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FONTES DOS DIREITOS GREGOS*

MATHEUS PIRES DE CAMPOS BORGES TANCREDI


HÉLCIO MACIEL FRANÇA MADEIRA (ORIENTADOR)

1. Fontes de Direito

Buscar pelas fontes de direito consiste em buscar saber quais e quantos são os centros
produtores de normas e quais são as formas pelas quais estes centros produtores manifestam estas
normas. Consequentemente identificar quais sejam as fontes é identificar o que é o direito para
determinado povo. Saber sobre as fontes dos direitos dos antigos gregos é saber o que pode ser
considerado direito entre eles.
A expressão “fontes de direito” é equívoca e, para que se afaste dela a confusão no estudo do
tema, cumpre listar os três sentidos principais da expressão fontes de direito, tais como resumidos por
John Gilissen:

1º SENTIDO – FONTES HISTÓRICAS DO DIREITO

São os elementos que contribuíram para a formação do direito positivo em vigor num
determinado ente, relativamente autônomo e soberano, como um país. Os sistemas jurídicos, os
direitos de uma cidade, de um império, de uma nação ou de um Estado se apresentam quase sempre
como resultado histórico dos direitos anteriores e como fruto dos contatos com os outros direitos
coevos.
Para compreender as fontes históricas de um determinado direito é necessário o recurso a
determinados conceitos próprios do estudo dos sistemas jurídicos, como são os conceitos de
continuidade, evolução, penetração, influência, resistência, renascimento jurídico, acomodação,
incrustação etc.

No direito brasileiro, são fontes históricas, partindo das mais remotas para as mais recentes: o
direito romano, o direito dos povos germânicos, em especial o visigodo, o direito canônico e o
direito português antigo. Influências do direito hebraico antigo, do direito grego antigo, do
direito franco medieval, ou, mais recentemente, da Common Law podem ser notados em
algumas normas muito específicas. O objetivo do curso de história do direito é o de apresentar
aos alunos, na medida do possível, um pouco de cada um destes sistemas, sem descurar de
apresentar em aula exemplos de fontes formais de direito (leis, costumes, jurisprudência,
doutrina) em cada um dos povos abordados.

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Material didático provisório oferecido na disciplina História do Direito I, na Faculdade de Direito da Universidade
de São Paulo, como versão prévia de artigo científico a ser publicado.

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No caso dos direitos gregos, são fontes históricas as contribuições culturais de povos que
concorreram para a formação da civilização helênica e de seu sistema normativo. Entre outros,
podemos citar as influências da civilização minóica e da civilização micênica. Investigar, por
exemplo, as influências fenícias ou orientais nos costumes comerciais do direito ático ou mais
especificamente no direito de Atenas bem como nas normas adotadas para a regência da
atividade mercantil, seria um estudo de fontes históricas dos direitos gregos. O mesmo se pode
dizer do estudo de costumes bélicos ou religiosos dos invasores dóricos sobre o direito e a
sociedade da antiga Esparta.

2º SENTIDO – FONTES REAIS DO DIREITO

São os fatores extrajurídicos que contribuem para a formação do direito. Buscar por eles é
responder à pergunta: de onde vem a regra de direito? Aqui o direito aproxima-se da ciência política,
na medida em que verifica que setores de uma dada sociedade conseguem melhor imprimir seus
interesses nos ordenamentos jurídicos, aproxima-se da sociologia, devido à preocupação de entender
como se relacionam diferentes grupos sociais, da ética quando visa demarcar o que determinado grupo
tem por justo e equânime e que valores respeita e promove, da religião, pois, é sabido que as
concepções religiosas de um povo têm acentuada influência sobre seus sistemas jurídicos, e ainda da
economia, pois fatores como o acesso a recursos naturais e condições demográficas também
condicionam as normas de um dado povo. Este segundo significado de fontes do direito é vastíssimo e
pressupõe uma abordagem multidisciplinar cujo estudo está além das possibilidades de um curso anual
de história do direito.
É grande parte em função da vastidão deste segundo significado de fontes do direito e da
enorme complexidade de se estudarem estes fenômenos, que muitos juristas fizeram consideráveis
esforços para separar o estudo destes fenômenos do campo específico da ciência jurídica. Estudos
deste tipo, se não são bem conduzidos, prestam-se muitas vezes à perda da objetividade e à
construção de um saber ideológico e dissociado da relativa neutralidade e clareza necessárias à
construção de qualquer ciência, nisto inclusa a ciência jurídica. Este tipo de estudos prosperou durante
o século XIX e foi contra ele que se levantou, por exemplo, Hans Kelsen ao escrever sua Teoria Pura do
Direito. Kelsen não negava a influência destes fatores, afinal era a teoria que era “pura” (entenda-se
objetiva, não misturada à ética, ciência política, sociologia e psicologia.) e não o direito em si.

No caso brasileiro não se pode bem compreender o direito brasileiro sem atentar para o fato
de que este território permaneceu por 322 dos seus 510 anos de história (cerca de 63% de sua
existência política) sob o domínio de uma metrópole e, em consequência disto, sujeito a fortes
limitações jurídicas e alvo de legislação específica complementar, diferente daquela da
metrópole. Além disso, completaram o seu quadro de fontes históricas os costumes indígenas
aqui originados ou outros, trazidos por estrangeiros. Não se pode ignorar, por exemplo, que até
1889, com o advento da República, instituições eclesiásticas da Igreja Católica Apostólica
Romana concentraram funções públicas essenciais para ao funcionamento da vida pública do

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país, bem como foram veículos das concepções religiosas predominantes. O direito canônico e o
catolicismo, assim, revelaram-se importantes fontes reais do direito, influenciando largamente
o direito civil, mais precisamente no direito de família brasileiro, o processo civil ou os
registros públicos.

No caso dos direitos gregos – um estudo das fontes reais dedicar-se-ia a conhecer a estrutura
política das diferentes nuances da civilização grega. Não se poderia desprezar o estudo da
formação e desenvolvimento da religião grega desde a idade das trevas até o período
helenístico. O desenvolvimento das técnicas de produção de artefatos e produtos
manufaturados tais como artigos de cerâmica ou armas, ou ainda construção civil ou naval. A
demografia das principais cidades e os fluxos mais comuns de comércio com outras pólis gregas
bem como com o estrangeiro. A história da arte grega, escultura, literatura e música também
podem ser usadas como fontes. Enfim, responder por que determinadas normas surgiram, e não
outras, pressupõe uma gama muito ampla de conhecimentos.

3º SENTIDO – FONTES FORMAIS DE DIREITO

São os instrumentos de elaboração do direito num grupo sociopolítico dado, numa época dada.
São também os modos ou formas através das quais as normas de direito positivo se exprimem. São
exemplos de fontes formais tradicionalmente elencados pela ciência do direito: os costumes, as leis, a
doutrina, a jurisprudência, a equidade, os princípios gerais do direito.

No caso brasileiro - O estudo destas fontes e de seu conteúdo normativo nada mais é do que o
objeto de estudo dos alunos de graduação em direito, durante a maior parte do tempo
dedicado ao estudo das matérias que compõem o curso. Estuda-se na disciplina “Introdução ao
Estudo do Direito” um pouco de cada uma destas fontes e de suas inter-relações e depois
estudam-se os direito civil, direito constitucional, direito comercial, direito tributário, e assim
por diante, para apreenderem-se os conteúdos destas fontes formais de direito. Assim,
habilitam-se os alunos na manipulação deste sistema de normas e, por conseguinte, tornam-se
juristas capacitados.

No caso dos direitos gregos - Este estudo a respeito dos órgãos produtores de normas e dos
tipos de normas por eles produzidos pode ser feito com qualquer grupo social. A tipologia de
fontes torna-se mais complexa, conforme os povos antigos acrescentam ao seus costumes novas
fontes normativas, sejam elas leis dadas ou votadas, sejam elas decorrentes da interpretação
de juízes ou de cientistas específicos – os juristas. Fazê-lo com relação a algumas póleis gregas
é aproximar-se daquilo que um grego da época poderia usar como direito, quando necessário se
defender em juízo ou entabular um contrato.

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Este artigo tem por fim apresentar um quadro geral destas fontes jurídicas gregas,
contextualizando-as historicamente e aduzindo, quando necessário, alguns elementos didáticos
relativos aos demais sentidos de fontes.

