinha de Guerra ameri-
basicamente em virtude de sua obsoleta sas médias e pesadas, ou seja, com es- cana já vem aplicando este material sob
filosofia de projeto de liga: afinal, eles pessuras acima de 20 mm. A partir de condições reais, ainda que em casos não
derivam de um aço para blindagem de- então, foram adotadas duas abordagens críticos. Ou seja, ele não é utilizado em
senvolvido pela Krupp alemã por volta para o desenvolvimento de ligas alter- estruturas que devam capturar trincas
de 1890. Naquela época, a soldagem era nativas às martensíticas: ou em blindagens. Além disso, seu uso
pouco mais que uma curiosidade cientí- • Aços endurecíveis através da precipi- se limita a chapas grossas relativamente
fica e, de fato, esse processo só atingiu tação de cobre, especificados nas nor- leves, ou seja, com espessura entre 6 e
sua maturidade mais de meio século de- mas ASTM A710 e HSLA-80 [Wilson, 19 mm. O material mais leve, ou seja, com
pois. Logo, não houve a menor preocu- 1988]. espessura inferior a 8 mm, é produzido
pação por parte dos metalurgistas da- conforme as classes 1 e 2, de acordo com
• Aços com teor extra-baixo de carbo-
quela época em adequar esta liga aos as especificações impostas pela Mari-
no, endurecíveis pela formação de mi-
requisitos típicos do processo de solda-
gem [Garcia, 1991].
Um dos fatores principais que de-
terminam a soldabilidade dos aços é o
grau de imunidade que a zona termica-
mente afetada - ZTA (ou seja, Heat Affec-
ted Zone - H.A.Z.) apresenta contra o trin-
camento a frio, tanto na forma retardada
como no que ocorre abaixo do cordão de
solda. De forma geral, a suscetibilidade
da ZTA de um dado aço ao trincamento
depende tanto de sua composição quí-
mica como da maneira como ele foi sol-
dado. Este relacionamento pode ser vis-
to esquematicamente na Figura 1. Ob-
serva-se neste gráfico que o aço HY-80
pode sofrer trincamento sob quaisquer
condições de soldagem. Esse diagrama
ainda mostra o caminho a ser seguido
para se minimizar este problema: reduzir
ao máximo o teor de carbono do material.
Aqui surge um problema: pratica-
mente todos os mecanismos de endure- Figura 1 - Susceptibilidade à ocorrência de trincamento na ZTA para vários aços
cimento envolvidos nos aços tempera- utilizados na indústria naval militar [Wilson, 1988].

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nha americana. Já o material pesado é produzido de acordo picas dos aços HY-80, HSLA-80 e ULCB podem ser vistas
com a classe 3 que, aliás, é a mais utilizada tanto nas aplica- respectivamente nas Tabelas 1 e 2.
ções civis como militares. Tais limitações restringem a aplica-
As ligas da família HY são baseadas no sistema Mn-Ni-
ção dos aços da família A710 em pequenos vasos de guerra e
Cr-Mo. O níquel está presente, a princípio, para conferir tena-
em alguns locais específicos de porta-aviões e submarinos
[Phillips, 1988]. Nestes casos, o material deve atender à norma cidade sob baixa temperatura ao material. Já o cromo e molib-
MIL-S-24645, recebendo as designações HSLA-80 ou HSLA- dênio são adicionados com o intuito de se assegurar alta tem-
100 conforme seu nível de resistência mecânica. perabilidade. A norma que rege este material não permite adi-
ções de microligantes tais como nióbio, vanádio, titânio ou
Não foram encontradas referências na literatura sobre o boro. Os teores de carbono, níquel, cromo e molibdênio espe-
uso de aços ULCB em aplicações navais militares, típicas da cificados na norma MIL-S-16216 são determinados em função
família HY, mas apenas desenvolvimentos em escala laborato- da espessura do material. Apesar da atual restrição ao uso de
rial e aplicações em tubos de grande diâmetro para a indústria elementos de microliga nos aços da família HY, estão sendo
petrolífera [Garcia, 1991]. desenvolvidos estudos sobre a adição de titânio a esses ma-
Esses novos aços possuem melhor soldabilidade, pres- teriais. Esse elemento de liga forma uma dispersão fina de pre-
cindindo do pré-aquecimento que se faz necessário nas ligas cipitados de TiN que reduz a temperabilidade da zona termica-
da família HY. Isto pode levar a reduções no custo das estrutu- mente afetada e, conseqüentemente, a magnitude dos picos
ras soldadas da ordem de 800 a 1.800 dólares por tonelada de de dureza nela observados. Desse modo, objetiva-se reduzir o
peso do componente [Montemarano, 15]. grau de pré-aquecimento que é requerido antes da soldagem
do material, a exemplo do que ocorre com os aços ao C-Mn e
de baixa liga e alta resistência (BLAR), que contêm titânio
3. Projeto metalúrgico dos aços [Phillips, 1988].
HY-80, HSLA-80 e ULCB Já o projeto metalúrgico do aço HSLA-80 é praticamente
As composições químicas e propriedades mecânicas tí- idêntico ao da liga ASTM A710 a qual, por sua vez, foi deriva-

