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RIO DE JANEIRO
LIVR AR IA DE B. L. G A R N IE R
Rua (lo Ouvidor, G9.
1864

I

TYP. DE QUIRLN'O 6l IUMÃO


rua cia Asseinbléa, 54.

Í)''
A’

SEEMORIA

DE

Francisco Jose de Assis

Maria Leopoldina Machado de Assis


0 POETA E ü LIVUO,

Contjeróaçiia :prfüminar.

lía uez a n n o s ! . . . s i m ... dez an n os I ! . . .


Como resvala o tempo sobre a face da terra ? . .

Kramos sem pre cinco, — algum a vez sete-: ,


O m avioso rouxinol das Primaveras.
O rnellifluo cantor das Esperanças,
O inspirado autor das Tentativas,
O obscuro escriptor destas verdades.
O (juinto era um m e n in o ... uma verdadeira cre-
ança : não tinha n om e, e posto q ue hoje todos lh ’o
c o n h e ra m , não m e con vem a m im dizê-lo neste lu ­
gar, e tão cedo.
8

II.

P a g o 0 quotidiano tributo á existência m a t e r ia l;


satisfeitos os deveres de cada profissão, a palestra
litteraria nos reunia na faceira e trarrquilla salinha
do m eu escriptorio.
Alli, — horas inteiras,— alheios ás lutas do m u n ­
do, con chegados nos lugares e nas aíTeições, levitas
í .I do m esm o culto, filhos dos m esm os p aes— a p o ­
breza e 0 tra b a lh o ,— em derredor do aliar do nosso
t e m p l o — a m eza do e s tu d o ... fallavamos de Deos,
de am or, de s o n h o s ; conversavam os m usica,
pintura, poesia 1. . .
Alli d e p ú n h a m o s o fructo das locubraçòes da ves-
pera, e na singella festa das nossas cren(;as, novas
inspirações bebiam os para os trabalhos do seguinte
dia. Era um continuo deslisar de am eníssim os m o ­
mentos ; era um su ave fugir das m urm u rações dos
p r o f a n o s ; era emfim um dulcíssimo viver nas re­
giões da p h a n ta sia !. .. E foi esse o berço das Prima­
veras, das Tentativas, das Chrysalidas e das
Ephemeras, e foi d ’alli que irradiaram os nom es de
Easimiro de A b reu, do M acedinho, de Gonsalves
B raga, e com splendido fulgor o de M achado de
Assis I
A morte e o tempo derribaram o altar, e d is p e r­
saram os levitas. Do tem plo só resta o chào em q u e
se ergueu ; e dos amigos só ficaram d o u s .. . dous
para guardar, com o Vestaes severas, o fogo sagrado
das tradições d ’aquelles dias, e para resum ir no
profundo affecto que os liga, o laço q u e tào forle-
mente estreitava os cinco.
E no instante em que este livro ch egar ás m ãos
do primeiro leitor, as cam pas d e lle s,— d iz-m ’o o
c o ra ç ã o ,— se entreabrirão para receber o saud oso
suspiro dos irm ãos, e um raio sym pathico da a u ­
reola do poeta !

Éramos, pois, cinco. Liam os e recitavam os. D e ­


n unciavam os as novid ad es: zurziaraos as p ro fa n a ­
ções : confundiam os nossas licções : — segredava­
m os nossos amores 1
O quinto, — 0 m en in o,— d ep u n h a , co m o todos
nós, sua respectiva o f f renda. Balbuciando apenas
a litteratura,— ainda novo para os seus mysteriös.
1

10

ainda fraco para o soa peso, nem por isso lhe fal­
tava ousadia ; antes sobrava-lhe soílVeguidào de sa ­
b er, am biçào de louros. Era vivo, era trefego, era
trabalhador.
A prazia-m c de ler-lhe no olhar m ovei e ardente
a febre da imaginaoào ; na conslancia das p ro d u c -
ções a avidez do saber, e com binando no m eu espi­
rito estas observações com a naturalidade, o c o lo ­
rido e a luz de conhecim entos litterârios q u e clle,
— sem querer sem duvida, — derram ava em todos
os ensaios poéticos que nos lia, ded iq u ei-m e a estu-
da-lo de perto, e con venci-m e, em pouco tem po, de
q ue largos destinos lhe prometlia a musa da p o e ­
s ia ... E por isso q u a n d o , lida algum a c o m p o ­
sição do nosso jo v e n com panheiro, diziào os outros :
bons versos ! mas simplesmente — bom versos, —
eu nunca deixava de accrescentar, cheio do q u e
aíTirmava hello prenúncio de um grande poeta !

Correram os a n n o s ... e com o se a seiva dos ra ­


mos perdidos se houvesse concentrado no re n o vo
que ficára, o renovo cresceu, cresceu e vigorou I
11

A prophecia so fui Iodos os dias realisando de um


m od o brilhante.
H oje a criança é h o m e m ; — o aprendiz jornalista
e poeta.
Nâo m e e n g a à iá ra ... A d iv i n h e i - o ! E se alguém
descobrir em rnim vaidade q u a n d o m e atlribuo p o ­
sitivamente 0 privilegio c a autoridade desta p ro ­
p h ecia, declaro desde já q ue a nào declino, q u e a
q u e ro para m im , q ue a nào cedo a n in g u é m ,
p o r q u e . . . porque delia me prézo, p orq u e delia m e
org u lh o , porque o prophetizado é M achado de A s­
s i s ,— o bardo de C o rin a ,— o poeta das Chrysàlidas!

Até a q u i o am igo : agora, leitor I o critico.


Eu disse :— o poeta das Chrysalidas.
Poeta é 0 autor : Chrysalidas é o livro.
Chrysalidas c p o e ta ... dous lindos n o m e s ... dous
n om es s o n o r o s ... mas um delles falso !
Como serpe entre rosas, — no meio de tanta
consonância deslisou-so uma contradicçào,
Chrysalida é nyrn[)ha, é principio do transforma-
çâo, aurora de exislencia, sem ente de fo r m o su ra ...
e os versos de M achado de Assis sao g em m a s scintil­
lantes, vida esp alm ad a, flores e sorrisos. Na m orta­
lha inform e e incolor do casulo a graça está em pro­
b lem a, 0 m ovim en to em risco : os versos de M a­
ch ad o de Assis só guardaram de nymphàQ belleza
e 0 dom da aeredade ! São fulgidas borboletas que
adejâo sobre todas as flores d ’alm a, revelando a
q u e m as contem pla a perfeição da creatura e o g ê ­
nio do creador. Não são, pois, chrysalidas ; se o
fo ssem não seria o autor poeta, e M achado de A s­
sis, leitor, é poeta!
‘‘t'I1■ F alla-vos o coração de q u e m vo-lo diz ? Não :
protesta unicam ente a consciência, e ju ro -o por m i ­
n ha íé de h o m em de lettras !

V I.

A que eschola pertence o autor deste livro ?


A ’ mystica de Lam artine, á sceptica de B yron , á
philosophica do H u g o , á sensualista de Ovidio, á
patriótica de M ickiewicz, á americana de Gonsalves
Dias ? A n en h u m a .
Qual 0 systcm a melrico q u e adoptou ? N e n h u m .
Q ual a m usa q u e lhe preside á s c r e a ç õ e s ? . . A
m ythologica de H o m ero , a m ixla de C am ões, a ca-
tholica do Dante, a libertina de P a r n y ? N e n h u m a .
A eschola de M achado de Assis é o sentimento ;
— seu system a a inspiraçào : sua m usa a liberdade.
Triplice liberdade: liberdade na concepção ; lib e r ­
dade na forma ; liberdade na ro u p a g em . Triplice
vantagem : — originalidade, naturalidade, varie­
dade 1
Sua alma é um cadinho onde se apurão eííluvios
derram ados pela n aturezar P rod u z versos com o a
harpa Eólia produsia sons : — canta e suspira com o
a garganta do valle em noites de verão ; pinta e d e s­
creve, com o a face espelhada da lagoa o Céu dos
nossos sertões. E não lhe pergunteis p orque : não
sabería responder-vos. Se insistisseis... paro-
diar-vos-hia a epigrafe da sua — Sinheí — , o v e r­
sículo do Cântico dos Cânticos, c no tom da maior
ingenuidade, dir-vos-hia : — cs, minha poesia,,, é
como 0 oleo derramado !
E com VazãOc. por que M achado de Assis é a
lyra, a natureza o plectro. E da amphora de sua
^ ‘■ 'í
aima elle m esm o ignora quando Irasbordão as got-
tas perfum adas !

h
«if
Ü i Eis aqui, pois, com o M achado de Assis é poeta.
Um Deus b e n ig n o ,— o m esm o que lhe deu p or
palria este solo sem ig u a l,— d e u -lh e tam b ém o c o n ­
dão de refleclir a pom posa natureza que o rodeia.
F ez m a i s .... medio por ella esse con dão.
- Se tivera nascido á som bra do polo, entre os gelog
11 do norte, seus cânticos pallidos e frios traduzirião cm
silvos os extases do poetã ;— mas filho deste n o v o
E den , cercado de infinitas m aravilhas, as notas
q u e elle d esp ren de são afinadas pelas grandiosas h a r ­
h
'1 - m on ias que proclam ão.
E ’ assim duas vezes instnimento.., e nesta doce
i
correspondência entre a creatura e o creador, a Musa
aleSf 0 sagrado m ensageiro q u e u ne a terra e o Céo
m‘ é . . . a in s p ira ç ã o !... E ’ ella que ferve, e derram a da
am phora o oleo perfum ado. E ’ ella que marca o c o m ­
passo ao rythm o, e a eschola ao trovador. E ’ ella que
tk
w lhe d iz : canta, chora, am a, s o r r i. , .. E ’* ella emfim
m q u e lhe segreda o ihem a da canção, e caprichosa, ora

m.

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15

chama-so luz, m el, arom a, graça, virtude, fo rm o su ­


ra, ora se cha.nia Stella, Visào, Erro, Sinhá, Corinna !

Livres, sentidos, inspirados, os versos do autor das


Chrysalidas são c devem ser eloquentes, h a rm o n io ­
sos c exactos. S a o — porque n in g u ém se negard a d i ­
ze-lo lendo-os. D evem s e r— p orqu e o sentimento o a
inpirôção constituem a verdadeira fonte de toda a
eloqucricia c de toda a harm onia no m undo moral, e
porque a exactidao é o mais legitimo frueto do c o n ­
sorcio destas duas con dições.
E ’ um erro attribuir exclusivam ente á arte a l'ôa
m edição do verso. E ’ erro igual ao do que recusa ao
ignorante de m usica, ao dilettanti, a possibilidade dc
cantar com justeza e ex p ressão . E m verso mal m e ­
did o é um verso dissonante ; é um verso que destaca
d ’entre sous com panheiros com o a nota desafinada
resalta da torrente de uma escala. iN’ um e n ’outro
caso a intelligcncia atilada pelo gosto, e o ouvido
apurado pela liccâo— arrancão sem soccorro da arte
0 joio que nascera no meio do trigo, e em bora a ella
■ ^r^maaaBCius^.-
ïr :

16 ti

recorrâo para a perfeição da nova planta, nem por


isso deixa esta de p assar-lhes pela joeira.

ÎX .
U

Para O poêla de sentimento a inspiração brota das


bellezas da natureza, com o so elevào os vapores da
superfície da terra ; m ais do v a lle d o q u e da m on ta­
nha ; mais d ’a q u i d o que d ’alli. A natureza tam b ém
tem altos e baixos para inspiração. O crepúsculo, e
m esm o o diluculo, é m ais inspirativo q u e a luz m e ­
ridiana : — 0 m agestoso silencio da floresta mais do
que 0 frenetico bulinio da cidade o vagido mais
do que a s c a n s .
A poesia que traduz a inspiração, e o verso que
pliolographa a poesia devem portanto ressenlir-se
destas diiïerenças. Porisso não ha livro de bom poeta
q u e não com p rove esta verdade. Não é o talento qqp
afrouxa ou dorm e com o H om ero : c a inspiração que
varia. Nas m enos inspiradas subsiste ainda o enge­
n h o , e 0 en g en h o é m uito.
No livro que vam os folhear, talvez ju lgu eis c o m -
m igo que poucas com posições se aproxim ão da altura
17

í^m que o poeta collocou a Yisio e os alexan drin os


a Corinna. Com o nàn havia de ser assim ? M a ­
chado de Assis reflpxtio a natureza, e a natureza
só creou um a Corinna !

X.

Entre a poesia— a r í e — e a p oesia— s m í t m e n -


/.o,— dá-se, sobre muitas, uma grand e differença : —
a eriidiçào.
Com o 0 arrebique q u e, occultando os vestigios do
tem po revela na face remoçada o poder do artista,
mas nunca a m o c id a d e ,— a erudição derram a sobre
os cantos da lyra u m verdadeiro fluido galvaniza-
dor. A ch lam yd e romana em que se envolve o poeta
lhe dissim ula— o vacuo do coracão, e o coth u rn o
grego, que por suado esforço conseguio calçar, lhe
tolhe, apezar de elegante e rico, a naturalidade d o s
m ovim en tos.
Com demasia de vestidos não é\ possível correr
b e m . . . . e a poesia deve correr, correr n atu ra lm en tí
com o a infancia, com o o a rr o io , com o a b r iz a , e até
m esm o com o o tufão e com o a lava I
m Sm I

Èí: :

18
I
0 lu xo exagerado da roupagem denotava ante a
sabedoria antiga— leviandade do ju izo : antena critic
ca m oderna ainda denota na poesia penúria de plian-
tasia. A simplicidade dos m odelos G regos e H ebrai.
COS, que nos legou a litteratura dos primeiros tempos
desde entào proscreveu para o bom gosto, a preteii-
ciosa licçào dos porticos. A facundia acadêm ica s e m ­
pre em m u d eceu e atemorisou as almas ingênuas, e
nas doces e x p a n ç õ e s destas, e nào nas doutas prelec-
ções d ’aquella, colhe a poesia os seus m elhores
lhesouros. e os seus mais caros triumplios.
No gen ero de poesia das ChrysalidaSj (unico
sem d u v i d a 'd e que fallo a q u i,) é tào evidente esta
verdade, tào clara a primazia conferida pelo gosto
iiltorario ao im proviso sobre a arte, ao sentimento
sobre a erudição que basta record ar quaes os n om es
dos poetas brasileiros ou lusos, que, no meio de
tantas e tão variadas publicações, se tornaram e p e r­
m an ecem ex clu siv am en te populares. E para q ue
não vos falte, leitor, um exem p lo de notoria acluali-
d a d e co m p a ra e T h o m a z R ibeiro a T h e o p b y lo B ra g a,
0 disei-me— se o brilhante talento do segundo poderd
jam ais disputar a palma da poesia á divina singeleza
do prim eiro.
19

Machado de Assis é o nosso T h o m a z R ib eiro,


mais inspirados, e talvez mais ardente ; e com o alem
de poeta é jornalista guarda a erudioào para o j o r ­
n a l... digo m a l: n à o g u a r d a . . . O cantor de Corinna
quando escreve versos nào levanta a penna do
papel, e por isso a historia nunca depara lugar entre
0 b ioco de uma e a superfície do outro.

