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A FORMAÇÃO DO PROFESSOR COMO MEDIADOR DA LEITURA

Autora: Rosangela Cabral Moraes Seguro1

Orientadora: Elisiani Vitória Tiepolo2

Resumo: A falta de leitura e o desinteresse por ela podem ser ocasionados pela influência das novas
tecnologias. Com base nesta premissa, os professores, em suas práticas pedagógicas, devem usar
as ferramentas digitais como aliadas. Muitas vezes, não há incentivo do ato de ler na família que,
apesar de reconhecer a importância da leitura, não dá a ela o seu devido valor. Mas não podemos
negar que, infelizmente, o desprazer pela leitura é reforçado, principalmente, na própria escola, que a
trata de maneira obrigatória e desagradável, afastando os alunos, cada vez mais, do prazer e,
consequentemente, da prática leitora. É, portanto, tarefa urgente, buscar diferentes maneiras de
estimular os estudantes de forma que, conscientes de sua importância, façam da leitura uma
necessidade para a sua vida, pois, sem ela, um indivíduo não consegue sobreviver numa sociedade
letrada, competitiva e excludente como a da atualidade. Compreende-se que o ato de ler, por si só,
não basta, é preciso despertar no educando o gosto pela leitura. E para que isso aconteça, é
necessário que o professor seja um leitor de fato e esteja disposto e preparado para estimular e
mediar a leitura, através de situações significativas.

Palavras-Chave: Formação. Leitura. Mediador de leitura.

Percebe-se que o mundo globalizado vem afastando, cada vez mais, os


alunos da literatura. As novas tecnologias, o acesso limitado à leitura na família
(onde pouco ou nada se lê), a falta de incentivo e outras atividades que os jovens
desempenham têm ocasionado pouco interesse pelo ato de ler. Essa deficiência tem
ocasionado dificuldades de aprendizagem, tais como: vocabulário reduzido, pobre e
informal, dificuldade de interpretação, graves erros ortográficos e produções textuais
incoerentes e improdutivas. Além disso, a falta de leitura empobrece a criticidade e a
criatividade, reduzindo a visão de mundo ao senso comum.
O fato de a leitura já não assumir tanta importância na vida dos brasileiros
pode ser comprovado através da pesquisa Retratos da Leitura no Brasil, realizada
em 2011, em âmbito nacional (315 municípios mais o Distrito Federal), pelo Instituto
Pró-Livro, cujo objetivo foi diagnosticar e medir o comportamento leitor do brasileiro,
especialmente em relação aos livros. Foram entrevistadas 5012 pessoas, com 5
anos de idade ou mais, independente de serem alfabetizadas.

1
Professora PDE 2012, com Graduação em Letras – Português/Inglês e Especialização em Metodologias para o
Ensino de 1º e 2º Grau. Atua na Rede Publica de Ensino do Estado do Paraná, no Colégio Estadual
Desembargador Clotário Portugal, em Campo Largo.
2
Professora da UFPR – Setor Litoral, Mestre em Literatura Brasileira pela UFPR.
Partindo do pressuposto teórico de que o professor deve ser o principal
promotor de leitura e formador do público leitor, Silva (2003), afirma que cabe ao
educador a responsabilidade de despertar o desejo de ler nos alunos, porém isso
não pode ficar apenas no desejo. Ele deve conduzir os estudantes para as
competências do “ler bem” para que eles passem a “ler muito” ao longo de sua vida.
Ezequiel Theodoro da Silva também afirma que a escola tem mais
responsabilidade na formação leitora das crianças do que a família, quando diz:

Ainda que a Constituição Federal de 1988 diga que a educação da criança é


uma responsabilidade da família e da escola, pode-se afirmar que, hoje em
dia, com pai e mãe trabalhando fora do lar, o tempo educativo maior reside
na escola, até mesmo com um crescente repasse para esta de várias
responsabilidades pedagógicas que classicamente ocorriam no âmbito
familiar. Daí a necessidade de o espaço escolar apresentar uma
ambientação rica para a produção da leitura, além de exemplos de
situações através das quais as crianças possam sentir o real valor do ato de
ler na vida das pessoas. (SILVA, 2003, p. 49)

A leitura direciona os estudantes à descoberta de sua identidade e ao


exercício de comunicação, sugerindo experiências que são indispensáveis ao
desenvolvimento integral do ser humano.
Tornando-se um bom leitor, o aluno terá mais acesso às informações,
podendo exercer, com mais ênfase, sua cidadania e alcançar as competências
necessárias a uma vida de qualidade, produtiva e com realização. Nesse contexto,
Demo (2003, p. 149) relata: “Uma sociedade que não questiona e, sobretudo, não se
questiona, jamais muda de elite. Sem mudança de elite, não há desenvolvimento.”
Estamos vivendo num mundo repleto de inquietações, onde quase tudo é
influenciado pelas novas tecnologias, as quais nos levam ao imediatismo. Nessa
atmosfera tão acelerada que a vida cotidiana se encontra, a leitura tende a dar
espaço a outras necessidades mais urgentes e, supostamente, mais importantes.
Na procura de formarmos seres mais capazes de se reconhecerem e
conquistarem seu espaço na sociedade seria romântico se propuséssemos a nossos
alunos substituir o convívio do mundo virtual pela prática da leitura de livros. Assim,
percebe-se a necessidade de adotar uma práxis educacional que venha transformar
todos os recursos em práticas pedagógicas que se façam somar na formação dos
jovens.
Para Geraldi, o indivíduo dever ter uma vasta experiência em sua prática
leitora para se tornar um leitor de fato.
Não cremos que haja leitura qualitativa no leitor de um livro só. Escolhemos
um caminho que, respeitando os passos do aluno, permite que a quantidade
gere qualidade, não pela mera quantidade de livros lidos, mas pela
experiência de liberdade de ler utilizando-se de sua vivência para a
compreensão do que lê. (GERALDI, 2011, p. 112)

É, portanto, tarefa urgente buscar diferentes maneiras de estimular os


estudantes a tomarem gosto pela leitura, pois, sem ela, um indivíduo não consegue
sobreviver numa sociedade letrada, competitiva e excludente como a da atualidade.
De acordo com a Lei 9.394/96 – Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional – LDB, em seu Título I, Artigo 1°:

A educação abrange processos formativos que se desenvolvem na vida


familiar, na convivência humana, no trabalho, nas instituições de ensino e
pesquisa, nos movimentos sociais e organizações da sociedade civil e nas
manifestações culturais. (BRASIL, 1996)