Tabela 1 - Composições químicas típicas dos aços HY-80, HSLA-80 e ULCB [Nakasuji, 1980].

C Mn P S Si Ni Cr Mo Nb Ti Cu B

≤ 0,55 ≤ ≤ ≤ 2,75 1,35 0,30


HY-80 - - - -
0,20 0,75 0,014 0,008 0,5 3,25 1,6 0,60

≤ 0,40 ≤ ≤ ≤ 0,70 0,60 0,15 ≥ 1,00


HSLA-80 - -
0,07 0,70 0,025 0,025 0,40 1,00 0,90 0,25 0,02 1,30

ULCB 0,02 1,95 0,022 0,003 0,26 0,38 - 0,31 0,04 0,019 - 0,001

Tabela 2 - Propriedades mecânicas típicas dos aços HY-80, HSLA-80 e ULCB [Nakasuji, 1980]. Legendas: h = espessura; LE = limite
de escoamento; LR = limite de resistência; RE = razão elástica; RI = resistência ao impacto.

h LE LR RE AT RI Charpy
[mm] [MPa] [MPa] [%] [%] [J]
550 ≥ ≥
HY-80 > 19,05 * *
690 20 81 a -18°C
8,1 ≥ ≥ ≥ ≥
HSLA-80 -
19,0 550 655 20 20 a -45°C

ULCB 20 653 732 89 33 178 a -20°C

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da dos chamados aços IN787 ou NiCu- Analogamente ao que ocorreu com importante nos aços ULCB, pois aumen-
Age, desenvolvidos pela International os aços da família HSLA-80, o que se ta simultaneamente a resistência mecâ-
Nickel Corporation [Wilson, 1988]. Esse objetivou no desenvolvimento das ligas nica e a tenacidade através do refino de
material foi especificamente desenvolvi- ULCB foi conseguir resistência mecâni- grão. Nessas ligas com teor extra-baixo
do para uso em oleodutos e gasodutos a ca através de mecanismos de endureci- de carbono, há um significativo teor de
serem construídos nas regiões árticas. mento os mais independentes possíveis nióbio em solução sólida, mesmo quan-
Sua principal característica é a capacida- do teor de carbono do material. É ampla- do o reaquecimento for efetuado sob
de de endurecimento pela precipitação mente conhecida a excelente combina- temperaturas relativamente baixas como,
ção de tenacidade e resistência mecâni- por exemplo, 1000°C. Além disso, ele
de e-Cu que ocorre a partir da ferrita su-
ca apresentada pelos aços bainíticos aumenta significativamente a tempera-
persaturada, entre 480 e 705°C. O níquel
com baixo teor de C. A principal razão bilidade do aço quando solubilizado,
é adicionado em teores acima de 0,7%
para este fato está no fato de que uma quer isoladamente, quer em combinação
com o objetivo de se evitar os proble-
concentração extremamente baixa de car- com o boro. Garante-se, desse modo, o
mas de fragilidade a quente normalmen- desenvolvimento da estrutura bainítica,
te associados à presença do cobre nos bono, entre 0,01 e 0,03%, pode reduzir
ou eliminar a formação de cementita en- através de um forte efeito sinérgico
aços. Além disso, aumenta dramatica- [Nakasuji, 1980].
mente a temperabilidade da liga, promo- tre placas na matriz de ferrita bainítica
[Niikura, 1984]. O boro é uma adição in-
vendo ainda maior tenacidade. O cromo
e molibdênio são incorporados à liga
dispensável quando se deseja obter 4. Papel do tratamento
estrutura plenamente bainítica em ligas
para se retardar a precipitação dos com-
com teor extra-baixo de carbono. Por
termomecânico nos
postos a base de cobre durante o resfri- novos aços
outro lado, esse elemento apresenta afi-
amento a partir do campo austenítico,
nidade muito grande com o nitrogênio. O uso de laminação controlada é
permitindo sua produção industrial de
Logo, o efeito proporcionado pelo boro fundamental para que os aços HSLA-80
forma consistente. Esses elementos tam-
somente ficará garantido se o nitrogênio e ULCB venham a apresentar as caracte-
bém são fundamentais na definição da
estiver previamente fixado através de sua rísticas desejadas de resistência mecâ-
cinética de transformação desses aços. combinação com um outro elemento de nica e tenacidade. Como se sabe, esse
O nióbio é utilizado para se refinar o liga com o qual apresenta maior afinida- processo termomecânico é iniciado pelo
grão durante a laminação a quente e de. Normalmente se utiliza titânio com reaquecimento das placas sob alta tem-
nas fases de austenitização dos trata- esse objetivo. O nióbio é um elemento peratura, geralmente acima de 1150°C, de
mentos térmicos subseqüentes (caso das
Classes 2 e 3). Proporciona ainda algum
endurecimento por precipitação no en-
velhecimento.
O aço HSLA-80 na condição como
laminado, temperado ou normalizado
apresenta dureza relativamente baixa,
boa ductilidade e tenacidade moderada.
Às vezes, a conformação a frio nestes
estágios pode apresentar algumas van-
tagens, pois são requeridos menores
valores de carga para se efetuar a con-
formação das peças em prensas. Além
disso, o tratamento de envelhecimento
contribui para a redução dos efeitos de-
letérios que a seqüência deformação a
frio mais envelhecimento sob tempera-
tura ambiente poderia ter sobre a tenaci-
dade do material. Sua execução após a
soldagem pode servir como um tratamen-
to térmico para alívio de tensões, o que
pode eventualmente contribuir para a
redução do custo total da fabricação do
Figura 2 - Esquema da laminação controlada empregado no processamento de aços
componente. HSLA-80 e ULCB [Wilson, 1988].

