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Volume 1 • Número 12 Março 2020 ISSN 2525-4294

Março 2020 ISSN 2525-4294


Volume 1 • Número 12
Educação Integral:
Reflexões sobre educação na perspectiva da
integralidade humana

INEQ / FAEP
VOLUME 1 - NÚMERO 12 – (MARÇO DE 2020)

CARTA AO LEITOR Periodicidade: Trimestral

Nesta edição da Revista “Educação Integral: refle-


Os conceitos contidos nesta revista são de inteira
xões sobre educação na perspectiva da integralida-
reponsabilidade dos autores.
de humana”, os educadores que compartilham as
É proibida a reprodução total ou parcial desta obra
decisões com o Conselho Editorial pretenderam dia-
sem prévia autorização dos autores.
logar com os leitores sobre o trabalho nas institui-
ções educativas, na perspectiva da Educação como
atualização histórico - cultural. A Educação Escolar,
muitas vezes, considera que os conteúdos a serem
trabalhados pela escola se reduzem a conhecimen- CONSELHO EDITORIAL
tos e informações organizados em disciplinas, po-
Profº Dr. Claudinei Aparecido da Costa
rém, os educandos estão integralmente presentes
Profº Dr. Clemente Ramos dos Santos
nas situações de aprendizagem e se apropriam de
Profº Dra. Vania Aparecida da Costa
outros elementos da cultura em todos os espaços
Profª Ms. Ana Maria Gentil
que estiverem: valores, costumes, filosofia e ou-
tros. Neste sentido, os educadores precisam atuar
EDITOR CHEFE
de forma intencional e planejada na construção da
personalidade e no desenvolvimento das potencia- Profº Dr. Claudinei Aparecido da Costa

lidades, organizando intenções e ações que sejam


desencadeadoras de aprendizagens significativas REVISÃO E NORMATIZAÇÃO DE TEXTOS
que envolvam conteúdos não voltados apenas para Prof. Marcos Alves da Silva
a apropriação de conhecimentos e informações. O
desafio para as escolas que optarem por agir na in- CAPA E PROJETO GRÁFICO
tegralidade humana é conseguir trabalhar com con- Fernando Silva de Araujo
teúdos da cultura para atender aos objetivos educa-
cionais compatíveis com a proposta de constituição INSTITUTO NACIONAL DE EDUCAÇÃO e
de uma sociedade mais justa e igualitária. QUALIFICAÇÃO PROFISSIONAL – INEQ
Desta forma, pretendeu-se um estudo intencional e
Rua Santa Ângela, 252, Vila Palmeiras,
interdisciplinar sobre os objetivos da educação es-
Freguesia do Ó, São Paulo – SP - Cep: 02727-000
colar na perspectiva da formação integral. Espera-
Tel.: (11) 3218-0088
se que os leitores possam considerar as diferentes
e-mail: educacaointegral@ineq.com.br
possibilidades do fazer pedagógico, incluindo em
seus planejamentos os conteúdos relacionados a
ISSN 2525-4294
constituição da cultura humana.

Prof. Dr. Claudinei Aparecido da Costa


Diretor-geral

INEQ - Educação integral 3


Catalogação na Publicação
Serviço de Biblioteca e Documentação
INEQ Instituto Nacional de Educação e Qualificação Profissional / Faculdade
de Educação Paulistana / FATAC Faculdade de Tecnologia Alpha Channel

Educação Integral – Revista do Instituto Nacional de Educação e Qualificação Pro-


fissional

Faculdade de Educação Paulistana e Faculdade de Tecnologia


Alpha Channel. n. 12 (2020) São Paulo: INEQ/FAEP/FATAC
(2020)

Trimestral

Endereço eletrônico: https://ineq.com.br/revista/

ISSN 2525-4294

Wilma Aparecida Cavazini – Bibliotecária CRB 8 2665

4 INEQ - Educação integral


APRESENTAÇÃO
REVISTA EDUCAÇÃO INTEGRAL – março/2020

A revista “Educação Integral: reflexões sobre Na formação docente, ao longo da História da


educação na perspectiva da integralidade huma- Educação aconteceram impactos que romperam
na” pretende continuar as reflexões sobre a Edu- com a caminhada democrática e com a formação
cação, na perspectiva da atualização histórico – do sujeito crítico e reflexivo. O artigo “O IMPAC-
cultural. Neste sentido, os textos construídos por TO DA LEGISLAÇÃO E DAS PRESCRIÇÕES PE-
diferentes atores da ação educativa das institui- DAGÓGICAS NO COTIDIANO DO PROFESSOR DE
ções privadas e públicas buscam trilhar caminhos HISTÓRIA, O FIM DA DISCIPLINA DE HISTÓRIA
com o leitor, que possibilitem o aprofundamento E A CHEGADA DOS ESTUDOS SOCIAIS, BRASIL
dos processos de ensino e de aprendizagem, que (1971-1989)” traz uma reflexão importante sobre
implicam na apropriação do patrimônio cultural as intenções das políticas públicas e o silencia-
da humanidade pelos educandos. mento de alguns grupos presente nas propostas
que excluíam algumas disciplinas escolares, as
Em todas as edições, a revista pretende colabo- quais formariam o sujeito humano – histórico, na
rar na construção coletiva dos Projetos Políticos perspectiva da construção de práticas democrá-
– Pedagógicos das instituições educativas. Espe- ticas..
cificamente nesta revista, diferentes olhares tra-
zem temas especiais e articulados para pensar os Alguns artigos destacam o trabalho com a Inclu-
objetivos da educação os desdobramentos que são de educandos que necessitam de um olhar
possam contribuir com a formação docente. atento e reflexivo da escola. O artigo DIFICULDA-
DE DE APRENDIZAGEM, A DISLEXIA - UMA IN-
Na busca de conhecimentos para refletir sobre o TERFERÊNCIA PEDAGÓGICA E PSICOPEDAGÓ-
trabalho docente, destaca – se o artigo “A FOR- GICA procurou organizar um texto para auxiliar os
MAÇÃO DOCENTE COMO FERRAMENTA REFLE- docentes e trabalhadores da educação na com-
XIVA”, que explicita a necessidade do repensar preensão da Dislexia e no papel da escola e do
das práticas de todos os atores e protagonistas psicopedagogo na trajetória de inclusão e eman-
da ação educativa para atuarem na sociedade de cipação dos educandos disléxicos.
forma crítica e criativa. Expõe a importância do
trabalho com a dimensão ética, na perspectiva da Outros artigos caminham para uma reflexão se-
construção de valores democráticos. melhante e ajudam na busca de um planejamento
conjunto das instituições educativas, com a fina-
No sentido da transformação dos espaços es- lidade de trabalhar com educandos que apresen-
colares excludentes, o artigo “DIRETRIZES DA tam características de Hiperatividade. Estes tex-
EDUCAÇÃO ESPECIAL NA REDE MUNICIPAL DE tos auxiliam na reflexão sobre práticas inclusivas:
ENSINO DE SÃO PAULO: DESAFIOS E CONSIDE- “HIPERATIVOS NA ESCOLA O PAPEL DO EDU-
RAÇÕES” esclarece os avanços da legislação, CADOR NO DESENVOLVIMENTO DOS ALUNOS
das regulamentações e das ações realizadas no COM TDAH” E “TRANSTORNO DE DÉFICIT DE
Município de São Paulo, que se referem a Educa- ATENÇÃO E HIPERATIVIDADE (TDAH)”. Ambos
ção Inclusiva. destacam a importância de trabalhar para a com-
preensão das ações dos educandos e das possi-

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bilidades de ações pedagógicas. Compreender DIZAGEM ESCOLAR” propõe um repensar
os alunos e construir um trabalho para atender dos educadores, na perspectiva de articular as
às suas necessidades possibilita a construção novas Tecnologias Digitais da Informação e da
de um espaço inclusivo e democrático. Comunicação com as propostas educacionais
lúdicas, utilizando os jogos de Role Player Ga-
Ao refletir sobre a Educação Inclusiva, o texto mes ( RPG).
“SÍNDROME DE DOWN: CAMINHOS PARA A
INCLUSÃO SOCIAL E EDUCACIONAL” proble- Pode –se considerar o jogo de “simulacro” uma
matiza questões importantes sobre a inclusão atividade lúdica. Desta forma, o artigo “O JOGO
da pessoa com deficiência, especialmente, os TEATRAL COMO PROPOSTA DE DESENVOL-
educandos com Síndrome de Down, destacan- VIMENTO PSICOMOTOR PARA AUXÍLIO DA
do a necessidade do conhecimento das crian- APRENDIZAGEM” traz uma reflexão importan-
ças e adolescentes e os encaminhamentos ne- te sobre as possibilidades da linguagem teatral
cessários para o seu desenvolvimento. para o trabalho pedagógico, na perspectiva do
desenvolvimento humano integral, por ser uma
O texto que envolve de forma mais abrangente, expressão que envolve a totalidade da pessoa.
porém com muitas possibilidades de auxiliar
na reflexão sobre a inclusão social e educacio- Uma forma de trabalhar em uma perspectiva
nal, foi intitulado : “O LÚDICO COMO RECURSO interdisciplinar e buscar práticas inclusivas é
PEDAGÓGICO PARA O ENSINO/APRENDIZA- integrar reflexões sobre a diversidade e trazer
GEM SIGNIFICATIVA”. O artigo aborda a impor- a ludicidade no cotidiano escolar. O artigo “A
tância do lúdico no processo de aprendizagem LUDOPEDAGOGIA E SUA RELAÇÃO COM OS
em diferentes etapas da Educação Básica, BRINQUEDOS, BRINCADEIRAS, JOGOS DE IN-
possibilitando o desenvolvimento integral: so- FLUÊNCIA INDÍGENA, PORTUGUESA E AFRI-
cial, afetivo, cognitivo, físico. CANA NO BRASIL” enfatiza a importância do
conhecimento das diferentes culturas na orga-
Destaca – se que a Ludicidade possibilita a nização e trabalho com jogos. A Ludopedago-
interdependência entre desenvolvimento e gia e suas propostas pedagógicas podem co-
aprendizagem, sendo que, nos dias atuais, a laborar com o olhar das escolas para a relação
tecnologia pode contribuir com novas possi- entre Jogo e Diversidade.
bilidades. Entretanto, precisa ser repensada e
discutida cotidianamente. O artigo “A IMPOR- No artigo “LUTA POR SER CIDADÃO”, a autora
TÂNCIA DOS EDUCADORES NO PROCESSO DE destaca de forma significativa a importância
APRENDIZAGEM DA CRIANÇA ATRAVÉS DE de refletir sobre a escravidão e as buscas pela
BRINCADEIRAS LÚDICAS NA ERA DA TECNO- liberdade e igualdade. Por meio da análise da
LOGIA” procura realizar uma caminhada para linguagem cinematográfica, a organizadora do
interagir, equilibrar e integrar no trabalho peda- texto provoca o leitor trazendo a simbologia
gógico todas as possibilidades das brincadei- dos filmes para repensar as práticas excluden-
ras antigas e das brincadeiras do universo das tes.
tecnologias.
O artigo “A ARTICULAÇÃO DAS VÁRIAS FA-
Neste sentido, o texto “RPG E EDUCAÇÃO: CETAS DO PROCESSO DE APRENDIZAGEM
COMO O JOGO PODE AUXILIAR NA APREN- INICIAL DA LÍNGUA ESCRITA” destaca a im-

6 INEQ - Educação integral


portância de refletir de forma ampla sobre o de infância e de trabalho com a criança que
processo de construção da compreensão do inclui a “medida” para classificar as aprendi-
sistema de representação da escrita, que deve zagens, desconsiderando o acompanhamento
ser integrado aos sentidos e significados pre- do desenvolvimento infantil e o seu registro. O
sentes nos usos e funções da escrita em uma artigo “AVALIAÇÃO NA EDUCAÇÃO INFANTIL:
sociedade letrada. IMPORTÂNCIA, MODALIDADES, INSTRUMEN-
TOS E ÂMBITOS” destaca a importância de
Entretanto, se a reflexão sobre a apropriação acompanhar as aprendizagens e incentivar os
da leitura e da escrita estiver voltada para a diferentes registros.
primeira etapa da Educação Básica, torna-se
necessário pensar sobre o desenvolvimento Para finalizar a relação de artigos desta edição,
da função simbólica da consciência e a inser- destaca – se um texto produzido para tratar
ção em práticas sociais significativas. O artigo de um tema que possibilita a reflexão sobre a
“O PROCESSO DE ALFABETIZAÇÃO E LEITU- Educação Integral: “AS RELAÇÕES AFETIVAS
RA NA EDUCAÇÃO INFANTIL” aponta algumas NO CONTEXTO ESCOLAR: COMO SE ESTABE-
ideias para serem debatidas no que se refere LECER O DESENVOLVIMENTO COGNITIVO”.
ao trabalho com a cultura escrita na pequena Neste artigo, a autora estabelece uma relação
infância. entre as relações afetivas e o desenvolvimento
da cognição, indicando a importância das rela-
Ao pensar no trabalho com a Educação Infantil, ções sociais e afetivas na formação das subje-
destaca – se a necessidade de ampliar as re- tividades.
flexões sobre a Arte, considerada como Funda-
mento para organizar ações com as crianças Ao traçar as últimas linhas da apresentação
pequenas e bem pequenininhas. O artigo “A desta edição da revista, o Conselho Editorial
IMPORTÂNCIA DE ARTES NA EDUCAÇÃO IN- convida os leitores para uma jornada reflexi-
FANTIL” aponta para um olhar reflexivo sobre a va em torno da concepção de educação, que
linguagem da Arte como expressão na Educa- permeia todos os temas tratados pelos auto-
ção Infantil e a necessidade de trabalhar Arte e res nos artigos. Indica uma proposta de dis-
ludicidade de forma integrada. cussão coletiva com educadores em torno
dos assuntos expostos, que podem garantir a
O texto “O ENSINO DE ARTES VISUAIS NA EDU- manutenção da esperança em uma educação
CAÇÃO INFANTIL NO CONTEXTO DAS DIRE- transformadora, na perspectiva da integralida-
TRIZES CURRICULARES DO BRASIL” também de humana.
destaca a importância da Arte na Educação
Infantil, porém, apoia-se nas Diretrizes Nacio-
nais presentes em documentos institucionais.
O artigo destaca o papel das Artes Visuais no BOA LEITURA
desenvolvimento da cognição, da imaginação
e da criatividade.

Outra questão que necessita de destaque e


reflexão contínua é a Avaliação na Educação
Infantil, porque existe ainda uma concepção

INEQ - Educação integral 7


SUMÁRIO
10
O ENSINO DE ARTES VISUAIS NA EDUCAÇÃO INFANTIL
NO CONTEXTO DAS DIRETRIZES CURRICULARES DO
BRASIL. – Bruno Alberto dos Santos Cyriaco

20
LUTA POR SER CIDADÃO – Carina Amancio

23
A IMPORTÂNCIA DOS EDUCADORES NO PROCESSO DE
APRENDIZAGEM DA CRIANÇA ATRAVÉS DE BRINCADEIRAS
LÚDICAS NA ERA DA TECNOLOGIA – PONTE, Elisa Maria Brito da
Silva

28
A CONTRIBUIÇÃO DA ARTE NA EDUCAÇÃO INFANTIL –
Daniela Costa da Silva

AS RELAÇÕES AFETIVAS NO CONTEXTO ESCOLAR: COMO

33 SE ESTABELECER O DESENVOLVIMENTO COGNITIVO–


Jéssica dos Santos Silva

DIFICULDADE DE APRENDIZAGEM, A DISLEXIA - UMA

42 INTERFERÊNCIA PEDAGÓGICA E PSICOPEDAGÓGICA –


Jéssica dos Santos Silva

TRANSTORNO DE DÉFICIT DE ATENÇÃO E

49 HIPERATIVIDADE (TDAH) – Jéssica dos Santos Silva

A LUDOPEDAGOGIA E SUA RELAÇÃO COM OS BRINQUEDOS,

61 BRINCADEIRAS, JOGOS DE INFLUÊNCIA INDÍGENA,


PORTUGUESA E AFRICANA NO BRASIL – Mônica Schweiger

O JOGO TEATRAL COMO PROSTA DE DESENVOLVIMENTO

74 PSICOMOTOR PARA AUXÍLIO DA APRENDIZAGEM – Maíra


Banheza de Almeida

A IMPORTÂNCIA DO ENSINO DE ARTES NA EDUCAÇÃO

84 INFANTIL – Maria Luzineide Siqueira

8 INEQ - Educação integral


SUMÁRIO
91
A ARTICULAÇÃO DAS VÁRIAS FACETAS DO PROCESSO DE
APRENDIZAGEM INICIAL DA LÍNGUA ESCRITA – Nájara
Nogueira Damasceno

103
AVALIAÇÃO NA EDUCAÇÃO INFANTIL: IMPORTÂNCIA,
MODALIDADES, INSTRUMENTOS E ÂMBITOS – Natalia
Rodrigues Martyniak

RPG E EDUCAÇÃO: COMO O JOGO PODE AUXILIAR NA

113 APRENDIZAGEM ESCOLAR – Patrícia Aparecida Rossi Batista

DIRETRIZES DA EDUCAÇÃO ESPECIAL NA REDE

118 MUNICIPAL DE ENSINO DE SÃO PAULO: DESAFIOS E


CONSIDERAÇÕES – Renata dos Santos Iokoiama Ramalho

O PROCESSO DE ALFABETIZAÇÃO E LEITURA NA

124 EDUCAÇÃO INFANTIL – Rita De Cássia Mendonça França

SÍNDROME DE DOWN: CAMINHOS PARA A INCLUSÃO

131 SOCIAL E EDUCACIONAL – Sidney Mauricio dos Santos

A FORMAÇÃO DOCENTE COMO FERRAMENTA REFLEXIVA

136 – Simone Maria da Silva Barreto

O LÚDICO COMO RECURSO PEDAGÓGICO PARA O

148 ENSINO/APRENDIZAGEM SIGINIFICATIVA – Vanda Ramos


Mesquita

HIPERATIVOS NA ESCOLA O PAPEL DO EDUCADOR NO

155 DESENVOLVIMENTO DOS ALUNOS COM TDAH – Viviane


Bezerra Cavalcanti

O IMPACTO DA LEGISLAÇÃO E DAS PRESCRIÇÕES

162 PEDAGÓGICAS NO COTIDIANO DO PROFESSOR DE


HISTÓRIA, O FIM DA DISCIPLINA DE HISTÓRIA E A
CHEGADA DOS ESTUDOS SOCIAIS, BRASIL (1971-1989)
– Washington Barros

INEQ - Educação integral 9


O ENSINO DE ARTES VISUAIS
NA EDUCAÇÃO INFANTIL NO
CONTEXTO DAS DIRETRIZES
CURRICULARES DO BRASIL.

Bruno Alberto dos Santos Cyriaco¹

RESUMO lation that deals with the subject, in addition to


a historical path about the evolution of the sub-
O objetivo do presente texto é trazer uma aná- ject over the years. Finally, we will present the
lise sobre o ensino de artes visuais na Educa- history of teaching visual arts, specifically and
ção Infantil, por meio de uma revisão bibliográ- how the Early Childhood Education teacher can
fica. Para tanto, faremos um percurso sobre a make the best of it to teach students.
definição de Arte, qual sua importância e sua Keywords: Visual Arts; Child education; Art;
função; passando pelas particularidades do Education.
ensino de Arte nas escolas brasileiras, anali-
sando a legislação vigente que trata sobre o INTRODUÇÃO
assunto, além de um percurso histórico sobre
a evolução da matéria ao longo dos anos. Por O Ensino de Artes Visuais fomenta a amplia-
fim, apresentaremos a história do ensino de ar- ção da aquisição de conhecimentos e poten-
tes visuais, especificamente e como o profes- cialidades por parte do aluno. Através da Arte
sor de Educação Infantil pode extrair o melhor a criança pode se expressar, expor seus sen-
dela para ensinar os alunos. timentos e ideias, ampliar sua relação com o
Palavras-chave: Artes Visuais; Educação In- mundo ao seu redor. Assim sendo, ele utiliza
fantil; Artes; Educação. as Artes Visuais como uma forma de expres-
são, adquire sensibilidade e competência para
ABSTRACT lidar com formas, cores, imagens, gestos, sons
e demais expressões.
The purpose of this text is to bring an analysis
of the teaching of visual arts in Early Childhood As Artes Visuais e o conhecimento da imagem
Education, through a bibliographic review. For são de grande importância na Educação Infan-
that, we will make a journey on the definition til, se tornam fundamentais para o desenvolvi-
of Art, what is its importance and its function; mento cognitivo, afetivo, motor e perceptivo da
going through the particularities of Art teaching criança. É importante utilizar a Arte como um
in Brazilian schools, analyzing the current legis- recurso que auxilia na formação da criança,

1 - Graduação em Pedagogia pela Faculdade Associada Brasil (2016) Graduação em Geografia pela FCT UNESP em
Geografia (2008); Professor Ensino Fundamental II e Assistente de Diretor de Escola de Educação Infantil na Rede
Municipal de Educação de São Paulo.

10 INEQ - Educação integral


trabalhando-a não como passatempo ou um seu o registro histórico, e consequentemente a
recurso decorativo, mas sim como uma forma História da Arte.
de aprendizagem, cheia de objetivos importan-
tes no desenvolvimento do aluno. Arte está dividida em quatro áreas, que se sub-
dividem em várias outras linguagens as quais
As Artes Visuais estão presentes no cotidiano pode ser representada de diversas formas de
de forma marcante, atualmente é preciso notar expressão que possuem características, mé-
a importância da imagem na cultura. É viven- todos, suportes, e realizações distintas, ainda
ciando a Arte desde criança que a sociedade que possam ser usadas ao mesmo tempo, na
aprenderá a valorizar a sua cultura. Elas repre- mesma obra ou ainda juntas, criando assim ou-
sentam um saber artístico que proporcionará o tra linguagem artística. Seguem alguns exem-
desenvolvimento estético, criativo e expressi- plos de algumas formas de expressão: pintura,
vo da criança na Educação Infantil, auxiliando desenho, escultura, arquitetura, música, dança,
no seu processo de formação intelectual, afe- teatro, literatura, gravura, fotografia, cinema,
tivo e social. cerâmica, tecelagem, grafite, banda desenha-
da (história em quadrinhos, mangá, tira e car-
É relevante acentuar que o educador é o prin- tum), jogos de computadores, vídeos, e etc.
cipal sujeito mediador da aprendizagem no
Ensino de Artes Visuais, devendo interagir com A arte também está presente na sociedade em
os alunos e motivando-os a ter gosto ao fazer profissões que são exercidas nos mais dife-
Arte, despertando-lhes o interesse pelas ativi- rentes ramos de atividades; o conhecimento
dades artísticas. em artes é necessário no mundo do trabalho
e faz parte do desenvolvimento das pessoas.
1. O que é a Arte? Ela pode ser definida, como algo inerente ao
ser humano, uma maneira de expressar senti-
Em regra geral, não existe definição para o sig- mentos e emoções, com o objetivo de estimu-
nificado do que é arte. No entanto, ela pode ser lar o interesse da consciência de um ou mais
compreendida como uma forma de expressão expectadores, ou intrigar outros, além de criar
humana, abrangendo a percepção, a emoção, uma discussão crítica sobre alguma coisa. A
e a razão. arte também é uma forma de buscar a com-
preensão do universo circundante, ela é mais
A palavra arte vem do latim e significa técnica uma maneira do homem constituir a realidade.
e habilidade natural ou adquirida de fazer algo Através da arte, o homem busca explicações
ou alguma coisa. A arte pode ser considerada para seus conflitos, suas angústias, para seus
o primeiro legado da humanidade, através dela dramas. Sobre isso Vygotsky (1991-1999) afir-
é que tivemos conhecimento de nossa Histó- ma que:
ria, pois ela remota ao passado humano mui-
to antes da Escultura, Literatura, Arquitetura, e [...] Destacam-se as funções: social,
até mesmo antes da escrita. Podemos encon- biológica e psicológica da arte. Ele fala
trar esses registros históricos nas pinturas ru- da arte como ’técnica social do senti-
pestres, que retratam como era a vida do ser mento’ (1999, p.3; 315), e afirma que ‘’a
humano naquela época. É com a arte que se arte sistematiza um campo inteiramen-
inicia propriamente a história da humanidade, te específico do psiquismo do homem

INEQ - Educação integral 11


social –precisamente o campo do seu Cada expressão artística possui um significa-
sentimento’(VYGOTSKY, 1991, p.12). [...] do único, diferente e representa a criatividade,
Aponta para a ‘’possibilidade [do ser hu- que é uma potencialidade do ser humano e
mano] superar na arte as suas maiores sua realização é uma das necessidades huma-
paixões que não encontram vazão na nas, uma vez que por meio dela despertamos
vida normal (idem, p.3110), o que para a imaginação, a concentração, a coordenação
ele constitui o fundamento do campo motora e a realização.
biológico da arte, equilibrando o organis-
mo com o meio. Ele entende que na arte Toda criação é a consequência do trabalho fei-
está contida a possibilidade de se com- to pelo homem. Ela expressa a personalidade
pletar a vida e ampliar as suas possibili- do autor, mostram o período onde foram cria-
dades. (VYGOTSKY, 1999, p.3112) das e suas influências culturais. A arte contri-
bui para desenvolver o máximo de aptidões
Esse é um dos muitos conceitos usados para possíveis no ser humano.
definir o que é arte. Contudo a arte também
deve ser vista como algo que contemple e res- Por ser uma linguagem aguçadora dos sen-
peite a diversidade étnica, religiosa, estética, tidos, a arte transmite significados que não
social, política e sexual, o fazer artístico deve podem ser ligados por meio de nenhum outro
ser compreendido sempre em uma perspecti- conhecimento, ela não possui linguagem dis-
va multicultural, que inclui e é democrática. cursiva e nem cientifica. Dentre as outras áre-
as de arte, as artes visuais, por ter a imagem
Devemos levar em conta, e considerar como como matéria prima, possibilita a visualização
arte, o fazer artístico das pessoas que fazem de quem somos, onde estamos e como senti-
parte das culturas de minorias, como por mos.
exemplo, as pessoas com problemas psiquiá-
tricos e portadores de necessidades especiais. Na atualidade, as aulas de arte, que possuem
Podemos tomar como exemplo o Museu de um caráter voltado para a educação e o desen-
Imagem do Inconsciente, que defende o direito volvimento do indivíduo, e do seu senso crítico
de artistas que compõem essas minorias. e afetivo, está sendo desvalorizada. Durante as
aulas, os professores buscam apenas incenti-
Outro fato de suma importância é o que diz var a apreciação das grandes obras de arte,
respeito ao reconhecimento da condição das e não provocam em seus alunos a busca por
mulheres na arte, mesmo sendo inúmeras investigar a capacidade criadora que existe
as produções acadêmicas e produtivas para dentro de cada um. Mediante o uso das várias
a arte, são em minoria que se destacam na linguagens da arte, conseguimos demonstrar a
História da Arte, e nos processos de criação, importância da mesma na vida.
reprodução e comercialização e nos debates
sobre a manifestação artística. Deste modo 2. Orientações das Diretrizes Curriculares Na-
faz-se necessário uma maior inclusão desses cional do Ensino da Arte no Brasil
grupos nesse processo, e isso é feito por meio
de debates que ponha em evidência a função Na proposta geral dos Parâmetros Curricula-
da arte. res Nacionais, Arte tem uma função tão impor-
tante quanto a dos outros conhecimentos no

12 INEQ - Educação integral


processo de ensino e aprendizagem. A área de sentido para a valorização do que lhe é próprio
Arte está relacionada com as demais áreas e e favorecer abertura à riqueza e à diversidade
tem suas especificidades. A educação em arte da imaginação humana.
propicia o desenvolvimento do pensamento ar-
tístico e da percepção estética, que caracteri- Além disso, torna-se capaz de perceber sua
zam um modo próprio de ordenar e dar sentido realidade cotidiana mais vivamente, reconhe-
à experiência humana: o aluno desenvolve sua cendo objetos e formas que estão à sua volta,
sensibilidade, percepção e imaginação, tanto no exercício de uma observação crítica do que
ao realizar formas artísticas quanto na ação existe na sua cultura, podendo criar condições
de apreciar e conhecer as formas produzidas para uma qualidade de vida melhor. Uma fun-
por ele e pelos colegas, pela natureza e nas ção igualmente importante que o ensino da
diferentes culturas, conforme diz Santomauro arte tem a cumprir diz respeito à dimensão so-
(2019): cial das manifestações artísticas.

Durante muitos anos, o ensino de Arte A arte de cada cultura revela o modo de perce-
se resumiu a tarefas pouco criativas e ber, sentir e articular significados e valores que
marcadamente repetitivas. Desvaloriza- governam os diferentes tipos de relações entre
das na grande curricular, as aulas dificil- os indivíduos na sociedade. A arte solicita a vi-
mente tinham continuidade ao longo do são, a escuta e os demais sentidos como por-
ano letivo. “As atividades iam desde ligar tas de entrada para uma compreensão mais
pontos até copiar formas geométricas. A significativa das questões sociais. Essa forma
criança não era considerada uma produ- de comunicação é rápida e eficaz, pois atinge
tora e, por isso, cabia ao professor dirigir o interlocutor por meio de uma síntese ausente
seu trabalho e demonstrar o que deveria na explicação dos fatos. A arte também está
ser feito”, afirma Rosa Lavelberg, direto- presente na sociedade em profissões que são
ra do Centro Universitário Maria Antônia, exercidas nos mais diferentes ramos de ativi-
em São Paul, e coautora dos Parâmetros dades; o conhecimento em artes é necessário
Curriculares Nacionais (PCN’s) sobre a no mundo do trabalho e faz parte do desenvol-
disciplina. (SANTOMAURO, 2019) vimento profissional dos cidadãos.

Esta área também favorece ao aluno relacio- O conhecimento da arte abre perspectivas para
nar-se criativamente com as outras discipli- que o aluno tenha uma compreensão do mun-
nas do currículo. Por exemplo, o aluno que do na qual a dimensão poética esteja presente:
conhece arte pode estabelecer relações mais a arte ensina que é possível transformar con-
amplas quando estuda um determinado perí- tinuamente a existência, que é preciso mudar
odo histórico. Um aluno que exercita continua- referências a cada momento, ser flexível. Isso
mente sua imaginação estará mais habilitado quer dizer que criar e conhecer são indissoci-
a construir um texto, a desenvolver estratégias áveis e a flexibilidade é condição fundamental
pessoais para resolver um problema matemá- para aprender. O ser humano que não conhece
tico. Conhecendo a arte de outras culturas, o arte tem uma experiência de aprendizagem li-
aluno poderá compreender a relatividade dos mitada, escapa-lhe a dimensão do sonho, da
valores que estão enraizados nos seus modos força comunicativa dos objetos à sua volta, da
de pensar e agir, que pode criar um campo de sonoridade instigante da poesia, das criações

INEQ - Educação integral 13


musicais, das cores e formas, dos gestos e lu- Apreciação - percepção do sentido que
zes que buscam o sentido da vida. o objeto propõe, articulando-o tanto aos
elementos de linguagem visual quanto
3. O Ensino de Artes visuais na Educação In- aos materiais e suportes utilizados, vi-
fantil sando desenvolver, por meio da observa-
ção e da fruição a capacidade de constru-
As Artes Visuais na Educação Infantil apre- ção de sentido, reconhecimento, análise
sentam grandes oportunidades de desenvol- e identificação de obras de arte e de seus
vimento na aprendizagem da criança, pois produtores; Reflexão - considera tanto no
permitem ampliar o conhecimento do mundo fazer artístico como na apreciação, é um
em que está inserido, de suas habilidades e a pensar sobre todos os conteúdos do ob-
descoberta de suas potencialidades. Além dis- jeto artístico que se manifesta em sala,
so, estão presentes no cotidiano das crianças compartilhando perguntas e afirmações
que se expressam, comunicam e demonstram que a criança realiza instigada pelo pro-
seus sentimentos, pensamentos, emoções por fessor e no contato com suas próprias
vários meios, dentre eles: linhas, formas, rabis- produções e as dos artistas. (BRASIL,
car e desenhar no chão, na areia, em muros, 1998, p.89)
usando diversos materiais que são encontra-
dos por acaso pelas crianças. Muitos professores da Educação Infantil va-
lorizam as Artes Visuais por trazerem oportu-
As Artes Visuais são representadas por toda nidades de auto expressão e proporcionarem
forma de expressão visual como pintura, dese- grandes descobertas à criança pequena. As
nho, escultura, colagem, fotografia, cinema, ar- crianças menores se expressam por meio das
quitetura, o paisagismo, a decoração e outras atividades artísticas, das questões abstratas
linguagens. Elas promovem a interação e a co- e complexas que as mesmas não conseguem
municação da criança, representam uma for- transmitir para os adultos por meio de outras
ma de linguagem, por isso é importante esse linguagens.
ensino na Educação Infantil, para possibilitar o
desenvolvimento da imaginação, da criativida- A linguagem visual também é uma forma mui-
de, da cognição, da intuição e da sensibilidade. to importante de expressão e comunicação.
A Arte contribui para a formação intelectual da Se manifesta através de desenhos, pinturas,
criança, favorece a ação espontânea, facilita a esculturas, modelagens e tem grande signifi-
livre expressão e permite a comunicação. As cação, principalmente na Educação Infantil,
Artes Visuais representam um tipo de lingua- período em que a criança busca na imagina-
gem que tem características próprias e sua ção maneiras de se expressar.
aprendizagem acontece por meio dos seguin-
tes aspectos: Os educadores da Educação Infantil, muitas
vezes, não dão o devido valor ao trabalho com
Fazer artístico - centrado na exploração, as Artes Visuais dentro da sala de aula, usam
expressão e comunicação de produção as atividades artísticas apenas para acalmar o
de trabalhos de arte por meio de práticas ambiente e as crianças, para decorar a sala de
artísticas, propiciando o desenvolvimen- aula, para aprofundar mais sobre um determi-
to de um percurso de criação pessoal; nado conteúdo e para seu próprio descanso,

14 INEQ - Educação integral


propondo aos alunos desenhos e pinturas que, O educador deve propiciar aos alunos um am-
depois, não são explorados. biente adequado, com diversas superfícies,
materiais e instrumentos, de forma que tenham
As atividades artísticas devem ter maior rele- contato com uma gama maior de possibilida-
vância para o educador da Educação Infantil, des para se expressar. Com mais recursos e
deve haver uma interação entre ele e os alunos mais estímulos ele poderá conhecer novas téc-
de forma prazerosa para que criem suas pró- nicas, novos materiais, texturas, misturas de
prias produções. Entretanto, é preciso que se cores e tintas, desenvolvendo seus sentidos e
construa o ensino de métodos e técnicas para posteriormente sua intelectualidade. É impor-
o uso do material e para o processo criativo, tante também, que esse ambiente ofereça con-
não deixando que a aula vire um momento de dições favoráveis para os alunos, como como-
desordem e bagunça, e sim de aprendizado. didade e conforto, para que possam produzir
com criatividade e autonomia seus trabalhos
O professor deve provocar a atitude criadora artísticos.
do aluno, ser fomentador do pensamento, da
sensibilidade, do questionamento, da cons- A didática usada no Ensino de Artes Visuais
trução de novas ideias, desafiando-o e provo- deve ser interessante, prazerosa e estimular a
cando situações de criação. São diversas as curiosidade da criança. O educador deve evitar
técnicas de Artes Visuais usadas na Educação repetição e atividades mecânicas em sua didá-
Infantil, todas trazem possibilidades para os tica e mediar o processo de forma significati-
alunos aumentarem seu potencial criador, para va. Deve promover oportunidades para o aluno
isso é preciso que o educador ofereça varia- manipular o material didático, pois dessa for-
dos suportes e materiais como recurso de ma- ma eles criam interesse em saber do que se
nipulação e expressão. trata, de que material é feito, tendo oportunida-
de de experimentá-lo e compreendê-lo.
O desenho, a pintura e a colagem das
crianças são marcas que elas deixam a O material didático utilizado pelo educador é
partir de sua relação com o mundo, em um apoio indispensável para um bom trabalho
diálogo permanente com seu imaginário. com Artes Visuais dentro da sala de aula. Esse
São marcas pessoais. Portanto, é muito material deve despertar a curiosidade dos alu-
importante percebermos que cada crian- nos, provocar estímulos e interesse pelo as-
ça tem um jeito próprio de se expressar: sunto.
traços com mais vigor ou mais leves,
ocupando o espaço todo ou apenas um Os educadores devem oferecer diversas ativi-
cantinho, usando muitas cores ou esco- dades artísticas em seu planejamento, que es-
lhendo apenas uma etc. Nós professo- timulem e despertem a criatividade do aluno,
res(as), que lidamos dia-a-dia (sic) com incluindo desenhar com lápis, giz de cera, ca-
meninos e meninas e suas produções neta, pintar com diferentes tintas em diferen-
culturais, seremos capazes de reconhe- tes superfícies, criar também obras tridimen-
cer a produção de cada criança mesmo sionais.
que não tenha nome escrito se possibi-
litarmos que os pequenos se expressem Algumas crianças serão mais hábeis
com autoria. (BRASIL, 2006, p.48) com canetas, outras com tintas, e outras

INEQ - Educação integral 15


terão mais facilidade, usando argila do Com sua ajuda e seus comentários, os alunos
que arame. Algumas preferirão materiais dão forma a seus desenhos, ganham confian-
como as tintas, a meios mais controla- ça com as sugestões e aprimoram suas pro-
dos e precisos como as canetas. Ao ex- duções. Segundo o Referencial Curricular Na-
por as crianças a diferentes meios e ao cional para Educação Infantil (1998, p.107): “A
se tornarem sensível aos aspectos que organização do tempo em Artes Visuais deve
distinguem os trabalhos artísticos de respeitar as possibilidades das crianças relati-
seus alunos, o professor terá um quadro vas ao ritmo e interesse pelo trabalho, ao tem-
mais completo de cada criança. (KRE- po de concentração, bem como ao prazer na
CHEVSKY, 2001, p.146) realização das atividades.”

No espaço escolar, o aluno deverá ser incenti- É necessário que o educador conheça o pro-
vado a realizar variadas atividades artísticas, cesso de desenvolvimento de cada criança e
e para isso, o educador de Artes Visuais deve ofereça atividades que despertem a criativida-
usar procedimentos que o façam construir ha- de natural e inovadora que cada uma tem. Para
bilidades para criar o próprio trabalho e tam- que elas adquiram gosto pelo que fazem, o
bém analisar e apreciar a produção dos cole- educador deve sempre estimulá-las, valorizan-
gas, da arte local e a do patrimônio artístico. do a produção de cada uma sem fazer com-
Ao apresentar um objeto de estudos para seus parações, pois cada uma tem características e
alunos ou uma obra de arte, o educador deve habilidades diferentes.
usar ações como apreciação, produção e tam-
bém a contextualização, pois todas são im- Existem ainda pessoas que têm como ideia
portantes ao trabalhar com a Arte e não existe que somente o pedagogo tem a competência
sequência correta dessas três ações, quanto para trabalhar Artes na Educação Infantil, mas
mais variações da ordem, os alunos experien- um educador com formação adequada contri-
ciarem, mais serão fortalecidos no processo buirá de uma forma diferenciada para o pro-
criativo. cesso de formação do aluno. O ideal seria se
o trabalho do pedagogo fosse juntamente com
Ao proporcionar a apreciação de obras de Arte o educador de Artes Visuais, esta parceria po-
de diferentes artistas para os alunos, é impor- deria proporcionar um aprendizado muito mais
tante que o educador argumente sob a relevân- potencializado, e também poderia haver uma
cia e valor histórico de cada uma, estimulando troca de experiências entre os profissionais.
a autonomia da criança na apropriação artísti-
ca cultural, criar oportunidade para falar o que O educador deve sempre renovar suas práticas
vê e o que sente, despertando-lhe a curiosida- educativas, usando métodos de ensino diversi-
de e sensibilidade. Assim, amplia-se o conheci- ficados, ser flexível às mudanças, pois sempre
mento cultural e artístico da criança. vai encontrar crianças que não vão se adaptar
O educador deve estar atento e avaliar as ca- com certa atividade e há momentos em que a
pacidades artísticas dos alunos. Em um cur- mudança é essencial, principalmente ao traba-
to espaço de tempo, a criança usa diferentes lhar com as Artes Visuais, para não tornar can-
formas para desenhar um assunto de seu sativas e desinteressantes certas atividades.
interesse e o professor deve atentar a essas
mudanças e aos avanços no processo criativo. Fazer Arte deverá ser um momento de alegria

16 INEQ - Educação integral


para o aluno, o educador deve estimular a es- xiliar no processo de ensino-aprendizagem e
pontaneidade, valorizar mais o processo do fazer com que aprendam de forma criativa e
que o produto final, valorizando cada traço que prazerosa, pois é pela vivência que a criança
o aluno faz e ao final de cada produção artísti- desperta sua imaginação e também cria um
ca, expô-las e elogiar cada produção elevando bom relacionamento com o mundo e com sua
assim a autoestima da criança. realidade.

Dessa forma, é muito importante que o edu- 4. A Criança de 2 e 3 anos e sua relação com a
cador trabalhe com motivação e entusiasmo Arte no contexto da Educação Infantil
e esteja comprometido ao trabalhar com as
Artes Visuais na Educação Infantil. Assim as A Educação Infantil é a primeira etapa da Edu-
crianças criam gosto pelo que fazem, contri- cação Básica e tem por objetivo desenvolver
buindo de modo significativo para seu aprendi- a criança em todos os seus aspectos, sendo
zado. De acordo com o Referencial Curricular eles, físico, psicológico, intelectual e social.
Nacional para Educação Infantil: Este direito está assegurado pela Lei que rege
a educação, a Lei de Diretrizes e Bases da Edu-
As instituições de educação infantil de- cação Nacional, (LDBEN - Lei n° 9394/96).
vem favorecer um ambiente físico e so-
cial onde as crianças se sintam prote- Nesta etapa, as classes são organizadas se-
gidas e acolhidas, e ao mesmo tempo guindo o critério de idade. Para crianças de até
seguras para se arriscar e vencer desa- três anos de idade há a denominação creche e
fios. Quanto mais rico e desafiador for para crianças de quatro a cinco anos de idade
esse ambiente mais ele possibilitará a chama-se pré-escola. Na prática, as creches
ampliação de conhecimentos acerca de podem ser organizadas da seguinte forma:
si mesmas, dos outros e do meio em que Berçários (para crianças de até 1 ano e meio) e
vivem. (BRASIL, 1998, p.15) Maternal (crianças de 1 ano e meio até 3 anos
e 11 meses). Já a pré-escola é denominada
É muito importante a experiência do educador por períodos: 1° período (crianças de 4 anos)
e também o conhecimento do mundo que ele e 2° período (crianças de 5 anos a 5 anos e 11
possui, para ensinar de forma significativa e meses).
compartilhar suas experiências nas aulas.
Para este estudo, a abordagem de relação com
As Artes Visuais trabalham com o mundo do a Arte será feita com foco no segmento do Ma-
possível, tanto no seu processo de apreciação, ternal, mais especificamente crianças na faixa
quanto também no seu processo de criação. etária de dois e três anos. A criança com idade
Para que a aprendizagem aconteça de forma entre dois e três anos encontra-se em um pe-
significativa é importante que os ambientes ríodo propício ao desenvolvimento, muitas são
educacionais abram espaços para os alunos as descobertas realizadas por ela neste perí-
se expressarem e comunicarem. odo, além do seu interesse em explorar tudo
que a cerca.
Dessa forma, é relevante desde cedo, trabalhar
com a Arte dentro da sala de aula, propor o A criança com idade entre dois e três anos vi-
contato dos alunos com as Artes Visuais, au- vência novas possibilidades de aprendizagem

INEQ - Educação integral 17


em relação à sua anterior condição. Muitos Ela olha, toca, sente e se alegra com esse ato.
são os avanços que vão aparecendo tanto do E através destas vivências vai descobrindo o
ponto de vista afetivo, quanto em relação ao que é capaz de produzir. O significado aqui se
cognitivo e psicomotor. Dentre as capacidades encontra na ação, e em se tratando de Artes
a serem desenvolvidas nesta idade destacam- Visuais, o contato principalmente com a tinta,
-se a comunicação e o desenvolvimento da é para a criança uma das atividades mais inte-
linguagem. Por volta dos dois anos surge tam- ressante e prazerosa.
bém a conduta do jogo simbólico ou brincadei-
ra de “faz-de-conta”. Este se caracteriza pela CONSIDERAÇÕES FINAIS
presença da brincadeira imaginária, em que a
imaginação permite à criança vivenciar diver- Ao longo da pesquisa percebemos a necessi-
sos papéis. Através deste jogo a criança des- dade do Ensino de Artes Visuais na Educação
perta sua capacidade de simbolizar, ou seja, Infantil, que a educação através da Arte con-
incorpora a realidade exterior à sua realidade tribui no desenvolvimento da criatividade, da
interior, transformando o real em fantasia. autonomia e da espontaneidade. Desta forma,
conforme se adquire interesse pela Arte os in-
O desenho também dá um salto qualitativo divíduos se tornam mais críticos e reflexivos.
durante este período. Os primeiros desenhos
das crianças são chamados de garatujas. Es- O principal propósito do Ensino de Artes Visu-
tes desenhos como afirma Araújo (2014), são ais é proporcionar possibilidades na vida das
simples jogos de exercício, pois não tem a in- crianças, e deve ser percebido como forma de
tenção de representar algo. É por volta de 2 construção do conhecimento, de compreensão
anos a 2 anos e meio que a criança começa a do mundo e exteriorização de sentimentos.
dar significado ao mesmo, reconhecendo-o e Assim sendo, as Artes Visuais na Educação
nomeando-o. Infantil é de muita relevância para vivenciarem
suas experiências, se expressarem, ampliarem
Philippe Greig em seu estudo A criança e seu o conhecimento, desenvolverem o pensamen-
desenho afirma que por volta de 2 anos e meio to criativo e estético.
a criança já apresenta o domínio dos traços
sobre o papel e por volta dos três anos já é Vivenciando a Arte desde cedo que se aprende
possível perceber a presença de círculos nos a valorizar a cultura de uma sociedade. Para
desenhos infantis. Segundo Greig (2004) ao re- isso, é necessário um novo olhar sobre o En-
alizar esses rabiscos primitivos a criança dei- sino de Artes Visuais nas escolas, pois, para
xa sua marca, muitas vezes ao simples acaso uma aprendizagem significativa é essencial o
dos movimentos que o braço consegue fazer. comprometimento do educador, como o pla-
Estes movimentos vão se aprimorando pouco nejado nas atividades, definição de objetivos
a pouco. a serem alcançados e utilização de materiais
diversificados.
Como muito bem afirma Greig (2004), a criança
nesta idade adora experienciar objetos e mate- O educador é o principal sujeito mediador da
riais. A criança está aberta a experimentar, não aprendizagem em Artes Visuais, e deve intera-
se preocupando em se sujar, ou estragar algo, gir com as crianças, motivando-as a ter gosto
ela não tem medo de tocar, sentir, conduzir. ao fazer Arte, despertando-lhes o interesse pe-

18 INEQ - Educação integral


las atividades artísticas e desenvolvendo suas KRECHEVSKY, M. Avaliação na Educação In-
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INEQ - Educação integral 19


LUTA POR SER CIDADÃO

Carina Amancio

RESUMO e tráfico de escravizados tivesse que encontrar ma-


neiras de sobreviver economicamente. Assim como
O artigo busca mostrar pontos de vistas diferentes as construções sociais de superioridade da cor de
sobre a escravidão no mundo, retratando a difícil pele branca, começaram a sofrer contestações, fa-
busca por liberdade e igualdade. Desse modo, fo- zendo com que assim não só o valor social das pes-
ram retratados dois filmes, buscando mostrar a rea- soas negras passasse a ser levado em conta, mas
lidade do que era feito durante a triste época em que também o da população indígena (massacrada em
seres humanos eram traficados como peças. todo o Brasil com o passar dos séculos).
Palavra-chave: Liberdade; Escravidão; Cidadania.
Atualmente, há uma lacuna social e econômica en-
ABSTRACT tre a população negra com a população que se diz
branca no Brasil. Mesmo que o tempo tenha passa-
The article seeks to show different points of view do e que a história tenha começado a ser reescrita
about slavery in the world, portraying the difficult se- pelo ponto de vista de quem foi duramente escra-
arch for freedom and equality. Thus, two films were vizado durante o século XX, é muito difícil mudar o
portrayed, seeking to show the reality of what was fato social que foi a escravidão perante aos olhos de
done during the sad time when human beings were uma sociedade que sempre inferiorizou uma e sub-
trafficked as pieces. jugou pessoas em favor de seu próprio lucro. Desta
Keyword: Freedom; Slavery; Citizenship. forma, não só a sociedade afro-descendente, mas
também os indígenas passaram a não ser represen-
O ser cidadão é um conceito que foi amplamente tados, de forma que essas pessoas ficam a margem
debatido ao longo dos séculos. Em períodos onde da sociedade até hoje.
determinados seres humanos foram considerados
mercadorias, a representação de ser humano foi Mesmo que o mundo em grande parte seja racista,
deixada de lado. E é como forma de nunca mais em alguns lugares do mundo, essas pessoas ten-
repetir tais crimes contra toda uma sociedade, que tam se reerguer e mostrar sua perspectiva sobre a
hoje, representações cinematográficas discutem o escravidão e a forma com que as pessoas negras,
que já se passou e o que é ficar durante toda uma por exemplo, foram e continuam sendo tratadas
vida a margem da sociedade apenas por um fator: a pela sociedade, dois exemplos são os filmes "eu
cor da pele. não sou seu negro" e "12 anos de escravidão".

Uma nação nascida da miséria e escravidão de vidas Com um protagonista que procura causar descon-
mudou seu rumo em 1.888, quando novas leis surgi- forto emocional e provocar reflexões, o filme 12
ram e o trabalho escravizado tornou-se ilegal. Fazen- anos de escravidão começa em uma plantação de
do com que a população que vivia com o comercio cana, onde é representada a vida do escravizado,

20 INEQ - Educação integral


mostrando assim a dura realidade da vida des- os escravizados trabalhem para os brancos e que
sas pessoas. Tudo passou a ser representado, o sejam seus objetos em troca da entrada para o
que comiam, onde dormiam e o que tinham que céu.
fazer para conseguir direitos básicos, como por
exemplo, poder escrever sem ser torturado por O aspecto feminino da escravidão também é
isso, utilizando frutas e sua própria comida para retratado no filme, as escravizadas além de so-
que ninguém notasse. Vale lembrar, que conse- frerem a exploração nas plantações também so-
guir escrever escondido passa a ser um privilé- frem exploração sexual. A submissão ao branco
gio, pois até então o processo de alfabetização em busca da sobrevivência começa a tomar con-
era negado aos escravizados, sendo punível com ta do protagonista, ele para de pensar em sua re-
açoites e torturas. alidade e simplesmente é continua trabalhando.

Outra imposição aos escravizados era a proibi- Não só realidade do negro é mostrada no filme,
ção de qualquer manifestação escrita, não po- como a realidade do branco também, um diálogo
dem ler, ou ter uma profissão, pois eles eram entre o protagonista e um branco que trabalha-
considerados "peças" as quais podiam ser com- va para os fazendeiros revela as complicações
pradas por um fazendeiro, e para exercer as suas mentais de se torturar escravizados: para man-
funções não precisavam de nada além de Deus ter a sanidade mental, era preciso inventar uma
e do esforço braçal. Assim, como lhes são ti- mentira a fim de se convencer de que o que ele
rados todos os direitos, aqueles que sabem ler está fazendo é certo, ou se retaliar dia a dia, en-
ou escrever, por exemplo, não podiam falar aos ganando o sentimento de culpa que está sen-
escravagistas que tinham esses conhecimentos tindo, virando muitas vezes alcoólatra, ou tendo
para não sofrer torturas, esse ódio vem do medo comportamentos extremamente agressivos.
dos "brancos" de se igualarem a um escraviza-
do, pois este é uma peça para tais pessoas, não No final, o protagonista volta para a sua famí-
um ser humano. Ou seja, ocorre a objetificação lia, com a ajuda de um homem branco inglês,
dessas pessoas, eles, portanto, não têm direito tornando-se uma das poucas vítimas do tráfico
ao nome, corpo e nem mesmo os próprios filhos, de negros a retornar para a sua vida normal. O
uma frase do filme, dita por um fazendeiro, que protagonista ainda abriu um processo contra o
resume esse conceito é: “ um homem faz o que proprietário, perdendo a causa por não poder tes-
quiser com o que é dele” .Aquelas pessoas que temunhar contra brancos, revelando o forte pre-
foram escravizadas desde que nasceram já têm conceito da sociedade estadunidense da época.
noção do que devem ou não fazer, e após tan-
ta repressão durante suas vidas já se contenta- Agora, o filme “Eu não sou seu negro” traz a histó-
ram em não rebelar-se, o que é um choque para ria da luta contra o racismo nos Estados Unidos
o protagonista do filme, pois este teve uma vida da América (EUA) ao abordar a história de 3 esta-
sem escravidão e não se conforma com os limi- dunidenses negros que tiveram papel importante
tes impostos por tal atrocidade humana que é a nessa luta (e que morreram na década de 60),
escravidão. são eles: Medgar Evers, Malcolm X e Martin Lu-
ther King Jr. O livro de James Baldwin, que nunca
A fim de doutrinar os escravizados, evitando re- foi terminado, é o roteiro do filme.
beliões, os fazendeiros usavam a religião como
ferramenta, isso é mostrado na cena em que um O filme dialoga com o passado e presente do ra-
dos fazendeiros reúne os escravizados, e com a cismo estadunidense, mostrando como tudo o
Bíblia na mão, começa a fazer falsas citações do que foi dito e previsto no século 20 sobre a luta
conteúdo do livro, alegando que Deus deseja que negra contra o racismo continua ou está aconte-

INEQ - Educação integral 21


cendo no século 21. Outro aspecto retratado na Enquanto que os dois filmes tratam da vida dos
obra é minimização do sofrimento das pessoas negros nos EUA, o primeiro “12 anos de escra-
negras nos EUA, mostrando no cinema, propa- vidão” foca nos tempos da escravidão nos EUA,
gandas, uma vida que não representa o dia a dia mostrando o início da discriminação e diferen-
dessas pessoas, ignorando o racismo, exclusão ciação entre vidas brancas e negras, ambos os
social e perseguição que sofrem. Não só a rea- filmes mostram a doutrinação que assegura a
lidade dos americanos negros é distorcida na sobreposição das vidas brancas às vidas negras.
mídia, como também é cultivado um preconceito
quanto à essas pessoas, pois os filmes mostram Embora 12 anos de escravidão mostre de forma
os negros em papéis de bandidos e os brancos efetiva a vida de um escravizado na época, o fil-
em papéis de heróis, colocando as vidas brancas me “eu não sou seu negro” atua como um docu-
acima das negras, dividindo uma nação ao meio. mentário e ao mostrar propagandas da época
E, por último, a conciliação de negros e brancos consegue fazer com que soe mais chocante aos
que não existia no passado e não existe hoje é olhos de quem está assistindo a forma com que
mostrada mídia da época, amenizando e ocultan- as mídias da época conseguiam manipular e dis-
do as diferenças sociais entre pessoas brancas simular fatos, alegando que os escravizados não
e negras, a qual é mais uma consequência do ra- eram pessoas. Enquanto o primeiro filme mos-
cismo. tra o sofrimento do escravizado ainda durante a
escravidão, o documentário mostra as inúmeras
Junto dos filmes, as propagandas completam o tentativas dos brancos de segregar essas pesso-
trabalho de desconstrução da realidade das vi- as do resto da sociedade, dando ênfase aos pro-
das negras ao colocar essas pessoas em lugar testos protagonizados pelos brancos com o ob-
de servidão, pode-se observar propagandas de jetivo de impedir que essas pessoas ocupassem
restaurantes, lojas, com os negros servindo às os mesmos espaços do que eles, que tinham e
pessoas. O filme conta como o discurso racis- tem até hoje uma clara ideia de superioridade.
ta dos brancos sobre os negros é espalhado na
mídia, mantendo um sistema social de repres- CONSIDERAÇÕES FINAIS
são nos EUA, a realidade não é confrontada, os
americanos não aceitam o peso da culpa por ter Embora os dois filmes expressem de forma
escravizado vidas por tantos anos, e não conse- muito verossímil o que foi a escravidão, eles
guem aceitar que essas pessoas foram respon- representam momentos diferentes na vida dos
sáveis pelo desenvolvimento crescimento dos escravizados, o primeiro representa todo o so-
EUA. Massacres são transformados em lendas, frimento dessa vida e mostra ao telespectador
mudando a visão do passado estadunidense. A sua herança familiar e o faz refletir a respeito da
ilusão criada é tamanha que muitos americanos divida histórica que existe com os descendentes
brancos acreditam que os americanos negros dos escravizados. E mesmo que o segundo filme
não são pessoas, os brancos não entendem e mostre as barbáries que ocorreram após a liber-
não desejam entender a situação dos negros. tação dos escravizados, ele os mostra já livres
lutando por seus direitos e morrendo por suas
Em suma, James Baldwin mostra como os ame- crenças, na tentativa de alcançar um mundo me-
ricanos brancos fogem da dívida histórica com lhor, investindo em maneiras de nunca retorna-
os negros e como tentam aliviar esse sentimento rem aquele período de suas vidas. Desse modo,
de culpa, dizendo que a imaturidade foi incorpo- temos duas retratações de vidas sofridas e dis-
rada à cultura americana abrindo as portas para tintas, que buscam mostrar períodos que jamais
diversas formas de preconceito como o racismo. devem retornar.

22 INEQ - Educação integral


A IMPORTÂNCIA DOS
EDUCADORES NO PROCESSO DE
APRENDIZAGEM DA CRIANÇA
ATRAVÉS DE BRINCADEIRAS
LÚDICAS NA ERA DA
TECNOLOGIA
PONTE, Elisa Maria Brito da Silva¹

RESUMO Playing is paramount to human development,


even in the earliest dating times, and in stories
Brincar é primordial para o desenvolvimento told in books or generation after generation, the-
humano, até mesmo nos tempos mais remotos re were jokes, games and activities for children.
que se tem datação, e nas histórias contadas It is through "make-believe" playing, dolls, carts
em livros ou de geração em geração, havia brin- and games that children develop their capaci-
cadeiras, jogos e atividades para as crianças. É ty for expression and communication, psycho-
através de brincadeiras de faz de conta, bone- motor skills, their cognitive development and
cas, carrinhos e jogos que a criança desenvolve internalize the knowledge arising from the inte-
sua capacidade de expressão e comunicação, raction with the external environment, besides
psicomotricidade, seu desenvolvimento cogni- providing an exchange of affection. vocabulary
tivo e internaliza o conhecimento advindo da expansion, sharing, interaction and exposure of
interação com o meio externo, além de propi- emotions. Today, with the advent of technolo-
ciar a troca de afeto, ampliação do vocabulário, gy, much comes down to the cell phone and the
compartilhamento, interação e exposição das computer, in which should be moderated and
emoções. Hoje, com o advento da tecnologia, under supervision. Technology is an aid to pa-
muito se resume ao celular e ao computador, rents and teachers. The greatest difficulty for
no qual dever ser moderado e com supervisão. teachers in conjunction with parents is the ex-
A tecnologia é um instrumento de auxílio para cessive use of technology, to maintain balance
os pais e docentes. A maior dificuldade para os between social interactions through games and
professores em conjunto com os pais é o uso jokes.
excessivo da tecnologia, para se manter o equi- Key-words: Jokes; Development; Children.
líbrio entram as interações sociais através dos
jogos e das brincadeiras. INTRODUÇÃO
Palavras-Chave: Brincadeiras; Desenvolvimen-
to; Criança. Na educação infantil, uma das questões primor-
diais aos educadores é a definição das estraté-
ABSTRACT gias pedagógicas para a estimulação do desen-
volvimento e do aprendizado de seus alunos. A

1 Elisa Maria Brito da Silva Ponte, endereço eletrônico: elisa_ponte@hotmail.com


INEQ - Educação integral 23
elaboração de um plano de ensino que en- como, os métodos de aquisição da leitura
globem atividades como leitura de história, e escrita. Se antes fazíamos pesquisas nas
desenhos, pinturas, cantigas de roda, recor- bibliotecas e aprendíamos a ler o “bê-á-bá”
tes de papel, dentre outras, são essenciais nas cartilhas, atualmente a geração dos cha-
visando a devida importância de cada uma mados nativos digitais crescem mexendo
delas. Para entendermos a necessidade do em celulares e internet, ou seja, essas ferra-
ato de brincar, precisamos entender mais so- mentas são de suma importância tanto para
bre o que é ser criança. o ensino, quanto para a aprendizagem.
Biologicamente, criança é um ser humano As novas tecnologias transformaram as tro-
em formação, sociologicamente: cas de informações e possibilitaram a intera-
ção social de “um para todos" para "todos a
“A criança como todo ser humano, é todos" aproximando os indivíduos de manei-
um sujeito social e histórico e faz parte ra atemporal. Nas salas de aula a interativi-
de uma organização familiar que está dade digital já faz parte do cotidiano de um
inserida em uma sociedade, com uma número pequeno de escolas no Brasil. Embo-
determinada cultura, em um determina- ra o acesso a tablets, computadores, leitores
do momento histórico. É profundamen- digitais e celulares já se tornou comum na
te marcada pelo meio social em que realidade de muitos brasileiros, mas, infeliz-
se desenvolve, mas também o marca.” mente para uma parcela da população, es-
(RCNEI, 1998, p.21). ses recursos ainda são muito distantes. Para
Kenski (2012) a introdução das
Através disso, para o professor, que por sua novas tecnologias como instrumento para
vez, não é apenas um mediador do conhe- aprendizagem modificam comportamentos
cimento, é importante saber e ver a criança e o saber de maneira muito rápida.
não como aprendiz ou tratá-la como adulta,
deve-se respeitá-la conforme seus valores Um saber ampliado e mutante caracte-
culturais, étnicos, religiosos, e suas individu- riza o estágio do conhecimento na atu-
alidades. alidade. Essas alterações refletem-se
sobre as tradicionais formas de pensar
De acordo com Piaget (1973), para que haja e fazer educação. Abrir-se para as no-
uma concretização do aprendizado esco- vas educações, resultantes de mudan-
lar deve-se unir a educação e a ludicidade. ças estruturais nas formas de ensinar e
Para Kishimoto (1998), o lúdico deve ser vis- aprender possibilitadas pela atualidade
to com uma ferramenta contribuinte para o tecnológica, é o desafio a ser assumido
melhor desenvolvimento das crianças e não por toda a sociedade. (KENSKI, 2012, p.
ser visto como algo fora do contexto educa- 41).
cional.
As TICs aliadas as boas práticas pedagógicas
Muitos anos se passaram e com a evolução podem contribuir efetivamente no processo
das tecnologias da informação e comunica- de alfabetização. De acordo com a educa-
ção (TICs) as distâncias e as dificuldades de dora e presidente do Sindicato das Escolas
comunicabilidade foram se reduzindo, assim Privadas do Amazonas (Sinepe/AM), Elaine

24 INEQ - Educação integral


Saldanha,(2017) “Enquanto estão mexendo nhecimento com o auxílio da tecnologia.
em um computador ou tablet, as crianças
desenvolvem a concentração e o raciocínio O ATO DE BRINCAR
lógico". Nessa fase é preciso que o professor
estimule os alunos a conhecer o alfabeto de O Referencial Curricular Nacional para a Edu-
maneira lúdica e criativa, por isso deve im- cação nos informa que:
plementar nas aulas, sites e aplicativos vol-
tados para leitura e escrita. Antes de tudo, é Brincar é uma das atividades funda-
preciso identificar em qual hipótese silábica mentais para o desenvolvimento da
o aluno se encontra para que sejam divididos identidade e da autonomia da criança,
em grupos. Na sala de informática estimular desde muito cedo, pode se comunicar
o acesso a plataformas como: O pé de vento, por meio de gestos, sons e mais tarde
site com jogos, músicas, contação de histó- ter determinado papel na brincadeira
rias e conteúdos, nele o jovem aprende com faz com que ela desenvolva sua imagi-
aventuras de todos os tipos. O HagáQuê de- nação... A fantasia e a imaginação são
senvolvido pelo Instituto de Computação da elementos fundamentais para que a
Unicamp, é um software educativo de apoio criança aprenda mais sobre a relação
a alfabetização e ao domínio da linguagem entre pessoas(...)(RCNEI, 1998, p.22)
escrita, que auxilia as crianças a criarem his-
tórias em quadrinhos. O ato de brincar é tão importante para a
criança que se tornou um direito garantido
Uma vez adotada a forma de aprendizado na Declaração dos Direitos da Criança (BRA-
para cada fase de desenvolvimento há a ne- SIL, 1959). Estabelecendo igualitariamente
cessidade de identificarmos o que é aprendi- que a recreação é tão importante quanto a
zado e o que é desenvolvimento inseridos na alimentação e a saúde para a criança.
educação infantil. Piaget (1989) diz que todo
o desenvolvimento humano está relacionado No sétimo princípio dita-se que a criança
a fatores internos (biológicos), nas quais o deve ter oportunidade de brincar e de se de-
indivíduo, de acordo com cada etapa de vida, dicar a atividades recreativas, sendo orienta-
desenvolve funções físicas, mentais e emo- das para os mesmos objetivos educacionais
cionais. Já a aprendizagem relaciona-se a (BRASIL, 1959).
todo o processo de interação da criança des-
de o ambiente familiar até o convívio social. Através dos brinquedos e de brincadeiras, a
criança descobre o mundo, além de mantê-la
“O desenvolvimento da criança é resul- saudável. A cada momento o educador deve
tado da interação de uma aprendizagem ficar atento com as atitudes tomadas e pela
natural, mas paralelamente estimulada, maneira como cada criança absorve e lida
que ocorre por meio da experiência ad- socialmente nas recreações.
quirida” (GUSSO & SCHUARTZ, 2005).
Existem inúmeras possibilidades no desen-
Dessa forma que o ato de brincar entra como volvimento de uma criança no tempo desti-
ferramenta na obtenção e construção do co- nado a recreação, todas de extrema impor-

INEQ - Educação integral 25


tância. Ao mergulhar-se na atividade lúdica, maioria dos "futuros cidadãos" deste país.
toda sua energia, todo o seu ser, é organizado
em função da ação. A criança deve se sentir Os brinquedos, os jogos e toda atividade
atraída pelo brinquedo, de forma que lhe des- recreativa possibilita a criança de um novo
perte desejo em brincar e cabe aos educado- mundo onde os desejos se concretizam
res mostrar as possibilidades que ele ofere- através da imaginação. Uma atividade psi-
ce, motivando-a e observando-a. Mesmo que cológica específica da consciência humana,
a ‘exploração’ do brinquedo não seja a rea- que ocorre na criança com uma certa idade.
ção esperada, deve-se deixá-la livre. O papel Essas atividades têm um papel fundamental
do adulto educador é de ouvir atentamente para o desenvolvimento infantil enquanto
para guiar e motivar o falar, pensar e inventar humano em formação psicológica e física.
de cada uma. Nessa perspectiva as atividades recreativas
possibilitam a criança a conhecer e analisar
Ao brincar a criança elabora seus próprios o mundo, e construir sua personalidade.
conceitos, alimentando o mundo imaginário,
explorando e inventando o faz de conta, que
tem um significado profundo em nossas vi- CONSIDERAÇÕES FINAIS
das, principalmente, na vida da criança, pois
seus reflexos contribuem para o desenvol- É através de brincadeiras de faz de conta,
vimento pessoal e social, que fará parte da bonecas, carrinhos e jogos que a criança
nossa história. desenvolve sua capacidade de expressão e
comunicação, psicomotricidade, seu desen-
Na mesma linha de pensamento Vygotsky volvimento cognitivo e internaliza o conhe-
(1994, p. 115) acrescenta que: Para o autor cimento advindo da interação com o meio
que a criança vê e escuta (impressões per- externo, além de propiciar a troca de afeto,
cebidas) constituem os primeiros pontos de ampliação do vocabulário, compartilhamen-
apoio para a sua futura criação, ela acumula to, interação e exposição das emoções. É
material com o qual depois estrutura a sua através destes que a criança adquire experi-
fantasia que progride num complexo proces- ências. O uso de recursos lúdicos por parte
so de transformação em que jogam a disso- do professor além de, despertar o gosto por
ciação e a associação como principais com- aprender também poderá ser usado como
ponentes do processo. parâmetro na hora de diagnosticar as capa-
cidades e as dificuldades de cada aluno.
Para o uso dos tablets e dos computadores,
cabe ao educador fazer escolhas coerentes “Por meio das brincadeiras os profes-
com relação ao lugar apropriado e metodolo- sores podem observar e constituir uma
gia de aplicação da tecnologia. Essas esco- visão dos processos de desenvolvi-
lhas são fundamentais para que a sociedade mento das crianças em conjunto e de
possa conquistar, gradativamente, domínio cada uma em particular, registrando
das ferramentas oferecidas pela informática, suas capacidades de uso das lingua-
tendo a sensibilidade ética e social de que gens, assim como de suas capacida-
as nossas instituições de ensino formam a des sociais e dos recursos afetivos

26 INEQ - Educação integral


e emocionais que dispõem”. (RCNEI, 1o da Lei no 91, de 28 de agosto de 1935; 1o
1998, p.28). do Decreto no 50.517, de 2 de maio de 1961.
BRASIL. Referencial Curricular Nacional para
Vygotsky (1991, p. 134) faz uso das palavras a Educação Infantil. vol. I. Brasília: MEC/SEF,
de Montessori, quando relata que “o jardim 1998.
de infância é o lugar apropriado para o ensino GUSSO, S.F.K. SCHUARTZ, M.A. A criança e
da leitura e da escrita”, mas que estas descu- o lúdico: A importância do “brincar”. Pontifí-
bram as respectivas habilidades durante as cia Universidade Católica do Paraná, 2005.
atividades. Sendo assim, trabalhar com o lú- p.237-248.
dico é importante na construção do conheci- KENSKI, V.M. Tecnologias e ensino presen-
mento na Educação Infantil, responsável por cial e a distância. 9a ed. São Paulo: Papirus,
gerar uma formação integral e globalizada, 2012.
uma vez que auxilia no desenvolvimento da KISHIMOTO, T.M. (Org.) Jogo, brinquedo,
imaginação, do raciocínio, e da criatividade. brincadeira e a educação. 3a ed. São Paulo:
Da mesma forma, na construção do sistema Cortez 1998.
de representação, envolvendo a aquisição da PIAGET, J. A Formação do Símbolo na Crian-
leitura e escrita, visando à formação dos as- ça. 3a ed. Rio de Janeiro: ed. Zahar, 1973.
pectos motores, cognitivos, físicos e psicoló- PIAGET, J. INHELDER, B. A Psicologia da
gicos das crianças. Criança. 10a ed. Rio de Janeiro: Bertrand Bra-
sil, 1989.
O avanço das tecnologias de informação SALDANHA, E. Novas Tecnologias contri-
possibilitou a criação de ferramentas que buem e modificam forma de alfabetizar
podem ser utilizadas pelos professores em crianças. A Crítica. 2017. Disponível em:
sala de aula, o que permite maior disponibi- <https://www.acritica.com/ channels/coti-
lidade de informação e recursos para o cor- diano/news/novas-tecnologias-contribuem-
po docente, tornando o processo educativo -e-modificam-forma-de- alfabetizar-as-crian-
mais dinâmico, eficiente e inovador. Nesse cas>. Acesso em 15 de dezembro de 2019.
sentido, o uso das ferramentas tecnológicas VYGOTSKY, L. S. A Formação Social da Men-
na educação deve ser vista sob a ótica de te. 4a ed. São Paulo: Martins Fontes Editora
uma nova metodologia de ensino, possibili- Ltda, 1991.
tando a interação digital, professores – alu- VYGOTSKY, L. S. A Formação Social da Men-
nos, com os conteúdos, isto é, o aluno passa te. 5a ed. São Paulo: Martins Fontes Editora
a interagir com diversas ferramentas que o Ltda, 1994.
estimulam e o auxiliam a utilizar o seus es-
quemas mentais a partir do uso racional e
mediado da informação.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BRASIL. Declaração dos Direitos da Criança.


