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A DINÂMICA POPULACIONAL DOS PAÍSES DESENVOLVIDOS

E SUBDESENVOLVIDOS

(1)
João YUNES

YUNES, J. — A dinâmica populacional dos países desenvolvidos e subdesen-


volvidos. Rev. Saúde públ., S. Paulo, 5:129-50, 1971.
RESUMO — Analisam-se os principais fatôres que contribuiram para a dinâ-
mica populacional dos países desenvolvidos e subdesenvolvidos, a política por
êles adotada, bem como a aplicação da demografia em saúde pública. O ritmo
de maior crescimento populacional observa-se nos países subdesenvolvidos
sendo que, para o ano 2.000, a região denominada de terceiro mundo é a que
apresentará o maior contingente populacional pois os países subdesenvolvidos
contribuirão com 79% do total da população mundial. A primeira transição
demográfica iniciou-se no século 17, na Europa, com o processo de revolução
industrial enquanto que, nos países subdesenvolvidos, isto ocorreu a partir do
ano de 1940, porém, com uma diferença fundamental, pois a queda de morta-
lidade verificada não foi acompanhada por um declínio significativo da nata-
lidade nem da modernização de suas economias. Entre os principais fatôres
que afetam a mortalidade e a fertilidade analisou-se a influência do desenvol-
vimento econômico e social e dos avanços no campo da medicina e da saúde
pública. Está sob uma política antinatalista oficial 66% da população dos
países subdesenvolvidos e os contraceptivos mais utilizados têm sido, em ordem
decrescente, o dispositivo intrauterino, esterilização e pílulas. Sòmente a
Índia, em 4 anos (1964-68), esterilizou 5.200.000 habitantes com uma idade
média de 32,2 anos. Entre as principais aplicações da demografia em saúde
pública destacam-se o planejamento de saúde, migrações, epidemiologia e hi-
giene materno-infantil.
UNITERMOS — Dinâmica populacional*; Demografia*; Política populacio-
nal*; Saúde pública.

1. INTRODUÇÃO

O crescimento populacional é, no mun- sões, que envolvem a política populacio-


do hodierno, sem dúvida, um dos temas nal, são discutidas tanto em países desen-
mais debatidos e as conseqüências dêste volvidos como subdesenvolvidos, o esfôrço
aumento um dos mais controvertidos. deverá ser concentrado no estudo, análise
No momento em que importantes deci- e investigação de caráter científico que

Recebido para publicação em 11-3-1971.


(1) Do Centro de Estudos de Dinâmica Populacional do Departamento de Epidemiologia da Fa-
culdade de Saúde Pública da USP, Av. Dr. Arnaldo, 715, São Paulo, SP - Brasil. Da Disci-
plina de Pediatria Social da Faculdade de Medicina da USP, São Paulo, SP - Brasil. Apre-
sentado no "Seminário sôbre o Ensino da Proteção à Saúde Materna-Infantil, em função
das Necessidades da Comunidade, Salvador, nov. 1970" e no "Curso Internacional sôbre
Problemas Prenatais, Brasília, DF, nov. 1970".
possam superar a natureza apriorística e guerras, manteve baixo o crescimento
e o nível emocional que, freqüentemente, populacional.
dominam a controvérsia. As teses pró- Para a população mundial duplicar-se
natalistas e teses a favor do contrôle da a partir do comêço da Era Cristã foram
natalidade se opõem, sem que se elabo- necessários 1650 anos. O primeiro cál-
rem importantes distinções a respeito de culo digno de confiança data dêste ano
fatôres como a densidade demográfica, em que a população estimada era de 500
os recursos naturais, as tendências das milhões de habitantes. Nos dois séculos
taxas de natalidade, o processo de urba- seguintes esta cifra dobrou. Em menos
nização, isto é, fatôres demográficos, eco- de um século duplicou-se novamente e
nômicos, sociais e culturais que determi- com as taxas atuais de crescimento, do-
nam a conveniência de opções políticas brará novamente em um têrço de século
concretas, suscitando uma das mais agu- (Tabela 1) 2.
das controvérsias de nossa época.

