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Trovadorismo

Sumário

O que é o Trovadorismo

A língua do Trovadorismo

Os cancioneiros e as cantigas

As cantigas de amor

As cantigas de amigo

As cantigas de escárnio e as cantigas de maldizer

As cantigas de Santa Maria

Referências bibliográficas e eletrônicas


O que é o Trovadorismo

O Trovadorismo é o movimento que se


desenvolveu durante os séculos XII, XIII e
XIV na Península Ibérica. Durante este
período, surgiram as cantigas, que eram
poesias destinadas ao canto e
acompanhadas de flauta, viola, alaúde e
outros instrumentos. O compositor dessas
cantigas era chamado de trovador e ao
cantor dava-se o nome de jogral; por isso, o período ficou conhecido como Trovadorismo. Os
trovadores mais antigos são Dom Sancho (1.154 – 1.211) e João Soares de Paiva (nascido por
volta de 1.140). Até pouco tempo, considerava-se Paio Soares de Taveirós o mais antigo, mas já se
sabe que ele é um autor surgido na primeira metade do século XIII (A ele se atribui a autoria da
Cantiga da Ribeirinha). A iluminura ao lado representa o Rei Afonso X, autor de poemas que
ficaram conhecidos como Cantigas de Santa Maria.

A língua do Trovadorismo

Na Idade Média, a língua portuguesa ainda não tinha a forma e a estrutura que conhecemos. O
que havia era o galego-português, idioma usado para manter a unidade linguística entre
Portugal e a Galiza.

Os cancioneiros e as cantigas

Os manuscritos que integram o acervo conhecido da lírica trovadoresca foram organizados em


coletâneas - os cancioneiros. Os mais importantes são:

 Cancioneiro da Ajuda – A coletânea da Biblioteca da Ajuda, em Lisboa, contém cerca de


310 cantigas, quase todas de amor.
 Cancioneiro da Vaticana – Contém 1.205 cantigas copiadas na Itália no século XV ou XVI.
 Cancioneiro da Biblioteca de Lisboa – Copiado na Itália no século XV ou XVI, o cancioneiro
foi descoberto em 1878, na biblioteca do Conde Colocci Brancutti, levado para
Portugal, onde está desde 1924.

As cantigas

Com base na maioria dos textos encontrados nos cancioneiros, as cantigas podem ser divididas em
quatro grupos principais: cantigas de amigo, cantigas de amor, cantigas de escárnio e cantigas de
maldizer. Além destas, há as cantigas de Santa Maria atribuídas a Afonso X.

As cantigas de amigo

Originárias da Península Ibérica, as cantigas de amigo eram escritas sob o ponto-de-vista de um


eu lírico feminino que chorava a ausência do amado. O tema da cantiga comporta, de acordo com
o professor Leodegário de Azevedo Filho, algumas variações: separação do namorado, que partiu
em uma expedição militar e a espera de seu retorno; romaria a lugares santos , onde a moça vai
pedir por uma conquista amorosa, através da dança; as baladas, que narram a ida da moça a
algum baile; o choro da amante à beira do mar; e as cantigas de fonte, que narram a ida da moça a
uma fonte, onde ela reencontra o namorado, com perda ou não da virgindade.

Ai flores de do verde pino


Dom Dinis

- Ai flores, ai flores do verde pino,se Ai , Deus, e u é?


Sabedes novas do meu amigo?
Ai, Deus, e u é? - Vós me perguntastes pólo voss’amado?
E eu bem vos digo que é vivo e sano:
Ai flores , flores do verde ramo, Ai , Deus, e u é?
Se sabedes novas do meu
amado? Ai, Deus e u é? E eu bem vos digo que é san’ e vivo,
E será vosc’ant’o prazo saído.
Se sabedes novas do meu amado, Ai, Deus, e u é?
Aquel que mentiu do que pôs comigo?
Ai Deus e u é? E eu bem vos digo que é vivo e sano
E será vosc’ant’ o prazo passado.
- Vós me perguntastes pólo Ai, Deus, e u é?
voss’amigo? E eu bem vos digo que é
san’ e vivo:
Ai flores do verde pinheiro
(Versão em português moderno)

-Ai, flores, ai flores do verde pinheiro, Ai, Deus, onde está?


