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HISTÓRIA DA IGREJA
LATINO-AMERICANA
(1930 a 1985)
2ª edição
Título original
Los últimos 50 años (1930-1985) en Ia historia de Ia Iglesia en América
Latina
© Indo-American Press Service - Editores - Colômbia, 1986
Tradução
Eugenia Flavian
Revisão
José Joaquim Sobral
© PAULUS - 1989
Rua Francisco Cruz, 229
04117-091 São Paulo (Brasil)
Fax (011) 575-7403
Tel. (011) 572-2362
ISBN 85-349-0380-8
SIGLAS E ABREVIATURAS
AC - Ação Católica
ACO - Ação Católica Operária
ACU - Agrupamento Católico Universitário (Cuba)
AEC - Associação de Educação Católica
ANEC - Associação Nacional de Estudantes Católicos
(Chile)
ASICH - Associação Sindical Chilena (1941)
ASJ - Ação Social da Juventude Católica (Peru)
CCTRN - Central Sindical Rerum Novarum (Costa
Rica, 1943)
CEBs - Comunidades Eclesiais de Base
CEDOC - Confederação Equatoriana de Operários
Católicos
CEHILA - Comissão de Estudos de História da Igreja da
América Latina
CELAM - Conselho do Episcopado Latino-americano
CENAMI - Centro Nacional de Ajuda às Missões Indígenas
(México)
CENCOS - Centro Nacional de Comunicação Social
(México)
CHR - Conferência Haitiana dos Religiosos
CIAS - Centro de Pesquisas e Ação Social
CIEC - Confederação Latino-americana de Educação
Cristã (Bogotá)
CIMI - Conselho Indigenista Missionário
CLAJOC - Conferência Latino-americana da JOC
CLAR - Conferência Latino-americana de Religiosos
CLASC - Confederação Latino-americana de Sindicalis-
tas Cristãos (Santiago)
CNBB - Conferência Nac. dos Bispos do Brasil (1952)
CNOC - Conferência Nacional de Operários Católicos
(1936)
5
CON - Conferência de Organizações Católicas
~
Nacionais (México)
CONFERRE - Conferência dos Religiosos (Chile)
CONFREGUA - Conferência dos Religiosos da Gua-
temala
CONIP - Coordenadoria Nacional da Igreja
Popular (El Salvador)
COPEI - Democracia Cristã Venezuelana
COSDEGUA - Confederação dos Sacerdotes da
Guatemala
CTCR - Central dos Trabalhadores Costa-rique-
nhos
DC - Democracia Cristã
DEI - Departamento de Estudos e Pesquisas
(Costa Rica)
EATWOT - Associação Ecumênica dos Teólogos
do Terceiro Mundo
ECN - Exército Cristão Nacionalista (Bolívia)
EECR - Escola Ecumênica de Ciências Reli-
gíosas
ELN - Exército de Libertação Nacional
(Colômbia)
EUA - Estados Unidos da América
FANAL - Federação Agrária Nacional (Colôm-
bia)
FLAC - Formação, Liturgia, Apostolado,
Catequese (Cuba)
FSLN - Frente Sandinista de Libertação Na-
cional
HGIAL - Historia General de Ia Iglesia en América
Latina (CEHILA)
HI - Historia de Ia Iglesia en América Latina
(E. Dussel)
INPE - Instituto Nacional de Pastoral Equa-
toriana
6
INPROA - Instituto para a Reforma Agrária
(Chile)
IPLA -Instituto de Pastoral para a América
Latina (Quito)
IRFED -Instituto de Pesquisa e Formação Social
(Paris, 1958)
ISAL -Igreja e Sociedade na América Latina
(Bolívia)
ISEB - Instituto Superior de Estudos Brasileiros
ISPLA - Instituto de Pastoral Itinerante (Equador)
ITAC - Instituto Teológico da América Central
JAC - Juventude Agrária Católica
JEC - Juventude Estudantil Católica
JOC - Juventude Operária Católica
JUC - Juventude Universitária Católica
LEC - Liga Eleitoral Católica
LEO - Liga Espiritual Operária (Costa Rica)
MAPU - Movimento de Ação Popular Universitária
(Chile)
MEB - Movimento de Educação de Base (1961)
MFC - Movimento Familiar Cristão (Uruguai)
MIEC - Movimento Independente de Estudantes
Católicos
MLN - Movimento de Libertação Nacional (Tupa
maros)
MNCL - Movimento Nacional Cristão de Libertação
(Equador)
MP - De Medellín a Puebla (E. Dussel, Loyola)
MSPTM - Movimento de Sacerdotes para o Terceiro
Mundo
ODCA - Organização Democrática Cristã da Amé-
rica
OSLAM - Organização de Seminários Latino-america-
nos (Tlalpan)
SEDAC - Secretariado Episcopal da América Central
7
SEDOC - Serviço de Documentação (Vozes)
SIAC - Secretariado Latino-americano de Ação Ca-
tólica (Santiago)
SSM - Secretariado Social Mexicano (1922)
TL - Teologia da Libertação
UNE - União Nacional dos Estudantes
UNEC - União Nacional dos Estudantes Católicos
(Peru)
UPCA - União Popular Católica Argentina (1919)
URSS - União das Repúblicas Socialistas Soviéticas
UTC - União dos Trabalhadores da Colômbia
(1945)
8
Nota introdutória
9
I.
A IGREJA NA ERA DOS POPULISMOS (1930-
1959)
2. Cf. Octavio lanni, La formación del Estado populista en América Latina, Era,
México, 1975; Francisco Weffort, Populismo, marginación y dependencia, San
José, 1973; G. Germani -Torcuato di Tella, Populismo y contradicciones de clase
en América Latina, Era, México, 1973; A. Niekerk, Populism and Political
Development in Latin America, Rotterdam, 1974; E. Dussel, "El estatuto i-
deológico dei discurso populista", in ldeas y Valores, n. 50, Bogotá, ago. 1977,
pp. 35-69.
11
fascista (populismo do centro) a maneira de desenvolver
seu potencial industrial e colonial.
É nesse contexto que os papados de Pio XI (1922-
1939) e Pio XII (1939-1958) ocupam totalmente o período
que tratamos. Na época de Pio XI, que simpatizou com os
"nacionalismos" desconfiando do socialismo, destacare-
mos dois anos fundamentais. Em 1931, quando escreve a
encíclica Quadragesimo Anno (dia 15 de maio), onde
critica o socialismo, e Non abbiamo bisogno (29 de junho),
colocando limites ao fascismo de Mussolini. Em 1937,
quando condena o nazismo de Hítler com Mit brennender
Sorge (14 de março) e põe limites ao socialismo com a
encíclica Divini Redemptoris (19 de março). A isto
acrescentamos certa tendência a assinar "acordos", entre os
quais não devemos esquecer aquele tão ambíguo feito com
o nazismo no dia 20 de julho de 1933. 3
Pio XII- cuja obsessão era salvar as estruturas da
Igreja no meio de uma Europa destruída, vendo com bons
olhos o triunfo nazista sobre a URSS como o mal menor,
mas também compreendendo o perigo totalitário do Estado
fascista contra a Igreja institucional- reconhece o governo
de Franco em setembro de 1937. Na América Latina, a
instauração da II República Espanhola, no dia 14 de abril de
193 1, o triunfo da Frente Popular, em 1936, e a guerra civil
até 1939, serão determinantes para a "divisão" dos cristãos.
Da mesma forma, o conflito mexicano dos "Cristãos", de
1926 a 1929, terá influência sobre os militantes.
Um fato a ser constatado é a estranha semelhança
e até íntima ligação da política norte-americana e vaticana,4
3. Sobre a Igreja em geral, nesta época, podem ser consultadas as obras de Hubert
Jedin, op. cit., t. VIII; A. Fliche-V. Martin, Histoire de l’Eglise, tomo corres-
pondente; L. Rogier-R. Aubier et alii, Nouvelle histoire de l’Eglise, Paris, t. IV,
1979 etc.
4. Cf. Avro Manhattan, The Vatican in World Politics, Gaer, Nova York, 1949;
Jacques Mitterrand, La politique exterieure du Vatican, Dervy - Livres, Paris,
12
em relação à América Latina, em questões tais como as
revoluções das Filipinas, Cuba e Porto Rico (1898), a
solução da crise "Cristera" (1929) e a política da "guerra
fria" a partir de 1945.
1959; Robert Gaham, Vatican Diplomacy, Princeton Univ. Press, 1959. Ver, de
modo especial, Samuel Silva Gotay, "La Iglesia católica en el proceso político de
Ia americanización de Puerto Rico (1898-1930)", in HGIAL, op. cit., t. IV (a Igreja no
Caribe) (em preparo).
5. Cf. minha "Introducción General", à HGIAL, t. I/1, pp. 73-80; Pablo Richard,
Morte das cristandades e renascimento da Igreja, Ed. Paulinas, São Paulo, 2ª ed.,
1984.
13
com eles. No final da década de 50, a Igreja está reorgani-
zada em nível nacional e, pela primeira vez, em nível latino-
americano para poder transformar-se em uma das prota-
gonistas dos períodos posteriores. O Cone Sul continuará
sendo, ainda, o lugar eclesial de maior criatividade, na
época de H. Truman (1945-1953) e de D. Eisenhower
(1953-1961), e das Democracias Cristãs européias (de De
Gasseri na Itália e Adenauer na Alemanha).
3. Os grandes desaflos
14
do Apostolado Secular. Pouco antes, em 1945, foi organi-
zada a I Semana Interamericana de Ação Católica, em
Santiago do Chile; em 1949 a II em Havana; a III em
Chimbote (Peru), em 1953.
15
Entre 1957-1961 foram organizados outros tipos
de experiências: a "Grande Missão" em uma cidade ou país,
de Tegucigalpa a Buenos Aires, mas agora com orientação
mais espiritualista e principalmente com missionários
espanhóis. Pretendia-se "converter" em massa. Nos anos
30, porém, pensava-se influir politicamente. A peregrina-
ção ao Cristo de Esquipulas, com a qual se conseguiu
enfraquecer o governo de J. Arbenz em 1953 (Guatemala),
pode ser o melhor exemplo deste tipo de manifestações
religiosas.
A terceira maneira é a Ação Social principalmente
no setor trabalhista. O corporativismo proposto pela Qua-
dragesimo Anno (1931) abriu o caminho para a "Doutrina
Social", que Pio XII tanto incentivou: uma espécie de
crítica reformista ao capitalismo. Grupos como "Economia
e Humanismo" do padre Lebret (1942) ou o "personalismo"
de E. Mounier (que fundou Esprit em 1932) terão influência
na América Latina. Em geral os movimentos eram "pater-
nalistas": agrupamentos operários sem compromisso clas-
sista, anticomunistas, freqüentemente "devocionistas". No
entanto, na década de 50, pela atuação da JOC, faz-se
presente certo classismo. Os sindicatos reformistas radica-
lizam-se e começa uma tomada de consciência cristã da
classe operária. O desenvolvimentismo de alguns grupos,
como o Instituto de Pesquisas e Formação Social (IRFED,
Paris, 1958), faz-se presente no final do período. Agrupa-
mentos, sindicatos, centros de estudo, publicações, rádios,
cooperativas etc., multiplicam-se em todos os países.