S eja, porém , qual for vossa opiniào sobre tudo


quanto acabo de conversar com vosco : seja qual for
vosso ju izo sobre o modo porque rcco m m en d ei o
livro c 0 auctor, n egai-m e em bora vosso assenli* r. I
m en to, m a s con cedei-m e dou s únicos direitos, O
primeiro é o de fazer-vos crer q u e estas paginas nào
sào m ais do que a dupla e sincera manifestação dos
sentimentos do am igo e do critico. O segundo é o de
asseverar-vos, ainda uma vez, q ue o livro que ides
percorrer é flor mimosa de nossa litteratura e que o
jioeta hade s e r , — sem duvida a lg u m a ,— uma das
glorias litterarias deste grande Tmperio.
Na esplendida crusada do futuro, sào as Chrysa-
MUSA CONSOLATRIX.

Q ue a mao do tempo e o halito dos h om ens


M urchem a ílor das illusões da v id a,
Musa consoladora,
K no teu seio am igo e socegado
Quo 0 poeta respira o suave som no

Nao ha, nao ha comtigo,


Nem dor aguda, nem som brios erm os ;
Da lua voz os nam orados cantos
E nchem , povoam tudo
De intima paz, de vida e de conforto.
90

A n te esta voz que as dores adorm ece, '


E m uda o agudo espinho em ílor cheirosa,
Q ue vales tu, desillusão dos h o m e n s ?
T u que pódes, ó tem po ?
A alma triste do poeta sobrenada
A ’ en chen te das angustias ;
E , aíTrontando o rugido da torm enta,
■ î^. Passa cantando, alcyono d iv in a .
î
f »
Musa con so lad o ra ,
Q u an d o da m inha fronte dc m an ceb o
A ultima illusao cahir, bem com o
if', Eolha amarella e secea
)' Que ao chão atira a viração do outono,
?l'
Ah 1 no teu seio am igo
A colhe-m e, — c terá m inha alrna alilicta.
Em vez de algum as illusões que teve,
A paz, 0 ultimo b om , ultimo e puro !

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STELLA

( 1802. )

Ouvre ton aile et pars.,..


Tii. G a u t h i e r .

Jij raro e mais escasso


A noite arrasta o m anto,
E verte o ultimo pranto
Por todo 0 vasto espaço.

Tibio clarao já cora


A téla do horisonte,
E já de sobre o monte
Y e m debruçar-se a au rora.
t» «■•.1

= 24 :=:

A ’ rnucla e lorva irm â,


D orm ida de cansaço,
iii :i
Lá vem tomar o espaço
A virgem da m an ha.

Uma por u m a, vao


As pallidas eslrellas,
E vào, e vào com ellas
“i T e u s sonhos, coraçào.
Í- »

Mas tu, q u e o d e v a n e io
inspiras do poeto,
INào vês q ue a vaga inquieta
■-a?-- Abrc-te o h ú m id o seio ?

Vai. R adioso e ardente,


Em b re v e o astro do dia.
■ :rs
R o m p e n d o a nevoa fria.
V i r a d o roxo oriente.

Dos Íntimos sonhares
Q ue a noite protegera,
De tanto que eu vertera
Em lagrim as a pares,

m
Do am or silencioso,
M yslico, d o ce, p u r o ,
Dos sonh os de futuro,
Da p az, do e lh ere o gozo.

D e tudo nos desperta


L u z de im portuno dia ;
Do a m o r q u e tanto a enchia
Minha alma está deserta.

A virgem da m a n h ã
Já todo 0 céu d o m in a . . . .
E spero-te, divin a.
E spero-te, am an h ã.
LUCIA.

(ALF. DK MUSSET.— 1 8 6 0 .)

Nos estavarnus sus ; era de noite ;


Ella curvára a fronle, e a mào formosa,
Na em b riagu ez da scisma,
T e n u e deixava errar sobre o teclado ;
Era um m urm urio ; parecia a nota
De aura longinqua a resvalar nas balsas
E temendo accordar a ave no b o sq u e ;
Em torno respiravam as boninas !,<v*l
Das noites bellas as volúpias m ornas ;
Do p arque os castanheiros e os carvalhos
Brando em balavam orvalhados ramos ;
Ouvíam os a n o i t e ; en tre-fech ada,
A rasgada janella
Deixava entrar da prim avera o s b a l s a m o s ;
A varzea estava erm a e o vento m udo ;
Na em b riag u ez da scisma a sós estavam os,
E tínham os quinze annos 1

f Lucia era loura e pallida ;


N unca o mais puro azul de um céu profundo
E m olhos m ais suaves reflectiu-se.
Eu m e perdia na belleza d e lia ,
i
i. E aquelle am or com q u e eu a a m a va— e tanto !
Era assim de u m irmào o aííecto casto.
I
Tanto pudor nessa creatura havia 1

Nem um som despertava em nossos lábios;


u Ella deixou as suas m àos nas minhas ;
Tibia som bra d o rm ia-lh e na fronte,
wi
E a cada m o v im en to — na m in h ’ alma
I E u sentia, m eu Deus, com o fascinam
rmi Os dous signos de paz e de ventura:
Mocidade da fronte
iV E prim avera d ’ alma.
A lua levantada em céu sem n u ven s

:
Com um a onda de luz veio in u n d al-a ;
Ella viu sua im a g em nos m eu s olhos,
Um riso de anjo desfolhou nos lábios
E m u r m u r o u u m can to.

Filha da dor, ó languida h arm on ia i


Lingua q u e o genio para am or creára —
E q u e , herdada do c é u , nos deu a Italia I
L in gu a d o c o r a ç a o — on d e alva idea, m
— V irgem m edrosa da mais leve s o m b r a ,—
Passa envolta n ’ um véu e occulta aos olhos 1
Q ue ouvirá, q u e dirá nos teus suspiros
Nascidos do ar, que elle respira — o infante ?
V é - s e um olh ar, u m a lagrim a na face,
O resto é u m m ysterio ignoto ás turbas,
Com o 0 do m ar, da noite e das florestas l

Estavam os a sós e pensativos.


Eu contem plava-a. Da canção saudosa
Com o q u e em nós estremecia um éco.
Ella cu rv o u a languida c a b e ç a .. . .
P o b re criança 1 — no teu seio acaso
Desdem ona g e m i a ? T u choravas,
Mi

w
i i ■

feh
:=2 30 ^

»
E em tua boca consenlias triste
Q ue eu depuzessc estremecido beijo ;
f'
G uardou-a a tua dur ciosa e m uda :
Assim, beijei-te descorada e fria,
m Assim, depois tu resvallasteá cam pa ;
Foi, com o a vida, tua m orte um riso,
E a Deus voltaste no calor do berço.
«

Doces m ysteriös do singelo teclo


O nde a inriocencia habita ;
Cantos, sonhos d ’am o r, gozos de infante,
E tu, fascinação doce o invencivel,
Que á porta já de M argarida,— o Fausto
Fez hesitar ainda.
Candura santa dos primeiros annos,
O nde paracs agora ?
Paz á tua alm a, pallida m enina 1
Erm o de vida, o piano em que locavas
dá não accordará sob os teus dedos !
Ü DILÚVIO.
( 1 8 G3 ).

1'^ caljio a cliiiva sobre a terra


(piarenta dias e quarenta noites.
G e n e s i s — C , V I I V. 1 2 .
i
’•tj

Do sol ao raio osplondido,


Fecundo, abençoado,
A terra cxhausla e linmída
S u rg e, revive já ;
Que a morte inteira o rapida
Dos filhos do peceado
Poz termo á immensa cólera
Do immenso Jeh ovah I
nf

ËV’‘v'¥.
32

Que m ar nào foi 1 que tumidas


As aguas não rolavam 1
Montanhas e planícies
T u d o tornou-se um m ar ;
E nesta scena lu g u b re
Os gritos q ue soavam
Era u m clam or unisono
Q ue a terra ia acabar.
S
E m vão, ó pae atonito,
Ao seio 0 filho estreitas ;
Filh os, esposos, míseros,
Em vão tenlaes fugir 1
Que as aguas do dilúvio
Crescidas e refeitas.
Vão da planície aos píncaros
Su b ir, subir, subir !

S ó , com o a idea unica


Do um m u n d o que se acaba.
mvU Erm a, boiava intrépida,
A arca de Noé ;
['A.
Pura das velhas nodoas
•De tudo 0 que desaba.

.1
L ev a no seio incólum es
A virgindade e a fë.

Lá vae ! Q ue um vento aligero.


Entre os contrários ventos,
Ao lenho calm o e im pávido
A bre cam in h o a l e m ...
Lá vae ! Em torno angustias,
C lam ores o lam entos ;
Dentro a esperança, os cânticos,
A calm a, a paz e o b e m .

Cheio de am o r, solicito,
O olhar da divindade,
Véla os escapos naufrages
Da im m ensa alluviào.
Assim, por sobre o tum ulo
Da extincta hu m an id ad e
S a lva -se um b erço : o vin culo
Da nova creaçào.

íris, da paz o nuncio,


O n un cio do concerto.
Riso do Eterno em jú b ilo .
Nuvens do céu rasgou ;
E a pom ba, a pomba m yslica,
fi 1 Voltando ao lenho aberto,
Do arbusto da planície
Um ramo d e s p e n c o u .
rrâ %
.

Ao sol e ás brisas tépidas


Respira a terra um bausto,
Vicam de novo as arvores,
Brota de n o v o a ílor ;
E ao som do✓ nossos cânticos,
Ao fumo do holocausto
»• Desapparece a cólera
Do rosto do S en h o r.

=! f ♦ '
hl

)■ 1

VISIO.

(1804).

Eras pallida. E os cabellos,


A ereos, soltos novellos,
So bre as espaduas c a h ia m .,.
Os olhos meio-cerrados
De volupia e de ternura
Entre lagrimas lu z ia m ...
E os braços entrelaçados,
dom o cingindo a ven tura,
Ao leu seio me cin g ia m ... Hl

Depois, naquelle delirio.


S u a v e, doce martyrio
Nr

1
B»’ •‘
36

t)e pouquíssim os instantes,


Os teus lábios sequiosos,
■ Frios, trêm ulos, trocavam
% Os beijos mais delirantes,
E no su p re m o dos gozos
Ante os anjos se c aza v am
Nossas almas palpitantes...

U. > D e p o is ... depois a verdade,


(
A fria realidade,
A solidão, a tristeza ;
I).
%■ D aq u elle sonho desperto,
V O lh e i... silencio de morte
} R e sp ira v a a n atu reza—
E ra a terra, era o deserto,
Fora-se o doce transporte,
í t R esta v a a fria certeza.
*
1
. ^

lll Desfizera-se a mentira :


T u d o aos m eus olhos fugira ;
T u e 0 teu olhar ardente,
Lábios trêmulos e frios,
lí O ab raço lon go e apertado,
* ■i
■?f O beijo doce e vehem cn te ;
^ ■' l

1,

5
: %
í

37 □□

R eslavam m eus desvários,


E 0 incessante cuidado,
E a phantasia doente.

E agora te vejo. E fria


T ào outra estás da q u e eu via
Naquelle sonho encantado 1
E ’s ou tra— calm a, discreta,
C om o olhar indifférente,
T ào outro do olhar sonhado, I
Que a m inha alma de poeta
Nào ve se a im agem presente*
Foi a visão do passado.

Foi, sim , m as visão apenas ;


Daquellas visões am enas ^
Q ue á m ente dos infelizes^
D escem vivas e animadas.
Cheias de luz e esperança
E de celestes matizes :
Mas, apenas dissipadas,
Fica.uma leve lem brança,
Nào ficam outras raizes.
íz : 38

Inda assim, em bora sonho,


Mas, sonho doce e risonho,
D ésse-m e Deus q u e fingida
Tivesse aquelia ventura
J-J-- il Noite por noite, hora a hora,
No que m e resta de vida,
Q ue, já livre da am argu ra,
Alm a, que em dores m e chora,
Chorára de agradecida !

h:

Li; f
iMueve-iue eníiii tu amor de tal manera
Que aimqne no hul)iera cielo yo te amr.ia.
Santa T iifriza de Jrsus.

As orações dos h om ens


S u b a m eteriiamente aos teus ouvidos ;
Elcrnam ente aos teus ouvidos soem
Os cânticos da terra.

No turvo mar da vida,


O n d e aos parceis do crime a alma naufraga,
A derradeira bússola nos seja,
S en h o r, tua palavra.
40
r-x t,
m A m elhor segurança
Da nossa intima paz, S en h o r, é esta ;
pi, Esta a luz que ha de abrir á estancia eterna
Ï Mil 0 fulgido cam inh o.

Ah 1 feliz 0 que pode,


No cx lrem o adeus ás cousas deste m un do,
Q uando a alma, despida de vaidade.
-.I Ve quanto vale a terra ;

Q uando das glorias frias


Q ue 0 tem po dá e o m esm o tempo som e. Íí
Despida já ,-— os olhos m oribundos
1,
Volta ás eternas glorias ; /i

Feliz 0 que nos lábios,


i : Sii No coração, na mente põe teu n om e,
E só por elle cuida entrar cantando
if
No seio do infinito.

'HM
: |i

^ ' ‘ .

#..i
J.■iS

. ti

A CARIDADE.

(iSfil.)

Ella linha no rosto uma expressão tào calma


Com o 0 som no innocente e prim eiro de urna aima
D onde não se afastou ainda o olhar de Deus ;
Uma serena.graça» uma graça dos césu, -
E ra-lhe o casto, o b rand o, o delicado andar ,
E nas azas da brisa iam -lhe a ondear
Sobre o gracioso collo as delicadas tranças.

L evava pola mão duas gentis creanças.

ía cam inho. A um lado ouve m agoado pranto.


