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VENDAS LIGADAS
2019
Índice
Lista de abreviaturas.......................................................................................................3
Introdução........................................................................................................................4
Aprofundamento teórico.................................................................................................4
Análise do Acórdão.........................................................................................................7
Conclusão.......................................................................................................................12
Bibliografia.....................................................................................................................14
Lista de abreviaturas
Introdução
Este caso inicia-se com uma denúncia feita pela SUN Microsystems, em 1998,
que resultou na abertura oficiosa, pela Comissão, de um inquérito sobre a Microsoft.
Em 2004, o inquérito concluiu com duas acusações feitas à Microsoft,
designadamente a violação do artigo 82º CE (atual 102º TFUE) por ter cometido dois
abusos de posição dominante: (1) Recusa de fornecer informações relativas à
interoperabilidade e de autorizar a respetiva utilização, e (2) venda ligada do sistema
operativo Windows para PC clientes e do Windows Media Player.
Estes abusos foram punidos através da aplicação de uma coima de 497 196 204
euros, bem como através de medidas corretivas a ser tomadas dentro de certo prazo,
nomeadamente o fornecimento de uma versão do sistema operativo sem a
funcionalidade multimédia do Windows Media Player.
A Microsoft interpôs recurso, pedindo a anulação da decisão impugnada e a
anulação ou redução da coima. No entanto, em 24 de março de 2004, o Tribunal de
Primeira Instância voltou a confirmar a decisão da Comissão;
Coloca-se a questão de saber se há, de facto, uma violação do artigo 102º TFUE.
Aprofundamento teórico
(processo C-62/86) determina que se uma empresa tiver uma quota de mercado superior
a 50% será um indício de que está em posição dominante. Neste caso, a Microsoft tinha
uma quota de 98%, pelo que é considerada uma empresa super-dominante.
Quanto ao requisito do abuso de uma posição dominante, tal como referi antes, o
artigo 102º não proíbe a posição dominante em si, mas antes o abuso dessa posição 5. A
lei não define o conceito de abuso, estabelecendo apenas uma enumeração
exemplificativa no 102º TFUE, todavia a jurisprudência tem vindo a determinar o
conceito. O acórdão Continental Can (processo 6/72) adota um conceito lato,
abrangendo os abusos de exploração e os abusos de exclusão. Os abusos de exploração
são os abusos “em que a vantagem é auferida mediante o exercício de poder de mercado
sobre os clientes, fornecedores ou consumidores dos bens ou serviços da empresa
dominante”6. Os abusos de exclusão são aqueles que criam entraves na concorrência no
mercado. Sendo a Microsoft uma empresa dominante tem uma responsabilidade
especial, quando atua no mercado7. Neste caso, estamos perante um abuso de venda
ligada, que configura um abuso de exploração, uma vez que o consumidor é obrigado a
adquirir um produto (subordinado) através da aquisição de outro (subordinante), tendo
desta forma uma vantagem concorrencial. Este abuso será de exclusão, se desta forma
excluir os concorrentes no mercado do produto subordinado 8. Este tipo de venda é o
designado de “tying”, que se distingue da forma de “bundling”/ venda agrupada, em que
há uma venda unicamente em pacote, ou seja, o produto subordinado não é vendido em
separado, ao contrário do que se verifica no tying, ou quando há uma politica de preços
favorável com a venda conjunta9.
Por fim, tem de haver uma afetação do comércio entre os Estados-Membros,
bastando que a afetação do comércio seja possível, ou seja, potencial.
