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Educação Física em Revista - EFR


2014, v. 8, n. 2, p. 48-56 Artigo Original

PRÁTICAS CORPORAIS HODIERNAS: UM OLHAR PELA


SOCIOLOGIA CONTEMPORÂNEA

Gabriel Bungenstab
Universidade Federal de Goiás
Contato: gabrielcarv@msn.com

RESUMO: O texto a seguir aponta algumas contribuições sobre os pensamentos dos


sociólogos Zygmunt Bauman e Michel Maffesoli. O diálogo entre esses dois pensadores
aponta caminhos a fim de refletir o que vem sendo a juventude contemporânea e a relação
que ela assume com o corpo e com as práticas corporais. Inserir esses dois sociólogos de
grande importância no cenário mundial para pensarmos a Educação Física e as práticas
corporais é uma aposta nova e que pode gerar outras reflexões e críticas acerca da nossa
área.

Palavras-chave: práticas corporais; educação física; sociologia; juventude.

Data de aceite: 09/2014


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INTRODUÇÃO A leitura que Bauman e Maffesoli


fazem da sociedade atual podem nos
A discussão sobre as práticas dar pistas sobre as novas
corporais juvenis na sociedade manifestações corporais juvenis que
hodierna é um tema sintomático para vem nascendo dentro das escolas e
ser debatido tanto no âmbito da nas ruas. Bauman realiza um
Educação Física como da Sociologia. diagnóstico enfatizado em uma
Na esteira de Carvalho (2010), sociedade do consumo, pautada pelo
entendemos as práticas corporais presente e pelas relações efêmeras. Já
como “modos de viver”, no sentido de Maffesoli prefere trabalhar com a ideia
que elas são componentes da cultura de que, hoje, os indivíduos (incluindo
corporal dos povos e estão associadas os jovens) se relacionam em grupos,
ao indivíduo em suas gestualidades, denominados pelo sociólogo francês de
movimentos e seus modos de se novas tribos, onde os indivíduos tem a
expressar corporalmente. O objetivo capacidade de poder se identificar com
deste artigo é refletir sobre as práticas vários grupos diferentes. Bauman é um
corporais juvenis na sociedade sociólogo bastante trabalhado no
contemporânea (pós-moderna) campo das práticas corporais e da
utilizando os pensamentos do corporeidade. Importantes obras na
sociólogo polonês Zygmunt Bauman e área que utilizam esse autor foram
do, também, sociólogo francês Michel escritas por Bracht, Almeida e Gomes
Maffesoli. (2012). Maffesoli, por sua vez, é mais
Sabe-se que o debate acerca da requerido no campo da sociologia,
modernidade/pós-modernidade é caro onde, as práticas corporais surgem
nos dias atuais. Diversos autores apenas de forma secundaria para se
contribuem para o debate, ora tratar o tema das formações de grupos
acreditando que a sociedade sofreu e do cotidiano juvenil, como visto em
modificações estruturais e ora Groppo (2009) e Magnani (2002).
acreditando que a sociedade ainda se Para entender a relação da
mantém na ordem da modernidade. juventude com as práticas corporais na
Mas o que se entende por sociedade atual acredito ser importante
modernidade e pós-modernidade? entender as mudanças que ocorreram
Segundo Giddens (1991, p. 11): na sociedade e como elas influenciam
o trato que a juventude dispensa às
Uma estonteante variedade práticas corporais nos dias de hoje.
de termos tem sido sugerida Entendo que Bauman e Maffesoli “dão
para essa transição, alguns pistas” e contribuem de forma
dos quais se referem significativa para pensarmos sobre as
positivamente a emergência transformações da sociedade (e do
de um novo tipo de sistema jovem). Os aspectos apontados por
social (tal como “sociedade eles irão compor e aprofundar uma
de informação” ou nova forma de viver e de se relacionar
“sociedade de consumo”), no contemporâneo, sobretudo, com as
mas cuja maioria sugere que, práticas corporais. Elenquei alguns
mais que um estado de aspectos discutidos por ambos os
coisas precedente, esta autores que acredito serem importantes
chegando a um para o desenvolvimento do presente
encerramento (“pós- trabalho, sobretudo no que tange à
modernidade”, “pós- contribuição bibliográfica acerca do
modernismo”, “sociedade tema.
pós-industrial”, e assim por
diante) Nesse sentido, trazer as ideias
desses dois sociólogos é interessante
para se pensar as práticas corporais no
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âmbito da educação física, tendo em ordem, comparando aquilo que se deve