A quarta maneira é o anticomunismo mais ou
menos combativo. Na primeira fase (1930-1945) o anti-
comunismo da Igreja liga-se à sua antiga aliança com os
partidos conservadores e a oligarquia tradicional. Na se-
gunda fase do pós-guerra (1945-1959) torna-se muito mais
militante dentro da política americana da "guerra fria",
começando a apoiar as ditaduras de novo naipe: cada vez
16
menos populistas e mais autoritárias, como as de Trujillo,
Somoza, Stroessner etc. Quanto mais militante esse anti-
comunismo (como na Guatemala ou na Colômbia), mais
estreita a aliança com as classes dominantes. Na medida em
que a Igreja encontra um modelo democrático ou moderni-
zador (como no Chile), seu anticomunismo toma-se menos
necessário, como nos casos de Mons. Sanabria na Costa Rica e
Mons. Larraín no Chile.
7. Cf. minha HI, op. cit., pp. 177ss., e meu artigo, "Hipótesis para una historia de
la teología en América Latina (1492-1980)", in Historia de la teología en
América Latina, DEI, San José, 1981, pp. 418ss.
17
Buenos Aires (1960), Valparaíso e Centroamérica na
Guatemala (1961) etc. A I Assembléia Ibero-americana de
Universidades Católicas foi realizada em Lima, em 1944.
Grandes revistas filosóficas e teológicas como
Sapientia (Buenos Aires), Revista Eclesiástica Brasileira
(Petrópolis), Teología y Vida (Santiago), Stromata (Buenos
Aires), Christus (México) e muitas outras fecundavam a
renovação intelectual da nova geração.
A obra de Juan Luis Segundo SJ, Función de la
iglesia en la realidad rioplatense, 1959 (Barreiro y Ramos,
Montevidéu, 1962) é a reflexão teológica que encerra esta
época e inaugura a teologia latino-americana contempo-
rânea.
0 segundo nível é a renovação pastoral. Em pri-
meiro lugar toma-se consciência da situação existente gra-
ças ao Centro de Pesquisas Sociais e Religiosas (Buenos
Aires), Centro de Pesquisa e Ação Social (Santiago), Cen-
tro de Pesquisas Sociais (Bogotá), Centro de Pesquisas
Sócio-religiosas (México) e os padres jesuítas que fundam
CIAS em quase todos os países.8 No final do período,
promove-se a chamada "pastoral de conjunto" que parte das
experiências do Pe. Boulard na França. Lenta renovação
litúrgica, com traduções bíblicas atualizadas e missais
bilíngües. Renovação catequética, até a fundação do Insti-
tuto Catequético Latino-americano em Santiago, em 1961.
Renovação da espiritualidade, com a presença de benediti-
nos de Solesmes, em Los Condes (Chile, 1938), beneditinas
em Santa Escolástica (Buenos Aires), a abadia de Einsie-
18
deln funda Los Toldos (Argentina, 1947) etc. Depois virá a
difusão dos trapistas (Azul, Argentina) e os Irmãozinhos e
Irmãzinhas de Charles de Foucauld. A partir da encíclica de
Pio XII Mystici corporis Christi, a Igreja começa a ser
encarada como "comunidade" fraterna mais do que corno
instituição jurídica; daí também a renovação da paróquia
como "comunidade missionária" - influência pastoral
vinda da França do pós-guerra.
O terceiro nível é a organização nacional e latino-
americana das instituições que foram surgindo pela mo-
dernização da Igreja no modelo de "Nova Cristandade". Em
primeiro lugar nascem as conferências episcopais nacio-
nais a partir de 1952, que são os órgãos nacionais de
coordenação do trabalho dos bispos, até então completa-
mente isolados. Hélder Câmara, Manuel Larraín e tantos
outros são os que unificam os episcopados nacionais. Da
mesma forma os religiosos e religiosas começam a reunir-
se por países (como a CONFERRE no Chile, em 1954),
conseguindo a unidade continental com a Conferência
Latino-americana de Religiosos (CLAR, Rio, 1958).
Junto a estes aparece grande número de novos
órgãos confederativos: Organização de Seminários Latino-
americanos (OSLAM, Tlalpan, 1958), Secretariado Lati-
no-americano da Ação Católica (SIAC, Santiago, 1946),
Conferência Latino-americana da JOC (Rio, 1959), Movi-
mento Familiar Cristão (Montevidéu, 1951), Confederação
Latino-americana de Sindicalistas Cristãos (CLASC, San-
tiago, 1954), Confederação Latino-americana de Educação
Cristã (CIEC, Bogotá, 1945) etc. Todo este esforço de
integração latino-americana culmina, de certa maneira, na
I Conferência do Episcopado Latino-americano no Rio de
Janeiro, de 25 de julho a 4 de agosto de 1955.9 Nesta
conferência é fundado o Conselho Episcopal Latino - ame-
19
ricano (CELAM) que terá tanta importância histórica para
a Igreja na América Latina e para o continente em geral.
Estão dadas as estruturas para o passo seguinte.
- Brasil
10. José 0. Beozzo, "A Igreja no Brasil (1930-1939)", in. HGIAL, vol 3, Ed.
Vozes, Petrópolis (em preparo); Thomas Bruneau, 0 catolicismo brasileiro em
época de transição, Ed. Loyola, São Paulo, 1974.
20
No dia 24 de agosto de 1934, Dom Leme estava
enviando a Roma o estatuto da Ação Católica, que foi
aprovado em 9 de junho de 1935. Ao mesmo tempo
contínuavam os congressos eucarísticos nacionais em Salvador
(1933), Belo Horizonte (1936), Recife (1939), São Paulo
(1942) com os mesmos efeitos de atrair multidões.
Cabe destacar a pastoral coletiva do episcopado contra
o comunismo (1937), que marcou o final desta fase. Com
efeito, a promulgação do "Estado Novo" (1939) destruiu
muitas das prerrogativas anteriores da Igreja. Por isto, o I
Concilio Plenário Brasileiro, de 2 a 20 de julho de 1939,
preparou a unidade da Igreja diante da precária fase que estava
despontando.
No dia 15 de março de 1932, o padre Leopoldo
Brentano SJ fundou, em Pelotas, o Círculo Operário Pelotense.
Três anos depois contava com catorze mil membros. Em 1936
reuniu-se a Confederação Nacional de Operários Católicos
(CNOC) com trinta e quatro mil membros. Os Círculos eram
inspirados no corporativismo fascista. Chegaram a ter duzentos
mil membros na década 1950-1960. A Juventude Operária
Católica (JOC) começa a sua expansão depois da queda do
getulismo. A Ação Católica Operária (ACO) organizase
rapidamente.
Graças a Tristão de Atayde, maritainiano, e outros
intelectuais, a revista A Ordem abandona a linha corporativista.
De qualquer m aneira, o conservadorismo da LEC, do
movimento "Integralista" e de muitos outros, formou no Brasil
um setor de catolicismo direitista com simpatias fascistas,
tendência esta que se prolonga até a década de 80.
Com a morte de Dom Leme em 1942, a Igreja fica
sem liderança. Somente em 1952, o padre Hélder Câmara
sugere a fundação da Conferência Nacional dos Bispos do
Brasil (CNBB). Hélder Câmara havia revitalizado a LEC entre
19461950, para pressionar o presidente GasparDutra. Durante o
segundo governo de Vargas (1951-1954) as
21
relações não variam. Neste período todo, foi surgindo na
Igreja brasileira um senso de autonomia perante Roma; por
isto Dom Leme se opôs ao acordo entreRoma e o Brasil,já que
poderiam pactuar para dominar a Igreja do Brasil. A atual
personalidade da Igreja brasileira germinou nesta época.
- Argentina
11. Gerardo Farrell, Iglesia y pueblo en Argentina (1860-1974), Patria Grande, Buenos
Aires, 1976; Antonio Quarracino,"La Iglesia en Argentina enlosúltirnos cincuenta años'',
in Criterio 1777, 1977, pp. 724ss.; Juan Carlos Zuretti, Nueva historia eclesiástica
argentina, Buenos Aires, 1972; L. Gera G.-Rodríguez M., "Apuntes para una
interpretación, de la Iglesia argentina", in Víspera 4,15,1970, pp. 59-88; H. J. Prien, op.
cit., pp. 584-592. Sobre o Uruguai, cf. H. J. Prien, op. cit.,pp. 592ss.; sobre o Paraguai, cf
id., ibid., pp. 598ss.; cf. A. Methol Ferré, "Las correntes religiosas", in Nuestra Tierra n.
35, Montevidéu, 1969.
22
janeiro de 1936 - lidera a Igreja neste período. Nessa época
éfundado o jornal El Pueblo. Com Perón (19461955), a Igreja
mantém aliança de apoio mútuo, obtendo alguns benefícios
(educação religiosa nas escolas, capelanias militares etc.); mas
a partir de 1953 começam as hostilidades que vão até a queda
do governo. A incipiente Democracia Cristã não consegue
avançar no período desenvolvimentista posterior.
- Chile
12. Cf. Fernando Aliaga, "Historia de Ia Iglesia en Chile", in HGIAL, t. IX (em preparo).
23
1951. Por seu lado, Clotário Blest fundava o grupo "Germe"
em 1928. 0 padre Femando Vives SJ organizava a Liga Social
em 193 1, a União de Trabalhadores Católicos e a Vanguarda
Operária Juvenil. Em 1934 começava a Ação Popular que, em
1945, tinha cento e sessenta centros onde se dava assistência
médica, jurídica, atendimento aos aposentados etc.
O fundo da questão se estabeleceu no fato de que a
Igreja, especialmente graças à figura de Mons. José María
Caro (1939-1958), elevado a cardeal em 1946, nunca apoiou o
Partido Conservador, de direita, como sendo o seu partido. Ao
contrário, através de consulta a Roma, Eugênio Pacelli enviou
uma carta, no dia 12 de abril de 1934, onde indicava a posição
suprapartidária da Igreja. Isto permite aos jovens a Ação
Católica participarem primeiro no Partido Conservador (desde
1931), para depois fundarem a Falange (novembro de 1939),
sob a direção de Eduardo Frei (que será a futura Democracia
Cristã chilena). Mons. Manuel Larraín, bispo de Talca desde
1938 - a figura mais importante da Igreja latino-americana no
século XX até sua morte em 22 de abril de 1966, organizador
da conferência episcopal chilena em 5 de novembro de 1952 e
da I Conferência do Episcopado Latino-americano no Rio de
Janeiro, em 1955 - defendeu a Falange contra os ataques do
conservadorismo.