A venda ligada implica que uma empresa em posição dominante venda dois
produtos independentes em conjunto, sem dar possibilidade ao consumidor de os
adquirir de forma separada, eliminando, desta forma, a concorrência. A conexão de dois
mercados “pode resultar da sua articulação vertical, como o mercado de produção e o
mercado de distribuição de um determinado produto, ou da sua relação horizontal,
5
MOURA e SILVA, Miguel (2018) – Direito da Concorrência., Lisboa: AAFDL Editora, p. 874
6
MOURA e SILVA, Miguel (2018) – Direito da Concorrência., Lisboa: AAFDL Editora, p. 918
7
Acórdão Irish Sugar, processo T-228/97
8
MOURA e SILVA, Miguel (2018) – Direito da Concorrência., Lisboa: AAFDL Editora, p. 996
9
CALAIM LOURENÇO, Nuno (2013) - Nuno Calaim Lourenço – As vendas subordinadas e agrupadas
como estratégias de projeção de poder de mercado., Coimbra: Almedina, pp. 36-53
Análise do Acórdão
10
CALAIM LOURENÇO, Nuno (2013) - Nuno Calaim Lourenço – As vendas subordinadas e agrupadas
como estratégias de projeção de poder de mercado., Coimbra: Almedina, pp. 23
11
JONES, Alison e SUFRIN, Brenda (2014) – EU Competition Law – Text, Cases, and Materials, 5ª
edição, Oxford University Press, p. 271
12
MOURA e SILVA, Miguel (2018) – Direito da Concorrência., Lisboa: AAFDL Editora, p. 1000
13
HOVENKAMP, Herbert (2005) – Federal Antitrust Policy: The Law of Competition and Its Practice,
3ª edição, Thomson West, p.557
14
MOURA e SILVA, Miguel (2018) – Direito da Concorrência., Lisboa: AAFDL Editora, p. 1004
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uma presença equivalente nos PC clientes do mundo, sem ter que concorrer pelo mérito
com os outros produtos. Os restantes modos de distribuição dos leitores multimédia
diferentes da pré-instalação pelos fabricantes de equipamentos originais não
compensam a omnipresença do WMP, uma vez que não são tão eficazes, pois são
operações que por vezes fracassam, há uma tendência para pensar que o leitor integrado
funcionará melhor do que o descarregado e muitos trabalhadores nem sequer têm o
direito de descarregar softwares da internet. Em 3 meses o WMP obteve graças à venda
ligada com o sistema operativo, mais ou menos a mesma difusão que atingiu num ano
através de descargas. Os utilizadores que têm o WMP pré-instalado ficam, em geral,
menos inclinados a utilizar um leitor multimédia alternativo, se isto não fosse assim, os
consumidores seriam obrigados a escolher um entre os vários leitores que estão
disponíveis no mercado. Este comportamento desencoraja os fabricantes de
equipamentos originais de pré-instalarem leitores multimédia concorrentes nos PC
clientes que vendem, porque, por um lado, acrescentar um segundo leitor utiliza
capacidade do disco rígido e é pouco provável que os consumidores estejam dispostos a
pagar um preço mais elevado por um 2º programa análogo, e cria também um risco de
confusão para os utilizadores e um aumento de despesas da assistência aos clientes e dos
custos de experimentação. Para concluir, o Tribunal alega também que o RealPlayer
usufruía de uma vantagem comercial enquanto produto líder no mercado, pelo que se o
Microsoft não tivesse adotado este comportamento, a concorrência entre o RealPlayer e
o WMP teria sido determinada em função das qualidades intrínsecas dos dois produtos.
Para concluir, é necessário analisar a eventual existência de uma justificação
objetiva. Contrariamente ao que se verifica no 101º, o 102º não prevê a isenção da
proibição dos abusos de posição dominante com “fundamento no balanço económico”.
Todavia, a jurisprudência admite que os comportamentos não sejam considerados como
abusivos, se houver uma justificação objetiva. “A justificação objetiva surge assim
como um elemento de análise do preenchimento do tipo e não como uma causa de
exclusão da ilicitude”15. A Comissão, na comunicação sobre o artigo 102º16 veio dizer
que as empresas podem justificar situações aparentemente abusivas, invocando quer
necessidades objetivas, quer ganhos de eficiência. As necessidades objetivas consistem
em razões de saúde ou segurança, relacionadas com a natureza do produto em questão,
enquanto os ganhos de eficiência consistem em reduções de custo para os
15
MOURA e SILVA, Miguel (2018) – Direito da Concorrência., Lisboa: AAFDL Editora, p. 1141
16
Comunicação da Comissão, ponto 29 e 30
11
17
CALAIM LOURENÇO, Nuno (2013) - Nuno Calaim Lourenço – As vendas subordinadas e agrupadas
como estratégias de projeção de poder de mercado., Coimbra: Almedina, pp. 36-51
18
MOURA e SILVA, Miguel (2018) – Direito da Concorrência., Lisboa: AAFDL Editora, p. 1002
19
CALAIM LOURENÇO, Nuno (2013) - Nuno Calaim Lourenço – As vendas subordinadas e agrupadas
como estratégias de projeção de poder de mercado., Coimbra: Almedina, pp. 36
20
HOVENKAMP, Herbert (2005) – Federal Antitrust Policy: The Law of Competition and Its Practice,
3ª edição, Thomson West, p.558
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sem o WMP, ou, pelo menos, possam retirar esse leitor. A solução caberia pela oferta da
Microsoft de duas versões: uma com o WMP, outra sem.