2. As Fontes de Cognição do Direito.

As fontes de cognição do direito são os documentos em sentido amplo, isto é, são os textos - ou
mais raramente as imagens, os monumentos ou outros símbolos -, que permitem conhecer as regras
jurídicas vigentes em determinada época. São fontes jurídicas os códigos, as leis ou as obras escritas
por um determinado jurista. São fontes não-jurídicas (conhecidas também por extrajurídicas) as
literárias, históricas, epigráficas, papirológicas, monumentais etc.
Nos direitos gregos, são raros os exemplos de fontes jurídicas. Seja porque o direito era
predominantemente costumeiro, seja pela ausência completa de juristas ou teóricos do direito. Citem-
se, como exemplo de fonte jurídica, as leis de Gortina ou as leis penais de Drácon, confirmadas por
Sólon.
As fontes não-jurídicas, por outro lado, são abundantes, especialmente quando se comparam os
direitos gregos aos direitos antigos anteriores (mesopotâmicos, egípcio, hitita etc.). A riqueza literária
da Grécia, em temas poéticos, historiográficos, filosóficos e políticos permitem um razoável
conhecimento, indiretamente, dos direitos vigentes nas diversas “cidades-estado”.
As fontes de cognição do direito, também chamadas de conhecimento, constituem o material
mais adequado para o Historiador do Direito, sem o qual não é possível narrar, hipotizar ou explicar os
fenômenos jurídicos.
A forma de citação das fontes jurídicas e não jurídicas nos textos científicos seguem, em geral,
os títulos e as divisões estabelecidas nas grandes edições críticas dos textos. Os títulos, para as obras
da Antiguidade, normalmente são em latim, mesmo para os textos gregos. Muitos deles, bem como as
divisões do texto, remontam à Renascença, outros aos seus descobridores.
Como muito raramente um texto antigo é ainda o original, é comum que os textos das cópias
(na forma de manuscritos, palimpsestos, códices etc.) cheguem incompletos, com equívocos ou em
contradição uns com os outros. As edições críticas das fontes jurídicas e não jurídicas são justamente
uma tentativa de fixar o texto original, bem como os títulos, as divisões e a numerações dos
parágrafos, facilitando a comunicação entre os cientistas.
Diversas ciências contribuem para a fixação dos textos originais: a paleografia, a edótica, a
filologia, a crítica literária, a epigrafia, a liguística etc. Eis alguns exemplos comuns de citação das
fontes de cognição dos direitos gregos (literárias, filosóficas e historiográficas):
Homerus, Ilias 15.189.
Herodotus, Historiae 6.84.1
Aristóteles, Athenaion Politeia 53.5; Ethica Nicomachea 5.10 (1135b)
Lysias, Orationes, pro Mant. 10
Demosthenes, Orationes, in Macart. 19
Plato, Leges 740e; Timaeus 87a

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Algumas editoras se especializaram nas edições críticas dos clássicos greco-romanos. Citem-se a
Collection Budé, da editora Les Belles Lettres, na França; os Classici della BUR, da editora Rizzoli, na
Itália; a Bibliotheca Scriptorum Graecorum et Romanorum Teubneriana, na Alemanha; a Scriptorum

Classicorum Bibliotheca Oxoniensis e a Loeb Classical Library, respectivamente pela Oxford University
Press e pela Harvard University Press, na Inglaterra.

3. Pluralidade de direitos na Grécia e na Ática em especial

Vejamos de modo resumido as fontes do direito nas diferentes épocas da história dos diversos
povos que hoje artificialmente generalizamos sob o nome de “gregos”. Não sem antes fazer um breve
esclarecimento sobre a pluralidade de fontes dos direitos gregos.
A Grécia, como os demais povos antigos pré-romanos, tinha uma produção normativa muito
menos intensa do que a verificada nas casas legislativas modernas. As leis eram respeitadas enquanto
carregavam em si algo de religioso e assim deveriam ser mantidas, pois constituíam um vínculo com os
ancestrais e com a tradição por eles deixada.
O estudo dos direito na antiguidade grega apresenta desde logo algumas peculiaridades que
condicionam o alcance de nosso saber a seu respeito.

I – PLURALIDADE DE SOBERANIAS.

Não há apenas um direito grego. Há diferentes direitos dos diferentes povos que compuseram a
história da antiga Grécia. A região foi composta por comunidades relativamente autônomas que
dispunham de leis próprias. As cidades-estado, cujo nome já indica a existência de soberania e
independência para cada uma das póleis, surgidas por volta da metade do século VIII a.C., são a mais
clara evidência da pluralidade de direitos, mas não são a única. Assim como cada pólis possuía seu
próprio ordenamento jurídico e exercia o controle sobre os habitantes que nela viviam, bem como nas
terras circunstantes, também em épocas anteriores à formação das póleis, cada grupo possuía um
ordenamento jurídico diferente.
Assim, há tantos direitos gregos quantas são as comunidades autônomas que se desenvolveram
na antiguidade grega. Há um direito tebano, um direito ateniense, um direito ático, um direito
coríntio, um direito espartano ou lacedemônio e assim por diante.

II – PLURALIDADE DE COMPLEXOS DE DIREITOS NO TEMPO, EM UMA MESMA PÓLIS.

Dentro de um específico direito, de uma dada pólis, o passar do tempo algumas vezes molda
alterações significativas. Diferenças de apenas trinta anos, por exemplo, provocaram alterações
drásticas na configuração do direito de Atenas, como aquelas introduzidas pelas reformas de Drácon e
depois por Sólon. Os gregos experimentaram grandes mudanças jurídicas abruptas, mesmo em âmbitos
institucionais que tendem naturalmente a ser conservadores, como os institutos civis e penais.

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III – PLURALIDADE DE DIREITOS DENTRO DE UM MESMO GRUPO AUTÔNOMO.

Aos direito gregos aplica-se aquilo que o jurista italiano Santi-Romano (1875-1947) denominou
“teoria da pluralidade de ordenamentos jurídicos”, conforme demonstrou Ugo Paoli (1884-1963),
professor de Direito Ático no Instituto de Direito Romano e Direito do Oriente Mediterrâneo da
Universidade de Roma “La Sapienza”.
A sociedade grega foi formada da sucessiva ampliação de pequenos grupos familiares
denominados óikos vinculados diretamente por laços de sangue e pela existência de um ancestral
comum. A gradual inclusão destes círculos menores em círculos mais abrangentes formou agrupamentos
cada vez maiores tais como o génos, o thíasos, os orgeones, a frátria, as tribos, obtendo-se, por fim, a
consagração destes grupos num todo maior chamado pólis, considerada esta como a expressão máxima
do desenvolvimento do direito grego, em especial do direito ático, melhor representado na cidade-
estado de Atenas.
Por pluralidade de ordenamentos jurídicos deve-se entender que uma pólis como Atenas,
paradigma para o estudo do direito grego clássico, apresenta ao observador, segundo as palavras do
professor Arnaldo Biscardi, uma estratificação de ordenamentos diversos, cada um deles com
autonomia própria. Dentro de uma mesma pólis havia normas vigentes que tinham por origem
diferentes instituições sociais.
A formação da pólis nos fornece a explicação para tanto. Junto ao direito da pólis havia ainda
um direito sagrado, independente e preexistente a ela, bem como um direito familiar, também
anterior à formação da pólis e nascido das relações entre os membros de uma família ou entre as
próprias famílias. As relações entre famílias eram regidas por duas espécies de direito familiar: um
antiqüíssimo direito “ecal” ou intra-familiar (da óikos), próprio de cada família e relativo, por
exemplo, ao destino do patrimônio familiar e ao culto dos ancestrais e dos deuses do lar, e ainda um
direito consuetudinário vigente ab initio válido entre os diversos grupos familiares (direito “não ecal”
ou inter-familiar), relativo, por exemplo, aos direitos obrigacionais resultantes de atos lícitos ou
ilícitos.
Abaixo faz-se uma pequena representação esquematizada da sucessiva ampliação de grupos
menores e de sua inclusão em outros mais abrangentes, com os direitos daí decorrentes convivendo na
conformação final que é a pólis.

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Antiga Estrutura Social Ática

Atenas surgiu da reunião de pequenos centros áticos originários e conservou até as reformas de Clístenes (arconte de 510 a 506
a.C.) uma antiga subdivisão de sua população.

Óikos

É a unidade original da sociedade grega antiga. É o conjunto formado por um grupo familiar mais ou menos extenso que inclui
todas as pessoas livres e escravos que dependem de um chefe, bem como os bens móveis e imóveis necessários às atividades
econômicas realizadas dentro deste oikos, todos destinados a assegurar sua existência material como uma verdadeira autarquia
que basta a si mesma. Pertenciam ainda ao oikos os objetos sagrados de culto aos ancestrais e as orações e rituais nele usados.

e espiritual. Era encabeçada por um chefe, que no mundo homérico será um grande guerreiro como Odisseu, Agamenon ou

Posteriormente surge a estrutura que, presente em diferentes povos, é denominada clã. Grupos de óikos compunham grupos
maiores que poderiam ser:

O Génos - integrado pela aristocracia, os ditos eupátridas.


O Thíasos - integrados por plebeus.
Os Orgeones - compostos pelo restante da população, os estrangeiros inclusive.

A Frátria – agrupamento maior de vários grupos de clãs como os acima mencionados.

