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MUNICIPALIZAÇÃO DOS SERVIÇOS DE ILUMINAÇÃO PÚBLICA

SP, 19/1/2015

Encerrou-se em 31 de dezembro de 2014 o prazo previsto no


art. 218, §§ 3º e 4º, inc. VI, da Resolução nº 414/2010, concedido pela Agência
Nacional de Energia Elétrica (Aneel), para que todas as concessionárias de
energia elétrica concluam, sem ônus, a transferência aos Municípios do siste-
ma de iluminação pública de forma a permitir que a prestação dos serviços de
iluminação pública sejam realizados, doravante, pela Comuna.
De acordo com a disciplina assentada no referido dispositivo
regulamentar, os Municípios receberão o parque de iluminação pública, fato
que implicará que a gestão, manutenção e administração dos serviços de ilumi-
nação pública sejam realizadas pelo ente municipal, sem interferência da
concessionária local, cuja função será apenas e tão somente fornecer a
energia elétrica necessária para o funcionamento dos equipamentos
trespassados. Em relação ao patrimônio a ser transferido ao Município,
verificam-se o relé fotoelétrico (necessário para propiciar o acendimento
automático da lâmpada); braço; reator; cúpula ou luminária; soquete e
lâmpada. Grife-se que o poste não é objeto de transferência, salvo se ele for
específico para iluminação (poste ornado, por exemplo).
Acerca das novas funções a serem desempenhadas pela Ad-
ministração Pública Municipal, destaca o advogado Alfredo Gioielli: “gestão,
manutenção de todo sistema de distribuição, atendimento, operação e reposi-
ção de lâmpadas, suportes, chaves, troca de luminárias, reatores, relés, cabos
condutores, braços e materiais de fixação e conexões elétricas” (Munici-
palização de iluminação pública pela Aneel é ilegal. Disponível em:
<http://http://www.conjur.com.br/2013-mar-21/alfredo-gioielli-municipalizacao-
iluminacao-publica-aneel-ilegal>. Acesso em: 22 out. 2014).
Sem adentrar na polêmica relacionada à forma como ocorreu a
transferência do parque de iluminação pública à Comuna, verifica-se que a
determinação da Aneel repousa no fato de que os Municípios, conforme
estabelece o art. 30, inc. V, da CF/1988, detêm a atribuição de organizar e
prestar serviços públicos de interesse local, inserindo-se aí a iluminação
pública.
Em relação às benesses vislumbradas com tal transferência,
destaca-se que a municipalização dos serviços de iluminação pública poderá
gerar a prestação de serviços mais eficientes e planejados, haja vista o maior
controle da Administração na operação. Nesse sentido, grife-se que tal rapidez
na prestação de manutenção corretiva e preventiva do parque de iluminação
pública garantirá segurança à população, vez que os locais pouco ou sem ilu-
minação são os mais propensos para cometimento de crimes de toda sorte.
Demais disso, com a prestação de serviços públicos realizada pelo Município,
poderão ser implementadas medidas que garantam a redução de consumo da
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energia, gerando economia ao Erário, a exemplo da substituição das lâmpadas