Assembleia das Nações Unidas de 20 de no-
vembro de 1959; Art. 84, inciso XXI, 1988; Art.

INEQ - Educação integral 27


A CONTRIBUIÇÃO DA ARTE
NA EDUCAÇÃO INFANTIL

Daniela Costa da Silva

RESUMO Profesor Mediador.

Magia, descobertas, imaginação, criatividade, INTRODUÇÃO


aventura etc. É o objetivo deste presente artigo,
mostrar a importância que a arte tem na vida da O principal objetivo da arte na Educação Infan-
criança, na fase da Educação Infantil e as contri- til é formar o ser criativo, reflexivo e crítico que
buições do educador neste processo educativo. possa relacionar-se como pessoa, no mundo em
A educação através da arte constitui um impor- que vive. Segundo a tradição, a arte tem sido uma
tante meio para o desenvolvimento da criança, parte importante nas aprendizagens da chamada
o acesso a essa leitura permite grandes desco- primeira infância. O pedagogo alemão Friedrich
bertas para a aprendizagem e os experimentos e, Fröebel, considerado o “pai” do jardim de infância,
principalmente, colaborar com o desenvolvimen- foi o primeiro educador a dar ênfase na importân-
to físico, social-cognitivo, afetivo e cultural das cia do brinquedo e da atividade lúdica. Também
crianças. O objetivo é aproximar a arte do univer- foi ele que anunciou o conceito de que as crianças
so infantil, pois a criança passa a conhecer arte deveriam criar as próprias expressões artísticas e
ao mesmo tempo em que faz Arte, brincando. apreciar a arte criada por qualquer outra pessoa.
Em nosso país, temos a real convicção que a
Palavra-chave: Artes, Crianças; Educação Infantil; Educação Infantil necessita de profissionais que
Professor mediador. entendam mais sobre arte em suas diversas mo-
dalidades e variações da escolarização da crian-
ABSTRACT ça de maneira lúdica, criativa e envolvente, mas,
sobretudo, fundamentada e intencional.
Magia, descubrimientos, imaginación, creatividad,
aventuras... El objetivo de este artículo es mostrar A arte e seus elementos estão presentes no dia-
la importancia que el arte tiene en la vida de los -a-dia desses “pequenos” como, por exemplo,
niños, en la fase de Educación Infantil y las apor- nas cores, figuras, rabiscos, desenhos, formas,
taciones del educador en este proceso educativo. imagens, gestos, fala e sons, nas ruas, em casa,
La educación a través del arte es un medio im- nos brinquedos e outras expressões. O contato
portante para el desarrollo de los niños, el acceso com a obra se dá pela mediação de um educador
a esta lectura permite grandes descubrimientos sensível, capaz de criar situações em que possa
para el aprendizaje y la experimentación y, sobre ampliar a leitura e compreensão da criança sobre
todo, colabora con el desarrollo físico, social-cog- seu mundo e sua cultura. As artes têm o poder de
nitivo, afectivo y cultural de los niños. El objetivo conduzir essas crianças a conhecerem suas limi-
es acercar el arte al universo infantil, porque el tações, dificuldades e possibilidades de desenvol-
niño empieza a conocer el arte al mismo tiempo ver e explorar suas reais potencialidades.
que hace arte, juega.
Palabras clave: Artes; Niños; Educación Infantil; A educação escolar deve dispor de meios orga-

28 INEQ - Educação integral


nizados e respeitar as características de to-
das as etapas do desenvolvimento infantil. Os A Arte é a educação que oportuniza a criança
Professores de Educação Infantil devem uti- o acesso à Arte como linguagem expressiva
lizar as linguagens da arte no quotidiano das e forma de conhecimento. Entretanto, há a
crianças em sala de aula atrelado aos recursos necessidade de tornar possível o acesso de
disponíveis e imaginar outros, para que a arte professores e estudantes às produções artís-
na escola não fique reduzida às atividades de ticas, na perspectiva de ampliar repertórios e
coordenação motora, decorativa e/ou um mero promover o conhecimento de seus processos
passatempo. É possível realizar trabalhos uti- criativos, mobilizando os alunos para a forma-
lizando desenhos, pinturas, modelagem, cola- ção de grupos de produção artística nas áreas
gem, construção, texturas entre outras, para de música, teatro, artes visuais e dança.
desenvolver o gosto, o cuidado e o respeito
pelo processo de criação e produção. Os Parâmetros Curriculares Nacionais de Arte
destacam que dentre as várias propostas que
O trabalho com artes precisa de cuidado e estão sendo difundidas no Brasil na transição
atenção no que se refere ao respeito das pe- para o século XXI, emergem aquelas que têm
culiaridades próprias de cada faixa etária e seu se afirmado pela abrangência e por envolver
nível de desenvolvimento, respeitando o pensa- ações que, sem dúvida, estão interferindo na
mento, a imaginação, a percepção, a intuição, melhoria do ensino e da aprendizagem de arte.
a sensibilidade e a cognição da criança dentro Os estudos sobre a educação estética, a esté-
de um trabalho realizado de forma integrada e tica do quotidiano, complementando a forma-
lúdica, visando favorecer o desenvolvimento ção artística dos alunos, bem como, o encami-
das suas habilidades criativas. nhamento pedagógico- artístico que tem por
premissa básica a integração do fazer artísti-
O desdobramento artístico de uma criança não co, a apreciação da obra de arte e sua contex-
pode ser comparado com o de outra; cada uma tualização histórica são preconizados nos Pa-
tem suas peculiaridades, seu tempo, e não râmetros Curriculares Nacionais (PCNs,1998,
cabe a nós educadores interferir nessa evolu- p. 31).
ção. A criança é constantemente movida por
meio de estímulos, então precisa da oferta de As Artes Visuais estão presentes no quotidia-
ferramentas encorajadoras nesse processo, no da vida infantil. Ao rabiscar e desenhar no
mas sem interferência na sua expressão artís- chão, na areia e nos muros, ao utilizar mate-
tica. riais encontrados ao acaso (gravetos, pedras,
carvão), ao pintar os objetos e até mesmo
Dessa forma, a criança, envolvida num con- seu próprio corpo, a criança pode utilizar-se
texto social, pode organizar as ideias para in- das Artes Visuais para dar sua opinião sobre
ventar, criar e construir. A linguagem da arte, as experiências vividas. Em um contexto mais
presente na Educação Infantil, ajuda a criança específico da Educação Infantil ao ensino uni-
fazer, por si só, as várias leituras de mundo e versitário, na maioria das vezes, o ensino de
sendo ela oferecida em suas variações, é um arte e também outras áreas do conhecimento,
importante instrumento do desenvolvimento ao invés de promover ações pedagógicas que
integral das crianças para atingirem um alto ní- levem às crianças e os adultos ao universo da
vel cultural, além de servir de alicerce para uma criação e estruturação da linguagem visual,
vida estudantil plena e realizada. A ausência de acaba confundindo os alunos a entenderem
uma educação com horizontes artísticos deixa e expressarem suas leituras e relações com o
de lado o que proporciona prazer e alegria às mundo. Desse modo, em diferentes contextos
crianças. socioculturais e nas salas de aula, nossa sensi-
bilidade e nossas formas expressivas estão se
1. A Arte envolvendo a Educação escoando, fugindo da vida das crianças, sem

INEQ - Educação integral 29


que se possam exercitar os processos sensí- cimentos específicos do artista educador, e
veis e criativos. dentro dela é necessário que o educador libere
seu lado infantil ao mesmo tempo, estabeleça
O processo de construção na infância se dá um olhar crítico e positivo em torno das ativi-
de forma mais agradável, divertida e integrada dades desenvolvidas pelas crianças buscando
através da valorização do brincar, contribuindo sempre um olhar reflexivo diante dos rabiscos,
com o desenvolvimento de sua sensibilidade. desenhos, expressões, pois em seus desenhos
As atividades lúdicas auxiliam diretamente no às crianças revelam como elas são em sua re-
desenvolvimento de sua expressão, nas rela- alidade, mostrando fatos cotidianos e curiosos
ções afetivas com o mundo, com as pessoas que precisam ser interpretados pelos educado-
e com os objetos. Segundo Buoro (2000, p.10): res.

A Criança não pode compreender a Arte 2. A Arte e o desenvolvimento infantil


se não a conhece. É tarefa do Educador
sensibilizar a criança para que possa ser A arte é fruto do contexto social e influencia a
um receptor da arte moderna e contem- essência humana, ela não pode ser definida de
porânea e até um produtor. uma única forma. É algo intransferível de ser
humano para ser humano, sobretudo, é um pro-
As artes visuais são linguagens que norteiam duto de culturas. Assim também é o desenvol-
a Educação Infantil, uma vez que a mesma vimento infantil, é fruto de uma criação, e está
trabalha com os sentimentos e as sensações inserido no contexto social onde se desenvolve
das crianças, estimulando o processo de de- o aprendizado.
senvolvimento através das interações entre os
elementos do meio artístico com o mundo em Proporcionar uma educação prazerosa é con-
que a criança vive. Sendo assim é fundamental dição fundamental para o desenvolvimento do
que as crianças desenvolvam-se com alegria, pensamento, a educação pela arte oportuniza
ao brincar elas constroem e descobrem o mun- ao educando agir no mundo de forma crítica,
do, existente em cada uma. O professor tem pois estimula a capacidade intelectual para re-
que estar sempre presente e fazer parte do criar ideias e ações, segundo sua própria deci-
processo de descoberta da criança, obtendo são. De acordo com Barbosa (2011, p.163):
novas ideias e novos materiais, não só enten-
dendo, mas vivenciando as linguagens da arte O aluno expressar-se-á pelo desenho
com a criança. como pela linguagem falada e escrita.
Daí o desenho espontâneo, pelo qual ele
É importante que o professor disponibilize ma- dirá o que viu, o que pensa e o que sente,
teriais diversos como: argila, papel, isopor, tin- devendo-se dar a criança inteira liberda-
ta, sucata, e deixe que ela descubra as diversas de nas manifestações, para que melhor
utilidades que eles têm, tendo liberdade para possa ser conhecida e encaminhada,
inventar coisas que para o professor muitas contribuindo desse modo também para
vezes não têm significado, mas que para ela lhe desenvolver a iniciativa e a capacida-
faz muito sentido. Para se começar um traba- de de Criar.
lho com as artes visuais é preciso que o edu-
cador instigue na criança um olhar voltado às Os professores devem contribuir para que as
coisas do seu quotidiano, como: sua casa, sua linguagens artísticas não sejam concebidas
rua, seu colega, a escola, ou melhor, fazer com apenas como instrumentos, e sim atribuir à
que a criança passe a observar o belo que está Arte a mesma importância das demais áreas,
ao seu redor. Nesse sentido, é necessário que isto é, vendo a Arte como uma área de conhe-
o processo de formação do educador tenha cimento que possui peculiaridades que pode-
como objetivo ampliar os olhares e os conhe- riam ser o foco das reflexões e articulação de

30 INEQ - Educação integral


situações de ensino por professores. Assim nosso dia a dia e deve ser considerada na es-
Cross (1983, p.110) comenta: cola como contribuição para a construção do
conhecimento sensível da criança, pois a ajuda
Não se pode dirigir uma classe de arte a ampliar suas leituras de mundo. Os seres hu-
na escola sem atentar para a natureza da manos são dotados de criatividade e possuem
arte, da cultura, do planejamento, de tudo a capacidade de aprender e de ensinar. A cria-
o que existe no mundo exterior, a fim de tividade precisa ser trabalhada e desenvolvida,
formar opiniões sobre os valores expres- e é por meio do trabalho realizado com a arte
sos lá dentro. nas escolas que isso será possível.

Conforme Lowenfeld (1997, p. 34), “no primei- A ilustração, o desenho animado, a história em
ro ano de vida a criança já é capaz de manter quadrinhos, a propaganda, a embalagem são
ritmos e produzir seus primeiros traços gráfi- representações que se tornam quase realida-
cos conhecidos como garatujas”. Assim como des.
as crianças, as garatujas infantis são tão di-
ferentes entre si, umas são firmes e ousadas Em diferentes contextos socioculturais e nas
com movimentos largos, outras delicadas e salas de aula, a sensibilidade e as formas ex-
tímidas. pressivas estão desaparecendo, saindo da
realidade das crianças, sem que se possam
A partir dos dois anos, as crianças começam a exercitar os processos sensíveis e criativos.
traçar linhas no papel e sentem-se felizes com Conforme Martins, Picosque e Guerra (1998, p.
esses movimentos, e apesar de desordenados, 145):
são exercícios essenciais, pois ao repetirem
esses traços as crianças sentem-se mais con- Mais do que espaço físico, a sala de aula
fiantes. Obter o domínio dos movimentos, para é o lugar onde o professor e seu grupo
uma criança, significa alegria e felicidade. de aprendizes habita, pois imprimem
nela as marcas do convívio da vida pe-
Entre três e quatro anos as crianças passam dagógica. (...) é retrato de uma história
a nomear suas garatujas, nomeando-as com pedagógica construída numa concepção
suas imagens mentais. Os desenhos de uma de educação. A cada dia de aula, no en-
criança refletem suas experiências significati- contro do professor e alunos, o retrato da
vas sobre suas produções. sala vai se esboçando.
Com seu crescimento no âmbito artístico, a
criança desenvolve um raciocínio crítico em O processo de construção na infância se dá
relação ao seu próprio trabalho e isso propor- de forma mais agradável, divertida e integrada
ciona intermináveis possibilidades de novas através da valorização do brincar, contribuindo
experimentações, revisões, aprimoramentos com o desenvolvimento de sua sensibilidade.
e aperfeiçoamentos. Segundo Derdyk (2003 As atividades lúdicas auxiliam diretamente no
p.64) afirma: desenvolvimento de sua expressão, nas rela-
ções afetivas com o mundo, com as pessoas
A criança em um determinado momento e com os objetos. Segundo Cunha (1999, p.10),
percebe que tudo que está depositado
no papel partiu dela. Não lhe foi dado, foi [...] para que as crianças tenham possi-
inventado por ela mesma. Inaugura-se o bilidades de desenvolverem-se na área
terreno da criação. expressiva, é imprescindível que o adulto
rompa com seus próprios estereótipos
3. A Arte, a Criança e o Educador [...].

A arte e seus elementos estão presentes em O educador sendo mediador deverá auxiliar o

INEQ - Educação integral 31


educando a refletir sobre as imagens de forma quanto à criatividade nas propostas artísticas
crítica, reflexiva e construtiva. O que se apren- junto com seus aprendizes. Construir um espa-
de não se esquece, a criança é um ser criativo ço rico de possibilidades, de conhecimentos, de
e está na mão dos mediadores facilitarem esta vida e de sonhos permeia este trabalho criando
aprendizagem que será para a vida inteira. assim um espaço e momentos valiosos onde
as crianças podem viver intensamente sua in-
O professor tem que estar sempre presente fância, com independência e criatividade, de
e fazer parte do processo de descoberta da forma ativa, significativa e artística.A escola é
criança, esquecendo os estereótipos e abrin- o espaço que propicia a criança a apreciar a
do a mente para novas ideias e novos mate- arte, valorizando o trabalho realizado pelo ou-
riais, não só entendendo, mas vivenciando as tro e por ela mesma. Quando ensinamos isso
linguagens da arte com a criança. Para traba- a ela, utilizando as diferentes linguagens artís-
lhar a produção de arte é importante ter como ticas, propiciamos que experimentarem senti-
alicerce que a Arte é expressão, e também se mentos, apreciações e a desenvolver seu sen-
faz necessário mostrar aos alunos que a Arte so estético e crítico e a sensibilidade através
tem uma história, um significado social e que da percepção e da criação.
passou por diversas fases. Trabalhar com Ar-
tes não é meramente explorar técnicas artís- REFERÊNCIAS
ticas, e sim explorar os diversos aspectos que
as envolvem, incentivando, criando situações BARBOSA, Ana Mae. Inquietações e Mudanças no Ensi-
que façam com que eles a usem de forma in- no da Arte/Ana Mae Barbosa (org). In: conceitos e ter-
minologias Aquecendo uma transforma-ação: Atitudes
terativa.
e Valores no da Arte. 2ª Ed .São Paulo: Cortez,2003.
BUORO, Anamélia Bueno. Arte-Educação. Editora Cor-
CONSIDERAÇÕES FINAIS tez,2000.
BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacio-
As artes visuais favorecem o contato das pes- nal. Lei n.9.394, de 20 de dezembro de 1996.
soas com a própria cultura e também com ou- BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Secre-
taria de Educação Fundamental. Referencial curricular
tras culturas. Através das criações particulares,
nacional para a educação infantil / Ministério da Educa-
cada criança se apropria de novas habilidades, ção e do Desporto, Secretaria de Educação Fundamen-
faz descobertas, conquista autoconfiança, tal. Brasília: MEC/SEF, 1998.
aprende a valorizar seu potencial e partilha CUNHA, Susana Rangel Vieira da. Cor, Som e movimen-
experiências expressando suas emoções, ex- to: a expressão plástica, musical e dramática no quo-
pectativas, satisfação e angústias.Com as ati- tidiano da criança/ organizadora Suzana Rangel Vieira
da Cunha. Porto Alegre: Mediação, 2002.
vidades de artes visuais na educação infantil,
DERDYK, Edith. Formas de Pensar o Desenho. Desen-
as crianças vivenciam experiências e se de- volvimento do Grafismo Infantil. Editora Scipione. 3ª Ed.
senvolverem de forma integral, pois adquirem 2003.
conhecimento por meio das diferentes produ- FERRAZ, M.H. C. de T; FUSARI, M. F. de R. Metodologia
ções artísticas que são capazes de realizar. do ensino da arte. São Paulo: Cortez, 1999.
Os professores “educadores” são os principais FERREIRA, Aurora. A criança e arte: o dia - dia na sala de
aula. 3ª Ed. Rio de Janeiro: Wak Editora. 2008.
mediadores no processo de educação escolar
GIL, Antonio Carlos. Como elaborar projetos de pesqui-
da criança, e a pesquisa sobre a arte na educa- sa. 4ª Ed. São Paulo: Atlas, 2002.
ção infantil é fundamental para criar as propos- LOWENFELD, Viktor. A criança e sua Arte. 2ª Ed. São
tas necessárias para sua atuação como uma Paulo. MESTRE JOU EDITORA. 1977.
forma de provocar: o criar, o fazer, o buscar, o MONTAGNINI, Rosely Cardoso. Ensino das artes e mú-
analisar, o interpretar e o expressar. sica: pedagogia / Rosely Cardoso Motagnini, Laura Ce-
lia Cabral Cava, Klésia Garcia Andrade. São Paulo: Pear-
som Prentice Hall 2009.
Outro papel do educador mediador é incentivar VYGOTSKY, Lev. A formação social da mente. 4ª Ed.
seus aprendizes a superarem seus obstáculos São Paulo: Martins Fontes, 1991.
e também a superarem os próprios desafios

32 INEQ - Educação integral


AS RELAÇÕES AFETIVAS
NO CONTEXTO ESCOLAR:
COMO SE ESTABELECER
O DESENVOLVIMENTO
COGNITIVO
Jéssica dos Santos Silva¹

RESUMO INTRODUÇÃO

Este artigo tem como objetivo fazer uma analise Este artigo pretende esclarecer e falar sobre Neu-
e refletir a importância da afetividade na aborda- rociências, que se ocupa em explicar e entender a
gem da questão do desenvolvimento cognitivo aprendizagem no que abrange ao desenvolvimen-
no contexto escolar, e para entendermos como to da criança, decorrendo entre integração entre
podemos contribuir para que esses educandos o corpo e o meio social onde a afetividade tem
construam um espaço de conhecimento e criti- papel fundamental neste processo.
cidade para a convivência, revertendo um quadro
negativo, que não favoreça o processo de ensino Aprendizagem é uma troca onde a cooperação
aprendizagem destas crianças, focando a intera- possibilita trocas de ideias e o desenvolvimento
ção entre professor e alunos. Por meio de análise das relações sociais acontecem através do res-
bibliográfica. peito e autonomia se colocando no lugar do outro:
Palavras-chave: Afetividade; Integração; Aprendi- educador e educando, e a escola é um lugar pri-
zagem. vilegiado para se promover estas trocas. Quanto
maior emoção (afetividade) e significado tenha
ABSTRACT as informações mais será gravado. Fernández
(1991, p. 47) entende que toda aprendizagem está
This article aims to analyze and reflect the impor- impregnada de afetividade, já que ocorre a partir
tance of affectivity in addressing the issue of cog- das interações sociais, num processo vinculador.
nitive development in the school context, and to
understand how we can contribute so that these 1. Motivação
students build a space of knowledge and critica-
lity for living together, reversing a negative situa- Aprende-se na escola dimensões lógica, afetiva,
tion, which does not favor the teaching-learning social, política e expressões. Destas a competên-
process of these children, focusing on the inte- cia do professor se dá através de formações, ou
raction between teacher and students. Through seja, só ensina quem está disposto a aprender em
bibliographic analysis. um processo constante.
Keywords: Affectivity; Integration; Learning. Há uma situação de equilíbrio quando as intera-
ções entre professor e alunos estão ocorrendo.
A atenção e motivação é muito importante para

1 - Pós-Graduada em Formação e Profissão Docente pela Faculdade de Ciência e Tecnologia-FACITEP em 2018/ Graduada em Pedago-
gia pelo Instituto Superior de Educação Campo Limpo Paulista-ISECAMP em 2016/ Graduada em Letras pela Universidade Paulista-U-
NIP em 2012/ Professora de Língua Inglesa e Educação Infantil e Ensino Fundamental I PMSP.

INEQ - Educação integral 33


o processo de ensino aprendizagem, são ne- pois neste estado há o excesso de excitação
cessárias. A escola deve ser um espaço que sobre as possibilidades de escoamento. A ti-
motive e não só se preocupe em transmitir midez pode ser um exemplo da emoção hipo-
conceitos. Para que isso ocorra, o professor tônica, pois revela um estado de hipotonia no
precisa desenvolver atividades que os alunos qual verifica-se hesitação na execução de mo-
consigam realizar despertando a curiosidade e vimentos e incerteza na postura a ser adotada
vontade de resolvê-las. Desafiando-os. A afeti- pelo sujeito.
vidade motiva a aprendizagem. Quanto maior
emoção e significado tenha as informações As emoções interferem (intervém) em nossas
mais será gravado na memória. ações, especialistas das áreas de neurobiolo-
gia e educação analisam o aprendizado como
1.1 Inteligênica e afetividade uma troca entre cognição, emoção e fisioló-
gico do ser humano. As emoções são vistas
A afetividade é uma fase de desenvolvimento merecem destaque e inevitável da vida e do
desde os primórdios. O ser humano é um ser aprendizado. As emoções no contexto social e
afetivo. Afetividade e inteligência se misturam educacional é uma etapa importante do desen-
permanentemente, então a construção da pes- volvimento de uma criança. As emoções estão
soa se dará integralmente por uma sucessão presentes quando se busca conhecimento,-
de momentos afetivos e cognitivos. quando se estabelecem relações com indivi-
duos. Afeto e apendizagem são inseparáveis
Para Wallon o ser humano é organicamente so- presente.
cial, ou seja, a interação da cultura é necessária
para se atualizar. Construindo-se mutuamente Na aprendizagem significativa encontra-se
sujeito e objeto, afetividade e inteligência, al- uma âncora que envolvem memória e emoção,
ternam-se prevalecendo o consumo da energia na estrutua mental dos conhecimentos adqui-
psicogenética. ridos anteriormente pelo aluno. Sendo assim, a
emoção ocupa um lugar privilegiado nas con-
A afetividade é interpretada como uma “ener- cepções psicogenéticas de Henri Wallon, pois
gia”, portanto como algo que impulsiona as para ele a emoção é vista como instrumento de
ações, sendo a mola que faz a progressão. sobrevivência imprescindível à espécie huma-
na e por sua vez também a afetividade, onde as
1.2 Emoção emoções se manifestam.

Wallon (1968 p.148) estabelece uma distin- No processo ensino-aprendizagem o professor


ção entre afetividade e emoção. O autor define como elemento mais importante do processo
as emoções como, “sistemas de atitudes que de desenvolvimento da afetividade com o alu-
corresponde, cada uma, a uma determinada no, deve passar-lhe metas claras e realistas le-
espécie de situação”, em outras palavras, são vando este a perceber as vantagens de realizar
manifestações de estados subjetivos, com atividades desafiadoras. O aluno precisa sentir
componentes orgânicos, elas têm origem na vontade de aprender, e o professor é quem pode
função tônica, e são classificadas de acor- despertar essa vontade no aluno, a afetividade
do com o grau de tensão a que se vinculam, na educação constitui um importante campo
podendo ser denominadas de hipotônicas ou de conhecimento que deve ser explorado pelos
hipertônicas. Um exemplo de emoção hipertô- professores desde as séries iniciais, uma vez
nica apresentada por Wallon (1971) é a cólera, que, por meio dela podemos compreender a

34 INEQ - Educação integral


razão do comportamento humano, pois, a afe- que a afetividade é algo visceral, um sentimen-
tividade é uma grande aliada da aprendizagem. to, ou se tem ou se não tem. Isso não quer di-
Pois toda a criança é um ser único e tem seu zer que não se possa fazer nada para que as
jeito de pensar e agir, por isso é necessário que pessoas consigam vivenciá-las. A afetividade
a relação professor-aluno seja prazerosa, para tem um papel imprescindível no processo de
que assim ocorra uma aprendizagem mais sa- desenvolvimento da personalidade da criança,
tisfatória. Isso irá acontecer mais intensamen- que se manifesta primeiramente no comporta-
te se a afetividade estiver incluída nessa rela- mento e posteriormente na expressão.
ção, porque a mesma está presente em todas
as esferas de nossa vida no trabalho, no lazer O desenvolvimento é um processo continuo,
e principalmente na escola, pois é no ambiente pois o ser humano nunca está pronto e acaba-
escolar aonde ocorre a aprendizagem mais es- do, esse desenvolvimento refere-se ao mental
pecífica do conhecimento de nossas crianças. e ao crescimento orgânico, conhecendo as
características comuns de uma faixa etária,
Por isso, o ambiente escolar como base no reconhecendo as individualidades. Para en-
processo ensino- aprendizagem do aluno pode tender melhor de que forma essa afetividade
e deve favorecer ao educando a afetividade em contribui no processo ensinoaprendizagem,
todos os aspectos cognitivos, levando o indiví- busca-se um aprofundamento mais específico
duo a sua autorealização e crescimento. Com e teorizado, pois quando se fala em afetivida-
o dia-a-dia do aluno, é importante também de para aprendizagem é preciso considerar as
transferir uma educação mais aberta que esti- características do ambiente escolar, visando
mule a criatividade, a intuição, e a imaginação, os processos cognitivos de todos. A aprendi-
aprender a pensar, e reforçar além dessas a ne- zagem sempre inclui relações entre as pesso-
cessidade de ter a ética profissional, no entan- as. A relação do indivíduo com o mundo está
to, o professor é ainda o principal instrumento sempre medida pelo outro.
para todo o processo de mudança na aprendi-
zagem. Porque o processo de aprendizagem é Não há como aprender e aprender o mundo se
pessoal, e a afetividade, assim como a inteli- não tivermos o ouro, aquele que nos fornece os
gência não aparecem pronta nem permanece significados que permitem pensar no mundo a
imutável. Ambas evoluem ao longo do desen- nossa vida. Veja bem, Vygotsky defende a idéia
volvimento: são construídas e se modificam de de que não há um desenvolvimento pronto e
um período a outro, pois, à medida que o indi- previsão dentro de nos que vai se atualizando
viduo se desenvolve as necessidades afetivas conforme o tempo passa ou recebemos influ-
se tornam cognitivas, sendo assim, ao apren- ência externa (BOCK, 1999, p 124). Portanto,
der o sujeito acrescenta aos conhecimentos não basta apenas investigar, refletir ou iden-
que possui novos conhecimentos, fazendo li- tificar a forma de trabalhar a afetividade nas
gações aqueles já existentes. escolas, pois ensinar é, em síntese, um esfor-
ço para auxiliar ou moldar o desenvolvimento
O tema afetividade ligado à aprendizagem de cada indivíduo, porque esse é um processo
está sempre em evidência nos ambientes es- que se dá de fora para dentro. Porque como
colares, impelindo professores a se superar educadores, não se pode, no entanto despre-
ou fazendo-os recuar, chegando à desistência zar os primeiros anos de vida da criança que
dos casos mais complexos. Porém, ela tem um são base para um desenvolvimento saudável
papel muito importante nos resultados que os de sua personalidade, observando sobre tudo
professores e alunos almejam. Hoje já se sabe a relação que a criança tem com sua mãe po-

INEQ - Educação integral 35


deremos entender a constituição de um adulto desenvolvimento da afetividade. Sendo assim,
com afetividade bem ou mal construída. Muito as aprendizagens ocorrem, inicialmente, no
menos podemos diferenciar os fatores sociais, âmbito familiar e depois, no social e na escola.
culturais, religiosos, genéticos e neurológicos Portanto, sabemos que o sentido da aprendiza-
que podem interferir significativamente na gem é único e particular na vida de cada um, e
aprendizagem. Somos humanos, e como tais, que inúmeros são os fatores afetivos. Assim, o
estamos sempre em busca de algo que justi- afeto explica a aceleração ou retardamento da
fique nossa existência, que nos dê razão para formação das estruturas: aceleração no caso
viver. de interesse e necessidade do aluno, retarda-
mento quando a situação afetiva é obstáculo
2. Definindo o conceito de afetividade no pro- para o desenvolvimento intelectual da criança.
cesso e aprendizagem O processo ensino-aprendizagem só pode ser
analisado como uma unidade, pois ensino e
A afetividade é um estado psicológico do ser aprendizagem são faces e, a relação professor-
humano que pode ou não ser modificado a par- -aluno é um fator determinante, e o processo
tir de situações, tal estado é de grande influen- ensino eaprendizagem é o recurso fundamen-
cia no comportamento e no aprendizado das tal do professor: sua compreensão, e o papel
pessoas juntamente com o desenvolvimento da afetividade nesse processo, é um elemento
cognitivo. Faz-se presente em sentimentos, importante para aumentar a sua eficácia, bem
desejos, interesses, tendências, valores e emo- como para a elaboração de programas de for-
ções, ou seja, em todas as esferas de nossa mação de professores. O processo ensino e
vida. Wallon “traz a dimensão afetiva como aprendizagem no lado afetivo se revela pela
ponto extremamente importante em sua teoria disposição do professor de oferecer diversi-
psicogenética, apresenta a distinção entre afe- dade de situações, espaço, para que todos os
tividade e emoção” (1968, p. 61). Diretamente alunos possam participar igualmente e pela
ligada a emoção, a afetividade consegue deter- sua disposição de responder às constantes e
minar o modo com que as pessoas visualizam insistentes indagações na busca de conhecer
o mundo e também a forma com que se ma- o mundo exterior, e assim facilitar para o aluno
nifestam dentro dele. Todos os fatos e acon- a sua diferenciação em relação aos objetos.
tecimentos que houve na vida de uma pessoa
traz recordações e experiências por toda sua O processo ensino-aprendizagem precisa ofe-
história, dessa forma, a presença de afeto de- recer atividades e a possibilidade de escolha
termina a forma com que o indivíduo se desen- pela criança das atividades que mais atraiam.
volverá. Determinando, assim também a auto- O importante do ponto de vista afetivo é reco-
-estima das pessoas a partir da infância, pois nhecer e respeitar as diferenças que despon-
quando uma criança recebe afeto dos outros tam como chamar pelo nome, mostrar que a
consegue crescer e desenvolver-se com segu- criança está sendo vista, propor atividades que
rança e determinação. mostrem essas diferenças, dar oportunidades
para que as crianças se expressem. A afetivi-
Cada estágio da afetividade, quer dizer as dade também é concebida como o reconheci-
emoções, o sentimento e a paixão, pressu- mento construído através da vivência, não se
põem o desenvolvimento de certas capacida- restringindo ao contado físico, mas à interação
des, em que se revelam um estado de matu- que se estabelece entre as partes envolvidas,
ração. Portanto, quanto mais habilidades se na qual todos os atos comunicativos, por de-
adquire no campo da racionalidade, maior é o monstrarem comportamentos, intenções, cren-

36 INEQ - Educação integral


ças, valores, sentimentos e desejos, afetam as emocional. Assim o aprender se torna mais in-
relações e, consequentemente, o processo de teressante quando o aluno se sente competen-
aprendizagem. te pelas atitudes e métodos de motivação em
sala de aula.
Perceber o sujeito como um ser intelectual e
afetivo, que pensa e sente simultaneamente, A importância da relação entre a emoção e a
e reconhecer a afetividade como parte inte- atividade intelectual na sala de aula, mostran-
grante do processo de construção do conheci- do que tanto o professor quanto o aluno pode-
mento, implica um outro olhar sobre a prática rá passar por momentos emocionais durante o
pedagógica, não restringindo o processo ensi- processo de ensino-aprendizagem. Como meio
no-aprendizagem apenas à dimensão cogniti- social, é um ambiente diferente da família, po-
va. Na educação de abordagem construtivista, rém bastante propicio ao seu desenvolvimento,
a preocupação como a forma de ensinar passa pois é diversificado, rico em interações, e per-
a ser tão importante quanto o conteúdo a ser mite à criança estabelecer relações simétricas
ensinado. Por isso, a intensidade das relações, entre parceiros da mesma idade e assimetria
os aspectos emocionais, a dinâmica das ma- entre adultos. Ao contrário da família, na qual a
nifestações e as formas de comunicação pas- sua posição é fixa, na escola ela dispõe de uma
sam a ser pressupostos para o processo de maior mobilidade, sendo possível a diversida-
construção do conhecimento. de de papéis e posições. Dessa forma, o pro-
fessor e os colegas são interlocutores perma-
Intrinsecamente ligada à cognição, a afetivida- nentes tanto no desenvolvimento intelectual
de constitui-se fator essencial na vida escolar, como do caráter da criança, o que poderá ser
devendo, pois o professor, estar ciente dos pro- preenchido individual e socialmente. Quando
blemas que pode enfrentar e estar preparado observamos nossos alunos, percebemos que
para resolvê-los. Isso porque muitas crianças o olhar tem significado de expressividade da
revelam rejeição à escola devido a primeira alma, são manifestações de sentimentos que
infância tumultuada e carente de afetividade, podem ser interpretados de forma positiva ou
principalmente da figura materna. negativa.
3. A Contribuição da afetividade na ralação en-
tre professor-aluno O olhar do professor influencia no comporta-
mento do aluno, quando interpretado de forma
O fator afetivo é muito importante para o de- negativa, gera desconforto em sala de aula.
senvolvimento e a construção do conhecimen- É importante também ressaltar que a criança
to, pois por meio das relações afetivas o aluno precisa ser reconhecida, ser elogiada, isso nu-
se desenvolve, aprende e adquire mais conhe- tri a afetividade da criança, pois demonstra o
cimentos que ajudarão no seu desempenho interesse do professor pela criança, fazendo
escolar. Ser professor não se constitui em uma com que ela se sinta importante. Os professo-
simples tarefa de transmissão do conheci- res exercem um papel importante no desenvol-
mento, pois vai mais além e também consiste vimento afetivo dos alunos, pois estão presen-
em despertar no aluno valores e sentimentos tes no processo de ensino-aprendizagem em
como o amor do próximo e o respeito, entre todos os momentos de sua escolarização.
outros. Observa-se que a relação professor-
-aluno, deve sempre buscar a afetividade e a A afetividade é como um recurso de motivação
comunicação entre ambos, como base e forma na aprendizagem do aluno, sendo assim, con-
de construção do conhecimento e do aspecto tribui no desenvolvimento das emoções que

INEQ - Educação integral 37


se evidenciam dentro da sala de aula. O prazer dar-lhes atenção e cuidar para que aprendam a
pelo aprender não é uma atividade que surge expressar-se, expondo opiniões, dando respos-
espontaneamente nos alunos, para que isto tas e fazendo opções pessoais.
aconteça é necessário que o professor desper-
te a curiosidade dos mesmos, acompanhando O fortalecimento das relações afetivas en-
suas ações no desenrolar das atividades em tre professor e aluno contribui para o melhor
sala de aula. FREIRE, enfatiza que as caracte- rendimento escolar, destacando assim que a
rísticas do professor que envolve afetivamen- afetividade não se dá somente por contato físi-
te seus alunos afirma que: “o bom professor é co: discutir a capacidade do aluno, elogiar seu
o que consegue, enquanto fala trazer o aluno trabalho, reconhecer seu esforço e motivá-lo
até a intimidade do movimento do seu pensa- sempre, constituindo assim formas cognitivas
mento. Sua aula é assim um desafio e não uma de ligação afetiva, sem deixar de ressaltar que
cantiga de ninar. Seus alunos cansam, não dor- o contato corporal também é uma manifesta-
mem, cansam porque acompanham as idas e ção de carinho.
vindas de seu pensamento, surpreendem suas
pausas, suas dúvidas, suas incertezas” (1996 O professor sabe que sua tarefa é orientar o
p. 96). aluno em seu aprendizado, tornando-o mais
crítico e sua relação com os alunos é uma re-
É preciso que os professores percebam-se en- lação profissional, que deve potencializar um
quanto agentes históricos e atuantes na socie- bom aprendizado, pois o olhar do professor
dade em que vive, para que então eles passam para seu aluno é indispensável para a cons-
vir a influenciar ou auxiliar os seus alunos a trução e o sucesso da sua aprendizagem. Isto
adotarem uma postura crítica diante da mes- inclui dar credibilidade as suas opiniões, va-
ma, pois um ser inconsciente e sem ideologia lorizar sugestões, observar, acompanhar seu
só pode contribuir para a formação de um ci- desenvolvimento e demonstrar acessibilidade
dadão acomodado, passivo e alheio aos acon- e disponibilizar mútuas conversas. Portanto,
tecimentos que se encontram ao seu redor. na relação professor-aluno, pode-se dizer que
Segundo Galvão, “[...] se a criança está ao sa- a escola exerce um papel fundamental no de-
bor de suas emoções, ela não tem condições senvolvimento sócio-afetivo da criança, por
neurológicas de controlá-las” (1999, p.3- 7). isso, a ação educativa da escola deve propiciar
Então, mais uma vez, destacamos o valoroso ao aluno oportunidades para que esse seja
papel do professor na compreensão do grau induzido a um esforço intencional, visando
de maturidade neurológico da criança para que resultados esperados e compreendidos. Vale
não considere certas atitudes tomadas por ela ressaltar que a afetividade, não se refere ao
como indisciplina, manha, atrevimento ou hi- carinho do professor para com determinada
pocrisia. Devemos ter consciência da impor- criança. Mas uma afetividade voltada para a
tância da afetividade para o desenvolvimento relação do professor em relação ao contexto
emocional da criança, mas também temos grupal, de forma que o professor adote uma
de considerar os fatores biológicos necessá- postura afetiva e positiva com o mesmo. Para
rios a esse desenvolvimento. A afetividade que haja esse processo educativo afetivo é ne-
no ambiente escolar contribui para o proces- cessário que algo mais permeie essa relação
so ensino- aprendizagem considerando uma professor-aluno.
vez, que o professor não apenas transmite co-
nhecimentos, mas também ouve os alunos e É esse algo a mais que falta em diversas insti-
ainda estabelece uma relação de troca. Deve tuições de ensino. A afetividade, uma relação

38 INEQ - Educação integral


mais estreita entre o educando e o educador. por que, afetam profundamente a relação pro-
Dentro da abordagem Democrática, a afetivi- fessor e aluno e, consequentemente, influência
dade ganha um novo enfoque no processo de no próprio processo ensino- aprendizagem. A
ensino e aprendizagem, pois se acredita que a afetividade vem sendo debatida e definida
interação afetiva auxilia mais na compreensão há alguns anos por psicólogos, pedagogos e
e na modificação das pessoas do que um ra- psicopedagogos e profissionais da educação
ciocínio brilhante, repassado mecanicamente. e saúde em geral. Porém, percebemos ainda
A afetividade, no processo educacional, ganha uma grande defasagem em prestar um serviço
seguidores ao colocar as atividades lúdicas profissional que alie suas técnicas próprias à
no processo da aprendizagem. A afetividade uma interação eficaz de desenvolvimento de
exerce um papel crucial na vida das pessoas um relacionamento baseado no emocional.
e forma um elo na relação professor-aluno,
quanto maior for à afinidade entre professores Professores e educadores que incluíram essa
e alunos, maior será a fluência do processo teoria no seu cotidiano apontam para os evi-
ensino-aprendizagem, pois mais facilmente os dentes resultados positivos que conseguiram
alunos compreenderão o sentido de estudar o alcançar. Mas, antes de pensarmos na escola
que está sendo apresentado pelo professor e como ambiente para desenvolvimento da per-
terão a curiosidade de buscar novas informa- sonalidade da criança, devemos alertar para o
ções que possam completar a aula, tornando-a fato de que esta criança ao entrar na escola, já
um momento de aprendizagem dinâmica para tem uma vida cheia de experiências, estímulos
ambos, aluno e professor. e respostas que aprendeu a dar diante de de-
terminadas situações de sua vida diária. Toda
2. A importância de trabalhar a afetividade em a aprendizagem está impregnada de afetivi-
sala de aula dade, já que ocorre a partir das interações so-
ciais, num processo vincular. Pensando, espe-
O educador enquanto sujeito mediador do pro- cificamente, na aprendizagem escolar, a trama
cesso ensino- aprendizagem, faz-se conscien- que se tece entre alunos, professores, conteú-
te de que não basta apenas educar para afe- do escolar, livros, escrita, etc. não acontece pu-
tividade, é preciso educar na afetividade. Por ramente no campo cognitivo, existe uma base
isso, um educador consciente da importância afetiva permeando nas relações.
da afetividade na construção do conhecimen-
to de seus educandos, toda ação torna-se uma A afetividade quando demonstrada em sala de
ação para transformação. Ação está que pos- aula, resulta em experiências positivas, trazen-
sibilita a construção do conhecimento em sala do benefícios na aprendizagem do aluno. A se-
de aula para a formação de uma nova socie- gurança e confiança depositada no professor
dade, baseada na justiça, na fraternidade, no são fundamentais para a construção do pro-
respeito, no amor e na solidariedade. cesso de aprendizagem. O professor, também
tem a necessidade de ser aceito e respeitado.
A ação pedagógica jamais pode se reduzir à Diante disso, a necessidade de afeto do aluno
coerção e a obediência cega por parte dos edu- e do professor se entrelaça numa relação recí-
candos, pois para cumprir o seu papel, a educa- proca que evolui durante o ano letivo, Mas no
ção precisa da participação e da colaboração decorrer desse período as necessidades afeti-
dos sujeitos nessa construção do conhecimen- vas se modificam e tornam-se cognitivas. As
to. Então é importante ressaltar que o que se experiências vividas em sala de aula ocorrem,
diz e como se comporta, em que momento e inicialmente, entre os indivíduos envolvidos, no

INEQ - Educação integral 39


plano externo (interpessoal). a qualidade das interações entre os sujeitos,
Através da mediação, elas vão se internali- enquanto experiências vivenciadas.
zando (intrapessoal), ganham autonomia e
passam a fazer parte da história individual. Es- Dessa maneira, pode-se supor que tais experi-
sas experiências também são afetivas, os in- ências vão marcar e conferir aos objetos cultu-
divíduos internalizam as experiências afetivas rais um sentido afetivo. Pois, educar é ajudar o
com relação a um objeto especifico. Escola e educando a tomar consciência de si mesmo,
sociedade valorizam muito mais a razão que a dos outros e da sociedade em que vive, bem
prática, essa escolha remete automaticamente como de seu papel dentro dela. O educador é,
á segmentação do saber e a exigência de um sem duvida, a peça mestra nesse processo de
9 alto grau de abstração. Ambos são fatores educar verdadeiramente, devendo ser encara-
que dificultam bastante a interdisciplinaridade, do como um elemento essencial e fundamen-
a contextualização de ensino e a própria moti- tal. Quanto maior e mais rica for sua história de
vação do aprendiz. vida profissional, maiores serão as possibilida-
A des de desempenhar uma prática democrática
escola contribui muito no sentido de promover afetiva que eduque positivamente. É de extre-
mudanças nos alunos, e eles de alguma forma, ma importância ressaltar que o sucesso ou o
conseguem também modificar seu compor- fracasso no desenvolvimento escolar da crian-
tamento. Ressalta-se que a educação escolar ça é influenciado por diversos fatores, sendo
de hoje não está em crise, mas em fase de re- o envolvimento da família com essas crianças
estruturação, apesar da escola trabalhar com o fator principal. As expectativas de pais em
o conhecimento e possuir como resultado de relação ao futuro são fatores que podem coo-
seu trabalho a formação de pessoas, sua es- perar ou não para que essas crianças estejam
trutura de organização é muito similar a de motivadas para um bom desempenho no pro-
outras instituições sociais. Para Pino (1997), cesso de aprendizagem e durante toda a vida
os fenômenos afetivos representam a manei- escolar.
ra como os acontecimentos repercutem na
natureza sensível do ser humano, produzindo A afetividade ganha mais espaço e mais valo-
nele um elenco de reações matizadas que de- rização dentro do processo de ensino e apren-
finem seu modo de ser-no-mundo. Dentre es- dizagem quando se menciona e se integra o lú-
ses acontecimentos, as atitudes e as reações dico no desenvolvimento do ser humano, para
dos seus semelhantes a seu respeito são, sem que seja possível construir por meio da alegria
sombra de duvida, os mais importantes, impri- e do prazer de querer fazer. Sendo assim, os
mindo ás relações humanas um tom de drama- educadores precisam valorizar as atividades
ticidade. Assim sendo, parece mais adequado lúdicas e acreditar nessa proposta, pois ela
entender o afetivo como uma qualidade das envolve diversos fatores, dentre ele o desen-
relações humanas e das experiências que elas volvimento integral dos participantes, os dese-
evocam (...). São as relações sociais, com jos, os sonhos, as expectativas, as crenças e
efeito, as que marcam a vida humana, confe- os mitos desses seres humanos frente a cada
rindo ao conjunto da realidade que forma seu contexto sócio-cultural e político, fazendo os
contexto (coisas, lugares, situações, etc.) um entender o seu real papel na sociedade.
sentido afetivo (1997, p. 130-131). Embora os
fenômenos afetivos sejam de natureza subje- CONSIDERAÇÕES FINAIS
tiva, isso não os torna independentes da ação
do meio sociocultural, pois se relacionam com Atualmente os educadores estão retomando

40 INEQ - Educação integral


as contribuições de Wallon, Piaget e Vygotsky tando essas alterações comportamentais e so-
de modo a entender a percepção que os edu- ciais desse indivíduo.
cadores dentro das experiências e os laços
afetivos influenciam tais como valores, senti- Ante ao que foi exposto, pode-se afirmar que
mentos e desejos afetam nas relações e com a afetividade é de extrema importância para
isso na aprendizagem. a saúde mental de todos os seres humanos.
Pessoas com doenças emocionais podem
A educação afetiva leva em consideração as desenvolver doenças físicas, além disso, este
ideias, opiniões dos de educandos consideran- estado psicológico afeta o desenvolvimento e
do-os seres capazes de opinar de terem vonta- a aprendizagem do indivíduo, pois este é um
de própria e desejos e que estes serem boas e todo composto de matéria física e emocional.
diferentes.A educação é democrática, recipro- Sendo assim, a escola deve proporcionar ao
ca e flexível. educando o desenvolvimento da sua afetivida-
de integralmente, considerando todas as suas
A afetividade é um dos aspectos fundamentais emoções e reações, incentivando a troca de
para que o educando obtenha sucesso em sua sentimentos, para que este se torne um adul-
aprendizagem. No que se refere ao professor to com autoestima e segurança emocional. O
ela também é essencial para que ele conquiste professor exerce um papel fundamental nesse
uma sensação de missão cumprida em rela- processo, tornando a relação afetiva entre pro-
ção ao seu trabalho como educador. Pode-se fessor e aluno algo de suma importância para
dizer que a ausência de afeto ou recebimento sua aprendizagem.
deficiente dele pode causar transtornos psico-
lógicos no educando que o acompanharão por REFERÊNCIAS
toda a vida. Indivíduos que excluem por opção
ou não a afetividade de suas vidas tornam-se LA TAILLE, Y., DANTAS, H., OLIVEIRA, M. K. Pia-
apáticas e sem emoção diante das circunstân- get, Vygotsky e Wallon: teorias psicogenéticas
cias. Tanto educadores como pais, admitem o em discussão. São Paulo: Summus Editorial
quão importante é a afetividade para a forma- Ltda, 1992.
ção do ser humano. No entanto, para a apren- FERNÁNDEZ, Alicia. A Inteligência Aprisiona-
dizagem ela é primordial, nesse processo com- da. Porto Alegre, Artes Médicas, 1991.
plexo todas as variantes afetivas e cognitivas FREIRE, Madalena. A Paixão de conhecer o
exercem um papel fundamental para o sucesso mundo. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1983.
do processo de ensino e aprendizagem. Sendo PINO, A. O biológico e o cultural nos processos
assim, devem ser respeitadas e incentivadas cognitivos, em Linguagem, cultura e cognição:
durante a educação escolar. reflexão para o ensino de ciências. Campinas,
1997.
Educandos que não recebem o devido afeto de REVISTA NOVA ESCOLA. Rio de Janeiro; ed.
seus familiares podem apresentar comporta- Junho, Julho de 2012. p.48 a 55.
mento inadequado na escola. Se no ambien- SCHWARTZ, Suzana. Motivação para ensinar
te escolar também não o receber podem ter e aprender- teoria e prática. Petrópolis, RJ: Vo-
esse comportamento agravado e reproduzido zes, 2019
na sociedade, gerando assim, uma reação em
cadeia. Porém, se na escola o professor conse-
gue estabelecer uma relação afetiva com esse
educando ele fará a diferença na vida dele, evi-

INEQ - Educação integral 41


DIFICULDADE DE
APRENDIZAGEM,
A DISLEXIA - UMA
INTERFERÊNCIA
PEDAGÓGICA E
PSICOPEDAGÓGICA
Jéssica dos Santos Silva¹

RESUMO mainly on AJURIAGUARA (1984). BOSSA (2011).


CIASCA (2003). DAVIS (2004).
Trata-se de uma pesquisa a respeito da dislexia. Keyword: Learning difficulties; Dyslexia; Psycho-
Compreender a dislexia na escola, assim como pedagogy.
seus sinais, tratamento e acompanhamento dos
alunos disléxicos é possível, bem como auxiliar INTRODUÇÃO
o desenvolvimento dos estudantes que apresen-
tam essa dificuldade sendo também necessário No contexto de uma sala de aula, é possível cons-
e juntamente aliado a psicopedagogia. Os obje- tatar a dificuldade dos professores em identificar
tivos dessa monografia são: Analisar a dislexia os problemas de aprendizagem presentes nos
– sintomas e tratamentos; Analisar estratégias alunos da turma. Entre eles, a dislexia. Muitas
psicopedagógicas para aplicar em sala de aula. A vezes os alunos carregam durante o curso suas
metodologia é a pesquisa teórica, fundamentada dificuldades, não recebem as orientações cabí-
principalmente em AJURIAGUARA (1984). BOSSA veis no diagnóstico, no acompanhamento e na
(2011). CIASCA (2003). DAVIS (2004). avaliação. Diante desse quadro, faz-se necessário
Palavra-chave: Dificuldades de aprendizagens; estudar a questão, pois a dislexia é um distúrbio
Dislexia; Psicopedagogia. que envolve vários aspectos. Conhecê-los é fun-
damental para dar condições para o aluno apren-
ABSTRACT der, condições essas nas quais o aluno aprenda
de uma forma diferente. O pedagogo, juntamente
This is a research about dyslexia. Understanding com o trabalho de um psicopedagogo precisa in-
dyslexia at school, as well as its signs, treatment tervir para auxiliá-lo no desenvolvimento, facilitan-
and monitoring of dyslexic students is possible, do o processo de ensino- aprendizagem.
as well as assisting the development of students Nesse contexto, surgem algumas questões:
who have this difficulty and it is also necessary
and together with psychopedagogy. The objecti- • Qual a importância de compreender a dislexia
ves of this monograph are: To analyze dyslexia na escola?
- symptoms and treatments; Analyze psychope- • Quais são os sinais e sintomas da dislexia?
dagogical strategies to apply in the classroom. • Como deve ser o seu tratamento?
The methodology is theoretical research, based • Quais são as estratégias que os professores do

1 - Pós-Graduada em Formação e Profissão Docente pela Faculdade de Ciência e Tecnologia-FACITEP em 2018/ Graduada em Pedago-
gia pelo Instituto Superior de Educação Campo Limpo Paulista-ISECAMP em 2016/ Graduada em Letras pela Universidade Paulista-U-
NIP em 2012/ Professora de Língua Inglesa e Educação Infantil e Ensino Fundamental I PMSP.

42 INEQ - Educação integral


Ensino Fundamental I podem utilizar em sala cimento compõe a aprendizagem. Uma das
de aula? muitas possibilidades para que ocorra a apren-
• Como o psicopedagogo poderá atuar com dizagem é ter um bom elemento mediador, im-
essas crianças? portante nesse processo do aprender.
• E como devem orientar os professores?
Esse elemento definirá uma aprendizagem sig-
Essas questões no decorrer desse trabalho, se- nificativa. Para que a aprendizagem ocorra e
rão discutidas, pois sabe-se que não há conclu- sendo em longo prazo, um processo válido,é
são em casos de estudos que ainda fomentam preciso uma ação conjunta entre o indivíduo
esclarecimentos. Diante do discurso exposto que ensina e o que aprende, não se limitando
acima, defini os objetivos: Analisar a dislexia apenas a métodos de ensinos, pois esses não
– sintomas e tratamento. Analisar estratégias são garantia de que os educandos aprenderão.
pedagógicas e psicopedagógicas para aplicar E durante o aprender, se aparecem dificulda-
em sala de aula. Ressaltando a importância des, o papel dos pais e responsáveis, educa-
do psicopedagogo e como suas intervenções dores, psicopedagogos, psicólogos e todos
contribuirão para que futuros alunos diagnos- aqueles que venham a contribuir para auxiliar
ticados com dislexia sejam encaminhados e os estudantes, são fundamentais para sanar
acompanhados dentro da unidade escolar. e orientar esses alunos diante de seus proble-
mas.
Essa pesquisa é bibliográfica, na qual a fonte
de dados são livros no idioma português de di- Em uma perspectiva mais científica, aprendi-
versos autores principalmente AJURIAGUARA zagem é a capacidade cognitiva mediante à
(1984). BOSSA (2011). CIASCA (2003). DAVIS obtenção de novas informações. Ao longo da
(2004) e a legislação vigente referente à Edu- vida estamos sempre aprendendo. Para que
cação Especial. ocorra a aprendizagem é necessário que es-
truturas cognitivas estejam preservadas. Cada
Esse trabalho é dividido em três capítulos, as- indivíduo aprende conforme sua maturidade
sim sendo no Capítulo 1- Introdução que abor- cognitiva, assim como as estruturas sensório-
da como ocorre a aquisição da linguagem e motoras que também compõem a aprendiza-
dificuldades de aprendizagem. Capítulo 2- Di- gem.
ficuldade de Aprendizagem-dislexia, é apre-
sentada a dislexia e seus sintomas. Capítulo O processo de ensino aprendizagem realiza-se
3 – As intervenções do psicopedagogo. Nesse em diversos ambientes, necessitando do auxí-
capítulo é apresentado a contribuição do psi- lio de um agente de conhecimento, que trans-
copedagogo nos casos de dislexia; Considera- mita ou informe um conteúdo. Esses aspectos
ções finais e Referências Bibliográficas. são fundamentais para a aprendizagem. A fal-
ta ou falha em alguns desses elementos acar-
1. Dificuldades de aprendizagem - Dislexia reta uma dificuldade de aprender.

Muito se fala sobre dificuldades de aprendiza- Os ambientes de aprendizagem são as casas


gem. Mas, antes de explanar sobre o assunto, onde os indivíduos convivem com outros in-
é necessário primeiramente entender o que divíduos, as escolas e as igrejas. Na escola,
é aprendizagem. Todo o processo de trans- esse agente é o professor. Ele é mediador, que
formar uma informação em um novo conhe- deverá criar condições para que seus alunos

INEQ - Educação integral 43


aprendam. A linguagem é muito importante para a vida
Segundo Piaget, escolar de todos, pois a descoberta do mun-
do ocorre através desse processo, seja a lin-
[...] a aprendizagem não se confunde ne- guagem falada ou escrita. Ao trabalhar com
cessariamente com o desenvolvimento, alfabetização não basta apenas ensinar a ler
e que, mesmo da hipótese segundo a e escrever, é preciso oferecer muito mais que
qual as estruturas lógicas não resultam as letras, permitindo que a criança vivencie e
da maturação de mecanismos inatos compreenda as relações sociais. As crianças
somente, o problema subsiste em es- podem ter contato com a leitura e a escrita
tabelecer se sua formação se reduz a através de lista de compras, agendas telefôni-
uma aprendizagem propriamente dita ou cas, caderno de receitas. A partir daí, ela perce-
depende de processos de significação be que a leitura e a escrita fazem parte da sua
ultrapassando o quadro do que desig- vida e tem utilidade, pois as palavras estão no
namos habitualmente sob este nome. seu cotidiano.
(1974,p.34)
Como afirma Ferreiro (1989 p. 24) ao traba-
Durante muito tempo, o insucesso na aprendi- lhar com a alfabetização é necessário que se
zagem devia-se a fatores considerados como criem condições para a busca de informações,
um fracasso escolar e responsabilizava muitas é preciso ensinar a ler e a escrever, sabendo
vezes os alunos por essa condição. Ao longo vivenciar e compreender as relações sociais. A
de vários estudos, foi possível modificar o olhar criança precisa atribuir significado ao que ela
a esses questionamentos. Hoje, sabemos que escreve através do seu dia-a-dia. Os educado-
as dificuldades de aprendizagem podem advir res precisam ter um olhar partindo da vivência
de fatores diversos tanto cognitivos, patológi- do aluno, ensinando partindo do princípio do
cos ou também de um ambiente precário do que eles já conhecem, trabalhando o concreto.
aprender. É claro que nem todas as crianças têm aces-
so ao universo letrado em suas casas, neces-
Jogar muitas vezes a culpa no aluno, assim sitando que a escola lhe apresente o que ela
como rotulá-lo de preguiçoso ou lerdo, desmo- ainda não teve acesso. E as crianças que apre-
tiva-o ainda mais diante de uma condição que sentam dificuldades para aprender?
necessita de uma intervenção aprofundada do
professor e do psicopedagogo, porque existe Partindo do pressuposto que segundo a Asso-
alguma dificuldade que necessita ser identifi- ciação Internacional de Dislexia, caracteriza a
cada. Fazer um acompanhamento e oferecer dislexia como um déficit fonológico de ordem
recursos e caminhos para que esse educando neurológica. Faz-se necessário primeiramente
possa aprender deve ser uma das tarefas da explanar como o processo de leitura ocorre.
escola. Quando um indivíduo está em processo de al-
fabetização, ele designa cada função cerebral
Desde o nascimento de uma criança, ela vive para decodificar e atribuir significado ao que
um processo de aprendizagem. Ela aprenderá se lê. Em nosso idioma, ativamos campos
a andar, falar a linguagem de seu meio, cantar, cerebrais, ao qual se refere o léxico, que são
escrever entre outros. Uma das aquisições fun- o conjunto de palavras que compõe nossa lín-
damentais ao ser humano é a linguagem. gua. Paralelo a essa ativação lexical é utilizado
outro campo cerebral que é a memória de tra-

44 INEQ - Educação integral


balho responsável pelo armazenamento e pro- rológicas. Os disléxicos têm oportunidades de
cessamento das informações atingindo pos- desenvolverem capacidades e habilidades até
teriormente a consciência fonológica que dá acima da média. Como afirma Davis (2004) a
significação tanto a estruturação das sílabas, dislexia é uma condição autogerada, sendo
fonemas e palavras, quanto à manipulação das que são desenvolvidos talentos perceptivos.
mesmas, ou seja, o seu uso funcional. Segundo Ajuriaguara (1984) a dislexia seria um
certo bloqueio durante a aquisição da leitura. O
Dificuldades de aprendizagem são recorrentes autor afirma ainda que:
na escola, e seu diagnóstico nem muitas vezes
é preciso, assim ocorre com a dislexia estereo- Assim, a dislexia é concebida como um
tipada como preguiça ou falta de atenção dos distúrbio psicopedagógico, com anam-
alunos. Mas veremos na pesquisa aqui feita nese frequente, mas não constante, dos
que essa dificuldade seja explicada por uma distúrbios de linguagem ou da orientação
causa biológica. Abordaremos também como h espacial, e dos fatores iniciais, consti-
a psicopedagogia contribui para que a escola e tucionais uns e dependentes do meio
os indivíduos diagnosticados caminhem para outros; fatores que podem se conjugar
uma progressão educacional, auxiliando esses para colocar a criança de seis anos em
educandos para uma aprendizagem significa- uma situação de inferioridade que a dei-
tiva. xará inábil para uma aquisição escolar
normal. Entre os fatores do meio ocupa
A Fundação Mundial de Neurologia em 1968 um lugar o fator pedagógico, e não cer-
definiu a dislexia como uma desordem, cau- tamente porque uma pedagogia inade-
sando dificuldades para ler durante o período quada possa por si só criar uma dislexia,
de alfabetização. Desvinculada de inteligência mas porque pode encaminhar uma crian-
ou os estímulos necessários para esse apren- ça com uma maturidade medíocre para o
dizado, a dislexia não é caracterizada por falta caminho da dislexia. (1984, p. 117)
de interesse ou mesmo uma inteligência abai-
xo do normal. Ao contrário, muitos alunos dis- Davis (2004) apresenta a dislexia como uma
léxicos possuem inteligência dentro do normal desorientação natural cognitiva. “A dislexia
e querem muito aprender, mas a tarefa se torna não é resultado de dano cerebral ou nervoso,
tão penosa que acabam por perderem o inte- tampouco é causada por uma malformação do
resse pela leitura. cérebro, é sim um produto do pensamento e de
uma maneira especial de reagir ao sentimento
A palavra dislexia origina-se do grego “dis” (dis- de confusão”. (2004, p. 34)
túrbio) e do latim “lexia” (linguagem), sendo
conhecida como distúrbio na leitura e escrita, Diante dessas concepções de dislexia, o que
um distúrbio que afeta o campo linguístico. Foi podemos observar é que a dislexia é uma he-
identificada em 1877, mas somente em 1896 rança genética. Portanto, um aluno disléxico,
foi citada pela medicina e denominada como possivelmente tem em sua família alguém
cegueira verbal (BARROS, 2007). com o mesmo déficit.