Parou. E na anciodade ainda o m esm o encanto
Dcscia*lhe ás feições. P rocu rou . Na calçada
A ’ c h u v a , ao ar, ao sol, despida, abandonada
A infancia lacrim osa, a infancia desvalida.
Pedia leito e pào, am paro, amor, guarida.

E tu. ó Caridade, ó virgem do S en h o r,


No amoroso seio as creanças tomaste,
C e n tr e b e ijo s — só teu s— o pranto lhes seccaste
D ando-lhes leito e pào, guarida e am or.
A JOVEN CAPTIVA,
(ANDRK CHENIER. —1861.)

— « Respeita a fouce a espiga que desponta ;


Sem receio ao lagar o tenro pam pano
Bebe no estio as lagrimas da aurora ;
Joven e bella tam bém sou ; turvada
A hora presente de iníortunio e tedio
Seja em bora ; m orrer nào quero ainda !

De olhos seccos o estoico abrace a morte;


Eu choro e espero ; ao vendaval que ruge
Curvo e levanto a limida cabeca.

Se ha dias m áus, tam bém os ha felizes 1


Oue m el nào deixa um travo de desgosto ?
Que mar nào incha a um temporal desfeito ?
T u , f»3cun(la illusão, vives com igo.
Pesa cm vao sobre m im carcero escu ro ,
Eu lenho, eu tenho as azas da esperança
Escapa da prisào do algoz h u m a n o .
Nas campinas do céu, mais venturosa,
Mais viva canta e rom pe a philom ela.

Devo acaso m o rre r? T ranquilla d u rm o ,


Tranquilla velo ; e a fera do remorso
«i
Nào m e perturba na vigilia ou somno ;
T ern o affago m e ri nos olhos todos
Q uando appareço, e as frontes abatidas
Quasi reanima um desusado juhilo.

Desta hella jo rn a d a é longe o termo.


Mal com eço ; e dos olmos do cam inho
Passei apenas os [»rimeiros olm os.
No feslirn em com eço da exislencia
Üm s6 instante os labios meus tocaram
A laça em minhas m àos ainda cheia.

Na primavera estou, quero a colheita


Ver ainda, e hem como o rei dos astros,
De sazào em sazào findar meu anuo.
?

Viçosa, sobre a haste, honra das (lores,


Hei visto apenas da m an h a serena
R o m p e r a !uz, — quero acabar m eu dia.

Morte, tu podes esperar ; aíTasta-te 1


Vao consolar os que a vergo n h a, o m edo,
O desespero pallido devora.
Pales inda me guarda um verde abrigo,
I ífS
Osculos 0 am or, as m usas harm onias ;
AíTasla-te, m orrer nào q u ero ainda ! » ■—

Assim, triste e captiva, a m inha lyra


Despertou escutando a voz m agoada
De um a jo v e n captiva ; e sacudindo
O peso do m eus dias langorosos,
Aceom odei á branda lei do verso
Os accentos da linda e ingênua boca. *

Socios m eus de m eu carccre, estes cantos


Farão a q u em os 1er buscar solicito
Quem a captiva foi ; ria-lhe a graça
Na ingênua fronte, nas palavras meigas ;
De um termo á vida, ha de trem er, com o ella,
Q uem aos seus dias for casar seus dias.

«• f"
NO LIMIAR.

(1863.)

Cahia a larde. Do infeliz á porta,


Onde mofino arbusto aparecia
De tronco secco e de folhagem morta,

FAle q u e entrava e Ella que saliia


Tlm instante pararam ; um instante
Ella escutou o que Elle lhe dizia ;

—-« Que fizeste? Teu gesto insinuante


Q ue lhe ensinou? Que ié lhe entrou no peilo
Ao m ago som da tua voz amante ?
c : .18 ^
-
c «k

« Quando llie ia o temporal desfeito


B '' De que raio de sol o m an tiveste?
I a \
í 1 E de que flores lhe forraste o leito ? »—
úL
í i V v
Ella, volvendo o olhar brando e celeste,
r v ''i Disse :— « Varre-lhe a alma desolada,
í-ir-l ^ Que nem um ram o, um a só ílor lhe restei

(( T o rn a -lh e, em vez da paz abençoada,


Uma vida de dor e de miséria,
! H-
y U m a morte continua e angustiada.
“’■ ^1*1
(( Essa é a lua m issào torva e funerea.
«•
4 "'. Eu procurei no lar do infortunado
4 .
Dos m eu s olhos verter-lhe a luz etherea.
kí :
f( B usqu ei fazer-lhe um leito sem eado
De rosas festivaes, onde tivesse
Um somno sem tortura nem cuid ad o.
I «I
((E porque o céu que mais se lhe en n egrece,
Tivesse algum reflexo de ventura
O n d e o cançado olhar espairecesse,
m
(( Uma restea de luz suave e pura
F iz'lh e descer a erma phanlasia,
De mel ungi-lhc o calix da am argu ra.
(( Fui tudo v à o , — foi lu d o van porfia,
A ventura não veio. A tua hora
C hega lia hora que term ina o dia.

c( Entra » — E o virgineo rosto q u e descóra


Nas mãos esconde. Nuvens q u e correram
C ob rem o céo q u e o sol já mal colora.

A m b o s, com um olhar se com p reh en deram .


U m penetrou no lar com passo ufano ;
Outra tom o u por u m desvio. Eram :
Ella a E sp e ra n ça , Elle o D ese n g a n o .
QUINXE ANNOS.

Oh ! la fleur de TEden, pourquoi l’as-tu fannée,


Insouciant entant, belle Eve aux blonds cheveux ?
Alfred de M u sset.

t r a um a pobre c ria n ç a ...


— Pobre criança, se o eras 1
Entre as quinze primaveras
De sua vida cançada
Nem um a flor de esperança
Abria a m edo. Eram rosas
Que a douda da esperdiçada
T ào festivas, lao formosas,
Desfolhava pelo chão.
— Pobre criança, se o eras 1
Os carinhos mal gozados
Eram por todos com prados,
Q u e os affectos de sua alma
Havia-os levado á feira,
O nde vendera sem pena ‘
Até a illusào primeira
Do seu doudo coraçào !

Pouco antes, a candura,


Go’ as bran cas azas abertas,
Em um berco • de ventura
A criança acalentava
Na santa paz do Sen hor ;
Para acordal-a era cedo,
E a pobre ainda dormia
Naquelle m udo segredo
Q ue só abre 0 seio um dia
Para dar entrada a am or.

Mas, por teu mal, acordaste


Ju n to do berço passou-te
A festiva melodia
Da s e d u c c à o ... e acordou-te !
Colhendo as límpidas azas,
O anjo q u e te velava
Nas m àos tremulas e frias
F echou 0 ro sto ... chorava !

T u , na sede dos am ores.


Colheste todas as flores
Quo nas orlas do cam inho
Foste encontrando ao p a s s a r ;
Por ellas, um só espinho
Nào te fe r io ... vás a n d a n d o ...
Corre, criança, até quando
Fores forçada a p a r a r !

Enteio, desflorada a alma


De tanta illusao, perdida
Aquella primeira calma
Do teu som n o de pureza ;
Esfolhadas, um a a um a,
Essas rosas de belleza
Que se esvaem com o a escum a
Q ue a vaga cospe na praia
E que por si se desfaz ;
[21! 5-Í ^

Enlào, q uan do nos teus olhos


U m a lagrima buscares,
E seccos, seccos de febre,
U m a só não encontrares
Das que em meio das angustias
São um consolo e uma paz ;

Então, quan do o frio spectro


Do abandono e da penúria
Vier aos teus soíTrimentos
Juntar a ultima injuria :
E que não vires ao lado
Um rosto, um olhar amigo
Daquelles q u e são agora
Os desvellados com ligo ;

Criança, verás o engano


i * E 0 erro dos sonhos teus ;
E dirás, — então já tarde,—
Que por taes gozos não vale
Deixar os braços de Deus.

\oQ y
(n ’ l’ m a l b i :m ,— 1862.)

0 «leu nome é como o oleo derramado.


SÁLOMAO.—Cântico dos Cânticos.

Nem 0 perfum e que espira


A flor, pela tarde am ena,
Nem a nota que suspira
Canto de saudade e pena
Nas brandas cordas da lyra ;
Nem 0 m urm urio da veia
Q ue abrio sulco pelo cbào
Entre m argens de alva area,
Onde se mira e recreia
Rosa fechada em bolào ;

Nom 0 arrulho enternecido


Das pombas, nem do arvoredo
Esse amoroso arruido
Q uando escuta algum segredo
Pela brisa repetido ;
Nem esta saudade pura
Do canto do sabiá
Escondido na espessura,
Nada respira doçura
Como 0 teu nom e, Sinhá !

Uy -í;,'

jl ^
ERRO.
(1860.)

Vous................................................................
Qui des combats du cœur n’aimez que la victoire
Et qui revëz d’amour, comme on rêve de glore,
L’œil fier et non voilé des pleurs . . , .
GEORGE F A R C V .

Erro Ó teu. Amei-te um dia


Com esse amor passageiro
Que nasce na phanlasia
E não chega ao coraçüo ;
Nem foi am or, foi apenas
Uma ligeira impressão ;
Üm querer indiííerenle,
Em lua presença vivo,
i •
Nullo se estavas ausente.
E se ora me vês esquivo,
Se, como outr’ora, nào vês
Meus incensos de poeta
I! 1 \ Ir eu queimar a teus pés,
E ’ q u e , — com o obra de um dia,
Passou>me essa phantasia.

Para eu amar^te devias


Outra ser e não com o eras.
T uas frivolas chim eras,
T eu vão am or de ti m esm a,
Essa pêndula gelada
Que cham avas coração,
Eram bem fracos liames
Para que a alma enam orada
Me conseguissem prender ;
Foram baldados tentames,
Sahio contra ti o azar,
E em bora pouca, perdeste
A gloria de me arrastar
Ao teu c a r r o ... Vãs chim eras I
Para eu amar-te devias
Outra ser e não com o e r a s ...

I I

'i,:.
LUDOVINA MOUTINHO

l l i :g i a .

(I8ül.)

A bondade choremos innocente


Cortada em flor que, pela mão da morte,
JXos foi arrebatada d’entre a gente. :S
C A M ò i i s . — E l e g i ü s .

líiW
S e, como outr’ora, nas íloreslas virgens,
Nos fosse dado— o esquife que te encerra mi
E rg u er a um galho de arvore frondosa,
Certo, nào tinhas u m m elhor jazigo
Do quo olli, ao ar livre, entre os perfum es
Da ilorenle eslaeao, imagem viva
Do tous cortados dias, e mais perto
'M ^
Do clarào das estrellas.

Sobre teus pobres e adorados rcsloS',


Piedosa a noite, alli derramaria
Do seus negros cabellos puro orvalho ;
A ’ borda do íeu ultimo jazigo
Os alados cantores da floresta
Iriam sem pre m odular seus c a n t o s ;
Nem* lettra, nem lavor de em blem a hum ano,
llelom braria a m ocidade morta ;
Bastava só que ao coraçào m aterno,
A o do esposo, ao dos teus, ao dos amigos,
Um aperto, uma dôr, um pranto occulto.
Dissesse : — Dorm e aqui, perto dos anjos,
A cinza de quem foi gentil transumpto
De virtudes e graças.
Mal havia transposto da existência
Os dourados u m b raes ; a vida agora
Sorria-lhe toucada dessas flores
Que 0 am or, que o talento e a m ocidade
A ’ uma repartiam.
T u d o lhe era presagio alegre e doce ;
U m a n u v e m seq u er nào som breava,
Em sua fronte, o iris da esperança ;
Era, em fim , entre os seus a copia viva
Dessa ventura q u e os mortaes alm ejam ,
E q u e raro a fortuna, avessa ao h o m em ,
D eixa gozar na terra.

Mas eis q u e o anjo pallido da morte


A presentio feliz e bella e pura,
E, abandonando a região do olvido,
Desceu íi torra, e sob a aza negra
A fronte lhe escondeu ; o frágil corpo
Nào pôde resistir ; a noite eterna
Veio fechar seus olhos ;
m
E m q u an lo a alma abrindo
As azas rutilantes pelo espaço,
Foi engolfar-se em luz, perpeluam ente,
No seio do infinito ;
Tal a assustada pom ba, que na arvore
O ninho fabricou, — se a mào do hom em
Ou a impulsào do vento um dia abate
O recatado a sylo ,— abrindo o voo.
p tb
"Î r
A - 6-2 :=:

Deixa os inuteis reslos


E, atravessando airosa os leves ares,
Vai buscar n'oulra parle outra guarida.

Hoje. do q ue era inda lem brança resta,


E que lem brança I Os olhos fatigados
‘ .I
i' . Parecem ver passar a som bra della ;
O altento ou vid o inda lhe escuta os passos ;
E as teclas do piano, em que sous dcdos
Tanta harm onia despertavam antes,
Como que soltam essas doces notas
Que ou tr’ora ao seu contacto respondiam .

Ah ! pczava-lhe este ar da terra im pura.


Faltava-lhe esse alento do outra esphera,
O nde, noiva dos anjos, a esperavam
As palmas da virtude.

tl I Mas, quando assim a ílor da m ocidade


Toda se desfolha sobre o chão da m orte.
Sen hor, em que firmar a segurança
Das venturas da terra ? T ud o m orre :/

A’ sentença fatal nada se esquiva,


O q ue é fructo e o que é flor. O h o m em cego
Cuida haver levantado em chão de bronze

VI


h •1

63 =

Uin eclificio resistente aos tempos,


Mas lá vem dia, em q u e , a um leve sopro,
0 casteilo se abate,
Onde, doce illuscào, fechado havias
T u d o 0 que de m elhor a alma do h o m em 1. • ,

Encerra de esperanças.

Dorme, dorm e tranquilla


Em teu ultimo asylo ; e se eu nào pude
Ir espargir lam b em algumas flores
So bre a lagea da lua sepultura ;
Se não pude, — eu que ha p ouco'te saudava
Em teu erguer, estrclla,— os tristes olhos
Banhar nos melancólicos fulgores,
Na triste luz do teu recente occaso,
Deixo-te ao menos nestes pobres versos
Um penhor de saudade, e lá na esphera
Aonde approuve ao Sen hor cham ar-te cedo.
Possas tu 1er nas pallidas estrophes
A tristeza do amigo.

•sQ'
ASPIRAÇÃO.

A F. X. DF. Novaes.