vista que relacionar as novas ou não fazer, aquilo que se ganha e
interseções da sociedade atual perde, a fim de construir um futuro
(consumo, efemeridade, presenteismo seguro e racional.
e neotribalismo) é também entender
como os jovens hoje veem e se Já a socialidade, segundo o
relacionam com as práticas corporais, sociólogo polonês, é um processo no
tanto aquelas institucionalizadas (pela qual se vive totalmente do presente;
disciplina de educação física) quanto não tendo nenhuma biografia, ela
àquelas que são formuladas pelos acaba antes mesmo de construir algum
próprios jovens em suas ações tipo de história. É considerada como
cotidianas. Ao tratar dos jovens, Velho uma erupção, que surge
(2006) nos mostra que a juventude repentinamente, alcança seu auge e se
contemporânea é marcada por diversas desfaz de forma rápida e brusca. A
manifestações diferentes. Como por socialidade não possui uma finalidade
meio da musica nos seus diferentes em si, a não ser a de valorizar o “estar-
ritmos - como o funk, samba, hip hop - junto” de forma desinteressada e
os esportes – capoeira, lutas e partilhar o momento do “nós”. Bauman
esportes coletivos – e a tecnologia dão (1993) ressalta que a socialidade não
oportunidades para as mais tem poder de expansão e, pautada pela
diversificadas e flexíveis manifestações efemeridade, ela dá todas as condições
dos jovens. para que o sentimento de emoção
transborde sem cessar até o seu rápido
desaparecimento.
DISCUTINDO CONCEITOS ENTRE
BAUMAN E MAFFESOLI Como característica do social,
Maffesoli (2010) diz que o indivíduo
Tanto Bauman quanto Maffesoli podia ter uma função na sociedade,
realizam diagnósticos sobre o que vem convivendo enraizado a um partido ou
sendo a sociedade contemporânea. Os a um grupo estável. Já na socialidade,
dois autores discursam sobre o que o indivíduo daria lugar à pessoa que
seria a socialização (social) e a representa papéis nos diferentes
socialidade. Para Bauman (1993), a setores sociais de que participa; assim,
socialização é um processo controlável pautado pelos gostos, ela vai
(na modernidade, o Estado-Nação e as assumindo seu lugar em diferentes
instituições eram as controladoras), em neotribos e grupos específicos. Para o
prol da reprodução e buscando atribuir sociólogo francês (2009, p. 100):
uma identidade aos sujeitos dentro de
um grupo específico, ou seja, ela Ao social correspondem a
classificava e determinava o espaço e solidariedade mecânica, o
a função que cada sujeito instrumental, o projeto, a
desempenhava na sociedade. Isso racionalidade e a finalidade;
garantiu a estrutura do Estado a socialidade, correspondem
moderno. a solidariedade orgânica, a
Assim, os acontecimentos dimensão simbólica
caminhavam junto com a probabilidade, (comunicação), o não lógico,
sujeita a padrões, critérios e pautada a preocupação com o
no racionalismo da vida cotidiana. A presente. Ao drama sucede o
socialização visa ao tempo futuro. trágico, aquilo que é vivido
Bauman (1993, p. 149) demonstra que em si mesmo sem rejeição
“[...] a socialização pode ser analisada, as contradições.
desconjuntada em fases e atos
constitutivos, em realizações parciais e Maffesoli (2004) acredita que a
funções complementares [...]”. A socialidade é o que está na ordem do
socialização constrói e determina certa dia no contemporâneo. Ela é bem
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diferente da simples sociabilidade dizendo que a profundidade pode estar