1.2 Crescimento populacional

O presente trabalho tem por objetivo,


indicar a possibilidade de adoção de uma
política populacional para os países sub-
desenvolvidos em geral e para o Brasil
em particular. Para tanto, analisa-se o
crescimento populacional e a transição
demográfica ocorridos nos países desen-
volvidos e subdesenvolvidos, bem como os
principais fatôres econômicos e sociais
que afetaram a mortalidade e fertilidade.
Considera-se a situação da política popu-
lacional nos países subdesenvolvidos e a
dimensão que a demografia pode ter na
aplicação em saúde pública.
A rápida expansão populacional veri-
A fonte de dados secundários mais uti- ficada na Tabela 1, não foi devida a um
lizada foi a das Nações Unidas e, a se- crescimento homogêneo da população. O
guir, apresenta-se os principais resulta- rítmo de maior crescimento se observa
dos desta análise. nos países considerados subdesenvolvidos,
Apesar da dificuldade de se obter enquanto que as nações desenvolvidas per-
dados estatísticos fidedignos, o conheci- manecem pràticamente estacionárias, isto
mento geral do incremento populacional é, crescem em rítmo acentuadamente me-
no passado apresenta-se bastante claro e nor, conforme se verifica nas Tabelas 2
a sua constatação serve de valioso marco e 37.
de referência para a consideração do pro- De acôrdo com os dados apresentados,
blema atual. as regiões de maior contingente popula-
Durante a maior parte da história da cional por ordem decrescente são repre-
humanidade, a população mundial au- sentadas pela Ásia, Europa, África, Amé-
mentou a um rítmo lento, uma vez que rica Latina, União Soviética, América do
tanto o coeficiente de natalidade quanto Norte e Oceania. Para o ano 2.000 com
o coeficiente de mortalidade eram eleva- as taxas de crescimento previstas, ocorre-
dos. A mortalidade em massa, devido a rá uma alteração nesta ordem. As re-
epidemias freqüentes, inanição periódica giões que apresentarão por ordem decres-
cente um tamanho populacional maior se-
rão: Ásia, África e América Latina, se-
guindo-se os outros continentes. Portan-
to, para o ano 2.000, a região denomina-
da do terceiro mundo é a que apresenta-
rá o maior contingente populacional, pois
os países subdesenvolvidos contribuirão
com 79% do total da população, sendo
60% da Ásia, 9,6% da África e 9,4%
da América Latina. Os países desenvol-
vidos contribuirão com apenas 21% da
população mundial.
Esta situação está preocupando muito
mais os países desenvolvidos. Estaria aí
a razão da política do contrôle populacio-
nal e do financiamento, por parte dêstes
países, nos programas de contrôle da na-
talidade ?
Esta problemática será discutida com
maiores detalhes porém, é digno de nota
ressaltar-se que o principal fator respon-
sável pela queda de mortalidade nos paí-
ses desenvolvidos ocorreu quando êstes
ingressaram no processo de desenvolvi-
mento industrial.