Ato profético foi aquele de Mons. J. M. Caro que, no
dia 23 de agosto de 1939, aceita como legítimas as
autoridades da Frente Popular, que lhe permitem a
organização do I Congresso Eucarístico Nacional em 194 1.
Em 1946 reúne-se o I Concílio Plenário Chileno - sem
esquecer que foi um bispo chileno, Mons. Casanova, quem
organizou o I Concilio Plenário Latino-americano, em Roma,
em 1899 -. É por tudo isto que a Igreja chilena alcançava
nítida liderança no âmbito latinoamericano no período que vai
do Concilio Vaticano II a Medellín.
24
6. A Igreja na região de Bolívar
- Peru
13. Cf. Jeffry Klaiber, Religión y revolución en el Perú (1824-1976), Univ. del Pacífico,
Lima, 1977, pp. 176ss.; do mesmo autor, "Historia de Ia Iglesia en el Perú", in HGIAL, t.
VIII (no prelo).
25
Ação Popular e Democrata Cristão. Tudo culmina na I Semana
Social peruana, em 1959, que marca o começo da nova época.
Junto com o cardeal de Lima, cabe lembrar o seu auxiliar,
Mons. J. Dammert Bellido, - bispo de Cajamarca a partir de
1962 - historiador e grande apóstolo entre os indígenas.
- Bolívia
- Equador
14. Cf. Josep Barnadas, "Historia de Ia Iglesia en Bolívia'', in HGIAL, t. VIII (no prelo).
15. Cf. a "Historia de Ia Iglesia en el Ecuador" de José María Vargas, in HGIAL, t. VIII
(no prelo).
26
Torre decide celebrar com concentração popular a festa de
Cristo Rei em 1929 e, mais tarde, em Quito, em 1933. A partir
de 1931 começa a organização de ações sociais operárias. A
Confederação Equatoriana de Operários Católicos (CEDOC)
chegou a contar com setenta mil filiados em 1938. Em 16 de
julho de 1954 nasceu a Universidade Católica de Quito.
Em 1956 procedeu-se ao estabelecimento da
Conferência Episcopal Equatoriana.
A ligação entre Igreja e Estado ficou estabelecida
pelo Modus vivendi assinado em 24 de julho de 1937, que
regulamenta essa ligação até os nossos dias.
- Colômbia
16. Cf. Rodolfo de Roux, "La Iglesia colombiana en el período 1930-1962", in HGIAL,
t. VII, pp. 517ss.
27
de longo alcance. A Revista Xaveriana foi, desde 1933, um
testemunho da intelectualidade católica.
É importante esclarecer a posição da Igreja perante o
Estado. Quando, em 1935, o Congresso Nacional interpela a
Igreja sobre a educação, o divórcio e outros assuntos, esta
reage, mas no final é proclamada a liberdade de culto. Em
1942 assina-se novo acordo. 0 que não impede que em 1948 o
episcopado se manifeste sobre as "relações entre Igreja e
Estado", alertando sobre o perigo marxista na universidade. A
mesma conferência episcopal declara-se anticomunista em
1944. Com a morte de Jorge Eliécer Gaitán em 1948 toma a
culpar o comunismo e o liberalismo pelos ataques contra a
Igreja (que chegaram até a incendiar o palácio episcopal de
Bogotá) em 9 de abril. Ainda em 22 de setembro de 1958 o
episcopado continua acusando o comunismo pela "violência"
que se expande por todo o país.
- Venezuela
17. Cf. Carlos Felice Cardot, "La Iglesia venezolana entre 1930-1962", in HGIAL, t.
VII, pp. 552ss.; e Luis Ugalde, no mesmo volume, pp. 625ss.
28
7. A Igreja no México e América Central
- México
29
No início do governo de Lázaro Cárdenas
(19341940), as coisas ficaram na mesma. 0 apoio da Igreja à
nacionalização do petróleo (1938) fez mudar a posição do
governo que se encaminhou para um modus vivendi de
relações toleráveis.
Em 1922 era fundado o Secretariado Social Mexicano
(SSM) pelo episcopado. Em 1929 a Ação Católica começa sua
organização, sob os auspícios do Secretariado Social na época
do padre Miguel Dario Miranda, seu diretor de 1924 até 1937
(futuro cardeal da sede do México). A partirde 1946 o diretor
do SSM foi o padre Pedro Velásquez grande organizador do
apostolado social, figura comparável à de Alberto Hurtado e
Gustavo Franceschi, que, de militante anticomunista nos anos
40 e 50, passa a ser animador da Conferência de Medellín.
- América Central
19. Cf. Miguel Picado, "Historia de Ia Iglesia en Costa Rica", in HGIAL, t. VI, 1985.
20. Texto de 25 de abril de 193 8 de Mons. V. Sanabria (citado por Miguel Picado, in op.
cit.).
30
o Partido Comunista costa-riquenho, em 14 de junho desse
ano, que se transformou na Vanguarda Popular. Mons.
Sanabria declarou: "os católicos, que o desejarem, podem
ingressar na nova organização". Salvou assim o governo
popular até 1948.
Em 16 de dezembro de 1935, Mons. Rafael Otón
Castro instituía a Ação Católica por carta pastoral. Entre 1942
e 1943, Mons. Sanabria reformula a instituição e esclarece os
seus objetivos, orientando-a principalmente para operários e
camponeses. A Liga Espiritual Operária (LEO) era o seu
centro. A Juventude Operária Católica (JOC) apoiava suas
ações. Depois organizou o sindicalismo cristão. O padre Carlos
Rodríguez Quirós dedicou-se a estes movimentos. Em 1945
organizou a 1 Semana Interamericana de Assessores Jocistas.
Em 15 de setembro de 1943 foi fundada a central
sindical Rerum Novarum (CCTRN). Em 1945 esta central
estabelece a sua autonomia em relação à Igreja. Em 1948
enfrenta a CTCR (Central de Trabalhadores Costa-riquenhos
da Vanguarda Popular) que será, mais tarde, o motivo da
guerra civil e queda do governo. O padre Benjamín Núñez
começou uma longa campanha contra o arcebispo e
desempenhou importante papel no Exército de Libertação
antigovernista.
Mons. Rubén Odio Herrera (1952-1959) é o sucessor
de Sanabria; ele apóia a política anticomunista de Figueres no
pós-guerra.
- Guatemala
31
Nas regiões de Petén e Zacapa, o padre Rafael
González funda a Ação Católica clássica. Enquanto isto, Mons.
Mariano Rossell y Arellano (1938-1964) ocupa a sede
guatemalteca e, em 1942, celebra o I Congresso Catequético
Nacional. Por outro lado, Vizcaíno, Leal funda a Academia
Superior de Cultura "Rafael Landívar" que, mais tarde, será
Universidade. Com o seu semanário Acción Social Cristiana,
em 1944, o movimento Rerum Novarum insere nítida presença
cristã no mundo operário.
Mons. Rossell se salienta por sua constante campanha
anticomunista. Em 12 de outubro de 1945 publica carta pastoral
"Sobre a ameaça comunista". Em 21 de novembro de 1947
volta ao mesmo tema. Em 18 de agosto de 1949 toma pública
uma instrução "Sobre a excomunhão dos comunistas". Em 195
1, como medida de força diante do populista eleito Jacobo
Arbenz Guzmán, realiza o I Congresso Eucarístico Nacional,
com a presença maciça de duzentas mil pessoas.
Ao começar a reforma agrária, Arbenz conta com a
oposição da oligarquia agrária, da United Fruit (da qual são
confiscados cem mil hectares) e dos Estados Unidos. Mons.
Rossell apóia Somoza, Trujillo e Carlos Castillo Armas que,
no pacto de Tegucigalpa, a 24 de dezembro de 1953, escrevem
no item 12:
32
o domínio ignominioso do passado" (discurso de 10 de
outubro de 1954).
De 11 a 15 de fevereiro realiza ainda o I Congresso
Eucarístico Centro-americano, e o núncio Mons. Paupini
nomeia o padre Mário Casariego como bispo auxiliar.
- El Salvador
- Honduras
22. Cf. Rodolfo Cardenal, "Historia de Ia Iglesia en El Salvador", in HGIAL, t. VI, 1985,
23. Cf. Marcos Carías, "Historia de Ia Iglesía en Honduras", in HGIAL, t. VI, 1985.
33
capitalismo. Em 1959 realiza-se a Grande Missão de
Tegucigalpa contra "a invasão materialista e
desmoralizadora", consagrando o país ao Sagrado Coração.
Em 1955 organizamse os Cavalheiros de Cristo Rei em San
Vicente, oradores leigos militantes. Graças ao padre
Domínguez são fundadas organizações camponesas e
operárias, utilizando o programa de rádio que o padre Molina
Sierra começara em 1955.
- Nicarágua
8. A Igreja no Caribe
- Santo Domingo
24. Cf Jorge Eduardo Arellano, "Historia de Ia Iglesia en Nicaragua", in. HGIAL, t. VI,
1985.
25. Cf. William, Wipfler Poder, influencia y impotencia. La Iglesia como factor socio-
político en República Dominicana, CEPAE, Santo Domingo, 1980, pp. 84ss.
34
presença do núncio Mons. José Fietta, promete à Igreja o
"amparo da cooperação que vos brindará o governo que
presido", para que a Igreja fosse "fonte de consolo, elemento
moral de poderosa influência no estabelecimento do nosso
progresso, do nosso bem-estar".26 No dia 6 de março
érestaurada a personalidade jurídica da Igreja. O ditador exclui
o padre Rafael Castellanos da sucessão a Mons. Alejandro
Noel e consegue pôr o dócil Ricardo Pittini como arcebispo de
Santo Domingo; este atingirá graus inigualáveis de
cumplicidade, a ponto de pedir a Trujillo em 1938 que retire
sua renúncia à reeleição para presidente. O massacre de
haitianos na região fronteíriça, em 1936, foi ocultado até pelos
sacerdotes da missão jesuíta. A Igreja recebeu do governo: três
catedrais, restauração de edifícios históricos, escolas, reitorias,
conventos, novos seminários, centros de retiro, subvenções e
salários para bispos, sacerdotes etc., veículos, equipamentos
audiovisuais, ornamentos litúrgícos. Em 1954 assinou-se o
acordo, no dia 16 de junho, ignorando os crimes e as injustiças
do tirano. No Congresso Internacional sobre a Cultura Católica
em 1956, com a presença até do cardeal Spellman de Nova
York, o cardeal De la Tom, de Quito, elogiou o Generalíssimo
por ser "o fiel intérprete dos sentimentos de seu povo".
Somente em 25 de julho de 1959, Mons. Hugo Polanco Brito
começa a demarcar as responsabilidades, dizendo: "eu
pessoalmente, como bispo de Santiago, não tenho outros
superiores senão o Papa e Deus, aos quais prestarei contas das
minhas ações."27
26. Zenón Castillo de Aza, Trujillo y otros benefactores de la Iglesia, Handicap, Ciudad
Trujillo, 1961, p. 216.
