Você está na página 1de 4

Tribunal de Justiça do Estado da Bahia

PODER JUDICIÁRIO
QUINTA TURMA RECURSAL - PROJUDI

PADRE CASIMIRO QUIROGA, LT. RIO DAS PEDRAS, QD 01, SALVADOR - BA


ssa-turmasrecursais@tjba.jus.br - Tel.: 71 3372-7460

Ação: Cumprimento de sentença


Recurso nº 0178835-31.2019.8.05.0001
Processo nº 0178835-31.2019.8.05.0001
Recorrente(s):
LAISA SOARES DA SILVA

Recorrido(s):
CENTRAL NACIONAL UNIMED

EMENTA

RECURSO INOMINADO. DIREITO DO CONSUMIDOR. AÇÃO DE


OBRIGAÇÃO DE FAZER CUMULADA COM DANOS MORAIS. PLANO
DE SAÚDE. MAMOPLASTIA REDUTORA NÃO ESTÉTICA.
RELATIVIZAÇÃO DO CONTRATO. RECUSA INDEVIDA DE
COBERTURA DE PROCEDIMENTO. RISCO DE AGRAVAMENTO DE
DOENÇA. EXISTÊNCIA DE RELATÓRIO MÉDICO RECOMENDANDO
A OPERAÇÃO. ALEGADA AUSÊNCIA DO TRATAMENTO INDICADO
NO ROL DE PROCEDIMENTOS EDITADO PELA ANS.
IRRELEVÂNCIA. ROL EXEMPLIFICATIVO. ABUSIVIDADE SE HÁ
EXPRESSA INDICAÇÃO MÉDICA. COMPETE AO PLANO
ESTABELECER QUAIS DOENÇAS SÃO COBERTAS, MAS NÃO O TIPO
DE TRATAMENTO QUE O PACIENTE DEVE SER SUBMETIDO.
PREVALÊNCIA DO PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA
HUMANA. DIREITO À VIDA E À SAÚDE. DANOS MORAIS
CONFIGURADOS. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO CONHECIDO
E PROVIDO.

RELATÓRIO
Vistos, etc.

Dispensado o relatório, nos termos do art. 46 da Lei 9.099/95.

VOTO

Conheço do recurso, pois preenchidos os pressupostos de admissibilidade.

Com efeito, o art. 46 da Lei nº 9.099/95, assim dispõe: ¿O julgamento em


segunda instância constará apenas da ata, com a indicação suficiente do processo,
fundamentação sucinta e parte dispositiva. Se a sentença for confirmada pelos próprios
fundamentos, a súmula do julgamento servirá de acórdão.¿

Acresço.

Trata-se de ação de obrigação de fazer cumulada com danos morais


ajuizada por LAISA SOARES DA SILVA em desfavor da CENTRAL NACIONAL UNIMED.

Em apertada síntese, refere a Recorrente que desde os idos de 2017 vem


sofrendo com problemas de saúde em decorrência do tamanho de seus seios. Esclarece que
apresenta mamas muito volumosas, com hipertrofia e ptose acentuada, grau IV,
gigantomastia, mamas densas, com episódios recorrentes de dermatite por atrito em sulcos
mamários e assimetria com mama esquerda mais volumosa. Prossegue afirmando que vêm
apresentando quadros de cervicalogia, dorsalgia, lombalgia e mastalgia acentuadas, conforme
relatórios acostados. (evento 01)

Pediu tutela de urgência para que a operadora seja compelida a arcar com o
procedimento e danos morais.

A acionada, por outro lado, defende que o procedimento cirúrgico solicitado


trata-se, em verdade, de procedimento estético, sem cobertura contratual. Pugna pela
improcedência. (eventos 22 e 23)

A sentença recorrida, escorada em relatório emitido pela junta


médica do Tribunal de Justiça desta unidade federativa, concluiu pela natureza
estética do procedimento e julgou improcedentes os pedidos iniciais. (evento 31)

É o assaz relatório. FUNDAMENTO E DECIDO.

Os planos de saúde estão amplamente sujeitos aos princípios e normas


estabelecidas pelo CDC, e suas cláusulas contratuais devem ser interpretadas de maneira
mais favorável ao usuário, tendo-se por abusivas e nulas as que o coloquem em desvantagem
excessiva.