1.3 Transição demográfica


A diversidade na tendência da morta-
lidade e do comportamento reprodutivo
entre os países desenvolvidos e subdesen-
volvidos é explicável pela chamada tran-
sição demográfica.
No passado, o aumento populacional
apresentou um padrão de crescimento, em
geral, semelhante, com algumas varia-
ções locais. Foi na Europa, mais ou me- Não se sabe, exatamente, qual é o prin-
nos na metade do século 17, que se ma- cipal fator que determinou a queda, po-
nifestou a primeira transição demográfi- rém, se considera que a taxa decrescente
ca e que se repetiu em outros países, à de natalidade está associada ao processo
medida que êstes passavam por um pro- de industrialização, urbanização, aumen-
cesso de revolução industrial. to do nível educacional, participação da
Os elevados coeficientes de natalidade mulher na força do trabalho e do desa-
e mortalidade, são características típicas parecimento da atitude fatalista em rela-
das economias agrícolas pré industriais. ção ao nascimento e à morte infantil. Os
países que já efetuaram a transição de
À medida que uma sociedade agrícola uma economia agrícola, de baixos ingres-
começa a transformar-se em uma estru- sos, para uma urbana e industrial, com
tura econômica mais moderna, a morta- ingressos mais altos, seguiram estas eta-
lidade começa a diminuir. À medida pas. Portanto, no início, as taxas eleva-
que se desenvolve a economia, há uma das de natalidade e mortalidade compen-
maior oferta de trabalho, as cidades cres- sam-se entre si e o resultado é um cresci-
cem e se urbanizam, os transportes são mento demográfico lento. Numa segun-
melhores e mais rápidos, eleva-se a pro- da fase começa a queda de mortalidade
dutividade e o ingresso per capita e, con- com manutenção da natalidade ainda em
seqüentemente, um melhor bem estar so- nível alto, trazendo como conseqüência o
cial. A revolução industrial produziu acelerado aumento populacional. Numa
enorme progresso no conhecimento cien- terceira fase, a mortalidade e natalidade
tífico, contribuindo para o contrôle de equilibram-se a um nível muito mais bai-
muitas doenças endêmicas, permitindo, xo e o crescimento novamente é lento.
em alguns casos, eliminar certas enfermi- Êste processo denomina-se transição de-
dades. Os países atualmente desenvolvi- mográfica.
dos passaram por esta etapa que lhes per-
mitiu beneficiar-se dêste desenvolvimento, Os países altamente desenvolvidos já
reduzindo sua mortalidade. passaram por estas etapas. Em algumas
áreas do mundo em que êste fenômeno
No padrão histórico típico, decresce, ocorreu, está se processando uma nova
primeiro, a mortalidade enquanto que a mudança, em que a prosperidade econô-
natalidade se mantém alta por um certo mica tem dado lugar a um incremento
tempo. Portanto, existe um período ca- moderado de população, que se ignora
racterizado por uma natalidade elevada por quanto tempo perdurará.
e uma mortalidade declinante. Na atua-
lidade, esta última sofreu tão rápida re- Por volta de 1940, as nações menos
dução que levou alguns autores a deno- desenvolvidas iniciaram uma mudança
minarem o fenômeno de "explosão demo- demográfica. Um nôvo padrão começou
gráfica". Há dúvida quanto a existên- a aparecer que, em certos aspectos, se
cia da verdadeira "explosão demográfi- assemelha à antiga transição demográfi-
ca". Com o tempo inicia-se uma nova ca mas, ao mesmo tempo, apresenta di-
etapa de transição demográfica. As pes- ferenças fundamentais porque ocorre em
soas começam a limitar deliberadamente uma época muito diferentes da do séc. 17.
o número de filhos trazendo, como con- Existe, atualmente, possibilidade de re-
seqüência, a queda da natalidade. Êste duzir-se o coeficiente de mortalidade sem
processo é o resultado de um grande nú- modernização da economia agrícola. No
mero de decisões pessoais e não de uma passado, os conhecimentos médicos desen-
política oficial de contrôle populacional, volveram-se a um rítmo lento, concomi-
mesmo porque, durante esta fase de tran- tantemente ao de transformação econô-
sição demográfica, não havia contracep- mica. Algumas das armas mais efetivas
tivos mecânicos, químicos ou hormonais. contra a enfermidade e a morte, tais co-
mo os quimioterápicos, antibióticos e vá- Embora o conhecimento das condições
rios inseticidas, são produtos mais recen- de mortalidade, nos primeiros séculos,
tes dos países industrializados, inclusive seja precária, é evidente que a duração
posteriores à queda das taxas de morta- de vida, neste tempo, foi curta. Uma
lidade e natalidade e o aparecimento do tábua de vida, constituída a partir dos
padrão de família reduzida1. registros de óbito na Grécia, indica uma
Os países menos desenvolvidos têm po- média, na esperança de vida, de 30 anos,
dido aproveitar-se dos conhecimentos mé- no ano de, mais ou menos, 400A. C. Es-
dicos e de saúde pública dos países de- timativas na esperança de vida, em vá-
senvolvidos, reduzindo sua mortalidade, rios países europeus, do séc. 13 ao 17,
sem haver modernizado suas economias. baseadas em dados fragmentados, varia-
ram de 20 para 40 anos. No séc. 18,
Muitos países subdesenvolvidos têm
1755-1776, a esperança de vida ao nas-
ainda índices de mortalidade e de espe-
cer variou de 33 para 40 anos (Suécia
rança de vida ao nascer idênticos aos da
33,2 anos para o homem e 35,7 anos pa-
Europa em 1915 e os níveis econômicos
ra a mulher; França 37,5 anos para am-
bem como o padrão geral de vida, aos bos os sexos). Êstes dados podem ser
de 1840 a 1850. comparados com a esperança de vida ao
Uma das conseqüências demográficas nascer na Índia, durante os anos de 1921-
da estagnação ou do pequeno progresso 1931, que foi de 27 anos. Êstes níveis
econômico e social nos países não indus- contrastam com a vida média européia
trializados é a manutenção de índices de que é, hoje, de 65 anos ou mais, em mui-
natalidade elevados. tos países europeus.
Portanto, o que caracteriza os países As indicações do coeficiente de morta-
subdesenvolvidos, quanto a sua dinâmica lidade entre os países europeus, durante
populacional, é a queda brusca da mor- o séc. 18, também evidencia a alta mor-
talidade, ocorrida, sobretudo, após a se- talidade. Nas duas primeiras décadas do
gunda guerra mundial sem ser acompa- séc. 19, a mortalidade, em tôda Europa,
nhada no declínio da fertilidade que per-
manece com taxas elevadas. excedia a 32 óbitos por mil habitantes,
cêrca de três vezes, em média, maior que
a atual.
2. FATÔRES ECONÔMICOS E SOCIAIS QUE
AFETAM A MORTALIDADE As condições de mortalidade na Euro-
pa e Estados Unidos, há 150 a 200 anos
Mudanças no padrão de mortalidade atrás, são as mesmas que as apresentadas
estão relacionadas com a mudança da es- hoje na maioria dos países subdesenvol-
trutura social e econômica. Alguns dos vidos.
mesmos fatôres sociais e econômicos que
afetam a mortalidade também afetam a As informações que serão apresentadas
fertilidade e a migração. a seguir parecem sugerir que as condi-
ções de vida da sociedade européia, que
2.1 Fatôres que contribuíram para a foram responsáveis por uma alta morta-
alta mortalidade lidade, não foram muito diferentes da-
quelas prevalentes hoje nos países subde-
2.1.1 Nos países desenvolvidos senvolvidos.

