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2020 - Capille Et Al - Proj SJM20 4
2020 - Capille Et Al - Proj SJM20 4
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Limites infraestruturais
A RJ-081, oficialmente denominada Rodovia Carlinhos da Tinguá, popularmente
conhecida como Via Light, é uma via expressa que liga a metrópole do Rio de Janeiro ao
município de Nova Iguaçu. Sua estrutura rígida e monofuncional consolida a separação
entre as densas malhas urbanas dos municípios que a margeiam. Em particular, o trecho
de 3,5 km de fronteira administrativa entre os municípios de São João de Meriti e
Nilópolis sintetizam profundos problemas espaciais para o projeto urbano nas escalas
locais e metropolitanas.
A lógica metropolitana carioca é responsável pela configuração do território conurbado
e genérico, fruto do fenômeno da dispersão urbana da Baixada. Através de uma
política de centralidades, na qual há uma forte relação de dependência dos municípios
metropolitanos com o Rio de Janeiro, esses espaços periféricos são recortados por
diversos eixos com destino à metrópole. As infraestruturas de transporte, esgoto e
iluminação - apesar de cumprirem seu papel no sistema – têm caráter frequentemente
fragmentador para a cidade que se molda ao seu redor.
No caso em estudo, tal fato agrava-se devido à sobreposição de agentes limitadores,
onde a rodovia coexiste com as linhas de transmissão de energia elétrica. A proibição
de construção sob os cabos, por medidas de segurança, acaba produzindo um vazio
urbano desconectado do restante da cidade, o que ratifica os fatores de inabitabilidade e
insegurança já criados pela condição rodoviária. Além disso, o território estudado está
afastado dos centros dos municípios que ele separa, o que reforça seu caráter periférico.
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RIO PAVUNA
NILÓPOLIS
RIO DE JANEIRO
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principais ferrovias
limites admnistrativos
centralidade dos municípios
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Convivência oscilante no acesso à Via Light,
Google Street View, Agosto 2017
É um território que se conforma com a somatória da negação. Nega-se
a rodovia, as linhas de alta tensão, o lixo, a existência. Entende-se que,
aqui, o vazio é o criador da barreira, no qual a densa malha flexível
e mutável das cidades ao redor se interrompem por essa desabitada
porção de terra, renegada pelo poder administrativo.
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A arquitetura do limite
A proposta é resultado de um processo experimental que teve como objetivo principal
evidenciar a potencialidade de um objeto urbano que se posiciona na fronteira entre
arquitetura e/ou espaço público. Essa investigação integra ensaio e projeto, buscando,
com o exercício propositivo, debater acerca da noção de limite em si, e a arquitetura que
o mesmo pode vir a produzir.
Sendo assim, foi desenvolvida uma pesquisa dos limites urbanos, aqueles entre a
arquitetura e o espaço livre de edificação, investigando - através de projeto - o território
formado na periferia metropolitana do Rio de Janeiro e buscando entender como os
espaços limítrofes entre os domínios público e privado se conformam nesse tipo de
ambiente urbano.
Nesse sentido, o objetivo foi menos o de definir soluções para problemas comuns das
áreas de periferia urbana e, mais, de levantar um repertório de condições projetuais
desses contextos. Assim, esse repertório é feito não de ‘dados objetivos’ que permitem
a frequente abordagem ‘problema-solução’, mas, sim, de uma coleção de fragmentos
(fotografias, cartografias, maquetes, ensaios) que compõe, em conjunto, uma ‘condição
de limite’. Com uma proposta mais indagadora do que definitiva, o produto deste
trabalho está mais no seu desenvolvimento do que na sua forma plástica final.
A espessura do limite
O Google Street View foi importante ferramenta para identificação
das particularidades desse território rodoviário superficalmente
homogêneo. Os recortes demonstram momentos de ocupações das
bordas livres, travessias improvisadas e ineficiência do poder público.