Em relação ao rol de procedimentos da ANS, há que se esclarecer que se


trata de um rol meramente exemplificativo e que não afasta a cobertura de procedimentos
necessários ao bem-estar do consumidor.

Ademais, os regulamentos da ANS não podem restringir a garantia da


integridade física do paciente, o que acarretaria em afronta ao Princípio da Dignidade da
Pessoa Humana. Assim, se o procedimento de fato era necessário à autora, conforme
evidenciam os documentos acostados aos autos, não há razão que justifique a negativa de
cobertura.

A vedação de cobertura para a mamoplastia redutora com o objetivo de


tratar doenças na coluna vertebral não consta taxativamente no contrato firmado entre as
partes, sendo certo que cláusulas restritivas de direito não dão margem a interpretações
extensivas. A omissão no contrato quanto à exclusão de cobertura deve ser interpretada de
forma favorável ao consumidor, nos termos do art. 47 do Código de Defesa do Consumidor.

A operadora pode estabelecer quais doenças são cobertas pela avença, mas
não o tipo de tratamento indicado para combater a enfermidade.

Não pode o paciente, por conta de cláusula limitativa, ser impedido de


receber tratamento com o método mais moderno disponível no momento em que instalada a
doença. Somente ao médico que acompanha o caso é dado estabelecer qual o tratamento
adequado para alcançar a cura ou amenizar os efeitos da enfermidade que acomete o
paciente.

O fato de o exame não constar de Resolução da ANS não implica, por si só,
exclusão da cobertura do plano. Se existe um rol de procedimentos obrigatórios, isso só
significa que são básicos e indispensáveis a todos os contratos e, portanto, não podem ser
excluídos a não ser por previsão contratual expressa.

No mais, cumpre consignar que há atestado médico nos autos informando


que o procedimento cirúrgico ao qual se submeter a autora não tinha finalidade
iminentemente estética. (eventos 01 e 101)

Assim, como já dito, à seguradora ou convênio compete estabelecer quais


doenças são cobertas, mas não a que tipo de tratamento o paciente deve ser submetido para
o alcance da cura. O contrato deve se ajustar aos avanços da medicina, cabendo ao
profissional da área a indicação do tratamento adequado ao seu paciente, não se admitindo
interferência do convênio para este fim, muito menos a exclusão do procedimento indicado
sob pena de violar o próprio objeto contratado, qual seja, a proteção da vida e da saúde do
segurado.

Nos contratos em geral o mero inadimplemento não é causa de existência


de danos morais. Todavia, conforme orientação do Superior Tribunal de Justiça, no caso
específico do contrato de plano de saúde, a injusta recusa de cobertura securitária médica
enseja a presença de danos morais, na medida em que tal conduta agrava a situação de
aflição psicológica e de angústia no espírito do segurado, o qual, ao pedir a autorização da
seguradora, já se encontra em condição de dor, de abalo psicológico e com a saúde debilitada.

Assim, a recusa indevida de custeio, por considerar o procedimento de


cunho estético, extrapola o mero dissabor que decorre do inadimplemento contratual é hábil a
gerar danos morais, na medida em que se mostra capaz de provocar angústia e sofrimento
aptos a agravar o já fragilizado estado de saúde da pessoa enferma. Por essas razões, emerge
nítido o dever de compensar o dano moral causado à autora.

Com essas considerações, e por tudo mais constante dos autos, voto no
sentido de CONHECER e DAR PROVIMENTO AO RECURSO para REFORMAR a sentença
guerreada para condenar a acionada a autorizar e custear, em definitivo, o procedimento
cirúrgico objeto da lide bem como os materiais necessários à sua realização,
inclusive honorários médicos, e para compensar a autora pelos danos morais
experimentados, no importe de R$ 7.000,00 (sete mil reais) com juros de 1% ao mês a
contar da citação e correção monetária a contar do arbitramento, nos termos da súmula 362
do STJ. Sem custas e honorários, ante a ausência de Recorrente vencido.

Salvador/BA, Sala das Sessões, 24 de novembro de 2020.

PAULO CESAR BANDEIRA DE MELO JORGE

Juiz R

Você também pode gostar