Os registros mostram que a população 2.1.1.1 Fome e escassez de alimentos


européia teve um coeficiente de mortali-
dade tão alto quanto os agora observados Na metade do séc. 19, as populações
na maioria dos países subdesenvolvidos. européias foram vítimas de inanição fre-
qüente. A falta de transporte fazia com ção. Em Londres, em 10 anos (1681-
que cada pequena localidade dependesse 1690), a mortalidade por varíola foi de
de sua própria colheita e uma falha des- 3 óbitos por mil habitantes. Nos séculos
ta, resultaria em inanição, mesmo que, 17 e 18, êste coeficiente, freqüentemente,
em localidades relativamente perto, a co- alcançava um índice de 4,5/mil, sendo
lheita fôsse normal. Durante o séc. 18 responsável por cerca de 1/10 de tôdas
a França, o mais rico país do continente, as mortes. A varíola foi, pràticamente,
sofreu repetidos períodos de inanição. eliminada um século após a descoberta
Pelo menos 9 severas falhas da colheita da vacina, sendo a última epidemia se-
foram registradas nos países escandina- vera desencadeada no continente europeu,
vos entre 1740 e 1800, e, cada uma de- no período de 1870-1873.
las, resultando em um acentuado aumen- O tifo é registrado como tendo asso-
to do coeficiente de mortalidade. Na lado a Europa desde o séc. 17 até fins
Noruega, o coeficiente de mortalidade, em do séc. 19. As epidemias por tifo ocor-
1741, foi três vêzes maior que em 1736- riam em épocas próximas a guerras e pe-
1740, tendo morrido, no referido ano, ríodos de inanição, responsabilizando-se
1/15 da população, tendo sido a princi- por um enorme número de vítimas.
pal causa, a falha de colheitas, que asso-
lou todo o norte dos países europeus. Na A tuberculose, embora não ocorresse
Suécia, durante a severa inanição de sob a forma epidêmica, foi uma das prin-
1773, o coeficiente de mortalidade ele- cipais causas de morte na população jo-
vou-se para 52,5/mil habitantes8. vem (crianças e adolescentes).
Todos os grupos etários parecem ser Estudos das causas destas calamitosas
afetados pela escassez de alimentos. É epidemias, geralmente, indicam que elas
na criança que o crescimento e o desen- foram devidas, em grande parte, ao pre-
volvimento é atrasado ou permanente- cário saneamento do meio e higiene pes-
soal, os quais, por sua vez, estavam ìnti-
mente retardado.
mamente ligados à falta de conhecimen-
tos médicos e os baixos padrões de con-
2.1.1.2 Epidemias
dições de vida.
Até recentemente, a peste, cólera, va- 2.1.1.3 Condições das áreas urbanas
ríola, tifo e outras enfermidades ocorre-
ram freqüentemente na Europa, agrava-
Na Europa, antes do século 20, o coe-
das pela carência de alimentos, foram res-
ficiente de mortalidade foi maior nas ci-
ponsáveis por elevada mortalidade.
dades do que em outras áreas. SÜSSMILCH
Gilson estimou que a peste, no ano 543
apudUNITEDNATIONS8 estimou que, em
D.C., foi responsável pela morte de cem
Brandeburgo (1739-1748), o coefi-
mil pessoas. Esta enfermidade exten-
ciente de mortalidade foi ao redor de
deu-se por tôda a Europa e permaneceu
25/mil habitantes nas áreas rurais,
por várias décadas. Somente em 1348,
31/mil em cidades menores e 36/mil em
a peste matou cêrca de 25 milhões de
grandes cidades como Berlim. Em Es-
habitantes, 1/4 da população européia
tocolmo, nos anos de 1775-1776, de acôr-
dessa época 8. do com PRICE apud UNITED NATIONS8,
Doenças, como varíola e febre tifóide, a esperança de vida ao nascer era, sò-
foram disseminadas durante todo o tem- mente, de cerca de 14 anos para o ho-
po. Quando as epidemias coincidiam mem e 18 anos para a mulher, enquanto
com os anos de más colheitas, o aumento que, para a Suécia como um todo, era
da mortalidade era bem maior. de 33 e 36 anos respectivamente. Nos
A varíola era responsável por grandes Estados Unidos, em 1830, as condições
epidemias antes da introdução da vacina- de mortalidade foram bem piores nas
grandes cidades do que nas pequenas e Em áreas de alta mortalidade, as doen-
nas áreas rurais. A maior mortalidade ças transmissíveis foram responsáveis por
urbana do que a rural persistiu em alguns uma grande parte dos óbitos. Na Índia,
países até mesmo no fim do séc. 19. a cólera, varíola e a peste assumiram pro-
Nesta época, WEBER apud UNITED NA- porções consideráveis e a tuberculose é
TIONS 8, reportou o excesso de mortalida- elevadamente prevalente. Pelo menos, es-
de urbana, em relação à rural, nos EUA, tima-se que cem milhões de habitantes
Rússia, Inglaterra e Holanda. Êste au- sofrem anualmente de malária e cêrca de
