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Projeto Acelera SP e o Direito de Pedalar
Projeto Acelera SP e o Direito de Pedalar
São Paulo
2020
Acelera SP e o direito de pedalar
Questão
A partir de uma olhada pela janela de qualquer casa na cidade de São Paulo é possível analisar
os efeitos da urbanização acelerada ocorrida no século XX. Má distribuição de moradia no
território, trânsito que reflete dificuldades de transporte, ônibus e metrôs lotados, acidentes com
veículos, poluição ambiental, visual e sonora, são temas que facilmente conseguimos levantar
após essa observação. (SPOSITO, 2020, p. 62)
A cidade de São Paulo se tornou capital econômica do país por conta da produção e exportação
de café para todo o mundo nos fins do século XIX e início do XX. Estando em localização
privilegiada, entre as fazendas de café no interior oeste paulista, onde o café se adaptou muito
bem ao solo e ao clima, e o porto de Santos, de onde o café escoava para outros continentes, a
capital da província atraiu a elite cafeicultora, que planejava ficar perto de suas propriedades,
mas sem deixar de lado a vida urbana (SINGER, 1977). A tônica do transporte e da mobilidade
está encrustada na História da cidade.
Após este início da prevalência política do automóvel como meio de transporte, podemos citar
ainda o Plano de Avenidas, criado, proposto e levado a cabo pelo engenheiro da Secretaria de
Viação e Obras Públicas e, posteriormente, prefeito Prestes Maia, entre a década de 1920 e
1930, que, como afirma Delijaicov, oprimiu a geografia, o desenho da cidade e os habitantes
(DELIJAICOV, 1999, p. 14). E no âmbito federal, podemos lembrar da política industrial no
segundo governo de Vargas (1951-54), principalmente a automobilística; ou JK (1956-61), com
a criação do GEIA (Grupo Executivo da Indústria Automobilística) para desburocratizar a
entrada de indústrias automobilísticas no Brasil, em que diversas destas se desenvolveram no
ABC paulista (SILVA, 2014, p. 59) e obtiveram vasto crescimento no mercado brasileiro.
Isto porque, no último quarto do século XX, o automóvel particular é alçado como um
instrumento de transporte para facilitar a locomoção familiar, mas também como uma ideologia
individualista que confunde o espaço privado com espaço público e coloca na velocidade toda
sua potência (GORZ, 2010). A popularização e as políticas públicas voltadas para o transporte
privado e sua estrutura rodoviarista crescem, enquanto cai, proporcionalmente, o grau de
investimento no transporte coletivo (SILVA, 2014, pp. 62-81), possibilitando a existência de
duas cidades: uma, automobilística, ligada aos serviços do centro da cidade, de classe média;
outra, periférica, dependente de transporte público, para classes mais baixas da população
(SILVA, 2014, pp. 81-82).
Neste contexto bastante improvável, a bicicleta, pouco a pouco, conquistou algum pequeno
espaço no debate público como ferramenta de transporte. Em 1976, foi inaugurada a primeira
ciclovia da cidade de São Paulo, ao longo de 1.800 metros ao longo da avenida Juscelino
Kubitschek, projeto aprovado pelo prefeito Olavo Egydio Setúbal. Naquela época, a ciclovia
da avenida JK ficou conhecida como “pista para bicicletas”, por se tratar de estrutura tão
específica e tão rara para a cidade naquela época (ESTADO, 1975).
Esta pista para bicicletas era, inicialmente, voltada para um público da Zona Sul, para lazer,
mas também servia como experiência para abertura de vias para o modal. O prefeito dizia que
implementaria projetos de construção de ciclovias na Marginal Tietê, bem como também havia
interesse de diversos vereadores em divulgar a bicicleta como instrumento de atividade física e
transporte ativo (FOLHA, 1976). Alguns anos depois, em 1988, a ciclovia foi desfeita para
construção do túnel Jânio Quadros (ESTADO, 2014), e não se viu mais nenhuma medida para
afirmação deste modal.
Os anos entre 1990 e 2010 foram de uma intensa luta de organizações civis para buscar o
reconhecimento da bicicleta como um veículo de transporte no Código de Trânsito Brasileiro
(CTB), conquistando em 1997 sua inclusão no artigo 58 (HARKOT, 2018), mas que não fez,
ainda, com que a linha da lei entrasse na cultura social dos moradores de São Paulo.
Ao ressuscitar a tradição de São Paulo como “locomotiva do Brasil”, cidade do futuro ou,
basicamente, do trabalho e, atrelado a isto, da velocidade, Dória e Covas criaram em São Paulo
uma atmosfera propensa a liberalização do uso do carro como instrumento de poder, enquanto
outros meios de transporte mais frágeis, ou o simples andar a pé, estivessem mais suscetíveis a
acidentes ou incidentes, como atropelamentos.
Objetivos
Esta pesquisa visa estudar os efeitos da política pública, atrelada ao marketing de campanha,
conhecida como “Acelera SP” da gestão Dória-Covas sobre os efeitos na mobilidade cicloviária
na cidade de São Paulo entre os anos de 2016 e 2020. É possível relacionar dois movimentos
durante o período, relativos à desestruturação e tentativa de reestruturação de uma política de
mobilidade voltada para outros modais que não somente o automóvel, principalmente a
bicicleta.
Buscaremos analisar os dados referentes a atropelamentos, choques e colisões em que as vítimas
estavam em bicicletas na cidade de São Paulo, coletados no site Infosiga SP, para tentar
entender como as políticas públicas de mobilidade poderiam ter evitado estes acidentes e
tornado a cidade mais acolhedora para uma sorte maior de modais.
Isto pois a cidade contemporânea se tornou o espaço para reprodução econômica do consumo.
