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Introdução
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Pós-Doutor em Estudos Culturais pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Doutor em Sociologia pela
Universidade de Brasília. Professor na Universidade Federal de Sergipe. E-mail: clovisbritto5@hotmail.com
Apoio: CNPq.
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Graduando em Museologia pela Universidade Federal de Sergipe. Bolsista de Iniciação Cientifica PIBIC-
CNPq. E-mail: jheansouza97@gmail.com
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No caso sergipano essa configuração adquire centralidade na medida em que uma das
principais responsáveis pela “escrita do folclore”, a professora Aglaé Fontes, é uma das
fundadoras e das principais estimuladores do grupo de teatro de bonecos. Imprime ações no
intuito de fabricar a imortalidade desse símbolo do “folclore sergipano”, inclusive
empreendendo exposições museológicas: “perenizando a forma do povo narrar suas histórias,
por todo o sempre” (FONTES, 2015, p. 25).
De acordo com Fernando Santos (1979), o teatro de bonecos é uma forma de expressão
de alguns estados nordestinos praticada por “artistas do povo”. Essa forma denominada
mamulengo seria um teatro com características “inteiramente populares”, revelando de modo
próprio “a rica expressividade do dia-a-dia do povo da região” (p. 11). Em suas análises, a
partir do mamulengo é possível recuperar aspectos da história do teatro de bonecos no Brasil,
áreas de sobrevivência, as distinções no meio rural e urbano, ciclo de apresentação, locais e
eventos motivadores, o público, a estrutura funcional do brinquedo, os mamulengueiros, o
espetáculo, os bonecos. No mesmo aspecto, Hermílo Borba Filho (1966) afirma que o
mamulengo consiste em uma das mais autênticas manifestações do nordeste e de teatro
popular “forma de espetáculo total onde o boneco é o personagem integral e público um
elemento atuante” (p. 15), conforme podemos observar em nosso estudo de caso:
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Antes, porém, é bom deixar claro que não entendo cultura popular como um
conceito que possa ser definido a priori, como uma fórmula imutável e
limitante. Talvez possa ser visto como uma perspectiva, no sentido de ser
mais um ponto (de vista) para se observar a sociedade e sua produção
cultural. O fundamental, no meu modo de ver, é considerar cultura popular
como um instrumento que serve para nos auxiliar, não no sentido de
resolver, mas no de colocar problemas, evidenciar diferenças e ajudar a
pensar a realidade social e cultural, sempre multifacetada, seja ela a da sala
de aula, a do nosso cotidiano, ou a das fontes históricas. Não se deve perder
de vista, entretanto, como já ouvi certa vez, que muito mais fácil do que
definir cultura popular é localizá-la em países como o Brasil, onde o acesso à
chamada modernidade não eliminou práticas e tradições ditas pré-modernas
(se bem que todo cuidado é pouco para identificar estas práticas e tradições
como populares) (ABREU, 2003, p. 3).
Visto sob esse entendimento, a ideia de folclore e cultura popular e de práticas a eles
relacionadas, a exemplo do teatro de bonecos, consiste em uma estratégia de produção da
crença no campo de produção simbólico (BOURDIEU, 2002). Nesse sentido, poderíamos
pensar em culturas populares, no plural, e reconhecer os museus como uma das instituições
responsáveis pela consolidação dessas versões, produzindo e difundindo crenças a respeito de
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agentes, grupos e práticas consideradas representativas. Talvez por essa razão, seja oportuno
sublinhar as orientações de Mário Chagas (1990; 1994) quando reconheceu a Museologia e os
museus como um determinado modo de olhar, interpretar e captar a realidade. Desse modo, o
campo de estudo estaria delimitado pelo chamado “Ternário matricial da Museologia”: o
sujeito, o objeto/bem cultural e o espaço/cenário.
É nas interfaces desses elementos que devemos considerar a musealização e a imagem
do museu, inserindo, assim, o componente social e a contemporaneidade como significativos
à compreensão do campo museal, aquilo que alguns autores designam de Museologia Social,
uma museologia centrada nas pessoas e não apenas nos objetos. E é nesse contexto que se
torna fundamental reconhecermos as exposições museológicas como importante recurso para
compreensão dessa configuração.
