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27/11/2020 Bolsonaro cumpre promessa e desconstrói o Brasil - 26/11/2020 - Reinaldo Azevedo - Folha

Reinaldo Azevedo (/colunas/reinaldoazevedo/)

ITAMARATY (HTTPS://WWW1.FOLHA.UOL.COM.BR/FOLHA-TOPICOS/ITAMARATY)

Bolsonaro cumpre promessa e desconstrói o Brasil


Em reunião com forças conservadoras em Washington, o presidente foi profético
sobre o próprio governo

26.nov.2020 às 23h15

O governo de Jair Bolsonaro acaba de comprar mais um conflito estúpido com


a China (https://www1.folha.uol.com.br/mundo/2020/11/embaixada-chinesa-reage-a-eduardo-bolsonaro-e-fala-em-
consequencias-negativas.shtml); ainda não reconheceu a eleição de Joe Biden

(https://www1.folha.uol.com.br/mundo/2020/11/bolsonaro-completa-15-dias-sem-reconhecer-vitoria-de-biden-nas-eleicoes-

presidenciais-dos-eua.shtml) nos EUA; acusou recentemente países europeus de comprar


madeira ilegal do Brasil (https://www1.folha.uol.com.br/ambiente/2020/11/alemanha-e-franca-compraram-
madeira-ilegal-do-brasil-indicam-acoes-da-pf-bolsonaro-ameaca-europeus.shtml) —o que os tornaria, quando

menos, corresponsáveis pelo desmatamento— e é hostil à Argentina


(https://www1.folha.uol.com.br/mundo/2020/09/nao-sei-por-que-a-familia-bolsonaro-se-preocupa-tanto-comigo-diz-alberto-

fernandez.shtml),
um dos principais clientes, ainda que em declínio, da combalida
indústria brasileira.

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O festejado acordo UE-Mercosul (https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2020/09/governo-diz-que-


fracasso-do-acordo-ue-mercosul-vai-aumentar-devastacao-da-amazonia.shtml) é agora só miragem, e o

ingresso do país na OCDE (https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2020/01/brasil-espera-que-apoio-dos-eua-


destrave-processo-de-expansao-da-ocde.shtml) vai ficando mais distante. Bolsonaro é hoje um

dos líderes mais isolados no planeta. Em seu rosto, percebem-se laivos de


nanico orgulhoso, que não se dobra à grande conspiração contra os homens
justos. Não é sem razão que suas honras viris mereceram o reconhecimento de
Vladimir Putin.

Em nota oficial, a embaixada da China reagiu, em termos apropriadamente


duros, à acusação feita por Eduardo Bolsonaro —filho de Jair e presidente da
Comissão de Relações Exteriores da Câmara— de que os chineses pretendem
usar a tecnologia 5G para praticar espionagem. O texto lembra que o país
governado por Xi Jinping, a quem o “capitão” claramente se opôs na reunião
virtual do Brics, responde por 33,5% das exportações brasileiras.

Se não cabia ao Itamaraty pedir desculpas —afinal, não se tratou de


manifestação de governo—, menos apropriado seria reagir com críticas
adicionais à China, como se a nota dura da embaixada representasse uma
ofensa ao próprio governo. Mas foi precisamente o que aconteceu
(https://www1.folha.uol.com.br/mundo/2020/11/em-carta-itamaraty-repreende-embaixada-da-china-por-resposta-a-eduardo-

bolsonaro.shtml). O Ministério das Relações Exteriores tomou as dores do filho do


presidente.

Assim, a família Bolsonaro e o grupo de lunáticos que o cerca —incluindo


Ernesto Araújo, o chanceler— confundem a própria pantomima com a história
e os interesses do país. Os malucos têm uma certeza: a China precisa da soja
brasileira, da carne brasileira, do ferro brasileiro. Logo, não pode advir desse
confronto mal nenhum ao país, e a ameaça de retaliação seria pura bravata.

Não ocorre a esses gênios da raça que os chineses não precisam abrir mão das
commodities brasileiras. Causariam um estrago considerável ao agronegócio,
e ao nosso país, se comprassem menos soja, menos carne e menos ferro do
Brasil. Até em briga de rua, no meu tempo de ser moleque, a gente avaliava

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27/11/2020 Bolsonaro cumpre promessa e desconstrói o Brasil - 26/11/2020 - Reinaldo Azevedo - Folha

antes as consequências de um confronto. A noção de honra, às vezes, a tanto


nos obrigava. Mas nenhum de nós podia fazer mal nenhum a não ser à própria
cara. Esses celerados estão empenhando o futuro do país. Alguma surpresa?

Não. O Brasil tem uma elite econômica temerária —é claro que há notáveis
exceções—, capaz de flertar com o caos sob o pretexto de salvar o país do
demônio. O “mal”, no caso, segundo essa gente, acaba se confundindo com a
cara média do povo brasileiro, que é meio preta e pode morrer de susto, bala,
vício ou asfixia num hipermercado (https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2020/11/homem-negro-
morre-apos-ser-espancado-por-segurancas-do-carrefour-em-porto-alegre.shtml). Já em 2018 eu me

perguntava, e a questão permanece, por que setores do empresariado e do


mercado financeiro imaginavam que Bolsonaro poderia ser a solução para as
suas angústias.

Em parte, sei a resposta. O ódio à política, liderado pela Lava Jato


(https://www1.folha.uol.com.br/ilustrissima/2020/11/pesquisadores-apontam-desvios-da-lava-jato-no-combate-a-

corrupcao.shtml),
levou pesos pesados do PIB brasileiro a acreditar numa espécie de
purificação mística. Se os “espertos”, na narrativa escatológica então
inventada, haviam criado o país da corrupção e da impunidade, talvez nos
faltassem brutalidade e crueza em estado puro.

E existia a personagem que encarnava todos esses baixos instintos —tudo


aquilo que a civilização, na verdade, deve reprimir pelo caminho da educação e
do decoro para que a vida em sociedade seja possível. E Bolsonaro chegou lá,
com seu séquito de neófitos arrogantes e truculentos, vocalizando os
preconceitos mais sórdidos sob o pretexto de conjurar, então, as forças do mal
que teriam se entranhado no país.

Em março do ano passado, numa reunião com forças conservadoras em


Washington, o presidente foi profético sobre o próprio governo: “O Brasil não
é um terreno aberto onde nós pretendemos construir coisas para o nosso
povo. Nós temos é que desconstruir muita coisa.”

Homem de palavra. Ele está desconstruindo o Brasil.

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27/11/2020 Bolsonaro cumpre promessa e desconstrói o Brasil - 26/11/2020 - Reinaldo Azevedo - Folha

Reinaldo Azevedo

Jornalista, autor de “O País dos Petralhas”.


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