Qd’aperçois-tii, mon ame? Au fond, n’est-ce-pas Dieu?


Tu vas à l u i...............
V. DE Laprade.

Sinlo que ha na minh’alma um vacuo immenso e fundo,


E (lesta mêla m orte o frio olhar do m un do
Nào vê O que ha do triste o de real cm mim ;
Muita vez, ó poeta, a dor e casta assim ,
R efolha*se, nào diz no rosto O que ella é,
U :

J
CG LU

E nem que o revelasse, o viilgo nao pùe fé


Nas tristes cornmoçôes da verde m ocidade,
L responde sorrindo íí cruel realidade.

Nào assim tu, ó alma, ó coração am igo ;


, •/'£ f: Nu, com o a consciência, abro-m e aqui com iigo ;
Tu que corres, com o eu, na vereda fatal
. b m busca do m esm o alvo o do m esm o ideal.
D eixem os que ella ria, a turba ignara e và ;
Nossas almas a sós, com o irmà ju n to a irma,
b m santa com m unliào, sem cárcere, som vous,
bonversarào no espaço e mais perto do Deus.

Deus quando abre ao poeta as portas desta vida


Nào lhe depara o gozo e a gloria a[)ctecida ;
Tarja de luto a folha cm que lhe deixa escriptas
■> l'i
Pi. ■ A suprema saudade e as dores infinitas.
Alma errante 0 perdida em um fatal desterro.
l'if 4
•l: Neste primeiro e fundo c triste limbo do erro,
Dhora a patria celeste, o fóco, o centro, a luz,
Onde 0 anjo da morte, ou da vida, o co n d u z
No dia festival do grande livram ento ;
Antes disso, a tristeza, o sombrio tormento,
O torvo azar, e mais, a torva solidào,
Kmbaciam.-lho n ’alma o espelho da illusâo.
O poeta chora e \ê perderem -so esfolhadas
Da verde primavera as flores tào cuidadas •
R asga, com o Jesus, no cam in h o das dores,
Os lassos pds ; o sangue hu m edece-lhe as flores
Mortas a lli,— e a fé, a fé m àe, a fé santa,
Ao vento impuro e máo que as illusòes quebran ta,
Na alma q u e alli se vae muitas vezes v a c i l l a . . .

Oh ! feliz 0 q u e póde, alma alegre e tranquilla,


A esperança vivaz e as illusòes floridas,
Atravessar cantando as longas avenidas
O ue levam do presente ao secreto porvir !
Feliz esse ! Esse póde am ar, gozar, sentir,
Viver emfim ! A vida é o am or, é a paz,
F/ a doce illusào e a esperança vivaz ;
Nào esta do poeta, esta que Deus nos poz
Nem com o'inútil fardo, antes còmo um algoz.

O poeta busca sempre o almejado ideal


Triste e funesto affan ! tentativa fatal I
Nesta sede de luz, nesta fome de amor,
O poeta corre à'estrella, á brisa, ao mar, á flo r ;
Quer ver-lhe a luz na luz da estrella peregrina,
P.f ■ ■>ii
fi

cz: 68

Q u er-lh e o cheiro aspirar na rosa da campina,


r i Na brisa o doce alento, a voz na voz do mar,
O ’ inútil esforço 1 ó improbo lutar 1
Em vez da luz, do arom a, ou do alento ou da voz,
Í'!
Acha-se o nada, o torvo, o impassivel algoz 1

Onde te escondes, pois, ideal da ventura ?


Em que canto da terra, em que funda espessura
ll i Foste esconder, ó fada, o teu esquivo lar ? -
p 'I
IÍM Dos h om ens esquecido, em erm o recatado,
m ‘. Que voz d o c o raçào , que lagrima, que brado
Do somno em que ora estás te virá despertar ?
r-^ ;■
t
f '* ' '
Pfí 1m* ~ ■ A esta sede de amar só Deus conhece a fonte?
f; í.^ Jorra elle ainda além deste fundo horisonte
Que a mente nao calcula, e onde se perde o olhar?
II'■
Que azas nos désle, ó Deus, para transpôr o esp aço?
Ao erm o do desterro inda nos prende um laço :
Onde encontrar a mào que o venha d e sa ta r?
i:-

Creio que só cm ti lia essa luz secreta,


:l Essa catrella polar dos sonhos do poeta,
Esse alvo, esse termo, esse m ago ideal ;
69

Fonte de todo o ser e fonte da v e rd a d e ,


^Nós vam os para ti, e e m tua im m en sidade
E ’ que h a v e m o s de ter o repouso final.
'*<*|

E ’ triste q u a n d o a vida, erm a, com o esta, passa ;


E quando nos im pelle o sopro da desgraça
L on g e de ti, ó D eus, e distante do am or !
Mas gu ard em os, poeta, a m elhor esperança :
Succederá a gloria á salutar provança :
O que a terra não deu, dar-nos-ha o Sen h o r !

'n

■ (
\Q cy

m
EWiBIRRÂCAO.
^Vv:

(a machado de assis ).

A balda alexandrina é poço immonso o fiindo,


Onde poetas m il, flagello desle m undo,
Patinham sem parar, cham ando lá por m im .
ISão m orrerão, se um verso, esliradinho assim,
Da beira for do poço, extenso com o elle é,
Levar-lhes grosso anzol ; enião eu tenho fé
Q ue volte u m afogado, á luz da m ocidade,
A ver no m undo secco a secca realidade.

Por elles, (5 por m im , receio, caro am igo ;


P erm itle o desabafo aqui, a sós comtigo,
Q ue á moda fazer guerra, eu sei quanto é fatal ;
Ï m'j Î' 'I '
■iîî‘ ! ’
H' ( -

Nem ven ce o positivo o frivolo i d e a l ;


Despótica em seu m ando, é sem pre fatua e va,
E até da và loucura a m oda é prim a-irm à :
Mas q u a n d o v e n h a 0 senso erguer-lhe os densos véusj
ft. 1. Do verso alexandrino ha de livrar-nos D eus.
ïilî'l
Deus quando abre ao poeta ás portas desta vida y :ií
Não lhe depara o gozo e a gloria appetecida ;
E 0 triste, se m orreu, deixando mal escriptas
! t' ’>
E m verso alexandrino historias infinitas,
Vai 1er lá n ’outra vida insipido desterro,
Se Deus, por com paixào, nào dá perdão ao erro ;
lil i‘ F ech a d o em quarto escuro, á noite nào tem luz,
E s c é cá do meu gosto o guarda que o conduz,
D ebalde, im m erso em pranto, implora o livram ento ;
Nào torna a ser, aqui, das Musas o tormento ;
Castigo alexan drin o, eterna solidào.
Terá lá no desterro, em prêmio da illusào ;
Verá queim ar, á noite, as rosas esfolhadas,
Q ue a m oda lhe oííertára, e trouxe tào cuidadas,
* * E ao pé do fogo intenso, ardendo em cruas dôres.
If ■ Verá que versos taes sào galhos, nào dào flores ;
lU: \l Q u e, len do-os a pedido, acreatura santa,
A paciência lhe foge, a fé so lhe quebranta,
' î* ^

cz: 73 - i !

Se vaicl’um veisoao fim ; d e p o is .. .t r e m e .. .v a c illa ...


Dormindo, cahe no chùo ; mais tarde, já tranquilla,
^"Sonha corn verso-verso, e as illusoes floridas,
Risonhas, vern moslrar-lhe as largas avenidas . .1

I Que 0 longo verso-prosa occulta, do porvir !


l'ilSonhando, ao menos, póde am ar, gozar, sentir,
Que um somnu alexandrino a deixa ali em paz,
, D orm ir...dorm ir...dorm ir...erguer-se,em fim ,vivaz,
I Bradando : « Chloroformio ! O genio q ue te poz,
(( A palma cede ao melro esguio, leu algoz ! »

E aspiras, vate, assim, da gloria ao ideal ?


Triste e funesto afan /... tentativa fatal!
UjAes/a sede de luz, nesta fome d'amor,
0poeta corre a estrella, d brisa, ão mar, d flor ;
Quer ver-lhe a luz na luz da estrella peregrina,
Quer-lhe o aroma sentir na rosa da càmpina,
a
I\a brisa o doce alento, a voz na voz do mar ; tl! í
0 inútil esforço ! O' improbo lutar !
, Tmvezdaluz, do aroma, uu do alento, ou da voz,
0 verso alexandrino, o impassivel algoz / ...
Nào cantas a tristeza, e menos a ventura ;
Que em vez do sabiá gem endo na espessura,
uiilarás, no canto, o grillo atraz do lar ;
Í -i

Mas desse estreito asylo, escuro e recatado,


Alegre has de fugir, que erguendo altivo brado,
A lyrica harm onia ha de ir-te despertar !

Verás de novo aberta a copiosa fonte !


Da poesia verás tào lúcido o horisonto,
(JuG a mente não calcula^ e onde se 'perde o olhü'i\
Que nas asas do genio, a voar pelo esparo,
Da perna sacudindo o alexandrino laço,
' (■ lia s de a mào bem dizer que o soube desatar.

Do precipicio foge, e segue a luz secreta,


Essa estreita polar dos sonhos do poeta ;
Mas, n ’outro verso, am igo, onde ao m ago ideal
A musica se ligue, o senso e a verdade ; ,
i — IN’ um destes vai>se, a 1er, da vida a immcnsidadf
Da syllaba primeira á syllaba íinal I

Meu Deus ! Esta existência é transitória e passa ;


S e fraco fui aqui, peceando por desgraça ;
S e já nào tenho ju s ao vosso puro am or ;
Se nem da salvação nutrir posso a esperança,
Q uero em cham m as arder, sotTrer toda a provança
— Eer verso a le x a n d r in o ... O h ! isso não, Senhor
F. X. DE XOVAKS.
Í i’

CLEOPATRÂ.
CANTO DE VM ESC« AVO.

(ÍM.'"® F.MÍLE DE Gl RARDl N. )

Filha pallida da noite,


Nome feroz de inclem ência,
Sem culto nem reverencia,
Nem crentes e nem altar,
:
A cujos pés d e s c a r n a d o s ...
A teus negros pés, ó morte Î
Só engeitados da sorte
Ousam frios implorar ;

T o m a a tua foice aguda,


A arma dos tens furores ;
76

V en h o c ’roado de flores
SS Da vida entregar-te a llor ;
E ’ um feliz que te implora
Na m adrugada da vida,
ü m a cabeça perdida
E perdida por a m o r .
«

Era rainha e formosa,


"i '
Sobre cem povos reinava,
\
E tinha um a turba escrava
Dos mais poderosos reis ;
Eu era apenas um servo,
■i :
Mas a m a va -a tanto, tanto,
[■■'i-ï
I Que nem tinha um desencanto
Nos seus desprezos cruéis.

Vivia distante delia


Sem fallar-lhe nem ouvil-a ;
Só me vingava em seguil-a
Para a poder contemplar ;
Era uma som bra calada
Que occulta força levava,
r\ E no cam in h o a aguardava
Para saudül-a e passar.
i s
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■r
i

77

Uiïi dia veio ella ás fontes


V er os tra b a lh o s,., não pude,
Fraqueou m inha virtude,
Cahi-lhe trem endo aos pés.
T od o 0 am or que m e devora,
O ’ Venus, ó intimo peito,
Fallou naquelle respeito,
Falloii naquella m udez.

.11
Só lhe conquistam amores
O hcroe, o bravo, o triom phante ;
E que coroa radiante
T in ha eu para offerecer ?
Disse um a palavra apenas
Q ue um m undo inteiro continha :
— Sou um escravo, rainha,
A m o-te e quero morrer.

E a nova Isis q u e o Egypto


Adora curvo e h u m ilh ad o
O pobre servo curvado
Olhou languida a s o r r i r ;
Vi Cleopatra, a rainha.
78

T rem er pallida em m eu seio ;


Morte, foi-se-m e o receio,
A qui estou, podes ferir.

Vem 1 que as glorias insensatas


Das con vulsões m aislascivas,
As phanlasias mais vivas,
Iti' ■<t; De mais febre e mais ardor,
T oda a ardente ebriodade
Dos seus reaes pensamentos,
T u d o gozei uns momentos
Na m inha noite de amor.

Prom pto estou para a jornada


Da estancia escura e escondida ;
O sangue, o futuro, a vida
Dou-te, ó morte, e vou m o rrer ;
Uma graça unica — peço
Como uUima esperança :
Nào me apagues a lem brança
Do am or q u e m e fez viver.
-Î ' •
Belleza completa e rara
Deram -lhe os n um es amigos ;
E sco lh e dos teus castigos
O que infundir mais terror,
Mas por ella, só por ella
Seja 0 meu padecim ento,
VJ
E tenha o intenso tormento
Na intensidade do am o r.

E m m inhas carnes rasgadas.


V en h a m rochas despenhadas
Sobre m eu corpo rolar.
Mas não me tires dos lábios
Aquelle n om e adorado, 'V
E ao m eu olhar encantado
Deixa essa im agem fic a r .

Eosso soíírer os teus golpes


Sem m u rm u rar da sentença ;
A m inha ventura é immensa
E foi em ti que eu a a c h e i ;
Mas nào m e apagues na fronte
Os sulcos quentes e vivos
Daquelles beijos lascivos
Que já m e fizeram rei.
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-5S?'’fîiÿ£3i
os ARLEQUINS.

SATYRA.

186Í . )

Que deviendras dans l’éternité l’âme d’un


homme qui a fait rolicliinelle tonie sa vie?
DE Staël.

Musa, depôe a lyra !


Cantos de am or, cantos de gloria esquece !
N ovo assunnpto apparece
Que O genio m ove e a indignação inspira.
Esta esphera é mais vasta,

Is 'M
il
E vence a lelra nova a letra antiga !
Musa, toma a vergasta,
E os arlequins fustiga 1
l!'
Como aos olhos de R o m a ,
I
— Cadaver do que foi, pavido imperio
De Caio e d e T i b e r i o , —
0 filho de Agripina ousado assoma ;
E a lyra sobracando.
Ante 0 povo idiota e amedrontado,
Pedia, am eaçando,
O applause a c o s t u m a d o ;

E 0 povo que beijava


O utr’ora ao deus Calligula o vestido,
De novo submeltido
Ao regio saltimbanco o applause dava.
E tu, tu nào te abrias,
O ’ céu de R o m a , á scena degradante !
E tu, tu nào cahias,
O ’ raio cham m ejante !

