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Aula 04 - GROHMANN Luis Gustavo Mello A Separacao de Poderes em Paises Presidencialistas A America Latina em Perspectiva Comparada
Aula 04 - GROHMANN Luis Gustavo Mello A Separacao de Poderes em Paises Presidencialistas A America Latina em Perspectiva Comparada
2001
A SEPARAÇÃO DE PODERES EM
PAÍSES PRESIDENCIALISTAS:
A AMÉRICA LATINA EM PERSPECTIVA COMPARADA1
RESUMO
Este artigo discute a separação de poderes nos países presidencialistas da América Latina, ressaltando
seus pressupostos teóricos e evidenciando o balanço entre os poderes Executivo e Legislativo, bem como
suas implicações para o aperfeiçoamento democrático. Conclui que a maioria dos países presidencialistas
latino-americanos apresenta predomínio do Legislativo com importantes casos desviantes, como Brasil,
Chile e México, onde há ou conflito entre poderes ou predomínio do Executivo.
PALAVRAS-CHAVE: separação de poderes; presidencialismo; relações Executivo-Legislativo; América
Latina; política comparada.
nalidade e seus efeitos. Se as instituições importam, com a adesão dos atores políticos aos seus valores
a separação dos poderes, que começa ou como e regras básicas; dentre eles o mais importante é
princípio normativo de condução da ação coletiva aceitar que partidos perdem eleições. Outra tra-
ou como resultado direto e não intencional da ação dição, contudo, aponta que os arranjos do sistema
política, ainda merece ser debatida e investigada. de governo são importantes no sentido de que
Uma implicação suficiente para justificar a devem proporcionar governabilidade, permitindo
investigação sobre a separação de poderes diz que o sistema fique estável, não sendo perturbado
respeito à capacidade de um sistema de governo pela paralisia decisória. Nesse sentido, o presiden-
gerar decisões tendo em vista a quantidade e forma cialismo foi sistematicamente atacado, dentro e
de relação entre n diferentes atores políticos. De fora do Brasil (POWELL, 1982; LAMOUNIER,
outro lado, como aponta Tsebelis (1998, p. 33- 1991; LINZ & VALENZUELA, 1994). De outro
56), as instituições formais, tais como aquelas que lado, algumas vozes chamaram a atenção para o
formam o complexo do sistema de governo, abrem fato de que a diversidade de tipos de presiden-
a possibilidade de cálculo racional e estratégico cialismo conduz ao reconhecimento de que o sis-
por parte dos atores. tema pode ser instável ou estável, dependendo dire-
tamente de suas instituições e seu contexto político
A perspectiva de valorização das instituições
(SHUGART & CAREY, 1992; MAINWARING &
políticas tomou novo fôlego na década passada
SCULLY, 1995; MAINWARING & SHUGART,
em parte pelo refluxo de duas concepções: a
1997). Foram tratadas também as diferentes com-
marxista, que alocava na sinergia do processo
binações do sistema de governo com sistema elei-
econômico com o processo social as determi-
toral e partidário, as quais podem gerar diferentes
nações da disputa política, e a comportamentalista,
resultados tendo em vista a estabilidade gover-
pela qual a ação era explicada em termos quase
nativa (MAINWARING, 1993; JONES, 1995).
que exclusivos pela referência a valores, crenças
e costumes dos atores. A análise do sistema constitucional presiden-
cialista exige uma abordagem que recupere os
Três grandes temas foram retomados nos
pressupostos da separação de poderes. Na seção
estudos sobre instituições políticas: o sistema
seguinte resgatamos, brevemente, a trajetória do
eleitoral, o sistema partidário e o sistema de
conceito de separação de poderes e os elementos
governo. No Brasil, o debate colou-se à própria
que compõem o seu universo. As seções pos-
dinâmica conjuntural, na medida em que, saída
teriores tratam do modelo teórico para análise da
das brumas autoritárias, a nação buscou refletir e
separação de poderes, da metodologia empregada
remodelar suas instituições no sentido da
e os resultados obtidos a partir da comparação
democratização (por exemplo, TRINDADE, 1992;
das constituições latino-americanas.
LAMOUNIER & NOHLEN, 1993; KINZO, 1993).
Não foi diferente em diversos países latino-ame- II. AS TEORIAS DA SEPARAÇÃO DE PODE-
ricanos, os quais, em parte pelos novos tempos RES
na arena internacional (fim da Guerra Fria, rechaço
II.1 Os clássicos: Locke, Montesquieu e os
a sistemas autoritários), em parte por suas dinâ-
Federalistas
micas internas, reconstruíram ou fundaram sis-
temas políticos orientados pela perspectiva da Discutir o sistema de governo em democracias
democracia representativa. representativas a partir de suas instituições implica
antes de mais nada reconhecer os fundamentos
Para tanto assumiu importância a definição do
teóricos que animam o projeto prático. Em
arcabouço constitucional, o qual, trivialmente,
sistemas presidencialistas, em especial, a questão
define as regras da competição política e do como
da separação de poderes coloca-se como angular.
governar. O desafio, que ainda perdura, é deter-
A simples existência desses arranjos por si mesma
minar quais arranjos constitucionais possibilitam
já seria suficiente para justificar a reflexão a partir
que práticas democráticas sejam seguidas e
desse ponto de vista. No entanto, julgamos que
consolidadas, afastando o máximo possível a chan-
no século que se inicia, com o aumento da
ce de que regimes autoritários voltem a surgir no
quantidade de países que buscam constituírem-
cenário político.
se como democráticos, com o incremento da
Como apontou Przeworski (1994), a demo- circulação de informação (principalmente via
cracia representativa, para perdurar, deve contar internet), com o avanço da defesa dos direitos
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fundamentais da pessoa humana, a institucio- reflexão sobre essa prática tendo em vista
nalidade política assume uma importância crucial aperfeiçoá-la ou modificá-la. A reflexão sobre o
como fator de encaminhamento para a resolução poder dividido apresentou-se desde a Grécia antiga
de conflitos. De outro lado, tais transformações - e a principal preocupação que a animou permaneceu
aliadas às transformações no mundo do trabalho ao longo dos tempos: como evitar a tirania. A
e da cultura, bem como ao agravamento das divisão do poder é uma velha solução. As teorias
condições sociais de vida das populações (tendo das formas de governo são as primeiras a identificar
em vista as políticas estabelecidas pelos governos, o formato dos governos e qual a sua melhor
estas, muitas vezes, em obediência às indicações organização. A teoria do governo misto, de longa
de organismos internacionais) - apresentam o trajetória, nasce então sugerindo que a melhor
dilema da participação versus decisão gover- forma de governo é aquela que combina as
namental, revelando a crise do tradicional Estado- diferentes modalidades de governo (monarquia,
nação que emergiu do pós-Guerra. O uso de aristocracia, democracia), a partir da existência
fórmulas institucionais que regulam uma partici- de três corpos: o do monarca, o dos aristocratas
pação ampliada da sociedade na formulação e e o do povo. Essa repartição tríplice tem, então,
aplicação de políticas públicas (Porto Alegre, Chi- como critério mais evidente o número de soberanos
cago, Wisconsin; cf. FUNG & WRIGHT, 1999) governantes (um, poucos e muitos), mas trazendo
podem auxiliar no redimensionamento dos es- consigo certa acoplagem aos elementos da
quemas de decisão política no campo do Estado. formação social do meio onde foram produzidos.