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forma a permitir plena solubilização dos sua espessura durante a laminação tor- ção cristalográfica. A deformação na re-
carbonitretos de nióbio. Essa etapa é nam difícil a obtenção de microestrutu- gião de não-recristalização da austenita
seguida de uma etapa de deformação a ras homogêneas no esboço. Isto se re- permite reduzir o tamanho desses paco-
alta temperatura, onde ocorre recristali- flete de forma negativa na tenacidade do tes, elevando a tenacidade das chapas
zação plena da austenita. Após o esbo- material. grossas. Contudo, foi constatado que a
ço ter atingido uma determinada espes- deformação a quente não acarretou alte-
Outro aspecto a ser considerado é
sura a laminação se interrompe, seguin- ração significativa na temperatura de iní-
a resposta da austenita microligada ao
do-se um período de espera até que o cio da transformação bainítica (Bs) [Gar-
nióbio, vanádio e titânio ao tratamento
material atinja a temperatura onde a aus- cia ,1991, Yamamoto, 1995, Banerjee,
termomecânico. Ela é função dos seguin-
tenita não mais se recristalizará entre 2001, Cizek, 2002].
tes fatores [Garcia, 1991]:
passes. Dá-se, então, a etapa final de de-
Um estudo efetuado sobre o efeito
formação, onde a ausência de recristali- • Relação entre a temperatura de reaque-
da laminação controlada sobre as pro-
zação na austenita provocará o “panque- cimento de placas efetivamente utili-
priedades mecânicas de um aço HSLA-
camento” de seus grãos e, dessa forma, zada e a temperatura a partir da qual
um intensificado refino de grão, o qual 80 e ULCB revelou que o grau total de
começam a aparecer grãos grosseiros
eleva simultaneamente a resistência me- deformação a quente aplicado ao materi-
(Tcga) no material.
cânica e tenacidade do material. A Figu- al influenciou decisivamente todas as
• Relação entre as temperaturas de la- suas propriedades mecânicas, com ex-
ra 2 mostra um esquema gráfico desse
minação e Tnr. ceção de sua ductilidade e, no caso do
processo.
aço ULCB, da razão elástica. A tempera-
• Relação entre a taxa de resfriamento
No caso dos aços ULCB - e, até em tura de reaquecimento influenciou ape-
certo grau, da família HSLA-80 - deve-se após a laminação e o diagrama TRC
nas o limite de resistência de ambos os
considerar que o atual conhecimento do material.
materiais. Já a temperatura de acabamento
sobre os princípios e práticas da lamina- Todas as temperaturas críticas da afetou significativamente apenas sua
ção controlada não é inteiramente ade- austenita microligada (Tcga, Tnr, Ar3, Bs) tenacidade [Gorni, 2001].
quado. De fato, esta tecnologia foi exaus- são fortemente influenciadas pelo tipo e
tivamente estudada no caso de aços de estado dos elementos de microliga pre-
Baixa Liga e Alta Resistência (BLAR) sentes. O alto teor de elementos substi- 5. Vantagens