Corroborando com a lei, podemos afirmar que a educação é um processo


contínuo que ocorre em diversos contextos sociais, ao longo da vida, possibilitando
a construção de novos saberes, o crescimento pessoal e o melhor relacionamento
do indivíduo com a sociedade, levando-o, assim, a exercer, de forma mais eficaz,
sua cidadania.
Para alcançar tal objetivo, é necessário que crianças e jovens sejam inseridos
no universo da leitura e, cabe à escola tal legado. Como consta nas Diretrizes
Curriculares da Educação Básica – DCEs:

É tarefa da escola possibilitar que seus alunos participem de diferentes


práticas sociais que utilizem a leitura, a escrita e a oralidade, com a
finalidade de inseri-los nas diversas esferas de interação. Se a escola
desconsiderar esse papel, o sujeito ficará à margem dos novos letramentos,
não conseguindo se constituir no âmbito de uma sociedade letrada.
(PARANÁ, 2008, p. 48)

Vera Maria Tieztmann Silva complementa:

Afinal, cabe-nos perguntar sobre as razões primeiras que devem orientar a


produção de leitores por meio da escola para a sociedade brasileira de hoje.
Sem uma leitura crítica das contradições geradoras da pobreza, miséria,
injustiça, violência social etc., acreditamos que o planejamento de qualquer
programa ou unidade de leitura, pelo professor ou pelo coletivo da escola,
estará fadado ao fracasso, mesmo porque, no processo, serão deixadas de
fora importantes dimensões que fazem a ponte entre ensino e vida, escola e
cidadania. (SILVA, 2003, p. 25)
Assim, o objetivo da leitura na escola é preparar um aluno que seja sujeito da
formação de sua própria história, crítico, reflexivo, pesquisador e que, através da
prática pedagógica, desenvolva competências e habilidades para atuar, de forma
consciente, na sociedade.
Há muito tempo, a escola tem ocupado grande espaço na vida das crianças e
dos jovens. Porém, se estudarmos sobre as escolas dos séculos anteriores,
perceberemos que eram totalmente diferentes das atuais. Segundo Silva (2009), as
salas de aula eram sombrias, apertadas e nada atrativas. As carteiras eram
incômodas e havia longas horas de estudo coletivo ou individual. Tanto os
professores, quanto os alunos eram, em sua grande maioria, homens e imperava a
austeridade, a opressão e a imposição, por parte dos mestres:

O que se vê é um clima de opressão e medo, um mundo masculino, rígido e


hierarquizado, onde professores severos impõem sua vontade usando de
autoritarismo e aplicando castigos corporais com ou sem motivo. (SILVA,
2009, p. 23)

Parafraseando Silva (2009), naquela escola, o aluno não podia dar sua
opinião, fazer uma crítica e, muitas vezes, não podia tirar suas dúvidas em relação
ao que lhe era ensinado. Só podia calar e obedecer, caso contrário, eram-lhe
aplicados castigos como ficar de joelhos sobre grãos de milho, dar bolos com a
palmatória ou desfilar nas ruas com orelhas de burro, seguido pelos olhares e vaias
das pessoas que por ali passavam.
Ainda de acordo com Silva (2009), nada se aprendia naquela escola
tradicional e conteudista. Sintaxe, geografia, álgebra, física, retórica, francês, lições
orais e escritas eram despejadas para os alunos sem muitas explicações. Não havia
estímulos ou prêmios, mas, sim, punição imediata para os alunos faltosos e para
aqueles que eram considerados incompetentes.
No poema “Minha Escola”, escrito pelo pernambucano Ascenso Ferreira,
citado por Silva (2009), pode-se observar o ambiente escolar sombrio e hostil
daquela época e como o aluno se sentia naquele espaço.
Durante muito tempo, o modelo de educação no Brasil era puramente
tradicional e, muitas vezes, não valorizava os alunos como seres humanos. Hoje, os
alunos conquistaram seu espaço na escola, ganharam mais liberdade de expressão
e respeito. Estão inseridos nos conteúdos das disciplinas do currículo, além das
matérias obrigatórias, conhecimentos que o aluno levará para sua vida. Além disso,
Aprende-se o respeito aos direitos das pessoas e a solidariedade entre os
povos, e também se aprende a refletir, a formar uma consciência crítica e a
ter coragem de expor e defender o próprio ponto de vista. Não é a isto que
chamamos formar o cidadão? (SILVA, 2009, p. 29)

Nas escolas atuais, essa práxis se dá, principalmente, através da leitura. De


acordo com as Diretrizes de Língua Portuguesa, podemos observar claramente esse
conceito:

[...] compreende-se a leitura como um ato dialógico, interlocutivo, que


envolve demandas sociais, históricas, políticas, econômicas, pedagógicas e
ideológicas de determinado momento. Ao ler, o indivíduo busca as suas
experiências, os seus conhecimentos prévios, a sua formação familiar,
religiosa, cultural, enfim, as várias vozes que o constituem. (PARANÁ, 2008,
p. 56)

Mediante essas considerações, podemos afirmar que um leitor se constrói ao


longo de sua história. Dessa forma, a leitura deve ser introduzida na vida da criança,
muito antes de sua alfabetização, isto é, desde o seu nascimento, ou até mesmo,
antes dele.
A instituição de ensino que a atualidade nos apresenta é um espaço diferente
daquela escola totalmente tradicional, conteudista, marcada por um regime severo
de disciplina. Nesse novo formato, segundo Silva (2009), o espaço escolar deve
propor-se a oferecer, ao aluno, um ambiente de aprendizagem que vai além do
curricular, onde se cultive os valores da humanidade, onde o planejamento possa
ser alterado, sempre que uma nova situação ocorra, ensinando-o a ser um
verdadeiro cidadão. A autora ainda nos afirma que, é a leitura a grande responsável
pela transformação da escola, principalmente, do aluno e, sempre que necessário,
devemos mudar nossa prática pedagógica, caso essa não esteja atingindo o objetivo
da leitura.