Esse distúrbio não é proveniente de um pro- As informações no cérebro de um disléxico


cesso ruim ou defasado de alfabetização. São não são completadas como seria o natural. A
condições genéticas com consequências neu- área correspondente do cérebro que é respon-

INEQ - Educação integral 45


sável pela linguagem é o lado esquerdo. Nesse Algumas das dificuldades apresentadas pe-
campo hemisfério, ocorre o processo de fone- los disléxicos são citadas por Ciasca (2003):
mas, análise e reconhecimento de palavras. alunos com dislexia demoram a desenvolver
O cérebro desenvolve-se construindo memó- a linguagem oral e escrita; fazem cópias ou
rias permanentes, fazendo com que o indiví- escrevem com letras e números alterados ou
duo aprenda a guardar (memorizar) palavras inadequados; apresentam dificuldades em or-
sempre usuais a ele. Como afirma Ciasca “ ganizar sequências de letras do alfabeto, de
para aprender é necessário que a integridade sílabas, têm pouca atenção para atividades
do sistema nervoso central esteja preservada”. mesmo que demonstrem interesse; não me-
(2002, p. 103) “ morizam episódios recentes como dar um re-
cado ou memorizar números de telefone; não
Nos disléxicos, o cérebro funciona de outra demonstram interesse em materiais impres-
maneira, porque existem falhas nas conexões sos como livros, revistas, gibis, etc.; não com-
cerebrais. Durante o processo de leitura, a área preendem o que leem (lê, mas não entende);
cerebral do aluno com dislexia, que é utilizada, entre outras várias situações que envolvam a
é somente a responsável pelo processamento linguagem escrita ou oral.
do fonema, por isso esses alunos têm dificul-
dade de distinguir os fonemas das sílabas. O diagnóstico da dislexia necessita de uma in-
Mesmo ele tendo lido a palavra, a leitura tor- tervenção multidisciplinar. Ciasca afirma que
na-se dificultosa, como se a cada vez que lê “diagnosticar a dislexia é difícil e para que seja
essa palavra, ela parece ser nova ao estudan- feita de maneira eficiente, a equipe multidis-
te. De acordo com a Associação Brasileira de ciplinar e instrumentos de avaliação eficazes
Dislexia (ADB), na sala de aula aparecem os para um diagnóstico correto são fundamen-
primeiros sinais de alerta da dislexia, durante tais”. (2003, p.57)
o processo de alfabetização.
Nesse momento o psicopedagogo juntamente
As trocas de letras constantes, não reconhecer com o psicólogo, fonoaudiólogo, professores
fonemas e letras, não conseguir ler palavras e os pais são importantes para uma avaliação,
pequenas e simples, leitura difícil, não memo- diagnósticos e tratamento desse aluno.
rizar palavras que acabou de ler, são alguns
sinais de uma possível existência de dislexia. 2. Contribuição psicopedagógica diante da
Após verificar esses sinais, é preciso acompa- Dislexia
nhar esse aluno, para que inicie desde cedo o
tratamento, assim o disléxico apresentará me- A contribuição psicopedagógica tem em vis-
nor dificuldade durante o processo de aquisi- ta a função e a importância nas questões de
ção da leitura e escrita. aprendizagem. A prática psicopedagógica se
desenvolve basicamente em três níveis: na
Ter dislexia não faz de cada disléxico um gê- prevenção de problemas escolares, na tera-
nio, mas é bom para a autoestima de todos dis- pêutica de distúrbios de aprendizagem e na
léxicos saberem que sua mente funciona exa- pesquisa psicopedagógica, conforme afirma
tamente do mesmo modo que as mentes de BOSSA (2011).
grandes gênios. Também importante saberem
que o fato de terem problema com a leitura não A avaliação psicopedagógica envolve entrevis-
significa que sejam burros (DAVIS, 2004, p. 57). tas com os pais ou responsáveis pela criança e

46 INEQ - Educação integral


com a própria criança ou adolescente; contato tidos, pois segundo a LDB 9.394/96:
com a escola e com outros especialistas que
já tenham atendido este paciente; análise do Art. 12 - Os estabelecimentos de ensino,
material escolar e exames realizados. A partir respeitadas as normas comuns e as do
de então, se inicia uma avaliação das habilida- seu sistema de ensino, terão a incum-
des cognitivas da criança a fim de verificar o bência de:
que está acontecendo. I - elaborar e executar sua Proposta Pe-
dagógica.
Os desafios que surgem para o psicopedagogo [...]
dentro da instituição escolar relacionam-se de V - prover meios para a recuperação dos
modo significativo. Conforme afirma SAMPAIO alunos de menor rendimento.
(2011), a formação pessoal e profissional do
psicopedagogo, implica a configuração de uma Art. 23 - A educação básica poderá or-
identidade própria e singular que seja capaz de ganizar-se em séries anuais, períodos
reunir qualidades, habilidades e competências semestrais, ciclos, alternância regular de
de atuação na instituição escolar. Se existisse períodos de estudos, grupos não seria-
nas escolas psicopedagogo trabalhando com dos, com base na idade, na competência
essas dificuldades, o número de crianças com e em outros critérios, ou por forma diver-
problemas seria bem menor. sa de organização, sempre que o interes-
se do processo de aprendizagem assim
O psicopedagogo atinge seus objetivos quan- o recomendar.
do tem a compreensão das necessidades de Art. 24 - V, a) avaliação contínua e cumu-
aprendizagem de determinado aluno, abrindo lativa; prevalência dos aspectos qualitati-
espaço para que a escola viabilize recursos vos sobre os quantitativos e dos resulta-
para atender as necessidades de aprendiza- dos ao longo do período.
gem. Dessa forma o psicopedagogo institucio-
nal passa a se tornar uma ferramenta podero- E conforme a Lei nº 8.069, de 13 de julho de
sa no auxilio da aprendizagem. 1990 (ECA):

O Psicopedagogo pode intervir através de tra- Art. 53, incisos I, II e III


tamento que é feito por meio de intervenções [...] A criança e o adolescente têm direi-
explícitas e intensivas em leitura, que diferem to à educação, visando ao pleno desen-
de acordo com o tipo de dislexia. Neste caso, volvimento de sua pessoa, preparo para
a meta dele não é alfabetizar, pois esta é uma o exercício da cidadania e qualificação
função do professor. Ele irá explorar atividades para o trabalho, assegurando-se-lhes:
de aprendizagem com vistas a promover o de- I – igualdade de condições para o acesso
senvolvimento em leitura e escrita do educan- e permanência na escola; II – direito de
do disléxico. ser respeitado pelos seus educadores;
[...]
A educação inclusiva é assegurada em nosso III – direito de contestar critérios avalia-
país, através de documentos como a Lei de Di- tivos, podendo recorrer às instâncias es-
retrizes e Bases (LDB), o Estatuto da Criança e colares superiores.
do Adolescente (ECA), assim os alunos disléxi-
cos tem seus direitos de aprendizagem garan- E nos parâmetros da Lei nº 9.394, de 20 de

INEQ - Educação integral 47


dezembro de 1996 (LDB) Artigos 12 (inciso V) REFERÊNCIAS
e 13 (incisos III e IV), lemos que:
ABD - Associação Brasileira de Dislexia. Dis-
“Os estabelecimentos de ensino, respei- ponível em http:/www.dislexia.org.br/abddisle-
tadas as normas comuns e as do seu sis- xiahtm>acessado em 20/07/2015.
tema de ensino, terão a incumbência de: ANDRADE, Márcia Siqueira de. Psicologia clíni-
V – prover meios para a recuperação dos ca: Manual para diagnóstico. Osasco: EDIFIEO,
alunos de menor rendimento; Os docen- 2011
tes incubir-se-ão de; zelar pela aprendiza- AJURIAGUARA. Julian, de. A dislexia em ques-
gem dos alunos; estabelecer estratégias tão: Dificuldades e Fracassos na Aprendiza-
de recuperação para os alunos de menor gem da Língua Escrita. Editora Artmed. São
rendimento. Paulo, 1984.
BARROS, Célia Silvia Guimarães. Pontos de
CONSIDERAÇÕES FINAIS Psicologia Escolar. Editora Ática. São Paulo,
2001.
Esse trabalho teve como objetivos conhecer BOSSA, Nadia Aparecida. A psicopedagogia no
a importância da dislexia, como identificá-la e Brasil: contribuições a partir da prática. Rio de
trata-la e analisar estratégias psicopedagógi- Janeiro: Wak Editora, 2011.
cas para aplicar em sala de aula. BRASIL. Ministério da Educação. Lei de Dire-
trizes e Bases da Educação Nacional, LDB –
No capítulo 1 foi apresentado como ocorre 9.394, de 20 de dezembro de 1996.
a aquisição da linguagem e dificuldades de ______. Estatuto da Criança e do Adolescente,
aprendizagem, no capítulo 2 foram analisadas ECA. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Bra-
as dificuldades de aprendizagem (dislexia) e sília, DF: Senado Federal, 1990. Disponível em:
no capítulo 3 as intervenções do psicopedago- <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/
go. l8069.htm>. Acesso em 06 de outubro de 2015.
CIASCA, Silvia Maria. Distúrbio de Aprendiza-
Conclui-se com a monografia que o diagnós- gem. Proposta de Avaliação Interdisciplinar/
tico precoce dos alunos com dislexia faz-se Sylvia Maria Ciasca- Organizadora. São Paulo:
necessário, porém esse diagnóstico deve ser Casa do Psicológo, 200
realizado em conjunto com uma equipe mul- DAVIS, Ronald Dell. O dom da dislexia; por que
tidisciplinar a mesma que acompanhará o de- algumas das pessoas mais brilhantes nã con-
senvolvimento escolar desse estudante. seguem ler e como podem aprender. Rio de Ja-
neiro: Rocco, 2004.
Enfim, essa pesquisa apresentou como é pos- FERREIRO, Emília. Processos de leitura e escri-
sível indivíduos diagnosticados com dislexia ta, os: novas perspectivas. 3.ed. PORTO ALE-
aprenderem, bem como a intervenção do pe- GRE: ARTMED, 2003 .
dagogo e psicopedagogo possibilitam novos SAMPAIO, Simaia. Dificuldades de aprendiza-
caminhos para que essa aprendizagem ocor- gem: a psicopedagogia na relação sujeito, fa-
ra. O trabalho destaca que o reconhecimento mília e escola. 3 ed. Rio de Janeiro: Wak Edito-
do Psicopedagogo como uma profissão faz-se ra, 2011.
necessário. SNOWLING, Margaret J. Dislexia. 2 ed. São
Paulo: Livraria Editora Santos, 2004.

48 INEQ - Educação integral


TRANSTORNO DE DÉFICIT DE
ATENÇÃO E HIPERATIVIDADE
(TDAH)

Jéssica dos Santos Silva¹

RESUMO the objectives of this work are: To identify the His-


tory of Psychopedagogy in Brazil; to analyze the
Crianças são diagnosticadas com o TDAH, porém importance of psychopedagogue in the student's
há falta de conhecimento científico dos professo- teaching and learning process related to ADHD.
res e das escolas para que eles sejam orientadas As for the methodology, it is a theoretical resear-
de forma adequada. Daí a importância da figura ch, based on the main authors: CYPEL; MATTOS;
do psicopedagogo - um profissional que estabele- MALUF and BOMBONATTO.
ça a relação existente entre o professor e o aluno Keyword: Learning disability, Attention Deficit
em seu processo de ensino e aprendizagem em Hyperactivity Disorder and Psychopedagogue.
sua relevância: científica, pessoal e social. Nesse
contexto, os objetivos desse trabalho são: Identi- INTRODUÇÃO
ficar a História da Psicopedagogia no Brasil; anali-
sar a importância do psicopedagogo no processo Estar diante de uma criança que possui capaci-
de ensino e aprendizagem do aluno relacionado dade e habilidades para aprender, onde o meio
ao TDAH. Quanto a metodologia, trata-se de uma em que ela está inserida também lhe propicia tal
pesquisa teórica, embasada nos autores princi- aprendizagem, mas mesmo assim, não aprende
pais: CYPEL; MATTOS; MALUF e BOMBONATTO. ou apresenta alguma dificuldade de aprendiza-
Palavra-chave: Dificuldade de aprendizagem, gem, é estar diante de uma situação comum a
Transtorno de Déficit de Atenção Hiperatividade nós educadores. A criança com o TDAH tem difi-
e Psicopedagogo. culdades em seu processo de aprendizagem. Daí,
nos perguntamos sobre como ajudar esse aluno
ABSTRACT a entender o que lhe é ensinado, ou quais os mé-
todos de intervenções necessárias para que seja
Children are diagnosed with TDAH, but there is a auxiliado, e enfim, qual papel do professor e do
lack of scientific knowledge from teachers and psicopedagogo em relação ao processo de ensi-
schools so that they are properly guided. Hence no e aprendizagem desse aluno.
the importance of the figure of the psychopeda-
gogue - a professional who establishes the rela- Saber identificar, diagnosticar e lhe oferecer en-
tionship between the teacher and the student in caminhamentos adequados, é uma possibilidade
their teaching and learning process in its relevan- hoje? Existem novos estudos na área da Psicope-
ce: scientific, personal and social. In this context, dagogia?

1 - Pós-Graduada em Formação e Profissão Docente pela Faculdade de Ciência e Tecnologia-FACITEP em 2018/ Graduada em Pedago-
gia pelo Instituto Superior de Educação Campo Limpo Paulista-ISECAMP em 2016/ Graduada em Letras pela Universidade Paulista-U-
NIP em 2012/ Professora de Língua Inglesa e Educação Infantil e Ensino Fundamental I PMSP.

INEQ - Educação integral 49


Sim. A angústia de um educador ao se deparar tudos sobre o Transtorno de Déficit de Atenção
com um aluno que é diagnosticado com Trans- e Hiperatividade. Nesse capítulo, apresentare-
torno de Déficit de Atenção e Hiperatividade, mos as características do sujeito com TDAH,
uma das muitas dificuldades de aprendizagem diagnóstico e tratamento; 4. O papel do profes-
que encontramos nas salas de aulas com fre- sor e do psicopedagogo diante de alunos com
quência, pode ser diminuída e/ou esclarecida, TDAH. Considerações Finais.
com um trabalho competente e multidiscipli-
nar de profissionais. O psicopedagogo poderá 1. A história da Psicopedagogia no Brasil
auxiliar e, junto com o professor, desenvolver
metodologias e oferecer ferramentas para que Ao analisarmos o panorama da educação bá-
esse aluno alcance desenvolvimento e apren- sica atual, é possível perceber conforme os
dizagem sólida. índices de censos anualmente divulgados
por órgãos responsáveis pelo progresso edu-
Em nossa prática docente temos elaborado cacional no Instituto Nacional de Pesquisas
inúmeros questionamentos: A criança com Educacionais Anísio Teixeira (INEP), que há
TDAH apresenta em seu processo de aprendi- uma grande defasagem no ensino, tanto públi-
zagem?; Como ajudá-la a entender o que está co, quanto privado. Os baixos resultados são
sendo ensinado?; Quais os métodos de inter- alarmantes. Muitos alunos não têm suas habi-
venções para ajudar esse aluno com TDAH?; lidades e competências desenvolvidas satisfa-
Qual o papel do professor e psicopedagogo em toriamente. Percebe-se assim que temos um
relação ao processo de ensino e aprendizagem desafio nas salas de aulas, no que se refere a
do aluno? identificar quais são essas dificuldades.

A partir dessas questões, define-se os seguin- Partindo desse pressuposto, ressaltamos aqui
tes objetivos: Identificar a História da Psico- a importância de um trabalho integrado de pro-
pedagogia no Brasil; analisar a importância fissionais não só dos professores, mas de uma
do psicopedagogo no processo de ensino e equipe multidisciplinar que possa vir a contri-
aprendizagem do aluno relacionado ao TDAH. buir com o progresso de ensino-aprendizagem
Quanto à metodologia, esse trabalho será uma desses alunos, os quais segundo esses índi-
pesquisa teórica baseada fundamentalmente ces e sensos são rotulados como defasados.
nos autores: CYPEL (2010), MATTOS (2015),
MALUF e BOMBONATTO (2007). Nesse momento, em pleno século XXI, com
vários estudos e pesquisas sobre ferramen-
Espera-se que essa pesquisa contribuía para tas que possam ser utilizadas para auxiliar a
que os leitores obtenham informações impor- mudança desse cenário educacional, um pro-
tantes sobre os benefícios do atendimento psi- fissional vem sendo importante, o psicopeda-
copedagógico e sua relevância como estraté- gogo. Esse profissional possui conhecimentos
gia pedagógica. diversos que não apenas se restringe a fatores
de sala de aula, mas formação e instrumentos
A estrutura do trabalho constitui-se em: 1. In- para colaborar com o trabalho do quadro do-
trodução; 2. A História da Psicopedagogia no cente.
Brasil. Nesse capítulo abordaremos a História
da Psicopedagogia e a sua importância do psi- A Psicopedagogia vem sendo construída para
copedagogo para auxiliar situações educacio- colocar o aluno como sujeito completo, bioló-
nais; 3. Dificuldades de aprendizagem e os es- gico, psíquico e social, que além de aprender

50 INEQ - Educação integral


também ensina e deve ser o autor de sua pró- O psicopedagogo desenvolve um ambiente
pria aprendizagem, cujas capacidades e ha- para que ocorra uma aprendizagem sólida, a
bilidades podem ser exploradas de diversas partir de bases de estudos fundamentados nas
formas. O objeto de estudo da Psicopedagogia ciências diversas. Utiliza-se de conhecimentos
é a relação do indivíduo com o meio educacio- da Psicologia, assim como o da Pedagogia.
nal, buscando, integrar os outros profissionais Trabalha junto com os professores em esco-
envolvidos na educação para que melhore e las e também é capaz de diagnosticar as ha-
progrida o processo de aprendizagem. bilidades e as dificuldades de aprendizagem,
intervindo para a superação dessas barreiras.
A área da Psicopedagogia é entendida como A Psicopedagogia também está associada
fornecedora de possibilidades para auxiliar nas ao desenvolvimento do indivíduo não só na
dificuldades dos alunos, oferecendo subsídios fase infantil, mas abrange tanto adolescentes,
aos pais, professores e alunos, a criarem es- quantos os adultos, conforme afirma FAGALI
tratégias significativas para o desenvolvimen- (2007).
to dos estudantes envolvidos. BOSSA (2011)
afirma que a Psicopedagogia surgiu devido à O curso de Psicopedagogia teve seu início no
grande quantidade de alunos que apresenta- Brasil com o Instituto Sedes Sapientiae, que
vam dificuldades de aprender, com o auxílio da desencadeou ideias para a construção da As-
Pedagogia, Psicologia, Fonoaudiologia entre sociação Brasileira de Psicopedagogia. FAGA-
diversas áreas que trabalham com linguagem LI (2007) menciona que na década de 1970 o
e desenvolvimento humano. Instituto Sedes Sapientiae, iniciou um projeto
com o curso de formação em Psicopedagogia
Auxiliar o processo de aprendizagem dos indi- vinculado à Pontifícia Universidade Católica
víduos é uma das finalidades da Psicopedago- de São Paulo, mas desligou-se da mesma nos
gia: anos 80. Após essa desvinculação, o Instituto
manteve a clínica de Psicologia, originando o
Do seu parentesco com a Pedagogia, a curso de formação de Psicopedagogia, que
Psicopedagogia traz as indefinições e tinha como objetivo estudar como o indivíduo
as contradições de ciência cujos limites aprende e orienta a aprendizagem e analisar
são os da própria vida humana. Envolve como os aspectos afetivos, psicomotores,
simultaneamente, a meu juízo, o social cognitivos e sociais integram o processo da
e o individual em processos tanto trans- aprendizagem.
formadores quanto reprodutores. Da Psi-
cologia, a Psicopedagogia herda o velho Surgindo num período em que muitos profis-
problema do paralelismo psicofísico, um sionais da educação procuravam compreender
dualismo que ora privilegia o físico, ora os problemas de aprendizagem, a Psicopeda-
o psíquico. Essas duas áreas não são gogia veio para entender essas dificuldades.
suficientes para aprender o objeto de es- De acordo com FAGALI (2007):
tudo da Psicopedagogia. O processo de
aprendizagem e suas variáveis e nortear [...] era grande a procura de alternativas
a sua prática. Dessa forma, recorre-se as criativas para avaliações e intervenções
outras áreas, como a Filosofia, a Linguís- educacionais eficazes, diante dos pro-
tica e a Psicanálise no sentido de alcan- blemas de aprendizagem, que se avo-
çar compreensão desse processo. (BOS- lumavam nas escolas, e as alterações
SA, 2011, p. 38) políticas e socioeducacionais vigentes

INEQ - Educação integral 51


na época, intensificando o quadro de difi- que presentavam algumas dificuldades para
culdades. (p.23) aprender, mesmo possuindo habilidades para
isso. O movimento dos estudos da Psicopeda-
Nas salas de aulas, práticas pedagógicas asso- gogia também apareceu paralelamente nos Es-
ciadas às atividades clínicas, mostravam mais tados Unidos, só que em linhas de pesquisas
resultados significativos dos estudantes do distintas.
que práticas individuais, como recuperações
nas escolas ou aulas particulares. O curso de Os estudos da Europa chegaram à América do
formação em Psicopedagogia como vimos, Sul e por fim ao Brasil com conceitos bem apro-
surgiu com o intuito de unir teoria e prática fundados. No Brasil, os cursos de formação
nas questões que envolvem as dificuldades de específica em Psicopedagogia, habilita esses
aprendizagem. profissionais que desejam atuar nessa área. A
formação do psicopedagogo está fundamen-
(...) apesar da preocupação, desde o iní- tada na Lei de Diretrizes e Bases da Educação
cio para as questões preventivas, o curso Nacional 9.394/96 (LDB), pois a mesma garan-
inicial se concretizava em torno de ques- te que a educação é dever da família e do Esta-
tões do que se denominava a reeduca- do, tendo como finalidade o desenvolvimento
ção, diante da prática do corpo docente do cidadão. O profissional da Psicopedagogia
e da demanda da própria população que possui uma instância que lhe assegura o seu
buscava o curso. Mas a “reeducação” era direito de exercício, a Associação Brasileira de
vista como um processo de reintegração Psicopedagogia (ABPp) é o órgão responsável
em que estavam presentes os fatores por aprimorar e divulgar os trabalhos desses
afetivos, os de raciocínio e o desenvolvi- profissionais.
mento doas conceitos de maneira geral.
A compreensão do raciocínio apoiava-se Ao longo da trajetória para consolidar o proje-
na epistemologia genética de Piaget e os to, revisões nas estruturas do currículo e dos
aspectos se fundamentavam na relação profissionais, o curso recebeu o nome de Psi-
vincular (professor-aluno, aprendiz-orien- copedagogia clínica e institucional. Após esse
tados). Nessa articulação entre afeto e período, a busca era para a consolidação, va-
conhecimento no aqui e agora, segundo lorização e reconhecimento do curso e da pro-
a abordagem fenomenológica. Um fator fissão. Paralelo a esse fato, os estudos nas
fundamental na estrutura do curso dizia áreas da Psicologia, Psicanálise e Linguagem
respeito ao desenvolvimento do papel foram ampliados como relata FAGALI (2007),
do Psicopedagogo, em uma abordagem colaborando assim com o desenvolvimento da
psicodramática em que o aprendiz- psi- psicopedagogia e esse começou a atuar em
copedagogo buscava a formação de sua práticas tanto clínicas como institucionais.
identidade. (FAGALI, 1992, p. 2² )
Mesmo ainda sendo um desafio a profissio-
Embora a Psicopedagogia ainda não seja reco- nalização do psicopedagogo, é possível reco-
nhecida como uma profissão, houve grandes nhecer a sua importância em auxiliar os alu-
avanços em sua trajetória aqui no Brasil. A ori- nos com dificuldades de aprendizagem. Com
gem da Psicopedagogia ocorreu na Europa na a criação da Associação Brasileira de Psico-
metade do século XX, para ajudar indivíduos pedagogia, os estudos puderam ser difundi-

2 - IN MALUF e BOMBONATTO, 2007, p 23.

52 INEQ - Educação integral


dos e divulgados por todo o território nacional, dessas informações, compõe a aprendizagem.
favorecendo discussões e aperfeiçoamento. A O aprendizado será sempre continuo e exige
Associação Brasileira de Psicopedagogia luta uma sequência para que ocorra o desenvolvi-
para o reconhecimento dos profissionais atra- mento do indivíduo envolvido (CYPEL, 2010,
vés do Código de Ética do Psicopedagogo, que p.39).
estabelece bases cientificas para auxiliar os
psicopedagogos, visando à boa conduta para Em uma perspectiva mais científica segundo
o exercício da Psicopedagogia. Com a origem PIAGET (1974, p.35), aprendizagem é a capa-
do Código de Ética houve um grande avanço cidade cognitiva mediante a obtenção de no-
para a oficialização desse profissional. vas informações e ao longo da vida. Portanto,
para que se realize a aprendizagem é neces-
Como o psicopedagogo atua nas dificuldades sário que estruturas cognitivas estejam preser-
de aprendizagem dos educandos, consideran- vadas. Cada indivíduo aprende conforme sua
do aspectos biológicos, psíquicos e sociais, o maturidade cognitiva.
atendimento acompanha o processo de apren-
dizagem de como o aluno aprende, porque O processo de ensino e aprendizagem desen-
essa varia conforme fatores diversos. As alte- volve-se em diversos ambientes, necessitando
rações da aprendizagem e consequentemente do auxílio de um agente de conhecimento, que
reconhecer essas alterações, preveni-las e tra- transmita, informe um conteúdo e que crie con-
tá-las é função do psicopedagogo. dições para a aprendizagem. Esses aspectos
são fundamentais, a falta ou falha em alguns
Esse especialista pode atuar em dois contex- desses elementos acarreta numa dificuldade
tos. No ambiente escolar numa perspectiva de aprender.
de prevenção, onde auxilia nas dificuldades
de aprendizagem e como essas afetam a ro- Durante muito tempo, o insucesso na aprendi-
tina escolar, colaborando juntamente com o zagem devia-se a fatores considerados como
professor para uma melhor estruturação me- um fracasso escolar que responsabilizava as-
todológica que visa à evolução do educando. sim muitas vezes os alunos por essa condição
E numa perspectiva da terapia, podemos dizer como afirma (BARTHOLO In MALUF e BOM-
que o psicopedagogo diagnostica e trata as di- BONATTO, 2007, p. 59). Ao longo de vários
ficuldades de aprendizagem, juntamente com estudos, foi possível modificar o olhar a esses
uma equipe de outros profissionais da área da questionamentos. Sabemos que as dificulda-
saúde. des de aprendizagem podem advir de fatores
diversos tanto cognitivos, patológicos ou tam-
2. As dificuldades de aprendizagem: o trans- bém de um ambiente precário do aprender.
torno de déficit de atenção e hiperatividade
Jogar muitas vezes a culpa no aluno, assim
Muito se fala sobre dificuldades de aprendiza- como rotulá-lo de preguiçoso ou lerdo o des-
gem. Mas antes de explanar sobre o assunto, motiva. Diante de uma condição de dificuldade,
é necessário primeiramente entender o que é ele necessita de uma intervenção aprofundada
aprendizagem. Todo o processo de transfor- do professor e do psicopedagogo. Ninguém
mar uma informação em um novo conheci- não aprende porque não quer, mas sim por-
mento que englobe os sentidos audiovisuais, que existe alguma barreira que deve ser iden-
tátil-cinestético, aspectos cognitivos, os recur- tificada. Fazer um acompanhamento e assim
sos da escrita, da fala, oralização e a devolutiva oferecer recursos e caminhos para que esse

INEQ - Educação integral 53


educando possa desenvolver suas habilidades cerebral mínima” começa a ser adotado
e competências é o correto. para designar as alterações, quando se
descobriu que não eram causadas por
Assim como no campo da Psicopedagogia, o lesões. (CYPEL, 2010, p. 16)
professor, que atua diretamente com o aluno e
suas dificuldades, precisa considerar o indiví- Segundo estudos da Associação Brasileira de
duo em sua totalidade. Trabalhar em conjunto Psicopedagogia, o Transtorno de Déficit de
com a família desse aluno é importante, pois Atenção e Hiperatividade (MALUF e BOMBO-
fatores emocionais interferem na aprendiza- NATTO 2007) é um transtorno com caracterís-
gem. BARTHOLO (2007, p.61) afirma que “um ticas genéticas, facilmente visíveis durante a
dos objetivos que temos em um trabalho psi- infância. Interfere do desenvolvimento da vida
copedagógico é entender a forma de aprender do indivíduo, manifesta-se com a hiperativida-
do sujeito e trabalhar a sua mobilidade quando de, desatenção e impulsividade.
esta se encontra rigidificada”.
A atenção é compreendida como o elemento
Avaliar a interação do educando com o ambien- que integra todo o sistema nervoso central,
te escolar, observar fatores sociais, cognitivos sendo bem complexo, envolvendo situações
e orgânicos, faz-se necessário para compreen- de vigília e estado do sono (CYPEL, 2010, p.
der esse indivíduo. Quando nos referimos às 24). No primeiro somos capazes de processar
dificuldades de aprendizagem não estamos as informações recebidas e selecionar aquelas
dizendo que o mesmo está associado a um que nos interessa, envolvendo também fatores
distúrbio ou déficit apenas, essas dificuldades externos como ambiente estimulador, fatores
também são consequências de fatores intra e emocionais, dentre outros.
extraescolares, devendo ser investigadas.
[...] a habilidade para atender seletiva-
A avaliação e revisão dos sintomas que lhe são mente a estímulos relevantes e ignorar
característicos dessa dificuldade de aprendi- outros é parte integral do processo de
zagem passaram a ser denominadas na déca- aprendizado, e é necessário entender
da de 90, como Distúrbio do Déficit de Atenção o desenvolvimento dessas habilidades
e Hiperatividade. Já no Brasil adotamos a no- para que possa estabelecer um mode-
menclatura Transtorno do Déficit de Atenção e lo adequado de aprendizado na crian-
Hiperatividade. ça. (HAGEN e HALE, 1973 apud CYPEL,
2010, p. 27).
O Transtorno de Déficit de Atenção e Hi-
peratividade foi citado na literatura no O déficit de atenção afeta essa atenção sele-
ano de 1925. Dupré e seus estudos nes- tiva, responsável pelo aprendizado de um alu-
se período cita um desajuste motor em no, causando dificuldades. A primeira caracte-
crianças sem lesões no cérebro como rística da hiperatividade é a apresentação de
afirma CYPEL (2010). Em 1947 os estu- uma atividade motora além do comum. É um
dos foram retomados com foco nas di- indivíduo inquieto, movimenta-se sempre, não
ficuldades de aprendizagem e alguma consegue ficar sentado quando necessita, di-
eventual lesão cerebral. Ao longo dos ficilmente para ao realizar atividades do coti-
anos a comunidade dos neurologistas diano. Conforme CYPEL (2010, p. 63). a hipe-
despertou interesse pelo tema. Mas foi ratividade corresponde ao exagero ou excesso
em 1962 que o termo “DCM-disfunção de atividade motora na criança. Para identificar

54 INEQ - Educação integral


a presença da hiperatividade é necessário ob- menos seis sintomas relatados no manual se-
servar o comportamento dos alunos, a inquie- jam diagnosticados no indivíduo em uma lista
tação constante. Na idade escolar esse com- de nove, como desatenção ou impulsividade e
portamento torna-se um problema, causando hiperatividade (CYPEL, 2010, p. 71-73).
dificuldades na aprendizagem, sendo alunos
sem organização apresentando pouco tempo I. Em geral, distrai-se facilmente com es-
de atenção nas tarefas. tímulos pouco significativos;
II. Esquece as atividades do dia;
Na maioria das vezes, comportamentos III. Tem dificuldade em manter a atenção
relacionados à desatenção, hiperativi- em jogos ou trabalhos;
dade e impulsividade vêm associados, IV. Parece não estar ouvindo o que está
entrelaçados, não sendo possível distin- sendo falado;
gui-los como sendo decorrentes de uma V. Costuma perder objetos necessários
ou outra daquelas condições. Tem-se a ás suas tarefas ou ás atividades escola-
convicção de que a inquietude verificada, res;
em algumas crianças, é decorrência di- VI. Pouca atenção aos detalhes nas tare-
reta de sua dificuldade de fixar atenção, fas escolares e outras atividades;
fazendo com que mude de interesse em VII. Dificuldade em organizar atividades
curta fração de tempo, determinando a com objetivos determinados;
sua movimentação no ambiente até en- VIII. Evita, não gosta, ou reluta em parti-
contrar um novo objetivo. (CYPEL, 2010, cipar de tarefas que requeiram esforço
p. 68) mental mantido por um período de tem-
po determinado;
Já a impulsividade é uma dificuldade de con- IX. Não segue as regras e falha em com-
trolar os impulsos, ou seja, não espera que o pletar as tarefas escolares, rotinas ou de-
estímulo feito receba um impulso pensado, veres no local das atividades. (os citados
agindo de maneira impulsiva, sem pensar. itens acimas devem ser observados nos
Quando um aluno apresenta essa deficiência casos de desatenção, e para comprovar
de controlar a impulsividade, ele costuma não que exista é necessário o indivíduo apre-
ter paciência de esperar. sentar seis ou mais).

Outro sintoma do TDHA é a desatenção que Nos casos de hiperatividade e impulsividade,


acontece com muita frequência dos casos, também é necessário observar seis ou mais
pois o aluno não é capaz de concentrar-se ao características descritas abaixo como afirma
realizar uma atividade, não lembra-se da tare- CYPEL (2010. P.72):
fa realizada ou perde-se no meio da lição, não
lembrando do que estava fazendo. Segundo a I. Levanta-se com frequência da cadeira na
Associação Americana de Psiquiatria (APA-si- sala de aula ou outro local onde se espera que
gla em inglês para American Psychiatry Aso- fique sentado;
ciation), o diagnóstico do Transtorno de Déficit II. Em geral, age antes de pensar;
de Atenção e Hiperatividade é feito através do III. Costuma ter dificuldade de esperar sua vez
DSM-IV (Diagnostic and Statistic Manual) de- em atividades em grupos;
senvolvido por equipes clínicas, como psiquia- IV. Responde a perguntas antes que estejam
tras e neuropediatras. Esse manual orienta a completamente formuladas;
presença do TDHA, somente é feita quando ao V. Apresenta dificuldade em brincar e partici-

INEQ - Educação integral 55


par de atividade de lazer; aparece, o aluno não é atento a detalhes que
VI. em geral, corre exageradamente ou sobe ele mesmo relata serem fáceis em suas ativi-
nos móveis em situações inapropriadas; dades, não se concentra em atividades como
VII. costuma fazer movimentos com as mãos ler um livro completo, jogos ou mesmo suas
ou pernas mesmo sentado; lições, não é organizado em suas tarefas, afas-
VIII. interrompe ou mostra-se intrusa em rela- ta-se de atividades que necessitem de esfor-
ção a outras pessoas; ços para pensar e também é desorganizado
IX. geralmente fala em excesso. com seus objetos.

Nas salas de aula erroneamente alunos que A hiperatividade costuma apresentar-se em


possuem comportamento agitado são tidos forma de sintomas de agitação motora mãos e
como hiperativos. Mas para diagnosticar o pés em constante movimento, não permanece
Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperativi- sentado e fala constantemente. Na impulsivi-
dade é preciso realizar exames neurológicos dade, as características manifestadas em ca-
e clínicos para que seja comprovada sua exis- sos de TDHA os alunos não sabem esperar sua
tência. vez para realizar as tarefas.

Os sintomas desatenção, impulsividade e hipe- O tratamento do TDHA é muito amplo, haven-


ratividade são observados e avaliados no perí- do além de uma abordagem médica com me-
odo da infância. Existem casos que esses três dicamentos. O auxílio e interferência de uma
possam apresentar- se combinados no indiví- equipe multidisciplinar, assim como o papel
duo ou apenas um ou dois sintomas. CYPEL da família também é essencial. Como afirma
(2010) afirma que a falta de atenção, dificul- CYPEL (2010), o diagnóstico e avaliação são
dades de concentração, um comando dado e feitos através de profissionais com experiência
não acatado pelo aluno, mudanças constantes ampla no desenvolvimento infantil. As ques-
de atividades, são algumas características do tões orgânicas relacionadas ao cérebro cabe
TDHA. Como foi dito anteriormente, são neces- a profissionais da saúde como o neuropediatra
sários exames clínicos e neurológicos além da que investiga a possível existência do TDHA.
observação sintomática para um diagnóstico “Não existe ainda um instrumento de avaliação
preciso do Transtorno do Déficit de Atenção e que, por si só, permita a realização do diagnós-
Hiperatividade. tico isento de risco de incorreções ou críticas”
(CYPEL, 2010, p. 80).
As causas do TDHA decorrentes de fatores
neurológicos geram uma “falha” na transmis- Diante dessa afirmação, afirmamos que não é
são dos comandos, das funções executivas. O possível aceitar avaliações superficiais, base-
aluno com TDHA não tem o controle de espe- ando-se apenas em um aspecto, seja ele, com-
rar algo, quer tudo imediatamente, não atende portamental ou neurológico.
as regras, dificuldades de se concentrar nas
tarefas da rotina escolar, agitação física (não O uso dessas baterias de teste e questio-
consegue permanecer “quieto” diante de situ- nários deve ser apreciado com cuidado.
ações em que é preciso. Essas são apenas al- É importante ressaltar mais uma vez que
gumas manifestações do Transtorno do Déficit poderá haver desvio do resultado, em fun-
de Atenção e Hiperatividade. ção de que muitos desses instrumentos
estejam aferindo quase que exclusiva-
Nos casos de desatenção que comumente mente um canal perceptual, por exemplo,

56 INEQ - Educação integral


o auditivo. Poderá, também, como já foi diante de alunos com TDHA
referido, a produção e o comportamen-
to da criança, mostrarem-se melhores, Como afirma MATTOS (2015), “não existe uma
em virtude de se tratar de uma consulta técnica nem uma abordagem pedagógica es-
médica e do contato mais individualiza- pecífica que possa melhorar a atenção e o
do. Mesmo assim, esses instrumentos desempenho da criança com TDHA”. Mas o
poderão ser utilizados como auxiliares trabalho com esses alunos deve ser assegura-
ou complementares para o diagnóstico, do e garantido, sendo também possível de ser
desde que aplicados por profissionais realizado. A parceria da família do aluno TDHA
experientes e sendo essas informa- e da escola é fundamental. Para CYPEL (2010,
ções agregadas a outras observadas na p.97-98), o ambiente favorável na sala de aula
criança, permitindo maior abrangência para que se obtenha uma aprendizagem signi-
das aferições para que se formulem as ficativa a todos:
conclusões diagnósticas finais. (CYPEL,
2010, p. 81) 1) A primeira atitude, até de bom senso,
é colocar o aluno sentado bem próximo
Já o uso dos medicamentos que visam a di- ao professor, logo na primeira fila. Será
minuir os sintomas causados pelo TDHA, vem mais fácil assim vigiá-lo e estimulá-lo na
sendo discutido, pois a escolha desse trata- participação e realização das atividades.
mento em longo prazo pode ser prejudicial. 2) O professor experiente tentará encon-
Essa forma de tratamento é utilizada em alte- trar estratégias para motivar tal aluno, o
rações extremas de comportamentos. Sendo que, algumas vezes, pode ficar descuida-
que cada caso deva ser avaliado de forma indi- do. Um pequeno detalhe na apresenta-
vidualizada conforme CYPEL (2010). ção do material, um acréscimo particular
na didática, e terá ganho a atenção e o
É de suma importância a criança saber interesse do aluno.
exatamente os motivos pelos quais está 3) Solicitar a realização das tarefas se-
indo à consulta. Ser informada que está gundo a capacidade demonstrada pela
apresentando comportamentos que difi- criança e, aos poucos, com cuidado,
cultam seus relacionamentos na escola, solicitar algo mais. Se as tarefas forem
em casa, no clube, que está mostrando- grande quantidade, procurar dividi-las
-se impaciente, agitada, desorganizada em duas ou três partes. Exigências exa-
com os brinquedos, roupas e pouco res- geradas terão respostas incompletas e
ponsável com as tarefas escolares. En- desestimularão a criança, expondo-a ao
fim, deixa-la saber que está acontecendo fracasso. Nesse período, quanto mais
algo que motivou a preocupação de seus sucesso puder obter e usufruir, melhor
pais e que a busca de um profissional será. Procurar elogiar o aluno quando as
tem a finalidade de encontrar os recur- tarefas e o comportamento estiverem
sos para ajuda-la a corrigir e adequar os adequados.
comportamentos inconvenientes e, por 4) Evitar correções e comentários desa-
consequência, trazer-lhe bem-estar no bonadores, depreciativos. Mais eficiente
convívio com a família e com os amigos. será chamar o aluno para próximo de si e
(CYPEL, 2010, p. 87) mostrar-lhe como é o certo, tantas vezes
quantas forem necessárias.
3. O papel do Professor e do Psicopedagogo 5) Manter a classe organizada facilitan-

INEQ - Educação integral 57


do, por consequência, a organização do do diagnóstico deve ser de adoção de atitudes
aluno. Inserir rotinas com essa mesma que façam com que os alunos TDHA, possam
finalidade para que tenha uma previsibili- avançar no aprendizado. CYPEL (2010, p. 96)
dade do que vai ocorrer. relata que muitas vezes os professores não
sabem como agir diante dos alunos com essa
6) Manter diálogo com o médico e outros dificuldade de aprendizagem, pois
profissionais que lidam com a criança,
para ter informações, trocar ideias e en- [...] a referência a essa atitude reativa
contrar estratégias que possam benefici- dos professores tem suas razões e não
á-la. aqui intenção de menosprezá-los e me-
7) Se o aluno estiver em um dia de maior nos ainda as escolas; devem ser consi-
inquietação, oferecer-lhe a oportunidade derados heroicos nessa tarefa educacio-
de sair da sala, ir ao banheiro, ou levar nal. (CYPEL, 2010, p. 96)
algo até a biblioteca.
O trabalho com as equipes multidisciplinares
O profissional da Psicopedagogia está habilita- é importante, pais, alunos, professores, psico-
do e capacitado para uma intervenção neces- pedagogos, psicólogos etc, são fundamentais
sária auxiliando os educandos com TDHA a de- para auxiliar esse momento do estudante em
senvolverem e avançarem na aprendizagem. sua rotina escolar, “ assim como feito com a
Aliando as questões orgânicas e ambientais, o criança e com os pais, deverá ser mantido um
psicopedagogo desenvolverá estratégias para contato estreito com a escola para esclarecer
informar e auxiliar os professores. Sua inter- o que significa desatenção e/ou hiperativida-
venção esta embasada num nível preventivo de” (CYPEL, 2010, p. 97).
(BERLIM E PORTELLA in MALUF e BOMBO-
NATTO, 2007). Trabalhando com as diferenças O psicopedagogo escolar deve conhecer,
e essas devendo ser respeitadas, identificar e reconhecer e problematizar o sistema do
reconhecer habilidades e capacidades dos alu- qual faz parte e, com estes elementos,
nos com TDHA. oferecer subsídios para a discussão e re-
flexão das práticas. Envolvendo a equipe
A Psicopedagogia alia o conhecimento em es- diretiva e pedagógica-supervisor, orien-
tabelecer o processo de ensino- aprendizagem tador educacional, psicólogo escolar,
com auxílio nas dificuldades de aprendizagem, professores, alunos, pais e funcionários-
buscando e contribuindo com o avanço do in- -amplia o espectro de compreensão dos
divíduo, bem como do educador. fenômenos que podem obstacularizar a
dinâmica de funcionamento da escola,
Assim, o psicopedagogo pode contribuir tendo, assim, um papel importante nesse
para a qualificação do trabalho docen- constante e repensar o sistema escola e
te, oferecendo novas perspectivas para sua práxis. (BERLIM & PORTELLA4)
pensar e compreender as dificuldades
e o fracasso escolar. (BERLIM & POR- Como afirmam BERLIM & PORTELLA IN BOM-
TELLA³) BONATTO e MALUF (2007, p. 86), o psicope-
dagogo trabalha com duas ferramentas, as
A postura do profissional de educação diante relações no ambiente escolar e a abordagem

3 - IN MALUF e BOMBONATTO, 2007, p. 86.


4 - IN BOMBONATTO e MALUF, 2007, p. 86

58 INEQ - Educação integral


didático-pedagógica. Essas relações são ob- mentais para uma melhor e mais consistente
jetos importantes, porque auxilia o professor orientação, sendo maior a chance de sucesso
na compreensão e interação dos alunos TDHA, nos objetivos de adequação desses comporta-
respeitando as diferenças e reconhecendo o mentos”. E esse processo será assumido pelo
crescimento educacional desses alunos. Já psicopedagogo.
a abordagem didático-pedagógica tem como
importância o processo de ensino aprendiza- Os estudos ao longo do tempo sobre o TDAH
gem e como esse é construído dentro e fora avançaram e com ele também o trabalho do
da escola psicopedagogo foi fundamental. O trabalho
conjunto – escola, psicopedagogo e pais, pos-
CONSIDERAÇÕES FINAIS sibilita uma aprendizagem significativa aos
alunos com essa dificuldade.
Os objetivos desse trabalho foram: Identificar a
História da Psicopedagogia no Brasil; analisar Enfim, essa pesquisa apresentou como é pos-
a importância do psicopedagogo no processo sível indivíduos diagnosticados com TDAH
de ensino e aprendizagem do aluno relaciona- aprenderem, bem como a intervenção do psi-
do ao TDAH. copedagogo possibilita novos caminhos para
que essa aprendizagem ocorra. O trabalho des-
No 2º capítulo, foi apresentada, resumidamen- taca que o reconhecimento do Psicopedagogo
te, a História da Psicopedagogia no Brasil e como uma profissão faz-se necessário.
os objetivos desse profissional em sua atua-
ção. No 3º capítulo, é descrito o significado de REFERÊNCIAS
Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperativi-
dade (TDAH), conceitos, sintomas, diagnóstico BRASIL. Associação Brasileira do Déficit de
e tratamento. Atenção. Disponível em:<http://www.tdah.
org.br/images/stories/site/pdf/cartilha_abda.
No 4º capítulo, foi analisado o papel do psico- pdf>. Acesso em 25 mai.de 2015.
pedagogo como um professor que deve bus- BOMBONATTO, Quezia, MALUF, Maria Irene.
car a competência para fornecer subsídios Organizadoras. História da Psicopedagogia e
teóricos-metodológicos aos professores de da ABPp no Brasil: fatos, protagonistas e con-
alunos que apresentam esse transtorno. quistas. Rio de Janeiro: Wak Ed, 2007.

Para concluir, salienta-se que: em meio a diver- CYPEL, Saul. Déficit de Atenção e Hiperativida-
sos estudos sobre o transtorno de déficit de de e as Funções Executivas. 4ed. São Paulo:
atenção e hiperatividade, vemos que é possí- Leitura Médica, 2010.
vel realizar um diagnóstico precoce, quando a MATTOS, P. No Mundo da Lua. Perguntas e
escola juntamente com a família se une para Respostas sobre o Transtorno do Déficit de
acolher e ajudar esses alunos, mas há de se Atenção com Hiperatividade em Crianças, Ado-
considerar o diagnóstico parcial como cita lescentes e Adultos. São Paulo: Lemos Edito-
CYPEL (2010, p. 117), “deverá ser feita uma rial, 2014.
avaliação ampla e criteriosa das condições de SILVA, A.B.B. Mentes Inquietas: TDAH: desa-
vida e do funcionamento da família, da dinâmi- tenção, hiperatividade e impulsividade. 4 ed.
ca que se estabelece em todas as relações da São Paulo: Globo S.A.
criança nos ambientes de que participa. Tudo
Isso nos proporcionará informações funda-

INEQ - Educação integral 59


A LUDOPEDAGOGIA E SUA RELAÇÃO
COM OS BRINQUEDOS, BRINCADEIRAS,
JOGOS DE INFLUÊNCIA INDÍGENA,
PORTUGUESA E AFRICANA NO BRASIL

Mônica Schweiger

RESUMO ABSTRACT

Situar a ludopedagogia de modo coerente com a To situate ludopedagogia in a coherent way with
ocorrência do brincar/jogar, a partir de paradig- the occurrence of playing, from paradigms of his-
mas da história, antropologia e de estudos recen- tory, anthropology and recent studies of pedago-
tes da pedagogia, com as Diretrizes Curriculares gy, with the National Curriculum Guidelines for
Nacionais para a Educação Infantil - DCNEI (2009) Early Childhood Education - DCNEI (2009) and the
e a Base Nacional Comum Curricular - BNCC National Common Curricular Base - BNCC (2018)
(2018) que referenda o contido nos artigos 4º e 9º which endorses what is contained in articles 4
da Resolução CNE/CEB nº 5, de 17 de dezembro and 9 of Resolution CNE / CEB nº 5, of Decem-
de 2009, respectivamente o conceito de criança ber 17, 2009, respectively the concept of child and
e as interações e a brincadeira como eixos estru- interactions and play as structuring axes for pe-
turantes para as práticas pedagógicas na Edu- dagogical practices in Early Childhood Education
cação Infantil (0 a 5 anos de idade), viabilizou o ( 0 to 5 years of age), made possible the unders-
entendimento que brinquedos, brincadeiras, jogos tanding that toys, games, games occur in cultu-
ocorrem nas culturas, por quem, onde e quando res, by whom, where and when they are effectively
são efetivamente elaborados, experienciados e elaborated, experienced and experienced, which
vivenciados, o que no Brasil significa serem os in Brazil means those of indigenous, Portuguese
de influência indígena, portuguesa e africana os and African influence. of greater expression. By
de maior expressão. Ao relacioná-los e descre- relating them and describing them, it was possible
vê-los, foi possível concluir que pesquisas em lu- to conclude that research in ludopedagogy, even if
dopedagogia, mesmo que apenas bibliográficas, only bibliographic, cannot be separated from the
não poderão estar apartadas das culturas que os cultures that originated or influenced them and,
originaram ou influenciaram e, sobretudo, quão above all, how important it is to play for human
importante é o brincar para os seres humanos, beings, especially for and in childhood, which, in
principalmente para e nas infâncias, que, ao fazê- doing so, co-produce culture, and for this reason
-lo, coproduzem cultura, e por esta razão prova- probably toys, games, games are (re) signified in
velmente brinquedos, brincadeiras, jogos são (re) intra and intercultural interactions.
significados nas interações intra e interculturas. Keywords: Ludopedagogia; indigenous influence;
Palavras-chave: Ludopedagogia; influência indí- Portuguese influence; African influence; Brazil.
gena; influência portuguesa; influência africana;
Brasil.

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INTRODUÇÃO dos, brincadeiras e jogos, é preservar nossa
própria memória e imaginação de criança que
É inegável a importância do brincar aos seres fomos e somos, embora possamos nos encon-
humanos, não tão somente na infância, mas trar em outra fase da vida; é preservar a histó-
nela principalmente, tampouco o potencial só- ria de infâncias de gerações passadas; é pos-
cio, educativo e afetivo e identitário que pos- sibilitar no presente que crianças construam
sui. A ludopedagogia ao utilizar esse poten- histórias de infâncias; é dar oportunidade às
cial, através do ensinar aprender brincando/ gerações futuras de também conhecer essas
jogando, procura, além da atividade inerente e histórias, mesmo que modificadas/transfor-
essencial à infância que é o brincar, utilizar-se madas ao longo do tempo: o que sempre se-
de conhecimentos culturais construídos para rão, mas com valores agregados.
facilitar o desenvolvimento e a aprendizagem
das crianças desde tenra idade, sem que no Relacionar alguns brinquedos, brincadeiras,
entanto se utilize dos brinquedos, brincadei- jogos de influência indígena, portuguesa e
ras, jogos desconectados das culturas que os africana no Brasil, mostrou-se desafiador e,
originaram ou influenciaram, optando-se pelos ao mesmo tempo, tarefa difícil, pois muitas
estudos da história e antropologia, aliados aos publicações esparsas são encontradas e nem
estudos mais recentes da pedagogia para con- sempre os registros de entendimentos so-
ceituar e delimitar o tema. bre determinado brinquedo, brincadeira, jogo
coincidem, até porque os diferentes tipos de
Considerando que, no mundo atual, essencial- registros são captados e organizados quase
mente capitalista, a forma de produzir os brin- sempre a partir do olhar de outra(s) cultura(s).
quedos vem, gradativamente, deixando de ser Desta feita, entende-se que este escrito não é
artesanal, mantendo-se esta forma de produ- exato e se tem ciência que não é finito, tam-
ção no Brasil em algumas culturas indígenas, pouco pretende exaltar uns em detrimento de
em que produzir o brinquedo ainda tem o senti- outros, mas ao relacionar alguns brinquedos,
do de fazer parte da brincadeira, ponto em que brincadeiras, jogos em um único artigo, espe-
se inicia, onde procurar e selecionar elementos ra-se possa aguçar a curiosidade e pesquisa
da natureza se fazem necessários para a brin- bibliográfica em ludopedagogia.
cadeira acontecer, surge a importância de se
resgatar esta forma de produção do brinquedo, 1. A Ludopedagogia e sua relação com os brin-
que também terá o significado de demonstrar quedos, brincadeiras, jogos de influência indí-
a outras crianças não indígenas a importância gena, portuguesa e africana no Brasil.
de se preservar essas culturas e o meio em
que vivem, sem o que, daqui a algum tempo, As Diretrizes Curriculares Nacionais da Educa-
não mais se deterá o processo de construção ção Infantil - DCNEI (Resolução CNE/CEB nº 5,
dos mesmos. Conhecê-los, ajuda a preservar de 17 de dezembro de 2009), em seu artigo 4º
a memória, a história e até mesmo os brinque- conceitua toda criança como:
dos em sua originalidade, apropriando-se des-
ses saberes. [...] sujeito histórico e de direitos, que,
nas interações, relações e práticas coti-
Resgatar influências dos saberes das culturas dianas que vivencia, constrói sua iden-
indígena, portuguesa e africana sobre brinque- tidade pessoal e coletiva, brinca, imagi-

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na, fantasia, deseja, aprende, observa, processo educativo. (ORTIZ, 2005, p. 10)
experimenta, narra, questiona e constrói
sentidos sobre a natureza e a sociedade, E nesse sentido a ludopedagogia deve ser
produzindo cultura." (BRASIL, 2009) compreendida, proporcionando interações e
brincadeira. Assim como a pedagogia não se
A Etapa da Educação Infantil (de 0 a 5 anos) na concebe distanciada da filosofia, sociologia,
Base Nacional Comum Curricular, prevê dois psicologia e outras ciências, a ludopedagogia
eixos estruturantes das práticas pedagógicas: não está alheia à história e antropologia, sendo
as interações e a brincadeira (Artigo 9º da Re- selecionadas para e como compreensão sobre
solução CNE/CEB nº 5, de 17 de dezembro de o tema, além de estudos recentes na educa-
2009), nos quais a ludopedagogia se insere. ção.

A palavra ludus vem do latim ludere que signi- Para Huizinga (2000), o lúdico é atividade hu-
fica brincar/jogar. Pedagogia, por sua vez, sig- mana, "elemento cultural". Lúdico e jogo têm
nifica a ciência que estuda a educação, tendo mesmo significado. Compreende jogo como
como um dos objetos de estudo os processos fenômeno antropológico, que potencializa a
de ensinoaprendizagem, o que requer intencio- identidade do grupo social. Ortiz ( 2005), de-
nalidade por parte de quem ensina: para quê signa o jogo como "prática cultural".
ensina, o que ensina e como ensina em rela- Brougère descreve a origem da "cultura lúdica"
ção ao sujeito que aprende: para quê aprende, e o que é:
o que aprende e como aprende.
Origina-se das interações sociais, do
A definição de ludicidade de Luckesi (2000), re- contato direto ou indireto (manipulação
fere-se a um fazer humano que não se relacio- do brinquedo: quem o concebeu não está
na apenas à presença de brincadeiras, jogos, presente, mas trata-se realmente de uma
mas a sentimentos, atitudes dos sujeitos en- interação social). A cultura lúdica como
volvidos na ação, um prazer em função do en- toda cultura é o produto da interação so-
volvimento genuíno com a atividade, uma sen- cial [...]. A criança co-produz sua cultura
sação de plenitude que acompanha processos lúdica, diversificada conforme os indi-
formativos significativos e verdadeiros. víduos, o sexo, a idade, o meio social. (
Ortiz é mais enfático: 2002, p. 27-28)

[...] Deve-se estimular as atividades lúdi- Desse de modo que a ludopedagogia não pode
cas como meio pedagógico que, junto a ser concebida apartada das culturas. Ortiz uni-
outras atividades, como as artísticas e versaliza o jogo enquanto prática cultural e o
musicais, ajudam a enriquecer a persona- dinamiza em relação às idades quando escre-
lidade criadora, necessária para enfrentar ve:
os desafios na vida. Para qualquer apren-
dizagem, tão importante como adquirir, é “O jogo é criança, adolescente, homem,
sentir os conhecimentos [...]. Divertir-se velho, percorre as etapas evolutivas,
enquanto aprende e envolver-se com a nasce, viaja, acompanha o ser humano
aprendizagem, fazem com que a criança e morre com ele. [...] O jogo faz cultura,
cresça, mude e participe ativamente do a cultura faz vida: o jogo é vida e a vida,

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cultura. (ORTIZ, 2005, p. 22) influências lúdicas ao nosso país, consideran-
do-se o tráfico de pessoas entre continentes,
Kishimoto (1998), relativiza as etapas evoluti- a extensão territorial do Brasil, os paises fron-
vas conforme as culturas e períodos da histó- teiriços na América do Sul e no contexto do
ria do Brasil. Explica que no início da República continente americano em relação aos fluxos
a imagem da criança indígena era misturada migratórios.
com a dos adultos, pois de tudo participava:
danças, cantos, imitação de animais, ativida- Em reportagem publicada na revista Nova
des de subsistência e outras; mesmo os com- Escola, escrita por Amaral (2015) "As origens
portamentos descritos como jogos não per- dos negros do Brasil", que versa em seu início
tenciam somente às crianças. Por esta razão, sobre a reportagem da revista Veja "DNA iden-
fala-se em jogos dos indígenas, distinguindo- tifica origem de escravos trazidos à América",
-se o significado de jogo em outras culturas obtém-se a informação de que escravos enter-
neste período histórico, em que a criança vê-se rados há mais de 300 anos no Caribe, na ilha
destacada do mundo adulto. de St. Martin, teriam vindo de uma região que
hoje são os países africanos Camarões, Gana
Entretanto, atualmente, dentre tantas culturas e Nigéria.
indígenas presentes no Brasil, acaba por ser
muito diferente como cada cultura desenvolve Na mesma reportagem da revista Nova Escola
o brinquedo e pratica a brincadeira, jogo, o que é comentada pesquisa realizada pelo médico
será perceptível quando da descrição de alguns geneticista e professor titular de Bioquímica
brinquedos, brincadeiras, jogos de influência Sergio Danilo Pena, da Universidade Federal de
indígena no Brasil, considerando também que Minas Gerais - UFMG, que, ao analisar genes
essas influências vêm, não tão somente, mas de um grupo de negros em São Paulo, polo de
principalmente, de fluxos migratórios internos migração interna no país e, por isso, de possí-
e de povos de países circunvizinhos ao Brasil vel referência para o que ocorreu em geral no
(que são quase todos da América do Sul!), o Brasil, estabeleceu marcadores de linhagem
que faz ser necessário mencionar a localização para o grupo, sendo "44,5% com ancestral no
atual dos indígenas em terras brasileiras. Centro Oeste, 43% no Oeste e 12,3% no Sudes-
te da África, dados que se comparados com
Sobre a influência portuguesa no lúdico bra- do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísti-
sileiro, Cascudo (2001) registra que práticas ca - IBGE, dependendo do período considerado
lúdicas da infância brasileira como cantigas e das relações comerciais mantidas no comér-
de roda, adivinhas, parlendas, histórias de rai- cio de escravos, corroboram em grande parte
nhas e príncipes, de bruxas e assombrações, com os do levantamento realizado por João
de brinquedos como o pião, a pipa, o bodoque, José Reis, professor de história da Universida-
e os jogos de pedrinhas, a amarelinha, dentre de Federal da Bahia - UFBA, que destaca a atual
outros, foram trazidos pelos portugueses e fa- Angola como a região de maior fornecimento
zem parte da cultura europeia. de escravos aos domínios portugueses nos sé-
culos XVI, XVII e a primeira metade do século
Quanto às influências africanas, para deline- XVIII para o Rio de Janeiro, Recife e São Pau-
á-las, é preciso obter dados sobre quais pro- lo, da atual Nigéria para a Bahia em meados
váveis países africanos trouxeram possíveis do século XVII até após a proibição do tráfico

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de pessoas, e da atual Moçambique, na costa os autores assinalam pontos comuns
leste africana, para o Rio de Janeiro, Recife e como elementos que interligam a grande
São Paulo no fim do século XVIII e começo do familia dos jogos: 1. liberdade de ação
século XIX. do jogador ou o caráter voluntário, de
motivação interna e episódica da ação
Antes, porém, de se iniciar a descrição de brin- lúdica; prazer (ou desprazer), futilidade,
quedos, brincadeiras, jogos, utilizar-se-á algu- o "não-sério" ou efeito positivo; 2. regras
mas citações para tentar compreendê-los, sem (implícitas ou explícitas); 3. relevância
que haja a preocupação em definí-los com pre- do processo de brincar (o caráter impro-
cisão: dutivo), incerteza de resultados; 4. não
literalidade, reflexão de segundo grau, re-
Vital Didonet: "É uma verdade que o brin- presentação da realidade, imaginação e
quedo é apenas o suporte do jogo, do 5. contextualização no tempo e espaço."
brincar, e que é possível brincar com a (KISHIMOTO, 2001, p.27)
imaginação. Mas é verdade, também, que
sem brinquedo é muito mais difícil reali- 2. Brinquedos, brincadeiras, jogos de influên-
zar a atividade lúdica, porque é ele que cia indígena no Brasil
permite simular situações [...] Se crian-
ça gosta de brincar, gosta também de Bilboquê: típica dos Ticuna, no estado do Ama-
brinquedo. Porque as duas coisas estão zonas. Brinquedo confeccionado com elemen-
intrinsecamente ligadas." (IN Kishimoto, tos da natureza: casca dura de frutos, bambu
1998). Kishimoto: "[...] o brinquedo con- e outros, uma espécie de "bola" com furo e um
tém sempre uma referência ao tempo de bastão presos por fibra vegetal, em que, ao lan-
infância do adulto com representações çar a "bola" no ar, tenta-se encaixar o furo da
veiculadas pela memória e imaginação. "bola" no bastão.
O vocábulo brinquedo não pode ser re-
duzido à pluralidade de sentidos do jogo, Peteca e a brincadeira mangá, tobdaé: uma es-
pois conota criança e tem uma dimensão pécie de queimada. Peteca, brinquedo confec-
material, cultural e técnica. Enquanto ob- cionado pelos Pareci e Xavante no estado do
jeto, é sempre suporte da brincadeira. É Mato Grosso, pelos Canela, no estado do Ma-
o estimulante material para fazer fluir o ranhão e, provavelmente, por demais indígenas
imaginário infantil. E a brincadeira? É a pelo Brasil. Os Canela utilizam folhas de buriti,
ação que a criança desempenha ao con- uma espécie de palmeira do cerrado, para con-
cretizar as regras do jogo, ao mergulhar feccioná-la.
na ação lúdica. Pode-se dizer que é o lú-
dico em ação. Desta forma, brinquedo e Mangá, Tobdaé parece ser brincadeira comum
brincadeira relacionam-se diretamente em boa parte das tribos indígenas, como entre
com a criança e não se confundem com os Xavante do estado de Mato Grosso, uma es-
o jogo." (KISHIMOTO, 2001, p.21) pécie de queimada em duplas, com a diferença
de serem usadas petecas ao invés de bola, em
Sobre jogos, Kishimoto sintetiza: que as duas crianças da dupla possuem várias
petecas para lançarem-nas e acertarem-nas
[...] (excetuando-se jogos de animais), uma na outra, "queimando-a", alternando-se a

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vez da criança "queimada" por outra que esteja chiuba, entrada da casa, mandíbula de macaco
aguardando brincar. e espelho no jogo do fio.
Jogo da onça (e dos cachorros): Adugo. Um
Pernas de pau: Os Xavante do estado de Mato tabuleiro com um quadrado maior dividido em
Grosso procuram tronco longo e reto com uma 16 quadrados menores, cortado por linhas dia-
forquilha, em forma de Y para apoiar o pé, em gonais e um apêndice triangular dividido ao
meio ao cerrado (vegetação típica da região, centro é conhecido traçado pelos Bororos de
de árvores retorcidas), levando, às vezes, horas Mato Grosso, Manchineris do Acre e Guaranis
para encontrarem o primeiro e depois o segun- de São Paulo, conforme levantamento realiza-
do (parecido com o primeiro), a fim de forma- do pelo projeto Jogos indígenas do Brasil.
rem o par do brinquedo e só depois iniciarem a
brincadeira: andar de pernas de pau. Tabuleiro traçado, 15 pedras ou sementes, em
que uma maior do que as demais é a onça
Dobraduras: típica dos Canela, no estado do que sai do centro do quadrado maior, devendo
Maranhão. Confeccionadas em folhas de bu- atacar os cachorros, "comendo-os", como no
riti, uma espécie de palmeira do cerrado, para jogo de damas, e demais catorze "peças" os
representar animais, da qual também confec- cachorros distribuídos em um só lado do qua-
cionam petecas. drado maior, nos pontos de encontro de linhas,
devendo encurralar a onça, para que não mais
Figuras com fio¹, conhecidas como jogos de possa se movimentar.
cordel, jogo do fio, cama de gato. Figuras ela-
boradas pelos Tapirapé, dos estados de Mato Brincadeira do gavião (e dos passarinhos):
Grosso e Tocantins, representando elementos Toloi Kunhügü - uma espécie de pega pega. É
da cultura, como objetos, animais e cenas do descrita como típica da tribo Kalapalo, locali-
cotidiano, com o cordel/fio de aproximada- zada ao sul do Parque Indígena do Xingu, no
mente um metro e meio de comprimento atado estado de Mato Grosso, mas conhecida por
nas duas extremidades, em sequencia de ma- outras tribos, também. É brincada às margens
nobras e entrelaçamentos com os dedos das de águas ou em solo fofo, desenhando-se uma
mãos de um ou dois participantes, iniciando-se árvore com seus galhos, para que cada criança
com a abertura do "anel" do fio seguro na parte escolha um, a fim de sentar-se e em ser seu ni-
contrária à das palmas das duas mãos, deixan- nho, abrigo do gavião, que propõe a brincadei-
do os quatro dedos de cada mão envolvidos ra e costuma ser o pegador/predador dos pas-
pelo fio e os polegares de fora, como base sarinhos. A brincadeira se inicia com o gavião
para a maioria das figuras. Os Karajás, dos acocorado/agachado, que ao ser atraído pelos
estados de Mato Grosso, Goiás, Tocantins e passarinhos fora de seus ninhos, a baterem
Pará, construíam em torno de vinte figuras em com os pés no chão e a cantarem, salta/pula e
1909, observadas por Kissemberth, das quais corre em direção às presas, que podem se pro-
três eram conhecidas pelos Tapirapés. Entre teger do ataque, correndo para o galho (ninho)
os Taulipáng, no estado de Roraima, fronteira escolhido. O gavião ao pegar sua(s) presa(s),
com a Venezuela e a Guiana, Kissemberth rela- leva-a(s), uma a uma, para o seu ninho, de onde
tou a representação de raízes da palmeira pas- não poderão mais sair, até que sobre o último

1 - Importante é que toda figura formada representa elementos das culturas e por esta razão os indígenas dão nomes
às figuras.