Para que o comportamento da Microsoft seja justificado por ganhos de
eficiência, é necessário que o comportamento seja indispensável para concretizar
aqueles ganhos de eficiência, pois não há alternativas menos anticoncorrenciais do que
aquele que produza os mesmos ganhos. Os ganhos têm de compensar os eventuais
efeitos negativos sobre a concorrência, e o comportamento não pode eliminar uma
concorrência efetiva através da supressão de todas ou parte das fontes atuais ou
potenciais da concorrência21. No entanto, embora haja vantagens para os criadores de
software e os criadores de páginas internet, essas não compensam os efeitos
anticoncorrenciais produzidos pela venda ligada em causa. A Microsoft também não
demonstra que a integração do WMP no Windows gere ganhos de eficiência e, por
último, a Microsoft não fez prova de que a supressão do WMP causaria uma degradação
do sistema operativo. Até porque já existe o Windows XP Embedded que não inclui o
WMP e uma versão do Windows sem WMP, colocada no mercado, em cumprimento
das medidas corretivas. Ambas as versões são plenamente funcionais.
Sumariamente, o Tribunal concluiu então que a Microsoft utiliza o sistema
operativo Windows como canal de distribuição para garantir a si própria uma vantagem
concorrencial considerável no mercado dos leitores multimédia. Devido à venda ligada,
os concorrentes encontram-se, a priori, numa posição desvantajosa, mesmo que os seus
produtos tenham qualidades intrínsecas superiores às do WMP, não concorrendo, desta
forma, pelo mérito. E a venda ligada reforça os obstáculos ao acesso ao mercado dos
conteúdos e das aplicações e facilita o aparecimento desses obstáculos em benefício do
WMP.
A 17 de setembro de 2007, O Tribunal julgou improcedente o recurso, mantendo
a aplicação da coima de 497€ milhões e as medidas corretivas a ser tomadas. Além
disso, a Microsoft teve de pagar 80% das custas da Comissão. A 22 de outubro de 2007,
a Microsoft anunciou que não iria recorrer novamente.
Conclusão
21
Comunicação da Comissão, ponto 30
22
MOURA e SILVA, Miguel (2018) – Direito da Concorrência., Lisboa: AAFDL Editora, p. 1001
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Caso semelhante ocorreu nos anos setenta, quando a IBM começou a incorporar os
leitores de disquetes nos seus computadores. Uma vez que estas eram anteriormente
vendidas de forma separada, a IBM, tal como a Microsoft, foi objeto de queixa.
Aspeto importante e marcante neste é a contraposição feita entre as exigência do
direito europeu da concorrência e as necessidade de proteção dos direitos de
propriedade intelectual, nas áreas ligadas à informática e à internet.
Vivendo-se numa era, em que se valoriza a tecnologia e a inovação, há que
proteger as novas invenções e tecnologias. A Comissão, e o Tribunal, optaram por
comprimir os direitos de propriedade intelectual de uma empresa em posição
dominante, por entenderem que o grau de inovação derivado da compressão deverá ser
superior àquele que a empresa pode fornecer ao conjunto da economia – e, portanto, à
sociedade - no exercício dos seus direitos de propriedade intelectual23.
23
CRUZ VILAÇA, José Luis – “O caso Microsoft – Monopólio ou Inovação?”
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Bibliografia
Livros
- MOURA e SILVA, Miguel (2018) – Direito da Concorrência., Lisboa: AAFDL
Editora
- JONES, Alison e SUFRIN, Brenda (2014) – EU Competition Law – Text, Cases, and
Materials, 5ª edição, Oxford University Press
- JORDE, Thomas M. e TEECE, David J. (1992) – Antitrust, Innovation and
Competitiveness. Oxford University Press
- CALAIM LOURENÇO, Nuno (2013) - Nuno Calaim Lourenço – As vendas
subordinadas e agrupadas como estratégias de projeção de poder de mercado.,
Coimbra: Almedina
- HOVENKAMP, Herbert (2005) – Federal Antitrust Policy: The Law of Competition
and Its Practice, 3ª edição, Thomson West
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