para tubos petrolíferos (oleodutos e ga- tucionais presentes nos aços HSLA-80 decorrentes do uso
sodutos), cujo projeto de liga é ligeira- e ULCB certamente altera de forma sig-
mente diferente do utilizado nas famílias
das ligas alternativas
nificativa tais temperaturas. Por exemplo,
HSLA-80 e ULCB. Em primeiro lugar, as elementos como manganês e molibdênio A substituição do aço HY-80 pelo
composições químicas dos aços BLAR elevam a solubilidade do Nb(C,N) na HSLA-80 já é uma realidade nos estalei-
convencionais são mais simples. Além austenita, o que tenderia a abaixar essas ros militares norte-americanos, onde esse
disso, a espessura do produto final é re- temperaturas críticas. Esse fato deve ser novo material já foi utilizado na constru-
lativamente fina, entre 12 a 18 mm, en- levado em conta ao se dimensionar os ção de vasos de guerra, com exceção de
quanto que chapas para uso em vasos parâmetros de processo da laminação submarinos [Montemarano, 1986].
de guerra apresentam espessura típica controlada [Garcia, 1991]. A própria produção do aço HSLA-
de 25 mm.
Outro aspecto a ser considerado no 80 é mais econômica do que a do HY-80,
O principal fator que diferencia os caso específico dos aços ULCB é o efei- em função do menor teor de elementos
aços BLAR convencionais dos ULCB é to da deformação a quente sobre a trans- de liga e tratamento térmico mais sim-
o maior teor de elementos de liga substi- formação da austenita. A princípio esse ples. Contudo, o potencial de economia
tucionais deste último, o que leva a duas efeito consiste na aceleração da trans- que pode ser conseguido é ainda maior
alterações metalúrgicas básicas: modifi- formação bainítica durante o resfriamen- quando se considera a redução de cus-
cações nas relações que governam a to posterior, com aumento na temperatu- tos que ocorre na fabricação do compo-
solubilidade do Nb(C,N) na austenita e ra de início de formação da bainita (Bs). nente a partir da chapa grossa. Eis abai-
níveis anormais de arraste por soluto, o Esse efeito redutor na temperabilidade é xo algumas das vantagens mais impor-
que restringe a movimentação dos de- aumentado pela precipitação de Nb(CN) tantes:
feitos cristalinos [Garcia, 1991]. na austenita durante a laminação a quen- • Não há necessidade de se pré-aque-
A maior espessura dos produtos te, reduzindo o teor de nióbio solúvel cer as chapas antes de sua soldagem.
feitos em aço ULCB para uso em belona- por ocasião de sua transformação. Ou- • Requer-se menos habilidade por parte
ves dificulta sua laminação controlada. tro aspecto a ser considerado é o refino do soldador, o que permite o emprego
Sob tais condições, os elevados gradi- no tamanho dos pacotes bainíticos, ou de mão-de-obra menos qualificada,
entes de temperatura e grau de deforma- seja, dos agregados de ripas de ferrita reduzindo-se os custos ligados a pes-
ção que se desenvolvem ao longo de bainítica paralelas com a mesma orienta- soal.