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passarinho que será o próximo gavião.
A brincadeira dos marimbondos também é
Brincadeira do tucunaré ou do peixe pacu: Uma conhecida como Cabas - Maë, sendo um gru-
criança é o pescador e as demais formam uma po de cabas (vespas) e outro de roçadores. O
fila. O pescador, com uma vara ou pedaço de grupo de cabas senta-se em roda e segurando
galho/pau parecido com uma vara de pescar a parte de cima das mãos, uns dos outros, ba-
corre em direção à última criança da fila para lançam-nas para cima e para baixo cantando,
tentar "pescá-la"/tocá-la com a vara, enquanto imitando um ninho de cabas. O grupo de roça-
a fila serpenteia. dores mexe os braços como se cada um esti-
vesse a roçar, até que um deles bate no ninho
Brincadeira da Queixada: Nankiô. Os Panará de cabas que saem "voando" a picar os roçado-
dos estados de Mato Grosso e Pará crêem res. Cabas ou marimbondos, que são vespas,
que os animais já foram seres humanos que são insetos comuns nas matas.
faziam aldeias, festas, caçadas, e dizem que
com os bichos aprenderam: com o rato a se- A corrida do saci: Heiné Kuputisü; e a briga
mear milho e com a cotia amendoim, fazendo de galo. Também brincada pela tribo Kalapa-
a festa da cotia como ela ensinou, antes da lo, consiste em correr com um só pé (como o
colheita. Assim também a brincadeira da quei- saci), até uma distância pré determinada por
xada imita àquelas criadas na aldeia: ao entra- uma linha traçada, sendo mais importante a
rem nas casas, a revirarem as coisas e a mexe- proximidade ou chegada à linha do que a ve-
rem nas comidas. Dentro de casa os meninos locidade. Ganha a corrida quem percorrer a
são pintados com urucum ou jenipapo, saem maior distância, sem que o pé seja trocado.
em fila, uns segurando nos outros, cantando e
dançando a música da queixada, ensinada por Na brincadeira briga de galo, uma dupla de
um adulto, até à casa central da aldeia, onde crianças indígenas fica parada em um só pé na
os homens se encontram à noite e os meninos água do rio, com os braços cruzados até que
são formados quando deixam de ser crianças. uma criança derruba a outra ao bater os om-
Ao adentrarem, caem "mortos" no chão, como bros para tentar desequilibrá-la.
as queixadas caçadas, e um adulto ajeita-as,
uma a uma em roda, como se tivesse prepa- Os Manchineri, do estado do Acre, imitam um
rando os porcos para assarem no jirau. galo: a dupla inclina o tronco para frente até a
cintura e com as mãos dadas atrás das coxas,
Brincadeira dos Marimbondos ou Cabas - Maë: usam o tronco para empurrar um ao outro fora
Brincadeira realizada à beira de um rio, em que de um círculo traçado no solo.
um grupo, geralmente de meninas, brinca de
fazer beiju (tapioca) e o outro, geralmente de Derruba toco ou luta do maracá (instrumen-
meninos, constrói na terra ou areia uma casa to de cabaça, que é a casca do fruto maduro,
de marimbondos (vespas). Quando o primeiro também utilizada como utensílio ou panela):
grupo constata que a casa de marimbondos brincada pelos Pataxó dos estados de Minas
está quase pronta, corre para tentar destruí-la Gerais e Bahia (derruba toco) e pelos Tupinam-
e o grupo que a construiu tenta evitar que isso bá do litoral brasileiro (luta do maracá).
ocorra, "picando" quem dela se aproximar, a
fim de evitar a destruição da moradia. Um toco no centro da "luta" em que a dupla ten-

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ta um derrubar ao outro para fazer o toco tom- cruzeta de cana ou madeira leve, coberta por
bar com parte(s) do corpo em desequilíbrio. papel de cor, com três linhas finas à mes-
Jogo da banana: Poï Aru Nhagü, assim deno- ma distância em três lados da armação e na
minado entre os Ticuna. Inicia com uma dupla, armação inferior uma cauda longa para pender,
cada qual com sua pilha de rodelas de banana. de tecido leve ou papel, precisa de quantidade
Demais indígenas escolhem entre defender ou de linha suficiente para ser levantada contra o
derrubar as rodelas da fruta, utilizando uma vento e sustentada no ar. As arraias podem ter
bola de pano para tentar "queimar" aqueles formato de paralelogramo (quadrado, retângu-
que tentam derrubá-las, eliminando-os da brin- lo, losango), com forma de aves, estrelas, triân-
cadeira. gulos e outras. Os portugueses conhecem-nas
como arraia, raia, bacalhau, papagaio, gaivota,
Piões que zunem: Embora tenham sido os por- estrela... Yrjo Him, autor do livro "Les Jeux d'En-
tugueses que trouxeram o pião com cordão ao fants" (apud Lima, s.d. p. 278), comenta que
Brasil na época da colonização, os Taulipáng lendas coreanas sugerem que no Japão foi er-
elaboram pião com pequena totuma (fruto), guido um papagaio com uma lanterna, dando a
redonda e oca, fazem furo(s) redondo(s) na la- impressão do surgimento de uma estrela. No
teral para zunir e mais dois para atravessar um Brasil, as denominações correntes são: pipa,
palito de madeira dura, em ângulo reto, selam papagaio, curica, cafifa, pandorga, quadrado,
o palito na totuma com cera negra e giram-no arraia, raia e outras.
com as mãos em solo plano para o som se
produzir. Os Panará do estado do Pará fazem Jogo do pião com cordão: A origem do pião
piões que zunem do tucumã, fruto de uma pal- está entre os gregos e romanos, mas foram os
meira. Outros indígenas como os Galibi, loca- portugueses que divulgaram este jogo no Bra-
lizados à margem direita do rio Oiapoque, ao sil nos primórdios da colonização.
norte do estado do Amapá, também produzem Teófilo Braga (apud Cascudo, 1984, p. 59) es-
piões que zunem. creve em versos portugueses a seguinte adivi-
nhação sobre o pião com cordão:
Jogo de bola. Da árvore caucho (Castilloa ulei),
nativa da Colômbia e da Amazônia no Brasil, "Para andar lhe pus a capa
indígenas extraiam goma elástica (látex) para E tirei para andar
revestir uma bola que aos primeiros europeus Que ele sem capa não anda
pareceu ser feita de um pau muito leve. Reba- Nem com ela pode andar
tiam-na com as costas e deitados de bruços. Com capa não dança
Os Pareci, do estado de Mato Grosso, extraiam Para dançar se bota capa
o látex da mangabeira para preparar a bola de Tira-se a capa para dançar"
borracha e jogavam-na às cabeçadas.
Cascudo (1984, p. 344) descreve o pião e sua
2.1 Brinquedos, brincadeiras, jogos de influên- procedência no Brasil:
cia portuguesa no Brasil
O pião é um pequeno objeto feito de ma-
Pipa: Introduzida no estado do Maranhão pe- deira, de preferência a brejaúva, tendo na
los portugueses no século XVI, mas de pro- ponta um prego - ferrão - implemento da
vável origem oriental, a arraia, brinquedo de lúdica infantil, do jogo do pião, atividade

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recreativa introduzida no Brasil pelo po- tentando acertar e tirar uma bola por vez do
voador branco. triângulo, ganhando-a se conseguir, até que se
acabem todas.
Bolinhas de gude e o jogo do papão: É possível
afirmar que bolinha de gude é um dos brinque- Bolinha Box: Cavam-se quatro buracos no solo,
dos mais antigos da humanidade, pois data conhecidos como birocas ou box. Jogadores
de 3.000 a 4.000 anos A.C., fato comprovado (dois a quatro) decidem quem será o primeiro
pelos exemplares encontrados em escavações ao último a lançarem suas bolinhas em dire-
arqueológicas no Egito e Oriente Médio. Os ção ao primeiro buraco. Aquele que mais apro-
gregos também a utilizavam em vários jogos ximar a sua, inicia jogando a gude da primeira à
e os romanos os difundiram. As bolinhas eram quarta biroca ou do quarto ao primeiro box. Ao
de pedras, tanto é que a palavra "gude" vem de errar, espera novamente sua vez de jogar até
"gode" que significa pedrinha redonda e lisa. que termine a sequência de acertos nos bura-
Passaram a ser feitas de argila, madeira e már- cos para só então "matar" bolinhas dos demais
more (rocha encontrada onde houve atividade jogadores, que vão saindo quando tiverem sua
vulcânica). Só no século XV começaram a gude acertada.
ser feitas as de vidro (Veneza e Boêmia). No
século XVII surgiram as de porcelana e louça. O jogo do papão: Com referência ao papão,
Foram criadas também as de aço, mas estas "comedor de criancinhas", são cavados três
pouco uso tiveram porque danificavam as de- buracos no solo nos vértices de um triângulo
mais, Hoje, são multicoloridas. de 3 metros de lado, em que o jogador tem de
completar três voltas para passar a ter o direito
Barca: Em espaço limpo e plano, desenha-se de "papar" bolinhas de gude dos demais joga-
no chão a barca em formato oval, colocando- dores e adquirir imunidades.
-se dentro a mesma quantidade de bolas sele-
cionadas por cada jogador, uma a uma e lado a Cabra cega/Cobra cega, batecondê: De origem
lado. Da barca, dista-se dois a três metros para romana e grega, comum na Espanha e em Por-
traçar uma linha paralela, de onde o jogo se ini- tugal, de onde veio para o continente america-
cia. Antes, porém, cada jogador lança sua bola no. A brincadeira consiste em vendar os olhos
jogadeira da barca à linha para verificar a mais de uma criança e iniciar um diálogo (de per-
próxima e assim decidir quem é primeiro, o se- guntas e respostas) entre a cabra cega e outra
gundo, o terceiro... a jogar à força dos toques criança. Em Portugal:
para tirar as bolas depositadas, uma a uma, da
barca. "Cabra cega, donde vens?
De Vizela (ou de Castela)
Triângulo: Traça-se um triângulo no chão e Que trazes na cesta?
cada jogador coloca uma quantidade combi- Pão e canela.
nada de bolas, posicionando-as na área inter- Dás-me dela?
na próximas às linhas e ângulos. Inicia quem Não, que é para mim e para minha velha."
acertar a bola atiradeira mais próxima à linha
traçada a certa distância do triângulo, que de- “Zigue tanela" Dito por outra criança ao fingir
pois é a inicial dos toques dos jogadores. Cada dar um beliscão na cabra cega, que ao seu re-
jogador segue o jogo de onde sua gude parou, dor tenta agarrar uma das crianças brincantes:

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a próxima a ter seus olhos vendados. No Brasil, contagem de 0 a 100 e os batedores aceleram
o diálogo mais comum é: as batidas. Os dois puladores que obtiverem
maior número de saltos, serão os próximos a
" Cabra cega, de onde vens? bater a corda.
Do Castelo Chamada: Dois participantes batem a corda
Trazes ouro ou trazes prata? e outros formam fila, pulando um por vez, di-
Trago ouro! zendo: "Pique, rabo, emenda", em três saltos,
Vá beijar no cu do besouro. saindo no quarto e o próximo "emendando",
Trago prata! iniciando a pular e a dizer a mesma coisa ou
Vá beijar no cu da barata." o que vai sair diz o nome de outro participante
para entrar, ao invés da fila.
Pular/saltar corda: Embora não se consiga pre-
cisar a origem de pular/saltar corda, existem Cara ou coroa: Jogo antigo em praças públicas
registros desta atividade em pinturas medie- da Grécia até o norte da Europa. Na Grécia era
vais. No entanto, pressupõe-se que possa ter jogada uma concha, branca de um lado e ne-
origem bem mais remota, até porque, conhe- gra do outro. Os romanos utilizavam uma mo-
cida em muitos lugares do planeta, evoluiu e eda com a cabeça de Janus (deus romano das
constituiu-se em desporto, com campeonato mudanças e transições) dum lado e do outro
mundial, rope skipping em inglês, em que são um navio: "caput aut navis" o que literalmente
executadas séries de saltos, acrobacias, ma- passou a ser na Gália "cabeça ou nau". As duas
nejos com a corda, buscando sincronizar mo- faces de Janus simbolizam o passado e o fu-
vimentos dos saltadores com uma música em turo. Sua figura é associada a portas (entrada
execução. e saída) e a transições: dos inícios, das deci-
sões, das escolhas. Por esta razão, é jogado
Trazida pelos portugueses ao Brasil, são va- até hoje para decidir quem inicia a partida de
riados os saltos executados: salto básico ou qualquer jogo.
fácil - pés ligeiramente afastados, saltando
juntos; salto pé alternado: mais rápida do que Amarelinha ou academia, cademia (jogo ginás-
a técnica anterior, saltar com o pé alternado tico). Jogo infantil muito antigo, conhecido por
possibilita aumentar a velocidade; e assim há diversos nomes pelo mundo, marelle na Fran-
várias outras técnicas, combinando diferentes ça, de onde provém amarelinha, pular maré
formas de saltar e bater corda. em Minas Gerais, marelinha no Rio de Janeiro.
Jogos de corda para vários participantes: Consiste em traçar quadrados enumerados de
um a dez, sendo uma casa para os números 1,
Salada, saladinha 4, 7 e 10, unidos e centralizados em sequencia
"Salada, saladinha numérica por duas casas: 2 e 3, 5 e 6, 8 e 9,
Bem temperadinha, que se assemelham às asas de avião, palavra
Azeite, vinagre, sal, que designa o jogo no Rio Grande do Norte. No
Pimenta, querosene topo é traçada uma oval, denominado de céu,
e fogo!" lua ou cabeça "do corpo humano" e embaixo
outra oval em contraposição ao céu, o inferno
Dois batedores iniciam a brincadeira cantando (a nomeação varia conforme as culturas, as-
com o pulador. Ao término da letra, iniciam a sim como a utilização ou não do "inferno"), de

INEQ - Educação integral 69


onde se posiciona o jogador para lançar a pe- mão os ossinhos que não conseguiu reaver no
drinha na primeira casa (a de número um), não primeiro lançamento. Joga os cinco ossinhos,
podendo nela adentrar, saltando direto com lança um no ar e, antes de reavê-lo com a parte
um pé em cada casa, dois e três, com um só contrária da palma da mão que o lançou, tenta
pé, casa quatro, e assim sucessivamente até a pegar os quatro ossinhos com a outra.
casa dez, podendo descansar e pisar com os
dois pés no céu, lua ou cabeça "do corpo hu- Jogando com uma mão e depois com outra:
mano" para retomar a volta e buscar a pedra, Joga os cinco ossinhos no solo ou mesa, pega
reiniciando o traçado ao jogar a pedra na casa um sem tocar nos demais, lança no ar e rea-
seguinte, continuando a saltar até errar (aden- vê um a um dos quatro ossinhos na palma da
trando na casa onde está a pedra, pisando nas mão, antes do quinto ossinho cair, retirando-os
linhas do traçado, esquecendo de pegar a pe- da palma a cada jogada e colocando-os no
dra de volta, errando ao lançar a pedra na casa) solo ou mesa. Depois, dois a dois, três, quatro.
e passar a vez a outro jogador, que iniciará o Há também os obstáculos que precisam ser
mesmo percurso com sua pedrinha. Em Por- transpostos, como a ponte e o muro, represen-
tugal é conhecido como jogo da macaca, pular tados por uma das mãos.
macaca, jogar macaca, jogo do homem.
2.2 Brinquedos, brincadeiras, jogos de influên-
Jogo dos ossinhos: Conhecido por Cinco Ma- cia africana no Brasil
rias (saquinhos de tecido de mesmo tamanho
com enchimento: serragem, areia, grãos ou se- Cuiba: Brinca-se em duplas, cada qual seguran-
mentes). do um sabugo de milho até no máximo a me-
tade, um por vez batendo com força o sabugo
Egipcios jogavam ossinhos para preverem o de milho que o outro segura, vencendo aquele
futuro, de onde provém possivelmente o jogo que conseguir quebrar o do outro primeiro. No
executado pelos romanos e, principalmente, estado do Sergipe é conhecido como jogo do
pelos gregos. Utilizavam pequenos ossos das Capuco:
pernas ou patas de carneiro para realizar uma
espécie de jogo de azar, em que se ganhava ou Capuco é a espiga de milho depois de
perdia o apostado, passando a ser, muito tem- tirados os caroços. Os meninos iam
po depois, apenas um jogo de destreza e os buscá-lo nos quintais, no monturo, no
ossinhos a serem substituídos por pedrinhas e chiqueiro, arrancando-o dos dentes e da
reproduzidos em marfim, gesso e plástico. lama dos porcos. A briga de capucos era
Jogando com duas mãos: Cinco ossinhos são como jogar pião, empinar papagaio, bo-
jogados para o alto pelo jogador que tenta re- tar sal e pimenta em cima do sapo, dos
aver a maior quantidade na parte contrária da maiores divertimentos da criançada.
palma da mão que os lançou. A quantidade Toda uma cerimônia rodeia o encontro
de ossinhos pegos são passados para a outra de dois jogadores de capucos; medem-
mão, exceto um que novamente é jogado no ar -se o tamanho e grossura; discutem-se
e recuperado com a parte contrária da palma as condições do encontro, quantas ve-
da mão que o lançou. Sem que o consiga, per- zes um capuco deve bater no outro, se
de a vez. Em conseguindo, lança novamente até quebrar-se ou até um certo número
um ossinho no ar, enquanto pega com a outra de pancadas." (Gilberto Amado, História

70 INEQ - Educação integral


da Minha Infância, 88, editora José Olym- movimenta sua pedra, mas o outro move a
pio, Rio de Janeiro, 1954: b IN Terra Bra- dele, sempre para o vértice seguinte, até que
sileira: Brasil Folclórico). um deles termine o trajeto do labirinto primeiro,
Meu querido bebê (Nigéria): Um participante
Pegue a cauda (Nigéria): Formam-se duas ou sai para não ver os demais, enquanto outro é
mais filas com a mesma quantidade de partici- escolhido para ser o "bebê", deitar no chão e ter
pantes, que se seguram entre si pela cintura ou o contorno do seu corpo traçado no chão. Fin-
ombro. O último de cada fila coloca um lenço do o traçado, o "bebê" se junta aos demais para
no bolso ou cinto para que o primeiro de cada o participante que saiu voltar e tentar acertar a
fila persigua a(s) "cauda(s)", tentando tirar o(s) quem pertence o contorno do corpo. Acertan-
lenço(s). Vence a fila que pegar mais lenços ou do, pontua e permanece para participar da pró-
a que pegar o lenço primeiro. xima rodada. Não acertando, sai do jogo e ou-
tro participante é escolhido para tentar acertar
Saltando o feijão (Nigéria): Um "balançador" o contorno do novo "bebê" selecionado. Quem
começa a girar uma corda no chão e demais fizer mais pontos, vence.
participantes formam um círculo em torno dele
e começam a saltar, evitando que a corda os Kameshi Mpuku Ne, conhecida como o gato e
atinja. Se isto ocorrer, afastam-se e deixam de o rato (Originou-se com o povo Luba, do Con-
saltar até que sobre um só participante que go). São escolhidos quem comanda a brinca-
será o vencedor. deira, o rato e o gato. Demais participantes são
distribuídos pelo espaço em linhas e colunas
Terra-mar (Moçambique): É traçada uma li- iguais (4X4, 5X5, etc), conforme o número de
nha reta no chão e depois escrito terra de um brincantes para esta formação, distando-se
lado e do outro mar; tanto mais longa será a um do outro em aproximadamente um metro, a
linha quanto maior o número de brincantes. fim de permitir a formação de corredores para
Os participantes podem iniciar de um dos la- o fluxo do rato e gato. A brincadeira se inicia
dos, quando um outro fora do "campo" chama quando "linhas se dão as mãos" e o rato iniciar
o lado contrário para onde todos devem pular a corrida/fuga do gato por entre os corredores
e assim seguir os comandos de terra ou mar. das linhas, alternando-se para a formação de
Quem saltar diferente do comando, vai saindo colunas quando o comando for dado: "parar o
da brincadeira. rato", momento em que se soltam as mãos das
linhas para dá-las às colunas e assim continu-
Labirinto (Moçambique): Dois participantes ar a perseguição até que o rato seja pego ou
sentam-se de frente um para o outro com uma pelo tempo que a brincadeira durar.
pedra escondida em uma das mãos e na pon-
ta (início) do labirinto em forma de "quadrado Mbube Mbube (Gana): "Imbube", em Zulu, é
ou retângulo" é colocada uma pedra diferente uma das palavras para designar leão e "Mbube"
para cada jogador. Sem que os dois jogadores significa chamar o leão para capturar o impala.
saibam a pedra que cada um traz em uma das Os participantes formam um grande círculo e
mãos, o jogo começa com um tentando acer- escolhem dois, um para ser o leão e o outro o
tar em qual das mãos se encontra a pedra do impala, vendam os olhos, giram e afastam um
outro. Quem acertar, move sua pedra para o do outro no espaço do círculo. O leão começa
vértice seguinte do labirinto e quem errar, não a se movimentar para pegar o impala, que tam-

INEQ - Educação integral 71


bém se movimenta para tentar escapar com a las culturas.
ajuda do canto: "Mbube, mbube", mais alto e
mais rápido quando o leão se aproxima e mais No âmbito das culturas, estudo e pesquisa em
baixo e lento quando se afasta. ludopedagogia precisa ser assim concebido,
Pombo (Gana): São sete pedras no chão, quan- sem o que seu valor se verá prejudicado, pois
do um dos participantes inicia pegando uma ao perder-se a essência, em consequência, o
delas, lançando-a ao ar, tentando pegar outra brincar e o potencial sócio, educativo, afetivo
das sete com a mesma mão, antes que a pri- e identitário que possui para os processos de
meira caia no solo. Conseguindo, continua lan- ensino e aprendizagem, tornar-se-ão artificiais.
çando uma pedra ao ar, tentando, na segunda Brinquedos, brincadeiras, jogos só existem
vez, pegar duas do monte e assim sucessiva- porque são produtos de interações que, em
mente até errar e passar a vez para outro par- constantes transformações, fazem surgir no-
ticipante. vos modos de se construir e de se brincar com
os brinquedos, brincadeiras, jogos, agregando
Da Gana (Gana e Nigéria): Jiboia é o significa- novos elementos culturais aos já existentes.
do de Da Gana. É traçado um quadrado ou re- Se brincar não é a única interação existente,
tângulo no chão para ser a "casa da jiboia", que talvez seja a principal, principalmente na infân-
inicialmente será representada por um dos par- cia. Brincar é importante em qualquer fase da
ticipantes escolhidos, entrando na "casa". Os vida porque:
demais posicionam-se próximos, porém fora
da linha do quadrado ou retângulo. e a jiboia a) estabelecem-se vínculos sociais, desenvol-
de dentro da "casa" tenta tocá-los. Aquele que vendo as relações sociais;
for tocado, entra na casa da cobra, segura-lhe b) vivencia-se a amizade e a solidariedade, em
uma das mãos e com a outra livre ajuda a ten- contraposição à inimizade e à individualidade,
tar tocar outros participantes que, se tocados, desenvolvendo empatia, construindo e man-
também passarão a ser a jiboia. Vence o últi- tendo afetividade;
mo que sobrar fora do quadrado ou retângulo. c) cria-se relação de pertinência com o grupo
brincante quando se aceita e se obedece às
CONSIDERAÇÕES FINAIS regras estabelecidas, mesmo que se propo-
nham modificações - o que requer "ne-
Ao longo do desenvolvimento deste artigo, gociação" -, quando se aceita a participação de
percebe-se o quão importante são as diversi- outras pessoas na brincadeira, jogo, quando se
dades culturais, mesmo no interior de cada cul- aceita ganhar ou perder, desenvolvendo a iden-
tura. Por isso não se pode compreender brin- tidade e as relações éticas;
quedo, brincadeira, jogo fora da cultura em que d) resgata-se, ao menos em parte, manifesta-
estão inseridos, o que impossibilita precisar ções e tradições da oralidade, do corpo em mo-
seus significados: as culturas, em seu tempos vimento, e de outros elementos culturais como
e espaços, apropriam-se do brinquedo como o modo de se relacionar com o meio ambien-
sendo parte integrante ou não da brincadeira, te, com o brinquedo e com os outros, desen-
jogo. Mas sem a existência do brinquedo, mui- volvendo as relações culturais, estéticas e
tas brincadeiras, jogos deixariam de acontecer; identitárias;
daí a importância de se preservar a memória e e) deseja-se, imagina-se, fantasia-se, explora-
a história do brinquedo, e suas utilizações pe- -se, descobre-se, aprende-se, inventa-se, fa-

72 INEQ - Educação integral


z-se, partilha-se, transforma-se, transcende- 4ª ed. São Paulo: Global, 2001, 496 p.
-se...; CUNHA, Débora Alfaia da & FREITAS, Cláudio
f) constroem-se novas relações de gênero e de Lopes de. Apostila Jogos infantis Africanos e
idades, quando se (lhe) permite que meninos Afrobrasileiros. II Semana da Consciência Ne-
e meninas, crianças e adultos possam brincar gra UFPA/CUNTINS,2010,7 p.
com o mesmo brinquedo e a participarem das HUIZINGA, Johan. Homo Ludens: o jogo como
mesmas brincadeiras, jogos; elemento da cultura. 4ª ed. São Paulo: Pers-
g) desenvolvem-se habilidades físicas, cogniti- pectiva, 2000, 256 p.
vas e socioafetivas. KISHIMOTO, Tizuko Morchida. Escolarização
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cessos, práticas e saberes. São Paulo: Escritu-
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brasileiro. 10ª ed. São Paulo: Global, 2001, 768 ritoriodobrincar.com.br brincadeiras e videos/
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INEQ - Educação integral 73


O JOGO TEATRAL COMO
PROSTA DE DESENVOLVIMENTO
PSICOMOTOR PARA AUXÍLIO DA
APRENDIZAGEM

Maíra Banheza de Almeida

RESUMO trical language are applied as a form of develop-


ment. In the third topic, work proposals are also
A ideia para a realização deste trabalho deu-se proposed with examples of games and activities
como decorrente da existência de poucos estu- that involve an art theater. The work had as the-
dos sobre o expressar-se por meio da linguagem oretical reference some authors like Constance
teatral. Como forma de desenvolver a socializa- Kamii (1991), Devries (1991) and Yozo (1996). Do
ção, a desinibição, e a psicomotricidade, no espa- some research with some final considerations on
ço escolar. Para isso, no primeiro tópico registro the topic.
pontos importantes a serem considerados sobre Keywords: Development; Childhood; Psychomo-
o teatro, no segundo tópico, são colocados alguns tricity; Body language; Theater.
aspectos psicomotores; e no terceiro tópico são
apresentadas propostas de utilização da lingua- INTRODUÇÃO
gem teatral como forma de desenvolvimento. No
terceiro tópico, também são apresentadas pro- Neste texto busca-se analisar jogo teatral como
postas de trabalho com exemplos de brincadeiras processo de desenvolvimento da psimotricidade,
e atividades que envolvem a arte teatral. O traba- auxiliando na aprendizagem das crianças com
lho teve como referência teórica alguns autores dificuldades de aprendizagem. A escolha des-
como Constance Kamii (1991), Devries(1991) e te tema é decorrente da falta de pesquisas que
Yozo (1996). Encerrei a pesquisa com algumas abordem o assunto, chegando até mesmo a ser
considerações finais sobre o tema. considerado como “impreciso”. A hipótese inicial,
Palavras-chave: Desenvolvimento; Infância; Psi- porém, é de que a comunicação corporal, é funda-
comotricidade; Expressão Corporal; Teatro. mental para o desenvolvimento biológico e social
da criança.Compreende-se que a linguagem cor-
ABSTRACT poral contribuir para a construção dos saberes,
de pensamento abstrato e da imaginação criativa.
One idea for the realization of this work came as Trabalhar a comunicação corporal a partir da cria-
a result of few studies on the use of theatrical tividade e espontaneidade da infância, juntamen-
expressions. As a way to develop socialization, te com a utilização de procedimentos lúdicos no
disinhibition and psychomotricity, in the school processo de aprendizagem infantil, torna primor-
space. For this, in the first topic of the record im- dial para o desenvolvimento sadio da criança.
portant points are considered about the theater, in
the second topic, some psychomotor aspects are Com a utilização desta arte, a criança aflora suas
used; and in the third topic, applications of thea- emoções, facilitando seu processo de desenvol-

74 INEQ - Educação integral


vimento no convívio social e educacional, au- Gonçalves, Wolf e Almeida (1988), dizem que
xiliando também no aspecto psicomotor. Para quando um comportamento natural sofre um
tanto, se questiona: bloqueio (pode ser uma barreira física, uma
deficiência pessoal ou um conflito de compor-
A- Como o jogo e a arte teatral podem auxiliar tamentos motivadores), gera a frustração. Isto
o processo de aprendizagem da criança? pode resultar em respostas agressivas, regres-
B- Como o jogo teatral auxilia no convívio da são, apatia, depressão ou intranqüilidade.
criança com seu meio? Uma forma comum de reação é evitar as situa-
Este artigo é a realização de um estudo sobre a ções causadoras de frustração.
possibilidade de se expressar de diversas for-
mas através da linguagem teatral. Ao final do O livro “Lições de Psicodrama”, ainda revela
texto é por meio apresentada uma proposta de que a arte teatral, no caso psicodrama, ajuda a
trabalho com exemplos de jogos teatrais para conscientizar sobre o medo de mudar, de cor-
crianças. rer o risco do novo e desconhecido, entender
as frustrações; possibilita a orientação ade-
1. O teatro quada e a aceleração sistematizada do pro-
cesso de busca, recuperando a criatividade e a
A palavra teatro define tanto o prédio onde espontaneidade.
podem se apresentar várias formas de artes
quanto uma determinada forma de arte. Almei- É possível dizer que toda reflexão que tenha
da (1995) em “O Teatro na Vida e a Vida no te- o drama como objeto precisa se apoiar numa
atro”, descreve que na palavra teatro, originaria tríade: quem vê, o que se vê, e o imaginado. O
da palavra grega, THEATRON, está presente a teatro é um fenômeno que existe nos espaços
ideia de “visão”. do presente e do imaginário, e nos tempos in-
dividuais e coletivos que se formam neste es-
Almeida (1995) ainda diz que o teatro é um paço.
espetáculo, onde é indispensável o ato de ob-
servar manifestações corporais de forma re- Segundo Japiassu (2001), o jogo teatral tem
presentativa. O homem desde sua existência, como finalidade trazer o domínio da expressão
possuía a necessidade de “teatralizar” suas e comunicação de uma maneira improvisada
formas de vida, seu cotidiano. ou lúdica. Almeida (1995), relata que foi na
Grécia que nosso teatro começou. Cerimônias
Para Japiassu (2001), o teatro é uma arte em ligadas ao deus Dionísio, em que estavam pre-
que um ator, ou conjunto de atores, interpre- sentes, a dança, a música e “imitações” desse
ta uma história ou atividades, com auxílio de deus, faziam a multidão se reunir para a oca-
dramatúrgicos e técnicos, que têm como obje- sião. Em 534 a. C., o poeta Tespis separou-se
tivo apresentar uma situação e despertar sen- do coro, recitando outros cantos, e daí surgi-
timentos na audiência. Desde a antiguidade, ram outros atores, cantores e recitadores. Se-
filósofos gregos como Aristóteles e Platão, e gundo almeida, no brasil, o teatro chegou para
filósofos romanos como Horacio e Sêneca por alguns com a colonização, para outros somen-
exemplo, já produziam documentos sobre a re- te no início do século XIX.
lação entre teatro e educação.
Almeida (1995) em “O Teatro na Vida e a Vida

INEQ - Educação integral 75


no teatro”, revela que alguns historiadores afir- com Dupré, e significa um entrelaçamento
mam ter havido a inicialização do teatro no entre movimento e pensamento. Dupré sem-
Brasil, na colonização europeia, trazido pelo pre chamava a atenção de seus alunos para o
Padre Anchieta, com fins catequéticos. O tea- equilíbrio motor. Ele verificou uma relação en-
tro de Anchieta, não pode ser chamado de tra- tre as dificuldades psicológicas e motoras, o
dicional brasileiro, porém não devemos julgar que o levou a formular o termo Psicomotricida-
o “evangelizador do Brasil”, que foi sem dúvida, de. Para Thiers (1994), a construção do sujeito
fonte de inspiração para nosso teatro. Mais social passa pela criança, pelo adolescente, e
tarde os brasileiros começaram a assistir vá- pelo seu desenvolvimento psíquico. O adoles-
rias peças vindas da Europa. O primeiro prédio cente não é criança nem adulto, caminha em
exclusivamente brasileiro foi construído no Rio busca de sua identidade adulta.
de Janeiro e se chamava “Casa da Opera”, isso
aconteceu na época do Vice-Reinado. Thiers (1994), descreve em seu livro que: “De-
senvolvimento é a própria evolução do Ser...
Contradizendo esta afirmação outros autores, e evolução pode ser concebida a nível físico,
relatam que, na verdade o teatro brasileiro, só emocional, mental, antropológico, social, lin-
ocorreu de fato entre o fim do século XVIII e güístico, psicomotor e até transcendental.” O
início do século XIX, com a expressão de obras desenvolvimento pressupõe um todo que ca-
autenticamente brasileiras, escritas por Mar- minha na procura de si mesmo, corpo e mente.
tins Pena, Casimiro de Abreu, Gonçalves Dias, A autora cita Winnicott, que também encontrou
Álvares de Azevedo, e Castro Alves, sem es- relação entre o físico e o emocional.
quecer é claro de João Caetano que estimulou
a formação dos atores brasileiros e valorizou o Sobre o corpo, Costa (2007), relata que é um
seu trabalho. instrumento comum na relação psicopedagó-
gica e psicomotora, sede dos sintomas do não
Japiassu (2001) descreve em sua obra que, a aprender e das experiências acumuladas para
vulgarização do pensamento pedagógico de as novas aprendizagens.
Rousseau serviu como base para o movimento
escola ativa que foi aceito por muitos educado- Segundo Costa (2007), no início da história o
res, entre os quais Claperede, Decrady, Freinet, corpo foi considerado “maquina”, e trabalhado
Froebel, John Deury, Montessore, Pestalozzi, mecanicamente pela psicomotricidade, tra-
Piaget, Wallon, Vygotsky, e finalmente no Bra- balhava-se, segundo a autora, parte por parte
sil por Anísio Ferreira, Fernando De Azevedo do corpo, o esquema corporal, a lateralidade e
e Lourenço filho. Foi através desse movimen- outras funções psicomotoras para atender as
to da escola nova, que o teatro na educação exigências de uma performance, ou como pré-
escolar, particularmente na educação infantil -requisito para a aprendizagem da escrita.
adquire conhecimento e importância psicope- Consta nos Referenciais Curriculares para a
dagógica. Educação Infantil:

2. Psicomotricidade A aquisição da consciência dos limites


do próprio corpo é um aspecto importan-
Segundo Gislene de Campos Oliveira (2007), te no processo de diferenciação do eu e
o termo apareceu pela primeira vez em 1920 do outro e da construção da identidade...

76 INEQ - Educação integral


Por meio da exploração que faz, do con- IV. A lateralidade é a propensão que o ser
tato físico com outras pessoas, da ob- humano possui de utilizar, preferencial-
servação daqueles com quem convive, mente, mais um lado do corpo do que o
a criança aprende sobre o mundo, sobre outro em três níveis: mão, olho e pé. O
si mesma e comunica-se pela linguagem lado dominante apresenta maior força
corporal.(BRASILRCN, 1998) muscular, mais precisão e rapidez.

Segundo Levi (1995), o olhar já não é mais cen- V. É essencial para que possamos nos
trado num corpo em movimento, mas num su- situar no meio em que vivemos, que fa-
jeito com seu corpo real em movimento. Olivei- zemos relações, comparações e combi-
ra ( 2007), faz a seguir algumas considerações nações.
a respeito das áreas, que contribuem para o
desenvolvimento da estrutura psicomotora da Em primeiro lugar, portanto, a crian-
criança: ça percebe a posição de seu próprio
corpo no espaço. Depois, a posição
I. É importante relatar, que os movimen- dos objetos em relação a si mesma,
tos (voluntários, reflexos e automáticos), por fim, aprende a perceber as rela-
não aparecem por acaso, esses movi- ções das posições dos objetos entre
mentos são controlados pelo sistema si [...].(OLIVEIRA, 2007, p.75)
nervoso, através da contração muscular.
“O tônus muscular está presente em to- VI. A estruturação espacial não nasce
das as funções motrizes do organismo, com o individuo, ela é construída com
como equilíbrio, a coordenação, o movi- sua maturação mental, que opera atra-
mento, etc [...]”(OLIVEIRA, 2007, p.27) vés de seus movimentos em relação aos
objetos que estão em seu meio. Quando
II. A coordenação global, diz respeito às a criança consegue se orientar em seu
atividades dos grandes músculos. Ela meio, estará mais capacitada a assimi-
depende da capacidade de equilíbrio lar a orientação no papel. As noções de
postural do indivíduo, que está ligado às espaço e tempo, têm que estar intima-
sensações cinestésicas e labirínticas. A mente ligadas. Da mesma forma que a
coordenação fina diz respeito às habili- palavra escrita exige que se tenha uma
dades e destrezas manuais, e constitui orientação no papel, através das linhas e
um aspecto particular da coordenação do espaço próprio para ela, apalavra fa-
global. Já a coordenação óculo-manual, lada, exige uma forma ordenada, suces-
se refere a um domínio visual, ligado aos siva e rítmica, dentro de um espaço de
gestos executados. tempo determinado.

III. A criança percebe-se e percebe tudo VII. Um aparelho visual e auditivo ínte-
o que a cerca em função de seu próprio gro é um pré-requisito muito importante
corpo, sendo assim, conhecendo-o, terá para a aprendizagem da leitura e da es-
maior habilidade para diferenciar e sentir crita, como relata Oliveira (2007), porém
diferenças. a maior preocupação é com as crianças
que ouvem e enxergam bem mas não

INEQ - Educação integral 77


discriminam corretamente os sons e for- portância do jogo no processo de aprendiza-
mas. gem na infância. Na concpeção da autorea, no
processo de ensino, a abordagem intelectual
Como foi possível perceber, muitos problemas ou psicológica, é substituída pelo plano da cor-
e dificuldades futuras, podem ser evitadas já poreidade. Os gestos e atitudes do teatro, são
na primeira infância, se o desenvolvimento mo- experimentados concretamente no jogo, sen-
tor não passar despercebido pelo educador. do que a conquista da expressão física, nasce
gradativamente, estabelecida com a sensoria-
3. Os jogos teatrais e a aprendizagem lidade.

Conforme Oliveira (2007), o Sistema nervoso Os traumas causados por uma má alfabetiza-
coordena e controla todas as atividades do or- ção, aparecem nas aulas de teatro. Na esco-
ganismo, e uma das funções do sistema nervo- la, o ensino de textos ainda é compreendido
so é canalizar as informações e enviá-las para como leitura e escrita. Os textos são recitados
regiões motoras correspondentes. de forma mecânica pelos educandos se não
houver uma orientação metodológica que nas-
A autora ainda relata que, todo comportamen- ce no teatro.
to comunicativo está relacionado ao Tônus,
ele está presente em funções motrizes como Conforme Spolin, jogos teatrais, podem trazer
o equilíbrio, coordenação e movimento, e um vida para a sala de aula, as oficinas teatrais,
dos aspectos fundamentais é sua ligação com não são designadas como passatempo no
as emoções. Oliveira continua dizendo que currículo, mas sim como complemento para a
podemos transmitir, sem palavras, através de aprendizagem escolar. Os jogos teatrais são
uma linguagem corporal, todo nosso estado úteis para auxiliar os educandos a desenvol-
emocional. verem habilidades como comunicar-se pela
Linguagem Oral e Escrita, além de formas não
[...] Uma criança, por exemplo, que não verbais. Ajudam a aprimorar a concentração e
acredita muito em si tem a tendência de convívio em grupo.
se ‘envolver’, isto é, de manter seu corpo
em estado de tensão quando se sente 3.1. O corpo
ameaçada. (OLIVEIRA, 2007)
O esquema corporal se faz pela experiência da
Sabe-se que a experiência escolar tem gran- criança, conforme ela utiliza seu corpo, o es-
de influência na imagem que a criança faz de quema corporal é construído. Na perspectiva
si mesma, um caso de fracasso escolar pode de Oliveira (2007), a criança nasce com uma
abalar toda sua autoconfiança e consequente- bagagem de sensações e percepções, mas
mente, sua autoestima, além de contribuir para pela falta de mielinização, não consegue orga-
outras dificuldades de aprendizagem. nizá-las. Conforme seu amadurecimento ner-
voso é desenvolvido, a criança pode distinguir
Spolin (1986), diz que o jogo instiga e faz e organizar as várias sensações de seu corpo.
emergir uma energia do coletivo, quase esque- A autora diz que neste conhecimento do corpo,
cida. Ela lembra que teóricos como Rosseau a criança passa por algumas experiências fun-
e Dewey a Piaget e Vygotsky, enfatizam a im- damentais para o desenvolvimento do esque-

78 INEQ - Educação integral


ma corporal: conjunta, harmônica e econômica de múscu-
los, nervos e sentidos, para ações de movimen-
1) Imagem Especular: trata-se da desco- tos equilibradamente seguros.
berta que a criança faz de sua imagem
no espelho, por volta de seis meses de Segundo o autor, expressão corporal é uma
idade. Aos poucos ela vai percebendo manifestação natural e espontânea, onde a ati-
que a imagem que vê no espelho é uma vidade tem um significado todo especial. Para
representação de si mesma, e passa a se as autoras o ato de expressar corporalmente
ver de forma global como um ser único. da criança necessita de uma boa percepção
auditiva, espaço-temporal, ter domínio do cor-
2) Corpo Percebido: (3 a 7 anos), corres- po, equilíbrio e criatividade, por esse motivo, o
ponde a uma organização do esquema desenvolvimento da arte teatral como propos-
corporal devido a maturação da “função ta de desenvolvimento da expressão corpora,
de interiorização”, a criança desenvolve deve ser contínuo.
uma percepção centrada em seu próprio
corpo. Nessa fase a criança domina Assim entendemos que quanto mais ricas fo-
mais o seu corpo, com isso refina seus rem as situações vivenciadas no cotidiano da
movimentos, adquirindo maior coorde- criança com jogos teatrais, maior será o de-
nação dentro de um espaço e tempo de- senvolvimento psicomotor adquirido.
terminados.
3.3. Jogos em grupo
3) Corpo Representado: (7 a 12 anos), até
o momento a criança já adquiriu noções Yozo (1996), descreve em sua obra “100 Jogos
do todo e das partes de seu corpo, então para Grupos”, as características do jogo dramá-
observa-se a estruturação do esquema tico, e observa que, muitos profissionais que
corporal. Tem maior controle e domínio utilizam o jogo dramático como ferramenta de
corporal. trabalho não se preocupam em caracteriza-lo.
Assim discrimina-se as seguintes caracterís-
3.2. Coordenação motora e expressão corpo- ticas: É uma atividade voluntária; Tem regras
ral específicas e absolutas; Tem duração delimi-
tada; Tem um espaço que é o próprio contexto
Segundo Chalaguier relata em seu livro “A ex- dramático; Há resgate da ordem lúdica; Tem
pressão corporal: abordagem metodológica, um objetivo específico; busca a identificação e
perspectivas pedagógicas”, (1975), na expres- resolução de problemas.
são corporal a ação é imaginária, mas os movi-
mentos que a integram são reais. Segundo Kamii e Devries (1991), cada criança
tem de reinventar o conhecimento para torna-
Para Valadares e Araújo (1999), entende-se -lo seu, assim como cada professor, precisa
por coordenação motora, a atuação conjunta construir sua própria maneira de trabalhar a
do sistema nervoso central e da musculatura partir das idéias apresentadas nos livros.
esquelética, na execução de um movimento.
Kiphard (apud VALADARES & ARAUJO,1999, Ainda na obra de kamii e Devries (1991), Piaget
p.98) já define coordenação como a atuação relata no prefácio do livro, que o “jogo é uma

INEQ - Educação integral 79


forma de atividade particularmente poderosa - O corpo Humano:
para estimular a vida social e a atividade cons-
trutiva da criança”. Material: Nenhum.
Objetivos: Brincar com a música, imitar, inven-
3.3.1 Propostas de Jogos Teatrais ppara auxi- tar e reproduzir criações musicais; Explorar e
liar no desenvolvimento psicomotor identificar elementos da música para se ex-
pressar, interagir com os outros e ampliar seu
A- Jogo de associação: conhecimento do mundo;Perceber e expressar
sensações do corpo, sentimentos e pensamen-
- Estátua tos, por meio de improvisações, composições
e interpretações musicais.
Material: Rádio (optativo) Desenvolvimento: O educador apresentará um
Objetivo: Ter confiança em suas próprias es- desenho do corpo humano para suas crianças,
tratégias e na sua capacidade para lidar com que aprenderão a nomear suas partes adequa-
diferentes situações, utilizando seus conheci- damente através da expressão corporal e com
mentos prévios.Domínio do corpo no espaço. a música:
Desenvolvimento: O educador escolherá al-
gumas crianças para que sejam os juízes em Cabeça, ombro, joelho e pé.
uma competição das melhores estátuas da Joelho e pé.
sala. Em seguida as outras crianças vão es- Cabeça, ombro, joelho e pé.
colher um tipo de estátua na qual querem se Joelho e pé.
transformar, enquanto dançam ou andam livre-
mente ao som de uma determinada música. Olhos, ouvidos, boca e nariz.
Quando o educador falar a palavra estátua, to- Cabeça, ombro, joelho e pé.
dos param e fazem uma pose, os juízes dirão Joelho e pé.
os nomes das melhores estátuas, que ganha-
rão uma medalha por seu desempenho. Na Hum, ombro, joelho e pé.
próxima rodada os juízes serão trocados para Joelho e pé.
que todos participem das votações. Hum, ombro, joelho e pé.
Joelho e pé.
- No meu caminhão vou levar...
Olhos, ouvidos, boca e nariz.
Material: Um caminhão de brinquedo Hum, ombro, joelho e pé.
Objetivo:Comunicar ideias e hipóteses, utili- Joelho e pé.
zando a linguagem oral.
Desenvolvimento: O educador e a turma es- Hum, hum, joelho e pé.
colhem uma carga que o caminhão irá levar Joelho e pé.
(exemplo: animais, frutas, verduras, objetos), Hum, hum, joelho e pé.
e cada criança terá que dizer o que irá levar, Joelho e pé.
dentro do carregamento escolhido.Em seguida
cada criança representará sua carga sem di- Olhos, ouvidos, boca e nariz.
zer nada para que os colegas tentem adivinhar Hum, hum, joelho e pé.
qual seria essa carga. Joelho e pé.

80 INEQ - Educação integral


crianças, combina o tema a ser escolhido
Hum, hum, hum e pé. (exemplo: animais, personagens, profissões,
Joelho e pé. filmes ou desenhos) em seguida o professor
Hum, hum, hum e pé. divide a sala em grupos para que haja uma
Joelho e pé. interação entre eles os grupos vão fazer uma
competição de mímicas onde o grupo que
Olhos, ouvidos, boca e nariz. acertar mais ganha. esta atividade terá como
Hum, hum, hum e pé. objetivo a expressão corporal, o companheiris-
Joelho e pé. mo, o trabalho coletivo além da dramatização.

Hum, hum, hum e hum. - Que animal sou eu?


Joelho e pé.
Hum, hum, hum e hum. Material:Giz de lousa.
Joelho e pé. Objetivos: Utilizar a imaginação de forma coe-
rente; Explorar e utilizar os movimentos corpo-
Olhos, ouvidos, boca e nariz. rais de forma que se faça ser entendido.
Hum, hum, hum e hum. Desenvolvimento: O educador levará suas
Joelho e pé. crianças para o pátio da escola onde os mes-
mos sentarão em círculo. O educador escolhe-
Hum, hum, hum e hum. rá um educando que sentará no meio da roda
Hum e pé. e escolherá um animal que deseja ser. O edu-
Hum, hum, hum e hum. cando que está no centro da roda ficará res-
Hum e pé. pondendo às perguntas dos colegas que em
ordem tentarão adivinhar que animal ele é.
Olhos, ouvidos, boca e nariz
Hum, hum, hum e hum. Cada um pergunta:
Hum e pé. Você pode voar?
Você nada?
Cabeça, ombro, joelho e pé. Você tem pêlos?
Joelho e pé. Você tem quatro patas?
Cabeça, ombro, joelho e pé.
Joelho e pé. E assim, sucessivamente até que todos te-
Joelho e pé. nham perguntado. A resposta só poderá ser
sim ou não. Quem adivinhar será o próximo a
ficar no centro da roda, escolher que animal
B- Jogos de dramatização: quer ser e a brincadeira continua.

- Mímica C- Jogos e brincadeiras folclóricas.

Material: Nenhum. Segundo Valadares (1.999), O folclore infantil


Objetivo: Explorar as possibilidades de gestos brasileiro é rico em brincadeiras, músicas, par-
e ritmos corporais. lendas, rimas e trava-línguas, fato que auxilia
Desenvolvimento: O professor, junto com suas no desenvolvimento, cognitivo e psicomotor

INEQ - Educação integral 81


da criança, além de apresenta-la a nossa cul- A linda Rosa juvenil, juvenil, juvenil,
tura. A linda Rosa juvenil, juvenil.
Vivia alegre no seu lar, no seu lar, no seu lar,
- Eu era assim Vivia alegre no seu lar, no seu lar.

Material: Nenhum Um dia veio a feiticeira má, muito má, muito


Objetivo: Familiarizar-se com a imagem do pró- má,
prio corpo, deslocar-se com destreza progres- Um dia veio a feiticeira má, muito má.
siva no espaço ao andar, correr, pular etc. E adormeceu a rosa assim, bem assim, bem
Desenvolvimento: As crianças, na medida em assim,
que cantam, representam a música cantada. E adormeceu a rosa assim, bem assim.

Quando eu era neném, neném, neném, E o tempo passou a correr, a correr, a correr,
Eu era assim, eu era assim. E o tempo passou a correr, a correr.
Quando eu era garoto, garoto, garoto, E o mato cresceu ao redor, ao redor, ao re-
Eu era assim, eu era assim, dor,
Quando eu era mocinho, mocinho, mocinho, E o mato cresceu ao redor, ao redor.
Eu era assim, eu era assim,
Quando eu era casado, casado, casado, Um dia veio um belo rei, belo rei, belo rei,
Eu era assim, eu era assim, Um dia veio um belo rei, belo rei.
Quando eu era velhinho, velhinho, velhinho, E despertou a rosa assim, bem assim, bem
Eu era assim, eu era assim, assim.
Quando eu era caduco, caduco, caduco, eu E despertou a rosa assim, bem assim.
era assim, eu era assim.
E os dois puseram-se a dançar, a dançar, a
- A linda Rosa Juvenil dançar,
E os dois puseram-se a dançar, a dançar.
Material: Nenhum. E batam palmas para o rei, para o rei, para
Objetivos: Ampliar as possibilidades expressi- o rei,
vas do próprio movimento, utilizando gestos E batam palmas para o rei, para o rei.
diversos e ritmo corporal nas suas brinca-
deiras, danças, jogos e demais situações de Desenvolvimento: O educador dividirá suas
interação; Perceber e expressar sensações crianças e o papel que cada uma representará,
e sentimentos por meio de improvisações, e pois estas músicas além de serem cantadas,
interpretações musicais; Explorar diferentes podem ser dramatizadas pelas crianças que
qualidades e dinâmicas do movimento como adoram se sentir pequenos atores.
força, velocidade, resistência e flexibilidade,
conhecendo gradativamente os limites e as D- Jogo de espelho:
potencialidades de seu corpo. As crianças sen-
tam-se em roda, e conforme cantam a música - Espelho
a representam (um fará o papel da rosa, outro
do rei, outro da feiticeira, e os outros do mato). Material: Nenhum.
Objetivo: Ajudar o jogador a ver com o corpo

82 INEQ - Educação integral


todo; refletir e não imitar o outro. JIAPIASSU, Ricardo Ottoni Vaz. Metodologia
Foco: Em refletir principalmente o gerador dos do Ensino do Teatro, 4ed, São Paulo: Papirus,
movimentos. 2001.
Desenvolvimento: Divida o grupo em duplas. ALMEIDA, Plutarco. O Teatro na Vida e a Vida
Um jogador fica sendo A e outro fica sendo B. no Teatro, 3ed São Paulo: 1995.
A fica de frente para B e reflete todos os movi- CHALANGUIER, C. A expressão corporal: abor-
mentos iniciados por B, incluindo a expressões dagem metodológica, perspectivas pedagógi-
faciais. Após algum tempo as posições se in- cas. Rio de Janeiro: DIEFEL, 1975
vertem. YOZO, Yudi K.. 100 Jogos Para grupos: Uma
abordagem psicodramática para empresas,
CONSIDERAÇÕES FINAIS escolas, e clinicas. São Paulo: Agora, 1996.
KAMII, Constance e DREVIES, Rheta. Jogos em
A hipótese inicial de que os jogo teatrais são grupo na Educação infantil: Implicações na te-
fundamentais para o desenvolvimento bioló- oria de Piaget. São Paulo: Trajetória Cultural,
gico, social e psicomotor da criança, foi com- 1991.
provada no decorrer dessa pesquisa. Segundo VALADARES, Solange e ARAÚJO, Rogéria. Edu-
os autores citados no texto, para expressar-se cação Física no cotidiano Escolar, volume 1.
corporalmente a criança necessita de percep- Minas Gerais: Editora Fapi Ltda, 1999.
ção auditiva, espaço-temporal, domínio do cor- VALADARES, Solange e ARAÚJO, Rogéria. Edu-
po, equilíbrio e criatividade, o que a auxilia no cação Física no cotidiano Escolar, volume 5.
processo de aprendizagem, já que todos esses Minas Gerais: Editora Fapi Ltda, 1999
itens são importantes para o desenvolvimento THIESRS, Solange. Soco-psicomotricidade Ra-
corporal e intelectual das crianças. Por esse main-Thiers: Uma leitura emocional, corporal e
motivo, os jogos teatrais como proposta de de- social. São Paulo: Casa do Psicólogo, 1994.
senvolvimento da psicomotricidade na apren- COSTA, Auredite Cardoso. Psicopedagogia e
dizagem, precisa de continuidade. psicomotricidade: pontos de intersecção nas
dificuldades de aprendizagem, 5 es, Petrópolis,
Com a introdução dos jogos teatrais, a crian- RJ: Vozes, 2007.
ça, torna-se mais comunicativa, expressiva, e LEVIN, Esteban. A clínica psicomotora. Petró-
segura de si mesma, como já foi mencionado, polis: Vozes, 1995.
fazendo assim com que sua interação com o WALLON, Henri. Do Ato ao Pensamento – En-
grupo escolar seja muito mais agradável e sau- saio de Psicologia comparada. Trad. De I. Sea-
dável para as crianças. bra Dinis, Lisboa: Moraes Editora, 1997.

REFERÊNCIAS

BRASIL. RCN’s. Referencial Curricular Nacional


para Educação Infantil. Volume 2: Formação
pessoal e Social, Brasilia: MEC/SEF,1998.
GONÇALVES, Camila Salles; WOLFF, José Ro-
berto; ALMEIDA, Wilson Castello de. Lições de
Psicodrama – introdução ao pensamento de J.
L. Moreno. 7 edição. São Paulo: Agora, 1988.

INEQ - Educação integral 83


A IMPORTÂNCIA DO ENSINO
DE ARTES NA EDUCAÇÃO
INFANTIL

Maria Luzineide Siqueira1

RESUMO This article is about reflecting on changes, pro-


blems and new perspectives in the teaching of Vi-
Este artigo realiza reflexão sobre mudanças, pro- sual Arts in Early Childhood Education. One of the
blemas e novas perspectivas no ensino de Artes main attributions of the discipline is the possibility
Visuais Na Educação infantil. Uma das principais that the child has to expand his knowledge, his abi-
atribuições da disciplina é a possibilidade que a lities and the common discoveries in this phase of
criança tem de ampliar seu conhecimento, suas life. Through art the child expresses his feelings,
habilidades e a descobertas comuns nesta fase and expands his relationship with the world spon-
de vida. Através da arte a criança expressa seus taneously. In this way, she appropriates several
sentimentos, e expande sua relação com o mun- languages, acquiring a sensitivity to create sha-
do de forma espontânea. Dessa maneira ela apro- pes, colors, images, gestures, sounds and other
pria-se de diversas linguagens, adquirindo uma important expressions for cognitive and emotio-
sensibilidade para criar formas, cores, imagens, nal development. The artistic expression allows
gestos, sons e outras expressões importantes the action between the cognitive and the affective
para o desenvolvimento cognitivo e emocional. A and when talking about small children, they have
expressão artística permite a ação entre o cogniti- a greater spontaneity, facilitating this expression,
vo e o afetivo e quando se fala de crianças peque- because the play is present all the time and throu-
nas, elas apresentam uma espontaneidade maior, gh contact with the images they communicate ea-
facilitando essa expressão, pois a brincadeira se sily through artistic languages. The research aims
faz presente o tempo todo e através do contato to understand the teaching of Art in pedagogical
com as imagens elas se comunicam facilmente practice in Early Childhood Education, making it
através das linguagens artísticas. A pesquisa tem possible, through methodological guidance that
como objetivo a compreender o ensino de Arte na allows students to consciously train about art.
prática pedagógica na educação Infantil possibili- Keywords: Visual arts; Child education; Present.
tando, por meio de encaminhamento metodológi-
co que possibilite ao aluno a formação consciente
sobre a arte.
Palavras-Chave: Artes visuais; Educação Infantil; INTRODUÇÃO
Atualidade.
Este artigo faz uma breve reflexão sobre Artes Vi-
ABSTRACT suais, que são todas as manifestações artísticas
que tem a visão como a principal forma de com-

1 - Professora de Educação Infantil e Ensino Fundamental. Graduada em Pedagoga e Pós-Graduada em Psicopedago-


gia. mlneidesiqueira@hotmail.com

84 INEQ - Educação integral


preensão. Para tanto, faz-se necessário um de material, técnica ou linguagem, ele não tem
conjunto estrutural que envolve a organização mais que dizer - sou um pintor ou poeta ou
dos espaços de produção do saber, como as dançarino, ele é simplesmente um artista, que
salas de aula, a organização curricular, seleção habita todas as formas de arte. Essa é uma ca-
de atividades e a formação adequada e contí- racterística da arte atual, o hibridismo, que é a
nua dos profissionais. impossibilidade de conceituar uma criação ar-
tística como pertencente a uma única vertente,
A LDBEN nº 9.394, promulgada em 20/12/1996, categoria ou cultura, decorrente do ilimitado ex-
no seu art. 26, § 2º, afirma: “o ensino de arte perimentalismo da arte contemporânea.
constituirá componente curricular obrigatório,
nos diversos níveis da educação básica, de for- A sociedade de hoje requer um ser reflexivo, e
ma a promover o desenvolvimento cultural dos a arte contemporânea favorece isso, pois pede
alunos”. Revogada a legislação anterior, a de- uma interpretação ativa, pode unir diversos
nominação “ensino de Arte” é adotada no lugar meios de pensamento, relacionar-se a vários
de “Educação Artística”, conforme vinha sendo contextos e é suscetível a múltiplas interpreta-
chamada esta disciplina escolar desde a LDB ções, promovendo o tipo de entendimento exi-
5.691/71. gido por uma sociedade pluralista, na qual gru-
pos podem coexistir com diferentes histórias,
Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN’s) valores e pontos de vista.
apontam para melhorias o ensino da Arte e
propõe quatro modalidades artísticas: Artes O papel da arte-educação hoje é o de investigar
Visuais (não mais apenas voltado para as Ar- as habilidades e meios pelos quais os estudan-
tes Plásticas, mas também para as demandas tes encontram significados em obras de arte,
da cultura visual em geral: publicidade, cinema, como eles relacionam as obras de arte a vários
televisão, histórias em quadrinhos, fotografia, contextos e consideram múltiplas interpreta-
artes gráficas, produções com novas tecnolo- ções delas.
gias,...); Música; Teatro e Dança. Esta mudança
traz novas demandas em relação à formação Holm (2007), afirma que “quando se trabalha
de professores nas diversas linguagens cita- com a primeira infância, arte não é algo que
das. ocorra isoladamente. Ela engloba: controle cor-
poral, coordenação, equilíbrio, mo¬tricidade,
Se esta formação já era precária na década de sentir, ver, ouvir, pensar, falar e ter segurança. E
setenta, quando a arte foi instituída na escola ter confiança para que a criança possa se mo-
como disciplina e a docência em Arte se basea- vimentar e experimentar. E que ela retorne ao
va em desenvolver meras atividades artísticas, adulto, tenha contato e crie junto. O importante
hoje, quando o ensino de Arte se direciona para é ter um adulto por perto, co-participando e não
a valorização dos conhecimentos específicos controlando”.
de cada linguagem, aumenta a exigência da
presença do professor especialista em cada Trabalhar com a arte na educação infantil é
uma dessas linguagens citadas nos PCN’s - abraçar o mundo com o corpo todo. Para que
Arte. isso ocorra, precisamos dar o direito da criança
se expressar do jeito dela, com a estética que
Analisando a arte contemporânea brasileira, lhe é peculiar e de todas as formas possíveis.
percebe-se que sofreu várias mudanças, tanto Quanto mais elementos artísticos o educador
em recursos utilizados como nas linguagens. apresentar para as crianças, mais rica será a
Hoje o artista pode utilizar-se de qualquer tipo linguagem e a expressividade delas. Dançar,

INEQ - Educação integral 85


pintar, cantar e dramatizar, dentre outras for- te criadores, possuímos linguagens, fazemos
mas de expressão humana, são linguagens. cultura” (BARBIERI, 2012, p. 47).