A Tribo – a reunião de frátrias compunha uma das quatro tribos jônicas das quais os atenienses diziam-se descendentes.

Pólis
A soma destes grupos preexistentes formará, da metade do século VIII a.C em diante, as diferentes cidades-estado gregas. Cada
uma delas soberana, autônoma e contendo em seu interior uma série de direitos independentes. Em cada pólis coexistiam,
portanto, diversos direitos, cujas regras ora podiam se complementar reciprocamente, ora entravam em conflito.

Direito Sagrado Direito Intra-familiar Direito Inter-familiar Direito da Pólis–político.

Para além dos limites da pólis poderiam aparecer ainda duas diferentes ordens jurídicas, que
também se interpenetram e se influenciam reciprocamente .

Direito dos comerciantes Direito Inter-Póleis


(lex mercatoria)

Uma espécie de direito internacional


público que se manifestava nas diferentes
Direito surgido das relações entre os normas produzidas no âmbito das
comerciantes e disciplinado por normas e negociações entre diferentes pólis em
costumes não pertencentes a nenhuma tempos de guerra ou de paz. São
pólis em especial, mas que se sobrepõe ao exemplos deste direito os tratados de paz,
ordenamento de todas e é reforçado por os acordos de formação de ligas entre
decisões como as dos tribunais comerciais cidades-estado ou ainda as concessões de
atenienses. igualdade política (isopoliteia) a cidadãos
de outras cidades-estado.

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As póleis viriam a ser constituídas pela reunião de tribos numa mesma unidade geográfica e
política. Cada um dos grupos menores que compuseram a pólis tinha originariamente poderes para
produzir normas jurídicas, ainda que não fossem escritas e se resumissem por vezes a costumes muito
antigos. Quando a pólis se formou, a unidade política principal teve de trazer para dentro de si todos
estes direitos preexistentes, sob pena de não o fazendo tornar-se insustentável.
Daí porque junto ao direito da pólis havia um direito sagrado, muito mais antigo do que o
direito da pólis, oriundo de costumes religiosos do culto aos ancestrais praticado dentro de cada oikos.
A existência de um preexistente direito familiar explica-se uma vez que a normatização das relações
sociais inter-familiares e intra-familiares, vale dizer, dentro de cada óikos e entre eles, assim como
entre frátrias ou tribos diferentes já fora levada a cabo muito antes da formação da pólis. O resultado
é que dentro da pólis vigiam ainda outros direitos independentes e simultâneos, de modo que alguém
podia perder o direito de cidadania perante o direito da pólis mas não perder os seus direitos sagrados
de culto e os direitos familiares.

4. As Fontes dos Direitos Gregos proeminentes.

I. DIREITO DOS POVOS SEM ESCRITA

Com o desenvolvimento da ciência histórica do direito, foi possível perceber alguns padrões
recorrentes no desenvolvimento dos diferentes direitos, como aquele segundo o qual os povos
começam sua vida social com uma forma de direito costumeiro, em épocas onde ainda não há a
escrita. Somente depois do advento desta é que se passa a adotar as leis como fontes formais do
direito, de modo mais frequente.
Para todos os povos, em suas origens, há sempre um direito original informe, composto por
regras costumeiras e estudado por disciplinas como a etnologia jurídica e a arqueologia. Esse direito
costumeiro às vezes é acessível ao historiador através de documentos escritos, de fases posteriores,
que reproduzem a própria norma que se quer conhecer ou então dão testemunho indireto da existência
dela. Este direito dos povos sem escrita existiu entre todos os povos que formaram os direitos gregos
no início de suas civilizações e apresenta as seguintes características determinantes: os costumes são a
fonte formal predominante; cada sociedade possui costumes próprios, enquanto vivem em isolamento;
porque relativamente isoladas, as sociedades apresentam variedade de costumes, com respostas
normativas heterogêneas a problemas sociais semelhantes; há indiferenciação entre o que é religião,
direito e moral. Não há delimitação do que vem a ser o âmbito especificamente jurídico.

II. DIREITO MINÓICO

A civilização minóica é a primeira civilização européia de que se tem notícia. Seu nome provém
do mitológico Rei Minos, soberano de Creta, em cujo reino nascera o minotauro, posteriormente
encerrado em um labirinto. A mitologia indica a existência de possíveis relações entre os minóicos e os

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povos continentais gregos, ainda que isto não seja suficiente para fazer qualquer tipo de afirmação
histórica.
Foi a complexa estrutura arquitetônica dos palácios minóicos a possível causa da afirmação
mitológica da existência do famoso labirinto. Ainda segundo o passado mitológico, para vingar a morte
de seu filho Androgeu, levada a cabo por Egeu, rei de Atenas, Minos exigiu o envio anual de um grupo
de sete rapazes e sete moças à ilha para serem oferecidos em sacrifício ao Minotauro, que os devorava.
E graças ao filho de Egeu, Teseu, que o pesado tributo foi superado. Ele dirigiu-se a Creta e,
ingressando no labirinto com o auxílio de Ariadne, que lhe confiou um novelo de linha para saber o
caminho de volta, trucidou o terrível monstro. Teseu foi o maior dos heróis atenienses de que a
mitologia dá notícias. Ao partir para Creta, o rei Egeu, seu pai, aconselhou-a a içar velas brancas em
sua embarcação caso voltasse vitorioso. O herói esqueceu-se do ajustado e seu pai, ao ver as velas
pretas da embarcação, em desespero, atirou-se ao mar que desde então é chamado com seu nome, o
Mar Egeu.
No campo da pesquisa arqueológica estudos conseguiram fixar a seguinte cronologia da
civilização minóica:

I) DE 3.000 A.C A 2.000 A.C. - PERÍODO MINÓICO ANTIGO - Período da existência de um sistema de escrita
hieroglífico ainda não decifrado.

Nele se inclui o PERÍODO PRÉ-PALACIANO (DE 2.600 A 2.000 A.C.) em que inexistiam chefes locais
suficientemente poderosos para centralizar a autoridade. Os diversos clãs vivem separados.

II) DE 2.000 A 1.580 OU 1.550 A.C. - PERÍODO MINÓICO MÉDIO – Em que se utilizava um sistema de escrita
denominado LINEAR A, também ainda não decifrado. Inclui os seguintes subperíodos:

PERÍODO PROTO-PALACIANO (DE 1.900 A 1.700 A.C. ) – Em que surge a autoridade dos reis. Os
minóicos iniciam a colonização da Ásia Menor. Constroem-se os primeiros grandes palácios e
fixa-se uma estrutura administrativa que centraliza as atividades da comunidade. A sociedade
divide-se em nobres, camponeses e hierarquiza-se. A cidade é próspera e mantém comércio
florescente pelo Mar Mediterrâneo, mas declinou abruptamente por alguma catástrofe natural
ou devido a alguma invasão de outro povo.

PERÍODO PALACIANO (DE 1.700 A 1.400 A.C.) - Sobre as ruínas dos antigos palácios constroem-se
outros ainda mais fantásticos, dos quais o de Cnossos é um excelente exemplo. Implanta-se um
regime administrativo e econômico único ao longo de toda a Ilha de Creta, que se vê
interligada por estradas pavimentadas. A atividade comercial aumenta as riquezas e a produção
de artefatos chega o seu auge. As mulheres, diferentemente do restante das cidades-estado
gregas que virão depois, tinham maior número de direitos, incluindo direitos políticos e direito
de propriedade. A civilização minóica leva seus produtos e sua cultura ao Mar Egeu e ao

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Peloponeso. Ao final desta época as frotas minóicas começam a sofrer a concorrência de uma
potência continental emergente, a civilização micênica.

III) 1.580 OU 1.550 A.C. A 1.100 A.C. - PERÍODO MINÓICO ANTIGO – em que se descobriu a existência de um
sistema de escrita denominado LINEAR B (decifrado por Ventris e Chadwick em 1953). Nele se incluem
dois subperíodos:

PERÍODO PÓS-PALACIANO (DE 1.400 A 1.150). Por volta de 1.450 a.C. se destruíram as comunidades
do interior da ilha de Creta e vários palácios também foram postos abaixo. Cnossos foi
destruída por volta de 1.375 a.C., por causas ainda imprecisas, talvez por invasões ou em razão
de uma possível erupção vulcânica na Ilha de Thera, localizada próxima à Ilha de Creta. Com a
queda da principal cidade, as influências continentais passam a sentir-se mais fortemente e
apontam para um provável controle micênico. As placas escritas em Linear B, já decifrado,
apontam neste sentido.

PERÍODO SUB-MINOICO (DE 1.150 A 1.100 A.C.). Nelo o continente grego é varrido pela invasão dos
dóricos, que conquistam os aqueus (que compunham a civilização micênica) e depois invadem a
Ilha de Creta, pondo fim ao que restará da civilização minóica.