27. Hugo Polanco Brito, Discursos y escritos (1934-1965), t. I (inédito).
35
-Porto Rico
- Cuba
28. Cf. Sarnuel Silva Gotay - Mario Rodríguez, "Historia de Ia Iglesia en Puerto Rico", in
HGIAL, t. IV (em preparo).
29. Samuel S. Gotay, La Iglesia católica en el proceso político de Ia americanización de
Puerto Rico (1898-1930) (inédito).
30. Cf. Raúl Gómez Treto, "Historia de Ia Iglesia en Cuba (1959-1979)", in HGIAL, t. IV
(ern preparo); Walfredo Piñeros Corrales, Cambias ocurridos en Ia Iglesia católica en
Cuba durante los últimos 50 años, Havana, 1982 (inédito). Estes dois trabalhos
pertencem a CEHILA-Cuba, coordenado por Rafael Cepeda.
36
meça a trabalhar efetivamente. A Juventude Operária Católica
(JOC) reúne os seus primeiros centros a partir de 23 de janeiro
de 1947. Dia 15 de agosto de 1946 abriu suas portas a
Universidade Católica Santo Tomáz de Villanueva. Em 1957
existiam, em Cuba, 209 paróquias, 6 dioceses, 245
comunidades religiosas (87 masculinas), 162 colégios
religiosos (52 masculinos) com quarenta mil estudantes; 667
sacerdotes que dirigiam 426 templos; um seminário maior
aberto em setembro de 1945, onde estudavam também negros
e mulatos, por vontade expressa de Mons. Arteaga.
A partir de 1955 começou a polítização da juventude
católica, sendo censurada pelo episcopado. Os dias de
Fulgêncio Batista y Zaldívar, cujo poder começou no dia 4 de
setembro de 1933, estavam chegando ao fim.
- Haiti
37
9. Tensões no modelo de "Nova Cristandade"
Richard Buhler, A History of the Catholic Church in the Belize, BISRA, Belize, 1976;
John Harricharan, "The Catholic Church and the english-speaking Caribbean", in
HGIAL, t. IV (em preparo); J. Vemooy, "La Iglesia católica romana del Surinam", in
HGIAL, t. IV (em preparo) etc.
38
II.
RENOVAÇÃO DA IGREJA
SOB O SIGNO DE MEDELLÍN (1959-1972)
39
promissos políticos na América Latina. 0 próprio papa falava
da "Igreja dos pobres".34
Junto com o desenvolvimentismo, uma corrente
revolucionária percorria a América Latina. Camilo Torres
morre em 15 de fevereiro de 1966 e, em 1967, "Che" Guevara.
Nesse ano Paulo VI (1963-1978) lança Populorum Progressio,
onde fala do "imperialismo internacional do dinheiro". Um ano
antes, 17 bispos dos países pobres tomam pública a
"Declaração dos bispos do Terceiro Mundo" em 31 de Julho de
1966, que terá uma longa história. É nesta época que a "teoria
da dependência" começa a colocar em questão teoricamente o
"desenvolvimentismo" mostrando a necessidade não de
reformas, mas de libertação estrutural continental.
A Revolução Cultural chinesa de 1966, a rebelião
juvenil mexicana, afogada em sangue em 2 de outubro de 1968
em Tlatelolco, as manifestações anteriores, em Berkeley,
contra a guerra do Vietnam, o "maio" de Paris, fizeram deste
ano (expressão da crise do capitalismo em 1967) um momento
central. 0 "córdoba 30" em 1969 também será histórico.
Salvador Allende ganha as eleições no Chile, em 1970, e o
papa lança Octogesima Adveniens (197 1) onde se admite um
socialismo democrático.
40
nos (22,23%) contra 849 europeus (31,60%). 0 cardeal A.
Caggiano de Buenos Aires foi um dos cinco que presidiram a
abertura.35 Quando o Concílio se encerrava em dezembro de
1965, havia-se produzido um movimento profundo na Igreja
desde o México até a Argentina. 0 CELAM realizou várias
assembléias anuais em Roma presididas por Mons. M. Larraín
(presidente do CELAM de 1963 a 1966)
De imediato houve alvoroço em certos grupos
minoritários, mas proféticos. Primeiro, o Encontro Episcopal
Latino-americano de Bafios (Equador), em junho de 1966,
com os responsáveis pelas comissões de educação, apostolado
secular, ação social e pastoral de conjunto. Depois vem a X
Assembléia do CELAM em Mar del Plata, sobre "0 papel da
igreja no desenvolvimento e na integração da América Latina"
(em outubro do mesmo ano), onde o governo ditatorial de
Ongania impediu a presença de Dom Hélder Câmara. 0
Encontro de Pastoral Universitária em Buga (Colômbia), em
1967, propõe a reforma nas universidades católicas,
permitindo a reestruturação de importantes centros intelectuais
(no Chile significou greves, passeatas, manifestações
estudantis, assim como em outros países). O Encontro
Latino-americano de Vocações (Lima, 1967) planeja a reforma
dos seminários teológicos. O I Encontro Pastoral de Missões
Indígenas em Melgar (Colômbia, abril de 1968) faz penetrar
na Igreja a questão indigenista. Por último, o Encontro da
Pastoral Social em Itapoã (Brasil) em maio de 1968. Tudo isto
preparou o caminho para o acontecimento fundamental da
Igreja latinoamericana do século XX: a II Conferência do
Episcopado Latino-americano em Medellín36 sobre a
"Presença da Igreja na atual transformação da América
Latina".
35. Sobre esta questão, cf. minha HI, op. cit., pp. 219-223.
36. Cf. Hernán Parada, Crónica de Medellín, Indo-American Press, Bogotá, 1975;
minha MP, pp. 67ss.
41
A partir desse momento, segunda fase (1968-1972),
começa o trabalho de renovação de toda a Igreja, partindo do
CELAM. O IPLA (Instituto Pastoral) de Quito, de onde sairão
mais de 500 agentes de pastoral - entre eles o padre Rutilio
Grande SJ, mártir de El Salvador, e tantos outros - o Instituto
de Catequese (Manizales), de Liturgia (Medellín), de
Juventude (Bogotá), realizam trabalho de aprofundamento e
extensão. Os Encontros de Renovação Episcopal que
causaram mudanças profundas em muitos bispos (o de
Medellín em julho de 197 1, com a participação de 56
prelados, desde Adalberto Almeida, arcebispo de Chihuahua,
até Mons. Jorge Enrique, de La Paz, e Mons. Oscar A.
Romero, de El Salvador).
Por outro lado, nos sínodos romanos de 1967 e 1969
as vozes latino-americanas se fizeram ouvir, sendo que no III
Sínodo de 1971 os bispos latino-americanos tiveram peso
significativo. Naquestão de "Justiça no mundo" mostraram
uma clara posição de libertação exposta pelo secretário
Executivo do CELAM, Mons. Eduardo Pirônio. E no seio da
Espanha, ainda franquista, organiza-se no Escorial, de 8 a 15
de julho de 1972, o encontro "Fé Cristã e Transformação
Social na América Latina", onde mais de 30 teólogos da
Libertação expõem, na Europa, a experiência vivida pela
Igreja latino-americana durante esses anos.37
3. Os grandes desarios
37. Cf. Fe cristiana y cambio social en América Latina, Sígueme, Salarnanca, 1972, com
versão para o inglês (Orbis Books, Nova York), o italiano, o francês etc.
42
à América Latina. É toda a questão da cultura popular, a
religião do povo (o catolicismo popular), o protagonismo
político desse povo com o qual a Igreja institucional estava
acostumada a "conviver", mas que tinha deixado de animar de
dentro. Agia sobre ele, mas não era ele mesmo como cristão. 0
Movimento de Sacerdotes para o Terceiro Mundo, na
Argentina - desde 1966 - é o primeiro movimento que se insere
no popular (não exclusivamente classista e devendo evitar o
desvio populista). As "Comunidades Eclesiais de Base" - que
surgem em muitas partes da América Latina, mas
principalmente no Nordeste do Brasil - serão a resposta para a
organização cristã do povo como "Povo de Deus" (Lumen
Gentium do Concilio Vaticano II). Esta corrente impõe-se no
catolicismo latino-americano (tanto o progressista quanto o de
libertação) a partir de meados da década de 70.
O segundo é o desafio de optar só pela reforma ou
também pela revolução. A revolução cubana de 59 colocou aos
cristãos a possibilidade do triunfo imediato através dos
"focos". O caminho das armas foi encarado política e
eticamente possível. Por outro lado, pela primeira vez se
discutiu seriamente a "opção socialista". Foi no Chile, desde a
crise do ILADES, em 1969, e a fundação do MAPU, que
"Cristãos para o socialismo" (1972) começam o longo caminho
histórico de encontro entre cristãos e marxistas. A época da
"guerra fria" e dos antimarxismos dos anos 30 ficou para trás,
mas nem por isso findaram as disputas, em todos os níveis,
entre cristãos reformistas, progressistas, que esperam o
desenvolvimento do capitalismo dependente, e os que lutam
pela utopia da superação desse capitalismo. O desafio fica
ainda mais profundo no período seguinte.
O terceiro se refere ao próprio "modelo" da Igreja, ou
seja o modo de entender a função da Igreja na sociedade
política e civil. 0 modelo de cristandade, que se apoiava no
43
Estado para realizar as suas atividades (educação religiosa nas
escolas do Estado, capelães militares, subvenções para templos
etc.) entra em crise, abrindo o caminho para o modelo de
Igreja dos pobres. Trata-se, como pensa o CELAM (1963-
1972) de irradiar o testemunho cristão diretamente ao povo, ao
pobre. O "pobre" se transforma no lugar de todas as opções,
discussões e ações. A "Teologia da Libertação" (TL) - reflexão
de uma geração inteira de teólogos latino-americanos que não
se deve atribuir a pessoas - chega a formular esta opção
histórica pelo pobre que transforma a Igreja em "Igreja dos
pobres" e que entrega ao povo, como sujeito protagônico
histórico, a responsabilidade de sua própria evangelização: a
"Igreja servidora" da libertação do povo dos pobres, no espírito
de João XXIII.
44
mo com a estância Tepeyac de 3.000 hectares entregues a
CESA. Estes atos de empobrecimento voluntário da Igreja são
seguidos de ações concretas, não mais como ajuda, mas como
promoção do próprio movimento popular. Dom Hélder no
Brasil; Mons. Larraín no Chile; Mons. A. Devoto, de Nevares;
Enrique Angelelli na Argentina; Sérgio Méndez Arceo em
Cuernavaca - que assiste ao 1 Encontro de Cristãos para o
Socialismo, Santiago, 1972; Mons. Antúlio Parrilla
Bonilla-que em Porto Rico presencia a queima de cadernos
militares como ato de protesto; Mons. Gerardo Valencia, em
Buenaventura, a favor da população negra; o cardeal J.