Criar e deixar criar talvez sejam caminhos ainda Inspirados nos ideais de Paulo Freire, aos pou-
não percorridos por muitos, mas necessários e cos, alguns arte/educadores passam a rever
urgentes quando falamos de educação infan- suas práticas, apostando no papel da escola e
til e arte. A criança é um campo fértil para a da educação como agentes de transformação
criatividade e a imaginação e nós, muitas vezes sociocultural. Nesta perspectiva, o professor
sem intenção, subestimamos sua capacidade começa a rever seu papel de mero transmissor
e impedimos seu desenvolvimento estético ou facilitador para o de mediador.
cada vez que interferimos demasiadamente e
direcionamos sua expressão artística criativa, O ensino da arte passa ser concebido como
sufocando as possibilidades de novos saberes. área de conhecimento, que segundo Ana Mae
Barbosa (1991, p.17) começa a se entender “o
Porém, sem esquecer o papel fundamental do conceito de arte-educação como epistemologia
professor, que deve ser o interlocutor, promotor da arte e/ou arte-educação como intermediário
e organizador do processo de criação. Para ga- entre arte e público”, de onde nasce também
rantir oportunidades para a expressão viva da a Proposta Triangular no ensino da arte, hoje
criança, precisamos considerar que “expressar revista e compreendida como uma maneira de
não é responder a uma solicitação de alguém, valorizar o fazer artístico consciente e informa-
mas mobilizar os sentidos em torno de algo do, o estudo da arte erudita e popular, assim
significativo, dando outra forma ao percebido e como a ampla contextualização dela.
vivido” (CUNHA, 2009), o que também é diferen-
te de simplesmente “deixar fazer”, acreditando Conscientes de seu papel na sociedade, arte/
na chamada “livre expressão”. educadores pós-modernos são participantes
da Pedagogia Crítica, e engajados na produção
Para mobilizar os sentidos, é essencial o enri- artística contemporânea, o que implica reco-
quecimento de experiências, promovendo en- nhecer, explorar e conciliar-se com o Pós-Mo-
contros com diferentes linguagens, alimentan- dernismo como um paradigma cultural e como
do a imaginação para que meninos e meninas um movimento estilístico (BARBIERI, 2012).
possam aventurar-se a ir além do habitual. As pedagogias críticas adotam a arte de acor-
1. A ARTE COMO FERRAMENTA PEDAGÓGICA do com a perspectiva multicultural. Este en-
foque consiste em algo além do que apenas
Na fase da educação infantil as atividades ar- incluir unidades e lições sobre outras culturas
tísticas contribuem com ricas oportunidades no currículo escolar, implica em centrar nosso
para seu desenvolvimento, uma vez que põem interesse nos grandes temas e funções da arte,
ao seu alcance diversos tipos de materiais para que são interculturais e transculturais. Implica
manipulação, além da arte espontânea que sur- também em não deixar passar a oportunidade
ge em brincadeiras ou a partir de uma proposta de incluir exemplos de culturas locais e de arte,
mais direcionada. relacionados com temas mais concretos e pró-
ximos da vida dos estudantes (LINO, 2012, p.
O lúdico, o teatro, a dança, a pintura, o desenho, 140).
a criatividade, o conto de fadas, fazem parte de
um momento em que as crianças se expres- O professor precisa dar oportunidades para
sam, comunicam e transformam a vida na rela- que o aluno se expresse de forma espontânea,
ção com a arte, ou seja, “somos potencialmen- pessoal, porém é importante que o mesmo con-

86 INEQ - Educação integral


siga analisar o contexto da atividade e quais quem aprende, pois serão autores de suas pró-
benefícios ela trás para o desenvolvimento da prias histórias, transformando a arte parte de
criança. suas vidas, dando um sentido para algo visto
Hernández afirma que: como incompreensível, tornando essa prática
um instrumento pedagógico que vai contribuir
É necessário que o professor seja um na construção do sujeito.
“estudante” fascinado por arte, pois só
assim terá entusiasmo para ensinar e 1.1 A Arte na Educação Infantil: Regulamenta-
transmitir a seus alunos a vontade de ção
aprender. Nesse sentido, um professor
mobilizado para a aprendizagem contí- Até pouco tempo a educação não estava inse-
nua, em sua vida pessoal e profissional, rida no ciclo básico, mas a Lei de Diretrizes e
saberá ensinar essa postura a seus estu- Bases da Educação 9.394/96 proporcionou que
dantes. (2015, p. 12) esta etapa pedagógica encontrasse sua própria
posição na formação das crianças; da mesma
O contato com as diferentes formas de artes maneira a arte abriu caminho neste espaço pio-
oportuniza aos alunos a exploração, o conheci- neiro, uma vez que ela exerce uma tarefa es-
mento, a brincadeira, desenvolvendo uma visão sencial nesta etapa educacional, englobando
transformadora beneficiando um vínculo com os fatores do conhecimento, da sensibilidade
a realidade, contribuindo para analisar a com- do conhecimento e da cultura. Segundo o Refe-
preensão do aluno e do mundo a qual vivência, rencial Curricular Nacional da Educação Infantil
favorecendo a ligação entre a fantasia e a rea- (RCNEI):
lidade.
A integração entre os aspectos sensíveis,
A criança da educação infantil explora bas- afetivos, intuitivos, estéticos e cognitivos,
tante os sentidos, pois se encontra na fase do assim como a promoção de interação e
concreto, fazendo com que suas experiências comunicação social, conferem caráter
sejam enriquecidas. Como neste período, suas significativo às artes visuais. Tal como a
habilidades são estimuladas, facilita o proces- música, as Artes visuais são linguagens
so de ensino-aprendizagem, pois são desen- e, portanto, uma das formas importantes
volvidas a percepção e a imaginação, o que de expressão e comunicação humanas, o
facilita a compreensão das diferentes áreas do que, por si só, justifica sua presença no
conhecimento. contexto da educação, de um modo geral,
e na educação infantil, particularmente.
A arte é fundamental na formação das crian- (p. 85)
ças, pois representa experiências individuais e
para que a arte seja utilizada como uma ferra- A criança tem a mente equivalente à do artista,
menta no desenvolvimento cognitivo, intelectu- pois ambos penetram com facilidade no univer-
al e emocional do aluno, o professor precisa ter so da imaginação, do faz de conta, possuem o
sensibilidade e conhecimento de que a arte é dom de fantasiar a tudo. Assim, um simples
extremamente necessária no cotidiano escolar, traço pode se transformar em um lindo castelo.
ciente do seu papel na relação com o desenvol- Tanto as crianças quanto os artistas percebem
vimento. as coisas a sua volta de uma forma diferente e
especial, pois sua percepção sensível lhes per-
E assim, o uso e o ensino das artes na educa- mite ressignificar o mundo por meio de confi-
ção infantil estão ligados aos interesses de gurações únicas.

INEQ - Educação integral 87


sações e as diferentes percepções para que
A partir de abordagens socioculturais contextu- assim possa transmitir um conhecimento de
alizadas com base nas teorias críticas da arte e mundo significativo. (BARBIEIRI, 2012) ressal-
da cultura, através de uma pedagogia dialógica. ta que:
(FREIRE, 2007) nas abordagens pós-modernas
de ensino de Artes Visuais, valorizamos tam- A qualificação do professor consiste em
bém a relação que os indivíduos estabelecem conhecer o mundo e ser capaz de instruir
entre a arte e a vida pessoal e social. Por esse os outros acerca desta, porém, sua auto-
motivo os âmbitos biográficos e crítico social ridade se assenta na responsabilidade
na relação entre a compreensão das artes visu- que ele assume por esse mundo. Face
ais e a educação. à criança, é como se ele fosse um repre-
sentante de todos os habitantes adultos,
Desta maneira a aprendizagem faz sentido para apontando os detalhes e dizendo à crian-
os estudantes, “especialmente quando a co- ça: isso é o nosso mundo. (p. 146)
nectam com os próprios interesses, experiên-
cias de mundo e vida” (PARSONS, 2006, p.296). As novas maneiras de abordar o ensino das
Artes Visuais estão diretamente relacionadas
O autor também defende a ideia de que para às finalidades do ensino hoje. Nas tendências
obter significado e compreensão da arte são contemporâneas do ensino de Artes Visuais as
necessários conhecimentos de outras discipli- finalidades da educação vão além do desen-
nas, diz que um currículo integrado é mais ade- volvimento da sensibilidade, da criatividade, da
quado para ensinar e aprender determinados percepção estética, da fruição, da contempla-
tipos de ideias com as quais nenhuma discipli- ção, da leitura formal. Nas tendências pedagó-
na é capaz de lidar sozinha. Assim, a educação gicas contemporâneas em Arte e Educação, as
deve privilegiar a liberdade de manifestação finalidades do ensino tornam-se mais amplas e
das crianças. Deve ser trabalhada em um uni- complexas e mais alinhadas com os objetivos
verso lúdico e mágico nessa faixa etária, sendo de toda a educação escolar em geral (MÖDIN-
capaz de produzir processos de aprendizagem GER, 2012).
significativos e não meramente para reproduzir
algo já pronto. As Diretrizes Curriculares Nacional (DCN,2010)
para a Educação Infantil definem, em seu Art.
As Diretrizes Curriculares Nacionais para a 9º, que devem ser garantidas nas instituições
Educação Infantil (2010) esclarecem que essa experiências que:
proposta curricular deve garantir experiências
que explorem o conhecimento de si próprio e [...] favoreçam a imersão das crianças
do mundo, ao qual estão inseridos, por meio de nas diferentes linguagens e o progres-
experiências corporais, sensoriais e expressi- sivo domínio por elas de vários gêneros
vas, respeitando o ritmo de cada criança, per- e formas de expressão: gestual, verbal,
mitindo brincadeiras que oportunizem o apro- plástica, dramática e musical, bem como
fundamento nas diferentes linguagens, sendo [...] promovam o relacionamento e a in-
elas, verbal, artística, musical e dramática. teração das crianças com diversificadas
manifestações de música, artes plásti-
Mediante esses conceitos, cabe ao professor cas e gráficas, cinema, fotografia, dança,
se apropriar desse conhecimento de mundo teatro, poesia e literatura. (p. 25-26)
que a arte transmite, permitindo explorar os
sons, as cores, os gestos, as texturas, as sen- A principal meta do ensino de Artes Visuais

88 INEQ - Educação integral


hoje é ajudar os estudantes que passam pela de permitir experimentar situações inusitadas,
escola a entender criticamente a sociedade e “recriar para a experiência de cada indivíduo a
a cultura. Arte/educadores contemporâneos plenitude daquilo que ele não é, isto é, a experi-
e defende também a ideia de que o ensino da ência da humanidade em geral. A magia da arte
Arte é um poderoso instrumento para resgatar está nesse processo de recriação, ela mostra a
a autoestima, fortalece a identidade, ao mesmo realidade como passível de ser transformada,
tempo em que pode contribuir e propiciar a in- dominada”.
clusão social e a educação para a cidadania e
a democracia, o que inclui a preparação dos es- Em síntese, a grande função social da arte é
tudantes para as profissões relacionadas com ser um meio de identificação consciente do
as visualidades. indivíduo com a humanidade e com a nature-
za, porquanto proporciona condições para que
Além das questões colocadas, as tendências o homem conviva e comparta modos de ver,
e finalidades das Artes Visuais na contempo- apreender, compreender e sentir o mundo pre-
raneidade apontam também para a necessida- sente – e também o futuro, por projeções cria-
de de quebrar as barreiras que separam a arte doras que a arte permite enquanto forma de
erudita da cultura popular e das imagens do domínio da natureza.
cotidiano.
O ensino da arte e de qualquer outra discipli-
(MÖDINGER, 2012) denuncia os antagonismos na só tem importância se tiver como objetivo
entre a cultura popular do aluno - que pode re- a transformação, que pode ser intelectual, mo-
presentar uma fonte de prazer pela convivência ral, espiritual ou cultural. Desde que se aprenda
com elementos pertencentes ao seu imaginário algo relevante é muito motivador o resultado de
social. Para entrar em sintonia com as tendên- uma prática educacional onde há crescimento
cias e finalidades do ensino de Artes Visuais intelectual e da sensibilidade. Como o grande
contemporâneo, é necessário rever as carac- pensador Heráclito descreveu sobre o valor
terísticas da modernidade, que entende a arte da transformação. “Um homem não entra no
como expressão subjetiva ou manifestação da mesmo rio duas vezes. Da segunda vez não é o
essência individual (DIAS e FRANZ 2014, p.17). mesmo rio e nem o mesmo homem”.

As tendências pedagógicas atuais apontam O professor deve ser “mediador” entre a arte e
para o estudo crítico do universo da Cultura o aluno, para assim transformar a sua prática
Visual em geral. Ao se valer, por exemplo, de docente. Segundo Chiovatto, em seu artigo “O
outras imagens e objetos da Cultura Visual, tais Professor Mediador”:
como quadrinhos, jogos eletrônicos, propagan-
das de TV, filmes, etc. os professores adentram O mediador não só apresenta um de-
o mundo simbólico e visual dos estudantes, se terminado conteúdo, mas estimula seu
aproximando cada vez mais dos objetivos do valor significativo, ajustando-o a cada
ensino de Artes Visuais na contemporaneida- turma, ‘tramando’, com eles, respostas
de. produtivas e significantes. Assim, o gru-
po estará efetivamente participando de
Por último, parece não haver dúvidas de que seu processo educativo, ampliando subs-
qualquer agenda para pensar as Artes Visuais tancialmente sua posição de ‘depositá-
para o século XXI há de ser baseada também rios’ de conhecimentos e informações.
em pedagogias que visem uma transformação (CHIOVATTO, 2000)
pessoal e social. A função social da arte é a

INEQ - Educação integral 89


Assim, o professor mediador é responsável BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de
por dosar as informações dos alunos a fim de Educação Básica. Diretrizes Curriculares Na-
construir através da interação, um todo com- cionais para a Educação Infantil. Brasília: MEC,
preensível e imparcial. A ação do professor é SEB, 2010.
ativa na construção de tramas que articulem ______. Ministério da Educação e do Desporto.
conteúdos, mundo, vida, experiências (suas Secretaria de Educação. Referencial Curricu-
e dos alunos) num todo significante, conside- lar Nacional para a Educação Infantil. Brasília:
rando as necessidades, respostas, explorando MEC/SEF, 1998.
e aprofundando cada descoberta, articulando ______. Lei de Diretrizes e Bases da Educação
todos os aspectos da situação. Nacional nº 9.394/96. Brasília: MEC, 1996.
BARBIERI, Stela. Interações: Onde está a Arte
CONSIDERAÇÕES FINAIS na Infância. São Paulo: Blucher, 2012.
BARBOSA. A. M. A imagem no ensino da arte.
A criança na educação infantil explora os sen- São Paulo: Perspectiva, 2001.
tidos em tudo que faz. A arte pode ir além de LINO, Dulcimarta Lemos. As artes do universo
uma atividade prática e precisa ser compreen- infantil. Porto Alegre: Mediação, 2012.
dida como um processo que envolve sentimen- CUNHA, S. R. V. Pintando, bordando, rasgando,
tos e emoções. Foi possível perceber através desenhando e melecando na educação infantil.
da pesquisa que a Arte é vista como importan- IN CUNHA, S. R. V. da (Org.). Cor, som e movi-
te tema gerador a ser trabalhado diariamente mento. Porto Alegre: Mediação, 2009.
nas Escolas de Educação Infantil, e que cabe CHIOVATTO, Milene. O Professor Mediador. Bo-
ao professor planejar e incluir esse conceito letim, Número 24, Outubro/ Novembro 2000.
respeitando a diversidade, o tempo e a maneira FRANZ, T.S. Educação para uma compreensão
com que cada criança relaciona-se com a arte crítica da arte. In: RELATÓRIO FINAL PROBIC/
no processo de construção do conhecimento. UDESC (Bolsista Gustavo Dias), apresentado
ao DAP/CEART/UDESC, ago., 2014.
Ao término da pesquisa conclui-se que a Arte FREIRE, P. Pedagogia do oprimido. Rio de Ja-
Contemporânea estabelece relações entre o neiro: Paz e Terra, 2007.
mundo e a maneira como o homem o percebe HERNÁNDEZ, F. Cultura visual, mudança edu-
ao longo do tempo e assim ajuda a construir cativa e projetos de trabalho. Porto Alegre: Art-
um olhar cada vez mais sensível e crítico para med, 2015.
perceber como os elementos artísticos trazem HOLM. A. M. Baby - Arte: os primeiros passos
significados diversos. Disponibilizada de modo com a arte. São Paulo: Museu de Arte Moderna
gratuito, a arte inserida no cotidiano pode vir de São Paulo, 2007.
a ser um momento de veemente exercício da MÖDINGER, Carlos Roberto. Artes visuais: Dan-
liberdade, de ampliação da consciência auto- ça; Música, Teatro e práticas pedagógicas e co-
consciência e de intenso prazer sensório-inte- laborações docentes. Erechim: Edelbra, 2012.
lectual desvinculado das relações de posse e OSTETTO, L. Educação Infantil Saberes e Faze-
dominação que permeiam a quase totalidade res - Formação de Professores. São Paulo. Edi-
das relações humanas na sociedade contem- tora: Papirus. 2010
porânea. PARSONS, M. Curriculum, arte e cognição inte-
grados. IN BARBOSA. A. M. (Org.) arte/educa-
REFERÊNCIAS ção contemporânea – Consonâncias interna-
cionais. São Paulo: Cortez, 2006.
ALMEIDA, C.M.C. Concepções e Práticas Artís-
ticas na Escola. Campinas-SP: Papirus, 2012.

90 INEQ - Educação integral


A ARTICULAÇÃO DAS VÁRIAS
FACETAS DO PROCESSO DE
APRENDIZAGEM INICIAL DA
LÍNGUA ESCRITA

Nájara Nogueira Damasceno

RESUMO forma de pesquisa bibliográfica, pautada em uma


análise qualitativa dos principais conceitos, perti-
Este artigo tem como objetivo principal compre- nentes ao objeto de estudo Concluiu-se que a prá-
ender algumas questões sobre o processo de en- tica de ensino pode favorecer o desenvolvimento
sino/aprendizagem e seus métodos, quando são dos conhecimentos relativos à aprendizagem em
debatidos com as teorias de alfabetização e Le- alfabetização e letramento, uma vez que a mes-
tramento. Faz-se necessário, a partir de escolha ma se encontra entrelaçada em todo o âmbito da
de métodos, refletir sobre a didática e o trabalho sociedade.
pedagógico que implica a formação de saberes Palavras-chave: Letramento; Alfabetização;
e das relações que se enredam para chegar à Aprendizagem; Prática docente.
construção do conhecimento. Para desenvolver
a consciência sobre a aprendizagem do sistema ABSTRACT
de escrita em meio a tantos fatores e desenvolver
a capacidade do aluno identificar e manipular as This article aims to understand some questions
unidades do oral, o que passa necessariamente about the teaching / learning process and its me-
por um processo de abstração da percepção so- thods when they are debated with the literacy and
bre a fala. Inicialmente apresenta algumas carac- literacy theories. It is necessary, from the choice of
terísticas básicas do aparelho fonador que são methods, to reflect on the didactics and the peda-
importantes para a produção de um segmento gogical work that implies the formation of know-
vocálico, como o fato de existir passagem livre da ledge and the relationships that are entangled to
corrente de ar, de a posição da língua em termos reach the construction of knowledge. To develop
de altura variar segundo as diferentes produções, awareness of the writing system learning throu-
o fato de se observar o arredondamento ou o es- gh so many factors and to develop the student's
tiramento dos lábios e, consequentemente, de a ability to identify and manipulate oral units, which
língua se projetar para frente ou para trás na cavi- necessarily goes through a process of abstraction
dade bucal com o objetivo de mostrar às crianças, of perception about speech. Initially it presents
de forma lúdica, que os sons que passam pela ca- some basic characteristics of the vocal device
vidade bucal podem ser produzidos de várias ma- important for the production of a vowel segment,
neiras, visto que a posição da língua e a posição such as the fact that there is free passage of the
dos lábios interferem na produção dos sons; bus- air stream, the position of the tongue in terms of
ca-se mostrar, que a língua é um órgão de grande height varies according to the different produc-
mobilidade e pode tocar o palato e os dentes de tions, the fact that one observes the rounding or
diversas formas para produzir os sons. A metodo- stretching of the lips and consequently the tongue
logia utilizada para elaboração deste artigo foi em protruding forward or backward in the oral cavity
INEQ - Educação integral 91
in order to show children in a playful way that A reorganização constante do ensino está su-
sounds passing through the oral cavity can be jeita as questões sociais de cada época. Sen-
produced in various ways, whereas tongue po- do assim, os métodos de ensino estão sujei-
sition and lip position interfere with sound pro- tos às leis de evolução histórica. Há também
duction; The aim is to show that the tongue is uma polêmica entre os métodos antigos e os
a highly mobile organ and can touch the palate modernos, na pluralidade de métodos e nas
and teeth in various ways to produce sounds. práticas que se adaptam melhor às fases de
The methodology used for the elaboration of desenvolvimento social da criança.
this article was in the form of bibliographical
research, based on a qualitative analysis of the Os métodos da soletração: fônico e silábico
main concepts, pertinent to the object of study. são de origem sintética, ou seja, partem da me-
It was concluded that the teaching practice can nor unidade para a maior, isto é, trilha-se um
favor the development of knowledge related to caminho que vai da menor unidade (letra) para
literacy and literacy learning, since it is inter- a maior (texto). Percebe-se que nesses mé-
twined throughout society. todos não existe uma reflexão sobre a sílaba,
Keywords: Literacy; Learning; Teaching practi- nem sobre as irregularidades decorrentes das
ce. relações fonema/grafema e suas correspon-
dências, o que significa, entre outros aspectos,
INTRODUÇÃO apagar a existência de sílabas que comportam
mais letras do que os sons que pronunciamos.
Acredita-se que a prática pedagógica requer Além disso, os textos utilizados para o estudo
intencionalidade, no sentido de ter como re- da sílaba são artificiais e muitas vezes sem
ferência o produto final de sua ação perante sentido.
as crianças, e sistematicidade, compreendida
como organização e sequências necessárias Enquanto os métodos sintéticos se propu-
para que os objetivos pertinentes sejam alcan- nham a alfabetizar a partir de fragmentos de
çados. Dessa forma, o professor deve ampliar palavras para atingir o seu todo, os métodos
e qualificar aquilo que foi iniciado pelas crian- analíticos propõem o estudo global da palavra,
ças para garantir que elas se apropriem das para somente depois estudar as partes dela.
máximas capacidades humanas de um dado Por onde começar a ensinar a alfabetização?
momento da história. É possível perceber que os problemas existen-
tes e a necessidade de superar os fracassos
Em conformidade com o objetivo desta pesqui- foram surgindo no decorrer da prática de cada
sa – refletir sobre a prática em alfabetização e um dos métodos, pois eles sempre vieram atre-
letramento – a intencionalidade e a sistemati- lados a um discurso único de eficiência, sem
cidade mostram-se, indiscutivelmente, neces- consideração dos limites internos de cada um,
sárias. Isto porque os processos de alfabetiza- mas apenas dos problemas dos métodos que
ção e letramento dizem respeito ao domínio de os precederam.
habilidades que não podem ser naturalmente
conquistadas, uma vez que, envolvem conteú- Para o trabalho de alfabetização, são ne-
dos complexos resultantes de convenções so- cessárias ações autênticas priorizando a
cialmente estabelecidas. análise do sistema de escrita e o uso da
sílaba no processo evolutivo da escrita

92 INEQ - Educação integral


da criança. (MATZENAUER e MIRANDA, ressaltar que o nosso sistema de escrita não
2013, p. 98) é apenas alfabético, mas ortográfico. Segundo
Cagliari (1998, p.121-122), deve-se conhecer
O artigo está estruturado, considerando a intro- a categorização gráfica e funcional das letras
dução, o desenvolvimento e a conclusão. A in- para decifração da linguagem, ou seja, deve-se
trodução compreende a delimitação do tema, conhecer a relação entre letra-som. É relevante
o problema de pesquisa, a justificativa e os também conhecer a ortografia e saber com ela
objetivos. O desenvolvimento é composto pelo atua na linguagem.
levantamento teórico que fundamente o tema
abordado. A conclusão, por fim, apresenta o al- 1.1 - Sílabas: Conceitos
cance dos objetivos, a resposta ao problema
de pesquisa, as limitações e as sugestões para Quando se pronuncia lentamente uma palavra,
trabalhos futuros. percebe-se que isso não é feito separando um
som de outro, mas dividindo a palavra em pe-
1. A estrutura silábica para a alfabetização quenos segmentos fônicos que serão tantos
quantos forem as vogais. Silva (2010) define a
A alfabetização deve propiciar ao aluno o do- sílaba assim:
mínio da base alfabética e a compreensão de
como funciona o sistema da escrita; nesse Na produção do mecanismo de corren-
processo, é necessário que o professor utilize te de ar pulmonar o ar não é expelido
textos veiculados socialmente. A didática silá- dos pulmões com uma pressão regular
bica é, portanto, pré-requisito para aquisição e constante. De fato, os movimentos de
da consciência fonêmica. Sobre a organização contração e relaxamento dos músculos
do nosso sistema gráfico, Faraco (2010) expli- respiratórios expelem sucessivamente
ca que: pequenos jatos de ar. A cada contração e
jato de ar expelido pelos pulmões consti-
A língua portuguesa tem uma represen- tui a base de uma sílaba. A sílaba é então
tação gráfica alfabética com memória interpretada como um movimento de for-
etimológica. Dizer que a representação ça muscular que se intensifica atingindo
gráfica é alfabética significa dizer que as um limite máximo, após o qual ocorrerá
unidades gráficas (letras) representam a redução progressiva desta força, con-
basicamente unidades sonoras (conso- forme o esquema abaixo. (p.76)
antes e vogais) e não palavras (como
pode ocorrer na escrita chinesa) ou sí- O esquema ao qual se refere o autor é assim
labas (como na escrita japonesa). Além caracterizado:
disso, a escrita alfabética tem como prin-
cípio geral, a ideia de que cada unidade
sonora será representada por uma deter-
minada letra e de que cada letra repre-
sentará uma unidade sonora. (p. 9)

A linguística é uma ciência da linguagem que


explica a estruturação da língua. É necessário

INEQ - Educação integral 93


A sílaba é, portanto, um fonema ou grupo de Uma unidade composta por dois consti-
fonemas emitidos num só impulso da voz. Na tuintes imediatos básicos, o on set (O) e
língua portuguesa, a sílaba se forma neces- a rima R, sendo o primeiro não obrigató-
sariamente com uma vogal, que constitui um rio e possível de ser ramificado, e o últi-
pico ou núcleo silábico. Para compreender a mo constituído necessariamente de um
estrutura silábica do português, retomemos pico de soância, o núcleo N, e de uma
uma vez mais a Silva (2010), que diz: coda (C), elemento opcional. Uma estru-
tura do tipo CVC, como aquela que cons-
Sílabas são constituídas de vogais que titui a palavra ‘mar’ ou a primeira parte
representamos por V - e consoantes - da palavra ‘car.ta’, teria, seguindo-se este
que representamos por C. (...) A vogal é esquema, a representação em (1).
sempre obrigatória e as consoantes po-
dem ser opcionais (...). A vogal é o nú-
cleo da sílaba e as consoantes ocupam
as partes periféricas. O núcleo ou pico
da sílaba pode receber o acento primá-
rio (ou tônico) ou secundário (átono).
Geralmente os núcleos das sílabas em
português são preenchidos por segmen-
tos vocálicos (uma das poucas exceções
em que uma consoante ocupa o núcleo
da sílaba é o sinal de silêncio: ps!. Uma
sílaba do português requer então que a
posição da vogal seja preenchida, o pre-
enchimento das posições consonantais
é opcional. Qualquer vogal tônica ou áto- MORTATTI (2004, p.69) explica que a ocupa-
na do português brasileiro pode ocupar ção das posições do esqueleto silábico costu-
tal posição. (p.152) ma sofrer restrições, de modo que consoantes
e vogais de uma determinada língua não po-
A estrutura da sílaba é composta por três par- dem ocupar qualquer posição dentre aquelas
tes: a parte nuclear, que tem em sua estrutura que, por exemplo, se apresenta no próprio grá-
obrigatoriamente um segmento vocálico. As fico trazido pelos autores. Com base na Escala
outras duas partes da estrutura silábica são de Sonância, é possível dar conta da formação
periféricas, opcionais, e são preenchidas por das diferentes estruturas silábicas observadas
segmentos consonantais. Quando esses seg- nas línguas do mundo, uma vez que o grau de
mentos consonantais ocorrem, eles podem sonância dos segmentos é o que vai definir o
apresentar uma ou mais consoantes. E se a preenchimento das posições de uma estrutura
sílaba apresentar apenas o segmento vocáli- como a que se vê no diagrama (1).
co, este preencherá todas as partes da estru- É possível, por exemplo, entender por que, nas
tura da sílaba. A sílaba, segundo Matzenauer línguas do mundo, são preferencialmente nú-
& Miranda (2013, p.68) pode ser descrita ainda cleo da sílaba os segmentos detentores de
como: maior índice na escala, as vogais, e porque nas
posições marginais ou mais próximas delas

94 INEQ - Educação integral


são encontrados apenas segmentos conso- a tonicidade por ela apresentada, como:
nantais cujos índices de sonância diminuem
gradativamente das líquidas às oclusivas. I. Tônica no início da palavra:
Da representação em (1), pode ser ex- Ex: [i] da [e] le, [a]ve.
traído um conjunto de estruturas silábicas re- I. Pretônica em início de palavra:
presentativo dos tipos silábicos mais frequen- Ex: [i] greja [e] levador, [o]dor.
tes nas línguas do mundo, conforme mostra o II. Tônica no meio da palavra:
diagrama (2): Ex: cu[i]ca, co[e]lho, pi[a]da.
III. Pretônica/Postônica no meio da pala-
vra:
Ex: ju[i]zado, di[a]rista, le[o]nino.
IV. Tônica no final da palavra:
Ex: hava [i], fuzu[e], ba[u].
V. Postônica final de palavra:
Ex: cári [e], ódi[o], ba[u].

A partir da sílaba canônica CV, podem ser deri- 1.3 - Consoantes vocálicas
vadas as estruturas V, CVC e CCV e delas, ou-
tras mais: VC, VCC, CVCC, CCVC e CCVCC. No Nota-se em posição vocálica podemos ter uma
português, a sílaba mínima pode ser composta ou duas consoantes em português. Temos en-
apenas por uma vogal (V) e a sílaba máxima, tão os seguintes tipos de sílabas: CV ~ CVV’,
isto é, aquela com maior número de elemen- quando apenas uma consoante precede o nú-
tos, por cinco segmentos (CCVCC). Como cleo da sílaba, ou CCV ~ CCVV, quando temos
exemplos de estruturas silábicas no português duas consoantes precedendo o núcleo.
do Brasil, teríamos:
I. Início da palavra. Ex:
V: á-gua; CV: /p/á, /b/ala, /t/apa;
CV: sa-po; CVV’: /p/ai, /b/oi, /t/eu.
VC: es-pe-lho; II Meio da palavra. Ex:
CVC: fes-ta; CV: ca/p/a, sa/b/e, pa/t/a;
CCV: pra-to; CVV’: cha/p/eu, aça/b/ou, min/g/au.
CCVC: flor;
VCC: ins-tru-men-to; No caso das sílabas que apresentam duas
CVCC: mons-tro; consoantes prevocálicas “CCV ~ CCVV”, tem-
CCVCC: trans-por-te -se um conjunto chamado de encontro con-
sonantal tautossilábico. Nestes encontros, as
1.2 - Sílabas constituídas de uma vogal duas consoantes são partes da mesma sílaba.

A Ilustração transcrita do livro de Silva (2010, I. Início da palavra:


p.153) de palavras que apresentam sílaba CCV: /pr/ece, /pl/ano, /Br/asil;
constituída apenas de vogal. Nestes casos, é CCVV’: /pr/eito, /pl/eura, /tr/eis.
interessante observar a relação entre a sílaba e II Meio da palavra:

INEQ - Educação integral 95


CCV: a/pr/eco, a/pl/ica, em/bl/ema; glides são classificados como segmentos
CCVV’: com/pr/ou, a/pl/auso, a/br/iu. vocálicos, que são caracterizados levando-se
em consideração alguns aspectos descritos a
1.4 - O Sistema Vocálico de Português: Brasi- seguir: posição da língua em termos de altura;
leiro posição da língua em termos anterior/poste-
rior; arredondamento ou não dos lábios. Estes
Na Língua Portuguesa utiliza-se cinco letras aspectos são quanto a:
para representar as vogais, sendo elas as le-
tras A, E, I, O e U. Estas letras representam, no a) Altura da língua
entanto, sete segmentos vocálicos A, Ê, É, I, Ô,
Ó, e U, que são os únicos fonemas do portu- Este item diz respeito à altura do corpo da lín-
guês a integrar o centro da sílaba, como vimos gua durante a articulação do segmento vocáli-
acima. Um segmento vocálico é todo fonema co, sendo representada pela dimensão vertical
em cuja emissão, o ar passa livremente pela por ela ocupada dentro da cavidade bucal. Po-
boca (ou também pelo nariz), sem obstrução demos considerar quatro níveis de altura: alta
de ar. Isso quer dizer que a passagem da cor- (i/u), média alta (e/o), média baixa (é/ó), baixa
rente de ar não é interrompida na linha central (a). Podemos também pensar em altura como
como acontece com algumas consoantes, e, o que se refere à abertura e ao fechamento da
portanto, não há obstrução ou fricção no trato boca, de modo que “alta” equivaleria à “fecha-
vocal. da” e “baixa” à “aberta”.

É importante ressaltar que ditongo é o nome
que se dá à combinação de uma sequência de
segmentos em que um dos segmentos da se-
quência é interpretado como vogal e o outro é
interpretado como “semivogal, vogal assilábi-
ca, semicontóide, semivocoide” ou de “glide”,
termo que empregado neste trabalho.

Uma das características de nomear-se um seg-
mento como vocálico ou consonantal, do pon-
to de vista da fonética, é a obstrução ou não a b) Anterioridade/Posteridade da língua
passagem de ar pelo trato vocal: enquanto os
segmentos consonantais apresentam fricção Este item diz respeito à posição do corpo da
ou obstrução do ar, os segmentos vocálicos língua na dimensão horizontal, durante a arti-
têm a passagem livre da corrente de ar com o culação do segmento vocálico. Pode-se, as-
estreitamento da cavidade oral e aproximação sim, dividir a cavidade bucal em três partes si-
do corpo da língua com o palato sem que ocor- métricas: uma localizada à frente da cavidade
ra fricção de ar. bucal (anterior), outra localizada na parte final
da cavidade bucal (posterior) e, entre elas, a
Quanto aos glides, estes podem apresentar parte central.
características fonéticas dos segmentos con-
sonantais e/ou vocálicos. Em português, os As vogais posteriores são pronunciadas com

96 INEQ - Educação integral


a língua posicionada no fundo da boca, entre sagem de ar, sendo que, no português, os seg-
o dorso da língua e o véu palatino, como por mentos consonantais são produzidos com
exemplo: as vogais “ô”, “ó” e “u”. Vogais ante- corrente de ar pulmonar (regressiva), ou seja,
riores são pronunciadas com a língua posicio- o ar sai dos pulmões e é expelido por meio de
nada na frente da boca entre o dorso da língua, pressão exercida pelos músculos do diafrag-
como exemplo: “ê”, “é” e “i”. As vogais centrais ma.
são pronunciadas com a língua no centro da
boca, como exemplo: “á” e “â”. A glote é o espaço onde estão situadas as cor-
das vocais. Quando as cordas vocais estão
unidas e a glote fechada, a corrente de ar pre-
cisa fazer pressão para passar pela cavidade,
havendo, então, vibração dessas cordas, o que
produzirá os sons sonoros ou vozeados.

Outro fator que interfere na produção de um
segmento consonantal é a posição do palati-
c) Arredondamento dos lábios no. Quando o véu palatino está levantado, o ar
sai pela boca mais livremente, produzindo as-
Durante a articulação de um segmento vocáli- sim os sons orais: [b], [s], [a]. Véu palatino abai-
co, os lábios podem estar arredondados (boca xado e sem impedimento de saída de ar para
aberta) ou podem estar estendidos (disten- a cavidade oral é produzido som nasalizado:
sos). [ã] [õ]. Com o véu palatino abaixado a cavidade
oral fechada, a passagem do ar é naso-farin-
d) Desvozeamento gal, produzindo-se sons nasais: [n, m]. No que
se refere à classificação de tais segmentos,
Geralmente, os segmentos vocálicos são vo- classificam-se:
zeados, o que significa que as cordas vocais
vibram; em português, o desvozeamento – isto a) Pelo modo como o ar é obstruído;
é, sem vibração das cordas vocais – de seg- b) Pelo lugar ou ponto de obstrução;
mentos vocálicos geralmente ocorre em vo- c) Pela vibração das cordas vocais.
gais não acentuadas em final de palavra.
O modo de articulação esta relacionado à ma-
e) Nasalização neira como se dá a obstrução da corrente de ar
causada pelos articuladores durante a produ-
Ocorre pelo abaixamento do véu palatino, ção de um segmento.
quando parte do fluxo de ar penetra na cavida-
de nasal sendo expelido pelas narinas. Produ- Assim, um segmento pode ser “oclusivo”,
z-se assim um som nasalizado, de modo que quando, na cavidade oral, os articuladores pro-
uma vogal nasal é quando o ar sai pela boca e duzem uma obstrução completa da passagem
pelas fossas nasais. de ar. Nesse caso, o véu palatino está levanta-
do e, assim, o ar que vem dos pulmões encami-
Do ponto de vista articulatório, o segmento nha-se para a cavidade oral. Como exemplos,
consonantal ocorre com a obstrução da pas- temos: tá, pá, cá, gol.

INEQ - Educação integral 97


No caso do segmento “nasal”, os articuladores VI. Bilabial - Obstrução da passagem de ar
estão fechados e o ar não pode passar. Como pelos lábios: [p] [b] [m]. Os sons bilabiais são
o véu palatino está abaixado, o ar que vem dos produzidos pelo estreitamento ou fechamento
pulmões escapa para a cavidade nasal e oral. do espaço entre os lábios: o articulador ativo é
As consoantes nasais são quase idênticas às o lábio inferior e o articulador passivo, o lábio
oclusivas, diferenciando-se apenas pelo fato superior. Exemplos: pá, boa, mata.
do véu palatino estar abaixado e nas oclusivas VII. Labiodental - Obstrução parcial: [f] [v].
ele está levantado. Exemplos: nua, banho, má. Há obstrução parcial da corrente de ar entre o
lábio inferior (articulador ativo) e os dentes in-
Além desses segmentos, temos outros produ- cisivos superiores (articulador passivo). Exem-
zidos com rápidos bloqueios da passagem de plos: faca, vaca.
ar. São eles: VIII. Dental - Ponta da língua ou ápice (arti-
I. Tepe (ou vibrante simples)- Ocorre culador ativo) mais dentes incisivos superiores
com batida rápida e única do articulador ativo (articulador passivo) ou com a ponta língua en-
no articulador passivo, ocorrendo uma rápida tre os dentes: [t] [d] [n] [l] [s] [z]. Exemplos: nata,
obstrução da passagem de ar através da boca. data, Zanata, lata, sapo.
Exemplo: fraca, fora. IX. Alveolar- A Ponta da lâmina da língua
II. Vibrante - O articulador ativo bate vá- (articulador ativo) contra a arcada alveolar (ar-
rias e rápidas vezes no articulador passivo ticulador passivo): [t] [d] [n] [s] [z] [l]. As conso-
causando vibração. Exemplo: carro. antes alveolares diferem das consoantes den-
III. Fricativa - Os articuladores se aproxi- tais apenas quanto ao articulador passivo. Nas
mam estreitando o trato vocal, o ar sai produ- consoantes dentais temos com articulador
zindo fricção: Exemplos: fava, fé, sapa. passivo os dentes superiores, já nas consoan-
IV. Africada - Inicialmente ocorre uma obs- tes alveolares temos os alvéolos como articu-
trução completa da passagem de ar como nas lador passivo. Exemplos: nata, data, Zanata,
oclusivas e depois ocorre uma abertura com lata, sapo, nada.
fricção como nas fricativas O véu palatino X. Alveolopalatal (ou pós-alveolares). A
permanece levantado durante a produção de lâmina da língua (articulador ativo) bate no co-
uma africada são, portanto consoantes orais. meço do céu da boca, isto é, na parte anterior
Exemplos: tia (tchia), dia (djia). do palato duro (articulador passivo). Exem-
V. Lateral - A corrente de ar é obstruída na plos: dia, tia (no dialeto carioca), chá, jaca.
linha central da boca porque o articulador ativo XI. Palatal - Sons que correspondem a /nh/
toca o passivo e o ar será expelido por ambos /lh/. O centro da língua (articulador ativo) con-
os lados desta obstrução, o que ocasiona a sa- tra o final do palato duro (articulador passivo).
ída lateral. Exemplos: palha, lá, sal. Exemplos: minha, telha.
XII. Velar - Dorso da língua (articulador ati-
Os pontos de articulação são denominados vo) contra o véu palatino ou palato mole (arti-
de acordo com os articuladores passivos. De culador passivo) [k] [g] e sons que correspon-
acordo com o lugar de articulação dos seg- dem ao “r” velar carioca em meio de palavra
mentos sonoros, sabe-se qual é o articulador e ao “r” carioca no início de palavra. Exemplo:
ativo e qual o articulador passivo envolvido no galo, casa, rata (dialeto carioca), carga (dialeto
processo. Chega-se, assim, aos segmentos se- carioca).
guintes: XIII. Glotal - Sons produzidos pelas cordas

98 INEQ - Educação integral


vocais, ou seja, os músculos da glote compor- Dizer que [o sistema gráfico] toma como
tam-se como articuladores. Exemplos: rata (na critério para fixar a forma gráfica de cer-
pronúncia do dialeto típico de Belo Horizonte), tas palavras não apenas as unidades so-
carga (carioca). noras que a compõem, mas também sua
origem. Assim escrevemos monge com
Articulações secundárias - A palatalização é g (e não com j) por ser uma palavra de
uma modificação que sofrem as consoantes origem grega; e pajé com j (e não com
e vogais nas diversas línguas, que se tornam g) por ser uma palavra de origem tupi.
palatais por diferente uso da articulação bucal. Escrevemos homem com h não porque
Ocorre quando, ao falar, a língua encosta no haja uma unidade sonora antes do o em
palato (céu da boca). É a ação de articular um português, mas porque em latim se gra-
fonema na região palatal. fava homo com h (resquício de um tem-
po na história do latim em que havia uma
Segundo CAGLIARI (1998), a aprendizagem consoante antes do o). (p.10)
da leitura e da escrita não é um processo tão
natural quanto o processo de aprender a falar, Tais práticas apresentam uma série de limi-
já que a maioria das crianças com idade pré- tações que influenciam a aprendizagem de
-escolar não apresenta competência cognitiva forma negativa, comprometendo o desenvol-
para identificar e isolar os sons da fala cons- vimento da criança em fase de alfabetização,
cientemente, haja vista ser este processo um visto que, o educando ao término da escola-
alto grau de complexidade, em que, para cada rização básica não é capaz de ler e escrever
som da língua, existe um grafema ou mais de satisfatoriamente.
um grafema correspondente. Sobre o proces-
so de alfabetização, Faraco (2010) explica que: O segmento vocálico tem como objetivo fazer
as crianças perceberem que embora utilizem
O professor alfabetizador precisa, entre apenas cinco letras para representar as vogais
outras coisas, ter um bom conhecimento temos sete sons vocálicos orais, produzidos
da organização do nosso sistema gráfi- quando o ar passa pela boca sem obstáculos,
co para poder melhor sistematizar seu como, por exemplo: /a/ bala; /e/ selo; /é/ sela;
ensino; para entender as dificuldades de /i/ saci; /o/ ovo; /ó/ mola; /u/ musgo. Percebe-
seus alunos e para auxiliá-los a superá- -se que as letras /e/ e /o/ apresentam fonemas
-las. (p. 9) abertos e fechados e pode dar origem a sons
diferentes.
Para aprender a ler e escrever, um dos passos
cruciais, consiste na reflexão sobre as sílabas, Com o objetivo de estudar as unidades míni-
sabendo que a língua portuguesa, em sua for- mas que podem ser identificadas num enun-
ma oral é constituída por unidades linguísticas ciado oral (sons da fala), iniciamos nosso tra-
mínimas – os fonemas –, representadas em balho reflexivo pela apresentação das vogais
sua forma escrita, por grafemas. Por outro do ponto de vista sonoro, fazendo relação en-
lado, vale assinalar que o sistema gráfico do tre o sistema fonológico e o sistema ortográfi-
português apresenta o que se conhece por me- co, ou seja, a relação entre som e letra.
mória etimológica, que, como bem apresenta
Faraco (2010), significa: A partir do estudo das vogais, que constituem

INEQ - Educação integral 99


obrigatoriamente o pico silábico ou núcleo da do, era o que ficava entre todos.
sílaba no sistema gráfico do português, o ob-
jetivo é trabalhar com os alunos a conscienti- Outra atividade pode focalizar no parâmetro
zação sobre o que vem a ser a sílaba. Assim, de anterioridade/posterioridade da língua, que
nesse primeiro momento, o que se buscou foi divide a cavidade bucal em três partes simétri-
apresentar as vogais aos alunos, discorrer so- cas, uma localizada à frente na cavidade bucal
bre sua importância e utilidade, e mostrar as (anterior), uma localizada na parte final da ca-
letras que representam na escrita os diferentes vidade bucal (posterior) e, entre estas, tem-se
sons vocálicos. a cavidade central.

Vale lembrar que a altura ocupada pelo corpo A partir da observação do posicionamento da
da língua representa sua dimensão dentro da língua na pronúncia das sequências das vo-
cavidade bucal, sendo que os termos “alto”, gais /i/ e /u/, /ê/ e /ô/, /é/ e /ó/ percebe-se,
“médios” (e seus diferentes graus “médio alto” por exemplo, que, ao pronunciar o som da vo-
e “médio baixo”) e “baixos” empregados para gal /u/, a língua fica posicionada na parte pos-
caracterizá-los remetem à altura do dorso da terior (atrás) da cavidade bucal, ou seja, ela vai
língua, os termos: “adiantado” e “recuado”, à bem para trás, fato que não se observa com /i/.
localização anterior ou posterior da língua na Assim, brincando, sucessivamente, com os ou-
cavidade oral, havendo, entre estas, uma par- tros pares. A vogal /a/ mais uma vez, é aquela
te central, e os termos “arredondado” e “não em que a língua não vai nem para frente, nem
arredondado” à projeção ou não projeção dos para trás.
lábios, o que faz com que durante a articulação
de um segmento vocálico os lábios estejam ar- O foco no parâmetro que se refere à altura ocu-
redondados ou estendidos. pada pelo corpo da língua durante a articulação
do segmento vocálico. Como foi explicado, ora
Quanto ao arredondamento (ou não) dos lá- a língua se aproxima do céu da boca (alta), ora
bios, deve-se solicitar que os alunos pronun- se afasta dele (baixa), entre estes dois pontos
ciem o som /a/ e o som /ó/ repetidas vezes, havendo alturas intermediárias denomina-se
observando que na produção do som /a/ os média alta e média baixa. Devemos então con-
lábios ficam bem abertos, e na produção do siderar quatro níveis de altura:
som /ó/, os lábios são projetados para frente,
isto é, os lábios ficam arredondados. A mesma a) Alta: vogais /i/ e /u/,
situação deve ser repetida sucessivamente na b) Média-alta: vogais /ê/ e /ô/,
comparação entre os sons /é/ e /ô/; o som /ê/ c) Média-baixa: vogais /é/ e /ó/
e /u/; e o som /i/ e /u/, para mostrar às crian- d) Baixa: vogal /a/
ças que, no caso de /é/, /ê/ e /i/, os lábios ou
ficam estendidos ou poucos arredondados. Pode-se solicitar que os alunos façam o som
/a/ para que possam sentir bem a abertura da
Partindo desse princípio para denominar as vo- boca e como a língua fica bem afastada do céu
gais /ó/, /ô/ e /u/ de arredondadas, as vogais da boca. E na sequência, solicitar que repitam
/é/, /ê/ e /i/, de não arredondadas já que os o som /i/ e /u/, um após o outro, questionan-
lábios ficam estendidos e não são projetados do-os sobre as diferenças para que percebam
para frente. O /a/ apesar de não ser arredonda- entre o som /a/ o quanto a abertura da boca se

100 INEQ - Educação integral


modifica. O objetivo destas atividades envolve tência” (SILVA, 2010, p. 35). Isto significa que o
reflexões sobre a articulação dos elementos nível de competência se constrói no percurso
vocálicos orais, ampliando o conhecimento do desenvolvimento, conforme a história das
que os alunos tenham sobre o que é uma vo- aquisições da aprendizagem de cada sujeito.
gal e desenvolvendo a capacidade de identifi-
car as semelhanças e as diferenças entre os “Piaget estabelece as bases para uma con-
sons das vogais, desenvolve habilidades e cepção didática baseada nas ações motoras e
comportamentos de uso competente da língua nas operações mentais (concretas e formais)”,
escrita nas práticas sociais que a envolvem no (GÓMEZ, 1998, p. 35), pois as ações que o su-
contexto do, por meio do e em dependência do jeito exerce ao manipular e explorar o seu meio
processo de aquisição do sistema alfabético e é que resultam as transformações e a constru-
ortográfico da escrita. ção do conhecimento.

Considera-se que os processos de ensino- “Para aprender um código alfabético é neces-
-aprendizagem baseiam-se em diferentes co- sário promover reflexões sistemáticas sobre
nhecimentos teóricos e práticos, que visam as relações entre o sistema oral e o sistema
intervir no desenvolvimento do sujeito. Porém, gráfico da língua”. (SOARES, 2010). Em todas
há várias dificuldades que interferem negati- as tarefas há uma participação ativa do sujei-
vamente neste processo, e nenhuma delas é to nos diferentes processos de exploração, de
única e imutável; assim, requerem dos profis- seleção, de combinação e de organização das
sionais envolvidos com a educação, estudos informações.
e investigações dos múltiplos problemas de
aprendizagem. É necessário que o professor conheça as me-
lhores técnicas de intervenção pedagógica
As estruturas cognitivas são os mecanismos para que se criem melhores condições para
reguladores aos quais se subordina a influ- o desenvolvimento do aluno. É interessante
ência do meio. Tais estruturas se constroem que o professor vá à busca das concepções
em processos de troca, por isso, denomina-se prévias dos alunos e a partir dela inicie a co-
como construtivismo genético. Dois movimen- locação das representações propostas pelo
tos explicam todo o processo de construção conhecimento científico. Com isso, o aluno
genética: elaborará novas representações, modificando
suas concepções anteriores, adquirindo uma
A assimilação, processo de integração, linguagem coerente. Portanto, é necessário
dos objetos ou conhecimentos novos às que o professor conheça as características
estruturas velhas, anteriormente cons- psicopessoais e cognitivas do aluno, os conte-
truídas pelo indivíduo; e a acomodação, údos das experiências do dia a dia e as melho-
a reformulação e a elaboração de estru- res técnicas de intervenção pedagógica para
turas novas em consequência da incor- criar melhores condições de desenvolvimento
poração precedente, ambos constituem do aluno. Assim a educação tradicional, mui-
a adaptação ativa. (GÓMEZ, 1998, p. 35) tas vezes permanece enraizada e presente na
rotina das escolas, sendo que o educador ne-
“A vinculação entre aprendizagem e desenvol- cessita saber dos problemas desta concepção
vimento leva ao conceito de nível de compe- para não agregar-se a ela, sendo que é um ca-

INEQ - Educação integral 101


minho tão simples e comum nas escolas, pois desafio dos professores da educação infantil
a educação tradicional vem sendo criticada há consiste em trazer essas vivências para o am-
200 anos e ainda hoje se encontra presente na biente da escola e por intermédios dessas ex-
área educacional. periências possa ampliar novas possibilidades
para que a criança desenvolva sua potenciali-
O maior objetivo da Educação é aprender a dade de escrita e leitura.
aprender, que o aluno seja capaz de estabele-
cer relações entre novos conteúdos, através REFERÊNCIAS
da comparação, correlação, aplicação, análi-
se, síntese e julgamento. Por outro lado uma BRASIL. Lei n. 9.394. Lei de Diretrizes e Bases
escola construtivista oportuniza a construção da Educação Nacional. Brasília, DF: MEC, 1996.
de relações significativas em um universo sim- CAGLIARI, L. C. Alfabetizando sem bá-bé-bi-bó-
bólico contextualizado. Portanto, as práticas -bu. São Paulo: Ed. Scipione, 1998.
sociais de leitura e escrita devem que ser foca- FARACO, Carlos Alberto. Escrita e alfabetiza-
das do ponto de vista pedagógico, sob a pena ção. 9ª Ed.- São Paulo: Contexto, 2000.
de tornar a aprendizagem da leitura e da escri- GIL, A. C. Como elaborar projetos de pesquisa.
ta pouco significativa para a criança, privando- São Paulo: Atlas, 2015.
-a do acesso a formas de comunicação que só GÓMEZ, A. I. P. A aprendizagem escolar: da
aparecem nos textos escritos. didática operatória à reconstrução da cultura
na sala de aula. Tradução Ernani F. da Fonseca
CONSIDERAÇÕES FINAIS Rosa. 5ª ed. Porto Alegre: Artmed, 1998.
MATZENAUER, C. e MIRANDA, A. R. Variação
Diante do exposto pode-se concluir que alfa- na aquisição Fonológica. Fonologia: Teorias e
betização e letramento podem e devem fazer Perspectivas, p. 1 - 16, 2013.
parte da educação desde a infância, afinal, é MORTATTI, Maria do Rosário Longo. Educação
desde as primeiras séries que se deve mediar a e letramento. São Paulo: UNESP, 2004.
proximidade da criança com a escrita tão pre- SOARES Magda Becker. Letramento: um tema
sente em seu contexto social. Devemos privile- em três gêneros. 4ª Ed., Belo Horizonte: Autên-
giar no contexto da pequena infância, práticas tica Editora, 2010.
voltadas para o letramento e práticas que ins- SILVA, Thais Cristófaro. Fonética e fonologia
tiguem as crianças no gosto pela leitura para do Português: roteiro de estudos e guia de
que o aprendizado não se torne mecânico e exercícios. São Paulo: Contexto, 2010.
descontextualizado nos reportando ao mode-
lo tradicional, centrado no lápis e no caderno e
ainda, no estresse e ansiedade da codificação
e decodificação do signo linguístico.
Mesmo antes de começarem a frequen-
tar uma escola as crianças já estão inseridas
no mundo das letras e das palavras, pois, todas
elas já possuem suas vivências, seja em casa
através da sua família, ou por meios de pla-
cas e cartazes espalhados nas ruas, revistas,
televisão e outros meios midiáticos. O grande

102 INEQ - Educação integral


AVALIAÇÃO NA EDUCAÇÃO
INFANTIL: IMPORTÂNCIA,
MODALIDADES,
INSTRUMENTOS E ÂMBITOS
Natalia Rodrigues Martyniak¹

RESUMO tion. Indicate the importance of assessment and


observation of young children, the role of the tea-
A avaliação é instrumento de grande importância cher in this panorama, as well as some modalities,
nas escolas de educação infantil, está associado instruments and areas are also objectives of this
à prática e às transformações no processo de en- research. It is observed that it is possible for the
sino – aprendizagem. Esse estudo bibliográfico reader to make a parallel in relation to their tea-
tem o objetivo maior de contribuir para a melhora ching practice and the practice of the school as
do processo avaliativo e da qualidade do trabalho a whole, thus being able to contribute to positive
oferecido nas escolas desse nível de ensino. Indi- changes that reverberate in the future of students
car a importância da avaliação e da observação and schools.
das crianças pequenas, o papel do professor nes- Keywords: Evaluation; Child education; Modali-
se panorama, assim como algumas modalidades, ties; Instruments; Scopes.
instrumentos e âmbitos são também objetivos da
presente pesquisa. Observa-se que seja possível INTRODUÇÃO
ao leitor fazer um paralelo em relação à sua prá-
tica docente e a prática da escola como um todo, Sabe-se que a avaliação é instrumento educativo,
podendo assim contribuir para mudanças positi- que faz parte, demonstra e contribui para a me-
vas que reverberam no futuro dos educandos e lhora da qualidade do trabalho desenvolvido pela
das escolas. escola. Por meio dela o educador pode, por exem-
Palavras-chave: Avaliação; Educação Infantil; Mo- plo, avaliar sua atuação, rever os caminhos do
dalidades; Instrumentos; Âmbitos. processo de ensino aprendizagem, informar-se
sobre os conhecimentos prévios e capacidades
ABSTRACT dos discentes.

Assessment is an instrument of great importance Além disso, a avaliação está envolvida com todo
in early childhood education schools, it is asso- o projeto educativo da escola, e em diversos ou-
ciated with practice and changes in the teaching tros âmbitos como: o familiar, o comunitário, o
- learning process. This bibliographic study has ambiente e o escolar e organizacional. Sendo
the main objective of contributing to the improve- assim, tudo que se refere à criança ou possa in-
ment of the evaluation process and the quality of fluenciar seu desenvolvimento deve ser objeto de
the work offered in schools at this level of educa- avaliação e reflexões constantes.

1 - Professora de Educação Infantil e Ensino Fundamental. Graduada em Pedagogia e Pós Graduada em Educação
Infantil. martyniak73@gmail.com

INEQ - Educação integral 103


ponha a letra que deseja escrever ou quando o
Essa pesquisa possui cunho bibliográfico e seu ajudamos a explicar o que aconteceu lá no pá-
principal objetivo é contribuir para a melhora tio.” (BASSEDAS; HUGUET; SOLÉ, 2011 p. 180)
do processo avaliativo realizado nas escolas Vale lembrar, aqui o que Vigotsky denominou
de Educação Infantil do Brasil, e consequente- de Zona de Desenvolvimento Proximal ou Po-
mente da qualidade do trabalho oferecido. tencial:

Esse estudo pretende ainda mostrar a impor- A distância entre aquilo que ela é capaz
tância da avaliação na Educação Infantil, assim de fazer de forma autônoma (nível de
como a observação como principal ferramenta desenvolvimento real) e aquilo que ela
avaliativa nesse nível de ensino. Indicar o re- realiza em colaboração com outros ele-
levante papel e responsabilidade do professor mentos de seu grupo social (nível de de-
nesse processo, assim como fazer referência senvolvimento potencial). (REGO, 2007,
as suas modalidades, instrumentos e âmbitos, p.73)
colaborando assim com as discussões atuais
sobre avaliação e incentivando novas perspec- Nesse sentido, Jussara Hoffmann (2010) indi-
tivas nos estudos em avaliação na Educação ca que a avaliação deve estar atrelada a ação,
Infantil. de maneira em que o objetivo não está na
verificação e no registro de dados do desem-
1. A Importância da avaliação na Educação In- penho escolar, mas na observação constante
fantil das aprendizagens que resulte em uma prática
educativa que produza benefícios de acordo
A avaliação de maneira geral, em todos os ní- com o percurso individual do educando.
veis de Ensino proporciona ao professor uma
ferramenta educativa, por meio da qual possa Na faixa etária de 0 a 6 anos, avaliar deve ser a
intervir em sua atuação pedagógica de modo resposta a conhecer o nível de desenvolvimen-
a ampliar os conhecimentos do aluno em re- to evolutivo de cada aluno. Assim as observa-
lação aos conteúdos trabalhados, que foram ções serão sistemáticas, multidimensionais e
eleitos por ele, juntamente a seu grupo de do- contínuas, de atitudes, e evoluções no proces-
centes e gestores da instituição que faz parte. so de ensino-aprendizagem. (ARRIBAS, 2004)
Estudiosos que tratam da avaliação para os A esse respeito, Bassedas, Huguet e Solé
pequenos, como Jussara Hoffmann (2010) (2011) fazem um alerta importante sobre
(2011); Bassedas, Huguet e Solé (2011) e Ar- dois aspectos. No primeiro, ressaltam que o
ribas (2004), defendem como seu principal docente deve atentar-se para não concentrar-
instrumento, a observação. Sendo a mesma, -se em minuciosas e exaustivas observações,
importante maneira de o docente relacionar-se perdendo assim o foco nas informações que
com seu grupo, atuando assim como um ex- realmente sejam úteis para tomar decisões, a
pectador do comportamento de seus alunos. caminho de um ensino ajustado às necessida-
des dos alunos. No segundo, apontam que ob-
Partindo do que é observado é possível que o servações a respeito das crianças devem ser
educador recolha informações, para que possa cuidadosas, na medida em que não as rotulem
intervir na Zona de Desenvolvimento Proximal, ou condicionem suas possibilidades. Convém,
como por exemplo, ao ajudar a criança a “...or- portanto pensar como se mostram em deter-
ganizar um desenho que não sabem por onde minado momento.
começar, quando lhe pegamos a mão para que

104 INEQ - Educação integral


Diante desses aspectos, pode-se dizer que a plano, à mudança de tais procedimentos.
finalidade da avaliação seja, prioritariamente, Observe-se, entretanto, que a maioria
subsidiar a tomada de decisões educativas. das escolas e universidades iniciam pro-
Ao observar o desenvolvimento e a evolução cessos de mudança alterando normas e
da criança, se pode planejar, intervir ou até re- práticas avaliativas, ao invés de delinear,
ver o percurso de trabalho. com os professores, princípios norteado-
res de suas práticas. (HOFFMANN, 2010,
2. Algumas modalidades de avaliação e a edu- p.17)
cação infantil
Assim, segundo a autora, num modelo de ava-
Entendendo que a avaliação está no âmago liação Mediadora, a avaliação não se concen-
dos processos de mudança e desencadeadora tra na verificação dos dados de desempenho,
de transformação, como brilhantemente defi- mas na observação constante das aprendiza-
ne Vasconcellos (2008), conseguintemente o gens que resultam em reajustes de percurso
papel social e político da escola e do professor no processo de ensino-aprendizagem, o que
devem estar a favor dessa mudança, na busca aprimora o desenvolvimento individual do edu-
por uma formação a cada dia de melhor quali- cando.
dade para os alunos, isso partindo da base, do
professor da Educação Infantil. Finalmente, Hoffmann (2010) fecha a discus-
são afirmando que a avaliação centrada em
Diante desse quadro, trazem-se as contribui- práticas tradicionais volta-se ao passado, já
ções de Jussara Hoffmann (2010), que discute que se pauta nos resultados obtidos, tecendo
a avaliação na atualidade, inclusive a avaliação considerações atitudinais que servem para
na Educação Infantil. Essa autora mostra que o justificar o alcance desses resultados, e uma
verdadeiro significado da avaliação está ligado vez comprovada determinada etapa de apren-
a ação, a qual coloca o conhecimento obtido dizagem, a avaliação está concluída.
pela observação ou investigação em prol da
melhoria da conjuntura avaliada. Logo a ava- Em contra partida, a avaliação Mediadora está
liação classificatória, de acordo com as novas direcionada ao futuro, já que acompanha com
tendências, estaria totalmente ausente desse seriedade as etapas vividas pelo aluno, ajus-
processo, preocupando-se apenas com a pes- tando, como dito, suas estratégias pedagógi-
quisa, ou seja, coleta, análise e compreensão cas. Nela cada manifestação do estudante é
dos dados adquiridos. um sinal, que indica o caminho que o professor
deverá seguir. Caminho esse que não é rígido,
São feitos também apontamentos pertinen- diferentemente da forma anterior de avaliação,
tes, que não poderiam deixar de serem desta- esse é:
cados, a respeito da discussão sobre o papel
transformador da avaliação. Hoffmann (2010) [...] plástico, flexível, para abrir-se a várias
comenta que muitas escolas, acabam procu- opções de rumos e tempos aos alunos e
rando mudanças de maneira errônea, ao seguir a cada turma, ajustando objetivos e ativi-
uma concepção classificatória de avaliação: dades permanentemente [...] para favore-
cer a evolução da trajetória do educando.
[...] mudanças essenciais em avaliação (HOFFMANN, 2010 p. 21)
dizem respeito à finalidade dos proce-
dimentos avaliativos, e não em primeiro Seguindo o pensamento de Jussara Hoffmann,

INEQ - Educação integral 105


que como mencionado escreve sobre a avalia- dos;
ção na Educação Infantil, serão apresentados h) A consciência de a avaliação ser multi-
procedimentos avaliativos indicados por dois dimensional, o que portanto, dificulta o proces-
autores. so em termos de material e tempo, situação
que acaba não acontecendo em outras idades.
Sendo um deles Arribas e cols. (2004), em livro i) Pensando nos aspectos citados, que
que de acordo com as observações da autora podem orientar a avaliação dos pequenos, o
desse estudo, é muito valorizado por profissio- processo de avaliação defendido tanto por Ar-
nais que trabalham com alunos dessa faixa ribas e Cols (2004), quanto por Bassedas, Hu-
etária. O outro são autores que escrevem so- guet e Solé (2011), se dá pela:
bre a avaliação na Educação Infantil, Basse-
das, Huguet e Solé (2011), que mostram esses • Avaliação Inicial: na qual o docente pode in-
procedimentos, seguindo a mesma visão. formar-se sobre os conhecimentos prévios e
De acordo com as duas referências, as peculia- as capacidades dos alunos em relação aos
ridades dessa etapa de ensino pressupõem do novos conteúdos. Assim é possível ajustar os
professor reflexão específica, sobre a maneira rumos, modificando atividades programadas
de avaliar os alunos. A primeira referência traz em função do conhecimento e dificuldades
de maneira mais completa, os aspectos que dos educandos. Essa avaliação pode aconte-
devem ser considerados na maneira de desen- cer ao início de uma atividade, de um novo cur-
volver o processo avaliativo. São eles: so escolar ou para indicar o que as crianças já
sabem sobre o que se pretende ensinar. Além
a) O pouco domínio da linguagem da disso, contribui para a realização de atividades
criança faz com que as respostas sensório- mais significativas, já que ao verificar os co-
-motoras nem sempre sejam de fácil interpre- nhecimentos prévios pode-se perceber o que
tação; lhes interessa, o que gostariam de saber, ou
b) É necessário definir áreas e dimensões informações que possam contribuir de alguma
de intervenção; maneira, como por exemplo, se há algum fami-
c) Ater-se ao fato de que se avalia o es- liar que conhece bem o assunto e poderá vir
tado do processo avaliativo, portanto existirão a escola conversar com os alunos. Situações
observações em diferentes momentos e fases que os motivam em relação ao conhecimento;
do processo;
d) Focar-se na valoração de comporta- • Avaliação formativa: É a que possui mais
mentos interligados e não isolados, já que es- sentido e importância na atividade educativa,
tes possivelmente não serão significativos; já que possui papel de regulação nos proces-
e) Utilizar de cautela ao interpretar dife- sos de ensino-aprendizagem. Tem a finalida-
rentes ritmos e sequencias lógicas como dis- de de proporcionar informações, que servem
túrbios, pois na maioria das vezes são normais para ajustar ou modificar o processo educati-
no período infantil; vo, atuando como disse Vigotsky, na Zona de
f) Integrar comportamentos em variado Desenvolvimento Proximal. Por meio da obser-
espaço educativo, ambiental e coordenado; vação e escuta sistemática das condutas das
g) Respeito às técnicas de avaliação, que crianças nas diferentes situações da rotina,
exigem aplicação individual ou em pequenos mediante fichas de observação, diretrizes e o
grupos e ainda, a necessidade de motivar o registro das informações obtidas.
aluno a realizar a tarefa avaliadora de modo
a não afetar negativamente os dados adquiri- • Avaliação cumulativa ou somativa: possibili-

106 INEQ - Educação integral


ta conhecer e medir os resultados da aprendi- pela exploração e manipulação dos objetos; o
zagem dos alunos e os resultados do processo âmbito escolar e organizacional: observação
de ensino-aprendizagem. Não se trata, porém dos diferentes elementos escolares, tanto na
de uma medida quantitativa do êxito ou fracas- adaptação como na dinâmica e comportamen-
so dos alunos, mas uma valoração qualitativa to nas tarefas.
dos êxitos e fracassos do processo educativo,
em relação ao que foi proposto inicialmente. Para esse último, alguns elementos fundamen-
Assim como nas anteriores, também possui tais para observação foram eleitos pela estu-
função reguladora, já que serve para replane- diosa; como: a sala de aula: a organização, de-
jar. É realizada ao final de uma atividade, curso, coração, distribuição, objetos e flexibilidade na
ciclo ou unidade didática. disposição do mobiliário acabam estimulando
o comportamento dos alunos; as crianças: a
Após a discussão sobre diferentes visões e organização em grupos torna possível estra-
concepções avaliativas, pensando na Educa- tégias metodológicas, assim como relações e
ção Infantil como foco, a seguir serão mostra- aprendizagens de devem ser observadas; equi-
das com mais detalhes indicações sobre o que pe de professores: relação que estabelece com
deve ser observado, as maneiras de sistemati- alunos, sua coordenação pedagógica e atitude
zar os dados e o que deve ser avaliado nesse diante das atividades; horário: distribuição das
nível de ensino. atividades, duração e adequação em relação
a idade das crianças; meios, recursos e ma-
3. Observação, instrumentos e âmbitos de teriais: como se distribuem no planejamento,
avaliação na educação infantil para cada grupo de alunos, a frequência e pre-
ferências de utilização.
Nessa seção começaremos falando sobre a
observação, que dentre as diferentes técni- Inúmeros outros aspectos a serem observa-
cas de avaliação é a que melhor se adapta a dos nas crianças da Educação Infantil foram
Educação Infantil, aprofundaremos discutindo citados pela autora, inclusive quando esta faz
seus instrumentos e por fim, em que âmbitos o referência a outros pesquisadores. De maneira
educador deve se ater na avaliação, ou seja, os sintetizada, poder-se-ia dizer que esses aspec-
âmbitos de intervenção. tos estão relacionados à: evolução integral da
criança, como aspectos físicos, psicobiológi-
Sabe-se que o professor deve ser como um cos e maturativos; adaptação; condutas ati-
espectador do comportamento de cada aluno, tudinais; relações sócio-afetivas com outras
entre as diversas situações que ocorrem no crianças e adultos; hábitos pessoais; estraté-
cotidiano escolar, por esse motivo Arribas e gias de aprendizagem das diversas áreas curri-
cols. (2004) mostram que o docente deve diri- culares; jogo; atitude do professor; relação es-
gir seu olhar para os diferentes contextos em cola-família; ambiente escolar (distância, meio
que a criança faz parte, como o âmbito fami- de transporte); e escola (recursos, materiais,
liar: que informa sobre a relação do aluno com funcionalidade, disponibilidade).
a família, irmãos, pais e outros adultos; o âmbi-
to comunitário: as relações estabelecidas com Além disso, a autora classifica as observações
os adultos da sua comunidade, escolar e extra- segundo o grau de sistematização como: in-
escolar, como amigos e vizinhos; o ambiente: formais ou ocasionais; as quais se tratam de
a forma e os meios que o aluno utiliza para co- descrições pontuais sobre algumas atividades
nhecer o ambiente, apropriando-se do espaço das crianças, são feitas de forma pouco siste-

INEQ - Educação integral 107


matizadas; e formais ou sistematizadas; regis- pectivas características da educação escolar.
tros sistemáticos de observação e registro de Apresentam alguns modelos, e acrescentam
fatos, condutas e situações relacionadas. que a utilização das mesmas pelas escolas e
professores deve ser diferente, já que cada um
As formas de registros destacam-se em obser- precisa realizar suas próprias pautas concre-
vações diretas e indiretas, sendo que na pri- tas para observar e avaliar.
meira as observações são obtidas mediante a
análise do comportamento observado, e na se- Um modelo sugerido pelos autores será colo-
gunda, são conseguidos por outra fonte, como cado a seguir de maneira sintética, para uma
o testemunho indireto, com as conversas com melhor elucidação e visualização do instru-
os pais, por exemplo. mento.