De posse do quadro acima, percebe-se que no caso do direito minóico a história do direito está
limitada ao estudo das épocas em que há escrita e que se trate de uma escrita já decifrada. Torna-se
inacessível o conteúdo do direito minóico antigo e médio. Ocorre, porém, que no período no qual se
conta com escrita decifrada, o linear B, este já é um período de predominância micênica, não havendo
direito fato acesso às fontes formais de direito minóico.
Decifrada a escrita linear B em 1953 pelos ingleses Michael Ventris e John Chadwick, não se
encontrou ainda inscrições que fizessem referência a algo além de um minucioso registro contábil de
produtos agrícolas.
É de se admitir, pelo grau civilizatório revelado em escavações arqueológicas, pela estrutura
administrativa e burocrática já hierarquizada sob o comando central de um rei, pelo comércio
abundante, que o direito minóico tenha alcançado um razoável nível de desenvolvimento.
Por outro lado, conjectura-se também da proximidade cultural dos minoanos com os etruscos,
especialmente no que diz respeito a costumes fúnebres, como as construções tumulares, e da
distância, por sua vez, dos costumes egípcios.

Mas a falta de documentos (fontes de cognição) diretos acerca das instituições jurídicas do
período torna o direito desta época muito mal conhecido, assim como se ignora a existência de outras
fontes do direito, além dos costumes. Conjectura-se, em razão de relatos homéricos e da existência de
afrescos minoanos representando mulheres sacerdotisas, fiadeiras, oleiras, pugilistas, toureiras e
caçadoras, que a situação social da mulher dever-se-ia refletir na jurídica, que provavelmente
conferira a ela liberdades, das quais os demais povos gregos posteriores não desfrutaram.

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DIREITO MICÊNICO

A civilização micênica, diferentemente do que ocorre com a minóica, composta pelos aqueus
(nome pelo qual pareciam chamar a si mesmos), é civilização propriamente grega. Tem por importante
testemunha o próprio Homero, a quem os antigos consideravam não somente poeta, mas verdadeiro
historiador.
Ainda já se tratasse de gregos sua estrutura é profundamente distinta daquela que
encontraremos no período clássico grego. Guarda maiores similaridades com os estados orientais da
Ásia Menor como o dos povos do crescente fértil ou hitita.
Os micênicos são o resultado da mistura do povo originariamente existente no território grego
com grupos numerosos de guerreiros vindos das planícies do mar negro e noroeste da Ásia menor. Por
volta de 1.600 a.C. a fusão dos dois deu origem à civilização micênica. Este povo será a base sobre a
qual se formará a nação grega. Guerreiros poderosos e ricos o suficiente para combater em carros de
guerra, conseguiram formar frouxas alianças políticas e comerciais entre os diversos centros de poder
regionais e assim ergueram fortificações em posições defensivas privilegiadas a partir das quais
controlavam grandes porções de terra.
Uma destas fortalezas destacou-se das demais e seu nome acabou por ser o da civilização que

representou. Trata-se de Micenas (Μυκηνες), situada na região nordeste do Peloponeso. Foram os


primeiros a produzirem documentos escritos em língua grega e em grande medida adaptaram para si
avanços culturais dos minóicos que à época de seu surgimento encontravam-se em seu auge. O seu
sistema de escrita foi uma adaptação daquele que existia na civilização minóica e serviu-lhes para
fortalecer o controle da produção agrícola e pastoril que floresceu sob a proteção de suas fortalezas.
Apesar de praticarem o comércio e até mesmo a pirataria as navegações não apagaram as
características principais dos micênicos: o gosto pela guerra, pelas glórias da batalha e pela conquista.
Eram em grande medida dependentes de trocas com civilizações mais antigas e ricas, como a dos
egípcios ou hititas. Os reis dependiam da riqueza gerada por meio destas trocas para pagar seus
seguidores, recompensar a elite guerreira que os acompanhava e assim manter a dignidade e o poderio
político e militar. Depois de 1.300 a.C. o comércio com estes povos, por diversas razões, caiu
abruptamente e por volta de 1.200 a.C. os diversos reis de cada uma das fortalezas principais, unidos
por alianças militares, lançaram-se sobre Ílion (Tróia para os romanos), a próspera cidade situada no
Helesponto, a estreita passagem entre Ásia e Europa, importante rota comercial entre o Mar Egeu e o
Mar Negro.
Esta guerra está contida na Ilíada, poema mantido por vários séculos com o esforço dos poetas
e aedos, que memorizavam e padronizavam seu conteúdo, finalmente eternizado por Homero, por
volta do ano 850 a.C., ou seja, cerca de 350 anos após o evento que pretendeu narrar. A batalha se
transformou num longo cerco que se arrastou por 10 anos, na qual se narraram as histórias dos grandes
heróis e reis aqueus como Ájax, Aquiles, Odisseu, Menelau e Agamenon, bem como dos líderes troianos
como Páris e Heitor. Ainda que o poema faça referência ao rapto de Helena como razão do embate, as
razões comerciais e estratégicas acima apontadas parecem ter sido o real motivo.

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A outra epopéia de Homero, a Odisséia, narra o retorno de Odisseu (Ulisses entre os romanos)
para seu reino na ilha de Ítaca, localizada no mar jônico situado entre a península balcânica e a
península itálica. O arguto Odisseu foi o responsável pelo estratagema do cavalo que acabou por
conduzir os gregos à vitória sobre Tróia, assinalando o predomínio da inteligência e da estratégia sobre
a força bruta.
Não muito tempo depois da vitória sobre os troianos, a civilização micênica viu-se inundada por
povos vindos do norte da Grécia e conhecidos com Dóricos. Os invasores da península balcânica,
dotados de rígida organização tribal, não encontram resistência suficiente por parte dos micênicos, já
enfraquecidos. Ainda que os micênicos suspeitassem da invasão e houvessem se preparado para ela,
seus esforços não foram suficientes. A onda de invasores dóricos atravessou de norte a sul quase toda a
Grécia, mas devido à geografia da região passou ao largo da Ática, região onde se situa Atenas, fazendo
desta um refúgio para os expulsos de outras paragens e dando à região a oportunidade para o
desenvolvimento daquela que viria a ser a mais destacada pólis da civilização grega na época clássica.
Os dórios, originalmente guerreiros rudes e analfabetos, entraram na composição da população
da futura cidade-estado de Esparta e, por volta de 1.140 a.C., causaram o próprio fim da civilização
micênica.
No campo normativo, as informações mais aproximadas nos são fornecidas por Homero. Através
dos seus poemas é possível inferir uma imagem da organização política e do direito micênico, tomados
os devidos cuidados, devido à natureza da fonte e à concepção idealizada de um mundo micênico, tal
como apreendido por um grego do período arcaico, séculos depois dos fatos epicamente narrados.
Há uma tendência ao exagero nas descrições sobre os tesouros dos reis micênicos ou sobre o
número de servos e guerreiros que tinham a seu dispor. A distância temporal entre Homero e Micenas,
o engrandecimento dos fatos, dos tesouros, do número de servos e guerreiros podem diminuir a
precisão histórica, mas não prejudicam uma interpretação das instituições relatadas, de um período
que pode ser denominado da “Sociedade Homérica”, inexistente de fato, mas reminiscente do mundo
micênico, seja o desaparecido, seja o que sobreviveu nas cidades jônicas do século VIII, onde viveu o
poeta.
E alguns valores micênicos ainda sobreviveram no início da idade arcaica, em que viveu
Homero, e permanecerão até a idade clássica, formando uma espécie de moral aristocrática e
guerreira de alguns grupos da própria pólis clássica.
Nota-se em Homero a ausência da pólis. Pequenos reinos militares de governo centralizado e
burocrático contabilizavam minuciosamente a sua atividade econômica, muito diferente das cidades-
estado politicamente ativas do período clássico, permeadas de variadas magistraturas e conselhos
prontos a limitar e balizar o arbítrio dos governantes em prol do desenvolvimento da própria pólis.
Mais alto do que a comunidade cívica, fala o oikos aristocrático. Ele será o centro produtor das
normas e das decisões. As figuras de guerreiros e grandes heróis são recorrentes e estes agem sem
necessidade de consulta popular. Os chefes de cada óikos em poucas palavras poderiam ser
caracterizados como líderes arbitrários e voluntariosos, ávidos por poder, glória e fortuna, e não
contidos por normas claras, ou por leis dadas para a obediência de todos.