O importante, contudo, é a referência à separação
Contudo, os fundamentos desse Estado en-
de corpos ou agências de poder. Na teoria do
contram-se nas teorias que, no passado, empreen-
governo misto não há a necessária delimitação
deram a tarefa de pensar a solução política para a
funcional desses corpos, nem um escopo de
disputa entre os interesses e os poderes, regulando
especialização; a crença fundamental é de que o
a participação da sociedade e limitando ou jus-
poder repartido, por si só, é capaz de limitar a
tificando o poder do Estado. O campo da política,
possibilidade do governo absoluto. Tal noção foi
ciência e teoria, é aquele que, por excelência,
ajustada pela teoria do governo equilibrado, já na
combina o rigor da ciência com a discussão clara
trajetória inglesa renascentista, que trouxe a idéia
dos pressupostos normativos. Conforme Sola
de que os poderes, além de serem repartidos em
(1999, p. 30), a ressignificação do Estado como
potências parecidas, deveriam controlar um ao
autoridade democrática implica um esforço nor-
outro. Até aí a divisão desses corpos pautava-se
mativo no sentido de alcançar os elementos de
pela própria existência das forças sociais
legitimação e estabelecimento de metas coletivas.
politicamente organizadas, catalisadas pelas figuras
O problema constitucional suscitado é aquele do Monarca, da Câmara dos Lordes e da Câmara
que questiona a construção do sistema de governo dos Comuns.
e suas relações com os sistemas eleitoral e
A teoria da separação de poderes pura introduz
partidário. Os atuais estados-nação do mundo
pelo menos uma importante modificação: a
democrático foram construídos sob a égide da
atribuição de funções específicas para cada poder.
divisão dos poderes. A divisão dos poderes não é
Além disso, como tributária das teorias anteriores,
uma técnica institucional que possa ser depreendida
pugna que cada poder não pode imiscuir-se nas
totalmente dos aspectos normativos, na medida
atividades relacionadas à função do outro poder,
em que qualquer engenharia constitucional implica
proibindo-se que os ocupantes dos cargos em um
alcançar certos objetivos. Em termos de interesses
e outro poder sejam os mesmos simultaneamente.
de grupos, objetivos podem ser bons para uns e
Para Vile (1998), é o amálgama entre as três teorias
terríveis para outros; em termos de construção
(separação de poderes, governo misto e governo
de regimes algumas regras são mais adequadas
equilibrado) que proporciona o surgimento, nas
que outras: certos instrumentos podem ser nitida-
figuras de Locke, Montesquieu e dos Federalistas,
mente autoritários, outros nitidamente demo-
da teoria da separação parcial de poderes, na qual
cráticos.
é permitido certo grau de compartilhamento
A separação de poderes institucionalmente funcional, especialmente na função legislativa, isto
fixada nasce da confluência histórica da política é, por exemplo, um outro poder (o Executivo)
prática, das disputas entre grupos humanos, e da também dispõe de atribuições legislativas, como
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gestão do Estado. Evita-se assim o abuso de poder tivo sobre o Legislativo, e 2) compensando a
por parte de algum corpo e obtém-se, em decor- incapacidade do Legislativo em vetar o Executivo,
rência do não-abuso de poder, a liberdade política. aquele teria o direito de punir os funcionários
A unidade do poder significa a possibilidade de (ministros, por exemplo) do Executivo. De outro
tirania. E basta ao indivíduo estar exposto a essa lado existiriam salvaguardas aos poderes para que
possibilidade para instaurar-se o temor à sua pudessem continuar sua existência sem se su-
segurança, redundando em falta de liberdade bordinarem à vontade ou a abusos de outro poder.
política. No sentido de proteger os nobres da ação dos
tribunais populares, esses seriam julgados de
O critério para estabelecer os poderes dife-
maneira especial, por integrantes da mesma
renciados é funcional, isto é, pela atividade prin-
categoria social e do mesmo corpo político. Inte-
cipal de cada um. Essa atividade não se confunde
grantes do Executivo seriam julgados pelos nobres
com os instrumentos de que cada poder dispõe
do Legislativo, em processos iniciados pela Câmara
ou com características de organização necessária
dos plebeus.
à efetividade na função. Por exemplo, o poder
Legislativo estabelece a legislação, mas a ma- Esse arranjo forçaria os integrantes dos poderes
nutenção de um corpo Legislativo que preserve o a caminhar para um acordo, do contrário o re-
poder dos nobres frente ao povo em geral não é sultado poderia ser a paralisia (idem, p. 160). Ou
uma função propriamente dita do poder, mas um seja, Montesquieu já previra que a paralisia
aspecto que concorre para a efetividade daquela decisória poderia ser o resultado da separação de
função e que evita o abuso de poder por parte do poderes, mas, ao invés de considerá-la como um
Legislativo . problema, assumiu-a como um incentivo para
forçar o acordo entre os poderes, concorrendo
Além disso, Montesquieu classificou os três
para a produção de políticas moderadas, condu-
poderes do Estado: o poder Legislativo (fazer as
centes à liberdade política.
leis); o poder Executivo das coisas que dependem
do direito das gentes (paz, guerra, segurança, Três outras questões também são relevantes:
prevenção de invasões etc.), que é o poder 1) a origem dos integrantes do poder; 2) o tempo
Executivo do Estado; o poder Executivo das coisas do mandato; e 3) o tipo de trabalho desenvolvido
que dependem do direito civil (pune os crimes, pelos poderes. A primeira questão diz respeito à
julga conflitos entre indivíduos etc.), ou seja, o interdição para os integrantes do Legislativo de
poder de julgar. virem a constituir o corpo Executivo (idem, p.
159). O francês não esclareceu, contudo, se essa
Marcado pelo contexto de sua época, a
interdição é exclusivamente para ocupação
distribuição desses poderes entre diferentes corpos
simultânea de cargos nos dois poderes ou somente
observará os atores sócio-políticos existentes. O
de extração, isto é, para não ocuparem os dois
Executivo ficaria nas mãos do monarca, o Legis-
poderes ao mesmo tempo. O segundo ponto
lativo nas dos nobres e dos representantes do
considera que mandatos muito grandes tendem a
povo, e o Judiciário em tribunais temporários do
tornar o povo furioso ou indolente, caso os
povo. É a física do poder. A relação entre setores
ocupantes dos cargos estabeleçam políticas ruins.
sociais e constituição dos poderes é inequívoca;
Ou seja, haverá dissociação entre Governo e
por isso a separação do Legislativo em dois corpos,
sociedade, entre governo e representação. O
um plebeu e outro nobre, como uma forma de
terceiro ponto afirma, de um lado, a singularidade
proteger os últimos, obtendo dessa maneira a
do Executivo, tendo em vista a necessidade de
moderação do Legislativo frente ao Executivo.
agir rapidamente e, de outro, a não utilidade de
A questão nova de Montesquieu frente a Locke reuniões freqüentes do Legislativo no sentido de
diz respeito à introdução da idéia de controle de produzir novas leis. Assim, em Montesquieu, a
um poder sobre o outro. O poder contra poder convocação do Legislativo, seu momento e a
não se constitui somente por duas instâncias que duração das reuniões, é demanda que também vem
se enfraquecem por abarcar unicamente uma parte fortemente condicionada pelas necessidades do
das atividades do governo da sociedade (razão Executivo, o qual têm poderes de convocação.
defendida por Locke). Antes disso, é a possi- Ele aprimorou a idéia de separação de poderes,
bilidade de um poder vir a impedir ou punir o abuso introduzindo o corpo judiciário e a idéia de
do outro. Esses controles são: 1) o veto do Execu- limitações mútuas. Os Federalistas vieram
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aprofundar sua discussão e foram além, cola- é difícil obter esse padrão, principalmente em
borando para instituir o primeiro sistema de relação ao Judiciário. Dois argumentos são invo-
governo republicano baseado na separação de cados para justificar o caso especial desse poder:
poderes. de um lado, é necessária uma qualificação dos seus
integrantes, algo que eleições populares não
Madison (MADISON, HAMILTON & JAY,
poderiam suprir; de outro lado, o fato de esses
1993) partia da absoluta concordância com a
integrantes exercerem mandatos permanentes
separação dos poderes em corpos diferenciados
anula o sentimento de dependência em relação a
segundo sua atribuição funcional. No entanto,
quem os conferiu.
defendeu que não havia proibições em Montesquieu
acerca de ingerências parciais nas esferas de Essa flexibilização das atribuições e da origem
atribuição entre um poder e outro, afirmando que dos integrantes dos poderes é acompanhada pela
o grau de independência entre os poderes proposto perspectiva relativista de Hamilton, dessa vez em
pelo francês jamais seria alcançado na prática relação à capacidade de um poder checar. Ao
(idem, p. 333, 338). A interpretação de Madison é discutir as justificativas da disposição do Senado
de que toda ou a maior parte de um poder não em aprovar ou não nomes de ministros escolhidos
deveria permanecer nas mesmas mãos. Dessa pelo Executivo, considerando o resultado para o
maneira, a tirania traduz-se no momento em que balanço da separação de poderes, sua posição era:
uma pessoa ou um grupo detém os poderes “Não é fácil encontrar uma resposta muito precisa
Executivo, Legislativo e Judiciário (idem, p. 332). para uma objeção ela mesma tão pouco precisa.