É preciso, então, que nós, professores, bibliotecários, coordenadores,


diretores de escola, sejamos capazes de rever continuamente nossa prática
com um olhar crítico, como aconselhou Paulo Freire. E é preciso, também,
que tenhamos a coragem de mudá-la, se com isso pudermos cumprir
melhor nossa tarefa de formar cidadãos deste país. (SILVA, 2009, p. 31)

Nesse sentido, é importante que tenhamos em mente que os alunos são


sujeitos que apresentam certo grau de experiência de vida e cabe ao professor levar
isso em consideração, quando realiza um planejamento de leitura. É o que nos
afirma Ezequiel Theodoro da Silva quando nos interroga:

Quem são os alunos para os quais devo planejar as minhas unidades de


leitura? Quais são os seus interesses? Quais são suas aspirações?
Dificuldades? Problemas? Qual o potencial desses alunos? O que eles já
sabem? O que já aprenderam nas séries anteriores? Quais os temas que
motivam essas crianças para a leitura? Onde e quando praticam a leitura?
Quais as competências que dominaram ao longo dos trajetos de leitura na
escola? (SILVA, 2003, p. 26)

É num ambiente de estímulo que as escolas devem trabalhar a prática


literária, porém, é preciso que os professores sejam verdadeiros promotores de
leitura, sendo leitores de fato, para formarem novos leitores, não apenas para a
escola, mas, principalmente, para a vida.

[...] o professor precisa atuar como mediador, provocando os alunos a


realizarem leituras significativas. Assim, o professor deve dar condições
para que o aluno atribua sentidos a sua leitura, visando a um sujeito crítico
e atuante nas práticas de letramento da sociedade. (PARANÁ, 2008, p. 71)

Para Ezequiel Theodoro da Silva os textos não funcionam sozinhos, é preciso


que haja alguém para intermediá-los, para que esses façam sentido na vida de
leitores em formação.

Nunca é tarde lembrar que uma seleção de textos, por melhor que seja, não
funciona por si mesma nos espaços escolares. Ela precisa do mediador –
professor (você!) para orientar de modo que o prazer e a fruição realmente
aconteçam durante as aventuras da leitura do grupo; de forma que o
material possa ser aproveitado ao máximo na situação de ensino-
aprendizagem, sem perder a sua capacidade de acender mais luzes para
compreensão da vida. (SILVA, 2003, p. 77)

De acordo com Tiepolo (2006), muito antes de entrar na escola, a criança


começa seu processo de alfabetização e oralidade através da leitura de livros feita
pelos pais ou alguém próximo, TV, propagandas, brinquedos pedagógicos, revistas,
computador, etc. Fato esse, que podemos também constatar nas Diretrizes
Curriculares:

Devemos lembrar que a criança, quando chega à escola, já domina a


oralidade, pois cresce ouvindo e falando a língua, seja por meio das
cantigas, das narrativas, dos causos contados no seu grupo social, do
diálogo dos falantes que a cercam ou até mesmo pelo rádio, TV e outras
mídias. (PARANÁ, 2008, p. 55)

Rildo Cosson, nos orienta:

[...] que o professor tome a literatura como uma experiência e não como um
conteúdo a ser avaliado. Desse modo, é a leitura literária feita pelo aluno
que está no centro do processo de ensino e aprendizagem, devendo a
avaliação buscar registrar seus avanços para ampliá-los e suas dificuldades
para superá-las. O professor não deve procurar pelas respostas certas, mas
sim pela interpretação a que o aluno chegou, como ele pensou aquilo. O
objetivo maior da avaliação é engajar o estudante na leitura literária e dividir
esse engajamento com o professor e os colegas – a comunidade de
leitores. (COSSON, 2011, p. 113).

A conotação positiva que antes se tinha da leitura, torna-se, com o passar dos
anos, negativa. O livro que era uma opção de lazer, sem vínculos com a escola,
passa a ter tonalidade do dever. Esse é o fator que mais interfere na formação do
leitor.
Para Geraldi (2011), vivemos em um sistema capitalista onde o que importa
em uma atividade, é o produto. Assim, excluiu-se, da grande maioria da população,
a leitura como prazer e somente alguns podem usufruir dela. E a escola, seguindo e
preparando os alunos para esse mesmo sistema, exclui de suas práticas, qualquer
atividade que não seja lucrativa.
Diante dessas considerações, Ezequiel Theodoro da Silva, constata:

Há que se buscar coerência entre os resultados pretendidos para o grupo


de estudantes e os instrumentos utilizados na avaliação. Há que se ter um
cuidado especial na verificação do domínio de competências, no
desenvolvimento do repertório de leitura, no aprimoramento do gosto, na
pesquisa de novos autores etc. Há que se adequar os instrumentos com as
finalidades buscadas através das unidades de leitura. Sem tal adequação, é
mais do que provável o surgimento de insatisfação e, ao mesmo tempo, a
tendência de se tomar a leitura como uma tarefa estafante, sem pé nem
cabeça, que cada professor cobra como quer, mesmo por inexistir um
quadro teórico de suporte para o desenvolvimento das atividades. (SILVA,
2003, p. 32)

De acordo com essa mesma linha de pensamento, Maria (2002, p. 33), afirma
que: “Mais que ensinar, é preciso apenas que o professor não impeça a criança de
aprender, que não deixe que se perca, no cotidiano escolar, a curiosidade natural
das crianças.” Se seguirmos pelo caminho da imposição e do autoritarismo, o que
ensinaremos para nossos jovens será uma leitura falida e inoperante. Não há
educação no silêncio, na imposição de fórmulas prontas, na repetição mecânica, no
hábito conservador e oposto ao progresso. Se agirmos dessa maneira, afastaremos
o aluno do mundo letrado.
O especialista em leitura, Ezequiel Theodoro da Silva (2003, p. 57), nos leva a
analisar o que a gramática representa para a literatura: “[...] os textos literários não
foram escritos para ser dissecados pela gramática, mas sim para mover a fantasia
dos leitores e aumentar a sua sensibilidade para uma melhor compreensão da vida
social.”
Seguindo essa premissa, percebemos que não podemos formar leitores
através de atividades impostas, mecânicas e repetitivas:

Há também que se discutir o desejo da escola em criar hábito de leitura.