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A riqueza era constituída basicamente da propriedade de terras cultiváveis, administrada pelo
senhor do óikos, que demonstrava poder e prestígio guardando tesouros em seu próprio lar. O valor do
guerreiro nobre medir-se-á pelo volume do tesouro acumulado e pela magnificência com que distribui
presentes. Aos hóspedes de igual condição social é costume promover a farta distribuição de presentes.
A hospitalidade é ao mesmo tempo um dever, um prazer e uma fonte de prestígio para o chefe do
óikos. Hesíodo os denomina “reis devoradores de presentes”, nobreza com grande apetite por riquezas,
mesmo que tenha de recorrer à pirataria. Entre os camponeses constrói-se a visão de que é na cidade
que se encontram julgadores corruptos, reis arbitrários e autoritários.
A sociedade aristocrática se rege predominantemente pelos costumes ancestrais, cultivados
dentro de cada óikos e transmitida pelas gerações. Não sentiram ainda a necessidade da lei, ainda que
já contassem com a escrita. Normas abstratas e gerais não eram ainda conhecidas. Na figura do rei
concentravam-se os poderes políticos, administrativos, jurídicos e religiosos, na mesma proporção em
que, para os assuntos domésticos, era o pater a instância primeira e última das decisões. As estruturas
micro-sociais de poder, de natureza familiar-patriarcal autoritária e de economia de subsistência
familiar, serviam de causa exemplar para organização política das primeiras cidades.
O rei é divinizado, ou ao menos recebe as honras divinas; reparte os lotes de terras para as
famílias; comanda as tropas e mantém uma grande burocracia, com numerosos de escribas, para
administrar os impostos, as terras, os exércitos, conforme atestam centenas de tabuletas descobertas,
em Linear B, nos palácios de Pilos e Micenas.
O exercício da autoridade régia, assentado e legitimado nos costumes, como o da autoridade
familiar, não dependia da edição de leis gerais, ainda raras na civilização micênica. A Grécia micênica
repetia os passos comuns aos demais direitos antigos. Somente o crescimento das cidades e a
necessidade de um costume único para parcelas diferentes de um povo farão surgir a necessidade de
fixação dos costumes por escrito. E a aristocracia, que se deixa habituar à arbitrariedade e à adulação,
fará por germinar, lentamente, a necessidade de um novo remédio social, que será bem conhecido
mais tarde, as leis gerais, normas objetivas, do conhecimento de todos e aplicáveis de forma imparcial.
Caberá a tempos vindouros a preocupação com a elaboração de normas e códigos claros e
acessíveis a todos como forma de conter o arbítrio dos mais poderosos. As primeiras leis ainda serão
apenas a fixação dos costumes imemoriais por escrito, para a segurança dos súditos. Mas as leis como
as de Drácon e Sólon, já no século VII a.C., suprirão aquela deficiência com mais eficiência e
profundidade.
Como no período anterior, as fontes são mínimas do período. Quase todas indiretas, literárias,
escritas séculos depois; ou monumentais e epigráficas, retratando aspectos isolados da civilização.

A “IDADE DA TREVAS”.

Período de 400 anos que se estendeu da derrocada da civilização micênica pelos Dóricos, no
século XII a.C., até o século IX a.C. quando começam a formar-se o que mais tarde seriam as cidades-
estado gregas.

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Ao final deste período e início da idade arcaica é que são compostos os poemas homéricos que
pretendem narrar eventos da extinta civilização micênica. Adaptando-se as vogais do alfabeto fenício
ressurge na Grécia uma língua que já apresentava as feições do grego antigo que foi usado no período
clássico. É a língua usada por Homero e Hesíodo.

DIREITO ATENIENSE

Atravessando o período arcaico (~800 a.C – próximo da data dos primeiros jogos olímpicos
realizados em 776 a.C. até o ano de 480 a.C. com a vitória grega na Batalha de Salamina) no qual se
formam as diferentes póleis, dentre as quais Atenas, chegamos enfim ao período no qual a lei em
sentido lato ganhará força como fonte formal dos direitos gregos.
Como explicado acima, os COSTUMES DOS OIKOS, GÉNOS, FRÁTRIAS, TRIBOS e outros grupos incorporam-se
como ordenamentos jurídicos independentes ao sistema jurídico da pólis. SÃO ELES NOSSA PRIMEIRA FONTE FORMAL

DE DIREITO EM ATENAS BEM COMO EM TODA PÓLIS.

Apenas com base nestes costumes já podemos contar com um DIREITO SAGRADO, UM DIREITO INTRA-FAMILIAR

E UM DIREITO INTER-FAMILIAR. A eles acrescentar-se-ão mais duas fontes formais de direito dentro da pólis.
Em época arcaica, período no qual as diferentes póleis lentamente se formaram, várias
importantes figuras históricas destacaram-se como homens de saber incomum e como autores de
conselhos e máximas de indiscutível valor na condução da vida pública e na justa aplicação das normas
e regras de conduta social.
Sete destes homens forma grupados sob o nome de sete sábios da Grécia antiga. Todos eles
eram legisladores e figuras públicas, autores de máximas e preceitos que pelo valor e justiça de suas
mensagens receberam a honra de serem inscritos no mais famoso santuário da complexa religião grega,
o Templo de Apolo em Delfos.
Platão nos oferece uma lista destes sábios. Vejamos:
• Tales de Mileto;
• Periandro de Corinto;
• Pitaco de Mitilene;
• Bias de Priene;
• Cleóbulo de Lindos;
• Sólon de Atenas;
• Quilon de Esparta.

As MÁXIMAS E PRECEITOS DE AUTORIA DESTES SETE LEGISLADORES E POETAS eram frequentemente utilizadas em juízo
durante as sustentações das causas perante os juízes. SERVIAM ENTÃO TAIS COMO PRINCÍPIOS GERAIS DO DIREITO E ERAM EM

GERAL BEM RECEBIDAS PELOS OUVINTES, CONSTITUINDO MAIS UMA FONTE FORMAL DO DIREITO ATENIENSE.

Consolidada a pólis, ao direito costumeiro, de onde advém o direito sagrado, o direito inter-
familiar e o direito intra-familiar, e às máximas e preceitos dos sábios legisladores somar-se-ão, enfim,
as fontes formais do direito ateniense que são consideradas clássicas da cidade-estado de Atenas,

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aquelas que produziram um direito que se pode dizer propriamente político, oriundo da pólis. Estas
fontes formais começaram a codificar e registrar as normas jurídicas de forma mais clara e distinta.
Servem estas fontes como LEIS OU DECRETOS para positivar por meios dos órgãos com capacidade de
produzir normas aquelas regras costumeiras mais antigas, em prol da segurança jurídica e da
diminuição do arbítrio dos governantes.
No limiar do século VIII a.C. Atenas se apresenta constituída pela reunião de quaro pequenos
centros regionais da Ática formadas a partir das quatro tribos jônicas originais, tais como
esquematizado acima. As tribos subdividiam-se em frátrias e estas em grupos menores vinculados por
consangüinidade. Dentre os tipos diferentes de clãs temos O Genós – γενος, integrado pela aristocracia,
os ditos eupátridas. Há o Thíasos – ϑιασος - clã integrado por plebeus, e por fim os Orgeones – οργεϖνες –
compostos pelo restante da população, o que incluía os estrangeiros.
Num primeiro momento Atenas, como todas as cidades-estado foi governada por um rei um

βασιλευς. Este rei concentrava todos os poderes políticos e religiosos, concentrando os poderes
constitucionais de produção normativa e de judicatura. A VONTADE DESTE REI, DENTRO DOS LIMITES DOS COSTUMES

ANTIGOS E DO RESPEITO AOS DEUSES, ERA SOBERANA E FONTE FORMAL DO DIREITO ATENIENSE JUNTANDO-SE ÀS DEMAIS FONTES COTUMEIRAS . O
mesmo ocorreu no início da formação de todas as pólis gregas.
A este rei junta-se em seguida um conselho de anciãos. Este conselho de anciãos auxiliava o rei
nas suas funções de soberania, tais como o comando militar em tempo de guerra, o que ocorria com
freqüência, a condução do supremo sacerdócio e o exercício da jurisdição.

O AREÓPAGO - Este Conselho de anciãos é denominado Areópago. O nome provém da junção das

seguintes palavras gregas: Áreios (Αρειος)– adjetivo que significa consagrado à Ares, o deus da guerra,

e Págos (παγος)– substantivo masculino que significa rochedo, colina ou montanha.


O Areópago era, portanto, um conselho de anciãos que recebeu este nome porque se reunia em
cima de um rochedo que ficava a meio caminho entre a ágora (αγορα - o centro comercial e cívico de
Atenas) e a acrópole (ακροπολις - a parte alta da cidade, que em Atenas abrigava um conjunto de
templos dentre os quais o Pártenon). Esta colina era dedicada ao deus da guerra, Ares. A escolha é
compreensível uma vez que ainda é marcante na pólis a presença de uma classe social composta pela
aristocracia guerreira, devotada ao deus da Guerra. Este rochedo foi identificado e existe até os dias
de hoje na Atenas moderna.
Posteriores reformas promovidas por Efialtes (membro do partido democrático) em
462/461 a.C., diminuíram os poderes da aristocracia ateniense e acabaram com quase todo o poder do
areópago, ainda que o mesmo nunca deixasse de contar com legitimidade e apreço por parte dos
cidadãos atenienses.

