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● Canto I
O Canto I compreende a Invocação: o poeta invoca uma musa, solicitando-lhe ajuda para
contar a história da fúria de Aquiles (μῆνιν), o maior herói dentre os Gregos a participar na
Guerra de Troia.
A narrativa propriamente dita começa nove amos (quase dez) após o início do
conflito bélico, no momento em que os Aqueus saqueiam uma cidade aliada de Troia e
capturam duas jovens e belas donzelas: Criseida e Briseida. Agamémnon, o comandante do
exército aqueu, reclama Criseida para sua escrava e concubina, enquanto Aquiles fica com
Briseida. Crises, o pai da primeira e sacerdote de Apolo, implora a Agamémnon que lhe
devolva a filha, oferecendo em troca um rico resgate. No entanto, o monarca grego recusa-
se a satisfazer o pedido do pai ferido, por isso reza a Apolo, que envia uma praga sobre o
acampamento grego que causa a morte de muitos soldados.
Nessa noite, Agamémnon envia Criseida de volta para o seu pai e manda enviados
+ara Briseida seja retirada da tenda de Aquiles e conduzida à sua. Aquiles pede, então, a
Tétis, deusa do mar e sua mãe, que solicite a Zeus que castigue os Aqueus, depois de lhe
ter contado a sua discussão com Agamémnon. Tétis promete falar com o chefe dos deuses,
que lhe deve um favor, assim que ele regressar de um período de treze dias de festa com
os etíopes. Enquanto isso, Ulisses devolve Criseida ao pai e faz sacrifícios em honra de
Apolo. O regresso da filha deixa Crises muito feliz e reza ao deus para que termine a praga
enviada sobre o acampamento grego. Apolo aceita a oração e Ulisses regressa para junto
dos seus companheiros.
Sucede que Aquiles, depois do confronto com Agamémnon, não voltou a participar
na guerra. Entrementes, passados doze dias, Tétis fala com Zeus, como havia prometido ao
filho, mas o pai dos deuses hesita em ajudar os Troianos, pois Hera, sua esposa, está do
lado dos Gregos, mas acaba por concordar, o que deixa a deusa furiosa, porém o seu filho
Hefesto convence-a a não iniciar um conflito entre os deuses por causa de meros mortais.
● Canto VI
Com os deuses afastados da batalha, os Gregos fazem os Troianos recuar em direção a
Troia, e Menelau faz refém um cocheiro troiano, chamado Adestro, que lhe roga que o
liberte. O ex-esposo de Helena está inclinado a atender ao pedido em troca de um resgate,
mas Agamémnon convence-o a matar o prisioneiro, o que os irmãos fazem em conjunto.
Heleno, um adivinho, exorta Heitor a regressar a Troia e a pedir a sua mãe, Hécuba,
e às demais mulheres nobres que orem no templo de Atenas e façam oferendas à deusa.
De seguida, vai ao encontro de Páris, que se retirou da batalha, alegando que estava
demasiado triste para lutar. Heitor e Helena não escondem o seu desprezo pelo irmão e
companheiro, o que faz com que Páris regresse ao combate. Depois Heitor visita a sua
esposa, Andrómaca, que está ocupada com o filho de ambos, Astianax, e observa, ansiosa,
o combate que decorre em baixo, na planície. Ela implora ao marido que se retire da luta,
mas ele recusa a ideia, pois a sua honra não o permite e, se o fizesse, morreria de
vergonha, além de que não pode fugir ao seu destino, seja ele qual for. Então beija o filho,
que se assusta inicialmente com a crista do capacete, mas acaba por corresponder ao afeto
do pai numa cena familiar comovente. Quando Heitor regressa à batalha, Andrómaca sofre,
convencida de que o esposo morrerá em breve. No caminho, encontra o irmão e os dois
voltam à refrega.
● Canto IX
Os Aqueus estão desesperados. Agamémnon chora e declara que a guerra foi um
fracasso, por isso propõe regressar à Grécia em desgraça, contudo Diomedes argumenta
contra tal cobardia e afirma que ficará e lutará, mesmo que todos os outros partam. Nestor
intervém de seguida, comungando das palavras do companheiro, e sugere a reconciliação
com Aquiles, de modo que ele possa regressar ao combate. Reconhecendo a validade do
discurso de Nestor, Agamémnon decide oferecer ao chefe dos Mirmidões um conjunto de
presentes bastante valioso: Briseida, um futuro saque, uma das suas filhas e sete cidades.
