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Neste texto veremos como se deu a formação do Instituto de Educação, Escola de

Professores, ainda hoje localizada no mesmo prédio original, que foi construído para abrigar o
ensino do professorado em 1930. Como consequência desse período e da gênesis da própria
instituição, trataremos também do ideário reformador da Escola Nova. Com seus grandes
representantes que atuaram no projeto da Escola de Professores do Instituto de Educação:
Fernando Azevedo (quem projetou o edifício e era o Diretor-Geral de Instrução Pública do
Distrito Federal); Anísio Teixeira (quem ocupou o cargo de Fernando Azevedo, já mencionado);
e Carlos Werneck (diretor da Escola Normal à época).

O discurso escolanovista de uma escola ativa, progressiva, se traduzia bem na


arquitetura do Instituto de Educação, com várias comunicações da estrutura escolar com pátio
interno; e, acessos diretos ao teatro, a cinemateca e ao ginásio destinados à comunidade –
sem necessidade de adentrar o ambiente escolar – percebia-se fisicamente o intuito de
ampliação do ensino. Não só em seus ideais, mas arquitetonicamente, através de sua
disposição material. O prédio era monumental ao exterior, pela sua influência neocolonial fora
da escala humana, o que contrastava com seu interior que parecia ergonicamente planejado.

Diana Vidal em seu texto sobre a escola e de que falamos, esclarece essa
representação escolanovista na organização do seu espaço físico:

“A diversidade dos espaços apontava para vários usos que o ensino, baseado na experiência,
na vivência dos estudantes, como pregavam os reformadores cariocas alicerçados em
discursos da Escola Nova, exigia.”

A localização escolhida para o prédio também representava a estratégia reformadora


de Fernando Azevedo. Instalado no bairro da Praça da Bandeira( ou ainda Tijuca, para
moradores da redondeza), na Rua Mariz e Barros; o local pretendia acesso a diversos públicos,
pois o início da rua era próximo à Estação de Ferro Leopoldina – o que permitia acessibilidade
às “periferias”, ao Centro e a Zona Sul; seu final, na Praça Saens Pena ,era o ponto de encontro
dos moradores do bairro e dava oportunidade de chegada a residentes de outras áreas da
zona norte.

O bairro da Tijuca era reconhecido por alocar o maior número de colégios notados
como de qualidade à época, são os seguintes exemplos: Colégio Militar, Colégio Batista,
Instituto Lafayette. Após a construção do prédio - que ocorreu na década de 20 e findou em
1930, em seu primeiro ano, o Instituto de Educação, alojou somente os estudantes da Escola
Normal que antes era sediada no Largo do Estácio, mas logo integraria outros segmentos de
ensino.

Em 1931, assim que Anísio Teixeira assume a direção, a Escola Normal transforma-se
em Escola dos Professores. Passam a compor a estrutura de ensino do Instituto de Educação,
escola de professores, escolas primárias e secundárias; além do jardim de infância. Essa
“transformação ampliativa”, usando a mesma terminologia de Anísio Teixeira, ainda levaria a
Escola de Professores ser integrada à Universidade do Distrito Federal posteriormente.

Porém as escolas secundarias, primária e jardim de infância, eram subordinadas a


escola dos professores, não tinham autonomia administrativa nem independência na
metodologia do ensino, serviam de “laboratório” a formação dos professores. Mais uma vez
recorrendo ao texto de Vidal, veremos com mais clareza essa característica:

“As Escolas Secundária e Primária e Jardim de Infância mantendo, cada qual, sua
organização autônoma e direção privativa, eram apontadas como campo de experimentação,
demonstração e prática de ensino aos cursos da Escola de Professores. As atividades das
escolas giravam em torno das necessidades da formação para o magistério. Ao diretor da
Escola de Professores competia a superintendência administrativa do conjunto, inclusive
sendo responsável pela indicação dos demais diretores, que serviam em comissão.”

Sobre a ocupação do prédio pelas escolas e seus espaços, seus três pavimentos se
organizavam da maneira qual explicitaremos adiante. O pavimento térreo agregava: Sala da
diretora da Escola Primária; auditório (teatro); salas de aula (primário); salas de serviços
médico e dentário; ginásio de esportes; pátio interno, em seu centro um chafariz; sala da
inspetoria; auditório para canto orfeônico; e banheiros.

O segundo e terceiro pavimento dividiam-se entre as Escolas Secundária e de


Professores. Pela manhã, os alunos secundaristas ocupavam os pavimentos; pelo período
vespertino, as normalistas. No segundo andar também se localizavam: administração;
secretaria; entradas para o ginásio e a galeria de teatro; banheiros; dois laboratórios de
química; três ateliers de desenho à mão livre e geométrico; oficina para trabalhos manuais; e,
armários identificados com números para a acomodação dos materiais dos alunos.