Segundo a mitologia o Areópago foi o primeiro tribunal da Grécia e realizou-se nele o


primeiro julgamento da história. O mito diz que Agamenon, comandante aqueu na Guerra de
Tróia e rei de Micenas, ofereceu a vida de sua filha em sacrifício. Agamenon era casado com
Clitemnestra e com ela tinha os seguintes filhos: Ifigênia, Orestes Crisotêmis e Electra.

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Às vésperas de partir em direção à Ílion (Tróia), Agamenon provoca a ira de Ártemis
(Diana), irmã gêmea de Apolo, ao dizer-se tão bom caçador quanto ela. Equiparar-se a um deus
era tido como a mais odiosa ofensa de todas. A deusa para puni-lo causou uma calmaria que
deteve toda a frota de Agamenon no porto de Áulis. Um adivinho disse a Agamenon que Ártemis
só seria apaziguada se ele consentisse em sacrificar a própria filha. Inicialmente Agamenon
recusa, mas, pressionado pelos soldados e temendo a dispersão dos guerreiros e o fracasso da
expedição, manda um emissário buscar sua filha Ifigênia em Micenas sob o pretexto de fazê-la
casar-se com Aquiles. No momento em que ela estava para ser sacrificada Ártemis, por
piedade, a salva e leva para um santuário distante.

A mãe de Ifigênia, Clitemnestra não perdoa a atitude do marido Agamenon de dar a


própria filha em sacrifício. Como vingança durante os 10 anos da Guerra de Tróia ela torna-se
amante de Egisto. Em Tróia, Agamenon toma Cassandra, filha do Rei troiano, como esposa e
despojo de guerra. Esta o adverte de que grande desgraça o esperaria em Micenas. Ele não dá
ouvidos a ela. Ao retornar para Micenas sua esposa Clitemnestra e o amante dela, Egisto, o
matam a golpes de machado.

Quando do assassinato de seu pai, Orestes era ainda uma criança. Ele e sua irmã
Electra viram-se ameaçados pela mãe e pelo amante da mãe logo após o assassinato de seu pai.
Electra entrega o menino Orestes a um preceptor que o leva para outro reino. Electra é
poupada mas é reduzida pela própria mãe à condição de escrava. Depois de atingir a
maturidade Orestes recebe de Apolo a ordem para vingar a morte do seu pai Agamenon. Ele
então se dirige a Micenas, infiltra-se na cidade disfarçado e mata sua própria mãe Clitemnestra
e o amante dela Egisto. Autor de matricídio Orestes é perseguido pelas eríneas (as fúrias) e
foge para Delfos onde Apolo o purifica. É depois acusado perante um tribunal que se reúne na
colina de Ares, o Areópago, sendo esta a primeira vez que o tribunal se reúne para um
julgamento. O violento crime de Orestes fora a razão da criação do Areópago.

O julgamento foi presidido por Atena (Minerva entre os romanos) e no processamento


da causa chegou-se a um empate com igual número de votos pra condenar e absolver Orestes.
Atena então interveio e com seu voto (o voto de Atena, Minerva) absolveu Orestes. Nasce assim
o Areópago.

Junto ao areópago havia ainda um órgão que reunia todos os cidadãos de Atenas, mas com
competência bem limitada. Ele é o embrião do órgão que será o mais importante de Atenas, a Ekklesia
ou Assembléia de todos os cidadãos.

Os Arcontes - A aristocracia, desejando enfraquecer o poder central do rei, gradualmente


fragmenta o poder régio e atribui suas competências a magistrados eleitos, os arcontes. Os arcontes

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eram os mais altos magistrados da Atenas clássica e possuíam variadas atribuições. Em seu auge Atenas
teve três diferentes arcontes, cada qual responsável por um conjunto de atribuições diferentes relativo
a um tipo específico de assuntos. A eles juntaram-se mais tarde outros seis magistrados denominados
tesmotetas, com o encargo de controlar a legalidade dos provimentos dos magistrados e das
assembléias populares. Foi através do arcontado de três cidadãos atenienses proeminentes, em
diferentes épocas, que Atenas adquiriu sua feição clássica de uma democracia direta. São eles:

1º ARCONTE NOTÁVEL - DRÁCON ( ∆ρακον ) – tendo assumido a magistratura de arconte em 621 a.C.,
logo após uma tentativa de um golpe de Estado, Drácon recebeu dos cidadãos atenienses poderes
extraordinários para colocar fim ao conflito social que se sucedeu. Controlado o conflito, foi incumbido
da tarefa de redigir um código de leis escritas, positivando aquilo que era em grande parte oral até
então. Drácon baseou-se nas normas tradicionais que serviam de base para os julgamentos realizados à
época. Redigiu-se então o CÓDIGO DE DRÁCON.

Com sua lei Drácon reforçou a supremacia do direito público da pólis sobre os direitos
particulares preexistentes à pólis, que, como vimos, tratavam dos problemas inter e intra-familiares,
bem como de assuntos religiosos. Ele suprimiu a vingança privada como forma de composição de
conflitos, retirando poderes das famílias e concentrando-os nas mãos da comunidade de cidadãos e dos
poderes públicos. Manteve, porém, o poder de jurisdição que o pai possuía sobre o filho, assegurando-
lhe o direito de julgá-lo ele mesmo e não entregá-lo para o julgamento diante dos tribunais da pólis.

O CÓDIGO DE DRÁCON É O PRIMEIRO CÓDIGO DE LEIS ESCRITAS DE ATENAS E CONSTITUIU IMPORTANTÍSSIMA FONTE FORMAL DE DIREITO

EM ATENAS. O código é conhecido pela sua severidade o que originou o adjetivo draconiano, aplicado a
leis dotadas de punições muito severas. Os crimes graves eram submetidos ao Areópago e contavam
com penas como o exílio ou a pena de morte. Deve-se a Drácon o começo de um importante princípio
do Direito Penal: a diferença entre o homicídio involuntário, voluntário e em legítima defesa. A falta
de proporção, porém, ficou patente na imposição de penas, pois, tanto o homicídio quanto o furto
eram punidos com a pena de morte.

2º ARCONTE NOTÁVEL - SÓLON ( Σολον ) – exerceu seu arcontado nos anos de 594-593 a.C. e realizou
profundas alterações na constituição mesma de Atenas e nas formas de distribuição de poderes dentro
da pólis. ESTAS LEIS APRESENTADAS POR SÓLON ESTÃO ENTRE AS MAIS IMPORTANTES FONTES FORMAIS DO DIREITO ATENIENSE. Em linhas
gerais as reformas consistiram em:

Abolição da escravidão por dívidas - no início do século VI a.C. as tensões sociais em Atenas se
haviam tornado agudas. Os mais pobres voltavam-se contra os donos de terras. Muitos cidadãos haviam
sido reduzidos a meeiros das colheitas e outros ainda haviam vendido a si mesmos como escravos para
pagar seus débitos. O poeta Sólon foi indicado para legislador e mediador de conflitos. Sólon cancelou
a maioria das dívidas e libertou os que tinham sido escravizados. Devolveu aos pequenos proprietários

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as terras que haviam perdido pelo não pagamento de dívidas. Recusa-se, porém, a dividir as
propriedades ou a retirar poderes políticos da aristocracia.

Estabelecimento de uma constituição censitária - o voto dependendo da riqueza, dividindo o


povo em quatro classes e nelas distribuindo poderes políticos e direitos de participação nas
magistraturas de acordo com a capacidade econômica de cada um.

• A primeira classe de cidadãos era a dos chamados Pentekosiomedimnoi – produziam ao menos


500 medimnoi (medidas) de grãos por ano, daí seu nome. Elegíveis aos mais altos cargos, mais
altas magistraturas. Numa estimativa aproximada as 500 medidas por ano equivaliam a
2.572 m3 de grãos, o que dá um cubo compacto de grãos de aproximadamente 13,75 m de lado.

• A segunda classe de cidadãos era a dos Hippeis (cavaleiros). Eles eram os capazes de manter
um cavalo e cuja propriedade produzisse ao menos 300 medimnoi (300 medidas) de grãos por
ano. Podiam participar das altas magistraturas. Cavalos tornam-se então sinais de riqueza e
permitem ao cavaleiro lutar nas guerras dentro da divisão de cavalaria. As 300 medimnoi, ou
trezentas medidas equivaliam a aproximadamente 1.543,46 m3 de grãos, perfazendo um cubo
compacto de aproximadamente 11,50 m de lado.

• A terceira classe era a dos Zeugitai, os que podiam manter um par de bois para o arado e que
produziam no mínimo 200 medimnoi de grãos por ano.A estes cabiam os postos administrativos
mais baixos. As 200 medidas equivaliam a aproximados 1.028,97 m3 de grãos ou um cubo
compacto de grãos de cerca de 10 metros de lado a cada ano.