Isto obviamente se regressar à guerra e reconhecer a sua autoridade. Três homens
entregam a proposta: Ájax, Ulisses e Fénix, o velho que criou Aquiles.
A embaixada grega encontra-o a tocar lira na sua tenda com o seu amigo Pátroclo.
Ulisses verbaliza a proposta de Agamémnon, mas Aquiles recusa-a, por causa do seu
orgulho ferido e declara que pretende retornar à sua terra natal, onde poderá viver uma vida
longa e prosaica, em vez da gloriosa, mas curta, se decidir ficar. Dirigindo-se a Fénix,
propõe-lhe que o acompanhe, mas este pede-lhe, de forma emocionada, que fique. E
recorda a história de Meléagro, outro príncipe guerreiro que, durante um episódio de raiva,
se recusou a lutar, para mostrar como era importante responder aos apelos de amigos
indefesos. Ájax incentiva Aquiles a conquistar o amor dos seus camaradas e coloca a sua
ausência em perspetiva, mas ele mantém-se irredutível, sentindo ainda na carne o insulto
de Agamémnon.
● Canto XVI
O Canto XVI é dominado pela ação de duas personagens inimigas: Heitor e Pátroclo. Num
plano secundário, situa-se Aquiles, cujo orgulho ferido o continua a impedir de regressar à
batalha e a agir de forma nada humana e patriótica, pois não revela, mais uma vez,
qualquer preocupação com o destino dos seus compatriotas e, em última análise, da sua
pátria. Já a atitude de Pátroclo é absolutamente diversa: ele chora ao constatar a situação
dramática e acusa Aquiles de ser frio e insensível, acusando-o de não ser filho de deuses e
humanos, mas do oceano e das rochas, forças que não possuem sentimentos. Neste
contexto, Homero cria um momento de ironia trágica relativo ao destino de Pátroclo: Aquiles
reza pelo seu sucesso na batalha contra os Troianos e pelo seu regresso são e salvo, mas
o poeta lembra ao leitor/ouvinte que o segundo termo da oração não se concretizará. Este
passo recorda, de alguma forma, o poema “O menino de sua mãe”, da autoria de Fernando
Pessoa, mas especificamente o momento em que a mãe e a criada rezam, lá longe, em
casa, pela saúde e bem-estar do jovem, quando, na realidade, já está morto.
Uma última nota para a relação entre os deuses e o destino. Tendo em conta os
eventos narrados neste canto, é lícito concluir que o destino não é imutável; pelo contrário,
ele pode ser contrariado e mudado, visto que Zeus, na iminência da morte do seu filho
Sarpédon, considera abrir uma exceção e alterar o destino, poupando a sua vida. No
entanto, nem o próprio pai dos deuses se pode dar a esse luxo sem que existam
consequências. Como Hera o adverte, se Zeus salvar Sarpédon, deixará de ser respeitado
pelos restantes deuses e serão levados a concluir que poderão fazer o mesmo, o que
acarretará problemas imprevisíveis.
● Canto XVIII
Aquiles pressente a morte de Pátroclo mesmo antes da chegada do mensageiro de
Menelau. Ao tomar conhecimento de que os seus receios eram verdadeiros, Aquiles fica
desesperado: chora, puxa os cabelos, bate com os punhos no chão, cobre o rosto de terra e
grita, enraivecido, de tal maneira que Tétis o escuta e vem com as suas irmãs ninfas
aquáticas do oceano ver o que tanto perturba o filho. Aquiles relata-lhe a desgraça que o
atingiu e afirmará que se irá vingar de Heitor, não obstante o facto de ter consciência de
que, ao fazê-lo, ao optar pela vida de guerreiro, estará a sentenciar a sua morte. Tétis
lamenta que o filho tenha de morrer logo depois de Heitor e diz-lhe que não combata até ela
voltar. A deusa do oceano pedirá a Hefesto que lhe faça uma nova armadura, já que a sua
é usada agora pelo comandante dos Troianos.
Enquanto isso, Tétis dirige-se à morada de Hefesto e pede-lhe que faça uma nova
armadura para Aquiles. Grato por ela o ter auxiliado no passado, o deus do fogo forja uma
armadura, um capacete, grevas e um escudo extraordinários com imagens de constelações,
pastagens, crianças dançando, cidades humanas em relevo, paz e guerra, vida e morte.