Tal na historia que passa


Neste de luzes século famoso,
O engenho portentoso

I
83 =

S a b e illudir a néscia populaça ;


Nào busca o mal tecido
Canto de o u lr ’ora ; a m oderna insolência
Nào encanta o ouvido,
Fascina a consciência !

V êd e ; o aspecto vistoso,
O olhar seguro, altivo e penetrante,
E certo ar arrogante
Que im põe com apparencias de assom broso ;
Nào vacilla, nào lom ba,
Carainba sobre a corda firme e alerta :
T e m cornsigo a m arom ba
E a ovacào é certa.

T am a n h a gentileza,
Tal segurança, ostentacào tào grande,
A multidào expande
Com ares de legitima grandeza.
. O gosto pervertido
Acha 0 sublime neste abatimento,
E dá-lh e agradecido.
O louro 0 0 m onum ento.
84

Do saber, da virtude,
Logra fazer, em prêmio dos trabalhos,
, I
Um manto de retalhos
1 Que a consciência universal illude.
I 'I
Nào córa, nüo se peja
Do papel, nem da mascara indecente,
E ainda inspira inveja
Esta gloria insolente !

Nào sào contrastes novos ;


Já vem de longe ; e de remotos dias
h»* >:
T ornam em cinzas frias
í ; O amor da patria e as illusõos dos povos,
T orpe ambiçcào sem pêas
De mocidade ern m ocidade corre,
E 0 culto das idéas
1•í
T rem e, convulsa e morre.

Que sonho apetecido


Leva 0 animo vil a taes emprezas ?
O sonho das baixezas :
L m fumo que se esvae e um vão ruido ;
Uma som bra illusoria
8d

Q ue a turba adora ignorante e rude ;


E a esta infausta gloria
Im m ola-se a virtude.

A tüo exlran h a liça


Chega a hora por fim do encerram ento,
i E lá soa 0 m om en to
Em que reluz a espada da justiça.
Entào, m usa da historia,
A b r e s o grande livro, e sem detença
A ’ invilecida gloria
Eulminas a sentença.

8
a

'■ I
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•f
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: .9
j/ -
EPITAPHIO DO MEXICO. K !i

(18G2).

i-
Camiiihante, vai dizer aos Lacedemonios que esta­
mos aqui deitados por termos defendido as suas leis. 1
^ Kpitaphio DAS rni:nMOPVLAS.

Dobra o jo e lh o é um tum ulo.


Em baixo amortalhado
Jaz 0 cadaver tepido
Do um poY O aniquilado ;
A precG melancólica
R esa-lh e em torno á cruz.
88

Ante 0 , universo atonito


Abrio-se a exlran ha lica,
T ravou-se a lula fervida
Da força e da justiça ;
■ '^1
Contra a justiça, ó século,
Venceu a espada e o ob u z.

Venceu a forca indomita ;


Mas a infeliz vencida
A m agoa, a dor, o odio,
Na face invillecida
C uspiu-lhe. E a eterna macula
Vi
Seus louros m urchará.
f

E q uan do a voz falidica


Da santa liberdade
Vier em dias prosperos
Clamar á hu m an id ad e,
} Então revivo o México
Da campa surgirá.

VDQ/
lf ,
.I

.4
"4

. i

Al
POLONIA.

E ao terceiro dia a alma deve voltar ao


corpo, e a naçào resuscitará.
M i ç k i e w i k z —Livro da nação polaca.

Com o aurora de um dia desejado,


Clarão suave o horisonte in n u n d a.
E ’ talvez am anhã. A noite am arga
Com o que chega ao termo ; e o sol dos livres,
Cangado de to ouvir o inulil pranto,
Alfim resurge no dourado Oriento.
Eras livro,— tão livre com o as aguas
Do teu formoso, celebrado rio ;
A corôa dos tem pos
Cingia-te a cabeça veneranda ;
E a desvellada mâi, a irm ã c u id o s a ,
'r A santa liberdade,
Como jun to de um berço precioso,
A ’ porta dos teus lares vigiava.

Eras feliz demais, demais formosa ;


A sanhuda cobiça dos tyranos
Veio en lu cta rteu s venturosos d ia s ...
Infeliz I a medrosa liberdade
Em face dos canhões espavorida
Aos reis abandonou teu chào sagrado ;
So bre ti, m oribunda,
Viste cahir os duros o p p r e s s o r e s :
Tal a gazella que percorre os cam pos,
Se 0 caçador a fere.
Cabe convulsa de dôr cm mortaes ancias,
E vê no extrem o arranco
Abater-so sobre ella
Escura n u vem de famintos corvos.

I
Í)1

Presa uma vez da ira dos tyranos,


Os m em bros retalhou-te
Dos senhores a explendida cobiça ;
Em proveito dos reis a terra livre
Foi repartida, e os filhos teus — escravos —
Viram descer um véu de luto á patria
E apagar-se na historia a gloria tua.
i
1 .
 gloria, nüo Η E ’ gloria o captivciro
Q uando a captiva, com o tu, nào perde
A alliança de Deus, a fé q ue alenta,
E essa uniào universal e muda
Que faz c o m m u n s a dor, o odio, a esperança

Um dia, q uan do o calix da am argura,


Martyr, até ás fezes esgotaste, Oil
Longo tremor correu as fibras tuas ;
Em teu ven tre de mài, a liberdade
Parecia^ soltar esse vagido
Q ue faz rever o céu no olhar materno ;
T eu coraçào estremeceu ; teus lábios 4
T rêm u los dc nnciedade e de esperança,
Buscaram aspirar a longos tragos
A vida nova nas celestes auras.
Entuo surgiu Kosciusko ;
Pela mao do Sen hor vinha tocado ;
A fé no coração, a espada em p un ho,
E na ponta da espada a torva morto.
C ham ou aos cam.pos a naçào cahida.
De novo entre o direito e a forca bruta
Em penhou-se o duello atroz e infausto
Que a triste hu m an idad e
Inda verá por séculos futuros.
Eoi longa a luta ; os filhos dessa terra
Ah I não pouparam nem valor nem sangu e I
A mài via partir sem pranto os filhos,
A irmã o irm ão, a esposa o esj^oso,
E todas abençoavam
A heróica legião q ue ia á conquista
Do grande livram ento.

.I' f
Coube ás hostes da força
Da pugna o alto prêmio ;
A oppressão jubilosa
Cantou essa victoria de ignominia ;
E do novo, ó captiva, o véu de luto
Correu sobre teu rosto !
Deus continha
Em suas maps o sol da liberdade,
E inda não quiz que nesse dia infausto
T e u m acerado corpo allumiasse.

Resignada á dor e ao infortúnio,


A mesma fé, o m esm o am or ardente
D a v a n n te a antiga força.
Triste viuva, o tem plo abriu-to as portas ;
Eoi a hora dos b y m n o s e das preces ;
Cantaste a D eus; tua alma consolada
Nas azas da oração aos céus subia,
Como a refugiar-se e a refazer-se
No seio do infinito.
E q u a n d o a força do feroz cossaco
A ’ casa do Sen h o r ia buscar-te,
Era ainda resando
Que te arrastavas pelo chão da egreja.

P obre nação 1— é longo o teu m a r ty r io ,


A tua dor pede vingança e termo ;
Muito bas vertido em lagrimas e sangue ;
E ’ propicia esta hora. O sol dos livres
Como que surge no dourado Oriente.
Nao ama a liberdade
Quem nao chora comtigo as dores l u a s ;
L nào pede, e nào ama, c nüo deseja
Tua resurreiçáo, finada heróica I
Urra — mullier c m íu n — curiosa palpa
De seu penacho a plum a flucluaiilc ;
Outra procura decifrar o motte
Que traz escripto o escudo rutilante.

Esta, risonha, olhos de vivo fogo,


Tira-lhe a espada limpida e lustrosa,
E apoiando-se nella, a contemplal-a
Perde-se toda em extasi amorosa.

Fita-lhe aquella nam orados olhos,


E após gira r-lh e em torno em b riagada.
; 'í Diz : ((Que formoso estás, ó flor da guerra,
Quanto te eu dera por te ser am ada 1 »

U m a, tom ando a m ào ao cavalleiro,


U m beijo im prim e-lhe : outra, duvidosa,
t‘
Audaz por íim, a boca adormecida
Casa n ’ um beijo á boca desejosa.

Faz-se de sonso o jo v e n ; caladinho


Finge do som no o plácido desmaio,
E deixa-se beijar pelas ondinas
Da branca lua ao doce e brando raio.
it)Ví

>“^1

MÂRIA DUPLESSIS.

(AL. DLMAS FILÏ10. —1850.)

Fiz promessa, dizendo-le que u m dia


Eu iria pedir-te o m eu perdào ;
Era dever ir abraçar primeiro
A minha doce e ultima aííeiçâo.

E quando ia apagar tanta saudade


Encontrei já fechada a tua porta ;
Soub e que uma recente sepultara
Muda fechava a tua fronte m orta.
Soub e q ue, apoz um longo soffrimento,
NS . A ggravâra-se a tua enfermidade ;
Viva esperança que eu nutria ainda
Despedaçou crueDfatalidade.
;síf ;
Vi, apertado de fataes lem branças,
A escada q ue eu subira tào contente;
E as paredes, herdeiras do passado,
Q ue vem fallar dos mortos ao vivente.

Subi e abri com lagrimas a porta


Que ambos abrim os a chorar um dia ;
Il ?;t'
E evoqu ei o fantasma da ventura
3- I il Que outr’ ora um céu de rosas nos abria.

Sentei-me á m eza, onde comtigo outr’ora


Em noites bellas de verào ceiava ;
Desses amores plácidos e am enos
T u d o ao meu triste coraçào falia va.

Fui ao leu cam arim , e vi-o ainda


Brilhar com o esplendor das m esm as cores ;
E pousei meu olhar nas porcelanas
O nde morriam inda algumas flores...

'■ ^

iiUJ

I Al
Vi aberto o piano em q ue tocavas ;
T u a morte o deixou m udo e vasio,
Com o deixa o arbusto sem folhagem ,
Passando pelo valle, o ardente estio.

Tornei a ver o teu sombrio quarto


Onde estava a saudade de outros dias..
Um raio illuminava o leito ao fundo
O nde, rosa de amor, já não dorm ias.

As cortinas abri que te am paravam


Da luz mortiça da m anhã, querida,
Para que um raio depozesse um toque
De prazer em tua fronte adormecida.

Era alli q ue, depois da meia noite.


Tanto amor nós sonhavam os outr’ora ;
E onde até o raiar da m adrugada
Ouvíam os bater — hora por hora !

Então olhavas tu a cham m a activa


Correr alli no lar, com o a serpente ;
E' que 0 somno fugia de teus olhos
Onde já te queim ava a febre ardente.
Lem bras-te agora, nesse m un do n ovo,
Dos gozos desta vida em que passaste ?
Ouves passar, no tumulo em que dorm es,
A turba dos festins que acompanhaste ?

A insom nia, como um verme em flor que m u rch a,


De continuo essas faces desbotava ;
E p r o m p ta para amores e banquetes
Conviva e cortezà te preparava.

H oje, Maria, entre virentes flores.


Dorm es em doce e plácido abandono ;
A tua alma acordou mais bella e pura,
E Deus pagou-te o retardado som no.

P obre m ulher I em tua ultima hora


Só um hom em tiveste á cabeceira ;
I 1u.f ,
h
E apenas dous amigos dos de outr’ora
Foram levar-te á cama derradeira.

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'I

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T i'/ c=; 102 :=^
Í
1 Mãos em mãos travadas,
Animadas,
i
Vão aquellas fadas
Pelo ar ;
Soltos os cabellos,
Em novellos,
Puros, louros, bellos,
A voar.

— (( H om em , nos teus dias


Que agonias,
Sonhos, utopias.
Am bições ;
Vivas e fagueiras,
As primeiras,
Como as derradeiras
Illu sõ es!
. ■ •,/!

— « Quantas, quantas vidas


Vão perdidas.
Pom bas m al feridas
Pelo mal !

li
1

I
I-

cz 103 □□

Annos apoz annos,


Tào insanos,
V em os desenganos
Afinal.

— c( Dorme : se os pesares
Repousares,
Vês — por estes ares
Vam os rir ; 5'
iMortas, nào ; festivas,
E lascivas.
S o m o s — /ioras vivas
De dormir ! — »

\OG/

/IS
Em vâo encheis de aroma o ar da tarde ;
Em vào abris o seio hu m id o e fresco
Do sol nascente aos beijos amorosos ;
Em vào ornacs a fronte à meiga virgem ;
Em vào, como penhor de puro aiTecto,
Com o u m é lo das aimas,
Passaes do seio amante ao seio amante ;
Là bâte a hora infausta
Em que é força m orrer ; as folhas lindas
Perdem o viço da manha prim eira,
As graças e o perfum e.
Rosas que sois entào ?— Restos perdidos,
lo lh a s mortas que o tempo esquece, e espalha
Brisa do inverno ou mào indiíTercnle.

! í
Tal é 0 vosso destino,
O ’ filhas da natureza ;
Em que vos peze á belleza.
Pereceis ;
Mas, n à o ... Se a m ão de um poet^
Vos cultiva agora, ó rosas.
Mais vivas, mais jubilosas,
Eloresceis.
OS DOUS HORISONTES.

A M. F e r r e i r a G u i m a r ã e s .

D ou sh orison les fecham nossa vida:

ü m horisoiite,— a saudade (í 5
Do que nào ha de voltar ;
Outro h o riso n le ,— a esperança
Dos tem pos q u e hào de chegar ;
No presente,— sem pre e s c u r o ,—
Vive a alma ambiciosa
í ?'
Na illusao voluptuosa
Do passado e do futuro. <•
□□ 108

Os doces brincos da infancia


Sob as azas maternaes,
0 vôo das andorinhas,
A onda viva e os rosaes ;
0 goso do arnor, sonhado
N ’ um olhar profnndo e ardente,
T al é na hora presente
O horisonte do passado.

Ou a m b iç à o d e grandeza
Q u e no espirito calou,
Desejo de am or sincero
Q ue 0 coraçào nào gosou ;
O u u m viver calmo e puro ,
A ’ alma convalescente,
Tal é na hora presente
O horisonte do futuro.

No breve correr dos dias


Sob 0 azul do c é u , — laes sào
Limites no rnar da vida :
Saudade ou aspiração ;
Ao nosso espirito ardente,
Na avidez do bem sonhado,
N unca o presente é passado,
Nunca o faturo é presente.