O terceiro andar era destinado à administração, nele se alojavam: sala da


Congregação; três salas ocupadas pelo Museu de História Natural; três salas ocupadas pela
biblioteca; salas específicas para as aulas de Higiene, Química e Física; laboratórios de Física e
Higiene; sala de aula de piso contínuo e sala dos professores. O Arquivo, vezes estava no
segundo, vezes ,no terceiro pavimento, dependia da demanda administrativa. O Jardim de
Infância ocupava um prédio isolado, que tinha sua entrada por um dos acessos laterais do
prédio.

Nota-se a presença numerosa de laboratórios, isso se deve à perspectiva de escola


ativa, viva, presente no ideário da Escola Nova. Vejamos um trecho em que Diana Vidal nos
mostra a relevância desse aspecto com o depoimento de uma ex-aluna:

“As aulas, no Instituto de Educação, procuravam, ao máximo, serem vivas. Algumas traziam
perigo e eram aceitas receosamente, como relata D. Helena:

O prof. Carlos Werneck levou uma cobra d´água, com os ovinhos para nascerem às cobrinhas.
O diretor, na ocasião, ficou morrendo de medo. O prof. Werneck levava sapo para vermos como era o
sistema nervoso do sapo. Quando se apertava determinadas partes, a defesa do sapo era soltar veneno .
Então a gente tinha que se proteger. Eram o mais possível aulas ao vivo. Não eram aulas mortas. Havia
um esqueleto. Os ossos todos armados direitinho para que , na hora de exame ,pudéssemos dizer o
nome daqueles ossos todos. Havia uns professores que diziam ‘elas vão ser professoras... não vão ser
médicas, para que tudo isso?’ Em Higiene também aprendíamos como a reprodução de micróbios era de
uma rapidez incrível, se botássemos uma coisa que se estava deteriorando, nós acompanhávamos tudo
pelo microscópio. Era tudo assim.

Na falta de matéria viva, recorriam-se as projeções:


Então, por exemplo, em Geografia, nós tínhamos a sala de Geografia, que tinha mapas de todos
os países do mundo, e a sala de aula onde o professor dava a aula técnica, quer dizer ,de conhecimento.
Depois nós tínhamos salas- museus ,em que era tudo mostrado. Tínhamos projetores. As aulas eram
muito com projeção.”

Logo em seguida a autora nos mostra como esses ideais reformadores se davam no
corpo docente:

“Nem todos os professores seguiam a Escola Nova. No dizer de D.Helena, ‘os


empistolados’ ou aqueles que não faziam parte da ‘patota do Anísio Teixeira’ continuavam
com aulas tradicionais, ‘de cuspe’. Para sua turma, havia três tipos de professores no Instituto:
‘cultos’, ‘semicultos’ e ‘empistolados’. O simples fato de empistolado não impedia o mestre de
professar princípios escolanovistas.”

Acerca do corpo discente, as presenças eram praticamente restritas ao sexo feminino,


influência de política promovida pelo Departamento de Educação. Essa tendência feminina
não era exclusividade das escolas, constatava-se também nos cursos oferecidos pelo Instituto
de Educação a professores já formados e abertos à comunidade.

Essas moças em sua maioria eram residentes da própria Tijuca, ou de bairros da zona
norte e central. Optavam pelo magistério por afinidade familiar, ou, porque nesse período as
oportunidades de emprego dadas as mulheres eram praticamente nulas; ou eram “donas do
lar”, ou então enfermeiras – profissão que não tinha boa visibilidade social, salvo as formadas
na Escola Ana Nery. Nem todas as alunas eram provenientes de famílias dotadas de recursos
econômicos satisfatórios, ou seja, das camadas médias da sociedade. A fim de ajudar a
diminuir possíveis desigualdades, havia uma Caixa Escolar que custeava um auxílio à aquisição
de uniformes e material para esse público menos favorecido. Outro incentivo era o ganho de
um pequeno provimento salarial direcionado para alunos do curso profissional Normal,
quando em estágio substituíam professores faltosos.

Apesar desse ambiente que tendia a diminuir as desigualdades entre os alunos,


contraditoriamente, a competição entre eles era incentivada; os melhores, tido como
exemplares eram selecionados para uma turma especial, que se vulgarizou como “gases
nobres”.