Isso porque ninguém se faz leitor mecanicamente, como pressupõe a ideia
de hábito, mas movido pela vontade, pelo desejo. A cada ação mecânica da
escola em direção à leitura, o aluno reage se afastando dela, pois se nos foi
possível criar hábitos como escovar os dentes, dormir no mesmo horário e
tomar banho por imposição de uma autoridade que nos obrigava a repeti-
los, certamente essa metodologia não se aplica à leitura, uma atividade que
exige operações cognitivas de ordem superior [...]. (TIEPOLO, 2006, p. 8)

Luzia de Maria (2002) nos instiga a organizar nossas ações de modo a


educarmos os estudantes não para a submissão, para a obediência cega e servil;
mas para a formação de cidadãos livres, capazes de defender seus direitos, porém
conscientes de seus deveres.
Na sociedade contemporânea, o que também prejudica a formação do leitor é
a globalização. Nesse sentido, Vera Maria Tieztmann Silva relata:

Outro fator é o cultural, resultado da época em que vivemos, cercados por


bombardeio constante de sons e de imagens. Para o comodismo de hoje,
com jovens habituados ao imediatismo das imagens trazidas
instantaneamente às telas da televisão, dos computadores e dos jogos
eletrônicos, os livros de aventuras que seduziam a imaginação de seus pais
e avós parecem fastidiosos de tão longos. O fôlego de nossos jovens anda
muito curto, sua paciência também. As diversões eletrônicas, os shopping
centers, a vida noturna, a prática de esportes, a malhação nas academias
são atividades que encurtam o tempo que poderia ser despendido com uma
leitura de prazer. Na rotina de boa parte dos adolescentes sobra, então,
apenas o espaço da leitura como dever, prescrita pela escola. É com essa
limitação que temos de enfrentar o problema de como propiciar no
adolescente escolar um passaporte de leitura para a vida adulta. (SILVA,
2009, p. 38-9)
Porém, não podemos excluir da nossa leitura, a esfera digital que, de acordo
com as DCEs, é uma nova maneira de ler. Esse tipo de leitura exige um leitor
dinâmico, ativo, capaz de selecionar quantitativamente e qualitativamente as
informações, visto que ele escolhe o caminho, o percurso da leitura. Assim, cabe à
escola, preparar o aluno para essa modalidade de leitura.
Na visão de Mikhail Bakhtin, todas as esferas sociais estão relacionadas com
a utilização da língua. É o que podemos constatar quando ele afirma:

Todas as esferas da atividade humana, por mais variadas que sejam, estão
sempre relacionadas com a língua. Não é de surpreender que o caráter e os
modos dessa utilização sejam tão variados como as próprias esferas da
atividade humana, o que não contradiz a unidade nacional de uma língua. A
utilização da língua efetua-se em forma de enunciados (orais e escritos),
concretos e únicos, que emanam dos integrantes duma ou doutra esfera da
atividade humana. (BAKHTIN, 2000, p. 279)

Nesse contexto, não devemos negar a leitura digital na esfera social, mas sim
adequá-la a fim de que traga, aos nossos estudantes, mais capacidade
argumentativa. Espera-se que, ao fazer uso das tecnologias ocorram, na vida das
pessoas, mudanças positivas e que, sendo um ambiente social, novos caminhos
sejam abertos, que ocorra a participação, interação e publicação de ideias.
Diante dessas considerações, concluímos que devemos fazer com que as
ferramentas digitais contribuam, de forma significativa na formação e na educação
de nossos jovens. E cabe à escola fazer com que os alunos-leitores superem as
expectativas do domínio da leitura, e que, através de suas práticas leitoras,
interajam com os suportes de difusão de informação, de forma democrática, como
direito de todos.
No entanto, há muita contradição entre o mundo globalizado e nossa
realidade, pois conforme consta nas Diretrizes Curriculares de Língua Portuguesa:

Refletir sobre o ensino da Língua e da Literatura implica pensar também as


contradições, as diferenças e os paradoxos do quadro complexo da
contemporaneidade. Mesmo vivendo numa época denominada “era da
informação”, a qual possibilita acesso rápido à leitura de uma gama
imensurável de informações, convivemos com o índice crescente de
analfabetismo funcional, e os resultados das avaliações educacionais
revelam baixo desempenho do aluno em relação à compreensão dos textos
que lê. (PARANÁ, 2008, p. 48)
De acordo com Maria (2002, p. 17), os analfabetos funcionais “São aquelas
pessoas que, ao deixarem a escola, perderam o convívio com a leitura e a escrita e,
embora tenham aprendido a ler e a escrever, com o tempo, foram-se tornando
incapazes de fazê-lo.” A autora ainda levanta a questão de que o analfabetismo
funcional é consequência do avanço da sociedade:

No mundo contemporâneo, o conceito de alfabetização não se vincula mais


à simples ideia de codificação e decodificação de signos, atividade
puramente mecânica. Numa sociedade informatizada, a economia
fundamenta-se, cada vez mais, nos setores terciários e quaternários,
crescendo, portanto, as exigências quanto à formação. Com a introdução de
novas tecnologias, trabalhadores antes considerados competentes e
eficazes vão sendo desvalorizados por não serem capazes de se adaptar à
nova realidade: seus conhecimentos de leitura e escrita são insuficientes
para que atualizem, por si sós, suas informações acerca do
desenvolvimento tecnológico. (MARIA, 2002, p. 18)

Ainda sob essa perspectiva, a autora nos leva a refletir que não faz tanto
tempo que a condição para o indivíduo ser considerado alfabetizado, limitava-se ao
ensino das primeiras letras e que soubesse “desenhar” seu próprio nome. Hoje,
porém, isso não é o suficiente:

Empresas contemporâneas necessitam de profissionais que tenham ótimo


desempenho de leitura, não apenas para que sejam capazes de ler e
decodificar manuais de instruções de máquinas sofisticadas; necessitam de
pessoas que não se limitem à execução passiva de normas e atitudes
mecânicas, mas que saibam pensar, interagir com situações novas
habilmente tomar decisões. Isto significa pessoas que tenham bom nível de
leitura geral, o que implica, sem dúvida, razoável leitura de mundo,
informação generalizada de questões contemporâneas e domínio de
habilidades que permitam, a esse profissional, construir e reconstruir
autodidatamente o seu saber. (MARIA, 2002, p. 20)

Quando nos remetemos a profissionais atualizados e eficazes para interagir


na sociedade contemporânea, não podemos deixar de mencionar o professor:

Do ponto de vista econômico, isso é da maior importância: qualquer


profissional (e entre todos, mais que qualquer outro, o professor) que não
faça permanente uso da leitura no sentido de reciclar e atualizar seus
conhecimentos, em muito pouco tempo será um profissional completamente
defasado e anacrônico no exercício da profissão. Para acompanhar o
processo de formação do aluno-leitor, é imprescindível que o professor
tenha construído ou esteja construindo, para si próprio, uma história de
leitor. É necessário que ele esteja, a cada momento, lendo e relendo a
realidade à sua volta [...]. (MARIA, 2002, p. 48-9)
O pesquisador francês Jean Foucambert, citado por Maria (2002, p. 21),
afirma que “Existe uma grande diferença entre ver e examinar, ouvir e escutar... Ler
não é ver o que está escrito, nem tampouco lhe atribuir uma versão oral.” Para ele, o
significado da leitura é bem mais amplo, do que uma simples ação mecânica: “Ler é
ser questionado pelo mundo e por si mesmo, é saber que certas respostas podem
ser encontradas na produção escrita [...] é construir uma resposta que entrelace
informações novas àquelas que já se possuía.”
Quando nos remetemos à formação de leitores, imediatamente nos vem a
ideia de que essa prática se aprende na escola. Assim, é a escola a grande
responsável pelo ato de ler (ou não ler). Porém, cabe ressaltar aqui, que o leitor não
se forma através de uma leitura mecânica, sem sentido, ler apenas pelo ler.
Corroborando com Tiepolo (2006, p. 8), “ninguém se faz leitor mecanicamente, como
pressupõe a ideia de hábito, mas movido pela vontade, pelo interesse, pelo desejo.”
Dessa forma, quanto mais a escola insistir na ação mecânica da leitura, mais o
aluno se afastará dela. A leitura é mais do que um hábito, ela “exige operações
cognitivas de ordem superior”. Dessa forma, jamais deveremos impor à criança, a
leitura como hábito semelhante a escovar os dentes, tomar banho, dormir na mesma
hora, pois esses são adquiridos através da imposição e da repetição, o que não
funciona com a leitura.
Segundo Bakhtin, toda atividade passiva não dá resultado:

A atividade passiva é condicionada pelas forças já dadas, atuais, é


predeterminada pela existência; ela não enriquece a existência com que é
por princípio inacessível de dentro da própria existência, não modifica o
sentido da face que a existência apresenta. A atividade passiva não
transfigura nada do ponto de vista formal. (BAKHTIN, 2000, p. 151)

Um bom exemplo de atividade puramente mecânica e da desvalorização do


diálogo nas escolas brasileiras é o que podemos constatar a partir do relato abaixo:

A pouca importância dada pela escola à expressão dos alunos fica


evidenciada pelo modo como o tempo curricular das aulas é ocupado. Há,
sem dúvida, na imensa maioria das escolas brasileiras, uma verdadeira
compulsão pelo uso de exercícios, material didático composto de atividades
mecânicas, tais como cópias e “treinos ortográficos”. São extremamente
oportunos para que o professor possa manter os alunos ocupados e... em
silêncio. Quando esses são solicitados a falar, suas falas não constituem
momentos de comunicação e diálogo, porque muitas vezes suas vozes
apenas compõem um coro, num autoritarismo que, além de impedir que o
pensamento esteja ativo, ainda dá a falsa impressão de um relacionamento
participante.” (MARIA, 2002, p. 37)
Agindo dessa forma, não estaremos formando leitores para a vida, nem ao
menos estaremos formando leitores. Estaremos formando alunos que apresentam
compreensão dos signos da língua escrita, mas limitados, calados, submissos, que
apresentam dificuldade de raciocínio, de concentração.
Geraldi (2011, p. 39), denomina essa deficiência na aprendizagem de “crise
do sistema educacional brasileiro”. Ele nos chama a atenção para o fato do baixo
nível linguístico que os estudantes vêm demonstrando na utilização da língua, tanto
na modalidade oral, como na escrita. Apesar de estarmos na “era da comunicação”,
os jovens não conseguem expressar seu pensamento. Não têm discernimento e são
incapazes de articular um juízo e estruturar, linguisticamente, uma opinião
fundamentada. Essa realidade pode ser observada nas redações de vestibulandos e
no vocabulário repleto de gírias dos jovens. Constata-se então que, o fracasso
escolar se dá pela falta de leitura. Nossos jovens não leem e esse baixo nível de
leitura é facilmente comprovado pelas baixas tiragens de jornais, revistas e livros.
Muitos professores foram frutos de um aprendizado semelhante a esse e em
decorrência do modo em que foram alfabetizados, apresentam dificuldades diante
de uma produção escrita. É o que podemos constatar através da afirmação de Luzia
de Maria:

Mesmo numa plateia de professores, quando se pede que escrevam um


pequeno texto, manifestando-se sobre um ponto qualquer – ainda que
previamente discutido – as reações confirmam o quanto é difícil, para
muitos a expressão do pensamento através da linguagem escrita. (MARIA,
2002, p. 47-8)

Como nos relata, ainda, tão sabiamente, Maria (2002) sobre o ato de ler e
escrever: “Leitura é exercício de condição de pensar, é alimento para a imaginação.
É refinamento do espírito. De nada servem normas de “como” escrever, a quem não
tem “o que” dizer.”
Para Marisa Lajolo, citada por Geraldi:

Ler não é decifrar como num jogo de adivinhações, o sentido de um texto.


É, a partir do texto, ser capaz de atribuir-lhe significado, conseguir
relacioná-lo a todos os outros textos significativos para cada um, reconhecer
nele o tipo de leitura que seu autor pretendia e, dono da própria vontade,
entregar-se a esta leitura, ou rebelar-se contra ela, propondo outra não
prevista. (GERALDI, 2011, p. 91)
Saber ler extrapola o simples ato de decodificação de letras e palavras, como
nos declara Freire (2005, p. 11) “A leitura do mundo precede a leitura da palavra, daí
que a posterior leitura desta não possa prescindir da continuidade da leitura
daquele.” E para que essa leitura efetive-se na vida de nossos jovens, faz-se
necessário que ela seja adaptada à realidade deles.
Podemos concluir que, não só a leitura como qualquer outra atividade que
seja cognitiva, não será internalizada se for feita de maneira mecânica, passiva ou
condicionada. E é o professor, atuando como mediador e exemplo de leitor, que
conduzirá os estudantes ao prazer de ler, tornando-os leitores aptos, exigentes e
perspicazes. Essa ideia é compartilhada por Vera Maria Tietzmann Silva:

Se o professor despertar a atenção do jovem leitor para a relação que existe


entre o processo de construção do texto e seu significado, ele será capaz
de apreciar mais intensamente as obras que ler, e, mais do que isso, será
capaz de prosseguir em seu percurso de leitor sozinho. Para que isso possa
acontecer, porém, é preciso que o professor se assuma de fato como
docente, ou seja, aquele que conduz. Conduzir não é cobrar, nem punir,
nem intimidar. É andar junto. Um passo mais à frente, talvez por já conhecer
o caminho, mas permitindo ao grupo que lidera o prazer da descoberta de
novas trilhas e novas paisagens. (SILVA, 2009, p. 45)

Defendendo a leitura em seu sentido amplo, Bakhtin nos leva a refletir que:

A língua materna - a composição de seu léxico e sua estrutura gramatical -,


não a aprendemos nos dicionários e nas gramáticas, nós a adquirimos
mediante enunciados concretos que ouvimos e reproduzimos durante a
comunicação verbal viva, que se efetua com os indivíduos que nos rodeiam.
(BAKHTIN, 2000, p. 301)

Em seu discurso, Bakhtin insiste na importância do diálogo que deve haver


entre os sujeitos para a efetiva atividade de linguagem. Muitos estudiosos
concordam com a premissa de que é através do diálogo, da democracia que se
forma um indivíduo preparado para exercer sua cidadania. Porém, Paulo Freire nos
faz um alerta quando nos diz:

Nem sempre, infelizmente, muitos de nós, educadoras e educadores que


proclamamos uma opção democrática, temos uma prática em coerência
com o nosso discurso avançado. Daí que o nosso discurso, incoerente com
a nossa prática, vive puro palavreado. (FREIRE, 2005, p. 25)

Freire (2005) ainda nos leva a refletir que se os educandos têm o direito de
falar, os professores têm o dever de escutá-los, porém sem cobranças posteriores.
Nesse sentido, escutá-los seria falar com eles e não falar para eles. Dizer-lhes
palavras que não tenham sentido arrogantes, colocando-os em posição inferior,
afirmando o elitismo, o autoritarismo da classe dominante. Freire afirma que
ninguém sabe tudo e ninguém ignora tudo, portanto não podemos separar o ato de
ensinar do ato de aprender.
A tarefa ambiciosa da escola é formar leitores, porém, isso não se faz do dia
para noite, é uma conquista que se realiza a longo prazo, com muito esforço e
empenho da escola, do professor. Vejamos o que Luzia de Maria nos orienta:

Não se formam leitores com fragmentos de textos, com leituras esporádicas,


coma simples adição de mais uma atividade escolar. Não se formam leitores
em programas de leitura onde não haja espaço para a escolha individual,
para o interesse próprio, para a busca pessoal de respostas. Por tudo isso
se percebe que não se pode atropelar o processo. Os jovens precisam ter a
oportunidade de descobrir o mundo social, cultural, econômico e industrial
da escrita; precisam ser estimulados a participar ativamente desse mundo;
precisam ter noção de riqueza e variedade de opções de leitura existentes,
reconhecendo na escrita um repositório do conhecimento acumulado pela
humanidade ao longo dos tempos; precisam conhecer os caminhos
percorridos por um texto, desde o momento em que é escrito por um
determinado autor, até o instante em que lhe chega às mãos; precisam ter
noção da sua importância pelas inúmeras atividades requeridas na
produção, na divulgação e na comercialização de um livro, precisam ter
conhecimento dos custos para avaliar o significado de todo esse processo.
(MARIA, 2002, p. 66-7)

Se todos os alunos tiverem a oportunidade de conhecer o processo acima


mencionado, certamente olharão o livro com outros olhos, valorizando-o, dando-lhe
a devida importância. Bakhtin (2000, p. 364) relata que “As grandes obras da
literatura levam séculos para nascer, e, no momento em que aparecem, colhemos
apenas o fruto maduro, oriundo do processo de uma lenta e complexa gestação.”
De acordo com as Diretrizes Curriculares da Educação Básica de Língua
Portuguesa (2008), a escola deve promover, através de uma variedade de textos, o
letramento do aluno para que ele possa dominar, de maneira satisfatória, as práticas
da leitura, oralidade e escrita. Compreende-se que letramento vai além da
alfabetização (atividade mecânica, que garante ao indivíduo a aquisição do
conhecimento linguístico – codificação e decodificação). Já o letramento, refere-se à
habilidade que o sujeito adquire, não só de ler e escrever, mas apropriar-se dessas
práticas com efetivo domínio, garantindo, assim, sua interação com outros indivíduos
e conquistando o seu espaço na sociedade.
Seguindo esse raciocínio, Cosson (2011), argumenta que a função da leitura
literária oferecida pela escola, é de ajudar o aluno a ler melhor, não apenas para
tornar o hábito da leitura prazeroso, mas, sobretudo, para fortalecer o indivíduo
como leitor. Eis aqui, o letramento literário.
É preciso considerar ainda que, sendo o professor intermediário entre o livro e
o autor, deve apresentar a seus alunos todos os tipos de obras. Dessa maneira, não
podemos pregar letramento literário deixando de lado os cânones (obras
consideradas representativas de uma determinada nação ou idioma). Esse tipo de
obra traz consigo a identidade cultural dos povos, numa determinada época. Cosson
(2011) faz alusão aos cânones como herança que não pode ser recusada, mas sim
trabalhada para ampliar, através dessas obras, os conhecimentos da historicidade,
da língua e da cultura da sociedade. O autor afirma que as obras devem ser
diversificadas, porque cada uma traz uma maneira diferente de ver e representar o
mundo. Assim, além dos cânones, os alunos devem conhecer, também, as obras
contemporâneas e as atuais:

Obras contemporâneas são aquelas escritas e publicadas em meu tempo e


obras atuais têm significado para mim em meu tempo, independente da
época de sua escrita ou publicação. De modo que muitas obras
contemporâneas nada representam para o leitor e obras vindas do passado
são plenas de sentido para sua vida. (COSSON, 2011, p. 34)

Na perspectiva do letramento literário, é fundamental que os textos sejam


diversificados, a fim de ampliar o conhecimento do leitor. Cosson (2011, p. 35)
afirma que “[...] o simples fato de saber ler não transforma o indivíduo em leitor
maduro.” O amadurecimento do leitor só se efetiva através de leituras,
progressivamente mais complexas, partindo daquilo que ele já conhece para aquilo
que ele desconhece. Essa prática possibilita o crescimento do leitor por meio da
ampliação de seus repertórios culturais.