tor associou a variação da mortalidade 2 milhões morrem por ano, direta ou in-
com o grau de aglomeração e atribuiu a diretamente, como conseqüência desta
maior mortalidade urbana a uma maior doença. Em muitos países, o coeficiente
"negligência" e "indiferença" urbana 8 . de mortalidade por diarréias e enterites
As condições da vida urbana na Euro- é elevado, a febre tifóide e tifo são en-
pa e América, nos séculos 18 e 19, é su- dêmicas e epidemias por varíola não são
ficiente para indicar algumas das razões raras. Em Porto Rico, onde a mortali-
da excessiva mortalidade urbana. As ci- dade tem caído consideràvelmente em
dades, nesta época, encontravam-se con- anos recentes, a diarréia e tuberculose
gestas, insalubres, com muitos doentes e participam com mais de 1/3 do total do
eram formadas por grandes aglomerados, número de óbitos nos anos próximos de
habitações com precaríssimas condições 1940.
de higiene que se agrupavam ao redor Na maioria dos países africanos, as
dos locais de trabalho. Dentro das in- principais causas de morte incluem a
dústrias havia precária ventilação, a tem- doença do sono, malária, tuberculose, es-
peratura era muitas vêzes bem elevada, quistossomose, ancilostomíase, lepra, doen-
a iluminação precária, as horas de tra- ças venéreas, varíola, pneumonia e desnu-
balhos longas e exaustivas e o risco de trição. O coeficiente de mortalidade ge-
acidentes era maior. As ruas eram es- ral foi estimado para o período de 1939-
treitas, com precária rêde de abasteci- 1946, na África do Sul entre 21 e 25/mil
mento de água e esgôto e ausência de habitantes comparado com 9/mil para a
áreas para recreação. Tais condições
população européia.
predispunham a um aumento de morta-
lidade, principalmente da criança. Os fatôres sociais e econômicos respon-
sáveis pelo baixo nível de saúde são seme-
2.1.2 Nos países subdesenvolvidos lhantes em tôdas as áreas dos países sub-
desenvolvidos. O saneamento do meio é
Tem sido assinalado em muitos estudos precário; a deficiência nutricional é ele-
que a alta mortalidade é característica vada, tornando a população mais suscep-
das regiões econômicamente subdesenvol- tível às doenças; os serviços de saúde
vidas da África, Asia e América Latina, existentes são inadequados e uma grande
estabelecendo relação com os baixos ní- parte da população tem baixo poder aqui-
veis de vida, educação e dificuldades de sitivo para manter sua saúde protegida.
assistência médica.
Quando os dados, para mostrar a re- Geralmente dentro dos países subdesen-
lação entre os coeficientes de mortalida- volvidos de hoje, a má nutrição é crôni-
de e certos índices de condições econô- ca, as doenças infecciosas são endêmicas,
micas e sociais, são disponíveis, êles indi- as quais, periòdicamente tornam-se epidê-
cam que a alta mortalidade é associada micas, contribuindo como causa mais ime-
à baixa renda per capita, elevado índice diata pelo excesso de mortalidade nestas
de analfabetismo, grande contingente de áreas. Estas causas são sintomas de po-
população rural e grande número de ha- breza, estando envolvidos fatôres políti-
bitantes por médico. cos, culturais, religiosos e geo-físicos.
2.2 Fatôres que contribuiram para a re- disponibilidade de fertilizantes artificiais,
dução da mortalidade meios de transporte e comunicações. A
inanição foi eliminada, habitações mais
2.2.1 Nos países desenvolvidos adequadas foram construídas, roupas me-
lhores foram viáveis, houve um aumento
O comêço do séc. 19, especialmente a da renda familiar. Todos êstes fatôres
partir de 1850, constata-se o grande pro- contribuiram para a melhoria da saúde
gresso que se começou a alcançar no da população.
combate a enfermidades e mortes e no
prolongamento da vida humana. Estudos 2.2.1.2 Influência das legislações so-
da redução da mortalidade que ocorreu ciais
nêste período e as mudanças econômicas
e sociais que a acompanharam, mostram A elaboração de uma legislação sani-
a maior evidência da relação entre mor- tária e o estabelecimento de agências de
talidade e fatôres econômicos e sociais. saúde estatais, principalmente na Ingla-
terra e Estados Unidos, contribuíram pa-
A redução do coeficiente de mortalida- ra a redução da mortalidade. Outro fa-
de não foi uniforme para os diferentes tor importante foi o aumento da idade
grupos etários. Nos países europeus, a mínima para o trabalho da criança e da
redução da mortalidade, a partir do séc. mulher e a melhoria do meio ambiente
20, tem sido, geralmente, mais acentuada de trabalho. Isto se verificou para a