Sabeis notícias do meu amigo?
Ai, Deus, onde está? Vós me perguntais pelo vosso amado?
E eu bem vos digo que está vivo e são.
Ai, flores, ai flores do verde ramo, Ai, Deus, onde está?
Sabeis notícias do meu amado?
Ai, Deus, onde está? E eu bem vos digo que está são e vivo
E estará convosco antes de terminar o prazo.
Sabeis notícias do meu amado? Ai, Deus, onde está?
Aquele que não cumpriu o que tinha jurado?
Ai, Deus, onde está? E eu bem vos digo que está vivo e são
E estará convosco antes de passar o prazo.
- Vós me perguntais pelo vosso amigo? Ai, Deus, onde está?
E eu bem vos digo que está são e vivo.

As cantigas de amor

Os jograis levaram as cantigas a toda a Europa e chegaram à região de Provença, sul da França,
onde o estilo poético foi adaptado à língua local e sofreu alterações estruturais, como se poderia
observar mais tarde nas obras do rei Dom Dinis. A poética trovadoresca sofreu ainda mudanças
de temática e foi impregnada pelo ideal de amor cortês.

No amor cortês (também chamado de coita de amor, termo em que “coita” significa encontro), o
eu lírico apresenta-se como vassalo amoroso de uma mulher casada, já que, na Provença, a
mulher solteira não tinha o mesmo valor social das casadas. Neste amor de vassalagem, a dama
era apresentada com as seguintes características: ela é o supremo bem a que o trovador
raramente tem direito de alcançar; é conjunto de beleza, virtude, paciência, fidelidade, esperança,
honra e discrição.

A discrição é condição essencial para a dama homenageada na cantiga de amor. É este sentimento
que faz o poeta atribuir-lhe um falso nome, a fim de evitar as maledicências em torno da
reputação da dama.

A cantiga de amor ibérica aproximou a amada da figura da Virgem Maria, enquanto a linguagem
da cantiga provençal expressa maior erotismo.
Quer’eu em maneira de provençal
Dom Dinis

Quer’eu em maneira de provençal e desi nom lhi fez pouco de bem


fazer agora um cantar d’amor quando nom quis lh’outra foss’igual
e querrei muit’i loar mia senhor
a que prez nem fremosura nom fal,
nem bondade; e mais vos direi ém: Ca mia senhor nunca Deus pôs mal,
tanto a fez Deus comprida de bem mais pôs i prez e beldad’e loor
que mais que todas las do mundo val. e falar mui bem, e riir melhor
que outra molher; desi é leal
muit’, e por esto nom sei oj’eu quem
Ca mia senhor quizo Deus fazer tal, possa compridamente no seu bem
quando a faz, que a fez sabedor falar, ca nom á, tra-lo seu bem, al.
de todo bem e de mui gram valor,
e com tod’est[o] é mui comunal
ali u deve; er deu-lhi bom sém,

Quero à moda provençal


(versão em português moderno)

Quero à moda provençal quando deve; também deu-lhe bom senso,


fazer agora um cantar de amor, e desde então lhe fez pouco bem
e quererei muito aí louvar minha senhora impedindo que nenhuma outra fosse igual a
a quem honra nem formosura não faltam ela.
nem bondade; e mais vos direi sobre ela:
Deus a fez tão cheia de qualidades
que ela mais que todas do Porque em minha senhora nunca Deus pôs
mundo. mal,
mas pôs nela honra e beleza e mérito
e capacidade de falar bem, e de rir melhor
Pois Deus quis fazer minha senhora de tal que outra mulher também é muito leal
modo e por isto não sei hoje quem
quando a fez, que a fez conhecedora de possa cabalmente falar no seu próprio bem
todo bem e de muito grande valor, pois não há outro bem, para além do seu.
e além de tudo isto é muito sociável
As cantigas de escárnio e cantigas de maldizer

As cantigas de escárnio e maldizer eram escritas com o objetivo de satirizar a sociedade medieval.
No primeiro tipo, fazia-se referência indireta à pessoa satirizada; no segundo, os trovadores
atacam explicitamente os maus jograis, os cavaleiros fracos, as esposas e fazem a denúncia dos
possíveis casos amorosos. De acordo com um manuscrito arquivado na Biblioteca de Lisboa, as
cantigas de maldizer são “aquelas que os trovadores fazem querendo dizer mal de alguém e o
fazem por palavras cobertas”.