Landázuri que doa o milhão de pesos recebido do governo para
reformar a catedral, para consertar a prisão e um novo hospital,
e tantos outros como Mons. Jorge Manrique em La Paz, Felipe
Benítez em Villarica, Carlos Parteli no Uruguai, não podem ser
esquecidos.
Mas ao mesmo tempo há profunda renovação na
estrutura sacerdotal. Movimentos como o dos Sacerdotes para
o Terceiro Mundo na Argentina (desde 1965) que começam
pensando em questões como o celibato sacerdotal e acabam
optando pela "revolução popular"; o movimento ONIS (1968)
no Peru; Golconda (1968) na Colômbia; Sacerdotes de
Guatemala (COSDEGUA, 1969); o grupo dos "80" no Chile
(1970); "Sacerdotes para o povo" no México (1970); o grupo
SAL na Colômbia; o "Movimento Nacional Cristão de
Libertação" (MNCL) no Equador; "Êxodo" na Costa Rica;
ISAL (Igreja e Sociedade na América Latina) na Bolívia e
tantos outros, demonstram que o sacerdote deixa de ser apenas
um profissional do culto, do ritual, para transformar-se em
profeta social, real, histórico.
As ordens e congregações religiosas também. Como
já dissemos, nasce a CLAR (Conferência Latino-americana de
Religiosos), cuj a I Assembléia Geral se realiza em Lima
(1960). As comunidades femininas, principalmente (que
45
chegam a ter quase 40 mil membros) abraçam a "opção pelos
pobres". De 15 a25 de agostode 1968, com apresença do geral
da ordem, padre Constantino Koser, os franciscanos - de tão
longa história no continente - realizam o I Encontro Latino-
americano Franciscano. De 25 dejaneiro a 2 de março de 1972
organiza-se em Medellín o I Curso de Provinciais Religiosos
da América Latina. Certamente, a renovação deste decênio
(1962-1972) não tem parâmetro igual na história das ordens
religiosas no nosso continente.
Do seu lado, os movimentos de leigos também
mostraram vitalidade igual e de forma crescente. No começo
foram invasões de templos e protestos pedindo a reform a da
Igreja (como a de Corpus Domini de Buenos Aires, em 4 de
abril de 1966, ou a tomada da Catedral de Santiago por 300
leigos, no dia 11 de agosto de 1968, ou a ocupação pacífica de
igrejas, como em Lima em 1970). A Ação Católica estava em
profunda crise, principalmente depois da crise da JUC
brasileira. Por outro lado, o sindicalismo cristão seculariza-se e
o militante cristão começa a "confundir-se" com a massa de
líderes que lutam pela classe trabalhadora ou camponesa num
sentido estritamente elassista.
A encíclica Humanae Vitae (1968), sobre moral no
casamento, de fato concede mais autonomia à consciência do
casal cristão que percorre seu caminho no Movimento
Familiar Cristão (Montevidéu, 1961).
O compromisso reformista político canaliza-se
através da Democracia Cristã. Expande-se a partir do Chile
em 1947 até a Venezuela (COPEI); no mesmo ano surge a
Organização Democrática Cristã da América (ODCA), que em
1954 éfundada na Argentina e Bolívia, em 1956 no Peru e
Guatemala, em 1960 em El Salvador, Paraguai e Panamá, em
1961 em Santo Domingo, em 1962 no Uruguai e Brasil, em
1964 no Equador e Colômbia. Quando em 1964 Eduardo Frei
chega ao poder no Chile, ou em 1968 Rafael Caldera
46
na Venezuela, a DC começa seu afastamento da juventude
cristã revolucionária.
38. Cf. nota 30 acima. Também Aldo Bünting, "La Iglesia en Cuba. Hacia una nueva
frontera", in Revista de CIAS, 193, Buenos Aires, 1970, pp. 21 ss.; minha MP, pp. 84ss.
47
declarou "Quem for anticomunista será anti-revolucionário".
Os cristãos dirigentes da pequena e alta burguesia passaram
em massa para a oposição. Começou a emigração para Miami
e o envolvimento de muitos em ações conspiratórias contra o
governo. Em 6 de junho de 1961 o ensino é nacionalizado, a
moeda anulada, os cemitérios confiscados, reprime-se a
procissão da Caridade do Cobre e tudo culmina com a
expulsão de cento e trinta e três sacerdotes em 12 de setembro,
entre os quais estava o futuro arcebispo de Havana, Mons.
Francisco Oves Martínez. Dos 745 sacerdotes que havia em
1960, em 1969 ficam apenas 230; de 2.225 religiosas, em
1970 ficam umas 200.
A terceira fase (1962-1967) será de "evasão", do
silêncio, da reflexão. Chegam os novos ventos do Concílio, a
presença do delegado apostólico Mons. César Zacchi com
experiência em países socialistas do leste, cujo secretário é o
padre Pietro Sambi, que veremos em 1979 na Nicarágua. Dia
21 de dezembro de 1964 falecia, com honras de comandante
morto em campanha, o padre Guillermo Sardinas, que tinha
participado da guerra junto com Castro, obtendo o grau de
comandante, e que desde 1959 se havia reintegrado como
pároco de Cristo Rei em Havana. Em 1966 abriu-se o novo
seminário maior San Carlos e San Ambrosio. A Ação Católica
foi dissolvida e foi reorganizada na FLAC (Formação,
Liturgia, Apostolado, Catequese), que se preparou para que
Cuba estivesse presente em Medellín (1968), embora o
impacto desta Conferência tenha sido muito limitado em Cuba.
A quarta fase (a partir de 1968), de "reencontro",
foi iniciada pelo próprio Castro, que no Congresso de
Intelectuais em Havana, na presença de 500 dirigentes do
mundo inteiro, exclamou: "Estes são os paradoxos da história:
quando vemos setores do clero que se tomam forças
revolucionárias, como resignar-nos a ver setores do marxismo
se tomarem forças eclesiásticas?"39
39. Citado por Alain Gheebrant, La Iglesia en América Latina, Siglo XXI, México,
1970, p. 194.
48
Em 20 de abril de 1969, através de um Comunicado, o
episcopado condena o bloqueio econômico e político realizado
pelos Estados Unidos. Em 9 de julho Mons. Oves é sagrado
arcebispo. Dia 8 de setembro é lançado outro Comunicado:
49
Pode-se dizer que a Igreja chilena foi a mais ativa da América
Latina no Concílio, por sua organização, seus teólogos, pelo
projeto levado em consideração para o texto Sobre a Igreja.
Além disto em 1963 foram organizadas as "Semanas Sociais",
a Grande Missão de Santiago e em 1967 os Sínodos de
Santiago, Concepción e Talca. O Chile foi também fator
essencial na realização da Conferência de Medellín.
No entanto, desde que Eduardo Frei assumiu o
governo (1964-1970) começou o declínio da liderança latino-
americana da Igreja chilena. A Democracia Cristã reprime um
movimento camponês realizado em Puerto Montt em 1967.
Alguns cristãos começam a mostrar descontentamento. 0
episcopado publica o último grande documento dentro da linha
criativa, não condenatória: "Chile: vontade de ser" (1968).
Pouco depois a "Igreja jovem" toma a catedral de Santiago
pedindo reformas, no dia 11 de agosto. O grupo de direita
Fiducia ("Tradição, Família e Propriedade") toma-se mais
ativo. Começa a crise fundamental - para entender todo o
desenvolvimento posterior da Igreja latino-americana - no
Instituto Latino-americano ILADES. Pierre Bigo e Roger
Vekemans da linha "desenvolvimentista", como dizem os
outros, acusam Gonzalo Arroyo e Franz Hinkelammert de
"marxistas" (os três primeiros são jesuítas e somente Arroyo
échileno). Em 1969 a situação se toma insustentável e o
ILADES se divide em dois. Vekemans irá mais tarde para a
Venezuela (1970) e chegará a Bogotá onde incentivará o
presbítero Alfonso López Trujillo em sua meteórica carreira
(bispo auxiliar de Bogotá, arcebispo e cardeal de Medellín).
Gonzalo Arroyo fundará mais tarde "Cristãos para o
Socialismo", como veremos.
Enquanto isso, no mesmo ano de 1969, a Democracia
Cristã se divide, sendo fundado o Movimento de Ação
Popular Unitária (MAPU) que integrará o governo socia-
50
lista da Unidade Popular, que ganha as eleições no dia 4 de
setembro de 1970.42
Em 16 de abril de 1971, como resultado do encontro
de "80" sacerdotes sobre "Participação dos cristãos na
construção do socialismo no Chile", aparece uma declaração
pública onde se anuncia: "Como cristãos não vemos
incompatibilidade entre cristianismo e socialismo". No dia 27
de maio o episcopado replica com a carta pastoral sobre
"Cristãos, política e socialismo", precedida por outro
documento (22 de abril) dirigido aos sacerdotes.
De 23 a 27 de março de 1972 realiza-se em Santiago
o 1 Encontro de Cristãos pelo Socialismo. Gonzalo Arroyo
diz:
42. Cf. Pablo Richard, Cristianos por el socialismo, Sígueme, Salamanca, 1976, onde
constam os acontecimentos de 1970 a 1973.
51
antecedente mais longínquo aconteceu no Brasil, onde a JUC,
por proposta do padre Almery Bezerra e partindo da
problemática do "Ideal Histórico" do Instituto Superior de
Estudos Brasileiros (ISEB), analisou o tema no "Congresso
pelos 10 anos" da sua fundação. 0 pensamento do padre T.
Cardornnel. e principalmente de Henrique de Lima Vaz será
praticado como "compromisso político" na "Ação Popular",
agrupamento político, cujo "Documento de Base" admite uma
ação revolucionária e marxista. Em junho de 1968 o Congresso
Nacional da JOC-ACO condena o capitalismo e constata a
"luta de classes", admitindo a análise marxista da realidade
social. Dezenas de grupos cristãos na América Latina aceitam
a estratégia revolucionária dos "focos" de "Che" Guevara,
como o caso da "Guerrilha do Teoponte" de Néstor Paz
Samora (1970, Bolívia), cujo caso mais conhecido foi o do
padre Camilo Torres (morto em 15 de fevereiro de 1966). Com
o fracasso da teoria dos "focos", a Unidade Popular chilena
constituiu novo modelo democrático. Mas da mesma forma,
com a sua derrota pelo golpe militar, outros caminhos serão
tentados no futuro.
- Brasil
No Brasil este período tem três fases.43
A primeira termina sem dúvida em 1964. Dom
Hélder Câmara, que havia trabalhado na LEC, que foi assessor
nacional da Ação Católica desde 1947, fundou a CNBB; isto
graças a duas pessoas: o núncio Dom Armando Lombardi
(que só será substituído em 1964) e Mons. Montini
(colaborador em Roma de Pio XII). Foi a época da
43. Cf. SEDOC (Serviço de Documentação) desde 1964; a obra de TH. Bruneau, já
citada; minha MP, pp. 193 -211.