Pesquisa junto aos alunos


Com a aplicação de um questionário de pesquisa, a 198 estudantes (uma
turma de cada ano/série), com questões fechadas (sendo que algumas eram de
múltipla escolha) buscou-se diagnosticar a realidade da escola em relação ao perfil
dos alunos, gostos e práticas leitoras e a percepção do trabalho com a leitura
realizada pela escola. A pesquisa foi realizada em setembro de 2012 e não houve
identificação dos alunos, a fim de obter maior autenticidade nas respostas. Após o
registro com tabulação dos dados obtidos, a pesquisa foi socializada com o corpo
docente do colégio, durante a Semana Pedagógica de fevereiro de 2013.
A partir da apresentação dos dados foi possível perceber que 46% dos alunos
leem porque o professor determina, porém 54% realizam a leitura porque gostam.
Em média, os alunos não possuem muitos livros em casa, pois 40,4% responderam
ter apenas 10 livros, 24,2% disseram ter de 10 a 20 livros, 17,7% têm entre 20 e 30
livros, 7,1% afirmaram possuir de 30 a 40 livros e 10,6% dos alunos responderam
que têm mais de 50 livros em sua casa.
Quanto ao que os alunos fazem em seu tempo livre, 75,3% disseram que
ficam navegando na Internet, 71,2% escutam música, 63,1% assistem TV, 56,6%
passeiam, 55,1% praticam esportes, 53% reúnem-se com os amigos, 50,5%
descansam, 41,4% jogam videogame e apenas 28,8% leem.
Em relação ao lugar que eles costumam ler, 76,3% disseram que leem na
sala de aula e 68,2% responderam que leem em casa. Ao serem perguntados sobre
as dificuldades que apresentam ao ler, 12,1% disseram que leem muito devagar,
21,7% citaram a concentração, 25,8% afirmaram não ter paciência e 56,1%
responderam que não possuem dificuldades na leitura.
Percebeu-se que a escola continua sendo a maior responsável pelo
desenvolvimento da leitura, pois 46% dos alunos afirmaram que o professor os
incentiva a ler, 31,8% disse que a grande incentivadora é a mãe, 19,7% citou o pai,
9,1% um amigo e 29,3% responderam que ninguém os influencia a ler.
Quando perguntados sobre a frequência da mãe e do pai lerem, 21,7%
responderam que sempre veem a mãe lendo e 15,7% disseram que sempre veem o
pai lendo. Porém, 10,1% dos alunos responderam que nunca veem a mãe lendo e
21,7% nunca veem o pai lendo.
Foi perguntado se costumam ganhar livros de presente e a resposta foi: 9,1%
responderam que frequentemente ganham livros, 51,5% algumas vezes e 39,4%
afirmaram nunca ganhar livros.
Sobre o acesso aos livros, 66,7% dos alunos disseram que emprestam os
livros da biblioteca do colégio. A grande maioria (71,2%) considera que a biblioteca
representa um lugar para ler, estudar e pesquisar. Os alunos vão com certa
frequência à biblioteca, mas afirmaram que se tivessem mais livros novos, Internet e
atividades culturais, certamente ela seria mais frequentada. A grande maioria dos
alunos (90,9%) disse que a biblioteca é bem cuidada, porém não encontram todos
os livros que precisam.
Em relação ao uso da Internet, 56,1% responderam que a acessam todos os
dias com o objetivo de conhecer pessoas e trocar mensagens.
Ao serem questionados sobre a importância da leitura na vida das pessoas,
86,4% dos alunos responderam que a leitura desenvolve a criatividade para
escrever, 77,3% disseram que o leitor tem um vocabulário mais amplo, 68,2%
acreditam que a leitura torna a pessoa mais inteligente, 36,9% responderam que a
pessoa que lê, tem mais oportunidades no mercado de trabalho e 3,5% não
considera a leitura importante.
Uma das questões perguntava se a leitura, da maneira como está sendo
realizada no colégio, despertava o prazer de ler e 42,9% dos alunos responderam
que não, 32,3% disseram que sim e 24,7% não souberam responder a esta
pergunta.

Considerações dos professores participantes do GTR


Os cursista do GTR afirmaram, em sua grande maioria, que têm dificuldades
de trabalhar a leitura com seus alunos, uma vez que estamos vivemos um tempo de
evoluções cada vez mais aceleradas e nossos jovens estão acostumados com o
imediatismo e interagem naturalmente com as tecnologias. Assim, seria inviável
propormos aos alunos a substituição de todos os aparatos eletrônicos que eles têm
acesso, pelo livro. Isso, definitivamente, não funcionaria. Dessa forma, precisamos
usar as ferramentas digitais para que estas sejam nossas aliadas no processo de
ensino-aprendizagem. Foi discutido que, quando a escola exclui de suas práticas
pedagógicas a leitura por fruição, fazendo com que os alunos leiam por obrigação,
dever, cobrança e, muitas vezes, castigo, está contribuindo para a formação de não-
leitores. Os cursistas estão cientes de que nem todos os pais leem para seus filhos,
compram livros, levam-nos a uma livraria, biblioteca, ou mesmo, os incentivam a ler.
Por isso os professores devem estar dispostos e preparados para estimular e mediar
os alunos, através de situações significativas de leitura, para que eles possam
perceber o real valor do ato de ler na vida das pessoas.
Quanto ao incentivo à leitura, alguns cursistas relataram que este começou
em casa, pelos pais ou pessoas mais velhas, que liam, contavam histórias,
compravam livros e revistas para eles. No entanto, outros cursistas relataram que
seus pais não os estimularam a ler, não porque não consideravam a leitura
importante, mas pelo fato de desconhecerem o real valor desta na vida das pessoas.
Em relação à motivação da leitura realizada na escola ou mediada pelo
professor, alguns afirmaram que foi um determinado professor, o grande estimulador
e responsável pela formação do leitor que, atualmente, os cursistas são. Enquanto
que outros afirmaram serem eles próprios, os responsáveis pela sua formação de
leitor, pois a leitura realizada na escola, não era estimulante.
Os cursistas ainda relataram que, hoje em dia, a família está ciente da
importância da leitura para a vida de seus filhos, mas com a vida agitada que levam,
trabalhando o dia todo fora de casa, os pais deixam para a escola a difícil tarefa de
incentivar e formar leitores. Dessa forma, os professores demonstraram estar
bastante cientes do importante papel que desempenham na vida de seus alunos e
sendo assim, em suas práticas, diversificam bastante as atividades com a leitura.
Procuram buscar leituras do contexto de seus alunos e fazem diversos trabalhos
com estes textos, interagindo, muitas vezes, com os recursos tecnológicos que a
escola dispõe.
Através das discussões, houve um consenso de que o ideal é quando a
leitura é colocada em evidência na vida do indivíduo, desde muito cedo, através da
família. Porém, se o incentivo à leitura não é dado em casa, cabe à escola, aos
professores das diversas áreas do conhecimento, estimularem os alunos à prática
leitora, pois uma sociedade realmente democrática necessita de leitores, de bons
leitores. Esse estímulo à leitura deve se dado através de atividades que estejam em
constante inovação; assim, os recursos midiáticos deverão ser usados sempre que
necessários, pois estamos vivendo em um mundo globalizado e nossos jovens
interagem naturalmente com as tecnologias. Também ficou evidente que o professor
deve ser o espelho, o exemplo de um bom leitor, pois segundo a cursista Simone
Luciana Gomes, “teoria e ação devem caminhar juntas nesta árdua tarefa de
conquistar novos leitores”. Assim, além de realizar práticas que despertem no aluno
o gosto pela leitura, o professor deve ser um leitor de fato para que possa alcançar o
objetivo de formar muitos e bons leitores.