nos casos de crianças e adolescentes. Pa- Inglaterra, Alemanha e outros países eu-
ra o grupo etário acima de 75 anos o ropeus. Na França e Inglaterra, uma
decréscimo registrado tem sido discreto. lei estabelecida em 1850 e 1851, respec-
Na Suécia, entre 1751-1800 e 1901-1945, tivamente, autorizou a condenação das
a mortalidade para o grupo etário menor habitações insalubres.
de 15 anos foi reduzida de 72 a 84%.
Esta redução para o grupo etário com 2.2.1.3 Influência do desenvolvimento
mais de 65 anos, para o período de 1901- do saneamento do meio
1945, foi de 32%. Na Suécia, a redu-
ção ocorreu, primeiro, entre crianças me- Foi no séc. 19, também, que ocorreu
nores de um ano, depois, para o grupo uma grande expansão dos serviços públi-
etário de 1- 5 anos e, finalmente, para cos e, entre êles, houve uma melhoria
o grupo de 5 - 14 anos. Na Inglaterra, considerável do saneamento do meio.
no entretanto, na segunda metade do séc. Estabelecimentos públicos para remoção
19, a mortalidade foi maior para o grupo dos dejetos começaram a operar, em
etário de 5-14 anos que para crianças Londres, em 1848 e, em 1865, se instalou
menores de 5 anos. a rêde de esgôto. A purificação do su-
primento de água iniciou-se no comêço
2.2.1.1 Influência do desenvolvimento do séc. 19 com a instalação de filtros de
econômico areia em Paris. Em Londres, contou-se
com êste recurso em ampla escala a par-
Indubitàvelmente, a redução acentuada tir de 1829 mas foi sòmente ao redor de
da mortalidade na Europa, a partir do 1875 que o uso de filtro espalhou-se atra-
séc. 18, tem sido devida, principalmente, vés da Europa. O tratamento de água
à grande melhoria da situação econômi- através da cloração começou a ser prati-
ca da população, através da industrializa- cado no início do séc. 20. Nesta época,
ção, desenvolvimento comercial e agríco- a maioria dos países do mundo ocidental
la e ao avanço, da medicina e saúde pú- e a Rússia já tinham introduzido siste-
blica que se verificou nestes países. Ou- mas de abastecimento de água e remo-
tros fatôres contribuintes foram a meca- ção dos dejetos, contribuindo para a me-
nização da agricultura, inovações técnicas, lhoria das condições gerais de saúde.
Como resultado da melhoria das con- duzida em mais de 95%. Na Checoslo-
dições de saneamento a mortalidade por váquia em 1919, a mortalidade por tu-
tifo, cólera, peste e as doenças do apa- berculose e doenças da infância decres-
relho digestivo declinaram consideràvel- ceram marcadamente. Comparativamen-
mente. Houve, também, um interêsse te, pouco avanço tem sido feito no con-
crescente na higiene pessoal. O uso do trôle às doenças degenerativas, as quais,
sabão, que até então era considerado lu- primariamente, afetam pessoas idosas.
xo, tornou-se de uso mais comum no séc.
19. 2.2.2 Nos países subdesenvolvidos
Na maioria dos países da América La-
2.2.1.4 Influência do desenvolvimento tina, Ásia e África, uma longa série his-
das ciências e dos programas tórica de dados de mortalidade apresen-
de saúde pública tam-se bastante precários e falhos. É
Antes do séc. 19, a redução da morta- evidente, no entretanto, que a mortalida-
lidade foi resultado, primeiramente, da de nestas regiões do mundo, quase que
melhoria dos fatôres não médicos pois, universalmente permaneceu muito alto até
era pouco conhecido, neste tempo, o pa- relativamente anos recentes.
pel que desempenhavam os organismos Em relação às causas responsáveis pela
patogênicos na etiologia das enfermida- queda da mortalidade nos países subde-
des. Desde então, importantes descober- senvolvidos, três importantes fatôres me-
tas no campo médico e de saúde pública recem ser mencionados:
têm sido associadas a mudanças bruscas a) Enquanto nos países europeus o de-
na mortalidade. Por exemplo, a vacina- clínio de mortalidade foi dependente
ção contra a varíola foi uma medida sim- do desenvolvimento econômico e cien-
ples e bastante eficaz para o contrôle da tífico, os países subdesenvolvidos be-
enfermidade considerada até então, tal- neficiaram-se da importação destas
vez, de maior letalidade. técnicas e conhecimentos.
A mortalidade decorrente de doenças
infecciosas e de epidemias foi reduzida b) É possível alcançar a redução da
substancialmente a partir do último sé- mortalidade nos países subdesenvol-
culo como resultado dos progressos so- vidos a um preço relativamente bai-
ciais, econômicos e médicos. Incluídas xo. Como a mortalidade nestes paí-
nesta categoria encontram-se as doenças ses foi extremamente alta, uma gran-
como: febre tifóide, escarlatina, coque- de redução foi possível com a apli-