Onde está a medida ou critério de que podemos
Madison enfocou o problema da separação dos
lançar mão para avaliar o que daria ao Senado um
poderes como um problema de ocupação, sobre
grau de influência grande demais, pequeno demais,
quem exerce o poder e quais são as garantias desse
ou exatamente o devido? Não seria mais seguro,
exercício. Preocupou-se em não permitir que
além de mais simples, deixar de lado esses cálculos
grupos articulem-se como maiorias unificadas,
vagos e incertos, para examinar cada poder em si
capazes de esmagar minorias, gerando políticas
mesmo e decidir, com base em princípios gerais,
calcadas em processos emocionais e não racionais.
onde ele pode ser depositado com mais vantagem
Deslocou seu foco para promover a assunção do
e menos inconveniente?” (idem, p. 422).
indivíduo como elemento angular do edifício
institucional. E falar do indivíduo era falar de Eis o seu método para definir os instrumentos
interesses e ambições. Os homens não são anjos constitucionais de defesa e controle de um poder
e agem em torno de seus interesses. Ambição deve em relação ao outro. O resultados são a mistura
frear ambição. Nesse sentido, os cargos dos entre as justificativas de balanceamento de forças
poderes devem oferecer aos seus administradores sociais, separação de poderes e controles de um
os meios constitucionais e os motivos pessoais poder sobre o outro. Diga-se de passagem que
para resistir ao outro poder e a seus abusos (idem, esse último não fica explicitado.
p. 350).
No entanto, certos elementos apontados por
Madison não confiava nas “barreiras de papel” Montesquieu estão referidos por Madison com
para conter a “índole abusiva do poder” (idem, p. justificativas diferentes. A repartição do Legislativo
338). Dois elementos são vitais para garantir a em duas câmaras sai da justificativa de cunho
separação de poderes efetiva: dar meios de inde- estamental para adquirir foros de balanceamento
pendência financeira ao poder e oferecer emolu- de poder: o Legislativo é muito forte, portanto é
mentos condizentes para os ocupantes dos cargos preciso dividi-lo, equalizando-o com o poder do
(motivos pessoais), emolumentos esses não Executivo, um poder fraco, talvez tanto quanto o
submetidos à vontade flutuante dos outros po- Judiciário (idem, p. 350).
deres.
Mas as questões tornam-se mescladas e falta
Mas outro aspecto ainda é relativizado por ele: precisão. Os Federalistas não explicitam todos os
a escolha dos integrantes de um poder por outro termos de uma teoria que acople separação de
(idem, p. 349). Considerou que se fôssemos seguir poderes com controle e equilíbrio entre poderes.
rigorosamente a proposição da separação de As atribuições constitucionais são tratadas de
poderes, só haveria uma única fonte de escolha maneira descontraída ao lado de instrumentos de
dos integrantes de cada poder: o povo. No entanto, controle e de balanço entre poderes.
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Separação de poderes, Presidente frente ao não tiver força política suficiente o resultado será
Legislativo, tenderiam ou para a paralisia decisória paralisia decisória e instabilidade do governo. Para
ou para a predominância do Executivo. A eficiên- o autor, o sistema americano, antes de mais nada,
cia e a estabilidade estariam nas mãos do parla- seria separacionista, proporcionando diferentes
mentarismo. balanços de poder entre Executivo e Legislativo.
Muita confusão é feita com esses termos. Tal C. Jones (1995, p. 8) identificou quatro
como Madison e Hamilton não precisaram com posições normativo-descritivas de balanço de
exatidão os aspectos institucionais que eram poder: primazia do Legislativo, primazia do
separação de poderes e controle de um poder sobre Presidente, governo misto cooperativo e governo
outro, também hoje em dia os termos são utilizados misto de adversários.
quase transitivamente, seja pelo senso comum seja
No balanço do poder entre os dois corpos, os
por analistas da política.
dois primeiros tipos são evidentes. Apontam a
No entanto, pelo menos duas perspectivas3 dominância clara e inequívoca de um sobre o outro.
ainda hoje tratam da separação de poderes com O governo misto cooperativo surge quando um
alguma sistematização, resgatando sua importância mesmo partido controla tanto o Executivo quanto
institucional no jogo político. A primeira diz res- o Legislativo. Tal governo é circunstancial,
peito à literatura norte-americana que busca dependendo do quadro eleitoral e de uma relação
examinar o funcionamento do sistema presidencial, específica entre Presidente e líderes. O governo
justamente a partir da proposição dos Federalistas, misto de adversários revela poderes eqüipotentes
a da separação dos poderes. Esse conjunto busca mas altamente competitivos, como por exemplo
resgatar o presidencialismo americano antes de o contexto do dividido governo norte-americano
mais nada como um sistema de separação de (o qual não implica não-cooperação, pois partidos
poderes, analisando a ação dos atores políticos diferentes podem cooperar).
frente às possibilidades oferecidas pelas institui-
Duas dimensões são importantes em Jones: a
ções, militando na contraposição às correntes que
dimensão institucional, que estrutura, oferece
pregam a parlamentarização da vida política ame-
meios e organiza a ação dos atores que ocupam
ricana.
aqueles poderes; e a dimensão política, que traz o
A segunda perspectiva é dispersa, mas tem comportamento dos atores.
trabalhos significativos. Situando-se no campo da
A sua proposição permite darmos um passo a
política comparada, esses trabalhos têm diferentes
mais na caracterização do balanço do poder entre
objetivos mas fazem referências à separação de
Executivo e Legislativo a partir da separação de
poderes, seja no contexto do presidencialismo, seja
poderes. Desde de seu ponto de vista temos que o
no contexto do parlamentarismo.
sistema norte-americano é flexível na constituição
Neustadt (1967), C. Jones (1995; 1997) e desse balanço. Não cristalizaria a dominância ou
Fischer (1998) defendem a proposição de que o poder de um sobre o outro mas permitiria um
sistema de governo americano é antes de mais conjunto de soluções conforme (1) a habilidade e
nada um sistema de instituições separadas com projeto do Presidente, e conforme (2) o espectro
poderes compartilhados. político do Legislativo. O processo de constituição
da agenda (entendida em termos amplos), no
C. Jones (1995) afirma que o sistema ameri-
sentido de temas e propostas constituintes dos
cano não é presidencialista, se por presidencialismo
projetos, sejam do Executivo sejam do Legislativo,
considerarmos a existência de um Presidente com
é central no estabelecimento desse balanço.
fortes poderes, tal como faz Powell (1982). C.
Jones (1997) observa que é uma limitação exigir Dessa maneira, as análises de Mayhew (1991),
que o sistema presidencialista tenha um Presidente que provam não ser o governo dividido gerador
forte frente ao Legislativo. A resultante dessa de paralisia decisória, ou de Bond e Fleischer
perspectiva é prever que sempre que um Presidente (1990), em que fica demonstrado que os repre-
sentantes se perfilam a favor e contra o governo
de maneira a formarem 4 grupos (do mesmo
3 Estão excluídos de nossa análise as análises e teorias
partido do Presidente a favor deste; de partido
diferente do Presidente a favor deste; do mesmo
relevantes do campo do Direito Constitucional estricto sensu.