Já a amplitude do registro pode dar-se a todos


os membros do grupo, a uma parte ou indivi- PAUTA DE OBSERVAÇÃO DA ESCOLA MATER-
dualmente, utilizando-se também de recursos NAL
audiovisuais como: filmagem, gravações e fo- GRUPO DE 0-12 MESES
tografia. Para dar confiabilidade dos dados, o Área I: Descoberta de si mesmo
controle de qualidade seria feito com a presen-
ça de duas pessoas adultas e com a utilização 1. Conhecimento de si mesmo e do próprio
dos aparelhos audiovisuais, para que se possa corpo
refletir e reproduzir os aspectos concretos da
atividade observada. O próprio corpo. Sensações, percepções e ne-
cessidades.
Entretanto, sabe-se que diante da realidade Destaca algumas partes do seu corpo (nariz,
das escolas brasileiras, esse controle de qua- boca, mãos, etc.) Nomeia algumas. Agrada-lhe
lidade das observações dificilmente acontece- fazer movimentos diante do espelho. Manifes-
ria rotineiramente, a não ser para o estudo de ta prazer ou incômodo diante de determinadas
um caso específico dentro de uma instituição. situações...
Uma maneira de registro, que pode facilmen- _____________________________________________
te ser introduzida na rotina de qualquer escola ____________________________________________
de Educação Infantil é proposta por Bassedas, _____________________________________________
Huguet e Solé (2011), pelo uso das Pautas de
Observação, justificando ser esse um instru- Sentimentos e emoções
mento que ajuda a manter claro ao professor Expressa suas emoções e sentimentos. Aceita
o que deve observar, e serve de guia para pla- as demonstrações de afeto das pessoas adul-
nejar e rever as situações propostas. Sendo tas conhecidas/agrada-lhe/rejeita-as/mostra-
um registro utilizado prioritariamente nas ava- -se indiferente. Aceita os beijos...
liações formativas, mas que também pode ser _____________________________________________
usado ao desenvolver as atividades de avalia- _____________________________________________
ção inicial e somativa. _____________________________________________

Os autores indicam que as Pautas sejam orga- Confiança e segurança


nizadas de acordo com as áreas do currículo Experimenta e realiza as tarefas e as condutas
da etapa, considerando diferentes blocos de a seu alcance/é preciso animá-lo ao fazê-lo.
acordo com a idade das crianças, e as res- Necessita de ajuda frequentemente/constan-

108 INEQ - Educação integral


temente/algumas vezes/quase nunca... do com a idade, individual, pequeno ou grande
_____________________________________________ grupo na realização das atividades ou grupos
____________________________________________ de alunos de acordo com o ritmo pessoal;
_____________________________________________ V. Atividades conforme se realizam: den-
tro ou fora da sala, ou da escola, de maneira
Depois de discutir a observação em seus dife- intergrupal;
rentes aspectos e verificar maneiras de realizar VI. Relações entre a equipe educativa, a
seu registro, nos concentraremos nos âmbitos distribuição e planejamento das responsabili-
de intervenção, ou seja, o que se deve avaliar. dades, o trabalho em equipe, atualização, entre
A avaliação da Educação Infantil, como já co- outros;
mentado, possui caráter multidimensional, VII. Relações família-escola: entrevistas,
como isso tudo que compõe o processo edu- reuniões, contatos pessoais, associações de
cativo, que faça parte ou influa na evolução da pais e mestres, participação dos pais na ges-
criança deve ser objeto da avaliação. Sendo tão da escola, etc.
assim, facilitador na intervenção educativa no
âmbito didático e organizacional. Por meio da análise cuidadosa desses aspec-
Nesse sentido, Arribas e cols. sugerem que: tos, existirão informações suficientes para
adequar o processo educativo à realidade es-
[...] sem dúvida alguma, [...] se deve ava- colar, e informações sobre as intervenções do
liar o processo de desenvolvimento da educador no ato educativo, possibilitarão ao
criança, mas também que a avaliação vai mesmo analisar sua prática e renovar-se ao
além, implica no âmbito escolar, a equipe longo do processo de ensino-aprendizagem.
educativa, em suma, a totalidade do pro-
jeto educativo. (ARRIBAS E COLS.,2004, É possível ressaltar ainda que os diferentes
p.390) autores destacados nesse estudo defendem
o mesmo processo avaliativo a ser realizado
A avaliação, de acordo com esses autores ne- por toda a educação infantil. Assim não desta-
cessita se voltar à análise dos seguintes ter- caram quaisquer alterações na avaliação das
mos: crianças de 0 a 3 anos e as de 4 a 6 anos.
I. Intenções do projeto educativo pen-
sando nos objetivos cognitivos, atitudinais e 4. Papel do Professor na avaliação das crian-
de habilidades para os diferentes campos de ças de 0 a 6 anos
desenvolvimento;
II. Conteúdos próprios das áreas curricu- O professor de Educação Infantil, de maneira
lares; especial, deve possuir certas características
III. Aspectos de infraestrutura e organiza- ligadas à observação, como se sabe, principal
ção da escola, como: organização e distribui- técnica avaliativa na educação precoce. Arri-
ção da sala de aula e uso de dependências co- ba e cols. (2004) indicam como característica
muns; sequencia de atividades / descanso no indispensável ao educador desse nível de en-
horário e em relação à faixa etária dos alunos; sino:
organização, utilização e funcionalidade dos
materiais didáticos, recursos audiovisuais e [..] que saiba observar e incorpore esta
educativos; observação de forma sistemática na for-
IV. Organização das crianças em agrupa- mulação e no desenvolvimento de sua
mentos homogênios ou heterogênios de acor- tarefa educativa.” (Arriba e cols, 2004,

INEQ - Educação integral 109


p.391) impessoal e fria, pois essa não se limita a in-
formes de acontecimentos. A cada dia se valo-
Assim, o docente deve ocupar-se da coleta riza de uma ou outra maneira, as realizações e
de informações para ajustar e melhorar o pro- atitudes dos alunos.
cesso de ensino-aprendizagem, não se esque-
cendo de que a avaliação também precisa ser A comunicação de uma avaliação para criança
congruente ao plano curricular da escola, pois ou para seus pais tende a necessitar de cuida-
é parte do processo educativo. dos, já que acaba trazendo influências sobre
seu comportamento e seu futuro escolar. Um
Sobre esse aspecto, Arriba e cols. (2004) indi- claro exemplo disso é que mesmo não queren-
cam ainda que a avaliação deve ser entendi- do, por meio de olhares, atitudes ou comentá-
da como comprovação da validade do projeto rios, os educadores acabam apresentando da-
educativo da instituição, assim como das es- dos, que podem ter consequências negativas
tratégias didáticas empreendidas para o alcan- na autoimagem do aluno.
ce dos objetivos propostos. Logo o professor
precisa compreendê-la como: Na medida em que a avaliação produz efeitos
sobre a pessoa avaliada e sobre as expecta-
[...]instrumento de investigação didática, tivas que os familiares e pessoas próximas
que a partir da identificação, da coleta vão criando sobre ela, podem condicionar em
e do tratamento de dados, permite-lhe parte, seu futuro na escola. Isso porque nessa
comprovar as hipóteses da ação, com fase as crianças estão começando a formar
a finalidade de confirmá-las e introduzir uma imagem de si mesmos e a se conhecer, o
nelas modificações pertinentes. (Arriba e que acabará tendo influencia sobre sua perso-
cols. 2004, p.390) nalidade. (BASSEDAS; HUGUET e SOLÉ, 2011)
Nesse momento os adultos que fazem parte
Pode-se perceber que o docente está, portanto, da vida do aluno acabam exercendo influên-
no centro da proposta de avaliação da escola, cias sobre seus sentimentos de competência,
mais do que isso, de sua postura diante dessa vontade de participar de atividades na escola
sugestão ou proposição de trabalho, existirão e sua capacidade de assumir caminhos. Os
processos e resultados positivos ou negativos pais, familiares, professores e demais pessoas
para o aluno. com quem se relacionam, estimulam o desen-
volvimento de seu autoconceito e de sua auto-
Nesse sentido, Jussara Hoffmann (2003) afir- estima. Assim como certas falas do professor
ma que o fundamento do procedimento ava- ao aluno como: “Não é preciso que você faça
liativo de uma instituição está na verdadeira isso, é muito difícil! Como sempre Carlos, todo
disponibilidade do adulto diante das crianças, lambuzado!, Você sempre tem que se desar-
pronto a conversar e a trocar informações, rumar?” (BASSEDAS; HUGUET e SOLÉ, 2011,
valendo-se de reflexões e ações constantes, p.181)
de modo a proporcionar ricas vivências que
o possibilitem ampliar suas possibilidades de Esses comentários certamente terão influ-
conhecer e descobrir o mundo. ência para que o educando sinta vontade de
esforçar-se, de participar com interesse ou in-
Avalia-se a todo o momento, e a partir da inte- segurança, com medo de equivocar-se, desin-
ração entre professor e aluno. Mesmo que se teresse, etc.
deseje não seria possível fazê-lo de maneira

110 INEQ - Educação integral


Esses autores indicam, por conseguinte que a fessor pode contribuir para a motivação dos
maneira de comunicar a avaliação deverá ser alunos em progredir a cada dia, e não os de-
cuidadosa e adequada ao destinatário, sendo o sestimular com exigências que não podem ser
próprio educador, a escola, a família ou a crian- alcançadas naquele momento. Dessa maneira
ça. Aos pais, por exemplo, a linguagem usada a criança se animará a continuar trabalhando
deve ser compreensível, de forma simples e e a buscar o máximo de suas possibilidades.
breve; para escola é preciso que seja clara e re-
lacionada aos conteúdos de ensino; já para os Os pais, ainda segundo os mesmos autores,
alunos, precisa adequar-se a sua capacidade também devem acompanhar o percurso de
de compreensão, favorecendo a formação de seus filhos, sendo comunicados sobre seu
uma imagem positiva dele próprio. desenvolvimento. Podem também contribuir
com a escola, por meio de informações sobre
Como contribuição ao assunto, Jussara Hof- o comportamento dos alunos fora da escola.
fmann (2010) mostra o que acredita ser o pa- O que enriquece a avaliação do professor, pois
pel de quem avalia. Ela indica que o professor ao contrastar o que o aluno faz nestes dois
é ativo no processo, portanto partícipe do fra- ambientes é possível regular o processo edu-
casso ou sucesso dos alunos, uma vez que por cativo.
meio de suas decisões pedagógicas e a ampli-
tude de suas observações, percursos individu- Essa comparação de informações permite ao
ais serão mais ou menos favorecidos. educador ir construindo uma visão mais ampla
sobre o aluno, e junto à família aprender e bus-
Agora, são as escolas e os docentes quem de- car o melhor para a educação do mesmo. Nes-
vem adequar suas propostas educativas favo- se sentido, estreitar a relação escola - família
recendo as aprendizagens, de acordo com di- é uma atitude louvável, pois de forma compar-
ferentes ritmos e singularidades, e não mais os tilhada essa colaboração pode contribuir para
alunos que devem ajustar-se a escola. Assim, a formulação e discussão de critérios pedagó-
o educador assume o papel de investigador e gicos e o estabelecimento do entendimento e
organizador de experiências significativas de cooperação atrelados a uma maior relação de
aprendizagem. confiança e cordialidade.

Seu compromisso é o de agir refletida- CONSIDERAÇÕES FINAIS


mente, criando e recriando alternativas
pedagógicas adequadas a partir da me- Acredita-se que a presente pesquisa foi uma
lhor observação e conhecimento de cada mostra de estudo a respeito da avaliação na
um dos alunos, sem perder a observa- Educação Infantil, e que pode aprofundar-se
ção do conjunto e promovendo sempre em novas investigações acadêmicas, cujo cor-
ações interativas. (HOFFMANN, 2010 p. pus seja aumentado sensivelmente de modo a
18) obter resultados mais abrangentes.

O educador preparando-se para receber o alu- Não se esperou finalizar aqui a discussão so-
no nesse contexto avaliativo precisa comparti- bre o tema, visto sua amplitude e grande rele-
lhar a avaliação com as crianças, fazendo com vância no contexto educacional, tanto dentro
que conheçam seus progressos e dificulda- de cada escola, como em nosso país e no
des. De acordo com Bassedas, Huguet e Solé mundo.
(2011), por meio dessas informações o pro-

INEQ - Educação integral 111


Se pensarmos de maneira ampla, consideran- REFERÊNCIAS
do que uma avaliação bem feita está atrelada
a boa qualidade do trabalho oferecido na Edu- ARRIBAS, Teresa Lleixà e colaboradores. Edu-
cação Infantil, pode-se verdadeiramente con- cação Infantil: desenvolvimento, currículo e or-
tribuir positivamente com o futuro dos educan- ganização escolar. Tradução de Fátima Murad.
dos no Ensino Fundamental, Médio e Superior, 5. ed. Porto Alegre: Artmed, 2004.
trazendo benefícios ainda para o desenvolvi- BASSEDAS, Eulàlia; HUGUET, Teresa; SOLÉ,
mento do país como um todo, formando cida- Isabel. Aprender e ensinar na Educação Infan-
dãos capacitados a articular para o progresso, til tradução de Cristina Maria de Oliveira. Porto
sustentabilidade, respeito ao próximo e aos Alegre: Artmed, 2011.
direitos humanos, assim como engajados para HOFFMANN, Jussara. Avaliar para Promover:
o mundo. as setas do caminho.13. ed. Porto Alegre: Edi-
tora Mediação, 2010.
Pode-se afirmar que os objetivos propostos ______. Pontos e contrapontos: do pensar ao
nesse estudo foram alcançados, já que há con- agir em avaliação. 7. ed. Porto Alegre: Editora
fiança que em todo o percurso da pesquisa foi Me¬diação, 2003.
mostrado a relevância do processo avaliativo, ______. Avaliação: mito e desafio: uma perspec-
de um bom processo avaliativo na Educação tiva construtivista. 30. ed. Porto Alegre: Me¬-
Infantil, assim como a importância da obser- diação, 2011.
vação das crianças pequenas. Dessa maneira REGO, C.T. Vygotsky: uma perspectiva históri-
acredita-se que se pôde contribuir para o apri- co-cultural da educação. 18. ed. Rio de Janeiro:
moramento desse processo, bem como a qua- Vozes, 2007. (Educação e conhecimento)
lidade do trabalho oferecido nas instituições. VASCONCELLOS, Celso dos Santos. A avalia-
Mostrou-se a avaliação como ferramenta edu- ção e o desafio da aprendizagem e do desen-
cativa, que possibilita mudanças no processo volvimento humano: A mudança da avaliação
de ensino-aprendizagem, na atuação docente, é fundamental para que deixe de atrapalhar a
e principalmente de modo que possa interferir prática pedagógica e ajude a qualificá-la. Pátio,
cada vez mais e melhor na Zona de Desenvol- São Paulo, ano IX nº 35 mai/jul 2005.
vimento Proximal do aluno, por meio de sua ______. Avaliação da aprendizagem: Práticas
observação constante e detalhada, principal de Mudança – por uma práxis transformadora.
instrumento de avaliação para os pequenos, 9. ed. São Paulo: Libertad, 2008.
segundo diversos autores.

Do mesmo modo, ao mostrar aspectos re-


levantes na avaliação da Educação Infantil,
como algumas modalidades, instrumentos e
âmbitos, assim como o papel docente, que é
central nesse processo, acredita-se ser possí-
vel ao leitor fazer um paralelo em relação à sua
prática profissional e ao desenvolvimento de
sua escola como um todo, podendo contribuir
para mudanças positivas na práxis.

112 INEQ - Educação integral


RPG E EDUCAÇÃO: COMO O
JOGO PODE AUXILIAR NA
APRENDIZAGEM ESCOLAR

Patrícia Aparecida Rossi Batista

RESUMO dos jogos com a educação. Procurando entender


como um jogo de RPG pode dinamizar o apren-
Este artigo buscou entender o universo dos jogos dizado escolar, innterpretando como um jogo
de Role Player Games (RPG) e como eles podem de RPG pode ser usado no aprendizado escolar,
ajudar de forma efetiva o aprendizado escolar. Fo- observando o que é RPG e qual sua origem, re-
ram pesquisados diversos artigos e teses sobre o lacionando o jogo com a prática educacional é
tema, assim como observação in loco de alguns possível ter clareza dos ganhos educacionais pro-
jogos de RPG, com entrevistas e conversas com porcionados aos participantes do jogo.
seus participantes. Definindo o que é, conhecen- O artigo que aqui se lê é fruto de pesquisa explo-
do sua história e relacionando com os jogos e ratória e levantamento bibliográfico do que é RPG
educação. Observando possíveis benefícios edu- e como ele pode ser utilizado como ferramenta
cacionais de sua prática e como ele pode ser apli- didática a professores interessados. Trazendo ao
cado dentro de uma unidade escolar. leitor, portanto, a oportunidade de conhecer um
Palavra-chave: RPG; Games; Educação. pouco mais deste universo lúdico e apresentar
possibilidades de uso didático caso se interesse
ABSTRACT em aprofundar no tema.

This article sought to understand the universe 1. O que é RPG?


of Role Player Games (RPG) and how they can
effectively help school learning. Various articles De acordo com Steve Jackson,
and theses on the topic were researched, as well
as on-site observation of some RPG games, with RPG não é um jogo no sentido lato, é um
interviews and conversations with their partici- método para criação de histórias dentro de
pants. Defining what it is, knowing its history and universos ficcionais que vão sendo explora-
relating it to games and education. Observing dos coletivamente. As pequenas e grandes
possible educational benefits of your practice and batalhas, as verdadeiras emoções, se dão
how it can be applied within a school unit. no desenrolar de uma história, uma aventu-
Keyword: RPG; Games; Education. ra, criada e vivida pelo grupo de jogadores. É
no desenrolar destas histórias que surgem
as derrotas e vitórias, altos e baixos que so-
INTRODUÇÃO mados ao fim garantem ao participante a
satisfação de ter atuado como um viajante
Educadores defendem cada vez mais a relação dos caminhos que a imaginação da equipe

INEQ - Educação integral 113


resolveu trilhar. (1994, p. 3) res foram conhecidos como geração “Xerox”.
Grandes editoras como a Saraiva e Cultura co-
Um jogo RPG, portanto é uma história colabo- meçaram a importar livros de RPG e editora.
rativa contada por um jogador que assume o Devir se tornaria a “casa” do RPG no Brasil, pas-
papel de narrador/ mestre do jogo. Este pode sando a divulgar o jogo e publicar o primeiro
utilizar uma aventura pronta (escrita em algum sistema de RPG no Brasil, o GURPS em 1991.
livro do jogo) ou criar a sua própria ambienta- Jogo de ambientação genérica, que criava
da no cenário que será o mestre. Para isso, irá regras extremamente detalhadas para os jo-
utilizar regras que são oferecidas em diferen- gadores construírem suas próprias histórias.
tes sistemas de jogos existentes no mercado: Criado por Steve Jackson em 1989. A partir
alguns mais focados em regras, enquanto ou- deste momento, diferentes editoras passa-
tros mais voltados à interpretação. Havendo a riam a apostar no RPG publicando dezenas de
possibilidade de criação de jogos. novos jogos. Até hoje, encontramos inclusive
editoras como a Retro Punk voltada exclusiva-
Utiliza-se dados de diferentes faces para cal- mente para estas publicações.
cular a probabilidade das ações dos jogado-
res, por meio de personagens, há chances de Bittencourt & Giraffa (2003), destaca a dife-
serem bem sucedidos, ou não. Na maioria dos rença entre os “RPG de mesa” e o "RPG digital"
casos utilizam dados de variadas numerações no de mesa os jogadores participam de uma
(20 faces, por exemplo). história narrada, por um jogador normalmente
denominado mestre. Já no digital, comandam
Aos jogadores cabe criar seus personagens personagens virtuais, em vídeos jogos que
baseados nos arquétipos disponíveis no jogo. apresentam os desafios e possíveis decisões
Personagens ditam o que será feito a cada aos personagens. Neste trabalho, nos limitare-
cena, conduzindo com outros jogadores o mos às histórias compartilhadas analógicas.
rumo da história.
RPG é um jogo cujas regras são descritas em
2. Origem do RPG livros geralmente, volumosos e que, além das
regras, trazem descrições de mundos fan-
O primeiro jogo publicado de oficial Role tásticos e orientações detalhadas para uma
Playing Game (RPG) - jogo de representação aventura, que poderíamos chamar de virtual.
de papéis) ocorreu em 1974. Escrito por Gary Os atores dessa aventura são o mestre e os
Gygax e publicado pela TSR, com o título de jogadores, usualmente chamados de players.
Dungeons & Dragons (Masmorra e Dragões) O texto do livro de regras é lido em geral pelo
que passaria a ser mais conhecido pela sigla mestre que, nas sessões de RPG, apresenta
D&D), inspirado pelas histórias de Tolkien. uma história, uma aventura, ao grupo de joga-
dores, criada por ele, a partir da leitura do li-
No Brasil, o RPG começa a se tornar popular vro. A aventura proposta deve conter enigmas,
na década de 90, ao ser jogado de forma “un- charadas e situações que exigirão escolhas
derground” por meio de jogadores com aces- por parte dos jogadores. Cada participante, tal
so a livros importados que eram distribuídos como um autor de ficção, constrói uma perso-
através de fotocópias. Estes primeiros jogado- nagem para si, detalhando seu perfil psicoló-

114 INEQ - Educação integral


gico, suas habilidades intelectuais e físicas, 4. Possíveis ganhos educacionais proporcio-
suas preferências e seus trunfos, assim como nados aos participantes do jogo
suas deficiências, que vão garantir o "tempero"
da ficção. Essas personagens devem adequar- O RPG vem sendo amplamente estudado por
-se a um ambiente, proposto pelo livro do mes- pedagogos e psicólogos quanto aos benefícios
tre, no qual a trama se desenrolará. O ambiente de sua prática ao desenvolvimento cognitivo e
onde se desenvolve a aventura, no vocabulário social de seus praticantes. Rodrigues (2004)
desses grupos, é chamado de mundo ou ce- define RPG como sendo uma “pilhagem narra-
nário. tiva”, uma vez que a história é construída com
elementos de outras histórias, de outros auto-
3. Relações do jogo com a prática educacional res, do repertório de leitura de sujeito.

Para Piaget, a importância dos jogos e demais Em nossas conversas com “mestres” de RPG
atividades lúdicas no desenvolvimento cogni- notamos que não se limitam a seu repertório
tivo do ser humano. Em sua classificação de cultural e sim passam a estudar e procurar no-
jogos o RPG enquadra-se no meio termo entre vas referências como livros e filmes que tratam
o jogo simbólico (“do faz de conta”), que ocor- da ambientação que iram retratar em seus jo-
re quando a brincadeira passa a ter sentido, ou gos. Repertório que será transmitindo para os
seja simbólica, e o de regras. jogadores por meio dos espaços imaginários
narrados pelo mestre do jogo. Apresentando
Para Vigotsky, que interpreta o jogo como ele- os conhecimentos gerados por suas pesqui-
mento impulsionador do desenvolvimento e sas históricas, geográficas e literárias presen-
detém a capacidade de formar zonas de de- tes na criação da aventura.
senvolvimento proximal (distância entre o que
eu sei e o que eu preciso saber). Seria um jogo Em um jogo de RPG, portanto, o individuo se
de situação imaginaria e de regras. assume como sujeito dialógico, exercendo sua
criatividade, imaginação compartilhando seus
Estes estudiosos apontam os benefícios dos saberes. Transformando o jogo em uma fer-
jogos simbólicos/imaginários para crianças ramenta de aprendizado, como destaca Brou-
em idade pré-escolar. Entretanto, partidas de gère (1998), ao afirmar que o jogo contribui
RPG resgatam todos estes elementos, porém para educação, permitindo que se de forma
reencenados por adolescentes e adultos. Fa- divertida e relaxante, elevando a concentração
tor que merece um estudo mais aprofundado. a atividade.
No jogo de regras que surge da transição da
atividade individual para a socialização. O RPG Jogos de RPG atuam por meio da narração
mistura seus dois tipos: Ao combinar as re- de cenas, onde ocorrem diferentes tipos de
gras criadas pelos próprios jogadores com as problemas a serem resolvidos pelas persona-
externas: impostas pelo mestre do jogo e do gens/jogadores. Por exemplo, a investigação
sistema que é praticado. Nestes jogos seus de uma cena onde ocorreu um crime, atra-
praticantes internalizam as regras e desenvol- vessar um rio com uma ponte quebrada, um
vem soluções para os conflitos que lhe são im- interrogatório para descobrir o que aconteceu
postos. encontrar alguém desaparecido, dentre uma

INEQ - Educação integral 115


infinidade de possibilidades. ¬Atuando com pela história. Através do lúdico, os participan-
resolução de problemas, exigindo a superação tes são estimulados a fazer escolhas, defender
de desafios individuais e coletivos. Avaliando seus pontos de vistas, encontrarem hipóteses
e gerenciando desafios de forma individual e e soluções.
coletiva. Buscando soluções para estes pro-
blemas de forma propositiva. Jogos de RPG também estimulam a empatia,
colocando as personagens em situações pro-
Desenvolver o pensamento científico, crítico blemas que envolvem colocar em situações
e criatividade. Organizando, selecionando e problemas, que envolvem em colocar em si-
acessando o pensamento crítico científico e tuações que precisa respeitar as diferenças
criativo por meio de investigações, observação raciais. Muito comum em jogos de fantasia e
e questionamento, que gerem a elaboração de ficção cientifica.
hipóteses, analise de dados, podendo produzir
e usar evidências. Jogos trabalhados com esta preocupação ex-
põe os jogadores à questões de cunho social
Nos exemplos das possíveis cenas do jogo como, por exemplo, problemas envolvendo
que demos é vital o uso e consequentemen- racismo, desigualdade social, violência, entre
te desenvolvimento destas habilidades. Uma outros. Mostrando os dramas que permeiam
vez que através da descrição do “mestre” os estes conflitos gerando empatia.
jogadores vão analisar todas as evidências
apresentadas, questionar os Personagens CONSIDERAÇÕES FINAIS
que o Narrador Controla para ajudar ou atra-
palhar (Npcs) ou mesmo recorrer aos seus Inúmeros artigos e teses ressalta a potencia-
conhecimentos científicos para pensar como lidade do uso didático do RPG de forma teóri-
poderiam atravessar o rio sem correrem riscos ca: Rodrigues (2004), Cabalero (2006), Grando
de perderem suas personagens. Exigindo em (2008), sem oferecer usos práticos ligando
todos estes possíveis desafios a criatividade RPG e educação. Nos trabalhos que encontra-
do grupo. Os desafios propostos neste jogos mos um uso prático, com resultados positivos,
exigem organização dos participantes, criação destacam o trabalho de Camarco que oferece
de estratégias e metas para os desafios pro- um jogo de RPG simplificado e voltado para
postos, desenvolvendo autonomia e determi- ensinar sobre os “Mananciais”, limitando e di-
nação. recionando o uso do jogo. E as aventuras pron-
tas, com elementos de historia e cultura brasi-
Jogos de RPG acabam envolvendo decisões leira em aventuras prontas do jogo “A Bandeira
éticas e responsáveis, uma vez que a ação que do Elefante e da Arara” de Christopher Kas-
determinam em uma cena gera reflexos no tensmid.
decorrer de todo o restante do jogo. Desenvol-
vendo o protagonismo, solidariedade e redu- O uso eficiente de RPG em uma escola exige
ção de problemas apresentados. E desenvolve, profissionais que dominem as práticas do jogo
também, o trabalho em grupo com os jogado- de modo a atuar como indica Pavão (2002):
res colaborando em equipe, na busca de solu- “que o uso do RPG como prática cultural exige
ções coletivas aos problemas apresentados a postura do professor como “mestre” do jogo,

116 INEQ - Educação integral


gerando uma comunidade RPGista na escola”. pdf>
Formação de difícil acesso, pois encontramos GRANDO, Anita. O Uso de Jogos Educacionais
em 2019 apenas um curso de extensão univer- do Tipo RPG na Educação.Disponível em < ht-
sitária “RPG (Role Playing Games) na educa- tps://www.seer.ufrgs.br/renote/article/viewFi-
ção: uma abordagem inovadora para o apren- le/14403/8308>
dizado, oferecido pela Pontifícia Universidade COSTA, R.Q.F; GALHADO, E;LIMA,A.A.SILVA,-
Católica de São Paulo (PUC-SP). F.R. O uso do RPG na escola como possível au-
xiliar pedagógico. UNESP, 2005.
Entretanto, os inúmeros ganhos apresentados JACKSON, S. GURPS Módulo básico. 2. ed. São
à educação proporcionados pela prática do Paulo: Devir, 1994.
RPG não devem ser ignorados no ambiente es- PAVÃO, A: SPERBER, S.F. A Leitura na Escola:
colar. Sugerimos palestras e oficinas a alunos Problemas e Soluções. In Anais do Primeiro
e professores, explicando o que é RPG e seus Simpósio de RPG e Educação, 2002, São Pau-
benefícios. E a presença do mesmo em forma lo. Anais. São Paulo: Devir, 2004.
paradidática aos alunos, oferecendo livros de PIAGET, Jean. A formação do símbolo na
jogos nas bibliotecas escolares e se possível, criança : imitação, jogo e sonho, imagem e
espaço para alunos realizarem seus jogos fora representação. 3. ed. Rio de Janeiro: Zahar,
do horário escolar. 1978
RODRIGUES, Sonia. Roleplaying Game e a Pe-
dagogia da Imaginação no Brasil: primeira tese
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ALMEIDA, P.N.Educação lúdica: técnicas e VYGOTSKY, L. Pensamento e Linguagem. São
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BITTENCOURT, João Ricardo. GIRAFFA, Lucia lo: Martins Fontes, 1988.
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zagem Virtuais utilizando Role-Play-Games. fantil. Buenos Aires: Nuestra América, 2003.
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ção – “Inclusão digital como instrumento de
inclusão social”. Rio de Janeiro. Universida-
de Federal do Rio de Janeiro. 2003
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http://www.comunidadesvirtuais.pro.br/semi-
nario2/trabalhos/suelixavier_alfredoeurico.

INEQ - Educação integral 117


DIRETRIZES DA EDUCAÇÃO
ESPECIAL NA REDE MUNICIPAL
DE ENSINO DE SÃO PAULO:
DESAFIOS E CONSIDERAÇÕES

Renata dos Santos Iokoiama Ramalho1

RESUMO law, as well as the challenges faced by schools


for inclusion to actually happen. The Legislation
O presente artigo trouxe para a discussão a Edu- is clear in saying that the inclusion of students
cação Especial e Inclusiva do ponto de vista do with disabilities should occur within the regular
que é assegurado em Lei, bem como os desafios teaching classes, and it is up to teachers to seek
enfrentados pelas escolas para que a inclusão training, in addition to continued training and im-
realmente aconteça. A Legislação é clara ao di- provement, thus contributing to inclusion. The-
zer que a inclusão de estudantes portadores de refore, this research was based on a bibliogra-
deficiência deve ocorrer dentro das classes de phic survey in order to discuss the main issues
ensino regulares, cabendo aos docentes buscar revelant to the subject, discussing the trajectory
capacitação, além de formação continuada e of special education in the said municipality, of-
aperfeiçoamento, contribuindo assim para a in- fering contributions to the understanding of the
clusão. Portanto, a presente pesquisa foi basea- proper functioning of inclusion in São Paulo. The
da em levantamento bibliográfico a fim de discu- results indicated that there is strong legislation
tir as principais questões pertinentes ao assunto, in the Municipal School Network of São Paulo,
discutindo a trajetória da educação especial no and that each year the municipality brings inno-
referido município, oferecendo contribuições vations related to the theme.
para a compreensão do bom funcionamento da Keywords: Special Education; Legislation; Stu-
inclusão em São Paulo. Os resultados indicaram dents with Disabilities.
que existe uma forte legislação na Rede Munici-
pal de Ensino de São Paulo, e que a cada ano o INTRODUÇÃO
município trás inovações referentes ao tema.
Palavras-chave: Educação Especial; Legislação; Quando falamos em Educação Especial no Bra-
Estudantes com Deficiências. sil, estamos nos referindo a um período que
compreende um espaço de aproximadamente
ABSTRACT 70 anos. Podemos trazer como um dos marcos
da educação especial brasileira a criação da
This article brought special and inclusive educa- Associação de Pais e Amigos de Excepcionais
tion from the point of view of what is ensured by (APAE), em 1954, contribuindo para inúmeras

1 - Professora de Educação Infantil e Ensino Fundamental I - Prefeitura de São Paulo.

118 INEQ - Educação integral


mudanças nesse setor. Até aquele ano, as es- frentados no dia a dia das escolas, para que a
colas de ensino regular atendiam apenas um Inclusão aconteça.
grupo seleto de educandos, o que excluía ne-
gros, pobres e consequentemente portadores 1. Educação especial inclusiva
de deficiência. 1.1 Educação especial no Brasil

Com o passar dos anos, os governos enten- O Brasil quando comparado a outros países,
deram que para assegurar uma educação es- demorou a ter um olhar diferenciado aos por-
pecial de qualidade era necessário formular e tadores de deficiência. Inicialmente, a inclu-
reformular Leis, a fim de trazer um novo olhar são ocorria em centros especializados que
sobre o assunto, discutindo-as no âmbito edu- atendiam esses indivíduos a fim de que eles
cacional, uma vez que não só os docentes, desenvolvessem algo.
mas também as famílias desses estudantes
passaram a ter mais consciência dos direitos O Imperial Instituto dos Meninos Cegos,
atendendo assim as suas necessidades. atualmente chamado de Instituto Benjamin
Constant, foi criado pelo Decreto nº. 1.428
Inicialmente, a Inclusão funcionava apenas de 12/09/1854 oferecendo instrução primá-
para integrar o educando. Com as mudanças, ria, educação moral e religiosa. Nos três pri-
surgiram novas necessidades incluindo estes meiros anos, o número de educandos não
educandos em classes regulares comuns e excedia a 30, sendo apenas dez admitidos de
uma pedagogia voltada para o educando, fo- forma gratuita, sendo constatada a pobreza
mentando assim, importantes mudanças no (CABRAL, 2016).
cenário educacional especial brasileiro (BRA-
SIL, 2007). Dois anos depois, foi criado o Instituto dos
Surdos Mudos, atualmente conhecido como
Apesar de o mundo todo hoje discutir a res- Instituto Nacional da Educação dos Surdos,
peito do processo de inclusão e da Educação oferecendo educação intelectual, moral e
Especial, é possível observar que nas escolas religiosa aos surdos de ambos os sexos. O
os desafios são constantes para que a inclu- Instituto foi inaugurado em 1º de janeiro de
são realmente aconteça. Neto et al. (2018) 1856, como caráter privado, mas sua funda-
discute esses desafios a partir do seguinte ção foi datada apenas em 26 de setembro, dia
ponto de vista: “Como garantir o acesso e a de promulgação da Lei nº. 939/1956, por ter
permanência de todos na escola, incluindo concedido subvenção anual e pensões aos
os alunos com deficiências, e como transfor- estudantes pobres. Inicialmente o atendimen-
mar nossa escola excludente, discriminadora, to acontecia no Colégio de M. Vassimon. O
numa escola inclusiva?” curso agora ofertava o ensino de Língua Por-
tuguesa, Aritmética, Geografia e História do
Assim, a presente pesquisa teve por objetivo Brasil, além de escrituração mercantil e dou-
discutir a legislação pertinente a educação trina cristã (CABRAL, 2016).
especial na Rede Municipal de Ensino de São
Paulo em especial, bem como os desafios en- Já na virada do século, mais precisamente em

INEQ - Educação integral 119


1926, o Instituto Pestalozzi, foi criado como de 1951, com a criação da primeira escola vol-
forma de atender deficientes mentais. O tra- tada aos portadores de deficiência auditiva,
balho da educadora e psicóloga Helena An- além de instituir e valorizar estas questões,
tipoff foi fundamental para o surgimento do promovendo até os dias atuais formações
assistencialismo social, institucionalizando para os profissionais da educação, decretos,
serviços voltados para o público-alvo da Edu- leis, projetos, entre outras ações.
cação Especial. Foi a partir do trabalho dela
que surgiu o termo “excepcional”, a fim de Em especial, a Rede Municipal de Ensino trás
extinguir o preconceito arraigado nos termos algumas leis específicas para esse tipo de
“deficiência mental” e “retardo mental”, utiliza- atendimento. O Decreto nº 33.891/1993, insti-
dos na época (PACHECO, 2016). tuiu a Política de Atendimento aos Portadores
de Necessidades Especiais na Rede Munici-
Vinte e oito anos mais tarde, a Associação pal de Ensino, criando entre outros serviços,
de Pais e Amigos de Excepcionais (APAE) foi as Salas de Atendimento aos Portadores de
criada. O contexto era prestar assistência mé- Necessidades Especiais (SAPNES) que fun-
dico-terapêutica as pessoas com deficiência cionavam paralelamente às classes regulares
intelectual inicialmente. A Associação conta- comuns. Até 2004, foram criadas 99 salas,
va com uma sede provisória onde havia duas demonstrando o forte movimento da SME em
classes especiais, atendendo em média, vinte relação à inclusão.
crianças. Após alguns anos, aquelas mesmas
crianças que recebiam atendimento, entraram Outro importante Decreto foi instituído em
na adolescência, necessitando de atividades 2004, de nº 45.415, que estabeleceu as dire-
mais criativas e profissionalizantes. trizes e normas para a Política de Atendimen-
to a crianças, adolescentes, jovens e adultos
Assim, a APAE foi a pioneira em criar uma com Necessidades Educacionais Especiais. O
oficina pedagógica com atividades ligadas à Artigo 2º veio a assegurar a matrícula desses
carpintaria para os indivíduos com necessida- estudantes nas classes regulares comuns. O
des educativas especiais. Após o sucesso e Decreto também trouxe considerações a res-
a progressão de institutos como a APAE, dis- peito da prestação de serviços de Educação
cussões, fóruns e legislação específica foram Especial a serem prestados em conjunto ou
criados contribuindo para a inclusão e a Edu- não pelo Centro de Formação e Acompanha-
cação Especial. mento à Inclusão (CEFAI), pelo Professor de
Apoio e Acompanhamento à Inclusão (PAAI),
1.2 Inclusão e a rede municipal de Ensino de pela Sala de Apoio e Acompanhamento à In-
São Paulo clusão (SAAI) e pelas seis Escolas Municipais
de Educação Especial que já existiam.
A Rede Municipal de Ensino da Cidade de São
Paulo, juntamente com a Secretaria Municipal Em seu artigo 4º os estudantes com defici-
de Educação de São Paulo (SME) foi uma das ências, limitações e/ou disfunções durante
primeiras a ofertar atendimento especializado o seu desenvolvimento deveriam ser encami-
aos estudantes com deficiência, desde o ano nhados aos serviços de Educação Especial

120 INEQ - Educação integral


depois de realizada avaliação educacional e A Portaria nº 8.764/2016, que regulamenta o
diagnosticada a real necessidade. Decreto nº 57.379/2016 instituindo a Política
Paulistana de Educação Especial. O artigo
Já em 2010 criou-se o Programa Inclui, a par- 3º, por exemplo, trata da matrícula dos es-
tir do Decreto Municipal nº 51.778/2010, tra- tudantes público-alvo da Educação Especial
zendo a Política de Atendimento de Educação em classes de ensino regular, havendo a dis-
Especial. O programa trabalhava com diferen- ponibilidade de Atendimento Educacional Es-
tes projetos cuja finalidade era a de construir pecializado (AEE). O artigo 6º discute sobre
uma rede interligada entre estudante, escola as ações do CEFAI, setor ligado a Diretoria de
e família, voltados para o ensino e a aprendi- Orientação Técnica Pedagógica (DOT-P), que
zagem: é responsável pelas ações inferentes a estes
estudantes, sendo responsáveis ainda pela
I. Projeto Identificar: quantificar e quali- formação dos profissionais da rede; pela pro-
ficar os dados de estudantes com quadros de dução de materiais e pelo desenvolvimento
deficiência, TGD e altas habilidades/superdo- de inúmeros projetos.
tação apontados no Sistema Escola On Line
(EOL); - Os artigos 9º e 10º trazem as Salas de
II. Projeto Apoiar: suporte pedagógico Recursos Multifuncionais (SRMs) que
especializado para o público-alvo da educa- devem funcionar em período contratur-
ção especial; no, de caráter complementar ou suple-
III. Projeto Formar: formação específica mentar, quando constatada a necessi-
aos profissionais da educação para atuarem dade do estudante.
na educação especial, bem como formação A Portaria ainda trás a inclusão do Aten-
continuada aos demais profissionais; dimento Educacional Especializado no
IV. Projeto Acessibilidade: eliminação de Projeto Político-Pedagógico das esco-
barreiras que impedem os estudantes com las da Rede Municipal de Ensino.
deficiência a participarem de todas as ativida-
des educacionais; 1.3 Estudo de caso: desafios encontrados na
V. Projeto Rede: apoio intensivo na loco- rede municipal
moção, alimentação e higiene para participa-
ção nas atividades escolares; Apesar de toda uma legislação pertinente so-
VI. Projeto Reestruturação das Escolas bre a Educação Especial na Rede Municipal
Municipais de Educação Especial: reorgani- de Ensino da Cidade de São Paulo, podemos
zação das Escolas Municipais de Educação dizer que muitas escolas ainda enfrentam cer-
Especial na perspectiva da educação bilíngue; tos desafios quanto ao processo de inclusão.
VII. E Projeto Avaliar: analisar os impactos De acordo com a pesquisa e estudo de caso
da implementação do Programa Inclui com realizado em cinco escolas pertencentes à
relação aos estudantes, avaliando e acompa- Diretoria Regional de Educação (DRE) de São
nhando os processos de aprendizagem do pú- Miguel, foi possível observar que nem todas
blico-alvo da educação especial. as escolas possuem a sala de recursos mul-
tifuncionais e Atendimento Educacional Espe-

INEQ - Educação integral 121


cializado (AEE), assim como materiais neces- do tema em discussão.
sários para facilitar o processo de inclusão.
Outro agravante, passível de ser observado foi
Nas salas de informática observadas, geral- que pelo fato dessas escolas se encontrarem
mente os computadores não eram adaptados, na periferia, tudo fica mais difícil. Os desafios
nem possuíam sintetizadores, e outros recur- são, portanto, maiores, apesar do compromis-
sos que poderiam contribuir para o desenvol- so da escola e dos profissionais da educação,
vimento desses estudantes. mas se faz necessário maior intervenção por
parte da Gestão a fim de que se cumpra a
A maioria destas escolas ainda não possuía legislação pertinente e a inclusão realmente
mobiliário adequado. Ainda, faltava professor aconteça.
de AEE, o que dificulta inclusive o trabalho dos
professores das salas de ensino regular. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Interessante destacar que apesar desses de- De acordo com os resultados obtidos a partir
safios, pôde-se encontrar em sua maioria, as da pesquisa e do estudo de caso, foi possí-
Auxiliares da Vida Escolar (AVE’s), que con- vel notar que a Rede Municipal de Ensino da
forme a necessidade do Professor de Apoio e Cidade de São Paulo, apresenta legislação
Acompanhamento à Inclusão (PAAI) é desig- pertinente em vigor, apesar dos desafios en-
nada para trabalhar nas escolas. Elas colabo- contrados em algumas escolas.
ram no atendimento individual aos estudantes As intervenções têm sido significativas, po-
que não possuem autonomia, necessitando rém, está faltando maior acompanhamento
assim de suporte permanente e intensivo para por parte das Diretorias Regionais de Educa-
a participação nas atividades escolares, na ção (DRE’s) para que os desafios enfrentados
alimentação, na locomoção e na higiene. não continuem acontecendo: falta de recur-
sos, de profissionais especializados, de Aten-
Quanto à acessibilidade, infelizmente algu- dimento Educacional Especializado (AEE), de
mas escolas não possuíam rampas de acesso, materiais e recursos, de Salas de Recursos
havendo em sua arquitetura muitas escadas, Multifuncionais, de acessibilidade, entre ou-
dificultando assim o processo de locomoção. tros aspectos.
Em compensação, os banheiros são adapta- Apesar desses e de outros desafios, a Rede
dos, para atendê-los de forma adequada. Municipal de Ensino ainda se demonstra com-
prometida com a inclusão quando comparada
A formação dos professores, também é outro a outras Redes.
desafio. A Rede disponibiliza cursos e forma- Ou seja, a Educação Especial na Rede Munici-
ção continuada, mas não é obrigatório, o que pal de Ensino de São Paulo, tem resistido aos
faz com que muitos dos professores não par- desafios, necessitando que os mesmos se-
ticipem desse tipo de formação. Nas cinco jam vencidos garantindo a inclusão, a autono-
escolas visitadas, foi possível perceber que mia e o futuro destes estudantes em especial.
boa parte do quadro do magistério não possui
formação continuada ou especifica a respeito

122 INEQ - Educação integral


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PACHECO, E.A. Movimento Pestalozziano gulamenta o Decreto nº. 57.379/2016. Institui
celebra 90 anos com trajetória marcada por no Sistema Municipal de Ensino a Política
conquistas e avanços. Disponível em: http:// Paulistana de Educação Especial, na pers-
fenapestalozzi.org.br/ler/movimento-pesta- pectiva da Educação Inclusiva. Disponível
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______. Decreto nº 33.891 de 16 de Dezembro 2016-institui-no-sistema-municipal-de-ensino-
de 1993. Institui a Política de Atendimento -a-politica-paulistana-de-educacao-especial-
aos Portadores de Necessidades Especiais -na-perspectiva-da-educacao-inclusiva. Aces-
na Rede Municipal de Ensino, e da outras pro- so em: 15 jan. 2020.
vidências. Disponível em: http://legislacao.
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-16-de-dezembro-de-1993. Acesso em: 21 jan.
2020.
______. Decreto nº 51.778 de 14 de Setembro
de 2010. Institui a Política de Atendimento de
Educação Especial, por meio do Programa
Inclui, no âmbito da Secretaria Municipal de

INEQ - Educação integral 123


O PROCESSO DE
ALFABETIZAÇÃO E LEITURA
NA EDUCAÇÃO INFANTIL

Rita De Cássia Mendonça França

RESUMO terature and literacy in the process of literacy in


early childhood education. The word literacy co-
O presente artigo tem como objetivo de mostra a mes from the verb “literate”, which means the ac-
importância da literatura e letramento no proces- tion of teaching and learning a fundamental lan-
so de alfabetização na educação infantil. A pala- guage modality for life in society: writing. In the
vra alfabetização vem do verbo “alfabetizar”, que words of Soares (2003, p. 14-15), the concept of
significa a ação de ensinar e aprender uma mo- literacy is related to “the acquisition of a techno-
dalidade de linguagem fundamental para a vida logy - the writing system and the techniques for
em sociedade: a escrita. Nas palavras de Soares its use”. In this sense, a literate individual is one
(2003, p. 14-15), o conceito de alfabetização está who knows how to decode letters and the sounds
relacionado à “aquisição de uma tecnologia – o they represent, has motor skills to manipulate wri-
sistema de escrita e as técnicas para seu uso”. ting instruments such as pencils, pens, keyboard
Neste sentido, um indivíduo alfabetizado é aque- etc., can read and write according to grammatical
le que sabe decodificar as letras e os sons que and orthographic rules of the language, correctly
elas representam, tem habilidades motoras para handles writing media such as books, magazines,
manipular os instrumentos de escrita como lápis, newspapers, among others. The concept of litera-
caneta, teclado etc., consegue ler e escrever de cy is related to the mastery of social functions of
acordo com as regras gramaticais e ortográficas writing, that is, it is not enough for the individual to
da língua, manipula corretamente os suportes de know the letters he uses in writing, it is necessary
escrita como livros, revistas, jornais, entre outros. to understand, in reading, that they translate the
Já o conceito de letramento está relacionado ao world around him and, in writing , knowing how to
domínio de funções sociais da escrita, ou seja, manipulate them in such a way that, together, they
não basta só o indivíduo conhecer as letras que form texts of different genres through which we
usa na escrita, é preciso entender, na leitura, que interact in society.
elas traduzem o mundo a sua volta e, na escrita, Keyword: Literacy; Literacy. Education
saber manipulá-las de tal modo que, juntas, elas
formem textos de diferentes gêneros por meio
dos quais interagimos na sociedade. INTRODUÇÃO
Palavra-chave: Alfabetização; Letramento. Educa-
ção. Esta pesquisa traz os esclarecimentos, que se
deram mediante as fundamentações teóricas de
ABSTRACT vários autores e, nas análises dos professores de
educação infantil, com o intuito de perceber como
This article aims to show the importance of li- os docentes compreendem e realizam a interati-

124 INEQ - Educação integral


vidade de seus alunos, durante o processo de do e conhecendo o espaço em que está inse-
alfabetização, letramento e leitura. rido. Isso significa que mesmo sem saber que
um determinado objeto pode ser lido e tem
Há diversas correntes filosóficas educacionais, uma grafia, entende e interpreta que ele tem
dentre as quais a construtivista e a sociointera- sua função.
cionista, afirmam que a criança, ao iniciar um
relacionamento com os livros, pode começar Muitos professores alfabetizadores podem
a ser gradualmente uma cidadã em potencial. pensar que devem, primeiro, alfabetizar para,
Essas concepções afirmam que o professor depois letrar, como se a alfabetização fosse
exerce uma forte influência na formação de uma espécie de preparação para o letramento.
competências de leitura e escrita em seus alu- Faz-se necessário destacar que, alfabetização
nos. e letramento são processos diferentes, mas
complementares e inseparáveis, logo o profes-
Portanto, nosso artigo, procura ressaltar que sor não deve escolher entre alfabetizar e letrar,
os problemas de aprendizagem de leitura e es- mas alfabetizar letrando. Para tanto, ele pode
crita dos alunos não devem ser relacionados escolher um método global de alfabetização
apenas à pobreza ambiental a que estejam como, por exemplo, um gênero como rótulo,
submetidos, ou atraso mental ou transtornos placa de trânsito, trabalhar a leitura do texto,
emocionais, pois esses problemas que eles suas características linguísticas, sua função
apresentam quanto à apreensão do processo na sociedade e explorar as palavras-chave e
de alfabetização (leitura e escrita) estão e são analisar suas estruturas silábicas, a ortografia
relacionados a problemas mais localizados, etc.
nos campos da conduta e interação com que
tais alunos foram expostos ao processo discu- Portanto, uma prática pedagógica que leve em
tido. consideração, de modo articulado e simultâ-
neo a alfabetização e o letramento, se mostra
1. Alfabetização e letramento: processos arti- bastante adequada e proveitosa para o desen-
culados volvimento da competência leitora e escritora
dos alunos. Isso porque, de acordo com o Pro-
Ao tratar-se de alfabetização e letramento grama de Formação de Professores dos anos
como um processo contínuo, ou seja, que vai iniciais do Ensino fundamental - Pró-Letramen-
se constituindo conforme a criança vai se de- to,
senvolvendo, saliento que, o estímulo da orali-
dade desse período é muito importante, pois [...] os alfabetizandos vivem numa so-
o contato verbal, através desses estímulos, a ciedade letrada, em que a língua escrita
criança começa a perceber que as coisas, os está presente de maneira visível e mar-
objetos e as necessidades básicas possuem cante nas atividades cotidianas, inevita-
uma denominação, e consequentemente sur- velmente, eles terão contato com textos
gem às primeiras tentativas de expressar sua escritos e formularão hipóteses sobre
necessidade por meio da fala. Conforme este sua utilidade, seu funcionamento, sua
sujeito cresce, vai percebendo que tudo ao seu configuração. Excluir essa vivência da
redor tem um significado e aos poucos inicia sala de aula, por um lado, pode ter o efei-
um processo de leitura de mundo, interpretan- to de reduzir e artificializar o objeto de

INEQ - Educação integral 125


aprendizagem que é a escrita, possibili- que, o universo literário infantil envolve a crian-
tando que os alunos desenvolvam con- ça em um mundo mágico que facilitarão seu
cepções inadequadas a respeito desse processo de ensino-aprendizagem.
objeto. Por outro lado, deixar de explorar
a relação extraescolar dos alunos com Caso haja tal comprometimento do professor
a escrita significa perder oportunidades com a eficácia do processo de alfabetização
de conhecer e desenvolver experiências de seus alunos, intercambiado pela literatura
culturais, ricas e importantes para a inte- infantil ter como resultados, discentes desen-
gração social e o exercício da cidadania. volvidos plenamente ou psicossocialmente,
(BRASIL, 2007, p.13) pois atenderá às especificidades psicológicas
e sociais dos mesmos. Neste sentido, o pro-
2. Apropriação da leitura e escrita fessor da Educação Infantil, Jardim II, concor-
daria com as concepções de que Piaget (1988)
Estar alfabetizado é ir além do código escrito, é defende:
apropriar-se da função social constituinte dos
atos de ler e escrever, é fazer uso da leitura e [uma] educação do pensamento, da ra-
da escrita no cotidiano, ou seja, ser capaz de zão e da própria lógica, é necessário e é
ler um livro, uma revista, um jornal, estar apto a condição primeira da educação da liber-
escrever com total compreensão, portanto, sa- dade. Não é suficiente preencher a me-
ber o que está lendo e escrevendo, é poder no mória de conhecimentos úteis para se
mundo da cultura conseguir acessar as infor- fazer homens livres: é preciso formar in-
mações e delas se utilizar com senso crítico. teligências ativas. (PIAGET, 1988, p.135).

Tendo tal concepção em mente, o professor Como pôde ser percebido no pensamento de
de Educação Infantil, alcançará resultados Piaget (1988), na medida em que existe uma
positivos quanto ao entendimento dos alunos causalidade perceptiva, ela própria é função
referentes à leitura e escrita, pois estará lhes das ações anteriores do sujeito, aplicadas ao
proporcionando entendê-las como uma chan- real segundo uma interação física entre sujei-
ce de romper com velhas rotinas, abandonar to e objeto. O autor defende uma espécie de
maneiras de fazer e pensar que a tradição cris- empirismo com a presença do sujeito que atu-
talizada, ainda, segundo Alves (1999, p. 10). aria em nível da ação da leitura e escrita dos
educandos, pois na medida em que a criança
Segundo Huppes (2001), o professor deve es- aprende, seu desenvolvimento seguirá as mes-
tar sempre atento aos acontecimentos que mas dimensões.
cercam seus alunos, oferecendo-lhes assuntos
interessantes e relacionados à fase na qual es- Vygotsky (1974), também aponta que o de-
tejam inseridos. Sendo a alfabetização o cami- senvolvimento e aprendizagem são processos
nho que colabora para que a criança seja uma independentes que interagem, afetando-se
boa leitora no futuro. O professor de Educação mutuamente, aprendizagem causa desenvol-
Infantil, ao colocar seus alunos em contato vimento e vice e versa, por isso, é preciso que
com autores e obras da literatura infantil, esta- o professor esteja atento e perceber por quais
rá possibilitando-lhe evolução para a aquisição processos interativos com a literatura infantil
das competências de leitura e escrita, uma vez seus alunos estão se tornando alfabetizados,

126 INEQ - Educação integral


no intuito de reforçar tais processos ou mes- Hoje, entendendo que há um conjunto de co-
mo ampliá-los. nhecimentos a serem construídos e que, por-
tanto, temos condições de promover desafios
Nesse sentido, Freire (2003), comunga as que levem as crianças a compreender que a
ideias de Vygotsky (1974), pois acredita que, escrita possui relação com a pauta sonora.
ensinar exige rigorosidade metódica e o dever Essa é uma descoberta que nem sempre é re-
do educador democrático é reforçar a capaci- alizado espontaneamente, razão pela qual se
dade crítica do educando, sua curiosidade, sua torna imprescindível ajudarmos os estudantes
insubmissão. a descobrir os princípios que regem aquela re-
lação enigmática: a relação entre as partes fa-
Assim como Vygotsky (1974) e Freire (2003), ladas e as partes escritas das palavras.
também Morin (2003) afirma que o ponto de
partida do conhecimento (ou da alfabetização) Ferreiro (1985) diz que para chegar à com-
é constituído pelas ações do sujeito sobre o preensão da correspondência entre as letras
real, na situação específica do aluno de Edu- – unidades gráficas mínimas – e os fonemas
cação Infantil, o real ainda confunde-se com – unidades sonoras mínimas é preciso realizar
o fantástico. Essa transposição é que precisa uma operação cognitiva complexa. Nas escri-
ser captada pelo professor, com a intenção de tas alfabéticas, essa empreitada envolve en-
facilitar a inserção de seus alunos no contato tender:
efetivo das diversas possibilidades interpreta-
tivas que a leitura e a escrita disponibilizam. [...] o que a escrita representa das pala-
vras faladas (isto é, que as letras repre-
É importante que nos recordemos de como foi sentam os sons e não os significados ou
a nossa experiência de estudante numa classe outras características físicas das coisas
de alfabetização. Será que pudemos vivenciar às quais aquelas palavras orais se refe-
o prazer de escutar, ler e produzir histórias e rem); como a escrita cria essas repre-
outros textos variados naquela etapa inicial, sentações (isto é, descobrir que a escrita
quando ainda não dominávamos o registro funciona “traduzindo”, por meio das le-
da escrita alfabética? Recebemos ajuda para tras, segmentos sonoros pequenos, os
entender como as letras registram os sons da fonemas, que estão no interior das síla-
fala? Ou precisamos descobrir isso por conta bas).
própria, à medida que copiávamos e recopiá-
vamos listas de sílabas ou palavras que não Outras estratégias didáticas que podem au-
compreendíamos? xiliar as crianças a se apropriar do sistema
alfabético de escrita são os jogos, ou seja, o
Sabemos que durante muito tempo o ensino ensinar no lúdico. Os jogos, criados com o pro-
do nosso sistema de escrita foi feito de uma pósito de alfabetizar crianças, também podem
maneira mecânica, repetitiva, na qual os estu- ser poderosos aliados dos professores. Po-
dantes eram levados a memorizar segmentos demos citar, para fins de exemplificação, três
das palavras (letras ou sílabas) ou mesmo pa- tipos de jogos: (1) os que contemplam ativi-
lavras inteiras, sem entender a lógica que rela- dades de análise fonológica sem fazer corres-
cionava as partes pronunciadas (pauta sono- pondência com a escrita; (2) os que possibili-
ra) e a sequência de letras correspondente. tam a reflexão sobre os princípios do sistema

INEQ - Educação integral 127


alfabético, ajudando os estudantes a pensar adaptado e eficaz. Assim “ser o criador é estar
sobre as correspondências grafofônicas (isto convencido de que existe algo de fundamental-
é, as relações letra-som) e (3) os que ajudam mente errado no que existe e que é necessário
a sistematizar essas correspondências grafo- começar tudo de novo” (ALVES, 1999, p.10).
fônicas.
Na década de 1980, Emília Ferreiro revolucio-
Os jogos fonológicos são aqueles em que os nou as práticas de alfabetização ao pesquisar
estudantes são levados a refletir sobre as se- o modo como as crianças aprendem as fases
melhanças e diferenças sonoras entre as pala- pelas quais passam, apoiando seu estudo
vras. Nesse tipo de atividade, eles começam a na Epistemologia Genética de seu orientador
perceber que nem sempre o foco de atenção Jean Piaget. Na época, suas ideias sobre a
deve ser dirigido aos significados. No caso da aquisição da leitura e da escrita pela criança
apropriação do sistema alfabético, é funda- estavam reunidas principalmente na obra “Psi-
mental entender que é preciso atentar para a cogênese da Língua Escrita” que, desde 1985,
pauta sonora para encontrar a lógica da escri- passou a ser uma referência para os alfabeti-
ta. zadores. Para a pesquisadora argentina, a alfa-
betização não é um estado, mas um processo
Os jogos favorecem a reflexão sobre os prin- longo “de início incerto e de final impossível”,
cípios do sistema alfabético são aqueles em ou seja, não é necessário precisar o início des-
que as crianças são convidadas a manipular sa aprendizagem nem a sua conclusão, pois
unidades sonoro-gráficas (palavras, sílabas, as mudanças tecnológicas no mundo contem-
palavras), a comparar palavras ou partes delas, porâneo impõem novas aprendizagens sobre a
a usar pistas para ler e escrever palavras. leitura e a escrita. Para ela, estar alfabetizado
no século XXI implica poder transitar de modo
3. A alfabetização e leitura no mundo tecno- eficiente por entre as novas práticas sociais
lógico ligadas à escrita nos atuais contextos media-
dos pelas novas tecnologias.
Os estudos de vários teóricos relacionados à
alfabetização evidenciam que a apropriação da A alfabetização é resultante de um longo pro-
leitura e da escrita não ocorrem em via única, cesso que abrange maturidade, psicomotrici-
mas a partir de maneiras metodológicas fun- dade, memorização, vivências individuais e co-
damentadas na interação entre professor-alu- letivas de letramento, consciência fonológica,
no, da instrumentalização e domínio, por parte estímulos orais e escritos. Diante desse con-
do professor de técnicas que possibilitem aos texto são construídos os conceitos de letras,
discentes situações de interação com os tex- sílabas, palavras, textos etc. Assim, as ativida-
tos infantis (prazerosos e repletos de valores des oferecidas aos alunos nesse processo pre-
a serem discutidos), seu relacionamento com cisam ser muito variadas. Os estímulos podem
seus contextos reais, sendo então a literatura utilizar não apenas massa de modelar, lápis de
infantil, um mecanismo de eficiência para que cor, giz de cera, tintas, papéis variados, mas
a alfabetização seja realmente adquirida pelos também telas de computador, tablets etc.
alunos, ou seja, o docente precisa ter a sensi-
bilidade de, fazer uso dos materiais disponí- Enganam-se quem acredita que a tecnologia
veis, tudo imensamente simples, inteligente, só oferece jogos para distrair as crianças. Mui-

128 INEQ - Educação integral


tos aplicativos são destinados à alfabetização, tato com histórias infantis, abordando temas
estimulando habilidades cognitivas, motoras, importantes para o convívio social dos alunos;
visuais, espaciais e auditivas. e) Contribuir para a construção de novas prá-
ticas pedagógicas que possibilitem a melho-
Emília Ferreiro defende que alfabetizar no sé- ria do processo de alfabetização dos alunos
culo XXI inclui todos os objetos em que circu- da Educação Infantil, tendo a literatura infantil
lam textos e imagens. Para ela, “alfabetização como norteador de tal processo.
digital” é um termo que tem sido usado para
designar um tipo de aprendizagem da escrita A temática desenvolvida tem relevância, visto
que envolve signos, gestos e comportamentos que, as mudanças no cenário educativo bra-
necessários para ler e escrever no computador sileiro, no qual as crianças, a partir dos seis
e em outros dispositivos digitais. anos de idade já podem ingressar no Ensino
Fundamental – fase etária em que cursavam
Os jogos digitais têm um papel importante no a Pré-Escola, antes da Promulgação da LEI DE
processo de alfabetização, pois desenvolvem DIRETRIZES E BASES DA EDUCAÇÃO NACIO-
a concentração, o raciocínio lógico além de in- NAL (LDBEN – 1996) - justifica a necessidade
centivar a leitura e a escrita, pois o ato de jogar de iniciação do aluno da Educação Infantil, fai-
exige movimentação mental e permite que a xa etária de cinco anos, ao contato com obras
criança explore suas hipóteses sobre a escri- literárias, com o objetivo que realize uma inte-
ta para avançar pelas etapas da alfabetização ratividade com o processo de leitura e escrita.
por meio da experimentação. Considerando que os alunos ingressam, atual-
mente, aos seis anos no primeiro ano primei-
4. Objetivos da literatura infantil ro escolar do Ensino fundamental, portanto, é
preciso que tenham um bom domínio sobre a
Alguns aspectos que precisam ser levados em ocorrência, estrutura e funcionalidade da lei-
conta: tura e escrita posteriormente e não apresen-
tarem dificuldades posteriores de aprendiza-
a) Verificar se é possível a utilização da litera- gens, possibilitando assim que, tanta a leitura
tura infantil no processo de alfabetização de e a escrita cumpram sua função social. A influ-
alunos frequentes Educação Infantil (faixa etá- ência que o professor exerce para que o aluno
ria de cinco anos); se aproprie da leitura e escrita torna-se então
b) Introduzir o processo reflexivo ao professor fator primordial, afinal, é ele quem mediará e
acerca da importância do processo de apren- orientará todos os passos desse processo.
dizagem de alfabetização, aquisição da leitura
e escrita na Educação Infantil, com o auxílio CONSIDERAÇÕES FINAIS
(contato) da literatura infantil;
c) Observar como os professores da Educação Pode-se concluir que o artigo apresenta argu-
Infantil, exploram os conteúdos das obras de mentos que revelam seu esclarecimento sobre
literatura infantil no processo de alfabetização a importância de estarem em permanente con-
por meio de práticas emancipatórias; tato com as teorias e práticas de alfabetização
d) Demonstrar que é possível desenvolver nos fundamentadas pela literatura infantil, onde
alunos o hábito da leitura, e melhora no seu denotam a compreensão, por exemplo, de que
processo de alfabetização por meio do con- o momento da “roda de conversas” e histórias

INEQ - Educação integral 129


precisa ser festejado, diferenciado com mo- REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
tivações extras que envolvam objetos, fotos,
livros, atitudes do professor, as quais tragam ALVES, Rubem. Conversas com quem gosta de
ainda maior significado e interesse para os alu- ensinar. São Paulo. Ed. Cortez, 1999.
nos. BRASIL (2008). Ministério da Educação. Se-
cretaria da Educação Básica. Pró-Letramento:
Outra questão importante no processo de al- Programa de Formação Continuada de Profes-
fabetização e leitura é a fase do letramento, sores dos Anos/Séries Iniciais do Ensino Fun-
que nada mais é o domínio da escrita, na qual damental.
a criança ao longo de seu percurso escolar ______. (1997). Secretaria de Educação Fun-
domina diferentes gêneros textuais durante a damental. Parâmetros curriculares nacionais:
leitura. língua portuguesa/ Ensino de primeira à quarta
série.
Já a alfabetização e leitura no mundo da tecno- ______.Lei de Diretrizes e Base da Educação
logia ajudam as crianças a se desenvolverem Nacional. Lei Federal 9394 de 20 de dezembro
a sua capacidade de entendimento da escrita de 1996.
e da leitura, pois a simples presença de novas FERREIRO, E; TEBEROSKY, A. Psicogênese da
tecnologias não garante a aprendizagem das Língua Escrita. Porto Alegre: Artmed, 1999.
crianças, é preciso que a mediação do profes- FERREIRO, E. Reflexões sobre alfabetização.
sor propicie desafios e reflexões sobre a leitu- São Paulo: Cortez, 1985.
ra e a escrita. Mesmo antes de ler e escrever FREIRE, Paulo. A importância do ato de ler. São
convencionalmente, a criança pode interagir Paulo, Ed. Cortez, 2003.
com o computador por meio de atividades HUPPES, Mara Cristina. Literatura infantil: his-
voltadas para a alfabetização. Afinal, muitas tória e situação atual. Revista do Professor,
crianças têm contato com as letras nos tecla- RS.: CPOC. Ano X, nº 30, 2001.
dos do computador ou dos celulares e podem MORIN, Edgar. Introdução ao pensamento
usá-las para escrever palavras de acordo com complexo. 4ª ed. Lisboa: Instituto Piaget, 2003.
suas hipóteses, mesmo que não seja da forma RIOS, T. Jogos: alternativas didáticas para brin-
convencional. car alfabetizando (ou alfabetizar brincando?).
IN: MORAIS, A.; ALBUQUERQUE, E.; LEAL, T. Al-
Por meio do poder que a literatura infantil exer- fabetização: apropriação do sistema de escrita
ce na vida de seus alunos e que, tal poder ini- alfabética. Belo Horizonte: Editora Autêntica,
cia-se pelo primeiro olhar que a criança revela 2005.
para a fantasia, aventura, magia e descobertas, SOARES, Magda Becker. Letramento: um tema
é o momento em que seu olhar se torna pro- em três gêneros. Belo Horizonte: Autêntica,
fundo mediante as possibilidades de sonhos, 2009.
compreensão ou distinção de seus pensamen- VIGOTSKY, Leontiev, Luria. Linguagem, desen-
tos a partir do contato com a literatura infantil. volvimento e aprendizagem. SP: Ícone, 1988.