luche, malária, varíola e tifo. cação de técnicas simples e relativa-
A redução das doenças infecciosas foi mente baratas.
responsável pela redução da mortalidade, c) O declínio da mortalidade não pode
principalmente, nas crianças e no grupo ser sempre atribuído ao melhoramen-
etário jovem. Estas doenças reduziram- to das condições econômicas da po-
se de 87%, na Inglaterra, entre os anos pulação. A saúde pública e as téc-
próximos de 1850 e o ano de 1947. Nes- nicas médicas têm contribuído para
te período, a diarréia e enterites, princi- a manutenção e o aumento da vida
pal causa de morte na infância, foi re- média do homem, sem um acompa-
duzida de 86% e a pneumonia em 53%. nhamento na melhoria das condi-
Nos Estados Unidos, no período de 1900- ções econômicas. Portanto, os paí-
1946, o coeficiente de mortalidade por ses subdesenvolvidos têm podido
pneumonia foi reduzido em cêrca de aproveitar-se dos conhecimentos mé-
80% e de tuberculose acima de 80%. A dicos e de saúde pública sem ter ha-
mortalidade por diarréia e enterites e por vido modernização de suas econo-
doenças transmissíveis da criança foi re- mias.
A rápida queda na redução da morta- Concluindo, as sulfas, antibióticos, in-
lidade pelo qual muitos países da Améri- seticidas, assim como o saneamento do
ca Latina, Ásia e África passaram duran- meio foram as armas mais efetivas no
te as décadas mais recentes, é ilustrada combate às enfermidades e a mortalida-
através da queda da mortalidade geral de. Êstes produtos são recentes e foram
que se verificou em 9 dêstes países (1) em importados dos países industrializados ao
que o seu coeficiente foi de 21/mil em redor de 1940. Em muitos países em
1932; 15/mil em 1947 e 13,5/mil em via de desenvolvimento a esperança de
1949. vida já se situa ao redor dos 60 anos e
Durante a década de 1935-1944, a nos industrializados, em cêrca de 70 anos.
mortalidade no México por varíola de-
cresceu de 35,4% e por difteria em 3. FATÔRES ECONÔMICOS E SOCIAIS QUE
25,3%. O uso de inseticidas (DDT) AFETAM A FERTILIDADE
que desempenhou um importante papel
na campanha antimalárica, também con- 3.1 Tendência da fertilidade nos países
tribuiu, consideràvelmente, para a redu- desenvolvidos
ção da mortalidade por várias outras
doenças transmissíveis veiculadas por in- O declínio da natalidade é um dos fe-
setos (febre amarela, doença do sono, ti- nômenos mais discutidos no campo da
fo exantemático). Em Porto Rico, a demografia. Na Europa, o coeficiente de
mortalidade por malária decresceu de natalidade, para o período compreendido
125/cem mil habitantes, em 1941, para entre 1735-1800, variou de 31-41 nasci-
32/cem mil, em 1946. mentos vivos por mil habitantes. Com
flutuações muito pequenas, a natalidade
A introdução de métodos preventivos foi mantida nestes níveis até o início de
através do saneamento do meio, especial- seu declínio que se verificou no último
mente em relação à água e deposição de período do séc. 19. Entre os anos de
dejetos, produziu melhora no estado de 1841-1845 e 1876-1880 houve uma va-
saúde da população. Na Região da Ba- riação pequena da natalidade (30-32/mil
cia Amazônica no Perú, por exemplo, hab.) para um período relativamente
antes do programa de saneamento do grande. Nesta época, a França tinha
meio 99% das crianças em idade esco- uma natalidade de 25,8/mil e a Alema-
lar foi considerada portadora de infec- nha de 39/mil habitantes 9.
ção ou infestação parasitária. Após apli-
cação do programa, 4 anos mais tarde, Uma vez iniciada a queda da natali-
esta taxa baixou para 58%. O custo das dade ela continuou, quase que ininter-
medidas preventivas em saúde, embora ruptamente, em quase tôda a Europa, até
seja inicialmente alta, pode ser, ràpida- 1933-1935, quando o valor mínimo foi
mente, compensada por uma redução nos atingido. Esta tendência não foi pràti-
gastos que as doenças teòricamente evitá- camente alterada pela primeira guerra
veis custariam. GIGLIOLI apud UNITED mundial, com exceção da França, Irlan-
NATIONS 8, colculou o custo do tratamen- da e Bélgica em que a natalidade, entre
to hospitalar por malária, nas Guianas 1921-1930, foi maior do que de 1911-1920.
Inglêsas, em 1943, em US$ 1.47/hab. A natalidade nos Estados Unidos, as-
O uso de DDT, com um custo de US$ sim como na França, declinou depois do
0.63/hab., reduziu o gasto do tratamento ano de 1800. O coeficiente de natalida-
hospitalar desta moléstia para US$ 0.32/ de de 55/mil, em 1800, foi maior que
hab. em 1947. nos países europeus. Em 1933, êste coe-