52
liderança carismática da Conferência Nacional dos Bispos do
Brasil (CNBB). Nesta época foram fundadas 43 dioceses novas
(com 109 bispos novos), 11 novas arquidioceses (com 42
arcebispos), 16 prelazias. Estes bispos jovens, progressistas
serão fundamentais a partir de 1968. Além disto a CNBB nesta
época estava nas mãos dos bispos do Nordeste.44
De 1959 a 1961 a Igreja enfrentou a questão do
ensino, fazendo pressão sobre o governo através da Associação
de Educação Católica (AEC). A lei de "Diretrizes e Bases para
a Educação Nacional", de 20 de dezembro de 196 1, aceitou os
pontos de vista da Igreja. Ao mesmo tempo vai acontecendo
lentamente a ruptura da Igreja com a oligarquia agrária. As
declarações de Natal, em 1951; de Campina Grande, em 1956;
e de novo em Natal, 1959 que apóiam os camponeses, o
sindicalismo rural - abrem o caminho da transformação
social.45 Em julho de 1962 é o próprio Comitê Central da
CNBB que declara que "ninguém pode ignorar o clamor das
massas que estão sendo martirizadas pela fome".
A partir da experiência colombiana na emissora
Sutatenza, começa no Brasil um enorme movimento de
educação radiofônica. Pouco a pouco surge no Recife, ao
redor de Paulo Freire, o Movimento de Educação de Base
(MEB) em 1961. Enquanto isto, a Ação Católica,
principalmente a JEC-JUC e a JOC (nasceu também a
Juventude Agrária Católica - JAC) vão se radicalizando e
assumem posições classistas e políticas. O dominicano
Thomas Cardormel é um dos iniciadores teóricos desse
movimento em direção àesquerda desde 1959. Em 1961, Aldo
Arantes, militante da JUC é eleito presidente da União
Nacional de Estudantes (UNE).
53
A Igreja não precisa mais ser aliada do Estado,
como no modelo de nova cristandade, para realizar a sua
função na sociedade civil; ela mesma possui agora instituições
para realizarem diretamente sua ação no mundo. Esta ação, no
entanto, é desenvolvimentista, efetuada por minorias
proféticas que agem "sobre" o povo.
54
- Argentina
47. Além da bibliografia da nota 11 acima, cf. Pablo Richard, Morte das cristandades e
nascimento da Igreja, Ed. Paulinas, São Paulo, 1982, pp. 117ss.; MP, pp. 106-162; HI,
pp. 243ss.; 293ss.
55
pró-militar (que reúne no governo muitos participantes dos
"Cursilhos de Cristandade").' Em 28 de junho de 1965, 80
sacerdotes, juntamente com o bispo Podestá e Antonio
Quarracino, reúnem-se para refletir sobre o Concilio. O I
Encontro Nacional é efetuado em Córdoba de 1 a 2 de maio de
1968, do movimento que se chamará Sacerdotes para o
Terceiro Mundo (MSPTM). O II Encontro realizou-se em maio
de 1969; o III, em maio de 1970. Na Declaração de São
Miguel elaborada pelo episcopado durante sua reunião anual de
21 a 26 de abril de 1969, para adaptar Medellín à Argentina,
encontra-se o ponto máximo de avanço da Igreja. Em
Cristianismo y Revolución (revista fundada em setembro de
1966) atinge-se a abordagem mais crítica do ponto de vista
teológico-político do período. Serão anos de profunda
polarização, com o nascimento de um modelo de "Igreja dos
pobres", que serárnuito reprimido posteriormente.48
No Paraguai,49 governa Alfredo Stroessner desde
1954. Entre 1966 e 1976 a Igreja adquire certo distanciamento
do governo e começa uma defesa ativa dos direitos humanos.
Isto faz com que o ano de 1969 tenha sido especialmente
difícil. Mons. Felipe S. Benítez declara que "a Igreja não pode
calar diante da violação dos direitos humanos". O bispo de
Villarica apóia alguns operários em greve; o governo acusa-o
de comunista; seus 75 sacerdotes defendem o bispo. O próprio
Mons. Aníbal Mena Porta chega a excomungar o chefe de
polícia pelas prisões e torturas, em 26 de outubro. A revista
Comunidad é desapropriada em 31 de outubro. O padre
Francisco de Paula Oliva SJ é expulso da Universidade
católica. Em 1971, ainda, o padre Uberfil. Monzón é preso e
torturado. A Igreja, então, se afasta do regime.
56
- Uruguai
50. Sobre o Uruguai, cf. MP, pp. 212; HI, III, p. 317.
57
7. A Igreja na área de Bolívar
- Peru
No Peru51 a Igreja atravessa um processo de profunda
mudança de orientação. As "Exigências Sociais do Catolicismo
no Peru" é o tema da I Semana Social de 1959, em Lima, que
já está descobrindo o compromisso da ação social da Igreja. Na
II Semana, sobre "propriedade" em Arequipa, segue-se dentro
da mesma linha. Nesse mesmo ano, o episcopado lança a carta
pastoral sobre "Os católicos e a política", tema ao qual volta
em 1963: "Política, dever cristão". O cardeal Juan Landázuri
Ricketts (sagrado em Lima desde 1962) é o homem da
renovação do Concílio principalmente no que se refere
àliturgia e catequese. Tudo isto desemboca no IV Congresso
Eucarístico Nacional de Huancayo em 1965. Em 1966 o
episcopado declara que "estamos especialmente preocupados
com a situação social e econômica da população camponesa da
serra". Em 1967 é organizada a Missão Conciliarem Lima.
Chegamos assim a 1968 e ao golpe militar de Velazco
Alvarado, de caráter nacionalista e populista, e à II
Conferência de Medellín. No mês de julho, em Chimbote, o
padre Gustavo Gutiérrez expunha a um grupo de sacerdotes o
que seria o ponto de partida da Teologia da Libertação.
Quando o governo dita a lei da reforma agrária, o cardeal e a
Igreja felicitam o governo - afastando-se assim da oligarquia
agrária -e a diocese de Cuzco realiza a reforma nas terras que a
Igreja ainda possuía. Apóia-se o governo por ocasião da
nacionalização do petróleo de Brea e Pariñas. A lei industrial
de 1970 também é apoiada. Mas com a reforma urbana,
quando um grupo de marginalizados ocupa alguns terrenos,
58
o bispo auxiliar Mons. Bambarén celebra uma missa pelos
"invasores", e isto provoca confronto com o governo que vai se
encaminhando lentamente para a direita.
Para o Sínodo romano de 1971, a Igreja peruana
apresenta o documento mais avançado talvez, onde chega a
dizer, depois de uma análise da miséria na América Latina,
que "poristo tantos cristãos hoje em dia reconhecem nas
correntes socialistas certo número de aspirações que levam
dentro de si mesmos em nome da fé".
- Bolívia
59
Secretariado de Ação Social. O golpe de estado de Hugo
Banzer representa o fim deste período, e começa uma
perseguição frontal contra a Igreja que se comprometeu com
os pobres.
-Equador
- Colômbia
54. Cf. José Moreno Alvarez, "La Iglesia en el Ecuador desde 1962", in HGIAL, t VIII
(no prelo); minha MP, pp. 146- 151; HI, pp. 295ss., 316ss.
55. Cf. Rodolfo de Roux, "La Iglesia colombiana desde 1962", in HGIAL, t. VII, pp.
559ss.; MP, pp. 170-180; HI, pp. 258ss., 295ss. Sobre a Igreja na Venezuela, cf. A.
Micheo-L. Ugalde, in HGIAL, t. VII, pp. 632ss.; MP, pp. 180-184; HI, pp. 315ss.
60
trepo (1929-1966), de família conservadora e oligárquica,
sociólogo de renome, um dos fundadores da "sociologia latino-
americana", que estudou em Louvain e marcou época:
61
8. A Igreja no México, América Central e Caribe
- México
56.Cf. Jesus García, "La Iglesia mexicana desde 1963", in HGIAL, t. V, pp. 361-493;
MP., pp. 158-170; HI, pp. 256ss., 312ss.; Edward Larry Mayer, La política social de Ia
Iglesia católica en México, 1964-1974, tese de doutoramento, UNAM, México, 1977
(inédito).
62
cese de Cuernavaca acontecem dois confrontos com Roma. O
caso do convento beneditino fundado por Gregório Lemercier
(onde utilizavam a psicanálise, 1966-1967) e o conflito com o
CIDOC de Mons. lvan Illich (que viveu seu momento crítico
entre 1968 e 1969).
O fato é que 1968, em virtude dos acontecimentos de
Tlatelolco (2 de outubro), abre a segunda fase. Trinta e sete
sacerdotes definem-se publicamente e começam a discernir
opções. No I Congresso Nacional de Teologia "Fé e
Desenvolvimento", realizado de 24 a 28 de novembro de 1969,
vislumbram-se as primeiras pistas da Teologia da Libertação,
com a presença de padres como Luis del Valle ou Javier
Lozano, que nesta época estavam entre os teólogos
progressistas.
0 documento apresentado por uma comissão ad hoc
sobre "Justiça no mundo", para o sínodo de 1971, pelo
episcopado mexicano, foi um dos mais avançados da época,
mostrando uma linha de compromisso com os pobres.
- América Central
57. Sobre a América Central, cf. P. Richard-C. Meléndez, La lglesia de los pobres en
América Central, 1960-1982, DEI, San José, 1982; e o t. VI da HGIAL, 1985.
58. Cf. Ricardo Bendaña, op. cit.; MP, pp. 226ss.
63
copado alerta contra o perigo comunista através de campanha
pela "justiça social". Quando em 1964 morre Mons. Rossell,
sucede-o Mons. Mário Casariego - uma das épocas mais
obscuras de tão importante sede episcopal. Em 1966 começa
grande repressão contra as organizações populares da Igreja;
há mártires, assassinatos, torturas.59
Só em agosto de 1968, 800 agentes de pastoral
realizam a I Semana de Pastoral de Conjunto, onde começa a
renovação pós-conciliar da Igreja guaternalteca. Os sacerdotes
fundam um movimento (COSDEGUA) que chega a ter 594
membros.
- Nicarágua
59. Cf. Thomas Melville, Guatemala, The Politicis of Land Owership, Free Press, Nova
York, 1971.
60. Cf. Jorge E. Arellano, op. cit.; MP, pp. 235ss.
64
- Honduras
- El Salvador
- Panamá
65
istmo. Organizador das Comunidades de Base, promoveu o
povo em suas lutas, opôs-se à injustiça. Quando o episcopado
se dirige ao Sínodo de Roma, através de comunicado em 20 de
agosto de 1971, afirma:
- Caribe
- Haiti
66
consentimento do Vaticano - que aceitou seus caprichos. Tudo
começou em maio de 1959, com aoposição à nomeação de
Mons. Maurice Choquet como bispo de Cap Haitien. Chega
até a expulsar o arcebispo de Port-au-Prince, Mons. François
Poirier, em 24 de novembro de 1960. Daí em diante expulsa os
sacerdotes estrangeiros e depois também os haitianos que
tanto defendera, seqüestrando e assassinando leigos e
realizando sistemática repressão.