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partido do Presidente contra este; e de partido inconstitucionalidades das ações dos outros
diferente do Presidente contra este), vêm poderes.
corroborar que as premissas federalistas de
Dessa forma, a limitação de um poder sobre o
separação de poderes efetivam-se na prática.
outro diz respeito também à disputa que se
Fischer, por seu turno, traça a história da estabelece entre os projetos políticos que os
constituição da separação de poderes nos EUA, ocupantes de um e outro poder defendem. Há dois
demonstrando que o modelo de predominância do movimentos: de defesa de seu projeto, que pede
Legislativo gradativamente vai cedendo lugar a um autonomia, e de fazer com que ele seja implantado,
sistema no qual as partes gozam de grande que exige a derrota ou acomodação do projeto
autonomia e independência, mas constrangidas a diferenciado. A agenda política passa a desem-
um governo conjunto: “Separação mas inter- penhar um papel fundamental no jogo entre os
dependência, autonomia mas reciprocidade” poderes.
(FISCHER, 1998, p. 5). Chama a atenção para a
Fischer (1998, p. 6-7) define algumas medidas
diferença entre o sistema de separação de poderes
de salvaguarda para a separação de poderes
e o sistema de freios e contrapesos: “Dois prin-
existentes nos EUA:
cípios, aparentemente irreconciliáveis, operam
lado a lado: (I) a separação de poderes e (II) o 1) a não-permissão para que representantes do
sistema de checks and balances. Longe de serem Legislativo sejam nomeados para cargos na
contraditórios, eles completam e auxiliam um ao Administração e nem que os ocupantes de
outro. Uma instituição não pode checar a menos cargos tornem-se representantes no
que tenha alguma medida de independência, e não Congresso;
pode reter independência sem o poder para checar”
2) o Congresso é proibido de passar projetos
(Jackson apud FISCHER, 1998, p. 5; idem, p. 6).
que provoquem a perda dos direitos civis
A separação de poderes é percebida como dos condenados, ou usurpar o Judiciário,
independência entre duas partes. Isso significa que por exemplo, ao provocar situações de puni-
uma parte – com formas de existência que não ção sem processo;
dependem da outra – dispõe de poderes próprios,
3) a imunidade para os legisladores;
os quais, para serem empregados, não necessitam
de sanção de qualquer outro. Já o sistema de freios 4) o Congresso não pode reduzir a remuneração
e contrapesos significa que uma parte tem o poder do Presidente e dos juízes;
de verificar as ações da outra, checar e balancear, 5) deve ser assegurada a existência de poderes
e, ainda, bloquear ou obstaculizar as ações da outra. distintos no processo de orçamento.
A questão contida na construção da armadura
institucional do sistema de governo é como esta- Examina também os três poderes exclusivos
belecer o equilíbrio entre ter poderes independentes do Presidente nos EUA: poder para nomear, poder
e autônomos e a capacidade de circunscrever o para negociar com nações estrangeiras, poder para
outro. perdoar.
A teoria que justifica o arranjo foi examinada O que vemos em Fischer é que também ele
anteriormente. Para evitar a tirania de um poder, não esclarece exatamente os âmbitos de separação
não basta apenas separar o poder, deixando-o mais de poderes e de freios e contrapesos. As medidas
fraco. É preciso que um vigie o outro, não permi- de salvaguarda dizem respeito à manutenção da
tindo a extrapolação de suas atribuições. Mas o separação, assim como os poderes exclusivos. É
problema se complexifica. O que ocorre é que a claro que esse não é seu objetivo. Tal como Jones,
ação dos poderes não se limita a evitar a extra- pretende verificar o comportamento dos atores
polação dos poderes instituídos, mas alcança a frente à institucionalidade, tomando casos ad hoc.
produção de políticas. Conforme C. Jones (1997), Instituições separadas são estruturas que exis-
os corpos de poder passam a competir em um tem sem depender uma da outra. Poderes comparti-
ambiente de potências compartilhadas, buscando lhados são poderes que estão ao mesmo tempo
o estabelecimento de suas políticas. Mesmo o disponíveis para o Legislativo e para o Executivo.
poder judiciário também exerce um papel sobre o Parece estranho ao ordenamento da separação de
fazer político, como, por exemplo, ao julgar as poderes, que afinal propõe poderes separados para
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corpos separados. Contudo, se ignorarmos a dife- fixidez do prazo dos mandatos (não sendo possível
renciação exata entre os poderes e considerarmos sua alteração quando vigentes); o Presidente nomeia
a força do poder disponível para cada parte e compõe os quadros do Executivo (ministros,
veremos que ambos dispõem de poderes que secretários etc.), e o Presidente tem alguma auto-
apresentam duas características: são potentes, no ridade constitucional para produzir legislação.
sentido de produzir resultados efetivos em de-
Aparentemente essa perspectiva toma o rumo
corrência da ação empreendida, e são flexíveis no
das proposições de Fischer e Jones, os quais
uso, isto é, conforme o estilo, a agenda e o pro-
apontam que existem corpos separados com
grama de cada parte são produzidos diferentes tipos
poderes compartilhados. No entanto, Fischer
de relação entre elas.
salienta a diferença entre uma teoria de separação
O Presidente norte-americano não dispõe de de poderes e uma teoria de freios e contrapesos.
poderes Legislativos (a exceção é o veto). Depende Se os três primeiros critérios de Shugart e Carey
do partido, das lideranças legislativas para pertencem ao campo da separação de poderes do
encaminhar suas necessidades legislativas. Não ponto de vista da existência do corpo, o último
está desarmado, contudo, para realizar sua agenda. diz respeito ao poder de legislar, o qual pode ser
Jones e Fischer salientam o campo da negociação compartilhado ou não. E, em termos estritos, o
entre os atores e do jogo político propriamente poder de legislar não diz respeito ao poder de
dito imerso em determinadas conjunturas. Porém checar. Como vimos, a própria concepção de
anotamos que esse espaço de compartilhamento Madison e Hamilton, se esclarecia o que era
pode ser melhor descrito. Poderes Legislativos, separação de poderes, não distinguia exatamente
poderes executivos, poderes de julgar são razoa- os poderes de ação e poderes de checagem.
velmente identificáveis. Mais adiante vamos tratar
Centrando sua análise no presidencialismo e
desse ponto.
seus tipos, Shugart e Carey analisam de maneira
A perspectiva comparativa que resgata a sistemática e comparada os poderes do Executivo.
separação de poderes não a examina de maneira E os poderes do Legislativo? Se falamos de sepa-
exclusiva mas dentro de um conjunto de questões ração de poderes, se vamos considerar que ela é o
que buscam estabelecer a comparação entre cerne do presidencialismo, porque a ausência de
diferentes países e sistemas. De um lado temos análise sistemática dos poderes constitucionais do
Shugart e Carey e, de outro, Lijphart. Legislativo, ou do Judiciário?
Shugart e Carey (1992) examinam basicamente Lijphart (s/d), estabelecendo a comparação
a relação entre presidentes e legislativos a partir entre 36 democracias contemporâneas no intuito
da conexão entre desenho constitucional e de identificar os tipos de democracia às quais
“dinâmica eleitoral”. A questão da separação de pertencem (consensuais ou majoritárias), elege
poderes é posta como cerne do conceito de pre- como uma das dimensões necessárias a relação
sidencialismo, em respeito à posição de Madison. Executivo-Legislativo. Considerando que no
No entanto, conforme eles, os poderes nunca estão modelo de democracia majoritário existe a predo-
plenamente separados no presidencialismo. minância do Executivo e no modelo consensual
há um balanceamento entre um e outro poder,
Esses autores ainda afirmam que a idéia de
contrasta os sistemas presidencialistas e parlamen-
Madison em separar a origem e a sobrevivência
taristas. Selecionando de outros autores, como
dos poderes servia ao propósito de que cada parte
uma das diferenças entre os sistemas, o esquema
pudesse impor freios ao outro sem ameaçar sua
da separação de poderes (idem, p. 136), o autor
própria existência. Assim, “separation in some
aponta que no sistema presidencial existe mútua
respects serves to ensure interdependence – that
independência e proibição de que os representantes
is, checks – in others” (idem, p. 19). Tendo em
participem do Executivo e do Legislativo ao mesmo
vista a origem e a sobrevivência, a máxima
tempo. No sistema parlamentarista o Executivo
separação seria característica do presidencialismo.
