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Muito Além Do Silêncio - Jornalismo
Muito Além Do Silêncio - Jornalismo
RESUMO
Essa pesquisa tem como objetivo principal compreender os discursos dos profissionais de imprensa
sobre a questão do suicídio. A partir da revisão bibliográfica sobre o tema e da análise discursiva de
entrevistas com jornalistas, chegaremos à conclusão se o medo e o antigo consenso de que “falar sobre
suicídio causa mais suicídios” é predominante nas redações ainda hoje.
INTRODUÇÃO
Assuntos que são temas tabus na sociedade costumam ser tabus também na mídia. A questão
do suicídio é polemizada nos canais midiáticos por diversos motivos, dentre eles o medo e o
consenso de que ao se falar sobre suicídio é possível influenciar alguém a cometê-lo,
conhecido como “efeito Werther”.
Trata-se de uma referência ao fenômeno do livro Os sofrimentos do jovem Werther escrito
por Johann Wolfgang Goethe no século 18 que conta a história de um jovem que se suicida
por amor. Supostamente diversos jovens se suicidaram após a leitura do romance, apesar de
não existirem provas concretas confirmando essas mortes. Existem estudos que comprovam
essa teoria como por exemplo Etzersdorfer et al. em um estudo austríaco mostrou uma forte
correlação entre o número de jornais distribuídos em várias áreas e o número de subsequentes
suicídios por arma de fogo em cada área depois de uma reportagem midiática.
(ETZERSDORFER et al, 2004)
Da mesma forma, o pesquisador Gerard Sullivan criticou a pesquisa sobre suicídios copiados,
sugerindo que as análises de dados têm sido seletivas e enganosas, e que as evidências para
suicídios copiados são muito menos consistentes do que o sugerido por alguns pesquisadores
(SULLIVAN, 2007).
1
Trabalho apresentado no GT Jornalismo do XVI ERECOM – Encontro Regional de Comunicação e I Ciclo de Estudos do
PPGCOM, realizados na Faculdade de Comunicação da Universidade Federal de Juiz de Fora (FACOM/UFJF) entre os dias
15 a 17 de outubro de 2018.
2
Estudante de Graduação 3º semestre do Curso de Jornalismo da UFJF, email: brunapolesca@hotmail.com.
3
Professor orientador e docente do Curso de Jornalismo da UFJF, email: wedencley@gmail.com.
XVI ERECOM – Encontro Regional de Comunicação
I CICLO DE ESTUDOS DO PPGCOM
15, 16 e 17 de outubro de 2018| FACOM – UFJF
Émile Durkheim já discutia sobre a prática suicida em 1897 e afirmava que “não há dúvida de
que a ideia do suicídio pode ser transmitida de forma contagiosa” (Durkheim, 2003, p. 109).
Ainda no século XIX alguns especialistas pediam que notícias de crimes e suicídios fossem
proibidas de serem veiculadas (idem, p. 124). O sociólogo, em contrapartida, não concordava
com isso, afirmando que “o que pode contribuir para o desenvolvimento do suicídio ou do
crime não é o fato de se falar deles; é a maneira como se fala” (idem, p. 125).
A grande questão a ser discutida é que os jornalistas do mundo inteiro aceitaram essa teoria
como verdade absoluta e evitaram, desde então, noticiar casos de suicídio ou até mesmo
abordar o tema. O aumento do número de suicídios na sociedade, em contrapartida, não foi
evitado com essa prática.
Dados recentes do Ministério da Saúde mostram que o suicídio aumentou gradativamente no
Brasil e no mundo entre os anos 2000 e 2016: de 6.780 foi para 11.736, uma alta de 73%
nesse período (em que pesa o aumento populacional) apesar do silêncio da mídia. Pelos dados
da Organização Mundial de Saúde (OMS) 4, no mundo, há um suicídio a cada 40 segundos.
No total, chega-se a cerca de 800 mil suicídios por ano, sendo a segunda principal causa de
morte entre jovens com idade entre 15 e 29 anos.
