A: Coordenadora da Equipe de Antropologia/Depto. de Ciências Sociais/CCHLA/UFRN Profa. Luciana Chianca
Natal, 22 de janeiro de 1999
Cara Professora,
Dirijo-me a Vossa Senhoria para solicitar a exclusão ou desconsideração de
minha assinatura no documento que propõe a criação do departamento de antropologia. Tal solicitação decorre das circunstâncias que se seguem:
1. Quando assinei o documento deixei claro verbalmente, que o estava fazendo
porque era testemunha da intenção e desejo da equipe em se tornar um departamento, intenção essa explicitada ao longo dos anos em que participei com assiduidade das reuniões. Entendia, e deixei claro, ao assinar o referido documento que, apesar de não compartilhar da idéia disciplinar, posição por demais explícita em minhas publicações e práticas acadêmicas, não deveria obstacularizar um projeto obstinado e obsessivo da equipe, em tornar-se formalmente um espaço disciplinar por excelência. Entendia, portanto, que estava testemunhando o desejo histórico de uma equipe, do qual apesar de não compartilhar, não poderia me valer da intransigência para impedí-lo, sobretudo, porque não tenho, ultimamente, participado dos projetos do grupo, restringindo-me a ministrar disciplinas de Antropologia, o que faço com imenso prazer e dedicação, transmitindo aos estudantes as inquietações cognitivas mais avançadas no campo das ciências humanas;
2. Quando, da assinatura do documento, fui inquirida pela Profa. Anita Q. Monteiro
se, criado o departamento, optaria por minha lotação como docente naquela unidade acadêmica. Respondi-lhe que "não", uma vez que minha prática de pesquisadora e docente na UFRN, está em clara adesão a um projeto de ciência e universidade que tenta religar os conhecimentos disciplinares e reduzir a fratura entre cultura científica e cultura humanística. Explicitei, na oportunidade, meus compromissos com outros espaços desta universidade onde desempenho atividades docentes, e que, caso o departamento viesse a ser criado, eu optaria por continuar lotada no departamento de Ciências Sociais - espaço sem dúvida mais heteróclito e aberto do que um departamento de antropologia, de caráter marcadamente disciplinar do qual discordo. Entretanto, se não empresto adesão, até compreendo e respeito a iniciativa dos colegas, motivada que tenho sido, pela recusa à intransigência intelectual do pensamento monolítico das certezas únicas.
3. Hoje, passado algum tempo, e tendo acompanhado as discussões que pretendem
atrelar a criação do referido departamento ao processo de reestruturação do Museu Câmara Cascudo, e, sobretudo, em discordância aberta com a estratégia da equipe de antropologia, em encaminhar seu projeto em dissintonia com o departamento de Ciências Sociais, do qual a equipe é parte constitutiva, me sinto no dever de deixar clara minha exclusão diante de um processo que julgo, pautado pela falta de um diálogo institucional mais aberto.
Em síntese, se fui complacente ao assinar o referido documento, em
dissintonia, com meus ideários de uma ciência menos fragmentada, hoje me manifesto em discordância aberta com a forma como tem sido encaminhado tal projeto, claramente à revelia do departamento do qual faz parte, o que fere, frontalmente, os princípios básicos da ética acadêmica e universitária.
Dra. Maria da Conceição X avier de Almeida
Antropóloga
C/Cópia: Chefe do Departamento de Ciências Sociais