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Antonio Augusto Gorni et al.
• Grande redução nos custos de inspe- conhecimento extensivo sobre suas ca- Transactions A, v. 33A, n.5, p. 1331-1349.
ção e reparo. racterísticas de tenacidade em condições 2002.
FUMIMARU, K. e outros. Extremely-low
• Supressão da necessidade de se reais de uso. O desenvolvimento do HY- Carbon Bainitic Steels for New Structural
perder tempo com a fixação e retirada 80 beneficiou-se largamente do clima de Steel Products. Revue de Metallurgie - CIT,
de dispositivos auxiliares para solda- paranóia decorrente da Guerra Fria na v. 97, n. 10, p. 1235-1244, 2000.
década de 1950, o que facilitou a execu- GARCIA, C. I. e outros. Ultra-low carbon
gem. bainitic plate steels: processing,
ção de projetos de pesquisa sobre esse
• Pode-se dispensar a limpeza da super- microstructure and properties. Iron &
material e agilizou sua aplicação real. Já Steelmaker, v. 18, n. 10, p. 97-106, 1991.
fície dos cordões de solda antes de se
os aços HSLA-80 e ULCB foram conce- GORNI, A. A. Desenvolvimento de aços
depositar passes subseqüentes. alternativos aos materiais temperados e
bidos entre o final da década de 1980 e o
• Redução da qualidade requerida para início da década de 1990, quando o sur- revenidos com limite de resistência entre
a preparação da superfície. 600 e 800 MPa. Faculdade de Engenharia
preendente colapso do Império Soviéti- Mecânica da UNICAMP, Março de 2001.
Além disso, o material HSLA-80 co chegou a se fazer acreditar que a His- (Tese de Doutorado).
apresenta maior número de aplicações tória havia acabado. A motivação militar MONTEMARANO, T.W. e outros. High
economicamente viáveis que o HY-80. para o uso desses materiais praticamen- strength low alloy steels in naval
construction. Journal of Ship Production,
Outra vantagem é a possibilidade de te acabou. Contudo, à medida que a re- v. 2, n. 3, p. 145-162, 1986.
conformação e endireitamento com cha- sistência mecânica dos aços usados em NAKASUJI, H. e outros. Development of
ma, operações inviáveis quando se utili- tubos de grande diâmetro, estruturas controlled rolled ultra low carbon bainitic
za o HY-80. Finalmente, processos de para pontes e plataformas marítimas au- steel for large diameter linepipe. In: Alloys
soldagem com alta produtividade - como, for the Eighties. Climax Molybdenum
menta cada vez mais, sem dúvida surgi-
Company, Ann Arbor, p. 213-224, 1980.
por exemplo, o que utiliza alta freqüência rão oportunidades em número crescente NIIKURA, M. e outros. Características da
- podem ser utilizados na fabricação de para a aplicação desses modernos mate- transformação e propriedades mecânicas
peças simples em aço HSLA-80. riais. O emprego de resfriamento acele- em aço de extra-baixo carbono endurecíveis
rado após a laminação também poderá através de tranformação. Tetsu-to-Hagané,
Até o momento não há informações v. 70, n. 10, p. 1429-1436, 1984.
contribuir para um maior uso dessas li-
sobre aplicações reais onde ocorreu a (Tradução n° 1218 do Centro de
gas, uma vez que permite a redução em Informações Técnicas da Companhia
substituição do aço HY-80 pelo ULCB.
seu teor de elementos de liga e maximiza Siderúrgica Paulista - COSIPA).
Contudo, uma vez que a composição PHILLIPS, R. H. e outros. High Strength Plate
o endurecimento por precipitação na fer-
química desse último tipo de liga é até Steels for Defence Applications. In:
rita/bainita proporcionado pelo cobre e
mais simples que a do HSLA-80, pode- Microalloying ‘88. Chicago: American
elementos microligantes. Society for Metals, 1988, p. 235-247.
se supor que as mesmas vantagens aqui
descritas também se apliquem à substi- WILSON, A. D. e outros. Properties and
microstructures of copper precipitation
tuição do aço HY-80 pelo ULCB.
Referências aged plate steels. In: Microalloying ‘88.
Chicago: American Society for Metals,
Bibliográficas 1988, p. 259-275.
7. Conclusões BANERJEE, M.K. e outros. Effect of YAMAMOTO, S. e outros. Effects of the grain
thermomechanical processing on the size and deformation in the unrecrystallized
As novas ligas com resistência microstructure and properties of a low austenite region on bainite transformation
mecânica e tenacidade equivalentes às carbon copper bearing steel. ISIJ behavior and microstructure. ISIJ
do aço HY-80 já se encontram comercial- International, v. 41, n. 3, p. 257-261. 2001. International, v. 35, n. 8, p. 1020-1026,
CIZEK, P. e outros. Effect of Composition 1995.
mente disponíveis, mas sua aplicação and austenite deformation on the
ainda é bastante restrita. Uma das razões transformation characteristics of low- Artigo recebido em 27/12/2002 e
para essa timidez certamente é a falta de carbon and ultralow-carbon microalloyed
steels. Metallurgical and Materials
aprovado em 17/12/2003.

REM: R. Esc. Minas, Ouro Preto, 56(4): 287-293, out. dez. 2003 293

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