incandescentes, que consomem mais energia elétrica, por lâmpadas do tipo
LED ou fluorescente, cujo consumo é reduzido. Outrossim, poderá, ainda, ser
substituída a matriz energética, dada a possibilidade do uso de energia solar e
eólica, em detrimento da elétrica, para a iluminação.
Preliminarmente à transferência do parque de iluminação públi-
ca pela concessionária de energia, deverá a Administração Pública planejar-se
em relação a tal recebimento, realizando, dentre outras providências, o levanta-
mento dos equipamentos já instalados e em operação, apontando-se as suas
condições físicas; o planejamento futuro de atuação na manutenção preventiva
e corretiva; a eleição da forma como serão prestados tais serviços: (1) se dire-
tamente, ou seja, pelo próprio Poder Público, fato que demandará a necessida-
de de aparelhamento da Administração; criação de órgão para gerir a execução
dos serviços, receber as ligações etc.; realização de concurso público para
contratação dos profissionais; aquisição de equipamentos e insumos por meio
de licitação; ou (2) indiretamente, por empresa contratada mediante licitação,
adoção de Parceria Público-Privada ou, ainda, por meio da participação de um
consórcio intermunicipal, cuja constituição é disciplinada pela Lei Federal nº
11.107/2005.
Nas tratativas a serem realizadas entre o Poder Público e a
concessionária, nessa oportunidade, devem os entes municipais questionar o
estado em que se encontram os bens a serem futuramente trespassados, não
devendo aceitá-los se eles estiverem sucateados ou sem que estejam
recebendo a correta manutenção ou produzidos em desconformidade com as
regras da ABNT. Grife-se que receber os bens nessas condições demandará a
substituição deles futuramente, fato que gerará prejuízo para os cofres
públicos. O que se tem recomendado é que “O município deve condicionar a
transferência de ativos a que a concessionária de distribuição promova as ade-
quações necessárias no parque de iluminação pública, deixando-as em condi-
ções normais de funcionamento” (GIOIELLI, Alfredo; KIRCHNER, Carlos
Augusto Ramos. Informações necessárias para a realização do plano de
transição de domínio da gestão da iluminação pública. Em:
<http://www.mpsp.mp.br/portal/page/portal/cao_cidadania/iluminacao_publica/
Manual de Boas Práticas na Transferência de Ativos de IP.pdf>. Acesso em: 22
out. 2014).
Em relação à celebração do termo de transferência do parque
de iluminação pública, tendo em vista que o competente ajuste não detém
cláusulas-padrão, deve a Administração questionar os termos propostos pela
concessionária de energia elétrica, devendo ser rechaçadas cláusulas que o
Poder Público entender serem abusivas, uma vez ser necessário garantir um
ajuste equânime entre a partes, bem como afastar qualquer tipo de prejuízo
para o interesse público.
Atuando de forma planejada, sempre com apoio da concessio-
nária de energia elétrica, que deverá prestar, quando necessário, as informa-
ções pertinentes nesta fase de transição, evita-se a judicialização da transfe-
rência do parque de iluminação pública, de modo a afastar qualquer tipo de
prejuízo à prestação desse serviço público.
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No que tange às obrigações da concessionária de energia


elétrica, vislumbra-se, dentre outras, a necessidade de encaminhamento de re-
latório analítico dos bens a serem transferidos, apontando-se, ainda, a situação
física destes, bem como qualquer outro dado solicitado pela Administração, ex
vi do teor contido no art. 218, § 7º, da resolução em destaque; a exigência de
transferência de equipamentos que observem as normas técnicas existentes; o
apoio no início da prestação de serviços pela Administração ou terceiro
contratado; a assistência técnica futura, haja vista a dependência na energia
elétrica da concessionária etc.
Em relação à Administração Pública, deverá ser elaborado pelo
setor competente um estudo de impacto orçamentário dos serviços a serem
realizados por pessoal próprio (execução direta) ou terceirizado (execução
indireta). No que tange à atuação do setor jurídico, este deverá, dentre outros
aspectos, analisar os termos da transferência do parque de iluminação pública,
com o consequente afastamento de cláusulas abusivas impostas pela
concessionária, assim como elaborar o termo de responsabilidade civil e
criminal das informações prestadas pela concessionária. Já o setor de enge-
nharia deverá elaborar laudo que descreverá o estado dos equipamentos, que
será cotejado futuramente com o relatório elaborado pela concessionária. O
exame deste relatório deve ser rigoroso, de forma a revestir a Administração da
segurança necessária quanto à sua verossimilhança, isto é, sua fidelidade em
relação à realidade dos equipamentos. Demais disso, deverá ser elaborado
pelo setor de engenharia um plano de execução dos serviços, termo de
referência ou projeto básico, em caso de execução indireta, haja vista que tais
documentos deverão constar do edital de licitação posteriormente. Por fim,
deverá o setor de meio ambiente elaborar um plano de descarte das lâmpadas.
Grife-se que o recebimento do parque de iluminação pública
deverá ser realizado formalmente, mediante vistoria em todos os equipa-
mentos, devendo as impropriedades serem consignadas no documento, a fim
de serem objeto de reparação, em prazo a ser fixado pelo Poder Público, bem
como afastar futura responsabilização da Administração.
Diante da complexidade envolvida e volume de trabalho, veri-
fica-se que algumas Municipalidades processaram competente licitação com o
escopo de contratar um particular para realizar tais providências preliminares, a
fim de observar o prazo imposto pela Aneel.
Ante todo o exposto, portanto, para aqueles Municípios que
ainda não se organizaram para receber tal encargo, tomadas tais cautelas,
dentre outras, garante-se o regular trespasse do parque de iluminação públi-
ca, sem que ocorra solução de continuidade dos serviços públicos e, por
conseguinte, prejuízo ao interesse público.

Por Aniello dos Reis Parziale – Advogado, membro do Corpo Jurídico da NDJ

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