Essa competitividade era fruto de um sistema rígido de cobrança e disciplina. Todos os


alunos deviam ter ciência e seguir as normas da instituição presentes nas “Instruções relativas
a disciplina escolar e aos deveres e direito dos alunos”. Com intuito de aumentar o controle
sobre o discente, havia a hierarquização do corpo, a qual cada turma teria de escolher dois
representantes – dentro do período de seis meses a escolha era refeita. Um representante
mediava os diálogos com a administração, e o outro, com a inspetoria e os professores. Além
das mediações eram guardiões do estatuto da escola, tinham obrigação ter comportamento
social e disciplina louváveis; e ainda, serem frequentadoras assíduas e pontuais, que eram
incumbidas de vigiar as colegas, no que diz respeito às designações sobre o uniforme oficial e
de educação física.

Sobre a uniformização e a estrutura arquitetônica da instituição, Diana Vidal escreveu:


“Uniforme e edifício eram dois signos de status para as normalistas e de reforço ao
controle disciplinar. Distinguiam-nas das demais estudantes.”

Quanto à obtenção dos títulos para o exercício do magistério, era necessário que as
secundaristas concluíssem o ciclo fundamental (composto de cinco anos) e mais o
complementar (esse formado por dois anos). Para formação de professores primários bastava
conclusão de um ano complementar; já para professores secundários, exigia-se a extensão
completa por dois anos.

A Escola Primária tinha seu uniforme de acordo com as cores dos secundaristas e
normalistas. Tinha deficiência de espaço para realização de atividades físicas e na
infraestrutura de conteúdos sonoros (aspecto bem preponderante na educação de crianças,
músicas, áudio-livro e etc.). No inicio as crianças formavam ao pátio e seguiam o professor,
com tempo adquiriram autonomia escolar e até interferiram no seu ambiente de
aprendizagem. Como Vidal ,ao transcrever sua entrevista com D.Helena ,nos mostra:

“Encantador era passar pelas salas antes do início das aulas e ver os pequeninos do
primeiro ano preocupados com uma florzinha que dispunham melhor nesta ou naquela jarra,
com um novo quadro que traziam para a sala de aula... E tudo isso faziam sozinhos, sem a
presença da professora. Não raros eram os pais, que trazendo o filho à Escola, não se
detivessem também em apreciar o interesse com que as crianças procuravam melhorar o
ambiente em que iam passar o dia.”

Interessante notar a liberdade dada às crianças para interagir na sua sala de aula,
porém essa característica ,avançada para o seu tempo histórico, foi logo amputada pela
adequação da instituição aos parâmetros reformadores; que ,por sua vez, tinha o ensino
primário como laboratório de experiência da escola de professores. Sobre esse aspecto, para
elucidarmo-nos melhor, cabe a transcrição de alguns trechos escritos por Diana Vidal, em “Lá
Vem o Bonde das Normalistas”.

“Em 1933, para melhor cumprir os objetivos da reforma educacional realizada por
Anísio Teixeira, foram reduzidas as turmas de primário, passando a funcionar a Escola apenas
de manhã. Realizavam-se os ajustes necessário à nova função laboratorial do ensino. A
primária tornava-se campo de observação e pesquisa das alunas da Escola de Professores.
Servia como local de investigação pedagógica às professorandas e de aprimoramento a sua
prática docente. As professoras da Primária, assim, deveriam estabelecer seu planejamento
em acordo com as necessidades da Escola de Professores, sendo fiscalizadas no cotidiano das
aulas pelo ingresso constante de professorandas observadoras. Seus métodos e sua conduta
eram discutidos por alunas e mestres da Escola de Professores. A vigilância se fazia constante.”

Com a redução das turmas, a falta de autonomia e independência profissional; o


quadro docente da escola primária ficou prejudicado, e impossibilitado, de dar
prosseguimento na rotina escolar – mesmo com o menor número de turmas. Para solucionar
esse problema ,as professorandas foram requisitadas. As alunas que obtivessem melhor
desempenho nas aulas de práticas pedagógicas eram designadas para ocuparem as funções.
Apesar dos reveses do aprofundamento da orientação reformadora, o Instituto seguia
empenhado em implementar “um ambiente educacional de acordo com os novos objetivos da
educação pública”. Com a frequência escolar em baixa, aliada a desestruturação da Escola
Primária, tentou-se corrigir essas falhas com programas de premiações.

O ano seguinte de 1932 teve seu início focado na reorganização administrativa e na


reorientação da Escola Primária. Em suma ,a formação do Instituto de Educação tinha como
objetivo suprir as expectativas dos reformadores escolanovistas. Para concluir ,dando ênfase
nesse aspecto da Escola Nova, reflitamos com a afirmação de Diana Vidal:

“O Instituto de Educação, surgido da incorporação do Jardim de Infância, Escola


Primária e Secundária à Escola de Professores, tentava cumprir a função, integrando o ensino
das diferentes unidades, à formação científica do professorado carioca.”

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