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as linhas de alta tensão
geram luz
as infraestruturas de transporte
geram produtos
A lógica metropolitana
Os espaços periféricos são formados por dois elementos urbanos sempre em constante ampliação e consolidação. É válido ressaltar que
essenciais. Aqui, classificamo-os como fixos e fluxos. Fixo é tudo aquilo não é o conjunto da cidade que está sendo considerado como algo
que estrutura a expansão da cidade: as rodovias, as ferrovias, as linhas mutável, o que se pondera aqui é a fragilidade individual de cada objeto
de transmissão elétrica e os grandes maciços preservados; tais peças arquitetônico colocado na periferia.
são monofuncionais e inabitáveis. Como fluxo, considera-se aquilo Sendo assim, entende-se que a expansão periférica é permitida - mas
que costumamos entender por arquitetura a nível do pedestre; as ruas também limitada - por essas estruturas fixas que não podem deixar de
e edificações - que tem como característica sua fácil mutabilidade, existir para que a lógica metropolitana continue fazendo sentido.
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STOP CITY
Dogma
2007-08
a marcação do fim
CONTINUOUS MONUMENT
Superstudio
1969-70
estrutura absoluta
PONTE VECCHIO
Taddeo Gaddi
1345
Florença, Itália
continuação da malha
PARQUE ATERRO DO
FLAMENGO
Lota de Macedo Soares / Affonso
Eduardo Reidy
1965
Rio de Janeiro, Brasil
topologia camuflada
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A Coleção de Projetos
Os projetos selecionados possuem escalas
e abordagens diferenciadas, mas todos
transmitem uma lógica que busca integrar
os espaços contruidos e livres, seja por
semelhança ou contraste.
Para todos os estudos de caso foram
produzidas colagens do projeto aplicado
na área do ensaio crítico; os casos acima
são o produto dessa fase dos projetos Stop
City e Intervenção Tempo.
Ressalta-se, ainda, que não há intensão de
uma comparação qualitativa
entre projetos, visando apenas
compreender como determinada
estratégia influenciaria no espaço a ser
projetado.
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a
b
a c
b
30 c
30
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Atravessamentos
As travessias podem ser formais (por cima e por
baixo) ou informais. Tendem a acontecer a cada
250m, e no trecho de 3,5 km analisado, existem 14
delas.
Atravessamento Informal
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Muro e Fazenda; Ponte e Catraca
A proposta projetual tem duas partes: ‘muro e fazenda’ e ‘ponte e catraca’. É uma
tentativa de produzir uma arquitetura absoluta¹ que pretende designar a
transição entre o espaço público e privado perimetropolitano², buscando ser
em si limite e/ou travessia.
Primeiro, ‘muro’ implica em assumir e projetar o limite do limite. Isto é, se a
infraestrutura é um limite urbano e tem ‘espessura’ (não se trata de uma linha
imaginária, mas de uma faixa de 100m de largura), tem, inclusive, um limite, uma
borda. Essa borda tem a potência de ser a fachada, a representação e performance do
limite urbano tornado arquitetura. Falta-lhe, entretanto, um projeto.
Ao mesmo tempo, a estratégia ‘fazenda’ implica em se posicionar contrário à mera
aplicação do conceito de ‘terrain vague’³ para os espaços inocupados da periferia
metropolitana: enquanto, nos centros urbanos dos países do norte global, o conceito
de ‘terrain vague’ permite uma contraposição importante ao conceito de ‘utilidade’ do
território, implicando em uma crítica à financeirização da terra urbana e ao capitalismo;
nas periferias do sul global, ‘terrain vague’ apenas romantiza situações de extrema
precariedade. Dessa forma, a primeira estratégia de projeto – ‘muro e fazenda’ –
consiste em conformar arquitetonicamente o limite (através do ‘muro’, limite do limite)
e subdividir as áreas de faixa de servidão em lotes para as áreas de cultivo, que é uma das
únicas atividades que podem ocorrer abaixo das linhas de alta tensão.
A estratégia ‘ponte e catraca’ implica, em seguida, na compreensão da função urbana
das arquiteturas que atravessam a faixa da infraestrutura. Para esses atravessadores,
a proposta é de uma arquitetura de uso indeterminado com um raciocínio estrutural
como estratégia para qualificação do espaço público. Portanto, a abordagem da proposta
não está na particularidade de cada um dos objetos, mas no papel que cada um deles
desempenha no plano urbano geral.