depende da confiança do Legislativo e seus
Com respeito às ações o presidencialismo procura
membros podem participar do Executivo. Outra
garantir a checagem mútua, redundando em
diferença é o direito de dissolução do Legislativo,
sobreposição de poderes. Descartam outros cri-
direito que o Presidente não teria (mas aponta como
térios que não sejam os seguintes na definição do
exceções França e Israel).
presidencialismo: eleição popular do Presidente;
84
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A SEPARAÇÃO DE PODERES EM PAÍSES PRESIDENCIALISTAS
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REVISTA DE SOCIOLOGIA E POLÍTICA Nº 17: 75-106 NOV. 2001
Precisamos agora determinar o balanço entre proca dos poderes para evitar abusos, tendo em
independência e checagem. A lógica normativa, vista a liberdade e o bom governo).
tendo em vista a teoria da separação de poderes, é
As situações de equilíbrio são quando temos:
que quanto mais um poder decidir unilateralmente,
sem concorrência de outro, maior devem ser os 1. checagem baixa e independência baixa, em
instrumentos de checagem. E quanto mais deci- que a maior parte das decisões são tomadas
sões conjuntas, menor a necessidade de checagens. em conjunto; a checagem sendo baixa,
O equilíbrio entre checagem e independência então compensa a não-independência existente.
apresenta-se como uma relação direta e linear5 , A agenda torna-se compartilhada;
buscando criar o ambiente de corpos separados
2. checagem alta e independência alta; mes-
mas com poderes compartilhados.
mo que um poder tenha alto poder de deci-
Temos então as seguintes situações de dese- são, o outro pode estabelecer controles e
quilíbrio6: punições sobre essas decisões. Dessa ma-
neira, diminui o campo de atuação livre do
1) quando existe baixa independência e alta
outro poder, forçando a adequação da agen-
checagem, um poder provoca a paralisia
da política aos movimentos do primeiro
decisória e diminui a possibilidade de imple-
poder.
mentação da agenda política do outro;
Essas situações de equilíbrio-desequilíbrio po-
2) quando existe alta independência e baixa
dem ser empregadas no balanço entre os poderes.
checagem, significa que um poder tem a
Ressaltamos que em situações nos quais exista
possibilidade de predomínio, subordinando
grave polarização político-ideológica entre Executi-
o outro à sua agenda.
vo, Legislativo e Judiciário o arcabouço das regras
As situações de desequilíbrio concorrem para pode vir a propiciar ou incrementar resultados que
a não-efetivação dos princípios fundadores da redundem em instabilidade política. O Quadro I
moderna separação de poderes (contenção recí- ajuda-nos a visualizar melhor a proposição:
5 Existe um ponto de confusão ou superposição: se um pelas regras seja baixa, a necessidade de checagens diminui,
mantendo, de certa forma, a mesma independência genérica.
poder é independente porque pode decidir sem precisar do
outro poder para efetivá-las, e se checagem é a capacidade 6 Podemos criar também um setor médio na escala. Acontece
de um impedir ao outro, esse impedimento não seria já um que a relação desse setor médio com os setores alto e baixo
elemento de não-independência? Sim, de maneira genérica. é o mesmo que o setor alto com o setor baixo e vice-versa,
Por isso, quanto mais checagem mais recua a independência porém com intensidade menor. Dessa forma, nessa parte
genérica, mas não a independência permitida pelas regras. O inicial optamos, para efeitos de maior clareza e contraste,
equilíbrio proposto é que caso essa independência permitida trabalhar com situações extremas.
87
A SEPARAÇÃO DE PODERES EM PAÍSES PRESIDENCIALISTAS
Uma palavra deve ser dada sobre os poderes. o balanço entre os poderes. O número desses meios
Existem três planos de poderes que estão dispo- é muito alto7. Dessa maneira, a melhor forma de
níveis para o Legislativo e o Executivo. O primeiro enfrentar esse desafio é propor um exercício
é o plano do que é permitido fazer quanto às exploratório. Focalizando nossa atenção nos
políticas públicas, as atribuições; o segundo diz regimes presidencialistas, tendo em vista que
respeito aos instrumentos institucionais que per- nesses sistemas necessariamente encontramos
mitem aprovar e implementar aquelas políticas, separação de poderes, a análise comparada impõe-
tanto em relação a si próprios quanto em relação se.
aos outros poderes. Fazem parte desses poderes
IV. ASPECTOS METODOLÓGICOS
a capacidade de formar a agenda, e a capacidade
de iniciar e decidir sobre a legislação, atos exe- Esperamos um resultado ao sermos capazes
cutivos e adjucativos. O caso do Judiciário é mais de identificar as prerrogativas de todos os poderes
específico. Sua força é seu mandato permanente, e os instrumentos de independência e checagem:
aliado a um alto poder de checar as decisões de verificar se as proposições teóricas da separação
outros poderes. Foi considerado o poder mais de poderes estão presentes nos arranjos institu-
fraco por Montesquieu e Madison, na medida em cionais daqueles regimes. De modo mais espe-
que não decide propriamente políticas novas. cífico: a separação de poderes existente garante o
Neste estudo, no entanto, centramos nossas balanço de poder, de maneira a não permitir a
atenções na relação Executivo-Legislativo . dominação de um poder sobre o outro? Assim,
quanto mais desequilíbrio institucional existir maior
O terceiro conjunto são os poderes de che-
a chance de ou um poder ter predominância em
cagem, aqueles poderes que permitem a um poder
relação ao outro ou existir paralisia decisória. E o
obstaculizar as ações e decisões do outro: vetos,
desequilíbrio institucional é maior quanto maior
julgamentos de ações, investigações, sessões de
for a distância entre independência e checagem.
informações etc.
Essa distância, por sua vez, cresce à medida em
Esse quadro não incorpora as dimensões do que ou independência é maior que checagem, ou
sistema eleitoral e do sistema partidário, tais como, checagem é maior que independência
por exemplo, o quadro de forças existente dentro
Nosso objeto de estudo é formado pelos casos
do Legislativo, as coalizões, a coesão partidária,
de regimes presidenciais da América Latina:
nem a formação ministerial. A incorporação desses
Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia, Costa
elementos tornaria a análise sobre a real separação
Rica, El Salvador, Equador, Guatemala, Haiti,
de poderes mais completa. No entanto, estamos
México, Nicarágua, Panamá, Paraguai, Peru,
circunscritos aos aspectos constitucionais
República Dominicana, Uruguai e Venezuela. Duas
desejando com isso garantir, tendo em vista nossos
observações são necessárias: 1) Cuba ficou
recursos imediatos, maior precisão e confiabilidade
excluída devido à natureza diferenciada do seu
na análise.