Os museus e suas expografias consistem em ações de “vigilância comemorativa” e de
“explosões discursivas”. Discursos que contribuem para o que designamos de
monumentalização de agentes, no nosso caso de temas, práticas e personagens, a partir de um
saber fazer relativo ao teatro de bonecos. Nesse caso específico, do Grupo Mamulengo de
Cheiroso. As exposições, nesse aspecto, instaurariam o processo de invenção da imortalidade,
quando uma pessoa ou grupo passa a integrar o patrimônio de uma nação ou região, tornando-
se homem ou mulher-monumento (Cf. ABREU, 1994). Por outro lado, esses mesmos espaços
consistem em locais de fabricação de silêncios, do fortalecimento de versões oficiais, de
combate a versões concorrentes, apresentando certas representações do Nordeste e do Sergipe
por meio da valorização dos textos e contextos apresentados pelas narrativas do grupo de
teatro de bonecos.
Nosso intuito será inventariar tais estratégias de fabricação da imortalidade do folclore e
da cultura popular tendo como estudo de caso a musealização do Mamulengo de Cheiroso por
meio dos processos museológicos na exposição de curta duração “Mamulengo de Cheiroso: a
magia do teatro de bonecos”, no Museu da Gente Sergipana3, e na exposição de longa duração
na “Sala de Cultura Popular”, do Centro Cultural de Aracaju4. Por meio dessa análise,
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O Museu da Gente Sergipana é uma instituição sem fins lucrativos que tem como objetivo a promover a
“cultura sergipana”. Criado no ano de 2011, o museu nasce de uma parceria entre o Governo do Estado e o
Banco do Estado- BANESE (Instituto Banese).
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O Centro Cultural de Aracaju faz parte das políticas públicas desenvolvidas pela Fundação Cultural de Aracaju
- FUNCAJU, para estimular e disseminar as atividades culturais, de educação e arte possibilitando o lazer e
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Um museu, seja ele qual for, só pode ser produzido e reconhecido como tal,
quando está inserido numa codificação social compartilhada, quando faz
parte de uma experiência comum. Sobretudo nas sociedades complexas e
contemporâneas essa experiência que denomino de participação museal é um
dado concreto. Na raiz dessa experiência está aquilo que se denomina de
imaginação museal. É com base nessa imaginação que os museus são
produzidos, reconhecidos, lidos, inventados e reinventados. A minha
sugestão é que a imaginação museal seja compreendida como a capacidade
humana de trabalhar com a linguagem dos objetos, das imagens, das formas
e das coisas. A imaginação museal é aquilo que propicia a experiência de
organização no espaço - seja ele um território ou um desterritório - de uma
narrativa que lança mão de imagens, formas e objetos, transformando-os em
suportes de discursos, de memórias, de valores, de esquecimentos, de
poderes etc., transformando-os em dispositivos mediadores de tempo e
pessoas diferentes (p. 57).
e às culturas populares. Para tanto, além de entrevistas com os curadores das exposições e
integrantes do teatro de bonecos, serão consultados catálogos, folders, matérias de jornais e
sites, além de revisão bibliográfica sobre o teatro de bonecos no Nordeste e especialmente em
Sergipe, visando compreender as escolhas utilizadas para a fabricação de determinadas
crenças sobre essas práticas e sobre determinada “imaginação museal”.
A história do teatro de boneco segundo Hemilio Borba Filho (1966) representa “uma
tradição e uma história tão antiga quanto o homem” percebida pelas referências culturais
carregam através das encenações do teatro de boneco e seus elementos cênicos, narrativas
proferidas nas falas dos personagens, tornando o Mamulengo de Cheiroso um dos elementos
dinâmicos frente às referências culturais locais.
Pensar a musealização dos bens categorizados materiais e imateriais, é constituir uma
nova linguagem para o objeto, é ressignificá-lo dentro de um universo museal sendo este
pensado e classificado a cada etapa do processo museológico frente uma coleção. Sendo
assim o objeto que antes pertencia ao espaço comum de uso passa se tornar substrato
representativo de um repertório ou de uma narrativa museal.