(socialização) considerada como um oculta na aparência. Em muitos
enfeite de importância mínima na momentos a aparência, para ele, é
estrutura das relações sociais. Faz vetor de agregação, de sentimento
sentido, para o autor, trabalhar com a estético e de reconhecimento. Sendo
ideia de estética, a fim de compreender assim, a visão que Maffesoli postula é,
esses fenômenos de sentimentos e de fato, mais positiva quando
experiências partilhadas que ocorrem comparado à Bauman. Viver o
no seio das socialidades. Entendendo presente, usufruindo de diferentes
que estética, para Maffesoli (1996), é a papéis dentro dos mais diversos
faculdade comum de sentir, de lugares é o que da liga as neotribos. A
experimentar, o que importa na importância está em usufruir o presente
socialidade não é o reconhecimento em de uma forma coletiva. Bauman parece
determinado projeto político; sua razão entender que o “eu” individual se
é simplesmente o presente vivido encontra com o “nós” grupal, no
coletivamente, em grupo. entanto, essa relação, na sua visão, é
pautada pelo consumismo. O indivíduo
Bauman diz (1993, p.149) que “A deve ter como principal cuidado,
diferença mais notável é a diferença
entre o fato de a socialização ter um [...] a capacidade de
propósito e o fato do desinteresse da aproveitar a oportunidade
socialidade”. Já Maffesoli diz (1987, p. quando ela se apresentar; a
133) que “Nunca será demais insistir: a desenvolver novos desejos
autenticidade dramática do social feitos sob medida para as
corresponde à trágica superficialidade novas, nunca vistas e
da socialidade”. Para Bauman, a inesperadas seduções; e a
presença de propósito na socialização não permitir que as
gera a construção e manutenção da necessidades estabelecidas
ordem, visando o projeto futuro e tornem as novas sensações
calculando as ações que devam ou não dispensáveis ou restrinjam
ser realizadas. Ele ainda analisa o nossa capacidade de
desinteresse da socialidade, de uma absorve-las e experimenta-
forma crítica, dizendo que a mesma, las (BAUMAN, 2001, p.91)
por não possuir nenhum propósito e
nenhum projeto futuro, se encerra ao O cuidado em não estabelecer
passo que o grupo e as relações nenhuma relação fixa e concreta com
(estéticas) cessam: qualquer grupo específico é o que gera
as inúmeras possibilidades de
Socialidade instantânea da experimentação, por exemplo, dentro
multidão é uma contra- dos muros escolares. No entanto,
estrutura para a estrutura da “saber que não estamos sós e que
socialização. Num só nossas aspirações pessoais são
momento glorioso de compartilhadas por outros pode conferir
“descarga”, ela anula anos segurança” (BAUMAN, 2003, p.60).
(talvez séculos) de Ainda assim, o autor fala que esses
elaboração paciente. Não vínculos gerados não podem ser
tem nenhuma estrutura irrevogáveis e muito menos impedir
própria; rumina nos entulhos escolhas pessoais diferenciadas e
da estrutura que acabou de singulares. O grupo deve manter a
explodir – a única estrutura noção de que suas portas estarão
que a “sociedade” conhece. sempre abertas para entradas e saídas
(BAUMAN, 1993, p.151) espontâneas. Parece que, para
Bauman, a relação do indivíduo com o
Já Maffesoli (1996) dá destaque grupo, ocorre, mas a mesma sempre
para a superficialidade da socialidade, acaba retornando ao indivíduo único,
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consumidor, sozinho e inseguro. Já transformações que ocorrem na