sistema econômico e político (não é capitalista e
Identificamos dois problemas nas análises sobre nem apresenta um sistema representativo acoplado
a separação de poderes: a ênfase nos poderes a uma democracia de feição clássica), e 2) o caso
presidenciais e ausência de clareza sobre a peruano é controverso na medida em que fortes
caracterização dos elementos constitucionais de fatores externos ao jogo entre poderes tornam o
separação, independência e checagem de poderes. seu estatuto constitucional algo precário; mesmo
A solução do primeiro passa por identificarmos assim, quando o bloco de poder dissolve-se como
os poderes do Legislativo e do Judiciário; e a do aconteceu com Fujimori, o mecanismo constitu-
segundo o mesmo em relação aos instrumentos cional volta a operar. A principal característica
que se enquadram naquelas classificações. desses países é que são presidencialistas. Existe,
no entanto, ampla diversidade sócio-econômica
No entanto, a enumeração desses poderes de
entre eles. As regiões apresentam diferenciações
maneira genérica e abstrata revela-se prematura
na medida em que a diversidade de instrumentos
institucionais existentes no mundo real é consi-
derável. E não apenas no mundo real, mas também
na possibilidade teórica de que novos meios e 7 Ver por exemplo a possibilidade e existência de veto
88
REVISTA DE SOCIOLOGIA E POLÍTICA Nº 17: 75-106 NOV. 2001
89
A SEPARAÇÃO DE PODERES EM PAÍSES PRESIDENCIALISTAS
veto pelo Legislativo; 8) procedimento para trâmite ao maior, numericamente, permitiram estabe-
do veto sem apreciação dentro do tempo cons- lecermos os patamares mínimo e máximo de sua
titucional pelas câmaras; 9) trâmite das partes não variação. Esses valores serviram de base para a
vetadas do projeto de lei; 10) poder do Executivo normalização de dados que fizemos, surgindo uma
em dissolver o Legislativo, e 11) participação segunda escala, variando de 0 a 100. Assim, todas
ministerial em sessões legislativas. as variáveis de nível 2 foram normalizadas dentro
dessa segunda escala, possibilitando sua
As subvariáveis de nível 2 “poderes de checa-
comparação interna. Além disso, demos peso para
gem da Câmara alta” e “poderes de checagem da
algumas variáveis tendo em vista sua importância.
Câmara baixa” compreendem as seguintes subva-
Assim, as subvariáveis de nível 2 “recursos de
riáveis de nível 1: 1) existência de comissão inves-
tempo” e “urgência do Executivo” foram multi-
tigatória exclusiva; 2) possibilidade de pedidos e
plicadas pelo fator 1/2 enquanto a subvariável
convocação de sessão de informações sobre outro
“convocação de consultas nacionais” foi multi-
poder; 3) poder de apreciação de contas; 4) poder
plicada pelo fator 1/3, provocando uma diminuição
de abertura de processo para julgamento; 5)
de seu peso no cômputo geral. Essa decisão é
possibilidade de conceder autorização para preen-
arbitrária mas guarda relevância, na medida em
chimento de cargos; 6) obrigatoriedade de receber
que os elementos constituintes dessas subvariáveis
comunicação de planos governamentais; 7)
não são cruciais para a relação entre Executivo e
capacidade de expedição de autorização sobre ma-
Legislativo, ainda que exerçam razoável efeito. A
térias diversas, como guerra-paz, autorização de
ausência de um padrão teórico claro de máximo e
viagens etc.; 8) capacidade de expedição de voto
mínimo de separação de poderes e poder de
de censura ou confiança sobre o Presidente; 9)
checagem levou-nos a essa decisão; dessa maneira,
capacidade de expedição de voto de censura ou
superamos essa ausência.
confiança sobre ministros e equipe presidencial;
10) capacidade de solicitar a demissão do Presi- Posteriormente as subvariáveis de nível 2
dente; 11) capacidade de proceder ao julgamento foram somadas e novamente sofreram um
das contas de outros poderes; 12) capacidade de processo de normalização tendo em vista os valores
julgar o Presidente; 13) capacidade de julgar minis- máximos e mínimos possíveis. Dessa forma as
tros e equipe presidencial, e 14) capacidade de três variáveis finais (separação, independência e
impedir atos inconstitucionais do Executivo. checagem) apresentam resultados comparáveis,
que variam de 0 a 100 para toda e qualquer uma
Dois passos importantes foram tomados: em
delas.
primeiro lugar, elaboramos as escalas dos indi-
cadores, que variam de 0 a infinito, dependendo Essa padronização permitiu-nos ter maior
do número de opções existentes. Em segundo visibilidade quanto à identificação do equilíbrio
lugar normalizamos os valores obtidos dentro de entre a independência dos poderes e os poderes
uma escala percentual de 0 a 100. As escalas dos de checagem por país. Se todas as variáveis têm
indicadores das variáveis de separação e inde- como limites 0 e 100, então pode-se esperar, tendo
pendência, e suas subvariáveis, foram construídas em vista o esperado equilíbrio, que quando a
de maneira a variar no sentido do menos separado independência tenha, por exemplo, o valor 40,
ao mais separado. Valores maiores, portanto, então a checagem também o apresente10. Dessa
significam maior separação e independência. Os maneira está garantida a identificação do caráter
indicadores de checagem dos poderes, apesar de linear e positivo previsto pela teoria.
serem em sua maioria constituídos por valores
V. OS RESULTADOS
dicotômicos de presença ou ausência, também
foram pontuados de maneira a serem somados e Nesta seção vamos analisar, em primeiro lugar,
gerarem um resultado que também é intuitivo: a separação de poderes nos países anteriormente
quanto mais alto é o valor da soma, maior é o
poder de checagem do poder.
A agregação dos valores nas variáveis supe-
riores (separação, independência, checagem) 10 Um segundo momento de investigação é requerido. Trata-
exigiu sua normalização tendo em vista alcançar se de alinhar lado a lado o poder da função e seu corres-
comparabilidade. As escalas variando do menor pondente mecanismo de checagem.
90
REVISTA DE SOCIOLOGIA E POLÍTICA Nº 17: 75-106 NOV. 2001
definidos desde um ponto de vista sistêmico, isto A Tabela 1 mostra-nos o comportamento das
é, apresentando suas características como um variáveis separação, independência e checagem
sistema único, mostrando os resultados gerais para conforme cada país. Apesar de a maior parte dos
cada variável. Posteriormente vamos proceder à países situarem-se em um patamar médio, existem
comparação entre elas, estabelecendo as diferenças oscilações importantes.
e semelhanças entre os formatos constitucionais.
Três países apresentam forte separação entre dência acima dos 60%.
os poderes: Bolívia, Chile e Brasil, acima dos 66%,
Os resultados relativos à checagem têm menor
seguidos pela Guatemala. As menores separações
variação interna. Uruguai, Peru, El Salvador e
pertencem a Uruguai, México e Costa Rica.
Venezuela são os que, na ordem, apresentam maior
Brasil e Chile têm os maiores valores de percentual de checagem, pouco ultrapassando os
independência, seguidos de Uruguai, Argentina e 50%. O Brasil quase alcança esse grupo. Os
Colômbia. A menor independência é apresentada menores percentuais pertencem a Nicarágua e
por El Salvador, seguido por México e Panamá. Bolívia. A Tabela 2 oferece-nos uma medida menos
Também Costa Rica e República Dominicana extensa ao agrupar por níveis de percentuais; no
situam-se em patamares de independência abaixo entanto, é útil porque permite identificarmos os
dos 33%. Nenhum país apresenta uma indepen- casos mais extremos.
TABELA 2 – Separação, independência e checagem por níveis de percentuais* por país latino-americano
presidencialista
91
A SEPARAÇÃO DE PODERES EM PAÍSES PRESIDENCIALISTAS
restantes
Costa Rica, El Salvador, Equador,
Baixo Guatemala, México, Panamá, Rep. Bolívia, Nicarágua
Dominicana
* Baixo = 0% a 33%; Médio = 33,1% a 66%; Alto = 66,1% a 100%.
90
80
70
60 Uruguai
Checagem
Peru
El Salvador Panamá Rep. Dominicana
Guatemala Venezuela
50 Paraguai Brasil
Argentina
México Costa Rica
Equador Colômbia
40
Haiti
Chile
30 Bolívia
Nicarágua
20
10
0
0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100
Independência
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Executivo Legislativo
País Distância
Independência Checagem
Argentina 60,4 48,1 12,3
Bolívia 52,9 25,9 27,0
Brasil 81,5 51,9 29,6
Chile 78,5 40,7 37,8
Colômbia 75,9 44,4 31,5
Costa Rica* 30,5 48,1 -17,6
El Salvador* 30,5 40,7 -10,2
Equador* 57,9 37,0 20,9
Guatemala 45,6 48,1 -2,5
Haiti 45,7 59,3 -13,6
México 35,7 44,4 -8,7
Nicarágua* 47,0 14,8 32,2
Panamá* 35,2 51,9 -16,7
Paraguai 62,4 44,4 18,0
Peru* 61,8 63,0 -1,2
Rep. Dominicana 32,6 51,9 -19,3
Uruguai 60,9 66,7 -5,8
Venezuela 39,2 51,9 -12,7
* Países com apenas uma câmara legislativa.