9. Do "desenvolvimento" à "libertação"
67
1
68
III.
69
que esse mundo coloca". Sua opção pela justiça foi prioridade
decidida naquele ano de 1973.
A segunda fase (1976-1979) começa com a
nomeação de J. Carter (1977-1981) que, inspirado pela
Comissão Trilateral, pressionado pela crise iniciada em 1967,
mas que atingiu seu ponto de "estagflação" em 1974-1975, teve
que produzir alguma "abertura" e parar de apoiar as ditaduras
militares. A queda de Balaguer e a eleição de Guzmán, em
Santo Domingo, indicavam mudança. É a época do interregno
de Paulo VI a João Paulo I e depois de João Paulo II (desde
1978).
A terceira fase (a partir de 1979) abre-se com dois
acontecimentos: a III Conferência Geral de Puebla, no início
de 1979, e o triunfo da Revolução Sandinista em 19 de julho
do mesmo ano. Mas ao mesmo tempo, a eleição de R. Reagan
(1981-1989) e o plano de incluir os problemas religiosos corno
problemas políticos na região ("Declaração de Santa Fé em
1979, e o "Instituto de Religião e Democracia", coordenado
por Michael Novak),69 tornam de novo a situação
extremamente tensa. Na América do Sul acontece a
"abertura", mas na América Central e Caribe continua a
política tradicional do "garrote". João Paulo II faz-se presente
no México em 1979 e lança a encíclica Laborem exercens
(1981) de grande transcendência, mas ao mesmo tempo
incentiva uma política contrária, em sua visita à Nicarágua, no
dia 4 de março de 1983, especialmente pela "Instrução sobre
alguns aspectos da Teologia da Libertação" (3 de setembro de
1984) e o diálogo com Leonardo Boff no Santo Ofício (no dia
7 do mesmo mês).
70
2. Os grandes desafios
71
O segundo desafio foi lançado a partir da defesa dos
direitos humanos, o lado negativo da repressão, ou a
resistência como exigência de respeito diante da tortura, morte
e exílio (são milhares os cristãos exilados)." A Igreja abandona
a posição narcisista anterior de lutar em defesa de seus
próprios direitos (de ensino, de culto etc.), para defender os
direitos do outro, do pobre, do indefeso, do que não tem voz.
Através de centenas de pastorais dos episcopados, declarações
de sacerdotes, religiosos, comunidades de base, associações de
"Justiça e Paz", de "Vicariato da Solidariedade" etc., a
"instituição" eclesial mostra sua função histórica contra os
regimes de Segurança Nacional. É um passo qualitativo para a
frente.
O terceiro desafio, não mais junto ao povo
martirizado, mas no povo protagonista, é o dos processos
revolucionários, especialmente o centro-americano desde 1979.
Desta vez a Igreja não chega "tarde" para condenar ou aprovar;
por meio de suas bases participa plenamente nos processos
revolucionários -não sem contradições internas e críticas
violentas dos grupos cristãos conservadores. O II Encontro de
Cristãos pelo Socialismo, em Quebec, em outubro de 1974, o
III Encontro, em Roma, em janeiro de 1977, o IV, em
Barcelona, em 1983, mostram que este movimento segue seu
curso tornando-se mundial. Mas na realidade seu curso mais
profundo se efetua na vida cotidiana da Nicarágua, E1
Salvador, Guatemala, dentro dos movimentos populares. Por
isto, a questão marxista permanece de pé. O Geral dos Jesuítas
dizia em sua intervenção no IV Sínodo Romano de 1977:
72
Esta ordem, que, como outras, tem tantos mártires na
América Latina, pela voz de seu novo Geral, o padre Piet
Hans Kolvenbach, reafirma:
73
ricano esta campanha tem o apoio dos bispos colombianos A.
López Trujillo e Dario Castrillón".74 O certo é que em Sucre,
no dia 23 de novembro de 1972, foi escolhido Mons. Alfonso
López Trujillo como secretário geral do CELAM; em 1970 foi
escolhido presidente e reeleito em 31 de março de 1979 em
Los Teques (Venezuela) por mais um período. Quando na
assembléia do Haiti (1983) precisou abandonar os cargos de
direção, Mons. López Trujillo estivera durante onze anos
dirigindo o CELAM, deixando em seu lugar Mons. Dario
Castrillón corno secretário executivo e Mons. Antonio
Quarracino como presidente, pessoas de sua confiança. A
partir desta alta instância foram modificados os institutos do
CELAM, foram lançadas campanhas em nível
latino-americano contra os teólogos da libertação, contra a
revolução nicaragüense, contra as Comunidades Eclesiais de
Base. A escolha da nova comissão da CNBB (Brasil) em
1983, dentro de uma linha exatamente contrária, serviu para
contrabalançar a situação de constante tensão intraeclesial. A
unidade da Igreja é vivida na contradição.
74. Veja-se o texto completo em Uno más uno de 26 de dezembro de 1977, México, p.
3.
75. Veja-se meu trabalho "Hipótesis para una historia de Ia teología en América Latina",
"Hipótesis de Ia teología en América Latina", DEI, San José, 1981, pp. 401-452.
74
Rubem Alves, Richard Shaull, Gustavo Gutiérrez, Hugo
Assmann em 1970 ou Lúcio Gera. Durante esses anos são
realizados numerosos encontros e congressos de teologia no
México, Bogotá, Buenos Aires etc. De 1968 a 1972 é a época
da grande expansão da Teologia da Libertação, que se toma a
teologia do CELAM, de seus encontros, seminários, institutos.
A partir de 1972 em Sucre começa-se a colocar em questão a
Teologia da Libertação, mas é agora que ela passa a
aprofundar suas teses iniciais. O Encontro de Teologia no
Escorial (Espanha, 1972) e o I Encontro de Teologia Latino-
americana no México (agosto de 1975)76 dão ao movimento
uma implantação continental. Pouco depois, em Theology in
the Americas (Detroit, 1975) se dá a conhecer essa teologia
nos meios negros, porto-riquenhos nos EUA, e outros grupos
minoritários. Em 1976 começam os encontros da Associação
Ecumênica dos Teólogos do Terceiro Mundo (EATWOT): o
primeiro em Dar-es Salaam (Tanzânia) em 1976; o segundo
em Acra (Ghana) 1977; o terceiro em Wennappywa (Sri
Lanka) em 1979; o quarto em São Paulo em 1980; o quinto em
Delhi em 1981 e o sexto em Genebra em 1983.77 A reunião
realizada em Bogotá pelo cardeal J. Ratzinger, de 26 a 30 de
março de 1984, com as comissões teológicas de 22 países
latino-americanos,78 a já mencionada "Instrução" romana de 3
de setembro e o já referido diálogo com Leonardo Boff pouco
depois, estão encaminhados a limitar os efeitos desta teologia
latinoamericana.
75
5. A Igreja perante os regimes de Segurança Nacional
"Se isto acontece conosco que somos gente conhecida, que acontecerá com
os camponeses, operários ou indígenas que forem presos?"79
-Brasil
76
1976) e João Bosco Penido Bumier (11 de outubro do mesmo
ano) foram assassinados. Em 22 de junho de 1982 ainda eram
condenados os padres Aristides Camio e François Gouriou a
15 e 10 anos de prisão, por seus compromissos com os
camponeses em São Geraldo do Araguaia. 0 cardeal Paulo
Evaristo Ams - defendido em 24 de agosto de 1984 por 3.000
professores de ensino médio público, não-católico, contra
ataques da imprensa de direita - lidera a presença da Igreja no
mundo operário industrial, urbano e intelectual universitário.
As greves metalúrgicas receberam total apoio da Igreja
paulista. D. Pedro Casaldáliga conduz o movimento camponês
do sertão pobre e faminto que, no V Encontro Intereclesial das
Comunidades de Base em Canindé (de 4 a 8 de julho de 1983),
declarava:
"A fome generalizada no nosso povo nunca foi tão grande em toda
nossa história".81
77
LAM, hoje é cardeal de Fortaleza. D. Ivo Lorscheiter,
presidente da CNBB, conduz esta Igreja que tem novo
"modelo". Com efeito, em 6 de maio de 1973 os bispos do
Nordeste, no documento "Ouvi o clamor do meu povo"
definem o modelo claramente:
-Argentina
78
Em 20 de junho de 1973, com a matança da juventude
em Ezeiza, começa a repressão contra as forças populares.
Com a morte de Perón acelera-se a conjuntura em 1974; a
repressão aumenta sob o governo que López Rega de fato
exercia, para culminar com o golpe militar de 1976. 0 padre
Carlos Mugica (do MSPTM) é assassinado na porta de sua
igreja de bairro pobre no dia 11 de maio de 1974; foi um entre
tantos. A 4 de agosto de 1976 é assassinado o bispo de La
Rioja, Mons. Enrique Angelli, profundamente compromissado
com seu povo, quando estava voltando de uma reunião em que
examinou a situação do assassinato de dois sacerdotes de sua
diocese;87 os responsáveis eram membros da Força Aérea do
Chamical. A causa de tanto martírio deve ser procurada no
modelo econômico de dependência do capitalismo norte-
americano, dirigido em sua etapa mais opressora pelo ministro
Martínez de Hoz, que endividou tremendamente o país. Mas o
triste é que a Igreja em sua instância hierárquica, por seu
modelo de Cristandade, realiza aliança com o Estado
militarista e com as classes dominantes e condena a guerrilha
sem atenuantes. O movimento de defesa dos direitos humanos
como "Justiça e Paz" dirigido pelo Prêmio Nobel Adolfo Pérez
Esquivel, cristão militante, e as "Mães da Praça de Maio",
também cristãs, entre as quais estavam as duas religiosas
francesas torturadas e assassinadas em 13 de dezembro de
1977, representam o outro rosto da Igreja. Por isto na XLVII
Assembléia do Episcopado, em 12 de novembro de 1983,
quando se pede ao povo que perdoe, os bispos já não têm
autoridade, porque a justiça para os torturadores e assassinos é
a condição do perdão e da reconciliação.
87. O "Dossiê" Angelli in DIAL 114,1983, e 152,1984, pp. 1-6. No dia 18 de julho
foram assassinados os padres Gabriel Longueville e Carlos Murías.
79
- Chile
80
Neste caminho a Igreja descobre novas dimensões,
entre elas a problemática da "cultura popular",91 o problema
indígena.92 De qualquer maneira, a repressão continua; a
recente morte do padre André Jarlán, num bairro de extrema
pobreza, pouco depois de ter sido assassinado um jovem
amigo do padre,93 mostra a situação desta Igreja nacional. Em
25 de março de 1984, o arcebispo Juan F. Fresno Larraín faz
um apelo ao governo para abrir caminho a uma saída
democrática de união nacional.