Que scismas, h o ríjem ?— Perdido


No m ar das recordações,
Escuto um eco sentido
Das passadas illusões.
Q ue buscas, ho m em ?— Procuro,
Atravez da im m en sidade,
Ler a doce realidade
Das illusões do futuro.

Dous horisontes fecham nossa vida.

10

•cH.
[

MONTE ALVERNE.

AO PADRE MESTRE A. J. DA SlLVR IRA S A R M E M O .

(1858.)

#
Morreu ! — Assim baqu ea a estatua erguida
No alto do pedestal ;
Assim 0 cedro das florestas virgens
.C a h e pelo embate do corsel dos ventos
Na hora do temporal.

Morreu ! — Fechou-se o portico sublim e


De um paço s e c u l a r ;
Da mocidade a romaria augusta .i "t
A m an hã ante as pallidas ruinas
Ha de vir meditar 1
•1 .I
‘! (
1 \
i
■ín '
* i
 ■j ^'í ^
1
; 112
;
.1 ^ Tinha na fronte de prophela ungido
" i
í
j A inspiração do céu.
1 • ) Pela escada do púlpito moderno
Subio o u tr ’ora festival m ancebo
,
E Bossuet desceu !

Ah! q ue perdeste n ’ um só h o m em , claustro f


Era uma augusta voz ;
Q uando essa boca divinal se abria,
Mais viva a crença dissipava n’alma
Uma duvida atroz !

Era t e m p o ? — a argila se alquebrava


N ’ um áspero c r y s o l ;
Corrido o véu pelos cangados olhos
Nem via o sol q u e lhe contava os dias,
Elle— fecundo sol 1

A doença o prendia ao leito infausto


Da d e r r a d e ir a .d o r ;
A terra reclamava o que era terra,
E 0 gelo dos invernos coroava
' ;í A fronte do orador.
Mas lá dentro o espirito fervente
Era com o u m fanal ;
Nào, não dorm ia nesse regio craneo
A alma gentil do Cicero dos púlpitos,
— Cuidadosa Yestal !

í '
Era tempo 1—-O romeiro do deserto
Pára um dia tam bém ;
E ante a cidade q ue alm ejou por annos
Desdobra um riso nos doridos lábios,
Descança e passa além !

Cahiste 1— Mas foi só a argila, o vaso,


Que 0 tempo derrubou ;
Não todo á eça foi teu vulto olym pico ;
Como deixa o com eta uma aurea cauda,
A lem brança ticou 1

O que hoje resta era a terrena purpura


Daquelle genio-rei ;
A alma voou ao seio do infinito,
Voltou á patria das divinas glorias
O apostolo da Ici.
Patria, curva os joelhos anto esses restos
Do orador imm ortal !
Por esses lábios não fallava um h o m e m ,
Era um a geração, um século inteiro,
Grande, m onum ental !
Ví ■ : í •

Morreu !— Assim baqu ea a estatua erguida


■ n:
No alto do pedestal ;
Assim 0 cedro das florestas virgens
Cahe pelo embate do corsel dos ventos
I- ’ - ^
'^ ■
Na hora do tem poral 1

lí.)». rV
Hi ■ H

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E fí■ ■
I

e 1

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i 7;

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.víl
AS VENTOINHAS.

(18C3.)

Com seus olhos Yagr.náus,


Bons de dar, bons de tolhei ,
Sa ’ de Mi r a n d a .

A m ulher é um catavontó,
Y a e ao vento,
Vao ao vento que s o p r a r ;
Com o vae também^ao vento
Turbulento,
Turbulento e incerto o mar.
ri

f,
rí 1
V/?.
!'í ' i ‘
1 ! 1^'
1 íl
hl
^ 116

Sopr;i 0 sul : a ventoinha


Volta azinha,
Volta azinha para o s u l ;
Vem t a f u l : a cabecinha
Volta azinha,
Volta azinha ao m eu taful.

Q uem lhe pozer confiança,


De esperança,
De esperança mal está ;
Nem desta sorte a esperança
Confiança,
Confiança nos dará.

Valera o m esm o na area


Rija amêa.
Rija amea c o n s t r u ir ;
Chega 0 m ar e vae a amea
Com o a area,
Como a arêa confundir.

Ouço dizer de umas fadas


Que abraçadas,
Ouo abraçadas com o irmãs,
Caçam almas descuidadas..
A b que fadas !
Âh q u e fadas tão villans !

Pois, com o essas das bailadas,


U m as fadas,
U m as fadas d ’entre nós.
Caçam , com o n a s bailadas ;
E são fadas,
E são fadas de alma e voz.

E ’ q u e — com o o calavenlo,
Y ão ao vento,
V ão ao vento que lhes der ;
Cedem très cousas ao vento :
Catavento,
Catavento, agua e m ulher.
ALPUJARRA.

( M IÇ K IE WIC Z . — 18 C2 . )

Jaz em ruinas o-torrao dos m ouros ;


Pesados ferros o infeliz arrasta -,
Inda resiste a intrépida Granada ;
Mas em Granada a peste assola os povos.

C ’ um p un hado de heroes sustenta a lula


Fero Alm ansor nas torres de A lpujarra ;
Fluctua perto a hispanica bandeira ;
H ade o sol d ’amanhü guiar o assalto.
pí:'

■| ' 1*20
■\•'V
Dou signal, ao ro m p er cio dia, o bronzo ;
Arrasam-se Irinciiciras e m uralhas ;
No alto dos minareis erguom -se as cruzes ;
Do castelhano a cidadella ó presa.

S ó , e vendo as cohortes destroçadas,


O valente Alm ansor apoz a luta
m l- A hre cam inho entre as imigas lanças,
Foge e illude os christàos que o perseguiam .

So bre as quentes ruinas do castello.


i. f
Entre corpos e restos da batalha.
Dá um banquete o Castelhano, e as presas
E os despojos pelos seus reparte.

Eis que o guarda da porta falia aos chefes :


(( Um cavalleiro, diz, de terra estranha
Q uer fallar-vos noticias importantes
Declara que voz traz, e urgência pedo. »

Era Almansor, o emir dos M usulm anes,


Q u e, fugindo ao refugio q u e b u s cá ra ,
V em entregar-se ás màos do castelhano,
A q u em só pede conservar a vida.
m

« Castelhanos, ex clam a, o emir vencido


No limiar do ven cedor se prostra ;
Vem professar a vossa fé e culto
E crer n o verbo dos prophelas vossos.

(( Espalhe a fama pela terra toda


Que um arabe, que um chefe de valentes,
Irm ão dos vencedores quiz tornar-se,
E vassallo ficar de estranho sceptro 1 »

Cala no anim o nobre ao Castelhano


Um a c l o n o b r e . . . O chefe com m o vid o,
Corre a abracal-o, e á sua vez os outros
Fazem o m esm o ao n o v o co m p an h eiro .

A ’s saudações responde o em ir valente


Com saudações. Em cordial abraço
Aperta ao seio o com m ovido chefe,
T o m a -lh e das mãos e p en de-lhe dos lábios.
I

Súbito cabe, sem forças, nos j o e l h o s ;


Arranca do turbante, e com m ão trem ula
O enrola aos pés do chefe admirado,
E junto delle arrasta-se por terra.
Os olhos volve em torno e assom bra a todos:
Tinha azuladas, lividas as faces,
T orcid os lahios por feroz sorriso,
Injeclados do san gu e ávidos olhos.
■V
(( Desfigurado e pallido m e vedes,
O ’ infiéis I Sabeis o que vos trago ?
E n g a n e i - v o s : eu volto de Granada,*
E a peste fulminante aqui vos trouxe. »

R ia-se ainda — morto j á — e ainda


Abertos tinha as palpebras e os lábios ;
Um sorriso infernal de escarneo impresso
l I *■ Deixára a morte nas feições do morto.

Da m edonh a cidade os castelhanos


F o g em . A peste os segu e. Antes que a custo
D eixado hou vessem de Alpujarra a serra,
Su ccu m biram os últimos soldados.
Car la beauté tue
Qui l’a vue,
Klle enivre et tue.

T u nasceste de um beijo e de um olhar. 0 beijo


N ’ uma hora de am or, de ternura e desejo,
Uniu a terra e o c é u . O olhar foi do Sen h o r,
O lhar de vida, olhar de graça, olhar de a m o r ;
Depois, depois vestindo a fórm a peregrina.
Aos m eus olhos mortaes, surgisle-m e, Corinna !

De um júbilo divino os cantos entoava


A natureza m ài, e tudo palpitava.
:4 '

'J . íz: 126 ci :

A Hor aberta e fresca, a pedra bronca e rude,


De uma vida m elhor e nova ju v en tu d e.

M inh’ alma adivinhou a origem do teu ser ;


Quiz cantar e sentir ; quiz amar e viver ;
A ’ luz que de ti v in h a, ardente, viva, pura,
Palpitou, reviveu a pobre creatura ;
Do amor grande, elevado, abriram -se-lh e as fontes ;
Fulgirarn novos sóes, rasgaram -se horisontes ;
Surgiu, abrindo em flor, uma nova regiào ;
Dra 0 dia m arcado á m in h a redem pçào.

Era assim que eu sonhava a m u lh er. Era assim :


Corpo de fascinar, alma de ch eru b im ;
Era assim : fronte altiva e gesto soberano,
Um porte de rainha a um tempo meigo e ufano,
Em olhos senhoris uma luz tao serena,
E grave com o Juno, e bella como Helena I
Era assim, a m ulh er que extasia e dom ina,
A m ulher q ue reune a terra e o céu : Corinna 1

Neste fundo sentir, nesta fascinação,


Que pede do poeta o amante coração ?
Viver com o nasceste, ó belleza, ó primor.
De um a fusão do ser, de um a eflusão do am or.
127

V i v e r , — fundir a existência
E m um osculo de am o r,
Fazer de am b as— uma essencia,
A pagar outras lem branças,
P erder outras illusões,
E ter por sonho m elhor
O sonh o das esperanças
De q u e a unica ventura
Nào reside em outra vida,
Não vem de outra creatura ;
C onfundir olh os nos olhos,
I
Unir um seio a outro seio,
D erram ar as m esm as lagrimas
E trem er do m esm o enleio,
T e r 0 m esm o coração,
V iver um do outro v iv e r ...
Tal era a m inha am bição.

Donde viria a ventura


Desta vida ? Em que jardim
Colheria esta flor p u r a ? \\i
Em que solitaria fonte
Esta agua iria beb er ?
Em que encendido horisonte
Podiam m eus olhos ver
Táo m eiga, tão viva estrella,
A b rir-se e re sp lan d ecer?
Só em ti em ti que és bella,
Em li que a paixão respiras,
Em ti cujo olhar se e m b eb e
Na illusão de que deliras,
Em ti, que u m osculo de H ebe
T e v e a singular virtude
De encher, de animar teus dias,
i ‘. De vida e de j u v e n t u d e . ...

l\p.. A m em os 1 diz a ílor á brisa peregrina,


■> * 1
A m em os 1 diz a brisa, arfando em torno á ílor ;
Cantemos esta lei e vivam os, Corinna,
De uma fusão do ser, de uma eíTusão do amor.
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Mon pauvre cœur, reprends ton sublime couiage


Etme chantes ta joie et ton déchirement. —
A. Houssage .

A m inha alm a, talvez, não é tão pura,


C om o era pura nos primeiros d i a s ;
E u s e i ; tive ch o radas agonias
De q u e conservo algu m a nodoa escura. A"- I]

T alvez. A penas á m an hã da vida


Abri m eus olhos virgens e m inha alma,
Nunca mais respirei a paz e a calm a,
E me perdi naporfiosa lida.
Não sei que fogo interno m e impellia
A ’ conquista da luz, do am o r, do gozo,
Não sei q ue m ovim en to im perioso
De um desusado ardor m inha alma en ch ia.

Corri de cam p o em cam p o e plaga em plaga.


(Tanta anciedade o coração encerra !)
A ver 0 lyrio q ue brotasse a terra,
A ver a escum a que cuspisse — a v a g a .

>*
Mas, no areai da praia, no horto agreste,

T u d o aos m eus olhos ávidos f u g ia ......
, ,' p‘ .
i Desci ao chão do valle q u e se abria.
m S u b i ao cu m e da m ontanha alpestre.

N a d a i Volvi o olhar ao céu . P erd i-m e


Em m eu s sonhos de m oço e de poeta ;
E contem plei, nesta am bição inquieta,
1+iA -'t: ' Da m uda noite a pagina su b lim e.
N
[A* ïir ' 1

T om ei nas m ãos a cythara saudosa,


IC soltei entre lagrim as um c a n t o . ..
A terra brava recebeu m eu pranto
E 0 eco repetiu-m e a voz chorosa.
Foi em vão. C om o u m lân gu id o suspiro,
A voz se m e calo u , e do invio m onte
O lhei ainda as linhas do horisonte,
C om o se olhasse o ultim o retiro.

N u v em n egra e veloz corria solta


O anjo da tem pestade a n n u n c ia n d o ;
V i ao longe as alcyones cantando
D oidas corren d o á flor da agua revolta.

Desilludido, exh au sto, erm o, perdido,


B u sq u ei a triste estancia do a b a n d o n o ,
E esperei, a g u a rd a n d o o ultim o som n o,
V olver á terra, de que foi nascido.

— (( O ’ Cybele fecunda, é no rem anso


Do teu solo — que vive a creatura ;
C h a m e m -te outros morada triste e escura.
C ham o-te gloria, cham o-te descanso ! »

Assim fallei. E m urm u ran do aos ventos


U m a blasphem ia atroz — estreito abraço
H o m e m e terra uniu , e em longo espaço
Aos ecos repeti meus vàos lamentos.
Mas, tu p a s s o s l e .. . H o u v e um grito
D e n t r o (le m im . Aos m eu s olhos
Visào de am or infinito,
Visão de perpetuo gozo
P erp assava c me attrahia,
Como um sonho voluptuoso
De sequiosa fantasia.
E rgu i-m e logo do chão,
E pousei meus olhos fundos
Em teus olhos soberanos.
Ardentes, vivos, profundos,
Com o os olhos da helleza
Q ue das escum as n a s c e u .. .
’0 Eras tu, m aga visão
Eras tu o ideal sonhado
O ne cm toda a parto busquoi,
E por q uem houvera dado
A vida que fatiguei ;
»
Por quem verti tanto pranto.
S P or q u em nos longos espinhos
Minhas mãos, m eus pés sangrei !