130 INEQ - Educação integral


SÍNDROME DE DOWN:
CAMINHOS PARA A INCLUSÃO
SOCIAL E EDUCACIONAL

Sidney Mauricio dos Santos

RESUMO
INTRODUÇÃO
Este artigo se foca nas dificuldades encontradas
na promoção da inclusão escolar de alunos com A inclusão escolar é um fato e a presença des-
Síndrome de Down no que tange aos seus rela- tes alunos com necessidades educacionais es-
cionamentos sociais dentro do ambiente escolar peciais, que neste artigo chamaremos de NE,
e da inadequação do processo ensino aprendiza- atualmente se faz sentir não somente no ensino
gem no que refere ao preparo e ao conhecimen- Fundamental, mas também nos bancos escolares
to da escola para a Educação Especial como um das escolas de Ensino Médio. Esses alunos alcan-
todo. Para esse estudo, recorreu-se à metodolo- çaram a qualificação necessária para frequenta-
gia qualitativa e à revisão bibliográfica e a análise rem as aulas regulares, mas ninguém preparou a
de dados colhidos na E.E. João Solimeo a fim de escola, os professores, os alunos e os funcioná-
se responder o problema proposto. rios eficazmente para recebê-los. A escola des-
Palavras-chave: Inclusão; Educação especial; Co- conhece o amplo espectro de especialidades que
nhecimento; Dificuldades. podem adentrar em suas salas e muito menos as
diferenças existentes entre indivíduos dentro da
mesma condição especial. Por assim dizer, hoje
ABSTRACT já não podemos falar em Autismo, mas em Au-
tismos, dada a grande diferença existente entre
This article focuses on the difficulties encounte- as formas que esta condição se apresenta em
red in promoting the school inclusion of students cada indivíduo. Embora não seja aplicado o plural
with Down Syndrome regarding their social re- para a condição da Síndrome de Down, ela apre-
lationships within the school environment and senta-se com múltiplas especificidades nos indi-
the inadequacy of the teaching-learning process víduos em que ela ocorre. À luz da constatação
regarding the preparation and knowledge of the das dificuldades que a chegada dos alunos com
school for Special Education. as a whole. For this Síndrome de Down causou especificamente na
study, we used the qualitative methodology and Escola Estadual João Solimeo fez-se necessário
the literature review and analysis of data collected um estudo com foco na efetiva inclusão destes.
in the E.E. João Solimeo in order to answer the Este trabalho tem foco no problema:
proposed problem.
Keywords: Inclusion; Special education; Knowled- Quais as ações que podem levar à diminuição do
ge; Difficulties. impacto do preconceito e do desconhecimento
sobre o acolhimento e a excelência no trabalho

INEQ - Educação integral 131


educacional para que resulte na realização de fessores, com a finalidade de determinar quais
um processo ensino aprendizagem adequado as mais evidentes causas de preconceito e
a essa população? dificuldades de trabalho com os alunos com
[SD]. Frente aos resultados, após a interpreta-
Durante o percurso em que este trabalho se ção dos dados e da elaboração de categorias
estabeleceu, ficaram evidentes as lacunas na de análise para nosso problema, verificou-se
legislação que se tem hoje no que refere aos que deve haver um diálogo entre as necessida-
direitos educacionais de deficientes no que des educacionais inerentes a essa clientela de
implica uma prática quotidiana, que caminha alunos com todos os funcionários da unidade
com dificuldade em meio à falta de infraes- para que torne efetiva a inclusão social e esco-
trutura física dos prédios escolares, à falta de lar a fim de que todos se apropriem das con-
preparo dos educadores e ao desconhecimen- dições necessárias para construção de uma
to de todos ao que se o respeito a esse público cidadania plena.
diferenciado.
2. Resultados e Discussões
Na circunstância em que o processo de in-
clusão escolar se encontra nesse momento, 2.1 Caracterização da escola E.E. João Soli-
já não cabem mais as discussões sobre sua meo
implantação, porém como ela deve acontecer
nas escolas regulares. Portanto, este artigo A Escola Estadual João Solimeo está situada
adquire um propósito prático, de desvelar pro- na Zona Norte, pertencente à Diretoria de en-
blemas e propor soluções para a inclusão dos sino Norte 1, na Estrada do Sabão, 110, bairro
alunos com Síndrome de Down. Jardim Maristela – distrito Freguesia do Ó. A
unidade possui 21 salas de aula em três perío-
Com o propósito de enfrentar os preconceitos dos, 1 laboratório de informática, um laborató-
e as dificuldades, assevera-se a necessidade rio de Ciências/Química/Física meio sem uso
de conhecer e aprender quem são esses novos e sem equipamentos, duas salas com equipa-
alunos nas salas de aula e os novos colegas mento Datashow – uma para reuniões e outra
sentados na cadeira ao lado para que se vali- para aulas –, uma quadra externa e uma inter-
de o esforço dessa clientela em estudar assim na, 1 sala de recurso, anfiteatro, 1 biblioteca e
reconhecendo as suas capacidades e tornan- uma cantina ao lado dela.
do, portanto, verdadeira a inclusão escolar em
sentido amplo. A E.E. João Solimeo tem um número significa-
tivo de alunos com [NE], um total de 103, o que
1. Metodologia e desenvolvimento é uma população que muda a rotina da escola
por causa de suas necessidades educativas
Este estudo segue uma pesquisa qualitativa especiais. Os alunos com [SD] não são os de
por meio de pesquisa de campo na E.E. João quantidade mais expressiva, mas tem apre-
Solimeo e por uma revisão bibliográfica de lite- sentado maior desafio para a escola, já que
raturas que contemplem a resposta de nosso um aluno com [SD] está no Ensino Médio e o
problema para se analisar a condição dos alu- convívio social tem sido um grande entrave ao
nos com [NE]. Para isso, foram submetidos ao que tange as condições ambientais e físicas
preenchimento de questionários alunos e pro- da unidade escolar. Acresce a esses fatores a

132 INEQ - Educação integral


carência de formação e capacitação do corpo 5. Ao ser questionados sobre se a criança com
docente, corpo gestor e funcionários para um [SD] recebe a devida atenção na escola, obte-
trabalho mais efetivo e com menos empirismo ve-se: Sim, 65; não, 63.
prática e teórico. Ao se interpretar os dados
coletados dos informantes, observou-se que o 6. Sobre a possibilidade de indivíduos com
questionário apresentou os seguintes resulta- [SD] estudarem em salas separadas, obteve-se
dos: a média de:
6.1. Os 25% dos informantes entrevistados
1. Corpo docente: A grande maioria dos infor- entendem que seria a melhor opção os alunos
mantes responderam vagamente, pois eles [SD] estudarem separados; já 75% dos infor-
escreveram somente AJUDANDO, porém não mantes afirmam o contrário:
informam como ajudariam.

2. Ao se questionar se os alunos compartilha-
riam o mesmo com os alunos com necessida-
des educacionais especiais, a resposta foi no-
vamente vaga SIM.

3. Em relação à pergunta: Uma pessoa com


Síndrome de Down torna-se diferente para
você, obteve-se a seguinte resposta: 17 sim,
111 não, o que nos permite a montagem do Por meio da análise da coleta de dados reali-
gráfico: zados com alunos do Ensino Médio na unida-
de E.E. João Solimeo, pode-se observar que
a maior dificuldade para o ensino e a socia-
lização dos alunos com Síndrome de Down,
encontra-se firmemente concentrada na falta
de conhecimento sobre a [SD]. Tanto o corpo
docente quanto o corpo discente afirmaram
não conhecer suficientemente a [SD], com uma
porcentagem muito grande de alunos (80%)
que afirmam não saber o que é [SD]. Quanto
à qualidade de atendimento, praticamente, to-
4. A quarta questão verifica se uma pessoa dos os entrevistados acham insuficiente ou
com Síndrome de Down deveria estudar no inadequado, por isso, ainda existe uma pe-
mesmo local de uma pessoa sem necessidade quena parcela entre os docentes e discentes
especial e obteve-se a seguinte resposta: que acreditam em ensino em salas separadas.
Porém outros indicadores advindos da análise
dos dados apontam para uma disposição em
cooperar e o conforto em compartilhar espa-
ços educacionais, o que nos demonstra que o
público desta entrevista está disposto a enten-
der a [SD] e, possivelmente, as demonstrações
INEQ - Educação integral 133
de preconceito para com estes indivíduos pos- drome de Down em atividades escolares
sam ser extintas. ou extraescolares. Estimular as relações
sociais em atividades de lazer, como es-
Paralelamente aos resultados da pesquisa, portes, festas, atividades artísticas ou
os relatos dos voluntários e orientadores das turísticas; Não tratar a pessoa com sín-
APAES visitadas priorizam o conhecimento drome de Down como se fosse “doente”.
da condição do indivíduo com [SD], para que o Respeitá-la e escutá-la.
grupo social escolar o compreenda e aceite e
para que os docentes sejam capazes de reali- Ainda que tenhamos observado que a maioria
zar um trabalho adequado às suas necessida- das pessoas entrevistadas tenham respondido
des especiais. às questões de modo a não evidenciar precon-
ceitos, ainda há uma pequena parcela em que
Ainda segundo a política da Associação de eles persistem e, talvez, algumas respostas
Pais e Amigos dos Excepcionais [APAE] é de que tenham se atido ao “politicamente corre-
suma importância a participação da família to”, o que justificam o zelo em realizar um tra-
na facilitação do trabalho, informando todas balho de esclarecimento sobre a [SD].
as particularidades do aluno, de ordem edu-
cativa ou de cunho comportamental para que É imprescindível o conhecimento de que:
os professores não sejam surpreendidos com
comportamentos que possam ser mal inter- Uma concepção infelizmente ainda mui-
pretados. to presente em relação aos portadores de
Síndrome de Down […] é a de que esses
Acima de tudo, as [APAEs] fazem amplas cam- [SD] se desenvolvem, todos, da mesma
panhas para o conhecimento da condição do forma, ou seja, apresentam as mesmas
indivíduo com [SD], que não é uma doença, características, incapacidades e limita-
mas uma condição genética onde o cromos- ções orgânicas, motoras e cognitivas;
somo 21 não é apenas duplicado mas aparece numa aparente continuidade do pensa-
3 vezes. Isso confere aos indivíduos algumas mento de um dos primeiros pesquisado-
características fenótipas específicas como os res da síndrome, o Dr. J. Langdon Down,
olhos amendoados e língua protusa. Eles tam- em meados do século XIX […] (BISSOTO)
bém podem ter seu desenvolvimento físico e
intelectual comprometidos, mas são capazes Portanto, as diferenças que caracterizam a
de aprender e ter uma vida produtiva. todos os seres humanos, também se aplicam
aos portadores da [SD] que, assim, devem ser
Uma orientação de uma unidade regional da tratados, tanto socialmente como educacio-
APAE orienta da seguinte forma: nalmente, como indivíduos únicos, como to-
dos nós.
Esclarecer a população sobre o que é
síndrome de Down; Não gerar um clima
apreensivo quando for receber em um
grupo de pessoas comuns, um indivíduo
com síndrome de Down; Favorecer o diá-
logo e a participação da pessoa com sín-

134 INEQ - Educação integral


CONSIDERAÇÕES FINAIS REFERENCIAL

Partindo das análises das respostas dos entre- BISSOTO, Maria Luisa. Desenvolvimento cogni-
vistados, percebe-se que a amostra nos alerta tivo e o processo de aprendizagem do portador
para a persistência do preconceito com relação de síndrome de Down: revendo concepções e
aos alunos com necessidades educacionais perspectivas educacionais. Revista Ciência e
especiais com Síndrome de Down, justamente Cognição, vol 4, Rio de Janeiro, mar, 2005.
no ambiente recém-conquistado para seu de- ROSA, Flávia Mendonça; DE BORTOLI, Paula
senvolvimento como cidadão. Lidar com esse Saud; SANTOS, Milena Floria; NASCIMENTO,
preconceito dentro do ambiente escolar, incen- Lucila Castanheira. A inclusão da criança com
tivando a socialização e esclarecendo dúvidas, síndrome de down na rede regular de ensino:
também estende a inclusão social desses indi- desafios e possibilidades. Revista brasileira
víduos para fora dos portões da escola, portan- de Educação especial. Vol. 14. Nº 03. Marília,
to, configurando tal atitude em um processo 2008
amplo e pleno, o que deve constituir a prática PRIETO, Rosângela Gaviole & MANTOAN, Ma-
diária dentro dos “muros da escola”. ria Teresa Egler. Inclusão escolar. São Paulo:
Editora Moderna, 2004.
Portanto as escolas devem preparar-se para SÃO PAULO, Decreto nº 60.075/14; “Programa
um atendimento formativo completo dos indi- Estadual de Atendimento à Pessoa com Defici-
víduos com [SD], quer social, quer formal, in- ência Intelectual: São Paulo pela igualdade de
formando funcionários, professores e alunos direitos”
sobre a síndrome e sobre as possibilidades
que os portadores dela tem em se desenvol-
ver intelectualmente e fisicamente e que esse
desenvolvimento está intimamente ligado às
relações interpessoais saudáveis e favoráveis
ao processo ensino aprendizagem que eles
mantiverem dentro da unidade escolar. Traba-
lho este que vem de encontro ao que tem sido
feito durante já á alguns anos e que com mui-
tas dificuldades, pelo tempo e pela disposição
do atendimento por conta do excessivo e da
sobrecarga de alunos a serem atendidos na UE
e por serem apenas duas Professoras de Apoio
a sala de recurso, tem sido feito de tudo para
que seja modificado este quadro preconceito
e muitas vezes de diferença em relação ao ou-
tro, valorizando a inclusão de fato, auxiliando
em todo o processo de formação e construção
dos saberes múltiplos e suas habilidades e
competências.

INEQ - Educação integral 135


A FORMAÇÃO DOCENTE
COMO FERRAMENTA
REFLEXIVA

Simone Maria da Silva Barreto¹

RESUMO cimento expressivo, a fim de que esses educan-


dos alcancem a compreensão do seu valor de ser
O mundo atual passa por constantes transforma- e estar presente como agente transformador no
ções econômicas, sociais, políticas e culturais. meio em que estão inseridos e atuarem de modo
Vivemos um momento histórico marcado pela que outros no seu entorno alcancem essa autono-
internacionalização da globalização e da tecno- mia em seu contexto social, ético, moral e políti-
logia. Ocorre um processo de universalização da co. Assim sendo, formação sempre continua em
cultura, dos produtos, das trocas, dos custos e espaços de aprendizagem, investigação, inova-
do capital. Os novos tempos exigem um padrão ção e troca de saberes é o processo de aperfeiço-
educacional que esteja voltado para o desenvol- amento dos saberes à atividade docente.
vimento de um conjunto de competências e de Palavras-chave: Formação docente; capacitação;
habilidades essenciais, a fim de que os educan- aprendizagem.
dos possam fundamentalmente compreender e
refletir sobre a realidade, participando e agindo no ABSTRACT
contexto de uma sociedade comprometida com o
futuro. Grandes desafios se descortinam a nossa The current world undergoes constant economic,
frente. O maior deles diz respeito à formação que social, political and cultural transformations. We
permitam desenvolver em docentes e discentes, a live in a historic moment marked by the internatio-
confiança nas suas capacidades de criar, de cons- nalization of globalization and technology. There
truir e reconstruir de estimular o pensamento e is a process of universalization of culture, of pro-
senso crítico. ducts, of exchanges, of costs and of capital.
The new times require an educational standard
A luta contra a exclusão social também passa ne- that is geared towards the development of a set of
cessariamente pelo trabalho dos professores. Os essential skills and abilities, so that learners can
professores devem se esforçar para tornarem as fundamentally understand and reflect on reality,
suas aulas mais agradáveis, motivadoras e pra- participating and acting in the context of a society
zerosas. É importante estimular a solidariedade committed to the future . Great challenges unfold
mediante os valores democráticos e éticos. Isso in front of us. The largest of these concerns trai-
significa ouvir o outro; respeitar as diferenças, ning that allows teachers and students to deve-
aperfeiçoar e investir nas técnicas de comunica- lop confidence in their ability to create, build and
ção, indicar formas mais competentes do conhe- rebuild in order to stimulate thinking and critical

1 - Licenciatura em pedagogia e pós-graduação em formação docente. Contato: simaenana@yahoo.com.br.

136 INEQ - Educação integral


thinking. outros processos comunicacionais, tiveram a
The fight against social exclusion also neces- importante função de repassar aquilo que era
sarily involves the work of teachers. Teachers considerado importante. Instigado pela sim-
should strive to make their classes more en- ples imitação ou pelo relato oral, o homem
joyable, motivating and enjoyable. It is impor- conseguiu produzir e difundir as mais variadas
tant to encourage solidarity through democra- maneiras de se relacionar com o mundo que o
tic and ethical values. That means listening to cerca.
the other; to respect differences, to improve
and invest in communication techniques, to Ao percorrer o processo histórico da educação,
indicate more competent forms of expressive pode-se perceber que inicialmente a educação
knowledge, so that these learners can unders- no Brasil era de responsabilidade dos jesuítas,
tand their value of being and being present as passando em seguida a ser de responsabilida-
a transforming agent in the environment in de da coroa portuguesa, após a expulsão dos
which they are inserted and act in a that others jesuítas pelo marquês de Pombal.
in their surroundings reach this autonomy in
their social, ethical, moral and political context. Dessa maneira é possível constatar que a for-
Thus, training always continues in spaces of mação docente tornou-se sólida, porém frágil,
learning, research, innovation and exchange of pois a educação brasileira nesse período ficou
knowledge is the process of improving knowle- sem um ensino de qualidade, já que foram os
dge to the teaching activity. jesuítas que organizaram o nosso sistema de
Keywords: Teacher training; training; learning. ensino.

INTRODUÇÃO No século XIX, ocorreu o surgimento das esco-
las normais, constituiu um passo importante
Com o presente trabalho, começaremos a le- para a evolução do processo de profissionali-
vantar alguns elementos que nos permitam zação e a permissão da entrada das mulheres
refletir sobre a formação do professor e seu na carreira docente. Quanto a esse aspecto,
papel na sociedade contemporânea. Inicial- Nóvoa (1995), afirma que a afirmação profis-
mente, citaremos um breve histórico sobre a sional dos professores é repleta por lutas e
profissão onde apresentaremos os impactos conflitos, já que muitos dos problemas vividos
que a sociedade da informação, da comuni- hoje na educação, tem suas raízes nos proble-
cação e do conhecimento traz para a escola e mas enfrentados pela profissionalização do-
para o professor, em seguida, apontaremos o cente ao longo de sua história.
perfil do professor reflexivo como possibilida-
de para o profissional docente exercer o papel A necessidade de se colocar pessoas específi-
que atualmente se espera dele e, por último, o cas para o ensinamento de certas habilidades
envolvimento crítico como condição para que já aconteceu no Antigo Egito, quando a função
o professor possa desempenhar adequada- de escriba era preservada pela constituição de
mente a sua função. escolas reais que preparavam o indivíduo para
dominar essa técnica. No Ocidente, as institui-
Ensinar é muito anterior ao processo de cria- ções de ensino variavam bastante de acordo
ção das primeiras instituições educadoras da com os valores que predominavam em certa
humanidade. Antes mesmo que a escrita fos- cultura.
se desenvolvida, a oralidade, em conjunto com

INEQ - Educação integral 137


Entre os espartanos, a educação começava de ser o centro que agora visa o educando e
aos sete anos de idade e se preocupava com mesmo a escola, ainda hoje permanecendo
o aprimoramento das habilidades físicas do como a responsável pela sistematização do
indivíduo. A dura rotina de treinos físicos era conhecimento, é formada por um corpo docen-
mantida com o objetivo de fazer com que os te que nem sempre recebe a devida atenção no
homens estivessem prontos para a guerra e as sentido de garantir melhores condições para
mulheres aptas para gerar crianças saudáveis. exercício da profissão., de tal maneira que a
Além disso, cada criança era mantida por um formação adequada que prepare para essas
tutor que desempenhava a função por vínculo mudanças bem como a valorização dos pro-
de amizade. fessores tem sido um desafio.

No período medieval, o mundo do conhecimen- Assim, analisando o passado, e olhando para o


to passou a ter um nítido controle das institui- presente dos professores, percebemos oscila-
ções religiosas cristãs. Inicialmente, o conhe- ções na formação docente, suas fragilidades,
cimento ali presente ficava somente restrito seus limites e possibilidades. Portanto, a afir-
aos próprios membros e aspirantes da Igreja. mação do professor enquanto profissional, é
um percurso repleto de lutas e de conflitos, de
Na Baixa Idade Média, tal situação mudou com excitações e de recuos (NÓVOA, 1995. p. 21).
a constituição das primeiras universidades.
Até o século XIX, nenhum curso era elaborado Pode-se perceber que o professor, no exercício
com o objetivo de formação de professores. de sua profissão, procura favorecer em seu tra-
balho, uma construção coletiva para melhorar
No Brasil, o domínio clerical às instituições de a qualidade da educação e adaptá-la melhor as
ensino findou depois que o Marquês de Pom- especificidades dos educandos. Diante disso,
bal expulsou os jesuítas da colônia. Após tal é possível conhecer que foram vários os fato-
medida, a própria Coroa designava quem po- res e caminhos que levaram a crescente des-
deria exercer funções pedagógicas. caracterização da função do professor e sua
consequente desvalorização.
A profissionalização do educador brasileiro
começou a ser desenhada em 1835, quando a 1. O papel do Professor na sociedade da infor-
primeira escola de educadores foi criada na ci- mação
dade de Niteroi, no Rio de Janeiro. A profissão
docente já foi muito conceituada pela socieda- De acordo com as Diretrizes Curriculares, exis-
de, uma vez que o professor era o centro da tem certos domínios que são indispensáveis
escola, detentor do conhecimento. Hoje vive- ao exercício da docência, entre eles: o conheci-
mos numa sociedade marcada pelos avanços mento da escola como organização complexa,
científicos e tecnológicos, e em meio a tantas cuja função é formar para a cidadania; a pes-
mudanças sociais mudou-se significativamen- quisa e a aplicação dos resultados de investi-
te essa percepção da sociedade em relação a gações dentro da área de atuação; a participa-
profissão docente. ção na gestão, organização e funcionamento
de sistemas e instituições de ensino.
Em decorrência disso, os profissionais da edu-
cação tiveram que se adequar para atender às Além disso, é fundamental que o professor sai-
exigências da sociedade moderna deixando ba elaborar, orientar e avaliar propostas (inter-

138 INEQ - Educação integral


pretar e reconstruir o conhecimento), transpor nhecimento, seja na produção, na transmissão,
os saberes específicos de suas áreas de co- na crítica ou na sua reformulação.
nhecimento e das relações entre essas áreas,
na perspectiva da complexidade, conhecer e Vivemos numa sociedade complexa, bombar-
compreender as etapas de desenvolvimento deada por uma avalanche de informações, na
dos estudantes com os quais está lidando. qual os meios de comunicação exercem um
poder esmagador, uma vez que:
O documento aponta outras competências que
o professor na atualidade deve dominar: traba- [...] as mensagens que neles passam
lhar em equipe; compreender, interpretar e apli- apresentam uma miríade de valores, uns
car a linguagem e os instrumentos produzidos positivos outros negativos, de difícil dis-
ao longo da evolução tecnológica, econômica cernimento para aqueles que, por razões
e organizativa; utilizar conhecimentos cien- várias, não desenvolveram grande espí-
tíficos e tecnológicos, em detrimento da sua rito crítico, competência que inclui o há-
experiência em regência, despertando-lhes a bito de se questionar perante o que lhe é
curiosidade. oferecido. (ALARCÃO, 2010, p. 14)

Apesar dos documentos oficiais já terem atua- Num momento de aceleradas e intensas trans-
lizado o discurso sobre o atual papel do profes- formações, de fragmentação e incerteza, no-
sor e por mais eficaz que tenha sido a forma- vas e complexas habilidades e competências
ção inicial, competências complexas como as são requeridas. Na sociedade da informação,
sugeridas pelas Diretrizes, ou mesmo outras habilidades como selecionar e processar in-
apresentadas em listas diversas, não são de- formação, capacidade para tomar decisões,
senvolvidas em nível excelente apenas através trabalhar em equipe, polivalência, flexibilidade,
das noções básicas adquiridas na graduação etc., são valorizadas, ficando excluídas da pro-
ou na especialização do mestrado ou doutora- dução e consumo de bens e serviços, materiais
do, mas através da experiência refletida por um e simbólicos, as pessoas que não as possuem.
programa rigoroso de formação continuada. (FLECHA e TORTAJADA, 2000).

Perrenoud (2002) ressalta a importância da Entre as competências necessárias para o


formação institucionalizada (tanto a inicial exercício efetivo da cidadania na sociedade
como a continuada), defendemos que cabe contemporânea, está a capacidade de utilizar
principalmente ao profissional da educação a informação eficazmente, ou seja, de modo
assumir e gerenciar sua própria formação. rápido e flexível, fazendo emergir problemas
relacionados ao acesso, avaliação e gestão
2. A Sociedade da informação, a Escola e o das informações, além da organização e ati-
Professor vação dos conhecimentos. Estes processos
Como consequência do desenvolvimento da pressupõem não só a competência para tratar
ciência moderna e da tecnologia a sociedade a informação, mas também com os meios (no
vem se transformando de modo acelerado, mundo atual, principalmente as tecnologias de
principalmente a partir do final do século XX. informação e comunicação) que a fazem cir-
As mudanças decorrentes das novas tecnolo- cular.
gias da informação e comunicação vêm esta-
belecendo novas maneiras de lidar com o co- No mundo de hoje, como diz Alarcão, o valor

INEQ - Educação integral 139


não está “na capacidade de seguir instruções “requer uma rápida e flexível mobilização dos
dadas por outros para fazer funcionar as má- conhecimentos e a sua utilização competente,
quinas, mas sim na capacidade de transformar só possível para quem tenha tido uma forma-
em conhecimento a informação a que, gra- ção nesse sentido.” (ALARCÃO, 2010, p. 21).
ças às máquinas, temos um rápido acesso.”
(ALARCÃO, 2010, p. 18). Diante de tal perspectiva, pergunta-se que tipo
de sociedade o país quer construir. Um país
Em tal contexto, a educação, enquanto pro- que despende exorbitantes valores em ações
cesso que proporciona acesso aos meios de cujo recursos financeiros são fartos, ignoran-
informação e produção, torna-se um elemen- do-se critérios de contenção de gastos, quan-
to fundamental para o exercício da cidadania, do se trata de uma pequena reforma em es-
pois, “além de facilitar o acesso a uma forma- tabelecimento de ensino, cujas dependências
ção baseada na aquisição de conhecimentos, permanecem por décadas sem assistência e
deve permitir o desenvolvimento das habilida- sem recursos para reformas, em um colégio
des necessárias na sociedade da informação.” público em ruínas, a palavra de ordem é que é
(FLECHA e TORTAJADA, 2000, p. 24). necessário respeitar a lei da “responsabilidade
fiscal”. Nunca existe dinheiro para se investir
Na era da informação e da comunicação, nem em educação e em tecnologia. É notório que
a escola detém o monopólio do saber, que pas- os homens públicos não encaram a educação
sa a ser também compartilhado pela mídia, como investimento.
nem o professor é apenas transmissor de in-
formações, mas, ao contrário, deve ser um me- A desvalorização da profissão docente não
diador, um decodificador, um crítico da cultura, afeta apenas o professor como profissional
ajudando os educandos a serem capazes de em sua individualidade, afeta todo o futuro da
transformá-las (as informações) em conheci- nação, na medida em que, se a carreira docente
mento pertinente. não é atraente, não irá atrair os melhores talen-
tos, que disputariam uma vaga em concurso
Na sociedade da informação, onde os estudan- público que ofertassem salários convidativos,
tes são o tempo todo bombardeados por uma ao contrário, com o ensino, cada vez menos va-
enxurrada de informações, o papel do profes- lorizado, cada vez mais estigmatizado, já não
sor, portanto, antes de ser um mero transmis- há estímulos para os jovens abraçarem essa
sor de informações, seria: carreira que, assim, cai no obscurantismo.

[...] o de selecionar a informação, orga- É mister repensar valores, bem como, a reva-
nizá-la segundo os instrumentos que lhe lorização da carreira docente, porque, do con-
dão acesso, articular a escola com os de- trário, estaremos caminhando rumo a um país
mais sistemas de informação, abrir espa- que priva seus cidadãos do direito subjetivo a
ços para reflexão, a crítica e a criativida- uma educação digna.
de dos educandos que, evidentemente,
deixariam a atitude passiva de simples 3. O percurso histórico da construção do saber
‘ouvintes’ de preleções. (ARANHA, 2006, sob a perspectiva construtivista
p. 296)
Os saberes são construídos na gênese da hu-
A transformação social em curso, por sua vez, manidade, então quais são as maneiras intro-

140 INEQ - Educação integral


dutórias da aquisição da linguagem escrita e O aprendizado acontece de forma fragmenta-
o segmento de conceptualização decorrentes da, diferenciando texto, imagens e caracterís-
do aparato de enfrentamento de ideias origina- ticas textuais. Contudo, no espaço escolar te-
das do indivíduo e a veracidade do desígnio da mos de trabalhar a junção desses elementos,
compreensão de si e do outro. Primeiramente com a finalidade de realizar o entendimento
deve analisar a trajetória que os pequenos per- textual eficaz. A constituição da grafia aconte-
correm a ser leitores, na percepção do estudo ce com a junção de 3 grafias ao mínimo, por
das mentes, psicogenético, anterior ao enten- não ser possível ler com poucas palavras.
dimento do procedimento em si, pois, segundo
Ferreiro e Teberosky (1999, p. 275): [...] que a legibilidade de um texto apa-
reça associada a uma exigência de
[...] ainda relatam que é evidente que a quantidade é uma hipótese construída
criança não compartilha conosco, os pela criança, cujo caráter endógeno fica
adultos, os conhecimento de que a escri- demonstrado pelo fato de que nenhum
ta é ‘linguagem escrita’. Isto é não supõe adulto pode tê-lo ensinado e porque em
que representa a linguagem ainda que qualquer texto escrito aparecem anota-
se interprete como a expressão visual ções de uma ou duas letras. (FERREIRO
de significados diferenciados. É por isso & TEBEROSKY, 1999, p. 277)
que a criança passa da imagem ao texto
e desde àquela sem modificar a interpre- Concomitantemente, considera a variedade de
tação, porque ambos formam uma uni- tipos de escritas e a estabelecer diferenças
dade e juntos expressam o sentido de entre grafias-letras, grafias-números e grafias
uma mensagem gráfica. que acompanham as letras, ou seja, as carac-
terísticas específicas da escrita se convertem
O educando entende a transposição do texto em observações ao mesmo tempo em que se
escrito para a produção textual manter sua es- incorporam como variáveis necessárias dentro
trutura, mesmo que seja um desenho, porém do sistema. Segundo Ferreiro, 1989,
saber que esse percurso em alguns casos po-
dem ser diferentes é um desafio. Nesse mo- [...] enquanto o olhar é uma ação implí-
mento compete ao professor com habilidade cita a atividade de ler, a recíproca não é
eternizar tais características. Embasados na verdadeira. Para ler é necessário olhar e
concepção de Ferreiro e Teberosky, (1999, p. algo mais não está definido senão pelo
275): ler em si, mas cujos índices exteriores po-
dem ser direção ou tempo de fixação do
Pensar que a escrita representa os “no- olhar. Fazer então esta distinção supõe
mes” não é ainda concebê-los como a ter aceitado a leitura silenciosa como o
expressão gráfica da linguagem; porém, ato de leitura e outra das distinções são
é um passo importante nessa direção. relativos à diferença entre contar e ler ou
A escrita se constitui como registros de explicar e ler.
nomes que servem como identificação
do objeto referido: espera-se encontrar Na atual fase há a necessidade de realizar
no texto tantos nomes quanto objetos discernimento entre teoria sobre os valores
existam na imagem. assimilados pelas crianças, sendo de origens
alheias, em decorrência das intervenções ex-

INEQ - Educação integral 141


ternas, das características pessoais e da sua dimento do conteúdo da leitura.
cultura. Sendo assim, há uma cobrança extre-
ma da criança para adquirir o conhecimento da O ato da leitura em voz alto é complexo por en-
escrita na sua forma lógica, pensamento e na volver primeiramente a compreensão do texto
forma sistema, construção. lido e em seguida retratar, nossa ortografia
Ferreiro e Teberosky, 1999, pág. 282, acrescen- não é fácil de ser decifrada por estrangeiro ou
ta, quem não esteja habituado a ela, assim enten-
der a escrita enquanto pequeno é primordial
[...] assinalamos reiteradamente, no de- para construção de textos coesos na juventu-
correr da análise de dados, como as de.
crianças, obedecendo a certas regras
que elas mesmas deram, são coerentes Se compreendemos que o cérebro é o
até as últimas consequências [...] órgão humano de processamento da in-
E formação; que é o cérebro não é prisio-
neiro dos sentidos, mas que controla os
Torna-se claro que a ordem de resolução órgãos sensoriais e seletivamente usa
de problemas que a criança constrói é o input que deles recebe; então não nos
muito semelhante a uma programação surpreenderá que o que a boca diz na lei-
ideal. Com efeito, a criança começa por tura em voz alta, não é o que o olho viu
tratar de diferencial o gráfico-econômico mãos o que o cérebro produziu para que
do gráfico não icônico, antes de tentar a boca diga. (FERREIRO & TEBEROSKY,
fazer diferenciações no interior deste úl- 1999, p. 319)
timo conjunto.
O legado da educação aos educandos dá-se
Apenas quando assimilarem os motivos para por meio da leitura, o qual irá utilizar na sua
repudiar as possibilidades silábicas, passarão vida inteira, em nossa rotina diária, lemos mui-
para fase fonética e exclusivamente quando to mais do que escrevemos, assim deveria ser
se entender a condição da escrita própria em dado mais ênfase a produção de texto na dis-
relação ao sistema alfabético conseguem atin- ciplina de língua portuguesa aliada a outras
gir as problemáticas de ortografia. O ato de ler áreas em decorrência da interdisciplinaridade,
não representa a nossa fala transcrita, trata do desde as séries iniciais, além de lhes possibi-
percurso individual a maturidade na aptidão da litar o acesso a variadas produções textuais,
língua verificada na elaboração da fala natural. mesclando com resoluções de problemas, pois
Segundo Cagliari, o educando apoia entende que sua compreen-
são textual ocorre apenas nas aulas de portu-
[...] o esforço da criança que começa a ler guês e devemos descontruir esse equívoco.
é comparável ao esforço que um apren- Ferreiro e Teberosky (1999, p. 342), destacam
diz de língua estrangeira faz para ler. É di- que um dos problemas contemporâneos aos
fícil conciliar os elementos fônicos com anteriores, é a distinção entre ler e olhar, e
os elementos semânticos. É o fato do mais, geralmente, entre as ações específicas e
conhecimento comum que as crianças não específicas com relação ao um texto. Fer-
têm dificuldades para realizar uma leitu- reiro e Teberosky (1999, p.380),
ra fluente, além de apresentarem dificul-
dades específicas com relação ao enten- [...] é extremamente surpreendente ver

142 INEQ - Educação integral


como a progressão de hipótese sobre dia novas leituras do mundo. Cada descober-
a escrita reproduz algumas das eta- ta cria possibilidades para novas descobertas,
pas-chaves da evolução da história da cada momento implica em novos conhecimen-
mesma na humanidade, apesar de que tos, cada leitura abre novas leitura de mundo.
nossas crianças estejam expostas a um
único sistema de escrita”. As aprendizagens do ser humano ocorrem
com suas vivências e sua realidade, ou seja,
Um dos motivos do fracasso nas séries iniciais sofre influência externa do meio onde vive.
dá-se pelo fato do professor não envolver os Cabe ao docente aproveitar essa oportunidade
alunos em seu planejamento, assim posto, ao para promover excelente trabalho com os alu-
refletir sobre o conteúdo ministrado e a forma nos e desenvolver suas capacidades. Portanto
a ser trabalhada, deve vislumbrar a bagagem o educador precisa agir de modo diferente, a
que eles possuem. Perrenoud, (2000, pág. fim de exercitar a escrita promover leitura de
100), texto diária. A leitura é como uma música que
para ser memorizada deve ser ouvida constan-
[...] que antes de ser uma competência temente e por meio dela ocorre a representa-
ligada a conteúdos específicos, precisa ção do diálogo dos nossos alunos e nesse con-
envolver os alunos em atividades de pes- texto o professor é simplesmente testemunha
quisa e em projetos de conhecimento é do processo construtivo.
capacidade fundamental do professor.
Tornar acessível e desejável sua própria 4. Educar na Contemporaneidade
relação com o saber e com a pesquisa.
“Não há docência sem discência, as
Torna-se cada vez mais necessária a utilização duas se explicam e seus sujeitos, ape-
das múltiplas linguagens, bem como, ouvir as sar das diferenças que os conotam,
devolutivas de todos os alunos, enquanto o não se reduzem à condição de objeto,
docente inicia as intervenções relacionando um do outro. Quem ensina aprende
o conteúdo já dado com as informações pes- ao ensinar e quem aprende ensina ao
quisadas.É notório que a escola deve acompa- aprender. Quem ensina ensina algu-
nhar a evolução do mundo, mas ela também ma coisa a alguém. Por isso é que,
tem o dever de validar a tradição cultural, so- do ponto de vista gramatical, o verbo
cial de diferentes grupos. É óbvio que a com- ensinar é um verbo transitivo-relativo.
preensão não é igual para todos, mas quando Verbo que pede um objeto direto – al-
não se entende algo que julga importante sa- guma coisa – e um objeto indireto – a
ber, a criança lê um texto e depois responde a alguém.”
um questionário, que já veem pronto no livro (Paulo Freire)
mecanizando a aprendizagem.
De acordo com Paulo Freire, ser professor sig-
A construção do conhecimento ocorre em res- nifica ter um compromisso constante com as
posta à natural exploração da natureza, a es- práticas sociais. E para assegurar esta postura,
sência do homem é a curiosidade. É no explorar cabe ao professor trabalhar com metodologias
e conhecer a natureza que ele explora as suas participativas e desafiadoras, estimulando o
possibilidades e se conhece. Neste processo pensamento crítico dos educandos e formu-
vai construindo o conhecimento. Faz a cada lando hipóteses a respeito do conhecimento

INEQ - Educação integral 143


cientificamente elaborado. desses conceitos/categorias, em políticas e
práticas, pode ser demonstrada pela possibi-
A relação ensino aprendizagem é estabelecida lidade de criar/recriar novas compreensões e/
entre pessoas que interagem e atuam nesse ou ações, buscando manter, todavia, a preci-
processo. O papel do professor atualmente são conceitual e a coerência.
não está apenas relacionado a passar um con-
teúdo em sala de aula, para os educandos ape- Em decorrência das análises realizadas po-
nas decorarem, sem a preocupação de discutir de-se afirmar a importância do paradigma da
ou questionar sobre a informação. formação permanente para pesquisar e propor
soluções para problemas contemporâneos do
Hoje, o professor tem a função de mediar a campo da formação docente, bem como o vi-
construção do conhecimento, auxiliando aos gor e a atualidade desse paradigma enquanto
educandos na transposição dos temas aborda- proposta que supera a crítica sobre a prática,
dos em sala de aula para o cotidiano desses. É porque comprometida com a transformação
o professor que induz o grupo a raciocinar e a social.
comparar, o que foi dito pelo educador durante
a aula, e como se beneficiar dessa informação, A formação continuada como princípio para
integrando-os mais ativamente a sociedade. políticas, programas e práticas de formação
Esse movimento é consequência do desenvol- de educadores pode se constituir em um com-
vimento tecnológico que nos coloca frente a promisso ético a ser assumido por educado-
inúmeras informações nas mais diversas áre- res críticos que desejam romper com o mito da
as do conhecimento, tirando o professor da- neutralidade da educação e com a adaptação
quela posição de centro do saber. dos seres humanos a uma suposta vida em
harmonia em uma sociedade marcada pela
Entretanto, diante de tantos desafios que per- desigualdade. Ressignificar o pensar dentro da
meiam a educação, a formação continuada é linguagem da possibilidade, em que o presen-
que fará a diferença e que permitirá aos do- te e o futuro podem ser criados e recriados, a
centes serem capazes de construir um mundo partir de uma práxis social organizada coleti-
melhor, onde serão valorizados e respeitados. vamente.
Os estudos demonstraram a possibilidade de
que os educadores que participaram de for- Diante disso, o que se pode observar é que o
mações construíssem novos conhecimentos e educador contemporâneo é aquele que busca
uma efetiva disposição para assumir práticas despertar no educando a autocrítica, fazendo
referenciadas no conceito de formação conti- com que o aluno aprenda a ser um sujeito ati-
nuada. vo, expondo suas opiniões sempre que neces-
sário, pois diante das adversidades tanto aluno
A materialização e a reinvenção de aspectos quanto professor devem se adequar ao novo,
da pedagogia social construtivista foram for- tornando – se pesquisadores. Enfim, o papel
temente marcadas pela presença de proposi- do professor contemporâneo se dá como me-
ções e práticas que visavam à construção de diador do conhecimento, facilitador, pesqui-
uma educação problematizadora. sador, flexível e companheiro, a partir dessa
analise se pode afirmar que o seu perfil fica
A materialização e recriação do construtivis- restritamente baseado no método favorável ao
mo social foram evidenciadas pela concretude desempenho educacional, formal, sociável e

144 INEQ - Educação integral


ético do educando. tabelecimento de ensino, cujas dependências
permanecem por décadas sem assistência e
Para tanto, o ato de educar seria oferecer ao sem recursos para reformas, em um colégio
educando meios para que esse possa se de- público em ruínas, a palavra de ordem é que é
senvolver integralmente em todos os aspectos, necessário respeitar a lei da “responsabilidade
adquirindo os pré-requisitos que possibilite a fiscal”. Nunca existe dinheiro para se investir
adaptação e evolução de acordo com as ne- em educação.
cessidades existentes no seu contexto social.
Devemos ressaltar a importância do diálogo É notório que os homens públicos não enca-
em torno da formação de professores, contu- ram a educação como investimento. Por essa
do, com atenção, para não passar a ideia de visão míope, que o administrador público tem
que todos os problemas na educação serão sobre a educação os seus atores seguem à
solucionados, isso seria utopia. margem de todas as demais profissões.

Continuamos com a sensação do colonialismo A desvalorização da profissão docente não


na educação, naquele período, como agora, afeta apenas o professor como profissional
não há interesse em investimentos nesse se- em sua individualidade, afeta todo o futuro da
tor, porquanto, os cidadãos teriam arrancados nação, na medida em que, se a carreira docente
de seus olhos as vendas da ignorância dariam não é atraente, não irá atrair os melhores talen-
lugar ao pensamento crítico, autônomo. tos, que disputariam uma vaga em concurso
público que ofertassem salários convidativos,
Nota-se pelos estudos que a contínua desva- ao contrário, com o ensino, cada vez menos va-
lorização da profissão docente, que se mani- lorizado, cada vez mais estigmatizado, já não
festa não apenas na remuneração aviltante há estímulos para os jovens abraçarem essa
que percebe um professor, se considerarmos carreira que, assim, cai no obscurantismo.
que nenhuma outra profissão tem sobre si a A educação de qualidade não é benesse que
responsabilidade de educar, como compete ao o Estado concede ao povo, é um direito legíti-
professor, que, além de ensinar, deve formar mo de todo cidadão, é obrigação do estado, do
cidadãos. município. O cidadão tem direito a professores
bem remunerados e é dever de cada professor
O professor enfrenta péssimas condições de zelar por sua formação para poderem ofertar
trabalho, salas de aula em que se amontoam um ensino de qualidade.
mais de 50 alunos, superlotação que impede
a realização de um trabalho com qualidade, o É mister repensar valores, bem como, a reva-
que torna o exercício docente improdutivo e lorização da carreira docente, porque, do con-
denuncia uma situação incontestável: vivemos trário, estaremos caminhando rumo a um país
uma inversão de valores na sociedade. que priva seus cidadãos do direito subjetivo a
uma educação digna.
Diante de tal perspectiva, pergunta-se que tipo
de sociedade o país quer construir. Um país CONSIDERAÇÕES FINAIS
que despende exorbitantes valores em ações
cujo recursos financeiros são fartos, ignoran- De acordo com o tema abordado, fica o apren-
do-se critérios de contenção de gastos, quan- dizado em torno do processo de atuação do
do se trata de uma pequena reforma em es- educador no âmbito educacional, tendo ainda

INEQ - Educação integral 145


nesse estudo a base para melhor classificar o sendo revisto, pois, assim como os padrões
papel do docente, que se apresenta, no entan- da sociedade mudam, os métodos e as práxis
to, como, mediador, facilitador, flexível, respon- educacionais devem evoluir na mesma propor-
sável e acima de tudo competente diante das ção de modo a atender satisfatoriamente o
problemáticas e na de alternativa para suas educando diante dos novos contextos sociais.
resoluções.
Quando nos dirigimos à formação docente
Um dos maiores desafios para os docentes e nosso objetivo é que essa qualidade na forma-
da escola contemporânea é aprender a lidar ção sempre presente no espírito do professor
com a tecnologia e transformá-la em aliada da venha garantir ao educando em geral, os seus
educação. Já não é mais plausível negar que direitos de aprendizagens, estamos falando de
os computadores, tablets e smartphones fa- alguém que está numa etapa da vida em que o
zem parte da realidade educacional do século crescimento e o desenvolvimento são grandes
XXI. incógnitas. O educando é um ser em desenvol-
vimento, o que implica uma vivência ativa de
Os professores foram, são e continuarão sen- várias apreensões e não-apreensões.
do mediadores indispensáveis no aprendizado,
o que não descarta a necessidade de aprender Entendemos que o ser humano passa pelo lon-
a lidar com a tecnologia. É preciso transformar go período de dependência conhecido entre as
as ferramentas tecnológicas em potencializa- espécies animais em função da imaturidade de
doras do ensino-aprendizado. Além disso, elas seu sistema nervoso no nascimento, fato que
devem ser usadas como meio e não fim na tem importantes repercussões psicológicas, já
construção do conhecimento. que, nesse período, transcorre e se fundamen-
ta o processo de humanização. O ser humano
Para tanto, os computadores, os dispositivos só se forma como tal na convivência e relação
móveis e a internet são ferramentas parceiras com outros seres humanos, ou seja, através da
do ensino-aprendizagem, utilizadas para a pes- linguagem e da herança cultural. Essa questão
quisa, troca de informações, interação entre tangencia outros campos de conhecimento,
os pares, esclarecimento de dúvidas, leituras não apenas do ponto de vista do aprendizado.
complementares, grupos de estudo. A questão
na escola atual definitivamente não é investir O processo chamado de humanização abarca
em novas tecnologias, mas em como saber questões inerentes à realidade psicossocial de
aplicá-las para tornar o aprendizado interes- todo ser humano, que não podem ser resolvi-
sante e motivador. das, mas apenas vividas como pares conflitan-
tes: dependência-independência, preservação-
Com este artigo, foi possível apresentar o perfil -destruição, amor-ódio, narcisismo-socialismo,
do educador que seja capaz de promover situ- masculinidade-feminilidade entre outras.
ações pertinentes e favoráveis a consolidação
do processo de aprendizagem do educando Por serem conflitantes, acompanham-se de
que deve se dar por meio da interação edu- angústias desde o início da vida. Em relação a
cando, conteúdo e professor, pois essa tríplice isso, uma das mudanças teve um significado
forma a base da construção do conhecimento. especial: a cidadania, um dos princípios da es-
Enfim, o papel do professor diante do cenário cola é garantir que o educando conheça seus
contemporâneo, deve constantemente estar deveres e direitos e os exerça em plenitude,

146 INEQ - Educação integral


sabendo ser e estar como agente transforma- gens e Auto-|Imagens. Petrópolis, Rio de Janei-
dor e cidadão do meio em que está inserido. A ro. Vozes, 2000.
cidadania significa escolha, significa participa-
ção, renda decente, mobilidade e a aquisição BRASIL. Secretaria de Ensino Fundamental.
do saber legitimado pela sociedade. Parâmetros Curriculares Nacionais; Língua
Portuguesa. Brasília, 1997.
Com a americanização da vida moderna, a ex- ESTEVE, José M. (1995). Mudanças sociais
periência se espalhou, embora mitigada por e função docente. IN: NÓVOA, António. Pro-
tradições institucionais e culturais muito dife- fissão Professor. Porto. Porto Editora. 1995.
rentes. Cada vez mais as pessoas em um mun- (p.93-124).
do globalizado/industrializado preferem con- FERREIRO, Emília. Alfabetização em processo.
tar com sua própria capacidade de progredir, São Paulo: Editora Cortez, 1989.
ao invés de acreditar nas promessas de refor- ______. & TEBEROSKY, Ana. A psicogênese da
mas, para não dizer revolução, de movimentos língua escrita. Porto Alegre: Artmed, 1999.
culturais e institucionais, como temos visto há FLECHA, R: TORTAJADA,I. Desafios e saídas
pouco no cenário político nacional, influências educativas na entrada do século. IN: IMBE-
negativas empesteiam nosso país. RION, F. A Educação no século XXI: os desafios
do futuro imediato. Porto Alegre: Artmed, 2000
Esse problema representa o resultado involun- NÓVOA, A. (1995). O passado e o presente dos
tário, mas também inevitável, da história dos professores. Porto. Porto Editora. (p.13-34).
direitos do cidadão. Mais uma vez, a moderni- PERRENOUD, Philippe. Dez n o v a s
dade gerou contradições que serão a ordem do competências para ensinar. Philippe
dia no futuro. Perrenoud; trad. Patrícia Chittoni Ramos. Porto
Isso não foi facilitado por um dilema paralelo Alegre: Artes Médicas Sul, 2000.
de estrutura formal de ensino. Embora todo ______. A prática reflexiva no ofício de profes-
problema social seja, em última análise, um sor. Porto Alegre: Artmed, 2002.
problema para o sujeito, qualquer resposta pú- ______. Pedagogia diferenciada das intenções
blica e legal a ele tende a ser geral. à ação. Philippe Perrenoud, trad. Patrícia Chit-
toni Ramos, Porto Alegre: Artes Médicas Sul,
Não se pode pensar em política educacional 2000.
sem burocracia, mas a instalação das burocra-
cias do estado apresenta todo tipo de conse- Formação docente disponível em:
quências involuntárias. http://www.scielo.br/pdf/er/n61/1984-0411-
er-61-00019.pdf acesso em 03/01/2018
No fim das contas, os educandos sentem que https://www.webartigos.com/artigos/o-pa-
não passam de números num jogo que não pel-do-professor-no-mundo-contempora-
lhes pertence, onde o capital humano e cultu- neo/124866#ixzz537CUabKY acesso em
ral nem sempre são devidamente valorizados. 03/01/2018

REFERÊNCIAS

ALARCÃO, Isabel. Professores reflexivos em


uma escola reflexiva. 7. Ed. São Paulo: Cortez,
2010.ARROYO, Miguel G. Oficio de Mestre: Ima-

INEQ - Educação integral 147


O LÚDICO COMO RECURSO
PEDAGÓGICO PARA O
ENSINO/APRENDIZAGEM
SIGINIFICATIVA
Vanda Ramos Mesquita¹

RESUMO possibilidades de melhora do ensino, abrindo um


novo caminho no campo da aprendizagem e da
O presente artigo aborda as contribuições do lúdi- transmissão do saber.
co para o ensino-aprendizagem em relação à emo- Palavras Chave: Lúdico. Ensino/Aprendizagem.
ção e cognição. Em suma, as emoções precisam Emoção. Educação.
fazer parte das experiências de aprendizagem de
qualquer estudante, pois a integração efetiva e efi- ABSTRACT
ciente só se estabelece quando a emoção e a cog-
nição estão em perfeita sintonia. A pesquisa des- This article addresses the contributions of play-
creve questões que permeiam a prática de ensino fulness to teaching-learning in relation to emotion
tendo como objetivo principal considerar a impor- and cognition. In short, emotions need to be part
tância do lúdico para o ensino/aprendizagem dos of any student's learning experiences, as effective
alunos, valorizando a integração do conhecimento. and efficient integration is only established when
Nesse sentido, importa propiciar ao educador uma emotion and cognition are in perfect harmony. The
reflexão acerca da prática pedagógica, pois ela research describes issues that permeate the prac-
desperta o indivíduo para um mundo prazeroso e tice of teaching with the main objective of conside-
satisfatório que facilita a aprendizagem e também ring the importance of playfulness for the teaching
a socialização do mesmo. A interação entre os as- / learning of students, valuing the integration of
pectos afetivos e cognitivos, assim, como promo- knowledge. In this sense, it is important to provide
ção da interação e comunicação social conferem the educator with a reflection on the pedagogical
caráter significativo à aprendizagem. A atual estru- practice, as it awakens the individual to a pleasant
tura educacional deve ser reestruturada para criar and satisfying world that facilitates learning and
novas possibilidades de educação que o momento also socializing it. The interaction between affec-
histórico exige e pela possibilidade de oferecer in- tive and cognitive aspects, as well as promoting
teração e sociabilidade entre os alunos das refe- interaction and social communication, gives a
ridas aulas a fim de promover o desenvolvimento significant character to learning. The current edu-
global do aluno. A metodologia utilizada foi à pes- cational structure must be restructured to create
quisa bibliográfica com a abordagem qualitativa, new educational possibilities that the historical
metodologia escolhida por ser a que melhor cor- moment demands and the possibility of offering
responde aos objetivos deste trabalho. Concluiu- interaction and sociability between students of the
-se que o lúdico contribui para mudar e ampliar as referred classes in order to promote the student's

1 - Professora de Educação Infantil e Ensino Fundamental. Graduada em Pedagoga e Pós-Graduada em Psicopedago-


gia. ramosmesquitavanda@gmail.com

148 INEQ - Educação integral


global development. The methodology used atividade lúdica estimula a representação e a
was the bibliographic research with the qualita- expressão de imagens que evocam aspectos
tive approach methodology chosen because it da realidade. Com isso, o aluno aprende a se
is the one that best corresponds to the objecti- conhecer e atuar no mundo que a rodeia.
ves of this work. It was concluded that the play- Este artigo tem como objetivo principal contri-
ful contributes to change and expand the pos- buir e enriquecer a premência emergencial no
sibilities of improving teaching, opening a new que diz respeito ao ensino, através de propos-
path in the field of learning and the transmission tas pedagógicas alternativas que efetivem o en-
of knowledge. sino/aprendizagem.
Keywords: Playful. Teaching / Learning. Emo-
tion. Education. Atualmente, a expectativa que se tem do papel
do professor, é a de que ele intervenha de forma
INTRODUÇÃO ativa e reformule sua prática através de estra-
tégias diferenciadas para atingir o interesse, a
A compreensão dos conteúdos de química, por participação dos alunos nas atividades em sala
exemplo, sempre foi considerada pelos alunos de aula e facilitar a aprendizagem. Envolvendo
como algo muito complicado e sem relação nesse processo educativo, não só seu conheci-
com o cotidiano, e em consequência de disso mento, mas as novas necessidades dos alunos.
muitos perdem o interesse pela disciplina. Des- A educação assim compreendida desencadeia
sa forma faz-se necessário buscar novas estra- um processo reflexivo das relações entre ensi-
tégias de ensino como meio de facilitar o ensi- no/aprendizagem e o agir pedagógico, através
no/aprendizagem de Química. de uma prática educativa que interfira em pos-
sibilidades num misto de ação e aprendizagem.
Neste contexto os jogos lúdicos podem ser
considerados recursos pedagógicos motiva- A pesquisa foi realizada com a análise dos da-
dores em busca de uma aprendizagem signifi- dos de forma qualitativa, que constitui na pers-
cativa. Em uma época em que se valorizam as pectiva de Gil (2014, p.110) “[...] uma proprie-
inteligências múltiplas e aspectos como: cria- dade de ideias, coisas e pessoas que permite
tividade, cooperação, senso crítico e o espírito que sejam diferenciadas entre si de acordo com
empreendedor os jogos podem proporcionar suas naturezas”. Considera-se a abordagem
o desenvolvimento de múltiplas capacidades; qualitativa a mais adequada para responder
desenvolver potencialidades e minimizar limi- aos objetivos propostos, uma vez que procura
tações. centrar a atenção na especificidade, no indivi-
dual, almejando sempre a compreensão dos fe-
Através de jogos lúdicos, o jogador une a von- nômenos estudados.
tade de vencer a necessidade de aprender, e as
regras estabelecidas pelos participantes. Moti- 1. A relação entre aprendizagem e estratégias
vando uma postura de desafio para novas con- de ensino
quistas e aprendizagem. Assim na interação vai
construindo conhecimento progressivamente, Aprender não é só memorizar informações.
reelaborando-os e transformando-os. Contra- É preciso saber relacionar as informações
riando as metodologias passivas, que conside- á realidade, refletir e dar significado a elas.
ram o aluno como mero receptáculo do saber Aprendemos com base em conhecimentos já
e a certeza da absorção do conhecimento. A adquirimos. Essa é a premissa da Teoria da

INEQ - Educação integral 149


Aprendizagem Significativa. Portanto é preciso O professor como mediador do processo deve
diferenciar memória de aprendizagem significa- ajudar ou facilitar os alunos a construir aprendi-
tiva. “A primeira é a capacidade de lembrar algo. zagens significativas e, para tal, precisa atribuir
Já a segunda envolve usar o saber prévio em um sentido pessoal à aprendizagem para que
novas situações, um processo pessoal e inten- os alunos compreendam não apenas o que têm
cional de construção de significados com base de fazer, mas também como e para quê.
na relação com o meio social e físico”. Valada- O mediador avalia as estratégias, seleciona as
res e Moreira (2009, p. 74). mais apropriadas à situação, amplia algumas,
ignora outras, faz esquemas. É por meio desse
Vygotsky (2010, p. 65) esclarece a compreen- processo de mediação que a estrutura cogniti-
são dos processos de interação da atividade va do aluno adquire padrões de comportamen-
humana, as funções mentais superiores, a to que determinarão sua capacidade de ser mo-
mediação simbólica e a elaboração conceitu- dificada.
al. Estas ideias estão relacionadas a sistemas
múltiplos de inteligência, sistemas múltiplos de Dessa forma, a aprendizagem é compreendida
memória e múltiplas funções executivas. Estas como um processo ativo para o qual é funda-
funções cerebrais desenvolvidas no cérebro mental a inter-relação de indivíduos diferen-
adulto. Considerando os aspectos da neuroci- ciados seja por suas origens socioculturais,
ência existem diferenças e características do ou por suas atuações profissionais, na relação
cérebro nas diversas etapas da vida que vão de troca, principalmente em situações formais
solicitar adequações específicas. de ensino considerado como “um aspecto ne-
cessário e universal do processo de desenvol-
Quando falamos em aprendizagem estamos fa- vimento das funções superiores psicológicas,
lando em processos neurais, redes que se esta- culturalmente organizadas e especificamente
belecem; neurônios que se ligam e fazem novas humanas”. (VYGOTSKY, 1988, p. 57 apud DU-
sinapses. E o que entendemos por aprendiza- BOC, 2011. p. 29).
gem? “Aprendizagem, nada mais é do que esse
maravilhoso e complexo processo pelo qual o A aprendizagem é, pois, o processo pelo
cérebro reage aos estímulos do ambiente que qual o cérebro reage aos estímulos do
ativa as sinapses (ligações entre os neurônios ambiente, ativando as sinapses, tornan-
por onde passam os estímulos) as tornando do-as mais “intensas”. Em decorrência,
mais intensas”. (FONSECA, 2016, p. 95). estas sinapses constituem-se em circui-
tos que processam as informações, com
A cada estímulo novo, a cada repetição de um capacidade molecular de armazenamen-
comportamento que queremos que seja con- to destas informações. Esse conheci-
solidado, temos circuitos que processam as mento tem provocado discussões e mu-
informações que deverão ser consolidadas. “A danças no campo pedagógico. (DUBOC.
aprendizagem é, pois, o processo pelo qual o 2011, p.30)
cérebro reage aos estímulos do ambiente, ati-
vando as sinapses, tornando-as mais intensas” Ao saber que o cérebro é uma estrutura moldá-
(LEITE, 2012, p.08). Como seres sociais que so- vel pelos estímulos ambientais e que nele ocor-
mos, precisamos do convívio com as pessoas re aprendizagem, é essencial buscar alternati-
para construir a nossa personalidade e interagir vas que apresente o conhecimento de forma
com o mundo ao nosso redor. que o cérebro aprenda melhor, uma vez que a

150 INEQ - Educação integral


aprendizagem significativa provoca alteração de, iniciativa e autonomia, como também para
na taxa de conexão sináptica e afeta a função a apropriação dos diversos saberes produzidos
cerebral. historicamente pela humanidade”.