• Na quarta classe estava o denominado theta. Estes eram trabalhadores comuns. Cidadãos
nativos que não atendiam aos requisitos das demais classes e eram agrupados aqui. Com uma
novidade. Eles agora tinham o direito de não serem escravizados por seus cidadãos em função
de suas dívidas. Sólon extinguiu em Atenas a escravidão por dívidas. Já em Homero (Odisséia
2.489-491) se faz menção aos theta como sendo apenas ligeiramente acima dos escravos. Não
podiam ser magistrados ou ter cargos, mas podiam ter assento na assembléia popular e direito
à voto, bem como atuar como jurados em tribunais. Este último direito ganhou importância
com o tempo.

• Abaixo dos tetas estavam os metecos (estrangeiros) e os servos, ambos excluídos de cidadania
e participação política. A participação política era um dever do cidadão e não apenas um
privilégio.

Criação da Ekklesía ( Εκκλησια ) fortalecendo uma assembléia que já existia - Sólon cria o
mais alto órgão político da Atenas a, Ekklesía ou assembléia popular, que era quem deliberava sobre a

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propositura das leis e sobre todas as questões mais importante para a pólis sendo ainda responsável
pela escolha dos seus magistrados.
Logo após sua criação por Sólon a assembléia reunia-se na própria ágora ateniense. Após as
reformas de Clístenes ela passou a reunir-se oficialmente numa colina denominada Pnyx. Da assembléia
popular participavam todos os cidadãos atenienses maiores de 18 anos e mentalmente saudáveis.

Criação da Boulé ( Βουλη ) um órgão composto inicialmente de 400 membros do qual podia
participar qualquer ateniense e que preparava os trabalhos para a assembléia popular. Seus membros
reuniam-se todos os dias e exerciam uma série de tarefas tais como:

• emissão de uma deliberação preliminar sobre qualquer lei proposta para ser apreciada pela
Assembléia popular, a Eklesia.
• alguma competência jurisdicional.
• controle dos magistrados.
• a realização de atos de caráter executivo que não eram atributo da assembléia.

A Boulé era necessária, pois, reunia-se diariamente e podia dar conta de problemas que
reclamavam soluções imediatas, não sendo preciso esperar-se pelas reuniões da assembléia que só
aconteciam algumas vezes por mês. É de se notar a inexistência de uma clara separação entre os
poderes judiciário, legislativo e executivo, tal como proposta na modernidade por Montesquieu. A
Boulé assim como outros órgãos políticos de Atenas realizava tarefas relativas a cada um dos três
poderes de forma indistinta.

Criação da Eliaía ( Ηλιαια ). Esta instituição é tida como das mais importantes dentre as
criadas por Sólon. A Eliaía é um tribunal popular. Qualquer cidadão que fosse maior de 30 anos e
mentalmente sadio podia tomar assento nele. Os cidadãos inscreviam-se numa lista e dela eram
sorteados nomes para compor o tribunal. O tribunal era dividido em 10 seções cada qual presidida por
um magistrado denominado tesmoteta. Com as reformas de Efialtes em 462/461 a.C. o tribunal
aristocrático, o Areópago, é esvaziado em sua competência e esta passa quase toda para a Eliaía. Este
tribunal foi a maior concessão de Sólon às classes menos favorecidas em termos de participação na vida
pública e nas magistraturas, das quais eram sistematicamente excluídas.

Após suas reformas Sólon voluntariamente vai para o exílio de modo a evitar sentir-se
pressionado a voltar atrás e alterar suas leis. As reformas de Sólon não contemplaram, porém, o cerne
das preocupações das classes menos favorecidas que queria uma participação nas riquezas da pólis.
Como a riqueza era basicamente fundiária e Sólon não realizou distribuição e divisão de terras, alguns
anos após seu arcontado seguiu-se um período de revolta e anarquia só terminado quando os menos
favorecidos unem-se a um tirano contra o poder dos aristocratas.

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Em 561-560 a.C., Pisístrato, um general ateniense, toma a acrópole de Atenas, com o apoio de
pastores, camponeses e mineradores, que eram os habitantes das montanhas e faz-se tirano. Com sua
morte em 528 a.C. seus dois filhos assumem o comando de Atenas. Um deles é assassinado e o outro
filho restante é deposto por uma aliança de aristocratas atenienses exilados e de democratas
atenienses apoiados militarmente por Esparta.

3º ARCONTE NOTÁVEL – CLÍSTENES ( Κλεισϑενης )- Clístenes reforma a constituição de Atenas e deita


as bases da democracia ateniense.

Os cidadãos haviam sido divididos em quatro grupos por Sólon e o critério fora a renda anual.

Clístenes, uma vez deposta a tirania dos Pisistrátidas, redivide toda a Àtica em 100 demos ( δηµος ).
Cada 10 deles são agrupados numa das dez Phílai ( φιλαι ) numa tentativa de romper a estrutura de
poder aristocrática baseada nas famílias e vínculos de parentesco e de sangue. O critério para
participação nas magistraturas deixa de ser baseado na renda, no génos, ou na propriedade de terras
capazes de produzir grãos, o que era a base do poder da aristocracia, o poder das famílias. No seu
lugar o critério passa a ser o de domicílio. Cada phylai continha cidadãos de todas as classes sociais.
Cada phylai fornecia uma unidade militar que era comandada por um oficial, o stratego. Foi como
estratego que Péricles destacou-se, tronando-se uma das mais emblemáticas figuras da Atenas clássica.
Membros da assembléia judicial, magistrados, e da Boulé eram escolhidos a partir de listagens
contendo membros de cada uma das 10 phylai.

Para impedir a volta de uma tirania à Atenas Clístenes criou o instituto do ostracismo. Qualquer
cidadão sobre quem caísse a suspeita de atentar contra a segurança do estado era desterrado por
decisão da assembléia por período de até 10 anos.

Clístenes aumenta para 500 o número de membros da Boulé. Se antes havia 400 membros sendo
100 representantes de cada uma das 4 classes censitárias, agora serão 50 membros de cada uma das
dez phílai.

Enfim Clístenes deita as bases da democracia ateniense sob a qual Atenas derrotará por duas
vezes a Pérsia, em Maratona em 490 a.C. e em Salamina em 480 a.C. dando início ao período clássico
da história de Atenas dentro do qual prosperarão figuras como Péricles, Anaxágoras, Sófocles,
Eurípedes, Heródoto, Fídias, Tucídides, Sócrates, Platão, Aristóteles, e quase todos os mais
importantes personagens da cultura ocidental nas mais diversas áreas do conhecmento.

Como fecho cumpre resumir que após os direitos preexistentes à pólis, com a formação da
constituição clássica da cidade de Atenas, surge enfim um órgão com competência para a o
recebimento e votação de propostas de leis apreentadas por cidadãos e magistrados, incluindo aqui a
LEI COMO MAIS UMA DAS FONTES FORMAIS DO DIREITO ATENIENSE .

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DIREITO ESPARTANO

A cidade de Esparta já existia entre os aqueus. Após a invasão dos dóricos a estrutura espartana
é alterada e trata-se de uma nova cidade, agora já se aproximando dos moldes de uma pólis clássica. A
Esparta dórica tem seu início no século X a.C. na parte sudeste do Peloponeso. Diferentemente de
Atenas os das demais cidades-estado gregas Esparta não possuía muralhas de proteção. Segundo o
entendimento dos espartanos as defesas da cidade deveriam se feitas pelos cidadãos.

Em seu início Esparta era governada por um rei. Este rei concentrava todos os poderes políticos
e religiosos, concentrando todos os poderes constitucionais de produção normativa e de judicatura, tal
como ocorrera em Atenas. A VONTADE DESTE REI, DENTRO DOS LIMITES DOS COSTUMES ANTIGOS E DO RESPEITO AOS DEUSES, ERA

SOBERANA E FONTE FORMAL DO DIREITO ESPARTANO ALÉM DOS COSTUMES.

Num segundo momento Esparta apresenta uma característica única. Ela passa a contar com dois
reis, como uma forma de garantir a participação política de duas famílias de destaque.

Dentre as várias pólis Esparta talvez fosse uma das que possuíssem as melhores terras da antiga Grécia,
tanto em termos de dimensão quanto de fertilidade. Esparta organizava-se me quatro ou mais vilas
separadas. A população como um todo se dividia em três categorias, os espartanos ou homoioi (os
pares), cidadãos com direitos políticos plenos, os hilotas pessoas que não possuíam nenhum direito
civil ou político, que pertenciam ao estado espartano e eram designados para o trabalho nas terras que

pertenciam aos espartanos. Além destes havia os periecos (περιοικος), cujo nome significa os que
residem ao redor, acerca do oikos. Viviam os periecos em vilas localizadas ao redor dos centros urbanos
onde residiam os espartanos e hilotas. Os periecos gozavam de certa liberdade, mas submetiam-se às
determinações espartanas e entregavam parte da sua produção como tributo aos espartanos.