Ma? se m in h ’alma, acaso, é menos pura


Do q u e era pura nos primeiros dias,

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rz 133

P o rq u e nào soube em tantas agonias


A b en çoar a m inha desventura ;

Se a blasphem ia os m eus lábios polluira,


Q n an do, depois do tem po e do cansaço,
Beijei a terra no m ortal abraço
E espedacei desanim ado a lyra ;

Podes, visào formosa e peregrina,


No am or profundo, na existência calm a,
Desse passado resgatar m in h ’alma
E levantar-m e aos olhos teus, — Corinna 1 m
Se tu podesses viver um dia na mi-
nli’alm a.... feliz creatiira, tu saberias
0 que é soffrer!
Miç k ie w ic z .— S oncíoi’ da Crimea.

Q uando voarem minhas esperanças,


Com o um bando de pom bas fugitivas ;
E destas illusões doces e vivas
Só me restarem pallidas lem branças ;
s. .'í A-
,
;
E abandonar-m e a minha m ãe C him era,
Que m e aleitou aos seios abun dantes ;
E vierem as nuvens llammejantes
Encher o céu da minha primavera ;

/ •
E raiar para m im um triste dia,
Em q u e , por completar m inha tristeza,
Nem possa ver-te, m usa da belleza,
Nem possa ouvir-te, musa da harm onia;

Q u a n d o assim seja, por teus olhos ju ro ,


Voto m in h ’ alma á escura soledade.
S em p ro cu rar m elhor felicidade,
E sem ambicionar prazer mais puro.

Com o 0 viajor que, da fallaz miragem


Volta desenganado ao lar tranquillo,
li E procura, naquelle ultimo asylo,
■it ■

» 1 Nem evocar m em órias da viagem ;

E nvolvido em m im m esm o, olhos cerrados


A tudo m a is,— a m inha fantasia
As azas colherá com que algum dia
Quiz alcançar os cimos elevados.

E ’s tu a maior gloria de m inha alma,


Se 0 m eu amor profundo não te alcança,
De q ue m e servirá outra esperança ?
Q ue gloria tirarei de alheia palma ?
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★ ★

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a 137 :=:

Q ue valem glorias v ã s ? A gloria, a m elhor gloria,


IV esta que nos orna a poesia da historia ;
IV a gloria do céu, é a gloria do am or.
E ’ Tasso eternisando a priuceza L eo n o r ;
E ’ Lydia ornando a lyra ao venusino Horacio ;
E ’ a doce Beatriz, flor e honra do Lacio,
S eg u in d o além da vida as viagens do Dante ;
E ’ do cantor do Gam a o h y m n o triste e amante
L evan d o á eternidade o amor de Calharina ;
E ’ 0 amor q u e une Ovidio á formosa Corinna *,
O de Cynthia a Propercio, o de Lesbia a Catullo ;
O da divina Delia ao divino Tibullo.
Esta a gloria q u e fica, eleva, honra e consola ;
Outra não ha m elhor.
Se faltar esta esmola,
Corinna, ao teu poeta, e se a doce illusào,
Com q u e se alenta e vive o amante coração.
Deixar-lhe u m dia o céu tão azul, tão tranquille,
N enhum a gloria mais ha de nunca attrahil-o.
Irá longe do m u n d o e dos seus vãos prazeres.
Viver na solidão a vida de outros seres, ■
Vegetar com o o arbusto, e m u rch ar, como a flor,
C om o um corpo sem alma ou alma sem amor.
¥
★ ★
Ah 1 faze quo estas illusoes lao vivas
Nunca se tornem pallidas lem branças ;
E n em voem as m inhas esperanças
Com o urn b an do de pom bas fugitivas 1
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Ne vois-lu pas? Is
A . iM .

T u que és bella e feliz, tu que lens por diadema


A dupla irradiação da belleza e do am or ;
E sabes reunir, com o o rnelhor poema,
Um desejo da terra e um toque do Sen hor ;

T u , creação feliz de um dia de pureza.


Em que a terra não teve um só peccado, irmã
Das visões que sonhou no culto da bellcza
A m usa de Petrarca e o pincel de R e m b r a n t ;
T u que, com o a illusão, entre nevoas deslisas
Aos versos do poeta u m desvellado oihar,
Corinna, ou v e a canção das amorosas brisas,
Do poeta e da lu z, das selvas e do m ar.

AS BRISAS.

Deu-nos a harpa eólia a excelsa melodia


Que a folhagem desperta e torna alegre a flor,
Mas que vale esta voz, ó musa da harm onia.
Ao pé da tua voz, filha da harpa do amor ?

Diz-nos tu com o houveste as notas do teu canto ?


Que alma de serafim volteia aos lábios teus ?
D onde houveste o segredo e o poderoso encanto
Que abre a ouvidos m orlaes a harm onia dos c é u s ?

A LVZ.

Eu sou a luz fecunda, alma da natureza ;


Sou 0 vivo alimento á viva creação.
Deus lançou-m e no, espaço. A minha realeza
Vae até onde vae m eu vivido clarão.

zi] 141 c:

Mas se derram o vida a Cybelle fecunda,


O u e sou eu ante a luz dos teus olhos ? Melhor,
A tua é mais do céu, mais doce, mais profunda,
Sü a vida vem de m im , tu dás a vida e o am or. .

AS AGUAS.

Do n um e da belleza o berço c e le b r a d o .
Foi 0 m ar. V en u s bclla entre espum as nasceu.
Veio a idade de ferro, e o n u m e venerado
Do venerado altar baq u eou :— pereceu.

Mas a belleza és tu. Com o V enus m arin ha,


í 'V;a
T en s a ineííavel graça e o ineffavel ardor.
Se paras, és um n u m e ; andas, um a rainha,
E se quebras um olhar, és tudo isso e és arrior !

C ham am -te as aguas, vem ! tu iras sobre a vaga


A vaga, a lua m àe, que te abre os seios nús,
B u s c a r adorações de uma plaga a outra plaga,

E das regiões da nevoa ás regiões da luz !


Um silencio de morte entrou no seio ás selvas.
Já não pisa Diana este sagrado chão ;
. I
‘ ■’ V Nem já vem repousar no leito destas relvas
Aguardando saudosa o amor e E ndym ião.

Da grande caçadora a um solicito aceno


Ç, Já nào v em , nào acode o gru p o jovial ;
Nem 0 éco repete a ílauta de Sileno,
A p o z 0 grand e ruido a m udez sepulchral.

Mas Diana apparece. A floresta palpita,


Uma seiva m elhor circula mais veloz ;
L vida que renasce, é vida que se agita ;
A ’ luz do teu olhar, ao som da tua voz 1
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1 t
V 0 POETA.

Tam bém eu, sonhador, que vi correr meus dias


Na solem ne m udez da grande solidão,
E soltei, enterrando as m inhas utopias,
O ultimo suspiro e a ultima oração ;
%

143

T a m b é m e u j u n l o a v o z á voz da natureza, 'í


i E soltando o m eu h y m n o ardente e trium phal,
I Beijarei ajoelhado as plantas da belleza
[| E b a n h a re i m in h ’alm a em tua l u z , — Ideal !
j

^ Ouviste a natureza ? A ’ s supplicas e ás m aguas


/ *1
T u a alma de m u lh er deve de palpitar ;
Mas q u e te não seduza o cântico das aguas,
Não procures, Corinna, o cam inho do m ar 1

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Povero mio core ! Ecco una separazione


(li piú nella mia scigurata vita Î ~t
S ilvio P ellico .

G u arda estes versos que escrevi chorando


C om o ura alivio á minha soledade,
C om o um d e v e r do m eu am or ; e q uan do
H o u v er em ti u m éco de saudade.
Beija estes versos que escrevi chorando.

Unico em m eio das paixões vulgares,


F ui a teus pés queim ar m in h ’alma anciosa,
Com o se queim a o oleo ante os altares ;
T iv e a paixão indomita e fogosa,
Unica em meio das paixões v u lg a res.
13
Cheio de am or, vasio de esperança,
Dei para ti os m ens primeiros passos ;
•i■ ï. Minha illusão fez-me, talvez, criança ;
:VI E eu pretendi dormir aos teus abraços,
Cheio de am or, vasio de esperança.

Refugiado á sombra do mysterio


P ud e cantar m eu h y m n o doloroso ;
E 0 m un do o u v i o o som doce ou funereo
S e m conhecer o coração ancioso
R efugiado á som bra do m ysterio.

% ê:
Mas eu q u e posso contra a sorte esquiva ?
I Vejo q ue em teus olhares de princeza
T ransluz uma alma ardente e compassiva
ít ; Capaz de reanim ar m inha incerteza ;
I( • Mas eu que posso contra a sorte esquiva ?

Como um réo indefeso e ab an d on ad o.


Fatalidade, c u r v o -m e ao teu gesto ;
R i E se a perseguição me tem cansado,
E m bora, escutarei o teu areslo
Como um réo indefeso e abandonado.

í;
4

I
^ 147 cz]

Embora fujas aos m eu s olhos tristes,


M in h’alma irá saudosa, enam orada,
Acercar-se de ti lá on d e existes; m
Ouvirás m in ha lyra apaixonada,
E m bora fujas aos m eus olhos tristes.

T alv ez u m dia m e u am or se extinga,


Com o fogo de Yesta mal cuidado
Q ue sem o zelo da Vestal náo vinga ; I
Na ausência e no silencio condem nado
Talvez um dia m eu am or se extinga.

Então não busques reavivar a ch am m a ;


E voca apenas a lem brança casta
Do fundo am or daquelle q u e não ama ;
Esta consolação apenas basta;
Então não b usqu es reavivar a ch a m m a.

G uarda estes versos que escrevi chorando


Com o um alivio á m inha soledade,
Com o um dever do m eu am or ; e quando
H ouver em ti um éco de saudade.
Beija estes versos q u e escrevi chorando.
o amor tem azas, mas elle lambem
pode dal-as.
Hom ero .

Em vào ! Contrario a am or é nullo o esforço hum ano;


E ’ nullo 0 vasto espaço, é nullo o vasto oceano.
Solta do chào, abrindo as azas luminosas,
iMinh’alma se ergue e vôa ás regiões venturosas,
O n d e ao teu brando olhar, o formosa Corinna,
R eveste a natureza a purpura divina !

Lá, com o quando volta a primavera em ílor,


T u d o sorri de luz, tudo sorri de am or ;
<*•
'I í

150 ci:

Ao influxo celeste e doce da belleza,


Pulsa, canta, irradia e v i v e a natureza ;
Mais languida e mais bella a tarde pensativa
Desce do m onte ao valle ; e a viraçào lasciva
1'^ Vai despertar á noite a melodia extranha
Que faliam entre si os olmos da m ontanha ;
A flor tem mais perfume e a noite mais poesia ;
O mar tem novos sons e mais viva ardentia ;
A onda enam orada arfa e beija as arêas,
Novo sangue circula, ó terra, em luas veias 1

O esplendor da belleza é raio crèador :


Derrama a tudo a luz, derrama a tudo o amor.

I(
i!.'! » xMas vê. Se o que te cerca é um a festa de vida,
Eu, tào longe de li, sinto a dor mal soíTrida
Da saudade que p un ge e do am or que lacera,
E palpita e soluça e sangra e desespera.
Sinto em torno de m im a m uda natureza
Respirando, com o eu, a saudado e a tristeza;
A saudade do bem e a tristeza do mal ;
Tristeza sem irm à,sa u d ad e sem igual.
ci: 151 =

E ’ (leste erm o q ue eu vou, alma desventurada,


M urm urar ju n to a li a estrophe im m aculada
Do am or q u e n à o perdeu, co’ a ultima esperança,
Nem 0 intenso fervor, n em a intensa lem b ra n ça . . a;I

Sabes se te eu am ei, sabes se te am o ainda,


Do m eu som brio céu alva estrella bem vin da !
Como divaga a abelha inquieta e sequiosa
Do cálice do lyrio ao cálice da rosa,
D ivaguei de alma em alma em busca deste a m o r ;
Gôta de mel divino, era divina a flor
Q ue 0 devia conter. Eras tu.
íá
No delirio
De te a m a r — olvidei as lutas e o m artyrio;
Eras tu. Eu só quiz, n ’ uma ventura calm a.
Sentir e ver o am or atravez de uma alma ;
De outras bellezas vans nào valeu o esplendor,
A belleza eras tu : — tinhas a alma e o amor.

Pelicano do am or, dilacerei meu peito, ■


E com nieu proprio sangue os filhos m eus aleito ;
Meus filhos : o desejo, a chim era, a esperança ;
Por elles reparti m in h ’alma. Na provança
Ella nào fraqueou, antes surgio mais forte ;
F/ que eu puz neste am or, neste ultimo transporte
T u d o 0 q u e vivifica a m inha ju v e n tu d e :
O culto da verdade e o culto da virtude,
A venia do passado e a am biçào do fu turo,
O que ha de grande e hello, o q u e h a de n obre e puro.

Deste profundo am or, doce e am ada Corinna,


Acorda-te a lem brança um éco de aíflicçào ?
M inh’alma pena e chora á dôr q u e a desatina :
Sente lu ’ alma acaso a m esm a com m o çào ?

Em vào! Contrario a am or é nullo o esforço h u m a n o ,


E ’ nullo 0 vasto espaço, é nullo o vasto oceano 1

Vou, sequioso espirito.


Cobrando n ovo alento,
' N ’aza veloz do vento
Correr de m ar em m a r ;
Posso, fugindo ao cárcere,
Que á terra me tem prezo,
Em novo ardor aceso,
Voar, voar, voar !
Então, se á hora languida
Da tarde que declina,
Do arbusto da collina
Beijando a folha e a flor,
A. brisa melancólica
L ev ar-te entre perfum es
Uns timidos q u eix u m es
E ch os de m agua e dor ;

Então, se o arroio timido


Que arrasta-se e m urm u ra
A ’ som bra da espessura
Dos verdes salgueiraes.
M andar-te entre os m urm urios
Que solta nos seus giros,
Uns com o que suspiros
D ’ amor, uns ternos ais ;

Então, se no silencio
Da noite adorm ecida.
Sentires— mal d o rm id a—
Em sonho ou em visão,
Um beijo em tuas palpebras,
'^

ULTIMA FOLHA.