Legislativo Executivo
País Distância
Independência Checagem
Argentina 70,4 44,3 26,1
Bolívia 63,0 31,4 31,6
Brasil 72,1 47,1 25,0
Chile 58,4 31,4 27,0
Colômbia 50,1 42,9 7,2
Costa Rica* 39,2 44,3 -5,1
93
A SEPARAÇÃO DE PODERES EM PAÍSES PRESIDENCIALISTAS
90
80
70 Uruguai
Legislativo
doLegislativo
Haiti Peru
60
Rep. Dominicana Venezuela Brasil
Guatemala
Argentina
50
Checagem do
Panamá
Costa Rica Colômbia
Checagem
México Paraguai
40
El Salvador Chile
Equador
30
Bolívia
20
Nicarágua
10
0
0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100
Independência do Executivo
94
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90
80
70 Uruguai
doLegislativo
Legislativo
Haiti Peru
60
Rep. Dominicana Venezuela Brasil
Guatemala
Checagemdo
Argentina
50 Panamá
Costa Rica Colômbia
Checagem
México Paraguai
40
El Salvador Chile
Equador
30
Bolívia
20
Nicarágua
10
0
0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100
Independência do Executivo
Os países que apresentam significativa distância Já no Gráfico 3 temos que a Costa Rica apro-
da reta, com maior ênfase na checagem do xima-se mais do equilíbrio no campo daqueles paí-
Legislativo, são República Dominicana, Panamá, ses que apresentam uma checagem do Executivo
Costa Rica, seguidos de Haiti e Venezuela. Do lado maior que a independência do Legislativo. No cam-
dos países que mostram maior independência do po dos países que apresentam maior independência
Executivo temos Chile, Brasil, Colômbia e do Legislativo temos o Paraguai como o mais equi-
Nicarágua. Nitidamente o bloco de países acima da librado. Nesse grupo temos um conjunto signifi-
reta é menos disperso e menos distante da mesma cativo de países com uma grande distância em
do que o bloco de países abaixo dela. Isso significa relação à reta de equilíbrio: Venezuela, Bolívia, Ar-
que os países que apresentam maior checagem do gentina, Uruguai e Brasil, seguidos de Guatemala,
Legislativo estão, no conjunto, mais equilibrados. Chile e Haiti.
90
80
70
Checagem do Executivo
El Salvador
60
Equador
México
Venezuela
50 Panamá Paraguai Guatemala
Colômbia Brasil
Costa Rica Peru Argentina - Uruguai
40 Rep. Dominicana
Nicarágua
Bolívia
30 Chile
Haiti
20
10
0
0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100
Independência do Legislativo
95
A SEPARAÇÃO DE PODERES EM PAÍSES PRESIDENCIALISTAS
Contudo, uma análise mais completa exige que independência e checagem de cada poder.
coloquemos lado a lado essas duas dimensões:
A Tabela 6 condensa a Tabela 5 no que diz Legislativo. Quatro casos constituem-se com
respeito à classificação em letra maiúscula, preponderância do Executivo (Chile, Colômbia,
correspondente à escala principal das variáveis. México e Nicarágua), em quatro existe equilíbrio
Assim, praticamente metade dos países latino- (Equador, Panamá, Paraguai, Peru) e em dois existe
americanos presidencialistas apresenta no balanço uma potencial situação de conflito (Brasil e Bolívia).
entre poderes uma preponderância a favor do
96
REVISTA DE SOCIOLOGIA E POLÍTICA Nº 17: 75-106 NOV. 2001
Agregando para análise o significado das letras No entanto, é crível alcançar níveis substantivos
minúsculas entre parênteses (subescala da escala de estabilidade política e governabilidade se os
principal das variáveis) da Tabela 5, temos que na atores observarem a conclusão de Przeworski
Argentina, apesar de existir predomínio Legislativo, (1994): a democracia exige a adesão dos atores à
existe um leve reequilíbrio a favor do Executivo regra do jogo.
tendo em vista que sua independência é média alta
A realidade constitucional da América Latina é
enquanto a checagem do Legislativo é média baixa.
dinâmica. Tal constatação indica que muitas
O Brasil, por seu turno, mesmo situando-se em
modificações são introduzidas com o passar dos
potencial situação de conflito, apresenta discreta
anos, transformando a correlação entre separação
predominância legislativa, tendo em vista um poder
de poderes, sua independência e capacidade de
de checagem situado em nível médio alto. O
checagem. Isso não impede contudo de
Executivo, por seu turno, apresenta um poder de
apontarmos algumas conclusões mais gerais sobre
checagem médio baixo.
o momento de vigência destas constituições.
No campo dos países onde o Executivo
Vimos que a maioria dos países latino-america-
predomina, temos duas situações de tendência para
nos apresenta, no período, predomínio do Legisla-
quase-conflito (Chile e Colômbia) e um com leve
tivo. Estes países, em conjunto com aqueles que
tendência para o equilíbrio (Nicarágua). No campo
apresentam equilíbrio entre poderes, representa
dos países em equilíbrio existem leves tendências
um expressivo contingente de 69,3% do total de
concorrendo para o desequilíbrio. Tendências que
países presidencialistas. A predominância do Le-
levam para a predominância do Executivo podem
gislativo é sancionada pelas teorias democráticas
ser notados no Paraguai e no Equador, e tendências
que alcançam soberania à representação, capacita-
com leve predominância do Legislativo no Panamá
da esta a fazer as leis. O equilíbrio é o resultado
e no Peru.
desejado pela teoria da separação de poderes.
VI. BREVE CONCLUSÃO Contudo, existem importantes casos que desviam
do estabelecido pelas teorias normativas (Brasil,
A teoria da separação de poderes propõe,
México e Chile, por exemplo), ensejando a pro-
normativamente, a divisão do poder em corpos
posição de que certos dilemas institucionais devem
separados e a capacidade de cada um desses
ser superados para que o processo democrático
corpos controlar o outro, devendo haver um
se aperfeiçoe e se estabilize.
equilíbrio entre os poderes de maneira a evitar o
predomínio de um sobre o outro, possibilitando Nosso estudo exploratório mostrou que é
não apenas afastar o perigo da tirania, como, possível estabelecer com mais acuidade os
também, correlativamente, garantir a liberdade. De aspectos institucionais de separação, independência
outro lado, a separação de poderes, caso seja e checagem do poder. Os resultados alcançados
efetiva, pode concorrer para a formação de nos permitem identificar que é possível descrever
sistemas democráticos menos centralizados, os desequilíbrios previstos na teoria. Nossa
perfazendo o modelo consensualista. Assim, como modelagem, contudo, não está pronta. O controle
comentou Mettenheim (2000), a separação de sobre os efeitos exige que as dimensões relativas
poderes, combinada com o presidencialismo, faria ao jogo político da relação Executivo - Legislativo
sentido dentro da afirmação da teoria da decisão e sejam incorporadas. Dessa maneira poderemos
do processo político conforme a tradição verificar até onde as variáveis de organização e
pluralista, que enfatiza a necessidade do poder constituição dos poderes são efetivamente
difuso. Dessa maneira, dentro do funcionamento importantes.
do sistema de poder dividido, as instituições
É claro que a institucionalidade dos poderes
precisariam incentivar a iniciativa política, a
alocados para cada organismo do Estado e do
negociação e a resolução de conflitos. A crença
Governo não pode substituir a ação política que
subjacente é de que com pelo menos dois centros
redefine o espaço de cada um. Dessa forma,
de poder, ocupados por forças diferentes, o melhor
podemos entender as limitações desse exercício
governo pode ser produzido. Não chegamos a
justamente porque existem casos e situações onde
afirmar tanto, porque em situações de intensa
a ação política altera o desfecho colocado em
polarização político-ideológica o processo dual
perspectiva pelo quadro institucional, como por
pode se voltar contra a própria institucionalidade.