Segundo Waldisa Rússio (1984), a musealização é umas das ferramentas de preservação
que visa a partir da transferência de um objeto do seu contexto original para o espaço
museológico, classificá-lo como documento/testemunho de uma realidade. Ou seja, o
processo de separação, classificação e ressignificação desse artefato instaura uma nova
configuração para objeto, tornando-o suporte de informação que passa a ser reconhecido
como objeto museológico.
Para Desvallés e Mairesse, (2013) a musealização é vista como uma ação que perpassa a
noção de preservação do objeto no espaço museal. Segundo eles há uma transferência de
conceitos, significados, onde as ações práticas de musealização do objeto o coloca em graus
de especialidade:
Assim, há uma cessão de significado onde o objeto passa a ser objeto museal, perdendo
a sua utilidade primordial e adquirindo novo sentido, uma vez que retirado do seu contexto
inicial “perde informações primitivas” e torna-se “substituto dessa realidade que deve
testemunhar” através da comunicação museal.
Nesse sentido, entende-se a musealização como um conjunto de ações técnicas que
relacionadas ao processo de classificação, preservação, e comunicação do objeto, confere a
sociedade a fabricação de novos signos, reconhecendo os espaços museológicos como
“espaços de poder legitimadores de narrativas, promotores de discursos” (BRITTO, 2016, p.
52).
Dessa forma a preservação da memória acionada através da musealização dos bens
culturais que se torna elemento representativo do ser humano com o seu meio, neste caso o
teatro de boneco, contribui para a elaboração de uma linguagem expografica onde
apresentação de narrativas sobre o Mamulengo do Cheiroso no Museu da Gente Sergipana e
no Centro Cultural Aracaju resumiria o que tem de mais “genuíno” nos fazeres e saberes na
cultura “povo sergipano”. De acordo com Fernando Santos (1979):
O mamulengo é um fenômeno vivo, dinâmico, em constante processo de
mutação, de transformação. Sendo de natureza dramática, possui
possibilidades consideravelmente mais amplas de incorporar fatos culturais
do cotidiano, e de absorver inclusive, como veremos, outros folguedos
através de seu processo de representação centrado na teatralização do mundo
que o cerca, levando a cena os brinquedos, as contradições, costumes e
tradições da comunidade onde subsiste. Dessa forma em continua transição o
brinquedo vem apresentando processo de transformação que atestam seu
caráter dinâmico, como a passagem do presépio para o mamulengo, ou do
presépio de fala para o teatro de bonecos mecanizados, as casas de farinha
ou ainda a mudança de roteiros tradicionais para roteiros mais renovadores,
englobando assuntos de interesse atual do público a que se destina, uma
constante renovação e transformação de determinados aspectos do brinquedo
(SANTOS, 1979, p. 34).
Impactos Esperados
Referências Bibliográficas
ABREU, Martha. Cultura popular, um conceito e várias histórias. In: ABREU, Martha;
SOIHET, Rachel (Orgs.). Ensino de História, Conceitos, Temáticas e Metodologias. Rio de
Janeiro: Casa da Palavra, 2003.
ALBUQUERQUE JÚNIOR, Durval Muniz de. A feira dos mitos: a fabricação do folclore e
da cultura popular (Nordeste 1920-1950). São Paulo: Intermeios, 2013.
BOURDIEU, Pierre. A produção da crença: contribuição para uma economia dos bens
simbólicos. São Paulo: Zouk, 2002.
DEDA Ézio. Mamulengo de Cheiroso: para além da boca de cena. In: Mamulengo de
Cheiroso: a magia no teatro de bonecos. Aracaju: Museu da Gente Sergipana, 2015.
FONTES, Aglaé. Um nascer pelo mundo. In: Mamulengo de Cheiroso: a magia no teatro de
bonecos. Aracaju: Museu da Gente Sergipana, 2015.
KOFES, Suely. Uma trajetória, em narrativas. Campinas, SP: Mercado de Letras, 2001.
MENESES, Ulpiano T. Bezerra de. Do teatro da memória ao laboratório da História: a
exposição museológica e o conhecimento histórico. Anais do Museu Paulista, São Paulo, v. 2,
jan/dez, 1994.