'X-'
Tout passe, II V
Tout íuit. ip -
•O ' '1

V. Hugo. T
"V'S

M usa, desce do alio da m ontanha


O nde aspiraste o arom a da poesia,
E deixa ao éco dos sagrados erm os
A ultim a h arm on ia.
%

D os teus cabellos de ouro, q ue beijavam 4


Na am ena tarde as viracões perd idas,
D eixa cah ir ao chào as alvas rosas
E as alvas m argaridas.
r mf f
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í i !

Î = loG ^
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i; "• V ês ? Não é noite, não, este ar som brio
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'V' Q ue nos escond e o céu . Inda no poente


1 Não quebra os raios pallidos e frios
0 sol resplandecente.
V, «

Vês ? Lá ao fundo o valle arido e secco


A b re -se , com o um leito m ortuário ;
E sp era-te o silencio da p lan icie,
Com o um frio su d ario.

D esce. Virá um dia em que m ais b ella,


Mais alegre, m ais ch eia de harm on ias,
<1 ' V oltes a p rocu rar a voz caden te
IM .
Dos teus prim eiros dias.

Entàú coroarás a ingênuo fronte


Das flores da m a n h a ,— e ao m onte agreste,
Com o a n oiva p hantastica dos erm os,
Irás, m usa celeste !

E ntão, nas horas solem n es


E m (jue 0 m yslico h ym en eu
U ne em abraço divin o
V erd e a terra, azu l o céu ;

n
Q u a n d o , já finda a torm enta
Q ue a n atureza en lu clo u ,
B afeja a brisa suave
C edros q u e o ven to abalou ;

E 0 rio , a arvore e o cam p o,


A area, a face do m ar.
P a re cem , com o urn concerto,
P alp itar, sorrir, orar ;

E ntão sim , alm a de poeta,


Nos teus sonhos cantarás
A gloria da n atureza,
A ven tu ra, o am or e a p az !

Ah 1 m as então será m ais alto ainda ;


Lá onde a alm a do vate
* ^
Possa escutar os an jos,
E onde não c h e g u e o vão rum or dos hom ens ;

Lá on d e, abrindo as asas am biciosas,


Possa ad ejar no espaço lu m in oso,
Y iv e r de lu z m ais viva e de ar m ais p u ro.
F artar-se do in fin ito !
14
POST-FACIO.

( c a r t a AO DR. CAETANO FILGUEIRAS)


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Meu ftiiiigo. Agora q ue o leitor frio e severo
p ôd e com p arar o m eu pobre livro com a tua cri­
tica b en ev o la e am iga, d eixa-m e dizer-te rap id a­
m ente duas palavras.
R ecord aste os nossos am igos, poetas na a d o ­
lescên cia, hoje idos para sem pre dos nossos olhos e
da gloria q u e os esp erava. T ào piedosa evocaçào
será 0 palladium do m eu livro, com o o é a tua carta
de recom m en d açâo.
Vae longe esse tem p o. G uardo a lem brança d é l­
ié, tào viva com o a saudade que ainda sinto, m as
já sem aquellas illusões que o tornavam tào doce
ao nosso espirito. O tem po nào corre em vào para
os q u e desde o berço foram con dem n ados ao d u e lo
s S > infausto en tre a aspiração e a realid ad e. Cada anno
foi um a lufada q ue d esp ren d eu da arvore da m o ­
I*'., iij ,I cid a d e, não só um a alm a q uerida, com o um a illu-
;:V sao consoladora.
A tua penna en con trou espressões de verdade e
de sentim ento para d e screv er as nossas con fab u la­
ções de poetas, tão serenas e tão intim as. T iveste
0 condão de Iransportar-m e a essas praticas da ad o­
lescên cia poética ; len do a tua carta p areceu -m e
o u vir aquelles q u e h o je repousam nos seus tum ulos;
e ou vin d o dentro de m im um ru ido de applauso
sin cero ás tuas expressões, afíigurava-se-m e que
eram elles q u e te ap p iau diam , com o no outro tem ­
po, na tua pequena e facev^a salinha.
Essa recordação b astava para felicitar o m eu li­
vro , Mas on d e não vae a am isade e a critica b en ev o ­
lente ? Foste a lé m :— traduziste para o papel as tuas
im p ressões que e u ,— m esm o despido desta m odéstia
oíTicial dos p reâm bu los e d o s e p ilo g o s ,— não posso
d eixar de acceitar com o parciaes e filhas do co ra­
ção . B em sabes com o o coração póde levar a in ju s­
tiças in volu n tárias, ap ezar de todo o em p en h o em
m anter um a im parcialidade perfeita.
N ão, 0 m eu livro não vae a p a r e c e r com o o re-
163

suUado de u m a vocação su p erior. C onfesso o q u e


m o falta q u e é para ter direito de reclam ar o pouco
que p o s s u o . O m eu livro é esse p ou co q u e tu carac-
terisaste tão b em aitrib u in d o os m eus versos a u m
d esejo secreto de exp an são ; não cu ro de escolas ou
th e o ria s; no culto das m usas n ão 'sou ura sacer-
d o ie, sou um üel ob scu ro da vasta m u ltid ão dos
fieis. T a l sou eu , tal deve ser apreciado o m eu li-
vro ; n em m ais, nem m en os.
Foi assim q u e eu cu ltiv e i a poesia. S e com -
m etti um erro , tenho c ú m p lic e s , t u e tantos outros,
m ortos, e ainda v iv o s. A n im aram -m e,e b em sabes o
q u e vale um a anim ação para os in fan tes da poesia.
M uitas vezes é a sua p erd ição. Sêl-a-b ia para m im i'
O p ub lico q u e resp on d a.
Não inclu i neste volu m e todos os m eus versos.
F altou-m e o tem po para colligir e corrigir m uitos
d elles, filbos das prim eiras in certezas. V ao porem
todos! ou quasi todos os versos de recente data. Se
um escru p u lo de não accu m u lar m uita cousa sem
valor m e não detivesse, este prim eiro vo lu m e sa h i-
ria m enos m agro do que é •, entro os dois in co n ve­
nientes preferi o segu n d o .
Com o sab es, p u b lican d o os m eus versos cedo ás
I - ,íí

so llicilaçõ es de alguns am igos, a cuja frente te po-


zeste. D evo d eclaral-o, para que não recaia sobre
m im exclusivam ente a respon sabilidade do livro.
D enuncio os cúm plices para q u e soííram a sen -
■ 'V tonça.
^ Nào te bastou an im ar-m e a realisar esta p u b lica­
■I
ção ; a tua lealdade quiz q u e tom asses parte no com -
\ m etlim en lo, e com a tua propria firm a sellaste a
tua confissão. A grad eço -te o aclo e o m odo p o r que
0 praticaste. E se a tua b ella carta não puder s a l­
var 0 m eu livro de um insucesso fatal, nem por
ISSO deixarei de ex len d cr-te am igavel c fraternal-
m ente a m ão.
»'

M achado de As s is .

Hio de Janeiro, l.o de Septembro


de 1864.

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NOTAS.
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0 DILÚVIO. —Pag. 31.

E ao som dos nossos cânticos ; etc.

(Pag. 34).

Estes versos sào postos na boca de uma hebrea. Fo­


ram recitados no Atheneu Dramatico pela eminente ar­
tista D. Gabriella da Cunha, por occasião da exhibição
de um quadro do scenograplio Joào Caetano, represen­
tando 0 dilúvio universal.

A JOVEN CAPTIVA. —Pag. 43.

Foi com alguma hesitação que eu liz inserir no vo­


lume estes versos. Já bastava o arrojo de traduzira
.ví.
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h ,Vi,' maviosa elegia de Chenier. Poderia eu conservar a


F, U grave simplicidade do original? A animação de um
amigo decidio-me a não immolar o trabalho já feito ; ahi
fica a poesia; se me sahir mal, corre por conta do amigo
anonym 0 .

EMBIRRAÇÀO. —Pag. 71.


I’ '.4'^

Esta poesia, como se terá visto, é a resposta que me


deu 0 meu amigo F. X. de Novaes, a quem foram diri­
gidos os versos anteriores. Tão bom amigo e tão bello
nome tinham direito de figurar neste livro. 0 leitor
r ' ' í' apreciará, sem duvida, a diíficuldade vencida pelo poeta
que me respondeu em estylo faceto, no mesmo tom e
pelos mesmos consoantes.

CLEOPATRA.- -Pag. 75.

Este canto é tirado de uma tragédia de M.“* Emile de


(Jirardin. 0 escravo, lendo visto coroado o seu amor
pela rainha do Egypio, é condemnado a morrer. Com a
taça em punho, entoa o bello canto de que fiz esta mal
amanhada paraphrase.

*r.
1G9

os ARLEQUINS.—Pag. 81.

Esta poesia foi recitada no Club Fluminense, n’ura


sarao litterario. Pareceu então que eu fazia satyra pes­
soal. Não fiz. A satyra abrange uma classe que se en­
contra em todas as scenas politicas,— é a classe daquelles
que, como se exprime um escriptor, depois de darem ao
povo todas as insignias da realeza, quizeram comple-
tar-lh’a; fazendo-se elles proprios os bobos do povo.

POLONIA.—Pag. 89.

Eras livre, tào livre como as aguas


î)o teii formoso, celebrado rio.

(Pag. 90).

O rio a que alludem os versos é o Niemen. E’ um dos


rios mais cantados pelos poetas polacos. Ha um soneto
de Miçkiewicz ao Niemen, que me agradou muito, apezar
da prosa franceza em que o li, e do qual escreve um cri­
tico polaco : « Ha nesta pagina uma cantilena a que não
resiste nenbum ouvido slavo ; foi posta em musica pelo
celebre Kurpinski. Assim consagrado, o soneto do Nie_
men correu toda a Polonia, e só deixará de viver quando
deixarem de correr as aguas daquelle rio. » »WJ
15
170

Foi a liora dos hyinnos e das preces.

(Pag. 93).

Allude ás scenas da Varsovia, em que este admiravel


povo ia aos templos cantar ladainhas sobre a musica dos
hymnos nacionaes, a despeito da invasão da tropa ar­
yr
mada nas igrejas. E’ sabido que por esse motivo se fe­
charam os templos.

MARIA DUPLESSIS.—Pag. 97.

Em 1858, eu e 0 meu finado amigo F. Gonsalves Braga


resolvemos fazer uma traducção livre ou paraphrase
destes versos de Alexandre Dumas filho. No dia apra­
zado apresentamos e confrontamos o nosso trabalho. A
traducção delle foi publicada, não me lembro em que
jornal.

As ROSAS. —Pag. 105.

................. Se a mão de um poeta


Vos cultiva agora, ó rosas, etc.

O Dr. Caetano Filgueiras trabalha ha tempos n’um


^ I
livro de que são as rosas o titulo e o objecto. E’ um tra­
balho curioso de erudicção e de phantasia; o assumpto
fi'ï

V
171

requer, na verdade, um poeta e um erudicto. E’ a isso


que alludem estes últimos versos.

MONTE ALVERNE.—Pag. 111.

A dedicatória desta poesia ao padre-mestre Silveira


Sarmento c um justo tributo pago ao talento, eá amizade
que sempre me votou este digno sacerdote. Pareceu-me
que não podia fazer nada mais proprio do que fallar-lhe 4»\
de Monte Alverne, que elle admirava, como eu.
Não ha nesta poesia só um tributo de amizade e de
admiraçao: ha igualmonte a lembrança de um anno de
minha vida. O padre-mestre, alguns annos mais velho
do que eu, fazia-se nesse tempo um modesto preceptor e
um agradavel companheiro. Circumstancias da vida nos
separaram até hoje.

ALPUJARRA.—Pag. 119.

Este canto c extrahido de um poema do poeta polaco


Miçkicwicz, denominado Convttdo IVcLllcni od. Não sei
como corresponderá ao original; eu servi-me da traduc-
cão franceza do polaco Chrisliano Ostrowski.
Í72

\*-v VERSOS A CORINNA.—Pag. 123.

As tres primeiras poesias desla collecção foram pu­


blicadas sob 0 anonymo nas columnas do Correio M er­
can til \ a quarta e quinta sahiram no D iá rio do Rio^
sendo esta ultima assignada. A sexta é inteiramente
inedicta.
1

Li t'

I■

I*.,
ERRATA.

Pag. 10,
(3.* linha).

Em vez de :
era trefego, etc.
L ê a -se :
era travesso, etc.

P ag. 19.
(2.* linha).

Em vez de
i
— m ais inspirado, e talvez, etc.

L êa-se :
— m ais inspirado, talvez, e
(9.* îinha).
Em vez de :

0 bioco de u m a, etc.
L êa-se ;
O b ic o d e u m a , etc.
.s Km vez de :

Com o a area
Com o a area con fu nd ir. «
L êa -se :
Com a area
Com a area con fu n d ir.

P ag. 119.
Em vez de :

Pesados ferros o infeliz arrasta ;

r
M r. . L êa-se :
r í; "v
lí:V Pesados ferros o infiel arrasta ;
-iU:'
>■

. n St Pag. 121.
i \ :f: ■
1 Km vez de :

T o m a-lh e das m ãos e p en d e-lh e dos lábios.

L êa -se :

T o m a-lh e as m ãos e p en d e-lh e dos láb ios.


INDICE,

P ag .
P r e f a c io .............................................................. 7
Musa consolalrix..................... 21
S t e l l a ................................................................... 23
L u c i a ................................................................... 27
Dilúvio................................................................... 31

Visio........................................................................• 3,3

F é ........................................................................ 39 1

A Caridade.............................................................. 41

A joven ca p tiv a ................................................... 43


No lim ia r ................................... 47 Í5
Quinze annos........................................................ 31
S i n h à ................................................................... 53
Erro........................................................................ 57
Ludovina Moutinho.............................................. 59
Aspiração.............................................................. 65
Embirração (ao autor)......................................... 71
Cleopatra............................................................. 75
Os arlequins...................................................^ . 81
Epitaphio do M e x ic o ......................................... 87
Polonia................................................................... 89
As ondinas............................................................. 95
Maria Dupplessis..............................................• 97
Iloras v i v a s ...............................................................101
As r o s a s ................................................................... 103
»N î

178

Os clous horisontes............................... «. . . 107


Monte Alveme .......................................................... 111
As veiitoinhas. . . . • .......................................... 115
Alpujarra 119

VERSOS A CORINNA :

I
f. II
. i- l III
s \ IV
; . y
P» . ' V H ' ,
VI
Ultima follia......................................................... 155
Posi-facio.............................................................. 159
N o t a s ..........................................................................165'
Errata................................................................... 173
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Typ.de Qnirino e irmào


r. d’Assembléa, 5i.

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