Maffesoli, desconsidera qualquer sociedade, agindo de forma dialética.
atividade na qual o individualismo seja Para Groppo (2004) a juventude é uma
o centro. Ele mesmo ressalta que realidade social e não uma mistificação
essas inúmeras discussões acerca da ideológica. Desse modo, é preciso
sociedade individualizada (e aqui relacionar a juventude com outras
podemos incluir Bauman) não passam categorias sociais como: a classe
de pensamentos de figurino e: social, etnia, raça, religião e condição
urbana. Assim, segundo Groppo (2004,
A menos que sirvam para p. 12): “[...] ao analisar as juventudes
exprimir a profunda confusão concretas, é preciso fazer o
de intelectuais que não cruzamento da juventude – como
compreendem mais nada da categoria social – com outras
sociedade que é sua razão categorias sociais e condicionantes
de ser, e dessa maneira históricos”. A partir disso, Groppo vai
tentem devolver-lhe o defender a ideia de que há uma
sentido, em termos condição juvenil mais ou menos geral
adequados ao campo moral que, dialeticamente, resulta na criação
e/ou político no qual de diferentes grupos juvenis.
excelem. Não pretendo voltar
Nesse sentido, devemos
a esse combate de
considerar que a condição da
retaguarda. Basta indicar
juventude está ligada a construção da
ainda, que de maneira um
história do homem, ou seja, a produção
pouco peremptória, como a
da vida humana. Considerar a
experiência do outro
juventude em seus aspectos naturais
fundamenta a comunidade,
(geracional) e também sócio-culturais
mesmo que ela seja
(classista, moratória social,
conflitual. (MAFFESOLI,
protagonismo) é interessante para
1987, p.102)
refletirmos a juventude na sociedade
brasileira atual. É certo que hoje
Parece então, que para este
podemos demarcar a juventude
autor, o processo ocorre de forma
brasileira sob um viés geracional,
inversa se o compararmos a Bauman.
considerando-a como uma etapa da
Aqui, a importância está menos no
vida, baseada pelas experiências, por
indivíduo e mais no grupo. A relação
transformações biológicas e pela
aparece de forma coletiva e ela nunca
locação social que está inserida. Pais
retorna para o indivíduo, como defende
(2009) e Mannheim (1973) foram
Bauman. Maffesoli acredita que o
pesquisadores que descreveram bem a
processo vai de um grupo (neotribo) a
ideia da juventude geracional, mas que
outro grupo. Ou seja, o indivíduo tem a
também é marcada por influências
capacidade, por meio da identificação,
sociais e culturais.
das máscaras e dos papeis de circular
de um grupo ao outro, mas nunca
Pensando na juventude,
voltando para o “eu” individual isolado.
podemos dizer que, por um lado, há
uma tendência de que as relações
juvenis passem – na modernidade
ALGUMAS IMPLICAÇÕES PARA O
líquida – a se caracterizar com um alto
CONCEITO DE JUVENTUDE
índice de insegurança e ansiedade,
gerando, por consequência, falta de
De acordo com Groppo (2000, confiança perante o outro e certa
2004), a juventude tem que ser individualidade, ou seja, o jovem passa
pensada como categoria social e, a se preocupar mais com o “eu” do que
nesse sentido, a juventude acompanha, com o “nós” (BAUMAN, 2013). No
influencia e é influenciada pelas entanto, existe também a visão de que
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o jovem, imbuído de suas máscaras, ele, nasceu e vive num mundo