Os números são preocupantes e a própria OMS está tratando a causa como questão de saúde
pública. Quando algo acomete uma grande parte da população a mídia não consegue mais
negligenciar e percebe que o assunto virou pauta há muito tempo. Foi produzida uma cartilha 5
para orientar jornalistas de como devem abordar o tema:
Este manual procura enfatizar o impacto que a cobertura midiática pode ter nos
suicídios, indicar fontes de informação confiáveis, sugerir como abordar suicídios
tanto em circunstâncias gerais quanto especificas e apontar as armadilhas a serem
evitadas nas coberturas de suicídios. (OMS, 2000, p.3).
.
METODOLOGIA
A partir dessas informações, foram realizadas entrevistas com seis jornalistas de duas
redações de Belo Horizonte, do Jornal O Tempo e do Jornal Hoje em Dia, a fim de entender
como os profissionais das grandes mídias lidam com essa problemática e o que pensam sobre
os números e sobre o papel da mídia quando se fala sobre suicídio. As entrevistas
aconteceram nos dias 3 e 4 de maio de 2018 e tiveram duração variada entre 4 e 13 minutos.
A partir da pesquisa de campo, iremos analisar a ideologia que sustenta essa prática
4
Disponível em https://nacoesunidas.org/oms-suicidio-e-responsavel-por-uma-morte-a-cada-40-segundos-no-mundo/,
acessado em 27 de setembro de 2018.
5
Disponível em http://www.who.int/mental_health/prevention/suicide/en/suicideprev_media_port.pdf, acessado em 27 de
novembro de 2018.
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discursiva, porque segundo Pêcheux (1975), não há discurso sem sujeito e não há sujeito sem
ideologia: o indivíduo é interpelado em sujeito pela ideologia e é assim que a língua faz
sentido.
O discurso em si é uma construção linguística atrelada ao contexto social no qual o texto é
desenvolvido. Ou seja, as ideologias presentes em um discurso são diretamente determinadas
pelo contexto político-social em que vive o seu autor. Mais que uma análise textual, a análise
do Discurso é uma análise contextual da estrutura discursiva em questão.
OBSERVAÇÕES
“A imprensa não aborda. Vem de um acordo, né? Pra não abordar esses casos porque tem esse
receio que isso estimule outras pessoas né? A também se se matar. ” Repórter, Hoje em Dia
“Assim, já existe uma orientação, e que já se segue na imprensa, de um caso por si só, isolado,
ele não vai ser contemplado. ” Repórter, Jornal O Tempo
“O Avicci, por exemplo, aquele DJ, ele se matou, mas ele era uma pessoa pública, era um
jovem. Mas ah, sei lá, o filho do seu Zé, ali da esquina, se matou(...)” Repórter, Hoje em Dia
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“Por exemplo se foi uma pessoa, uma celebridade, é inevitável como figura pública, (…), não
é viável não publicar. ” Repórter, Jornal O Tempo
“Então um fato isolado é a pessoa atentar contra a própria vida, aquilo vai afetar a família
dela, mas ela tirou a própria vida. Agora, isso a gente já deu casos recentes, inclusive, um
marido, ex-marido inconformado com a separação, que atenta contra a vida da ex
companheira, dos filhos, dos parentes dela, isso sim, porque já tem uma dramaticidade e
envolve mais pessoas. Este tipo de caso, ele vai ser publicado. ” Repórter, Jornal O Tempo
Os jornalistas da pesquisa entendem, sem sua maioria, que casos de suicídio de pessoas
públicas devem ser noticiados por uma questão de serem de interesse público. É importante
ressaltar que não foi citado a forma que se deve noticiar um caso desse tipo, apenas de que é
pauta e deve estar no jornal.
CONCLUSÃO
Foi possível compreender, a partir desses destaques, que a questão do suicídio na imprensa
deve ser analisada discursivamente. Existem discursos que sustentam as ações dos jornalistas
quanto ao assunto que devem ser levados em consideração. As falas dos entrevistados deixam
evidentes as crenças e ideologias que interpelam esses sujeitos e que são responsáveis pela
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falta de pautas nos jornais que tratam sobre o suicídio. É preciso adentrar mais nessas
entrevistas e nos autores que trabalham a Análise do Discurso para entender melhor como
esses mecanismos funcionam e as consequências disso na atividade jornalística (mas isso é
questão para um próximo artigo).
REFERÊNCIAS
PÊCHEUX, M. Les Vérités de la Palice. Maspero, Paris, trad. Bras. Semântica e Discurso, E.
Orlandi et alii, Editora da Unicamp.
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