Em síntese, as arquiteturas propostas, independente da escala, deverão estabelecer
pelo menos uma das três funções propostas: catraca, muro e/ou ponte. Os nomes de
cada uma das funções foram definidos justamente por imageticamente simbolizarem
a função que ocupam. Entretanto, eles não dizem respeito à concepção formal dos
objetos em si. Cada uma dessas funções pode ter formas distintas, dependendo das
circunstâncias de cada trecho. O objetivo deste trabalho não é determinar exatamente
cada um dos trechos, mas estabelecer um sistema.
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Muro como superfície
Muro + outros
Cada ponto de luz deve ser
colocado a cada 50 metros.
Deve ter 6m de altura.
Situação: Rua + Servidão + Rodovia Situação: Fim de Rua / Lote + Servidão ou Rodovia
Objeto se posiciona paralelamente à via local que ocorre ao longo da Objeto se posiciona ao fim da via local que ocorre perpendicular à
margem infraestrutural. Programa arquitetônico sugerido: comercial, margem infraestrutural. Programa arquitetônico sugerido: comercial,
ensino, infraestrutura pública. ensino, infraestrutura pública, religioso.
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Infraestrutura potencializada
O projeto busca gerar multiplicidade de funções. Considera que o uso
único da faixa de servidão elétrica e da rodovia são os fatores
que levam o espaço a não ser habitável e seguro. Criar lotes
para policulturas e vinculá-los a equipamentos para troca de
produtos, incorpora ao espaço um novo uso; e portanto, uma nova
centralidade.
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Catraca, o edifício vigilante
Os edifícios com função catraca podem ter dois posiconamentos
principais e sempre estão relacionados com estruturas já existentes.
Os que ficam imediatamente antes do acesso, em terrenos adjacentes à
area ocupada pela Via Light
Ponte
Os edifícios com função ponte unem as cidades que margeiam a
rodovia, interando tanto horizontalmente como verticalmente.
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-
RIO SARAPUI / MESQUI TA
TRANSBAIXADA SÃO JOÃO DE MERITI
RIO PAVUNA
Os Edifícios Âncora
Os equipamentos âncora são edifícios com maiores dimensões,
mas devem seguir as mesmas funções já citadas anteriormente. Se
desenvolvem em paralelo aos demais elementos propostos e possui em
si uma conjunção de todas as funções propostas. Tem objetivo de gerar
centralidade ao longo do eixo rodoviário, sendo posicionado a partir de
uma análise de pontos de interesse existentes que o margeiam. Seu uso
e formas devem variar, se adequando às necessidades do entorno.
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muro com espessura
Edifício-Praça Fazenda
O Edifício-Praça
A isométrica ilustra o trecho da implantação do Edifício-Praça.
Edificação de uso indeterminado, tem a sugestão de uso como suporte
ao esporte - exemplo: salas de dança, luta, comércio alimentíceo, etc -
por se associar com duas quadras esportivas existentes.
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cultivo 11
cultivo 11
cultivo 10
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A
0 10 50 100m 0 10 50 100m
Corte A
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Rotina do ócio x negócio x cívil
Rodovias não são consideradas como parte da cidade devido à sua
monofuncionalidade estrutural. Rodovias não são ruas. A proposta
considera a potencialidade da superfície plana e não construída da
Via Light, que constitui um cenário diferente das densas cidades à sua
margem.Tal cenário é oportuno para acoplar uma rotina do ócio à
rotina do negócio já existente.
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Notas:
1. AURELLI, Pier Vittorio . The Possibility of an Absolute Architecture
2. FARIAS FILHO, J. A. O Projeto Urbano Ex-Cêntrico como Instrumento de Política Metropolitana. In: COSTA, Lucia
Maria S. A.; MACHADO, Denise B. Pinheiro. (Org.). Conectividade, Resiliência: estratégias de projeto para
a metrópole., 1ªed.Rio de Janeiro: Rio Book’s / PROURB, 2012, v., p. 31-61.
4. BRANZI, Andrea. Tradução - CUTLAK, Barbara; GARCEZ, VITOR. Modernidade enfraquecida e difusa: o universo
dos projetos no início do século XX¹. Revista online do Departamento de Arquitetura e Urbanismo da Pontifícia
Universidade Católica - Puc-Rio – Rio de Janeiro Brasil. Ano I – N° I - ISSN 2446-7340
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