possa vivenciar melhor seus momentos totalmente diferente daquele vivido por
juvenis e criar, por meio disso, um gerações anteriores, Bauman (idem,
fortalecimento grupal e tribal. p.60) “[...] um mundo de emprego
Percebemos que as diferenças abundante, oportunidade
teóricas entre esses dois autores vai aparentemente infinitas de prazer, cada
constituindo modos de viver e um mais atraente que o outro e capaz
características sociais distintas, de multiplicar esses prazeres cada vez
inclusive para a juventude. Muito se diz mais sedutores [...]”.
que hoje os jovens vivem de forma Ao mesmo tempo, podemos
individual, à base do consumo e considerar que o jovem contemporâneo
criando relações superficiais e fluidas também necessita de uma relação
com os outros (BAUMAN, 2013). Não grupal (tribal) e que hoje as relações
se prendem a um determinado espaço estéticas e táteis estão na ordem do
e não se preocupam muito com o dia. Não importa se esse indivíduo irá
tempo futuro. Quanto mais rápido consumir ou realizar algo com alguma
esses jovens se movem, mais poder finalidade. A importância de estar-junto
eles adquirem. O conhecimento pode com outros vivenciando o presente e
ser um exemplo de poder, e sabemos compartilhando um forte sentimento em
que o conhecimento não é regalia comum é o que rege esses indivíduos
exclusiva da escola. Bauman diz que, atualmente. Parece que a ideia aqui é
demonstrar que o jovem pertence a
Hoje, não se espera nem se diferentes grupos e com distintos
pressupõe que os jovens papéis em cada um deles. Maffesoli
“estão em vias de se tornar (2005, p.13) prefere trabalhar com a
adultos como nós”; a ideia de juvenilismo:
tendência é vê-los como um
tipo diferente, que [...] a atitude ou a cultura
permanecerá diferente “de jovem, o “juvenilismo”, que
nós” por toda a vida. As com frequência se
discrepâncias entre “nós” (os estigmatiza nas sociedades
mais velhos) e “eles” (os contemporâneas, não está
mais novos) não nos limitado simplesmente a um
parecem mais corresponder problema geracional, mas a
a uma fase passageira e uma função contaminadora.
irritante, que tenderá A “eterna criança” é
fatalmente a se dissipar e a contemporaneamente uma
desaparecer à medida que figura emblemática, assim
eles amadureçam para as como foi o adulto sério,
realidades da vida. Os jovens racional, produtor e
sem duvida vão permanecer; reprodutor do século XIX
eles são irrevogáveis
(BAUMAN, 2010, p.20) Juvenilismo e função
contaminadora, para Maffesoli (2005),
Segundo Bauman (2010), esse representam uma ênfase e uma
indivíduo contemporâneo, sozinho, em exploração das características
frente ao seu computador ou ao celular marcadamente juvenis, como os
pode rapidamente se mover e se valores, as regras e a moda. O que
apropriar de conhecimentos que as importa, nessa visão é o sentimento de
gerações jovens anteriores não tiveram pertença que predomina fortemente no
a oportunidade (e se tiveram, o ideal comunitário. Cremos que em
processo se deu muitos mais determinados ambientes e momentos o
lentamente). Bauman (2010) chama de jovem possa vivenciar uma dessas
geração Y aqueles que, hoje, possuem características com mais ênfase do que
entre 11 e 28 anos. Essa geração, para a outra. Abramo (2005, p.44) diz que;
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“Agora a pergunta é menos sobre a espaços podem ser lugares oportunos


possibilidade ou impossibilidade de para se reformular novas práticas e
viver a juventude, e mais sobre os saberes, agregando aspectos da
diferentes modos como tal condição é cultura corporal que os jovens trazem
ou pode ser vivida”. A escola assim dos espaços de fora da escola.
pode ser um espaço onde prevaleça Ao tratar da relação dos esportes
uma delas ou onde há uma alternância radicais (ER) com a educação física
das mesmas. escolar, Ambrust e Silva (2012)
destacam a importância de considerar
essas práticas corporais, oriundas de
APONTANDO NOVOS CAMINHOS ambientes urbanos e naturais, como
NA RELAÇÃO ENTRE A JUVENTUDE conteúdos dentro do espaço escolar.
E AS PRÁTICAS CORPORAIS Eles dizem:

Acredito que os pensamentos de Os ER, mesmo aqueles


Bauman e Maffesoli apresentados aqui, entendidos como individuais,
surgem no sentido de proporcionar um geralmente são praticados
novo caminho para se pensar a em companhia de alguém.
juventude na sociedade atual. E é a Podemos ver pessoas
partir dele que também podemos sozinhas em cima de um
discutir relações que a juventude tece skate, mas dificilmente se
com algumas manifestações encontra desacompanhado
relacionadas às práticas corporais. de outros skatistas. Os ER
Como bem ressalta Velho (2006, p. costumam promover um
198): “A conjunção de esporte, música convívio interpessoal visto
e novas formas de sociabilidade tem como fundamental já que
permitido, como já foi sugerido, maior aumenta a motivação do
contato entre pessoas de origens e grupo e confere a agradável
meios sociais bastante diferentes.”. É sensação de pertencer a algo
nesse contexto que se deve conceituar que tem significados
o jovem com sua heterogeneidade e compartilhados. (AMBRUST
dinamismo, pensando no jovem de hoje E SILVA, 2012, P. 296)
como um ator social que vive o entorno
dessa sociedade fluida e flexível. Vemos, por meio do estudo
desses dois autores, como a relação do
Como pensar o jovem, por individual e do grupal (neotribal)
exemplo, dentro do cenário escolar de assume importância quando pensada
ensino médio e sua relação com a junto às práticas corporais. É nesse
educação física, levando em sentido que os pensamentos de
consideração os aspectos da Bauman e Maffesoli podem dar
individualidade, das máscaras, das contribuições valiosas para o
neotribos, do presenteismo e das entendimento de juventude
relações fluidas e flexíveis? Como contemporânea e da relação que ela
entender as mais diferentes assume com o corpo, com a educação
manifestações corporais e esportivas física e com as práticas corporais fora
que os jovens levam para o universo da da escola. Inserir esses dois sociólogos
escola? Até que ponto dar importância de grande importância no cenário
para os grupos, ou as famosas mundial para pensarmos a Educação
panelinhas de jovens que se criam Física e as práticas corporais é uma
dentro da aula de Educação Física? aposta nova e que pode gerar outras
Cachorro et al. (2010) dizem que as reflexões e críticas acerca da nossa
práticas corporais ainda são pouco área, tanto dentro quanto fora da
exploradas, principalmente quando são escola.
tratadas como campos de estudo nas Podemos pensar, também, como
aulas de Educação Física. Esses bem ressalta Bassani, Torri e Vaz
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(2013), que as práticas corporais ainda Escolar. Movimento (UFRGS.


são vistas pelos jovens como Impresso), 2012.
mecanismos de elevação do seu status
social, representando todo um discurso BAUMAN, Zygmunt. Modernidade
de autosuperação, de progressos Líquida. Rio de Janeiro: J. Zahar,
corporais e de busca do sucesso. 2001.
Nesse sentido, as influências do
consumo e dos grupos nos quais os ______. Comunidade: a busca por
jovens participam se tornam segurança no mundo atual. Rio de
instrumentos importantes de análise. O Janeiro: J. Zahar, 2003.
consumo de materiais esportivos _______. Ética da pós-modernidade.
demonstra que para o jovem se sentir São Paulo: Paulus, 1993.
realmente um praticante de alguma _______. 44 cartas do mundo líquido
atividade física ele precisa consumir moderno. Rio de Janeiro: J. Zahar,
todos os acessórios necessários para 2010.
aquela prática (tênis, roupas e etc).
Além de melhorar seu desempenho, o BASSANI, J. J; TORRI, D; VAZ, A, F.
consumo desses materiais promulga a Sobre a presença do esporte na
ideia de que o jovem está “antenado” e escola: paradoxos e ambiguidades.
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cotidiano, seja praticando (como atleta
ou lazer) ou consumindo essas práticas CACHORRO, G. A; CÉSARO, A. R;
(se vestindo como atletas se vestem). SCARNATTO, M; VILLAGRÁN, J. B. La
Por fim, torna-se interessante ciudad, los jovenes y el campo de las
realizar pesquisas futuras com o intuito practicas corporales. Revista
de enxergar, empiricamente, como os Brasileira de Ciencias do Esporte,
jovens se relacionam com as práticas Campinas, v. 31, n. 3, p. 43-58, maio
corporais institucionalizadas (aulas de 2010. Disponível em:
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em relação às práticas corporais ex.php/RBCE/article/view/923/526.
vivenciadas pelos jovens atualmente? Acesso em: 22 set. 2012
Será que é o seu aspecto consumista
(promulgando em sua maioria pela CARVALHO, Y. As práticas corporais
mídia) ou a influência que os grupos como práticas de saúde e de
exercem sobre seus jovens cuidado no contexto da promoção
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