Ai dona feia! Foste-vos queixar


Porque nunca vos louvo em meu trovar
Mas agora quero fazer um cantar
Em que vos louvarei para sempre
E vede como vos quero louvar:
- dona feia, velha e maluca!

Cantigas de Santa Maria

As cantigas de Santa Maria são um conjunto de poesias feitas em honra à Maria, mãe de Jesus.
Este cancioneiro contém cerca de quatrocentas composições e foram feitas na corte de D. Afonso
X, o sábio. Nas cantigas, são relatados episódios da vida mariana e milagres atribuídos à Maria.
Sobre a estrutura dos poemas, o português Arlindo Correia, estudioso das cantigas de Santa Maria,
afirma, em seu site que

Além disso, cada Cantiga é precedida nos códices por uma


didascália1 que pelo resumo do conteúdo, pela explanação do milagre
e, em alguns casos, pela atribuição às Festas da Virgem ou ao ciclo de
Nosso Senhor Jesus Cristo, fornecem – aqui com mais direta narração –
uma colocação no âmbito de uma festividade precisa e de um
verdadeiro e próprio ritual (por exemplo, a procissão).
Desta forma, se compreende a opção de organizar o espetáculo
em torno de uma espécie de calendário mariano: partindo de uma
cantiga onde se dá graças ao Senhor pela criação do mundo, do céu e
das estrelas à festa do nascimento de Maria no mês de Setembro, da

1
Didascália - Explicação do autor sobre algum elemento do texto. Nos textos do gênero
dramático, indicam elementos de cena. Nos textos poéticos, podem informar a que se prestam
os textos. Na cantiga apresentada aqui, a didascália é a frase “Esta é de loor de Santa Maria”
(Esta é de louvor a Nossa Senhora).
festa da sua Virgindade, no mês de Dezembro, à Anunciação no Céu
com a procissão de 15 de Agosto e assim por diante.

Virgen Madre groriosa


(Festa da Virgem 2)
Esta é de loor de Santa Maria.

Virgen Madre groriosa, nen quen osmar poderia


de Deus filla e esposa, teu ben e ta gran mesura?
santa, nobre, preciosa, Ca sempre en ty atura
quen te loar saberia Deus a luz ond’ es tu alva.
ou podia? Virgen Madre groriosa...

Ca Deus que é lum’ e dia, Tu es alva per que visto


segund’ a nossa natura foi o sol, que éste Cristo,
non viramos sa figura que o mund’ ouve conquisto
senon por ti, que fust’ alva. e sacado du jazia
Virgen Madre groriosa... e jaria,
e de que non sairya;
Tu es alva dos alvores, mais Deus por ti da altura
que faze-los peccadores quis de ti, sa creatura,
que vejan os seus errores nacer, e fez de ti alva.
e connoscan sa folia, Virgen Madre groriosa...
que desvia
d’aver om’ o que devia, Tu es alva dos que creen
que perdeu por sa loucura e lume dos que non veen
Eva, que tu, Virgen pura, a Deus, e que por mal ten
cobraste porque es alva. o ben per sa bavequia
Virgen Madre groriosa... d’eresia,
que é maa ousadia,
Tu es alva dos mesqos, e Deus non á destes cura;
que non erren os camos, mais pela ta gran cordura
a grandes, a pequenos; lles dás lume come alva.
ca tu iles mostras a via Virgen Madre groriosa...
per que ya
o teu Fillo todavia, Tu es alva que pareces
que nos sacou da escura ante Deus e escrareces
carreira maa e dura os ceos, e que mereces
per ti que es nossa alva. d’averes sa conpania.
Virgen Madre groriosa... E querria
t’ eu ver con el, ca seria
Tu es alva dos culpados, quito de maa ventura
que cegos por seus e metudo na folgura
pecados eran; mais u es con Deus, u es alva.
alumeados Virgen Madre groriosa...
son per ti, Santa Maria.
Quen diria,
A decadência da poesia trovadoresca

O Trovadorismo desenvolveu-se mais fortemente durante os séculos XII e XIII. A partir do século
XIV, a música começou a ser separada da poesia e os jograis começaram a desaparecer. A poesia
passava, então, a ser escrita apenas para a leitura sem execução musical.

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