● Canto XXII
Heitor é o único troiano que permanece fora das muralhas de Troia. Príamo implora-lhe que
entre, mas o filho, que se sente culpado por não ter seguido os conselhos sábios que o
intimavam a fazer recolher o exército, na noite anterior, para dentro da cidade, antes ter
optado por o manter no exterior dos portões, sente-se demasiado envergonhado para retirar
e se juntar aos seus homens, por isso permanece sozinho e não entra. Quando Aquiles
regressa da perseguição a Apolo, disfarçado de Agenor, Heitor confronta-o. Inicialmente,
tenta negociar com o inimigo, porém, quando percebe que qualquer negociação é
impossível, foge. Ele corre em torno da cidade três vezes, graças à força extra que Apolo
lhe concede, com Aquiles sempre na sua cola, bloqueando-lhe a entrada em Troia. Zeus
considera a possibilidade de salvar Heitor, mas Atenas diz-lhe que a sua vez chegou. O
chefe do Olimpo põe os destinos de Aquiles e Heitor numa escala de ouro e o resultado é o
afundamento no chão do do comandante das tropas troianas.
Quando Heitor dá a terceira volta em torno da cidade, aparece-lhe Atenas,
disfarçada de Deífobo, também ele filho de Príamo (de acordo com a mitologia grega,
Deífobo casou com Helena, após a morte do seu segundo marido, Páris), e convence-o a
parar de correr, depois de prometer que o ajudará a lutar contra Aquiles. Heitor assim faz e
encara o oponente, propondo-lhe um pacto segundo o qual o vencedor do duelo não
mutilará o vencido, porém o filho de Tétis responde-lhe que não há juramentos entre
homens e leões. Então Aquiles arremessa a sua lança primeiro, mas o oponente esquiva-
se. Sem o conhecimento de Heitor, Atenas devolve a arma a Aquiles. O líder dos troianos
atira, por sua vez, a lança com que está armado e atinge o escudo do inimigo no centro.
Heitor volta-se, de seguida, para Deífobo para lhe pedir outra lança; quando descobre que o
suposto irmão desapareceu, compreende que os deuses o traíram. Percebendo a situação
dramática em que se encontra, Heitor ataca o oponente com a sua espada. No entanto, ele
usa ainda a velha armadura de Aquiles, roubada do cadáver de Pátroclo, que o seu antigo
proprietário conhece muito bem, nomeadamente os seus pontos fracos. Com um golpe
perfeito, Aquiles espeta a lança na garganta de Heitor. Moribundo, este implora ao filho de
Tétis que devolva o seu corpo aos pais, para que o sepultem, todavia o líder dos Mirmidões
recusa. Seguidamente, retira-lhe a armadura; outros soldados gregos juntam-se-lhe e
apunhalam o cadáver. Então, Aquiles amarra o corpo de Heitor na parte traseira da sua
carruagem e arrasta-o pelo solo até ao acampamento aqueu. Enquanto isso, do alto das
muralhas de Troia, Príamo e Hécuba observam a cena e choram de dor. Andrómaca ouve
os gritos e o pranto, sai do quarto e corre para onde está o casal. Quando vê o cadáver do
marido sendo arrastado pelo solo, desmaia.
● Canto XIV
Nos dias seguintes, Aquiles continua a profanar o cadáver de Heitor amarrando-o
ao seu carro, arrastando-o em torno da tumba de Pátroclo. No entanto, Apolo o corpo de
herói troiano para que não se deteriore ou apodreça e afasta cães e necrófagos, enquanto
Hera, Atenas e Poseidon impedem que os outros deuses o capturem e devolvam à família.
No décimo segundo dia após a morte de Heitor, Zeus reúne as divindades e decide
que Aquiles devolverá o corpo de Heitor em troca de um resgate, para que seja
adequadamente sepultado. Para que tal se concretize, Zeus envia Tétis para levar a notícia
a Aquiles, enquanto Íris vai ao encontro de Príamo no sentido de o instruir a constituir o
resgate. Hécuba receia que Aquiles mate o marido, mas o pai dos deuses tranquiliza-a,
enviando uma águia como bom augúrio.