- Bolívia
81
mente é ensangüentada pelo golpe de 17 de julho de 1980; em
12 de abril era assassinado o padre Espinal. Nem por isto
diminui a crise que sofrem "todos os cidadãos, mas
particularmente as classes populares, que foram duramente
castigadas pela crise econômica" (diz o episcopado em 26 de
novembro de 1983).
- Uruguai
"A Igreja não recebe sua liberdade como dádiva dos homens, mas
como atributo essencial que o próprio Deus lhe dá. Por outro lado,
esta liberdade é reconhecida pelas leis dos povos civilizados cristãos
ou não."98
82
corretamente e defendidos os direitos, deveres e garantias de todos,
dentro do âmbito legal e coerente com a tradição nacional".99
- Paraguai
- Peru
83
Quando a situação de pobreza do povo aumenta em
virtude das medidas adotadas pela ditadura de Morales
Bermúdez, a partir de agosto de 1975, a Igreja tem mais
espaço para sua ação junto ao povo e se afasta do Estado. Os
bispos do planalto, a 10 de julho de 1977, denunciam a
miséria dos camponeses: "Recolhendo o clamor e as
aspirações dos pobres... o sofrimento de nosso povo... A
constante elevação do custo de vida, o congelamento dos
salários, por tudo isto denunciamos a violência da repres-
são... "104
Um pouco antes, em 4 de outubro de 1976, diante da
crítica de certos setores conservadores a respeito da renovação
eclesial que surgiu a partir de 1968, o episcopado reafirma:
- Equador
84
Embora receba uma "visita" enviada por Roma, por pressão de
grupos interessados, seu trabalho continua. O documento mais
importante e amplo do episcopado, em todos estes anos,
"Justiça Social", de agosto de 1977, 107 é lançado tendo em
vista a III Conferência de Puebla e pareceria ter sido escrito
visando aos confrontos que ocorrerão naquela Conferência
(condenação de Cristãos pelo Socialismo, que não havia no
Equador, embora houvesse antecedentes na exortação de 25 de
setembro de 1976 sobre "Integridade da mensagem cristã").
Em geral, a maioria da Igreja hierárquica não rompeu sua
antiga relação com a burguesia agromercantil. conservadora.
- Colômbia
85
camente indígena do grupo étnico Páez. Em 9 de junho desse
ano os Cabildos Indígenas do Cauca haviam declarado que
lutavam pela ocupação de suas próprias terras. Um grupode
proprietários de terras é responsabilizado pela morte do padre
Álvaro, que liderava seus irmãos. O próprio episcopado, em
declaração de 15 de novembro, exprime:
- México
110
No México, o episcopado lançou um documento
optando claramente pelas classes populares: "O compromisso
cristão diante das opções sociais e políticas". De qualquer
maneira, a carta pastoral não teve muitas conscqüências por
falta de movimentos operários ou camponeses da Igreja. Com
efeito, em virtude dos constantes conflitos entre Igreja e
Estado, aquela encarregou-se de suprimir qualquer movimento
cristão que se tomasse incômodo ao Estado. Somente a
questão educacional do "texto obrigatório", no começo do
governo de Luis Echeverria, produziu certo confronto - e
conseqüentemente os textos foram modificados. Por outro
lado, em 1976, a rápida construção da nova basílica àVirgem
de Guadalupe, onde o governo e os bancos tiveram
participação muito ativa, levou à reconciliação entre Igreja e
Estado.
Como em outros países, o assassinato, em 21 de
março de 1977, do padre Rodolfo Aguilar, que trabalhava
109. Servir, 29,1984, p. 5. Cf. DIAL, 173 e 184 (1984), Sobre a Venezuela, MP, pp.
444ss.
110. Cf. Jesús García, "La Iglesia mexicana desde 1962", in HGIAL, t. V, pp. 361-493.
86
num bairro pobre de Chihuahua, demonstra que há grupos de
poder que se opõem ao trabalho da Igreja entre os pobres.
Com efeito, importante movimento de vários milhares de
Comunidades Eclesiais de Base aumenta em número em todo
o país. No X Encontro Nacional de CEBs em Tehuantepec, em
outubro de 1981, o bispo Arturo Lona manifestou:
"Por toda parte desafio e sofrimento; é que este caminho não se faz
sem conflitos: repressões, suspeitas, torturas, prisão e morte... São
muitos milhares os camponeses, os indígenas e operários da América
Latina que estiveram presos por seu compromisso com as
Comunidades Eclesiais de Base. "111
87
-Nicarágua
88
Igreja em conjunto apoiou o processo sandinista; a CONFER,
a Universidade Católica e o próprio episcopado que, em sua
carta pastoral de 17 de novembro "Compromisso cristão por
uma nova Nicarágua", declarou:
90
As posições são mais firmes. O episcopado, por exemplo,
opõese ao serviço militar obrigatório (29 de agosto de 1983),
suscitando grande número de réplicas (da comunidade de
jesuítas, dominicanos, comunidades de base etc), que
destacam as omissões cometidas na análise da realidade vivida
no país. Conflitos como o dos indígenas misquitos, a expulsão
do padre Timóteo Merino (a 13 de maio de 1983), dos dez
sacerdotes estrangeiros (a 9 de julho de 1984), mostram o
caminho da Igreja nicaragüense num processo revolucionário,
em que os cristãos agem de maneira jà bem diferente de como
agiram em Cuba a partir de 1959. Vinte anos não passaram em
vão.
- El Salvador
91
contradições. Enquanto Mons. Romero preside uma procissão
que enfrenta a baioneta do exército no dia da morte de Rutílio
Grande, em sua própria paróquia de Aguilares onde foram
assassinados mais de 200 militantes das Comunidades
Eclesiais de Base até 1983 - Mons. Pedro Aparício apóia o
governo e critica os leigos no Sínodo Romano de 1977. Tudo
culmina em 24 de março de 1980, quando assassinos
profissionais ligados ao exército matam Mons. O. A. Romero
durante o sacrifício da missa. Monsenhor dissera em 20 de
janeiro que havia um projeto que pesava sobre o destino de E1
Salvador:
- Guatemala
92
camponeses que lideram suas comunidades pobres,
especialmente nas dioceses de Huehuetenango,
Quezaltenango, Verapaces e Izabal. No final de 1973
realizase o I Congresso Nacional de Religiosos
(CONFREGUA) que coordena mais de 996 religiosas e 551
religiosos do país. Em 25 de julho de 1976 o episcopado,
sob a presidência de Mons. Juan Gerardi, publicou um
documento "Unidos na esperança" - que o cardeal Casariego
não quis assinar -onde manifesta que "Guatemala vive há
longos anos sob o jugo do temor e da angústia".121 Como
exemplo entre milhares, veja-se este testemunho do Comitê
cristão de solidariedade:
93
julho de 1979. O comunicado do episcopado também
manifesta:
- Honduras
94
e o padre Casimiro Zephyr, juntamente com outros cristãos.
0 padre Betancourt fundara o Instituto Santa Clara para
capacitação camponesa e sabia que sua vida corria perigo.
Por isto pegou mal a atitude do CELAM ao informar sobre
infiltração marxista entre os sacerdotes, em 23 de junho de
1982, opondo-se ao estudo realizado por Pax Christi a favor
das forças populares (nesse estudo o italiano Mons. Betazzi
criticava e considerava equívoca a política do CELAM para
a América Central).
- Costa Rica
8. A Igreja no Caribe
- Cuba
Em Cuba128a crise passou, mas a Igreja continua
isoladada renovação da Igreja dos Pobres, da Teologia da
Libertação. Em 27 de março de 1974 Mons. Agostino
Casaroli faz uma visita à ilha; Mons. César Zacchi
énomeado núncio - em 1975 será substituído por Mons.
Mário Tagliaferri. Em dezembro de 1975 realiza-se o I
95
Congresso do Partido Comunista Cubano que, embora
manifeste certa abertura ao diálogo, continua afirmando sua
posição "dogmática": "ciência e religião opõem-se
irremediavelmente". O artigo 35 da Constituição Socialista
afirma: "É livre a profissão de todas as religiões... A Igreja
ficará separada do Estado; este não poderá subvencionar
nenhum culto".
Dois fatos: a condenação do terrorismo contra a linha
aérea cubana por parte do episcopado - em Granma no dia
16 de novembro de 1976 - e o diálogo com pastores cristãos
em Jamaica em 29 de outubro de 1977 por parte de Fidel
Castro, demonstram a situação de mútua abertura. Por isto,
no XI Festival Mundial da Juventude, em julho de 1978,
Mons. Oves pôde dizer:
96
- Haiti
No Haiti130 até o final de 1980, manteve-se a situação
de legitimação incondicional do governo de Jean Claude
Duvalier. Como a repressão se generalizou no país, a
Conferência Haitiana de Religiosos publicou um comunicado
em 24 de outubro de 1980:
97
"Aqui, há dez anos atrás, algumas paróquias do Haiti começaram a
viver urna experiência totalmente novana Igreja com o que nós
chamamos Ti Léglis ou Fraternidades... Esta reunião nacional
deixou-nos, antes demais nada, aconvicção deque as comunidades
eclesiais; de base, nas aldeias e nos bairros, são necessidade urgente
para nós. As comunidades de base não são moda passageira, mas a
figura que a Igreja assume e que se parece àquela que tinha nos
tempos dos Apóstolos (At 2,4247)".132
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nal, povo esse que resistia aos ataques do liberalismo
secularizador e antipopular - começa a modernizar-se a partir
de 1930. Estamodernização concretizou-seno modelo de
"Nova Cristandade", através do qual a Igreja realizou a aliança
com o Estado populista (exceto o México, por algum tempo),
usando as suas mesmas táticas. Esta Igreja, renovada "para
dentro" e defendendo os "seus direitos", pôde lançar-se (a
partir de 1959) à renovação dos seus compromissos "para
fora". Isto significou a crise do modelo de "Nova Cristandade"
e os primeiros passos para uma "Igreja dos Pobres". A opção
pelos pobres, pelo povo em si, tem como centro a II
Conferência de Medellín (1968), certamente o ato eclesial
mais importante do século XX cristão latino-americano. No
entanto, no novo período (a partir de 1972) por um lado se
recompõe o setor tradicionalista, conduzido por um grupo
progressista e modernizador (a partir da assembléia do
CELAM em Sucre), mas a Igreja, embora com contradições
internas crescentes, consegue dar mais um passo. Agora é o
próprio povo cristão que realiza sua protagonização. As
Comunidades Eclesiais de Base - que o padre José Marins
tanto incentivou - e a Teologia da Libertação (as primeiras
como organização do povo em si e a outra como sua teoria
cristã) são duas vertentes da vitalidade eclesial atual. Em
setembro de 1984 134 descobre-se que agora talvez "tenha
chegado a hora de uma responsabilidade missionária mundial".
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ÍNDICE
5 Siglas e abreviaturas
9 Nota introdutória
ISBN 85-349-0380-8