Um professor qualificado e capacitado, com Dos dois posicionamentos, têm-se como evi-
método de ensino adequado facilita a apren- dente que a brincadeira, tomada em seus vá-
dizagem e a aquisição de conhecimento. “Cria rios aspectos, pode representar uma fonte im-
novas faces do Aprender, consolida o papel do pulsionadora do processo de desenvolvimento
educador, como um mediador e o aluno como e aprendizagem. Isso ocorre porque o meio
participante ativo do pensar e aprender” (DE- ambiente em que o aluno em desenvolvimento
LORS, 2005, p. 95). (cognitivo, social, afetivo, etc.) se encontra em
constante expansão e a quantidade de objetos
Nessa perspectiva, é importante que os jo- que não domina a desafia como um problema.
gos pedagógicos não sejam utilizados apenas Dessa forma, pode-se depreender que há tam-
como um único método para transmissão de bém na brincadeira uma importância do desen-
uma determinada temática, mas sim como ins- volvimento para aquisições mais elaboradas
trumentos de apoio, constituindo elementos como as intelectuais. Conforme Oliveira ao afir-
úteis no reforço de conteúdos já apreendidos mar que:
anteriormente.
Muitas das dificuldades apresentadas pe-
Ao utilizar o lúdico como recurso pedagógico, los alunos podem ser facilmente sanadas
deve-se ter presente que na construção do co- no âmbito da sala de aula, bastando para
nhecimento o aluno apropria-se da realidade isto, que o professor esteja mais cons-
atribuindo-lhe significado. Assim, educandos ciente de sua responsabilidade como edu-
com dificuldades de aprendizagem podem atra- cador e despenda mais esforço e energia
vés de jogos como recurso facilitar a compre- para ajudar a aumentar o potencial motor,
ensão espontânea dos conteúdos em relação à cognitivo e afetivo do aluno. Assim sendo,
disciplina. Em síntese, as brincadeiras expres- devemos estimular os jogos como fonte
sam possibilidades de uma pedagogia diferen- de aprendizagem. (OLIVEIRA, 2007, p.96.)
ciada das normalmente aplicadas, permitindo
ao professor criar e gerir situações de aprendi- Em âmbito educativo a aplicação de um progra-
zagem mais condizentes com as atuais condi- ma que estimule a aprendizagem, especialmen-
ções educacionais. te por meio do jogo, permite aos educandos
prosseguirem nas etapas da própria evolução
Tendo este postulado como base, (KISHIMOTO, de maneira mais harmoniosa facultando aos
2006, p. 120) esclarece que a brincadeira é ati- educadores guiá-la na maturação emocional.
vidade objetiva que constitui a base da percep- O aluno saberá aproveitar o jogo e aventurar-se
ção que a criança tem do mundo e dos objetos nele de maneira autônoma, saberá desenvolver
humanos, motivo pelo qual ela própria é quem espontaneamente os jogos e, por meio deles,
determina o conteúdo lúdico. satisfazer as próprias necessidades (MACEDO,
2010, p. 91).
Para Piaget, (2008, p.102) “o lúdico é uma ferra-
menta pedagógica que exerce uma função fun- É nesse contexto que (BETTELHEIM, 1988, p.
damental para o desenvolvimento da criativida- 141) afirma que o homem só é homem de fato

INEQ - Educação integral 151


quando brinca. Ou seja, a brincadeira está pre- linguagem dos conteúdos adquirindo com mais
sente em todas as fases da vida dos seres hu- facilidade conhecimentos básicos para a apren-
manos, pois de alguma forma ela se faz presen- dizagem de outros conceitos (MATIAS e NASCI-
te e torna-se um ingrediente indispensável no MENTO, 2017, p. 454)
relacionamento entre as pessoas, dando-lhes
a possibilidade de fazer com que a criatividade A partir do jogo lúdico os professores
aflore. É nesse escopo que se defende a me- podem entender a existência de uma dis-
todologia em que o brincar é a ludicidade do tância entre a química teórica e os conhe-
aprender. cimentos sobre a química presente nos
saberes populares, mas mesmo havendo
Tomando-se como assertiva que a criança essa distância esses conhecimentos não
aprende enquanto brinca e que por meio da devem ser desprezados e sim incorpo-
brincadeira a criança envolve-se no jogo e sente rados aos conhecimentos ministrados
a necessidade de partilhar com o outro, enten- pelos educadores. É dessa forma que o
de-se que, ainda que em postura de adversário, lúdico entra como ferramenta importante
o indivíduo está aprendendo a se relacionar. E na assimilação dos conhecimentos teó-
esta relação expõe as potencialidades dos par- ricos e os conhecimentos presentes nos
ticipantes, afeta as emoções e põe à prova as saberes popular. (MATIAS e NASCIMEN-
aptidões testando limites. TO, 2017, p. 454)

Em se tratando diretamente da educação for- Entende-se que é por meio do lúdico que os
mal, os jogos podem ajudar na abordagem de alunos passam a compreender e a utilizar con-
temas transversais e desenvolver o raciocínio venções e regras que serão empregadas no
verbal, numérico, visual e abstrato, incentivar o processo de ensino/ aprendizagem de Química
respeito às pessoas e culturas, estimular a me- e tal compreensão favorece a integração deles
lhor aceitação de regras e, por fim, possibilitar num mundo social proporcionando ainda as pri-
ao aluno o aprendizado acerca da resolução meiras aproximações com futuras teorizações.
de problemas ou dificuldades, estimulando-o a
procurar alternativas. O uso do lúdico na educação prevê principal-
mente a utilização de metodologias agradáveis
Dessa maneira, “na brincadeira, mediante a ar- e adequadas aos alunos que façam com que o
ticulação entre o conhecido e o imaginado, de- aprendizado aconteça de forma dinâmica, agra-
senvolve-se o autoconhecimento descobre-se dável e natural de fazer, que respeitam as ca-
até onde se pode chegar e o conhecimento dos racterísticas próprias dos discentes: interesse
outros, o que se pode esperar e em quais cir- e esquemas de raciocínio próprio. E haveria ou-
cunstâncias” (VALADARES e MOREIRA, 2009, p. tras coisas que as interessassem mais do que
48). a brincadeira?

No ensino de química, por exemplo, os jogos de Muitos educadores concordam que o jogo é
modo geral podem e devem ser empregados importante para a educação, pois todos reco-
como recursos para aprendizagem de concei- nhecem mesmo aqueles que habitualmente
tos. O uso de jogos na prática pedagógica tem não lidam com crianças, que o “brincar” é parte
como objetivo, em alguns casos, possibilitar ao integrante do dia a dia delas. A diferença entre
aluno uma nova forma de se familiarizar com os educadores é que para alguns o jogo, a brin-

152 INEQ - Educação integral


cadeira fica muito bem quando a “parte séria” teração é contraria as metodologias passivas,
acaba o que quer dizer: vamos estudar fazer as que consideram o aluno como receptor do sa-
tarefas e quando tudo estiver pronto, vocês es- ber e a certeza da absorção do conhecimento
tarão “livres para brincar”. fica meio nebulosa.

Mas para outros educadores o jogo mescla-se Os jogos constituem admiráveis instituições
dentro do processo de ensino e aprendizagem, sociais. Quando o professor diz “agora iremos
isso quer dizer que o jogo é parte integrante da fazer um jogo” ou “agora irei contar uma histó-
ação educadora. Quando falamos no assunto ria para vocês” ele já estabelece que seja de-
é natural e procurado. Já nas primeiras séries dicado um tempo determinado para isso e au-
do ensino fundamental começa a polêmica: tomaticamente todos percebem que farão uma
brincar ajuda ou distrai? E quando falamos nas evasão da realidade. Se professor levar o lúdico
demais séries, no segundo e terceiro grau o lú- para dentro da sala de aula, resta perguntar que
dico fica absolutamente esquecido, pois agora vantagens isto trará? E o aprender como é que
todos têm que trabalhar seriamente! fica? Trarão muitas porque além da transmis-
são de conteúdos os jogos podem colaborar na
O curioso é que, nos dias de hoje e nos países formação do indivíduo de forma ampla, propor-
mais adiantados do mundo, os melhores cur- cionando o desenvolvimento intelectual, social,
sos para executivos exploram as atividades lú- afetivo, ético, artístico.
dicas para a apreensão de conceitos e de atitu-
des como: formação de liderança, cooperação Este desenvolvimento pode ser obtido através
e, até, reflexão sobre valores. Certamente o uso de situações comuns decorrentes da aplicação
do lúdico explica-se em programas de treina- de jogos como o exercício da vivência em equi-
mento avançados porque é a melhor forma de pe, da criatividade, imaginação, oportunidades
transmissão de conhecimentos, auxilia no in- de autoconhecimento, de descobertas de po-
teresse, motivação, engajamento, avaliação e tencialidade, formação da autoestima e exercí-
fixação. cios de relacionamento social.
No Brasil começam a surgir bons livros que
Assim, quando falamos em lúdico e no brincar orientam para esta nova ferramenta educacio-
não estamos falando em algo fútil e superficial, nal, mas “montar” uma atividade assim, não é
mas de uma ação que os alunos fazem de for- tão difícil como pode parecer em um primeiro
ma autônoma e espontânea, sem o domínio di- momento. O que precisa é que o educador es-
recionador do adulto. teja realmente convencido de que esta é uma
ferramenta útil e que ele terá vantagens em apli-
Entendemos que utilizar metodologia lúdica, car, precisa ser aquele educador que também
como jogos, e manifestações artísticas, atraia se diverte com isso, que conhece as preferên-
e motive o aluno a participar. Esta participação cias da faixa etária que trabalha.
espontânea faz com que ele se torne conscien-
te do objeto de ensino, objeto que nós educa- CONSIDERAÇÕES FINAIS
dores colocamos ao seu alcance. Desta forma
gerenciamos o aprendizado na medida em que Ao término da pesquisa conclui-se o educador
escolhemos os recursos e o conteúdo que jul- não pode subjugar sua metodologia de ensino
gamos ser importante estar no momento ade- a algum tipo de material porque ele é atraente
quado para o aluno aprender. Esta forma de in- ou lúdico. É necessário um cuidado importante

INEQ - Educação integral 153


da parte do professor, pois, antes de trabalhar REFERÊNCIAS
com jogos em sala de aula, é necessário testá-
-los, analisando e refletindo sobre os possíveis BETTEHEIM, Bruno. Uma vida para seu filho:
erros; assim, terá condições de entender as difi- pais bons o bastante. Tradução Maura Sardi-
culdades que os alunos irão enfrentar. Além dis- nha, Maria Helena Geordane. 11 ed. Rio de Ja-
so, devemos ter um cuidado especial na hora de neiro: Campus, 1988.
escolher jogos, que devem ser interessantes e DELORS, Jacques. Os Quatro pilares da educa-
desafiadores. O conteúdo deve estar de acordo ção. In: educação: um tesouro a descobrir. São
Paulo: Cortez, 2005, p. 89-102.
com o grau de desenvolvimento do aluno. Por-
DUBOC. Maria José Oliveira. Neurociência:
tanto, o jogo não deve ser fácil demais e nem
significado e implicações para o processo de
tão difícil, para que os alunos não se desesti-
aprendizagem. Revista Evidência, Araxá, v. 7, n.
mulem. Outro aspecto relevante do lúdico em
7, p. 25-32, 2011.
sala de aula é o desafio que desperta no aluno
FONSECA, Vitor da. Dificuldades de aprendiza-
gerando interesse e prazer. gem: abordagem neuropsicopedagógica. 5ª ed.
Rio de Janeiro: Wak; 2016.
Com as pesquisas e investigações das últimas GIL, Antônio Carlos. Como elaborar Projetos de
décadas é possível conhecer como a aprendiza- Pesquisa. 9 ed. São Paulo: Atlas, 2014.
gem pode ocorrer de forma eficaz. A neurociên- KISHIMOTO, T. M. Jogos infantis: o jogo, a
cia embasa uma nova teoria da aprendizagem, criança e a educação. 10. ed. Petrópolis: Vozes,
visto que as descobertas conduzem a novas 2006.
abordagens, muito diferentes das que são uti- MACEDO Lino. A teoria de Piaget no Século XXI.
lizadas na maioria das escolas. Esta nova base Pátio (Porto Alegre. 1997), v. 1, p. 58-61, 2010.
de conhecimentos habilita o educador para MATIAS, Felipe da Silva e NASCIMENTO, Felipe
criar novas estratégias de ensino que podem Tavares do. Jogos Lúdicos como ferramen-
melhorar o desempenho dos alunos e a ampliar ta no Ensino de Química: Teoria versus Prá-
ainda mais as atividades educacionais, abrindo tica. Revista de Pesquisa Interdisciplinar, Ca-
uma nova estrada no campo do aprendizado e jazeiras, n. 2, suplementar, p. 452-464, set. de
2017. Disponível em<: file:///C:/Users/7/Down-
da transmissão do saber.
loads/281-1419-1-PB%20(3).pdf. Acesso em
28/09/2019
Compreende-se desta forma que o uso de es-
OLIVEIRA, G. A Transmissão dos Sinais Emocio-
tratégias adequadas em um processo de ensi-
nais Pelas Crianças. São Paulo: Vetor, 2007.
no dinâmico e prazeroso provocará alterações
LEITE, Suely de Fátima Brito de Souza Cala-
que afetam o funcionamento cerebral, de forma bri. Neurociência um novo olhar educacional.
positiva e com resultados satisfatórios. 2012/09. Disponível em http://neuropsico-
pedagogianasaladeaula. html.> Acesso em
Finalmente, conclui-se que o ensino-aprendiza- 27/09/2019.
gem deve ser visto como um processo global VALADARES, J. e MOREIRA, M. A. A teoria da
progressivo e permanente, que precisa de es- aprendizagem significativa: sua fundamenta-
tudos para seu aperfeiçoamento, pois em qual- ção e implementação. Coimbra: Edições Alme-
quer meio escolar sempre haverá diferenças dina. 2009.
individuais, diversidades das condições do am- PIAGET, Jean. O Nascimento da Inteligência na
biente que vêm dos alunos e que necessitam de Criança. 5 ed. Rio de Janeiro: Zahar. 2008.
um olhar diferenciado. VIGOTSKY, L.S.; LURIA, A.R.; LEONTIEV, A.N. Lin-
guagem, desenvolvimento e aprendizagem. 5
ed. São Paulo: Ícone, 1988.

154 INEQ - Educação integral


HIPERATIVOS NA ESCOLA
O PAPEL DO EDUCADOR NO
DESENVOLVIMENTO DOS
ALUNOS COM TDAH
Viviane Bezerra Cavalcanti

RESUMO diagnosing the case can have serious consequen-


ces for the child's development.
Há estudantes que apresentam comportamento Keywords: Hyperactivity; Impulsivity; ADHD.
muito agitado, tomam os brinquedos de seus co-
legas, andam de um lado para o outro e não conse- INTRODUÇÃO
guem ficar muito tempo sentado no mesmo lugar.
Não conseguem terminar as tarefas solicitadas Um dos principais objetivos deste artigo é eluci-
e, em alguns momentos, demonstram atitudes dar a prática pedagógica do educador em sala
agressivas e um comportamento que geralmen- de aula, demonstrar com lidar com o processo
te pode ser confundido com indisciplina, mas na de aprendizagem no dia a dia do estudante com
verdade pode ser uma característica do distúrbio Transtorno do Deficit de Atenção e Hiperatividade
de atenção. Esse distúrbio atinge 5% das crianças (TDAH) . Geralmente os alunos com o transtorno
e adolescentes de todo o mundo: é chamada de tendem a ser reconhecidos com características
Transtorno do Deficit de Atenção e Hiperatividade comportamentais bastantes peculiares. Por um
(TDAH). É muito importante conhecer os sinto- lado esses estudantes mostram-se sempre dis-
mas deste transtorno para a lidar com a situação traídos, como se estivessem sempre pensando
de maneira confiante. A demora em diagnosticar em diversas coisas ao mesmo tempo. No entan-
o caso pode trazer sérias consequências para o to, a função de nosso artigo é procurar esclare-
desenvolvimento da criança. cer de forma simples, pais e professores sobre
Palavras chaves: Hiperatividade; Impulsividade; o que é TDAH, apresentando os tipos diferentes
TDAH. de TDAH e seu tratamento. Além disso, buscare-
mos contribuir com alguns procedimentos meto-
ABSTRACT dológicos que poderão contribuir para um melhor
relacionamento do estudante com TDAH e o am-
There are students who show very agitated beha- biente escolar. .
vior, take their classmates' toys, walk around and
cannot sit in the same place for long. They are 1. Conhecimento científico
unable to complete the requested tasks and, at ti-
mes, demonstrate aggressive attitudes and beha- O TDAH é um transtorno neurobiológico, de ori-
vior that can often be mistaken for indiscipline, gem genética de longa duração, persistindo por
but in fact it can be a characteristic of the atten- toda a vida da pessoa e que tem seu início na in-
tion disorder. This disorder affects 5% of children fância, no entanto, o que ocorre é justamente o
and adolescents worldwide: it is called Attention estimulo de áreas do cérebro o lobo frontal, res-
Deficit Hyperactivity Disorder (ADHD). It is very ponsável por filtrar nossas ações, que no caso
important to know the symptoms of this disorder de pessoas com TDAH, lamentavelmente, não
to deal with the situation confidently. The delay in funciona suficientemente bem, levando, assim, a

INEQ - Educação integral 155


desatenção, a impulsividade e, consequente- c. Hábitos de vida muito estressantes.
mente, à hiperatividade . d. Insegurança emocional da mãe.

Na década de 70, focou-se mais a problemática 1.1 Tipos de TDAH
da desatenção que a hiperatividade, demons-
trando, também que os sintomas tendiam a A Hiperatividade, é uma síndrome com foco
diminuir conforme se dava o amadurecimento principal na atividade motora excessiva, em
do indivíduo, o que possibilitou a extensão da que sua atividade superior é habitual, geral-
investigação ao mundo dos adultos, isso já na mente acompanhada de um deficite de aten-
década de 80. Nos anos 90, passou-se a deno- ção. Temos também o Distúrbio do Deficit de
minar a hiperatividade como distúrbio de defi- atenção sem a Hiperatividade. Nosse caso, o
cit de atenção . indivíduo já nasce com o transtorno e seus sin-
tomas começam a ser mais evidente quando a
As causas do deficit de atenção e hiperativida- criança está no período escolar, geralmente na
de que existem são genes diferentes que con- educação infantil.
trolam a quantidade de produção/receptação
da dopamina e da serotonina. Quando alguns O TDAH pode perpetuar da infância até a fase
desses genes são transmitidos para um indi- adulta, por isso esta deve ser diagnosticada
víduo, mudam a dinâmica dos sistemas de do- e tratada o quanto antes para que a qualida-
pamina e serotonina e originam o TDAH. de de vida da criança seja efetiva ao longo de
todo o seu desenvolvimento.
O comportamento hiperativo pode estar rela-
cionado com a perda de visão ou audição, um A ansiedade, a inquietação, a euforia e a distra-
problema de comunicação, como a incapa- ção frequentes podem significar mais do que
cidade de processar adequadamente os sím- uma fase na vida da criança, pois os exageros
bolos e ideias que surgem, stress emocional, de conduta, de modo geral, diferenciam quem
convulsões ou distúrbios do sono. Também vive um momento atípico daqueles que sofrem
pode estar relacionado a paralisia cerebral, de transtorno de Deficit de Atenção com Hipe-
intoxicação por chumbo, abuso de álcool ou ratividade, doença precoce e crônica, que pro-
drogas na gravidez, reação a certos medica- voca falhas nas funções do cérebro responsá-
mentos ou alimentos e complicações de parto, veis pela a atenção e memória .
como privação de oxigénio ou traumas duran-
te o nascimento. Esses problemas devem ser Os sintomas são diversificados, variando de
descartados como causa do comportamento leve, moderado e grave, incluindo problemas
antes de tratar a hiperatividade da criança. de linguagem, memória e habilidades moto-
ras. Embora a criança hiperativa tenha muitas
O TDAH chega a atingir de 3% a 5% da popu- vezes uma inteligência normal ou, até mesmo,
lação escolar infantil, provocando baixo rendi- acima da média, a mesma é caracterizada por
mento escolar, baixa autoestima e dificultando problemas de aprendizagem e comportamen-
os relacionamentos entre os colegas. De uma to. Os professores e os pais da criança devem
maneira geral, as principais causas conheci- saber lidar com tal situação que tem como
das até hoje são: ponto central a falta de atenção, impulsividade,
instabilidade emocional e hiperativa incontro-
a. Mães, com depressões pós-parto; lável na criança .
b. Mães que consomem habitualmente
psicofármacos; O verdadeiro comportamento hiperativo inter-

156 INEQ - Educação integral


fere na vida social e familiar, porque as crian- de TDAH. Algumas pessoas com TDAH são ex-
ças hiperativas têm dificuldade em prestar cecionalmente hiperativas e impulsivas, outras
atenção e aprender. São incapazes de filtrar são mais notavelmente afetadas por estados
estímulos, e, portanto, são distraídas. Assim, de desatenção e outras, ainda, apresentam
essa criança pode falar alto demais e em mo- uma combinação de dois ou mais traços con-
mentos inoportunos. forme o Diagnostic and Statistical Manual of
Mental Disorders (DSM –IV,1994). |Vejamos
As crianças estão sempre em movimento, são abaixo:
incapazes de ficar quietas. São impulsivas,
não param em momento algum para olhar e a. Transtorno de Hiperatividade com defi-
ouvir, devido a sua vontade, curiosidade e a cit de atenção, Tipo predominantemente
necessidade de explorar surpreendentes e Desatento.
aparentemente infinitas. Outro aspecto impor- b. Transtorno de Hiperatividade com defi-
tante é que ascrianças hiperativas não toleram cit de atenção, Tipo Predominantemente
ser contrariadas. Discutem com as pessoas Hiperativo/Impulsivo.
próximas, mudam de humor de repente . Essas c. Transtorno de Hiperatividade com defi-
crianças também tendem a ser muito agarra- cit de atenção, Tipo Combinado
das as pessoas, porque necessita de muita
atenção e alguém que as tranquilize. 1.3 TDAH - Tipo desatento

A criança hiperativa pode ter muitos problemas. A pessoa apresenta pelo menos, seis das se-
Apesar da "dificuldade de aprendizagem", essa guintes características: Não vê detalhes ou faz
criança é geralmente muito inteligente. Sabe erros por falta de cuidado; Dificuldade em man-
que determinados comportamentos não são ter a atenção; Parece não ouvir; Dificuldade em
aceitáveis. Mas, apesar do desejo de agradar e seguir instruções; Dificuldade na organização;
de ser educada e contida, a criança hiperativa Evita ou não gosta de tarefas que exigem um
não consegue controlar-se. Pode ser frustrada, esforço mental prolongado; Frequentemente
desanimada e envergonhada. Ela sabe que é perde os objetos necessários para uma ativi-
inteligente, mas não consegue desacelerar o dade; Distrai-se com facilidade; Esquecimento
sistema nervoso, a ponto de utilizar o potencial nas atividades diárias.
mental necessário para concluir uma tarefa.
A criança hiperativa muitas vezes se sente iso- 1.4 TDAH - Tipo hiperativo/ impulsivo
lada e separada dos colegas, mas não entende
por que é tão diferente. Fica perturbada com É definido se a pessoa apresenta seis das se-
suas próprias capacidades. Sem conseguir guintes características: Inquietação, mexendo
concluir as tarefas normais de uma criança na as mãos e os pés ou se remexendo na cadei-
escola ou em casa, a criança hiperativa pode ra; Dificuldade em permanecer sentada; Corre
sofrer de stress, tristeza e baixa autoestima . sem destino ou sobe nas coisas excessiva-
mente (em adulto, há um sentimento subjetivo
1.2 Tipos de Hiperatividade de inquietação); Dificuldade em concentrar se
numa atividade silenciosamente; Fala exces-
Durante bastante tempo, a hiperatividade era sivamente; Responde a perguntas antes delas
considerada por muitos estudiosos como sen- serem formuladas; Age como se fosse movida
do a características mais marcante da pertur- a motor; Dificuldade em esperar sua vez; Inter-
bação da hiperatividade e deficit de atenção. rompe e se interrompe.
No entanto, há na atualidade diferentes tipos

INEQ - Educação integral 157


1.5 TDAH - Tipo combinado descritivas, com ênfase nos comportamentos
apresentados pelos pacientes e nos achados
É caracterizado pela pessoa que apresenta os clínicos mais frequentes, independente de sa-
dois conjuntos de critérios dos tipos desaten- bermos ou não quais os fatores etiológicos en-
to. Tipo não específico: A pessoa apresenta volvidos nos diversos diagnósticos.
algumas dificuldades, mas número insuficien-
te de sintomas para chegar a um diagnóstico Atualmente, os MC mais utilizados são o Ma-
completo. Esses sintomas, no entanto, dese- nual de Diagnóstico e Estatística da Associa-
quilibram a vida diária e escolar. ção Psiquiátrica Americana, que já está na sua
quarta versão, o DSM-IV e o Código Interna-
2. Como diagnosticar o TDAH? cional de Doenças da Organização Mundial de
Saúde, décima versão, o CID-10.
O diagnóstico de TDAH é clínico. Não existe,
até o momento, NENHUM exame ou teste que Apesar das enormes vantagens que o DSM-IV e
possa sozinho dar seu diagnóstico, nem mes- a CID-10 proporcionaram, é preciso estar aten-
mo os mais modernos tais como ressonância to para que eles não sejam utilizados de forma
magnética funcional, PET, SPECT, eletroence- equivocada. Ou seja, os manuais NUNCA po-
falograma digital ou dosagem de substâncias dem ser usados para estigmatizar as pessoas.
no sangue ou em fios de cabelo. Da mesma forma, é importante lembrar que o
diagnóstico é o início do tratamento, não o seu
Para se elaborar um diagnóstico correto dessa fim. Levantamos essa questão porque muitos
condição são necessárias várias avaliações, professores perguntam se ao dizer o diagnós-
muitas vezes com abordagem multidisciplinar. tico para alguém ou discutir sobre o mesmo
A avaliação clínica com médico deve coletar com a família não existe o risco de “rotular” o
informações não apenas da observação da paciente. É interessante pensar que essa per-
criança durante a consulta, mas também rea- gunta só é feita para diagnósticos psiquiátri-
lizar entrevista com os pais e/ou cuidadores cos. Para qualquer outra especialidade, quan-
dessa criança, solicitar informações da escola do vamos ao médico queremos sempre saber
que a criança frequenta sobre seu comporta- o que temos. Por exemplo, caso uma criança
mento, sociabilidade e aprendizado, além da esteja com febre e tosse, os pais com certeza
utilização de escalas de avaliação da presença vão querer saber se seu filho(a) tem bronquite,
e gravidade dos sintomas. pneumonia, ou apenas um resfriado, antes de
medicá-lo(a) com uma aspirina ou antibiótico.
2.1 Como classificar o TDAH? Da mesma forma, em psiquiatria, também é
extremamente importante identificar e discutir
O objetivo principal dos MC é melhorar a comu- com o paciente e seus familiares as hipóteses
nicação entre os pesquisadores e os clínicos. diagnósticas antes de iniciar o tratamento.
Especialmente, para pesquisadores, os MC Se nós, profissionais (tanto da área de saúde
permitem que eles compartilhem descobertas; quanto de educação), não nos sentirmos à
aumentem a confiabilidade e validação dos re- vontade para discutir um diagnóstico específi-
sultados de pesquisas; e assim encorajem o co, como vamos exigir que uma criança com
aumento gradual do conhecimento. Para os clí- TDAH tenha os mesmos direitos de outra com
nicos, os MC ajudam na escolha do tratamento qualquer problema clínico tais como pneumo-
mais adequado e possibilitam a avaliação dos nia ou diabetes? A seguir, apresentamos
benefícios das intervenções terapêuticas. Sen- os critérios para o diagnóstico de TDAH, de
do assim, os MC devem apresentar definições acordo com o DSM-IV Lista de Sintomas do

158 INEQ - Educação integral


TDAH de acordo com o DSM-IV: • Entrevistas com professores (relato sobre
o comportamento da criança na escola, le-
A. Ou a presença de seis (ou mais) sin- vantamento de queixas, sintomas, desem-
tomas de desatenção persistiram pelo penho escolar, relacionamentos com adul-
período mínimo de seis meses, em grau tos e crianças)
mal adaptativo e inconsistente com o • Questionários e escalas de sintomas para
nível de desenvolvimento OU a presen- ser preenchidos por pais e professores;
ça de seis(ou mais) dos seguintes sin-
tomas de hiperatividade/impulsividade 3. O perfil da criança com TDAH
,por no mínimo seis meses, em um grau
mal-adaptativo e inconsistente com o A criança TDAH com ou sem défice de aten-
desenvolvimento.B. Alguns dos sinto- ção , em sua chegada no ambiente escolar,
mas de desatenção ou hiperatividade/ necessita de um período adaptação tanto com
impulsividade já estavam presentes an- os novos colegas, assim também com o edu-
tes dos 7 anos de idade.C. Algum com- cador, as regras básicas de uma sala de aula,
prometimento causado pelos sintomas como a sua própria estrutura de organização,
está presente em 2 ou mais contextos abala o TDAH, as crianças com a perturbações
[p. ex. na escola (ou trabalho) e em ca- nestas áreas funcionam melhor se o ambiente
sa].D. Deve haver claras evidências de for previsível, se respeitar rotinas facilmente
comprometimento clinicamente impor- compreendidas pela criança e se induzir senti-
tante no funcionamento social, acadê- mentos de conforto de estabilidade e seguran-
mico ou ocupacional.E. Os sintomas não ça, isto é, se for um ambiente bem estruturado,
ocorrem exclusivamente durante o curso já a mesmice em que se posta a aula causa
de um transtorno global do desenvolvi- necessariamente um suposto desinteresse ní-
mento, esquizofrenia ou outro transtorno tido, gerando assim a insatisfação acertando-
psicótico, nem são melhor explicados -se a desmotivação e com isso a ansiedade e
por outro transtorno mental (p. ex.,trans- abaixando mais ainda sua auto estima, a falta
torno do humor, transtorno de ansiedade, de informação por parte do educador e cole-
transtorno dissociativo ou transtorno de gas de sala de aula, a sua doença pode natu-
personalidade. ralmente transformar esse ambiente em hostil
acentuando assim sua hiperatividade .
2.3 Como se trata o TDAH?
As crianças que não apresenta dificuldade de
O tratamento do TDAH envolve abordagens aprendizagens conseguem executar as tare-
múltiplas: fas de modo rápido e eficiente, mas como tam-
bém terminam antes dos outros, ao receber o
• Intervenções psicoeducacionais - com a estimulo correto o TDAH, poderá desenvolver
família; com o paciente; com a escola. acerca de seu objeto de interesse o hiperfoco
• Intervenções psicoterapêuticas, psicope- quando o individuo se desperta para um de-
dagógicas e de reabilitação neuropsicoló- terminado assunto, ele se focalizar podendo
gica; assim passar horas entretido em tal tarefa. A
• Intervenções psicofarmacológicas. autora menciona exemplos de pessoas geniais
• Entrevistas com os pais (levantamento de que, devido a capacidade de hiperfocar se de-
queixas e sintomas e relato sobre o com- dicaram amplamente para conseguir desen-
portamento da criança em casa e em ativi- volver seus projetos como, por exemplo, Albert
dades sociais); Einstein, Fernando Pessoa, Leonardo da Vinci

INEQ - Educação integral 159


e Henri Ford entre outros. Com o hiperfoco desempenho que não vai se lá grande
temos a criatividade aguçada e o ser criativo coisa. (MATTOS, 2004, p. 103 )
onde sua análise de um determinado assunto
horas a fio, proporciona a criação. Para refletirmos melhor qual será a melhor
escola para uma criança com o TDAH, deve –
Se o convívio social é importante para o desen- se verificar se na instituição escolar dar-se-á
volvimento da criança para quem tem TDAH importância às características individuais de
não e diferente. Ao professor cabe observar os cada um, elaborando em sua proposta escolar
sinais como agitação e dificuldade de assimi- as características individuais de cada indivi-
lação, as meninas que sofrem da doença são duo, assim como a avaliação deste deve ser
mais distraídas, falam demais ou simplesmen- diferenciada, sendo que uma vez temos alu-
te se isolam; já os meninos, no intervalo das nos diferenciados, visto que em algumas tur-
aulas, costumam se a meter em confusões ou mas temos uma quantidade maior de alunos,
brincar quase sempre sozinhos, tentam cha- e este porém fica de lado passando horas a fio
mar a atenção ou se comportam como se somente a olhar pela a janela ou no fundo da
fossem alienados, por serem diferentes dos sala .
demais, burlaram regras por não saber seguí-
-las ou agem por impulso e, em muitos casos, a 4. Abordagem de Ensino do Professor
criança com TDAH ser até um mandona.
O educador deve se informar, sobre o transtor-
Vale salientar que o aluno com TDAH, não no e o que diz respeito ao seu aluno, essa infor-
pode ser julgado e taxado como rebelde. Por mação consiste na leitura de manuais práticos
sofrer de uma doença que provoca dificuldade sobre a doença, tanto como conhecer seu alu-
de concentração, não se dão conta das ordens no por meio dos pais, como conhecendo sua
que recebe. A criança com TDAH, em suas atitude perante tal situação, seus gostos, pois
amizades tende a concentrar sua atenção em assim construirá não uma ideia equivocada de
crianças mais novas, mantendo dessa forma que o mesmo (estudante com TDAH) é um alu-
o seu papel de líder, elevando sua autoestima, no indisciplinado sem limites ou uma criança
normalmente baixa em demasia. cuja família não o educou direito .

No que tange a aprendizagem, especificamen- É notório que o educador com um aluno nes-
te os alunos com TDAH têm como fator com- ta condição, automaticamente, despenderá de
plicador deste processo a falta de atenção, o mais atenção do que com os demais estudan-
que levará ao aluno perder a explicação sobre tes da turma, pois o mesmo necessita parale-
atividades, não conseguindo realizar a mesma lamente de uma atenção individualiza, atenção
sozinha, cometendo erros por distração, arma- essa que não pode afetar o restante do grupo
zenamento superficial de informações. Essa e que, ao mesmo tempo, o mesmo não se sin-
problemática automaticamente reduz mais ta discriminado. É necessário que o educador
ainda sua autoestima, pois não vê na escola venha a refletir sobre a sua prática em sala de
motivação suficiente para se aperfeiçoar. aula e as crenças teóricas que o acompanham
ao longo de sua trajetória, pois neste momento
Muitas crianças com TDAH e com trans- põe se a prova se o que está sendo feito real-
torno de aprendizado simplesmente não mente é apropriado para cada público em cada
gosta de escola , não gosta de estudar sala de aula, assim é fundamental que o edu-
porque sabem que tem muita dificuldade cador tenha oportunidade de rever seus con-
e precisam se esforçar muito para ter um ceitos, crenças e atitudes.

160 INEQ - Educação integral


Mattos (2004), atenta para que os pais, junta- CONSIDERAÇÕES FINAIS
mente com os professores que convivem com
a criança, podem fazer a diferença se auxiliar Ao findar desse artigo, é possível perceber a
em suas necessidades de concentração e or- importância de pais e edcadores conhecerem
ganização nos momentos de estudo, tanto em do que é o TDAH, os seus tipos, como diagnos-
sala de aula quanto em casa. Em residência, o ticar tal transtorno, para poder lidar com um
local de estudo deve ser silencioso e não rui- indivíduo portador deste deficit de atenção, en-
doso, assim não proporciona desatenção, para quadrando-o dentro de seu nível.
tento vale informar que não deve ser uma po-
luição visual como objetos coloridos, que po- Foi possível também, por meio deste artigo,
derão distrair a criança; o local deve ser bem averiguar como é possível trabalhar pedagogi-
iluminado, confortável e arejado . camente com o aluno com o TDAH. Para tanto,
o educador deve flexibilizar seu trabalho para
E importante também que a criança venha a incluir esse aluno verdadeiramente no proces-
participar das atividades, se envolvendo na to- so educativo, favorecendo o mesmo pedagogi-
mada de decisões sobre seus deveres de casa camente. É fundamental também que a partir
e da escola, fazendo com que ela se aproxime deste conhecimento sobre o TDAH, se abre
mais do ofício de estudar, fazendo com que o novos horizontes do educador para o êxito na
estudo se torne mais fácil para ela, por meio sua relação com a criança, e a família e os de-
deste efeito de aproximação dos estudos. Para mais envolvidos nesse processo, porque a par-
tanto, deve se acomodar a criança com TDHA ticipação da família e o contanto permanente
do jeito mais confortável possível, seja em pé, destes com a escola, o educador e os psicólo-
deitada, de modo que paulatinamente os adul- gos forma uma ponte para o desenvolvimento
tos façam intervenções para que este adote de um trabalho harmonioso, no qual se tor-
uma postura mais organizada, de modo con- na possível superar os desafios e dar efetiva
vencional, esta tarefa no entanto deve fazer condição de aprendizado e desenvolvimento à
parte da rotina, tanto de educadores como dos criança portadora de TDAH.
pais, que lidam diretamente com o estudante
com o TDAH. Deste modo, negociar regras a REFERÊNCIAS
serem seguidas, o aluno acabará tendo um
consenso do que se espera dela no futuro. GOLDSTEIN, Sam & GOLDSTEIN, Michael.
1994.Hiperatividade como desenvolver a ca-
Mattos aponta que deve ser feito um planeja- pacidade de atenção da criança, Campinas Pa-
mento semanal para a criança com as ativida- pirus, 1994.
des que forem aplicadas, devendo as mesmas LEMOS, Mattos; PHELAN, T.W. No mundo da
serem rápidas para que não canse ou disper- Lua: perguntas e respostas sobre o transtorno
se sua atenção e paulatinamente devem ser do deficit de atenção com hiperatividade em
aumentadas (as atividades) para conforme a crianças, adolescentes e adultos. São Paulo:
criança vai desenvolvendo sua atenção. Editorial, 2004.
SILVA, Ana Beatriz B. 2003. Mentes inquietas:
Vale acrescentar que a memorização deste entendendo melhor o mundo das pessoas dis-
ocorre quando tem um vínculo com o que ele traídas, impulsivas e hiperativas. São Paulo:-
já sabe, assim acontece uma aprendizagem Gente, 2003.
significativa, caso a criança esteja cansada
não haverá êxito, nem mesmo com repetições SITES
infindáveis. www.tdah.org.br

INEQ - Educação integral 161


O IMPACTO DA LEGISLAÇÃO E DAS
PRESCRIÇÕES PEDAGÓGICAS NO
COTIDIANO DO PROFESSOR DE
HISTÓRIA, O FIM DA DISCIPLINA DE
HISTÓRIA E A CHEGADA DOS ESTUDOS
SOCIAIS, BRASIL (1971-1989)
Washington Barros

RESUMO tulados como de “Estudos Sociais”, verificar sua


origem e importância em dado momento da so-
O artigo apresentado visa estabelecer um diálogo ciedade.
entre autores que falam sobre a metodologia do
Ensino de História, com a intenção de cruzar suas Logo, o que se pôde perceber em resultados é que
falas em pontos de igualdade e diferença na rela- a disciplina de História esteve sempre à disposi-
ção da trajetória do Ensino da Disciplina de Histó- ção e com uma interligação muito tênue entre: po-
ria no Brasil de 1964 a 1989. lítica, sociedade e manipulação de informações,
hoje essa é pautada nas pluralidades e possibili-
Tendo como objetivos: Entender as questões e dades na busca da criticidade e plena formação
as tensões que levaram as mudanças dentro da do educando: Social, Civil, Ideológica, Política e
disciplina de História e as mudanças na socieda- Religiosa.
de, observar como essa enxergava a História en-
quanto disciplina e a instituição escola dentro de RESUMEN
uma conjuntura fortemente influenciada pela por
uma cultura norte americana, dentro de um perío- El trabajo presentado pretende establecer un diá-
do tecnicista até a abertura das mentalidades na logo entre autores que hablan sobre la metodolo-
década de 1980. gía de la Enseñanza de la Historia, con la intenci-
ón de cruzar sus discursos en puntos de igualdad
Após selecionar os autores que busquem explicar y diferencia en la relación de la historia de la En-
e explicitar o tema em datas e momentos históri- señanza de la Historia en Brasil desde 1964 hasta
cos diferentes a metodologia deu-se em interca- 1989.
lar suas visões traçando uma linha cronológica
sempre cruzando suas ideias com as leis de cada Teniendo como objetivos: comprender los proble-
momento e a perspectiva histórica da sociedade mas y las tensiones que llevaron a los cambios
brasileira. dentro de la disciplina de la historia y los cambios
en la sociedad, observar cómo consideraba la his-
Durante os quatorze anos que exerço o magisté- toria como una disciplina y la institución escolar
rio sempre foi uma grande dúvida entender quais dentro de un contexto fuertemente influenciado
as bases legais do Ensino de História durante sua por una cultura norteamericana, dentro de un pe-
trajetória nas ultimas décadas, o porquê de certa ríodo tecnicista hasta la apertura de las mentali-
repulsa da mesma por parte de alguns estudan- dades en la década de 1980 hasta la llegada del
tes e mais tendo estudado parte de minha vida neoliberalismo en 1996.
escolar com livros didáticos que ainda eram inti-

162 INEQ - Educação integral


Después de seleccionar a los autores que bus- duas décadas esteve à disposição do serviço
can explicar y explicar el tema en diferentes de militares que impuseram regras e normas
fechas y momentos históricos, la metodología para controlar as pesquisas na área de História
se llevó a cabo entre sus puntos de vista, dibu- e da História ensinada nas escolas.
jando una línea cronológica, cruzando siempre
sus ideas con las leyes de cada momento y la Em seu nascedouro, como disciplina escolar
perspectiva histórica de la sociedad brasileña. no Brasil durante o início do século XIX, a His-
tória se colocou como uma forma de buscar
Durante los seis años que he estado enseñan- e incentivar o sentimento da recém-nascida
do, siempre ha sido una gran duda entender nação na ânsia de construir uma identidade
cuáles han sido las bases legales de la En- brasileira, porém, durante seu trajeto sofreu al-
señanza de la Historia durante su trayectoria terações por razões políticas (PINSKY, 2007, p.
en las últimas décadas, por qué a algunos es- 22) ou ainda pela velocidade dos tempos mo-
tudiantes no les gusta y han estudiado parte de dernos.
mi vida escolar. con libros de texto que todavía
se llamaban "Estudios sociales", verifique su Fato é que a História e a escola serviram de
origen e importancia en un momento dado de ponto e contra ponto para uma base gover-
la sociedad. nante, potencialmente capaz de moldar a vida
da sociedade e de seus cidadãos, tendo nela
Por lo tanto, lo que se puede ver en los resulta- expressa seus desejos de forma a “moldar” o
dos es que la disciplina de la Historia siempre pensamento da grande massa. A forma como é
ha estado disponible y con una interconexión tratada a disciplina e suas mudanças são alvo
muy tenue entre: política, sociedad y manipula- desse projeto de pesquisa, cujo recorte se ini-
ción de la información, hoy se guía por la plu- cia depois de sua reforma com a Lei 5692/71¹,
ralidad y las posibilidades en la búsqueda de la período em que o ensino de História foi abolido
criticidad y la formación completa. del alumno: das grades curriculares em favor de disciplinas
social, civil, ideológico, político y religioso. que favorecessem outros interesses, no caso,
os interesses dos grupos que apoiavam os mi-
litares que estavam no poder desde 1964. Sen-
INTRODUÇÃO do assim a criticidade e o ponto social foram
esquecidos nesse aspecto. Segundo Fonseca
O presente texto pretende debater o ensino de (1993, p. 25-27):
História, pois esse é um capítulo a parte nos
estudos da História da Educação Brasileira. Para a realização de um projeto educa-
Tendo em vista que foi criado, recriado, im- cional, um dos elementos mais impor-
posto e vetado, ora buscando constituir uma tantes do processo é o professor, Este
identidade nacional, em alguns períodos, ora supostamente domina o saber, e a edu-
defendendo a transformação social, durante cação realiza-se através do seu trabalho

1 - A lei 5692/71, Lei de diretrizes e bases, Lei orgânica na educação que foi promulgada pelo então presidente da Re-
pública Emílio Garrastazu Médice em 11 de Agosto de 1971, durante o período militar que começou em 1964 e durou
até 1985, retirando da grade escolar os ensinos de História e Geografia do Ensino Fundamental I (Antigo 1º Grau) e
implantando de 1ª a 4ª Série do Ensino Primário: Estudos Sociais, 5ª a 8ª Série do Primeiro Grau (Ginásio) Educação
Moral e Cívica e Ensino Médio (Antigo Colegial) O.S.P.B..

INEQ - Educação integral 163


no nível de planejamento e execução do pois, essa sofreu grande mudança na década
processo de ensino, sendo investido de de 1970, sendo reduzida a um discurso domi-
autoridade institucional. A lógica da ra- nante do poder militar voltado para as tecno-
cionalização capitalista incorporada pe- logias, pois é importante pensarmos que esse
las escolas brasileiras nas décadas de período vem depois da Segunda Guerra onde a
20 e 30 é aprimorada pelas escolas bra- preocupação mundial era formar mão de obra
sileiras pelas novas mudanças através capacitada e habilitada para desenvolver no-
do aperfeiçoamento do controle técnico vas armas. Neste sentido, Bittencourt (2008,
e burocrático no interior das escolas: a p.197) afirma:
perda maior do controle do processo de
ensino e a subordinação dos professores Nos anos 70, assiste-se uma organiza-
aos supervisores e orientadores pedagó- ção diferente do currículo, criando-se o
gicos, a massificação e imposição do primeiro grau de oito anos e um segun-
material didático (livro didático por exce- do grau profissionalizante. Um currículo
lência) são algumas das formas aperfei- de caráter científico, mas entendido em
çoadas. [...]. As licenciaturas curtas vêm sua formulação apenas como tecnicista,
acentuar ou mesmo institucionalizar a consegue se impor e as áreas humanas
desvalorização e a consequente proleta- passam por um amplo processo de des-
rização do profissional da educação. Isto caracterização e perda de Status. A His-
acelera a crescente perda de autonomia tória do Brasil se mescla com os estudos
do professor frente ao processo ensino/ da Geografia, Educação Moral e Cívica e
aprendizagem na medida em que sua Organização Social dos Problemas do
preparação para o exercício das ativida- Brasil (OSPB), formando uma amalgama
des docentes é mínima ou quase nenhu- de conhecimentos superficiais sem base
ma; uma vez que os antigos exames de cientifica.
suficiência e as licenciaturas curtas não
se diferiam muito. Assim, as licenciatu- Dentro dessa perspectiva o foco deste artigo
ras curtas cumprem o papel de legitimar é cruzar, comparar as falas dos autores que
o controle técnico e as novas relações de abordam esse tema, logo após, analisar as
dominação no interior das escolas. leis vigentes no momento histórico estudado,
propondo assim um dialogo entre Legislação
Ou seja, na teoria o objetivo para promover um e contexto histórico. Relacionando ambos os
“aligeiramento” na formação do professor com processos em entendimento, verificando como
consequências diretas para a prática desses um autor pode se apoiar, justificar e dialogar
profissionais na sala de aula, estava arquiteta- com a escrita do outro. A seleção dessas bi-
do de forma vedada. bliografias e esses procedimentoS se justifi-
cam na busca de entender as seguintes ques-
Com o avanço do poder militar e o maior tões:
acesso à tecnologia, as Ciências Humanas
sofreram um processo de deslegitimação em O que mudou no Ensino de História após a pro-
relação às demais ciências e disciplinas esco- mulgação da 5692/71? Como essas mudan-
lares, e, em se tratando da disciplina de Histó- ças atingiram a formação de alunos e profes-
ria a questão é maior, ganha outras dimensões, sores dentro dessa Lei no período 1971-1996?

164 INEQ - Educação integral


Quais fatores internos e externos (dentro e fora odo, tais como: Circe Bittencourt (2007), Le-
da escola) propiciaram a mudança da 5692/71 andro Karnal (2008), Selva Guimarães (2003),
para 9394/96? Marcos Napolitano(2007), Carla Pinsky (2007),
Kátia Abud (2007) e Jaime Pinsky (2007). Es-
Quais as prescrições legais e teóricas do atual creveram sobre o período de 1971 a 1989 e até
Ensino de História, após a 9394/96? mais, tratam das reformas educacionais no en-
A pesquisa se propõe a abordar a trajetória do sino de História, traçando uma linha cronológi-
ensino de História dentro da grade curricular ca de análise, sempre englobando a sociedade
nos 18 anos que percorrem a LDB 5692/71 não que passava por um período militar, onde vozes
em sua totalidade, onde antes (final do sécu- eram silenciadas e o sentimento de impotên-
lo XIX, início do século XX) considera-se que cia e falta de liberdade imperava. E, na escola
essa instituição era somente voltada para a não era diferente, com a falta de investimento
classe dominante, os membros da oligarquia. nas pesquisas e na busca do pensamento cri-
Percebe-se, pela citação abaixo, que o ensino tico os discursos eram retóricos, sem base ou
de modo geral no Brasil, esteve sendo voltado fundamento conforme afirma Abud (2008 p.
para a elitização, com fortes raízes católicas. 47) que intercala a o momento Histórico, com
Conforme afirma Bittencourt (2008, p. 194): a situação educacional na década de 1980:

Nesse modelo de currículo de humani- Ao abraçar perspectivas antropológicas


dades, voltado para a formação de valo- e literárias, muitas vezes o discurso his-
res aristocráticos, com a concepção de toriográfico, também no Brasil, tornou-se
um humanismo excludente, a identidade presa de meras constatações narrativas
nacional era constituída exclusivamente sobre um cotidiano despolitizado, des-
pela inserção do Brasil no mundo ociden- vinculando-se da própria consciência
tal e cristão. O sentimento de pertencer a histórica, que acima de tudo, pressupõe
um mundo branco e seguidor de padrões a definição ética do historiador perante
estabelecidos por europeus cristãos pre- seu tempo. Em decorrência disso não
dominava nos projetos de setores das resta duvida que o ensino passou a cor-
elites encarregadas de conduzir a edu- rer o risco de fragmentar-se e prender –
cação escolar e tais projetos, é impor- se num circulo de sua própria pratica, crí-
tante destacas, eram muitos coerentes. tica esta paradoxalmente feita à rigidez
Tratava-se de um conhecimento escolar teórica dos anos 80.
organizado para a formação das elites
encarregadas de dirigir a nação e seria Outro fator importante que corroborou para
ingenuidade e anacrônico imaginar que um Ensino de História mais ligado às produ-
tais elites estivessem interessadas em ções historiográficas acadêmicas foi a criação
incluir em seus projetos políticos, a par- da Associação Nacional de História (ANPUH),
ticipação das camadas populares, como sendo a responsável por um novo olhar den-
ex- escravos, trabalhadores urbanos e tro do Ensino da disciplina no Brasil, pois hou-
rurais. ve, desde então, uma preocupação no final da
década de 1980, principio da década de 1990
A pesquisa tem, como alicerce, diversos auto- em resgatar o caráter investigativo da Histó-
res que tratam do ensino de História no perí- ria enquanto disciplina escolar alterando seu

INEQ - Educação integral 165


caráter formativo e passando a preocupar-se da Universidade de São Paulo, em 1934 e, esse
novamente com o campo da pesquisa dentro momento, é considerado um marco de extre-
da sala de aula. ma importância. Pois, pela primeira vez, esses
eram separados do ensino escolar e passa-
1. Do Clássico ao Dinâmico: a trajetória do en- vam a ser considerados profissionais gradua-
sino de História dos com conhecimento cientifico, tornando-se
cientistas nas ciências humanas.
A História ensinada, tal qual conhecemos hoje
é algo recente, nem sempre foi baseada na A partir de 1960 com a criação das Leis de Di-
totalidade, na analise de hipóteses e a escola retrizes e Bases Nacionais, no Brasil, a licen-
nem sempre foi inclusiva como nos dias de ciatura foi aceita como sendo paralela ao ba-
hoje. Segundo NADAI (1992) escola e a Histó- charelado. LOGO a graduação em História que
ria brasileira eram extensão da corte francesa, era algo voltado para o cientificismo, a desco-
de sua historiografia que estendia seus tentá- berta do saber, passou a ser compreendida
culos sobre o Brasil. A mesma afirma: como uma “disciplina conteudista”, ou seja, a
academia ficou com duas vertentes na forma-
Assim a História estudada no Brasil foi ção do professor de História, a primeira seria o
a História da Europa Ocidental, apresen- bacharelado, voltado para a formação do pes-
tada como verdadeira História da Civili- quisador, e a licenciatura para a formação do
zação. A História da Pátria seguiu como professor de História (MARTINS: 2000).
um apêndice, sem corpo autônomo, ocu-
pando papel extremamente secundário, Torna-se perceptível a partir de década de
relegada aos anos finais dos ginásios 1970, mais precisamente no ano 1971 que
reduzidos a um número ínfimo de aulas, o ensino de História da academia não era o
sem estrutura própria, consistia em um mesmo do ensinado na escola. Nem de longe
deposito de biografias de homens, de da- as discussões feitas nas universidades eram
tas e batalhas. (p.46) lembradas pelos professores nos bancos es-
colares ou com o corpo discente haja visto que
Esse foi o modelo educacional pelo qual optou isso se deve ao plano de ensino implantando
o imperador e, de fato, não era de se estranhar, pelos militares que previa um ensino unilateral,
pois a França era o país que suspirava civilida- ou seja, uma única verdade seria ensinada e
de e progresso, além de sua corte que ainda essa seria uma História cheia de intencionali-
era tida como sinal de nobreza e puro requin- dades voltada para o nacionalismo, com um
te, logo, a corte brasileira assim como as clas- sistema positivista, baseando-se nas grandes
ses mais abastarda jamais desprezariam os personagens da História, numa memória domi-
padrões franceses nesse momento histórico. nante.
Apagar ou não contemplar esse feito seria não
cortejar, não prestigiar o século das luzes e o O ensino tornava-se estático e tendencioso
mundo Ocidental Cristão. voltado para “moral e os bons costumes” e
também se embasava no sistema Norte Ameri-
A formação da primeira turma de professores cano de ensino (Sul dos Estados Unidos), pois
de História, no Brasil, em nível universitário, além da disciplina de Educação Moral e Cívica
ocorreu apenas no século XX, com a fundação (EMC) no antigo Primeiro Grau (ciclo que com-

166 INEQ - Educação integral


preendia da 5ª à 8ª Série), hoje Ensino Funda- de reprimir e fiscalizar todo e qualquer pensa-
mental II, surgia também o Ensino Religioso e mento voltado a questionar o sistema dentro e
a Língua Inglesa no currículo dando mostras fora das escolas. Logo, era preciso fiscalizar,
de que o Regime Militar no Brasil era Tri partite e muito bem, a base de formação dos forma-
que incluía: O Poder Militar Brasileiro, A Igre- dores dessa camada estudantil, os PROFES-
ja Católica Apostólica Romana e a grande in- SORES. ERA criada, então, a licenciatura curta:
fluencia dos Estados Unidos da América. Com
isso sai de cena o ensino de História e entra O argumento utilizado pelo governo fe-
a disciplina de Estudos Sociais promovendo deral ao instituir a licenciatura curta, foi
uma formação geral do educando. o mesmo utilizado pelos legisladores da
L.D.B de 1961, qual seja, suprir a carên-
Essas mudanças provocaram um aligeiramen- cia de professores qualificados no mer-
to da formação do professor, não para o en- cado de trabalho. A lei de Diretrizes e
sino superior, mas sim para o ensino técnico, Bases previa em seus artigos 116,117 e
afinal esse era o momento vivido pelo Brasil, 118 que, enquanto não houvesse núme-
a demanda pelo ensino tecnicista nas esco- ro suficiente de professores habilitados,
las, onde o importante no ato de estudar não tanto em cursos normais quanto para o
era a reflexão sobre o conteúdo ou o método primário como em licenciaturas para ou-
de estudos, mas sim o acumulo pelo acumulo tros níveis, esta carência seria suprida
especifico das informações que, na década de através de exames de suficiência reali-
1970, estavam voltadas para as grandes em- zada pelas escolas normais e faculda-
presas multinacionais que se instalavam no de. Desta forma, profissionais de outras
Brasil. áreas poderiam habilitar-se legalmente
para as atividades do magistério, Estas
Não há como negar que com o Regime Militar medidas fazem parte das “ disposições
a escola que até então era elitizada, apenas gerais e transitórias da L.D.B. (GUIMA-
para poucos, entrou numa fase expansiva e RÃES: 1993 p.26)
com tendência inclusiva, pois, as matrículas
que eram em torno de 15.892.230 em 1970, Logo, o que podemos perceber é que há um
aumentaram para 22.598.254 no ano de 1980² grande plano para restringir não somente a
. Se, por um lado o acesso passou a ser garan- imagem do professor como também podar
tido a todos, as informações não, havia ainda suas formas de pensamento e mais, suas
um elitismo brasileiro. Esse pensamento impe- práticas, haja visto que qualquer profissional
rava entre as camadas mais abastardas finan- poderia exercer o magistério, ainda que não
ceiramente no país, POIS preparava-SE alguns fosse devidamente habilitado na área; Ou seja
para a universidade e outros de fato para ser- o compromisso com a educação, e principal-
virem de mão de obra. Logo, as informações mente com o saber histórico era deixado de
necessárias para prosseguir a vida estudantil lado assim como a questão critica e pedagógi-
eram limitadas, de acordo a camada social de ca. O importante era suprir a necessidade de
origem do estudante. Havia, ainda, o Conse- mão de obra em sala de aula, já a qualidade
lho de Segurança Nacional, que tinha a função pedagógica seria deixada de lado. Podemos,

2 - FIBGE, Anuário Estatístico do Brasil,1983.

INEQ - Educação integral 167


então, compreender esse momento como sen- assim, era um mero reprodutor de uma men-
do um marco importante na desvalorização talidade militar. Estava pronto e posto o plano
do professor frente não só a sociedade, até para desenvolver uma nação alienada, acrítica
mesmo em seu plano de carreira, pois houve, e sem identidade própria. De acordo Déa Fene-
com isso, a perda de sua autonomia e da iden- lon (1984), as licenciaturas curtas em Estudos
tidade de classe. Com isso, se cumpre o papel Sociais visavam à realização de um ensino re-
do controle sobre a educação brasileira e nas produtor:
relações pertinentes ao ensino técnico nas es-
colas. O professor idealizado para produzir esse
tipo de ensino, deverá, portanto ser sub-
Nos 1º e 2º graus estavam previstos, após as metido a um treinamento generalizante
mudanças de 1971, a introdução da disciplina e superficial, que conduzirá fatalmente
de Estudos Sociais e isso gerou uma queda no a uma deformação e a um esvaziamen-
padrão da formação dos professores de Histó- to de seu instrumental cientifico. Não há
ria e Geografia, pois agora era prevista a licen- que pensar em fornecer-lhe elementos
ciatura curta. Logo, os professores não mais que lhe permitam analisar e compreen-
exerceriam suas funções na área das ciências der a realidade que o cerca. Ele também
humanas, mas sim ministrariam aulas de Edu- não precisa refletir e pensar, deve apenas
cação Moral e Cívica e Organização Social dos aprender a transmitir.³
Problemas do Brasil( OSPB).
Podemos observar um movimento (pequeno)
A formação dos professores era muito defici- entre os professores de História à medida que
tária, pois eram polivalentes, ou seja, profes- a tomada de consciência foi feita ao percebe-
sores com formação em todas as áreas do rem que perdiam dia após dia sua autonomia
conhecimento: Em Língua Portuguesa, Mate- em sala de aula.
mática, História, Geografia, Ciências da Natu-
reza e Educação Física e isso acarretou uma A intenção do governo nas escolas era de pro-
descaracterização dos profissionais ligados mover a plena concepção cidadã nacionalista,
as Ciências Humanas (FONSECA: 1993). Fato mas não incentivar o sentimento crítico, politi-
é que o ensino de História passou a ser raso co de ser cidadão. Se por um lado as escolas
e superficial, tanto em nível superior quanto estaduais regrediram drasticamente em seus
em nível escolar (o importante nesse momen- índices de alcances, de acesso a população, as
to era a formação técnica, seguindo o modelo particulares tiveram expansão recorde como
norte americano de formação ampla e geral). não se via desde os tempos do Império (BI-
TENCOURT:1990).Tais reformas não se viam
Com isso, o professor ficou refém do livro di- desde 1931, quando foi criado o Ministério da
dático (BITTENCOURT: 2007), com a forma- Educação e da Saúde Pública (MESP). Para
ção geral e voltada para as questões cívicas a Abud(1993), a máxima dominante do estado
formação deste profissional entrou num nível fora estabelecida nesse momento, ou seja, o
de dependência literal do livro didático, sendo Estado exerce seu papel ditatorial através dos

3 - Déa R. Fnelon, A questão dos estudos sociais, in cadernos Cedes/A pratica do ensino de história, São Paulo, Cor-
tez/ Cedes, nº10,1984,p.14. Déa foi umas das grandes figuras contra a licenciatura curta em Estudos Sociais no Brasil.

168 INEQ - Educação integral


seus livros didáticos. Logo, podemos observar dos às empresas (MARTINS: 2000.p.96).
que a década de 1970 foi de um período que
favoreceu grande controle ideológico. Esse Seguramente foi durante o regime militar que
controle tinha o objetivo de combater mem- todo o plano de ensino voltado ao cerceamen-
bros da sociedade que resistiam ao governo to da critica e das formas de expressão dentro
militar como, também, era voltado para total da educação foram traçados e isso gerou a
repressão intelectual. No âmbito acadêmi- degradação na carreira do professor, enquan-
co escolar, a preocupação seria com a forma to ser pensante e modificador do seu tempo.
como seria ensinado e o conteúdo previsto na Esse momento pode ser classificado como um
matriz curricular. PERÍODO SOMBRIO, tanto para os Historiado-
res (pesquisadores), professores de História
2. A criação dos Estudos Sociais e suas Legi- quanto também para a disciplina.
timações.
Se a década de 1970 foi um período verdadei-
Apesar da disciplina de Estudos Sociais subs- ramente difícil para a disciplina de História e
tituir as de História e Geografia nos 1º e 2º seus profissionais, a partir de 1980, uma luz,
graus, essa não se tornava menos importante, um movimento de revolução silenciosa era
pois tinham um número de aulas significativos traçado nos órgãos destinados a trata-la ver-
na grade escolar. dadeiramente com o uma ciência autônoma
e clara, exemplo disso foi o SURGIMENTO da
Logo, o Conselho Federal de Educação( CFE) Associação Nacional de História (ANPUH)4, no
criou cursos de três anos relacionados a for- cenário nacional, reivindicando a autonomia
mação polivalente dos professores com a mis- da Disciplina Histórica.
são de expandir os limites da escola, porém
não com a intenção de formar pesquisadores. É necessário ressaltar que o debate sobre os
A grande intenção com a criação da disciplina marcos importantes dentro da disciplina se
Estudos Sociais era mudar para dar continui- cruzam com a estrutura coletiva e política na
dade ao sistema não velado de suprimir a de- sociedade, pois se ambas encontravam-se em
mocracia. condições conturbadas em seus interiores na
década de 1970, com essa grande repressão a
Diante tal necessidade o Conselho Federal de partir de 1980 elas também se reencontram no
Educação (CFE), viu-se em uma condição tra- momento de abertura das mentalidades, logo
dicional de periodização europeia, aconselhan- as mudanças e as expectativas dentro do en-
do, induzindo as universidades a dividir o ensi- sino de História, estiveram sempre ligados ao
no de História desta forma: Idade Antiga, Idade contexto social da época..
Média e Idade Contemporânea. Cabe lembrar
que a Secretaria Estadual de Educação de São Nesse período, se a sociedade brasileira já co-
Paulo (SEE-SP) ainda contava com um sistema meçava a se manifestar em relação ao regime
de orientação vocacional, voltado a descobrir militar promovendo manifestações, passeatas,
aptidões dos alunos que seriam encaminha- festivais e tantas outras maneiras de abertura

4 - A Associação Nacional de História (Anpuh) é um órgão fundado em 1961 na cidade de Marília, hoje situado no
prédio da Faculdade das Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, com o objetivo de entender a História como
de fato uma ciência humana, primeiramente em âmbito universitário, a entidade surge com manifestos de defesa de
causa pelas fontes históricas e pela legalidade e aceitação das diferentes culturas.

INEQ - Educação integral 169


nesse regime, no campo escolar principalmen- seguiria se expressar nas diversas partes do
te entre os professores de História que eram saber usando a critica e uma posição analítica.
apoiados pela recém-criada ANPUH a situação Logo a educação precisava ser modificada
não foi diferente, pois os mestres já não acei- em sua base, sendo assim, podemos presumir
tavam receber materiais prontos, empacota- que a relação escola-sociedade precisava se
dos, de um órgão superior e queriam também dar de forma mais dinâmica e contemporânea,
participar da elaboração dos conteúdos. É não seria possível uma sociedade em plena
importante relacionar esse momento em que abertura política e também nos campos da
a sociedade brasileira passava por um grande arte e da ciência com uma escola retrógrada,
processo de mudança, pois com o crescimen- com um ensino tacanho, pois o que se viu a
to econômico do Centro Sul, mais necessaria- partir da década de 1980 foi uma grande revo-
mente, da Região Sudeste fez com que hou- lução no campo do saber, principalmente em
vesse um grande processo migratório vindo relação às ciências humanas que, desde 1945,
das regiões Norte e Nordeste. estavam em grande demérito em relação as ci-
ências exatas e biológicas que passaram a ser
Entretanto, região Centro Sul apresentava gran- sinais de progresso escolar, pois possibilita-
de diversidade cultural, novamente a escola vam a formação de cunho tecnológico neces-
(grande lugar de encontro entre essas plurali- sário a vida e imprescindível para o desenvolvi-
dades) começa a se deparar com uma comu- mento da sociedade. Essas seriam geradoras
nidade em si cosmopolita, ou seja essa agora de riqueza para a nação. O que se consegue
era o encontro de várias “sub etnias” dentro do perceber com esse período é que os interesses
seu espaço, com brasileiros que provinham da nação foram superados pelos das multina-
de diferentes usos e costumes em busca de cionais5 que, de forma escancarada, faziam do
oportunidades melhores de vida, e com essas trabalhador uma máquina, usurpando o senso
oportunidades vieram novas formas de pensar critico no trabalhador, que não necessariamen-
e trazer um novo momento dentro da educa- te precisaria pensar, apenas executar suas fun-
ção brasileira.(BITTENCOURT:2008). ções de forma mecânica, rápida e perfeita.

Dentro de toda essa efervescência no campo Na academia, a Nova História Cultural fazia a
das mentalidades é importante ressaltar que integração do Brasil com o mundo trazendo a
a sociedade passava por um novo conceito noção de que o passado tem que ser interroga-
de educação universitária, pois agora o vesti- do, se não seu estudo não faz sentido. Neste
bular cobrava outras aptidões de seus vesti- sentido, o interpretar não pode ser confundido
bulandos, não mais as do passado, baseadas com o inventar, colocando o ensino de História
em um conteúdo fechado, sem flexibilidade. em novos rumos, onde os educandos devem
Nesse contexto, as exigências seriam voltadas se entender como seres responsáveis pela sua
para como o vestibulando articularia as dife- formação social.
rentes áreas do conhecimento, em como con-

5 - Esse momento na História do Brasil deveu-se principalmente à conjuntura internacional, pois a partir da Segunda
Guerra Mundial que terminou em 1945, o sentimento bélico voltado para construir armas, dominar territórios era enten-
dido como primordial para uma nação segura e solida, sendo assim podemos verificar que houve uma super valoriza-
ção das ciências exatas, pois representariam a força em um momento de conflito. Podemos atribuir a esse momento
outra união que foi a invasão das empresas Multinacionais no Brasil, dando força nas décadas de 1960 e 1970 ai
ensino tecnicista no Brasil.

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