Esparta é conhecida pelo seu militarismo. Este nem sempre foi, porém, o seu perfil. Em dado
momento de sua história Esparta enfrentou, como quase toda cidade-estado grega problemas
demográficos e econômicos. Ao invés de adotar a mesma solução da maioria das demais póleis, o
incentivo e promoção de colônias em outras terras, Esparta optou por subjugar seus vizinhos de cidades
como Messênia. Destas conquistas é que advieram os hilotas e periecos. A solução trouxe consigo o
problema da instabilidade política. Com um número de hilotas e periecos muito superior ao de
espartanos, os cidadãos viviam em constante estado de alerta, prontos para sufocar as rebeliões que
pudessem surgir.

Para se ter uma idéia do pouco número de cidadãos espartanos o número mais elevado de
hoplitas (soldados de infantaria) espartanos de que se tem notícias é o de 5.000, na batalha de Platéia.
De modo a fazer frente a esta ameaça interna os espartanos abdicaram totalmente de se dedicarem a

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qualquer atividade econômica. Livres de toda preocupação com a atividade produtiva os cidadãos
dedicavam-se integralmente, desde os sete anos de idade, ao treinamento militar, alcançando a fama
merecida de maiores especialistas do combate hoplítico, ou seja, o combate de infantaria, guerreiros a
pé, sob a famosa formação da falange.

Para assegurar o bom treinamento os jovens passavam por severa educação denominada agogé

( αγωγη ) iniciada aos sete anos, terminada aos vinte e controlada pelo Estado com o fim de produzir
guerreiros fortes e obedientes. A estrutura básica do oikos, tão centrada em vínculos de sangue e de
família foi deliberadamente afastada na organização do estado espartano. A vida familiar era pouco
valorizada e maior parte do tempo do espartano era passado junto ao exército, onde mesmo depois do
fim de sua formação e do seu serviço militar convivia regularmente até por volta dos 30 anos,
realizando com a tropa as suas refeições comuns e tarefas cotidianas.

As mulheres eram encorajadas a fazerem exercícios e manterem-se fortes e saudáveis como


forma de produzirem filhos saudáveis e futuros guerreiros. A vida em comum dos cidadãos incentivava
o ideal de uma igualdade entre os membros e uma elite, que transparece no próprio nome com o qual
denominavam a si mesmos, os pares, os homoioi, os iguais. Se entre a elite de cidadãos vigia este
tratamento igualitário, o mesmo não era dispensado aos hilotas e periecos. Durante a juventude o
treinamento do espartano incluía a execução de incursões noturnas secretas em áreas de concentração
de hilotas e periecos para a execução de possíveis líderes revoltosos e contenção preventiva de
rebeliões numa espécie de polícia secreta.

No plano das instituições políticas aos dois reis juntaram-se posteriormente outros órgãos
constitucionais introduzidos, segundo a tradição, por Leis apresentadas por Licurgo, rei de Esparta e
legislador que se acredita tenha vivido no século VIII a.C. Tais leis teriam sido sugeridas a Licurgo pelo
próprio Apolo por meio de seu oráculo em Delfos, deixando transparecer o quanto o direito e a religião
entrelaçavam-se na antiguidade grega. Esta legislação era denominada Rhétra ( ρητρα ) significando
que era tida como se fosse a palavra do próprio Apolo. Os espartanos estão entres os gregos mais
religiosos da antiguidade. ESTAS LEIS DE LICURGO SÃO IMPORTANTE FONTE FORMAL DE DIREITO ESPARTANO E ERAM TAMBÉM

DENOMINADAS DE O CÓSMOS ( κοσµος ) DE LICURGO, POIS ERAM RESPONSÁVEIS PELA ORDEM NA PÓLIS.

Licurgo cria a Gerousía ( Γερουσια ) - a primeira inovação de Licurgo foi a introdução de um


conselho de governo denominado Gerousía. A Gerousía era composta dos dois reis e de mais 28
membros dentre espartanos com mais de 60 anos eleitos pela assembléia popular.

O sistema de escolha destes membros é curioso e foi classificado como infantil por Aristóteles, que foi
o maior estudioso das constituições gregas. Os candidatos se apresentavam um a um diante da
assembléia popular. Enquanto isso um grupo de pessoas eram mantida fechada num prédio vizinho sem
saber a ordem de apresentação dos candidatos. Ouviam então a qualidade e intensidade das ovações

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que cada um recebia e com base nisto escolhia aquele que julgavam ter recebido a mais calorosa
recepção da assembléia.

Como funções da Gerousía:

• Interessava-se e participava sobre todo assunto que merecesse uma deliberação.


• Possuía competência exclusiva para deliberar sobre alguns assuntos.
• Preparava os assuntos, deliberava preliminarmente as propostas de inovações normativas a
serem submetidas à aprovação da assembléia.
• Tinha competência jurisdicional sobre alguns crimes como os crimes de sangue.

A Apélla ( Απελλα ) – a Apella era a assembléia popular espartana. Apesar de ser o segundo órgão
criado pela legislação de Licurgo a assembléia popular de Esparta, bem como a das demais pólis nasceu
de um costume grego de reunir os cidadãos quando fosse necessário decidir sobre questões de interesse
fundamental da pólis. Inicialmente a assembléia se reunia a pedido do rei ou dos reis, mas estes não
estavam obrigados a acatar a opinião da assembléia que servia como um órgão consultivo que ouvia o
rei sobre o assunto fundamental. Com o cosmos de Licurgo as reuniões da assembléia passam a ser
feitas em intervalos regulares e suas decisões passam a vincular os dois reis e os demais membros da
Gerousía. ASSIM É QUE PODIA DELIBERAR SOBRE PROPOSTAS DE NOVAS NORMAS E PRODUZIR ASSIM LEIS PARA A PÓLIS.

A assembléia não manteve sua influência por muito tempo na história espartana e, talvez pelo caráter
espartano mais aristocrático do que democrático suas atribuições foram absorvidas por uma
magistratura criada posteriormente em época não precisa, a magistratura dos éforos.

Éforos ( Εφοροι ) – esta magistratura era composta de cinco membros responsáveis pelo controle de
toda a atividade de governo. Os cinco éforos eram nomeados pela Gerousía. Com o tempo concentram
poderes até suplantarem a Apélla e a Gerousía tornando-se o órgão político mais poderoso de Esparta.

Direito Helenístico
O direito helenístico diz respeito a um período em que as cidades-estado gregas já se encontram em
franca decadência política, enfraquecidas pelas disputas entre si tais como a da longa Guerra do
Peloponeso que envolveu a maioria delas em duas ligas opostas encabeçadas por Atenas e Esparta. As
cidades-estado são primeiro submetidas aos Macedônios com Felipe II e depois por seu filho Alexandre
a partir do ano da vitória macedônica na batalha de Queronéia em que os tebanos são derrotados pelo
exército de Felipe II, em 338 a.C. Dois anos depois Felipe II é assassinado e Alexandre torna-se o senhor
de toda a Grécia.

O reinado de Alexandre é politicamente marcado pela diminuição da soberania da pólis gregas. Ainda
que mantivessem em grande medida suas instituições políticas, as póleis não mais eram soberanas e

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tiveram de submeter-se amargamente ao jugo macedônico. Isso não se deu de forma suave e houve
importantes tentativas de livrar-se do domínio macedônico.
À conquista macedônica segue-se a campanha de Alexandre contra a Pérsia, o mais famoso rival grego
no mundo antigo. A vitória sobre a Pérsia e o impressionante aumento do território sobre o controle
macedônio levam a cultura grega ao oriente e trazem à Grécia muito da cultura oriental, fortalecendo
um nascente sentimento cosmopolita.

Apesar da grandeza das conquistas de Alexandre a dificuldade de administração do império macedônico


causou sua ruína e divisão em diferentes porções. Daí em diante a Grécia se torna vulnerável a uma
potência militar em ascensão, Roma.

A Grécia é conquistada por Roma em 146 a.C. quando da tomada de Corinto. A Grécia passa a ser uma
província romana, a província da Acaia, e as cidades-Estado são rebaixadas à condição de municípios,
não mais dotados da soberania ou da autonomia de que gozavam em seu auge. Apesar da conquista a
Grécia sempre foi tratada com uma deferência maior por parte de Roma do que aquela normalmente
deferida às demais províncias. Permaneceu o centro da produção do conhecimento da antiguidade uma
vez que permaneciam em funcionamento as diversas escolas de filosofia e retórica fundadas na época
clássica, as quais eram frequentadas pelos romanos mais abastados que tinham pretensões à ocupação
das magistraturas mais elevadas. No plano militar o macedônico Alexandre, educado pelo grego
Aristóteles, continuou sendo para os generais romanos o exemplo máximo de excelência militar a ser
copiado ou talvez ultrapassado.

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