Implementação do Projeto
No processo de Implementação do Projeto: A formação do professor como
mediador da leitura, pode-se perceber boa aceitação por parte dos integrantes da
Equipe Multidisciplinar, em relação às propostas apresentadas. Foram realizadas
conversas informais e apresentações de materiais teóricos embasados em autores
que abordam o tema leitura. Durante as reuniões, foram realizadas rodas de leitura e
surgiram muitas ideias, através das atividades efetivadas, de como levar o aluno a
ser um leitor para a vida toda. Os integrantes da Equipe Multidisciplinar organizaram,
no Colégio, uma campanha de doação de livros para a biblioteca, onde arrecadaram
482 livros.
Foram organizados momentos de leitura, na biblioteca, durante os quais, os
professores faziam a leitura de contos aos alunos e os levavam a refletir sobre a
importância que a leitura tem na vida das pessoas. Através do Projeto Ler e Pensar,
realizado pela Gazeta do Povo, o Colégio recebe, diariamente, dois exemplares
deste jornal, os quais ficam na biblioteca para que os alunos possam, através da
leitura, estar sempre informados de fatos que acontecem em Curitiba e no mundo.
Houve, inclusive, depoimentos de professores e alunos onde relataram como a
leitura foi introduzida em suas vidas. Os alunos reconheceram o quanto é importante
o incentivo do professor para que eles se interessem pela leitura e se tornem
leitores.
A Implementação do Projeto levou os professores a refletirem sobre a
importância da leitura para eles próprios, pois antes de “cobrar” a leitura de seus
alunos, é preciso acreditar em seu poder e ser, primeiramente, um leitor. Os
professores também entenderam que a leitura não pode ser feita de forma
mecânica, ler apenas por ler, ou ainda, realizada como cobrança ou castigo. Assim,
devem rever suas práticas pedagógicas, de forma que seus alunos tomem gosto
pela leitura e percebam que é a partir dela que eles farão diferença na sociedade
atual, tão competitiva e letrada.

Considerações Finais
Formar leitores no mundo atual, não é tarefa fácil, pois vivemos num sistema
complexo, articulado e com a evolução da tecnologia, a Internet está cada vez mais
presente na vida das pessoas. Com a presença massiva dos recursos midiáticos no
dia-a-dia das pessoas, é inevitável que as culturas sociais se alterem, pois a
sociedade encontra novas maneiras de transmitir informações e gerar
conhecimento. E, acostumados ao imediatismo, às imagens instantâneas, ao som,
às novas tecnologias, torna-se cada vez mais difícil, para nossos alunos, a leitura de
livros. Para reverter esta nova realidade, faz-se necessário que o professor aprenda
a utilizar as tecnologias da informação e comunicação (TICs), para mediar a leitura,
pois as novas gerações de estudantes estão cada vez mais conectadas a essas
novidades. É preciso que o professor seja um articulador dos conhecimentos e use
as ferramentas digitais de forma que venham a contribuir, de maneira eficaz, na
formação leitora dos alunos.
Com pai e mãe trabalhando, muitas responsabilidades que antes eram da
família, são repassadas à escola. A leitura é uma destas responsabilidades. Com a
correria da modernidade, nem todos os pais leem para seus filhos, compram livros,
levam-nos a uma livraria, biblioteca, ou mesmo, os incentivam a ler. Por isso, os
professores devem estar dispostos e preparados para estimular e mediar os alunos,
através de situações significativas de leitura, para que eles possam perceber o real
valor do ato de ler. Assim, o objetivo da leitura na escola é preparar um aluno que
seja sujeito da formação de sua própria história, crítico, reflexivo, pesquisador e que,
através da prática leitora, desenvolva competências e habilidades para atuar, de
forma consciente, na sociedade.
Muitos autores afirmam que a escola tem grande parcela de culpa em afastar
o aluno da leitura, quando a impõe. Mudar isso significa resgatar a leitura como
fruição, isto é, o ler pelo ler, sem cobranças, simplesmente pelo prazer que a leitura
proporciona. E é exatamente essa ausência de cobrança, esse desinteresse pelo
controle do resultado da leitura, que desperta o interesse, o gosto pela prática
leitora.
O objetivo do professor, não é ter competência para ensinar leitura através de
práticas mecânicas e impostas, mas sim ser um mediador e organizar práticas
leitoras que possibilitem, aos alunos, aperfeiçoar seus conhecimentos e ao mesmo
tempo incorporar na sala de aula aquilo que aprendem fora dela. As mudanças
estão aí e precisamos fazer com que elas sejam facilitadoras da aprendizagem.
Sendo assim, o professor deve buscar leituras do contexto de seus alunos e
elaborar diversas atividades com estes textos, interagindo com os recursos
tecnológicos que a escola dispõe. Além de mediar e realizar práticas que despertem
no aluno o gosto pela leitura, o professor deve ser um leitor de fato, pois não poderá
ofertar aos alunos aquilo que ele próprio não tem.
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