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atividades físicas e comportamentos


sedentários: evidências e novos caminhos
para nossas pesquisas

A área de “Atividade Física Relacionada à dade física ocorrem por meios diferentes dos
Leandro Martin Saúde” vem crescendo rapidamente no Brasil, que são disparados como resposta à prática
Totaro Garcia1 fenômeno vislumbrado na revisão realizada de exercícios físicos. Ou seja, certos sinais fi-
Kelly samara da silva2 recentemente por Dumith1. Seus resultados siológicos que levam a prejuízos à saúde por
Markus Vinicius nahas3 também lançam luz sobre problemas ainda conta da inatividade física são diferentes dos
presentes, como a falta de consenso nos cri- sinais responsáveis por melhorá-la quando se
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Discente de Mestrado do térios de classificação e terminologias utiliza- realiza AFMV, podendo até coexistir;
Programa de Pós-Graduação dos para definir diferentes níveis de ativida- 2. Ausência ou insuficiência de AFMV e
em Educação Física da de física. Neste sentido, observamos outros excesso de atividades sedentárias são classes
Universidade Federal de Santa aspectos que consideramos importantes e de comportamentos diferentes, com deter-
Catarina (UFSC). Bolsista interligados: (1) aparente confusão entre ter minantes distintos e que atuam independen-
CAPES. um estilo de vida sedentário (ou fisicamen- temente como fatores de risco à saúde.
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Discente de Doutorado do te inativo) e não atingir às recomendações Um estudo recente demonstrou que in-
Programa de Pós-Graduação de atividades físicas moderadas e vigorosas divíduos que fazem mais AFL não necessaria-
em Educação Física da (AFMV); (2) falta de mensuração e atenção às mente fazem mais AFMV (r=-0,02); entretan-
Universidade Federal de Santa atividades físicas leves (AFL); e (3) necessida- to, são aqueles que menos se envolvem em
Catarina (UFSC). de de distinguir tempo em comportamentos atividades sedentárias (r=0,96) indicando que
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Professor Titular do sedentários e em AFL. os benefícios das AFL estão mais associados à
Departamento de Educação
Observa-se, com frequência, a utilização redução do tempo sedentário que o acrésci-
Física da Universidade Federal
equivocada dos termos “sedentário” e “fisica- mo de atividades mais intensas. Além disso,
de Santa Catarina (UFSC).
mente inativo”, mesmo quando não se avalia independentemente da prática de AFMV, as
a prática de AFL. Seriam necessariamente AFL estão associadas a um menor perímetro
“sedentários” aqueles que não atingem às de cintura e risco metabólico combinado3.
recomendações para AFMV? Ou deveríamos Neste sentido, preocupa-nos a não in-
prestar mais atenção nos níveis habituais de clusão das AFL na classificação dos níveis de
AFL, que, certamente, afastam as pessoas de atividades físicas nas pesquisas realizadas em
comportamentos sedentários? Não se tra- nosso país. Imaginemos um grupo de pes-
Endereço para Correspondência
ta somente de nomear corretamente o que soas que não pratica exercício físico regular,
se observa. Talvez sejam mais importantes mas que inclua atividades leves na rotina
Leandro Martin Totaro Garcia
as implicações únicas e distintas à saúde de diária (1,0 a 2,9 METs), que excedam sua de-
Campus Universitário
não realizar AFMV, permanecer tempo dema- manda energética de repouso. No máximo
Coordenadoria de Pós-Graduação em
siadamente longo nas posições sentada ou poderemos dizer que não atendem às reco-
Educação Física
deitada, e realizar atividades físicas em níveis mendações de AFMV, mas não nos parece
CEP: 88040-900
ou intensidades aquém dos apontados pelas correto sugerir que tenham um estilo de vida
Bairro Trindade, Florianópolis
recomendações. sedentário ou inativo fisicamente.
Santa Catarina
Estas diferenças vêm sendo demons- Além disso, um estudo de meta-análise
Telefone (48) 3721-8519
tradas em estudos com modelos animais e mostrou 45% de redução de risco de morta-
e-mail: leandromtg@gmail.com
estudos epidemiológicos e parte delas está lidade naqueles que se exercitavam mesmo
contemplada no “Paradigma da Fisiologia da sem atender às recomendações4. Existem
• Recebido: 14/01/2010 Inatividade Física”2, do qual destacamos dois evidências de que a atividade física não ape-
• Re-submissão: 04/03/2010 pontos importantes: nas reduz o risco de mortalidade por todas as
• Aceito: 08/03/2010 1. Alguns dos processos celulares e mo- causas, mas também o diminui gradualmente
leculares disparados como resposta à inativi- para níveis variados de intensidade, com im-

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portante redução do risco decorrente da mudança do seden- diante de comportamentos diferentes, com implicações im-
tarismo para a prática de AFL ou abaixo dos níveis recomen- portantes e talvez independentes para a saúde; portanto,
dados pelas diretrizes5. devem ser avaliados separadamente, mas abordados em con-
Baseados nisso, parece-nos equivocado incluir em uma junto.
única categoria as AFL, sedentárias e o fato de não se exercitar
no tempo recomendado, como se possuíssem características Contribuição dos autores
e implicações semelhantes para a saúde. Ao avaliarmos o pe- Leandro M. T. Garcia sugeriu a elaboração do manuscrito,
ríodo de vigília de adultos comuns, apenas 1% a 10% deste além de redigi-lo e revisá-lo. Kelly S. Silva redigiu e revisou o
tempo é gasto em AFMV. Ou seja, ao mensurarmos somente o manuscrito. Markus V. Nahas contribuiu de forma importante
cumprimento das diretrizes atuais, desconsideramos mais de na revisão crítica do texto.
90% das atividades dos indivíduos2.
Imprecisões deste tipo têm consequências importan-
Referências
tes quando nossas pesquisas podem encorajar estratégias e 1. Dumith SC. Physical activity in Brazil: a systematic review. Cad Saude
ações de intervenção, pois implícita nelas está a ideia de que Publica 2009;25(Suppl 3):S415-26.
reduzir a inatividade física consiste em aumentar a prática de 2. Hamilton MT, Healy GN, Dunstan DW, Zderic TW, Owen N. Too little ex-
ercise and too much sitting: inactivity physiology and the need for new
atividades mais intensas. Ou, às vezes, pode parecer confuso recommendations on sedentary behavior. Current Cardiovascular Risk
quando avaliamos a prática de AFMV e sugerimos estratégias Reports 2008;2(4): 292-8.
que vão ao encontro de mudanças de hábitos diários que en- 3. Healy GN, Wijndaele K, Dunstan DW et al. Objectively measured sed-
entary time, physical activity, and metabolic risk: the Australian Diabetes,
volvem AFL, como solicitar às pessoas que reduzam o tempo Obesity and Lifestyle Study (AusDiab). Diabetes Care 2008;31(2):369-
assistindo televisão ou que se desloquem a pé para seu tra- 71.
balho. 4. Löllgen H, Böckenhoff A, Knapp G. Physical activity and all-cause mor-
tality: an updated meta-analysis with different intensity categories. Int J
Este é um assunto que necessita ser abordado com mais Sports Med 2009;30(3):213-24.
profundidade pelos pesquisadores da área, por sua comple- 5. Hamer M, Stamatakis E. Physical activity and risk of cardiovascular dis-
xidade e importância para as políticas públicas. Acreditamos ease events: inflammatory and metabolic mechanisms. Med Sci Sports
Exerc 2009;41(6):1206-11.
que, para avançarmos, precisamos considerar que estamos

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