O ritmo da cidade impulsiona seus cidadãos ao ritmo das coisas, ao ritmo da fábrica,
desumanizando pessoas e transformando a multidão numa máquina do capital (CARLOS, A
Cidade, 2020). O espaço urbano se torna espaço-mercadoria na medida em que reproduz a
lógica social de lugar possível de investimento financeiro, segregando o restante do espaço
social desta atenção, relegado à sobrevivência autônoma distante de políticas públicas
(CARLOS, A privação do urbano e o "direito à cidade" em Henri Lefebvre, 2017).
Porém, a cidade também é local de luta no espaço, pelo espaço. A própria produção do espaço
e reprodução de lógicas econômicas está em torno de lutas pela sobrevivência de atores sociais
que buscam reverter este ciclo (CARLOS, A privação do urbano e o "direito à cidade" em Henri
Lefebvre, 2017, pp. 42-43). Por este motivo, pretendemos também consultar a sociedade civil
organizada para dar voz neste trabalho a estes sujeitos segregados. Membros de coletivos de
fomento ao transporte por bicicleta, como Bike Zona Leste, Bike Zona Sul, da associação de
ciclistas Ciclocidade, do portal de notícias especializadas Vá de Bike, representantes na Câmara
Temática da Bicicleta do Conselho Municipal de Transporte e Trânsito, dentre outros, serão
consultados para relatar e analisar as políticas públicas desenvolvidas na referida gestão no
assunto que nos interessa, transporte e mobilidade na cidade.
Portanto, pretendemos, por um lado, estudar a política de planejamento urbano do “Acelera SP”
e suas consequências na segurança viária a partir do modal bicicleta entre 2016 e 2020; e por
outro, como a sociedade se organiza, pressiona e luta (HARVEY, 2014) para buscar seu direito
à cidade no direito (LEFEBVRE, 2001) de pedalar.
Métodos
Esta pesquisa se inicia no levantamento e análise de dados públicos referentes ao índice de
atropelamentos, colisões e choques na cidade de São Paulo disponibilizados pelo Governo do
Estado na plataforma Infosiga. A análise quantitativa destes dados poderá nos informar regiões
com maior índice de acidentes, ruas e avenidas mais perigosas, faixa etária das vítimas e demais
informações que deveriam ser levados em conta na formulação de uma política inclusiva de
mobilidade.
Porém, podemos pensar ainda esta pesquisa como pesquisa-ação participativa, no sentido que
busca levantar dados, analisar o funcionamento ou não das políticas públicas de mobilidade,
discutir com o corpo social estas análises para, futuramente repensar o modelo adotado e
pressionar o poder público para uma participação popular ativa real, não somente consultiva,
nas instâncias de poder e decisão. Surge desta discussão o termo pesquisa-luta, numa busca
contínua de trazer a ciência para desenvolver a realidade material do humano que é segregado
da cidade-mercadoria, trazendo à tona os saberes cotidianos do pesquisador e dos grupos sociais
envolvidos.
Cronograma
Atividade/Mês FEV MAR ABR MAI JUN JUL AGO SET OUT NOV
Pós-Grad: Cidades,
Planejamento Urbano
e Participação Popular
Pesquisa sobre
Políticas Públicas
voltadas à mobilidade
Pesquisa Histórico do
“AceleraSP”
Levantamento e
Análise de Dados
Bibliografia “Direito
à Cidade”
Bibliog. Mobilidade
Ativa e Ciclística
Contato com Org.
Sociais Ciclísticas
Análise de dados
junto as OS-Bike
Escrita de artigo de
conclusão de curso
Bibliografia
DELIJAICOV, A. (1999). Os Rios e o Desenho da Cidade - Proposta de Projeto para a Orla Fluvial
da Grande São Paulo. São Paulo: Dissertação de Mestrado.
GORZ, A. (2010). A Ideologia Social do Carro. Em A. GORZ, Ecologia. São Paulo: Annablume.
HARVEY, D. (2014). Cidades Rebeldes: Do Direito à Cidade à Revolução Urbana. São Paulo: Martins
Fontes.
SÁVIO, M. (2010). A cidade e as máquinas: bondes e automóveis nos primórdios da metrópole paulista
(1900-1930). São Paulo: Annablume.
SINGER, P. (1977). Desenvolvimento econômico e evolução urbana. Belo Horizonte: Editora Nacional.
"Com críticas a Haddad, Doria diz que limites nas marginais de SP mudam em 25 de janeiro".
UOL, 2016. Disponível em <https://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-
noticias/2016/12/20/limites-de-velocidade-nas-marginais-de-sp-mudam-no-dia-25-diz-
gestao-doria.htm>. Acesso em 15 de novembro de 2020.
“Doria cumpre promessa e aumenta velocidade das marginais em janeiro”. FOLHA de São
Paulo. Disponível em <https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2016/12/1843035-
com-ajuste-doria-anuncia-aumento-de-velocidade-nas-marginais-em-janeiro.shtml>.
Acesso em 20 de novembro de 2020.
“Novo limite de velocidade nas marginais pode ser revisto, diz Haddad”. G1, 2015. Disponível
em <http://g1.globo.com/sao-paulo/noticia/2015/07/novo-limite-de-velocidade-nas-
marginais-pode-ser-revisto-diz-haddad.html>. Acesso em 15 de novembro de 2020.
“Túnel de Jânio engoliu primeira ciclovia de São Paulo”. O ESTADO de S. Paulo, São Paulo.
28 de outubro de 1975. Disponível em
<https://acervo.estadao.com.br/noticias/acervo,tunel-de-janio-engoliu-primeira-
ciclovia-de-sao-paulo,10469,0.htm>. Acesso em 15 de novembro de 2020.