exemplo, o Peru de Fujimori. Também no campo
97
A SEPARAÇÃO DE PODERES EM PAÍSES PRESIDENCIALISTAS
da institucionalidade podemos ter a extensão das democracia criou nos países da região soluções
regulações constitucionais em forma de leis constitucionais diversas, apesar de alguma simili-
regulares, que implicam alteração do balanço Exe- tude aparente no emprego de certos instrumentos
cutivo-Legislativo-Judiciário. Porém, é a partir a disposição dos poderes.
dessa institucionalidade que as diferentes forças
A questão subseqüente a este breve estudo,
políticas traçam suas estratégias. Isso é incon-
além da necessidade de aprofundá-lo e torná-lo
tornável.
mais exaustivo, é justamente identificar, a partir
De outro lado, a existência de formatos insti- desse quadro institucional diferenciado, quais são
tucionais algo diferentes, com possibilidades de os efeitos reais e concretos por eles permitidos,
gerarem resultados políticos também diferentes, se seus efeitos são marginais ou se, ao contrário,
demonstra que os presidencialismos existentes não desempenham papel fundamental na ordenação da
podem ser considerados como um conjunto disputa política.
homogêneo quanto às suas implicações políticas. Recebido para publicação em 8 de outubro de 2001.
Além disso, o processo das transições para a Artigo aprovado em 23 de novembro de 2001.
Luís Gustavo Mello Grohmann (gustg@zaz.com.br) é Mestre em Ciência Política pela Universidade
Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Doutorando em Ciência Política no Instituto Universitário de
Pequisas do Rio de Janeiro (IUPERJ) e Professor do Departamento de Sociologia e Política na Universidade
Federal de Santa Maria (UFSM).
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A SEPARAÇÃO DE PODERES EM PAÍSES PRESIDENCIALISTAS
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REVISTA DE SOCIOLOGIA E POLÍTICA Nº 17: 75-106 NOV. 2001
ANEXO I
TABELA A-1 – Separação de poderes (em %)
E Total
País A B C D
1 2 Normalizado
Argentina 66,6 100 0 66,6 40 40 52,2
Bolívia 58,3 100 80 88,8 20 80 71,2
Brasil 66,6 100 40 66,6 60 80 68,9
Chile 70,8 100 80 77,7 40 60 71,4
Colômbia 66,6 100 60 100 20 0 57,8
Costa Rica* 66,6 100 20 33,3 20 40 46,7
El Salvador* 66,6 100 60 88,8 20 20 59,3
Equador* 66,6 100 80 100 20 0 61,1
Guatemala 75 100 80 100 20 20 65,8
Haiti 58,3 66,6 60 66,6 20 20 48,6
México 66,6 100 0 66,6 20 20 45,6
Nicarágua* 58,3 100 80 100 20 20 63,1
Panamá* 66,6 100 80 55,5 20 0 53,7
Paraguai 83,3 100 80 55,5 20 40 63,1
Peru* 100 66,6 80 77,7 20 0 57,4
Rep. Dominicana 75 100 40 100 20 20 59,2
Uruguai 66,6 66,6 0 66,6 20 40 43,3
Venezuela 62,5 100 20 100 20 40 57,1
* Países unicamerais
A = Origem do mandato
B = Independência do mandato
C = Fiscalização das contas
D = Independência financeira do poder
E1 = Atribuições constitucionais exclusivas do Executivo
E2 = Atribuições constitucionais exclusivas do Legislativo
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A SEPARAÇÃO DE PODERES EM PAÍSES PRESIDENCIALISTAS
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REVISTA DE SOCIOLOGIA E POLÍTICA Nº 17: 75-106 NOV. 2001
Recurso Estado de
País Iniciativa Decisão Plebiscito Total Normalizado
Tempo Sítio
Argentina 66,6 50 72,2 12,5 33 70,4
Bolívia 66,6 50 55,5 37,5 0 63
Brasil 66,6 50 77,7 12,5 33 72,1
Chile 66,6 25 77,7 25 0 58,4
Colômbia 66,6 0 50 50 0 50,1
Costa Rica* 33,3 0 72,2 25 0 39,2
El Salvador* 66,6 0 38,8 25 0 39,2
Equador* 66,6 25 72,2 37,5 0 60,5
Guatemala 66,6 50 72,2 12,5 33 70,4
Haiti 66,6 0 88,8 12,5 0 50,5
México 33,3 25 22,2 12,5 0 27,9
Nicarágua* 66,6 0 77,7 37,5 0 54,6
Panamá* 66,6 0 66,6 0 0 40
Paraguai 66,6 25 55,5 12,5 0 47,9
Peru* 100 0 33,3 50 0 55,1
Rep.
66,6 0 72,2 25 0 49,2
Dominicana
Uruguai 66,6 25 72,2 37,5 33 70,4
Venezuela 66,6 50 100 37,5 0 76,3
* Países unicamerais
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A SEPARAÇÃO DE PODERES EM PAÍSES PRESIDENCIALISTAS
2. Mandato Independente Para cada poder, se seu mandato Sim (1); Não (0)
não pode ser interrompido por
outro poder
3.Independência Para cada poder, independência Dependência total (1); semi-
financeira do poder orçamentária independente, com % mínimo, decisão do
outro poder (2); independente mas com
decisão conjunta não normatizada, via
orçamento (3); total independência (4)
4.Atribuições Se o poder tem atribuições Sim (1); Não (0)
constitucionais exclusivas constitucionais exclusivas de
cunho Legislativo, Executivo,
Judiciário, Orçamentário, outras.
2. Quorum para decisão 2.A. Quorum em plenário para votar Maioria Relativa (4); Maioria
legislativa projeto de lei sobre emenda Absoluta (3); 3/5 absoluta
2.A. para emendas constitucional (2); 2/3 absoluta (1)
constitucionais 2.B. idem sobre orçamento
2.B. para leis orçamentárias 2.C. idem sobre matérias ordinárias
2.C. para leis ordinárias
3. Recursos de tempo 3.A. Se o poder tem prerrogativa de Sim (1); Não (0)
3.A. Solicitação de urgência pedir urgência par projetos de lei
para projetos, por poder 3.B. Se o poder tem prerrogativa de
3.B. convocação de sessão pedir convocação de sessão
extraordinária, por poder extraordinária
4. Urgência do Executivo 4.A. Qual o trâmite do projeto caso o 4.A. Entra na pauta de
4.A. trâmite do projeto em caso Legislativo não o examine pelo tempo imediato (1); projeto é
de não exame pelo Legislativo estabelecido aprovado (2)
4.B. momento do pedido de 4.B. Em qual momento do trâmite do 4.B. No início do processo
urgência projeto de lei pode ser solicitada a (1); em qualquer parte do
urgência trâmite (2)
4.C. limitação ou não do
número de projetos com pedido 4.C. Se existe limitação ou não do 4.C. sim (0); não (1)
de urgência número de projetos com pedido de 4.D. sim (0); não (1)
urgência
4.D. pedido de urgência pode 4.E Não se aplica [nsa] (0);
ser derrubado 4.D. Se o pedido de urgência pode ser 2/3 relativo (1); 3/5 absoluto
ou não derrubado pelo plenário do (2); 2/3 absoluto (3).
4.E. quorum para derrubada da Legislativo
urgência
4.E. Qual o quorum para o plenário do
Legislativo derrubar o pedido de
urgência
5. Decreto do Executivo e 5.A. O Legislativo pode ou não impedir a 5.A. Não há decreto (0);
delegação do Legislativo entrada em vigor de decreto Legislativo efeito do decreto com
5.A. controle da vigência do 5.B. Qual área de atuação do decreto necessidade de decisão do
decreto Legislativo pelo poder Legislativo (1); efeito sem
5.C. Se o Executivo pode reeditar ou necessidade de decisão do
Legislativo não o decreto Legislativo (2)
5.B. área de atuação do
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