(1) Egito, Guiana Britânica, Chile, Costa Rica, El Salvador, Jamaica, México, Porto Rico,
Ceilão.
ficiente atingiu o valor de 18/mil e em tigações em diversos países sugerem que
1970, 17,6/mil. o método mais largamente utilizado tem
A queda da natalidade na Europa va- sido a interrupção do coito, técnica co-
riou de acôrdo com a região considerada. nhecida por muitos séculos.
Para a natalidade cair de 30/mil para Na maioria dos países, a prática do
20/mil decorreram mais de 70 anos para abôrto tem sido menos importante que o
a França, 40 para a Suécia e Suíça e 30 uso de contraceptivos na redução do ta-
para a Inglaterra e Dinamarca. manho da família, embora haja algu-
O Japão é o único país que não é ha- mas evidências de que a prática do abôr-
bitado por pessoas predominantemente to está aumentando em alguns países. Em
descendentes de europeus e que experi- um número reduzido de países, a prática
mentou um declínio da natalidade similar do abôrto tem sido permitida legalmente
aos Estados Unidos e países europeus. A por motivos médicos, engênicos, crimi-
natalidade no Japão de 35/mil (1921-5) nais ou sócio-econômicos.
declinou para 27 (1938) e 19 (1970).
a) Mudança de atitude em relação ao
3.1.1 Fatôres econômicos e sociais tamanho da família
Vários estudos mostram que os ricos
são "menos férteis" que os pobres. Os autores mais recentes acreditam que
Os opositores de Malthus (na época o declínio da fertilidade é devido a um
de sua controvertida declaração, no fim complexo de causas interrelacionadas,
do séc. 18), afirmaram que um aumento atuando uma sôbre a outra, trazendo co-
da prosperidade econômica seria sempre mo conseqüência a sua queda. Alguns
seguida por um declínio da fertilidade. tentam explicar que a idéia de limitar
Na França, a explicação da redução o número de filhos e espaçar os nasci-
da fertilidade para a classe alta foi atri- mentos tem sido adotada, generalizada-
buída ao amor à luxuria, avanço na es- mente em países industrializados, em tro-
cala social e desejo de evitar a subdivi- ca da tradicional idéia de ter o número
são de propriedades para herdeiros. de filhos que a "natureza" forneceu.
Vários autores citam diversos fatôres Tem sido atribuídas diferenças de ati-
da vida moderna que podem contribuir tudes em relação ao declínio da mortali-
para a redução da capacidade reproduti- dade infantil. Se as pessoas planejam
va, tais como: aumento do alcoolismo e um número definido de filhos, a redução
das doenças venéreas, maior participação da mortalidade infantil causará, certa-
da mulher na fôrça de trabalho, decrés- mente, a redução do número de nasci-
cimo das relações sexuais devido ao maior mentos.
"stress" emocional na vida urbana mo- Entre as principais razões dadas para
derna. Alguns dêstes fatôres têm sido não ter filhos ou muitos filhos, as mães,
sugeridos como contribuintes e não como em geral, apontam o mêdo ao desemprê-
agente causal direto no declínio da ferti- go, razões econômicas e acomodações ha-
lidade. Não há prova também de que a bitacionais.
freqüência do alcoolismo e de doenças ve- A origem da atitude da limitação do
néreas tenha aumentado durante o pe- tamanho da família foi aceito, primei-
ríodo em que a natalidade decresceu. ramente, pela classe alta depois pelos
Há concordância quase universal de demais segmentos da sociedade. Por
que o declínio no tamanho da família tem exemplo, a queda da fertilidade mais rá-
sido devido a prática da limitação da pida em cidades pode ser devida ao ínti-
natalidade. A queda da natalidade ocor- mo contato das classes sociais mais baixas
reu bem antes do desenvolvimento mo- com as classes que primeiro praticaram
derno das técnicas contraceptivas. Inves- a limitação do tamanho da família.
Eventos históricos, tais como a Revo- c) Mobilidade social
lução Francesa, Crises Econômicas, De-
pressão na Inglaterra em 1875, influên- O desejo de melhorar a posição na es-
cia da opinião pública, etc., são consi- cala social tem sido apontado como um
motivo importante para a limitação do
derados como tendo sido favoráveis à ati-
tude de limitação do tamanho da famí- tamanho da família.
lia. O efeito da mobilidade social sôbre a
fertilidade parece ser atribuída, em ge-
A libertação do tradicionalismo, com
ral, ao fato de que criar uma criança
conseqüente mudança dos valores e pa-
significa gastar dinheiro, tempo e esfôr-
drões de comportamento, é também cita-
ço, os quais poderiam ser utilizados para
do como fator contribuinte para o declí-
subir na escala social. Desta maneira, a
nio da fertilidade.
mobilidade social é mais factível com um
número pequeno de crianças do que com
b) Urbanização
um grande.
O declínio da fertilidade tem sido pre- d) Status da mulher e organização fa-
cedido e acompanhado, em todos os paí- miliar
ses, pela urbanização. É comum os au-
tores afirmarem que a população urbana A mudança no status e no papel da
é "menos" fértil que a rural. mulher tem sido uma das razoes para a
A relação entre o processo de urbani- diminuição do tamanho familiar.
zação e queda da fertilidade é complexa. Fatores freqüentemente mencionados
A maioria dos autores acredita que as como contribuintes para a mudança de
grandes cidades modernas favorecem o atitude da mulher são:
desenvolvimento de atitudes motivando a — Aumento do nível educacional.
limitação do tamanho da família. Al- — Igualdade para a mulher em muitas
guns autores chegaram a afirmar que o esferas da vida pública.
meio urbano é uma condição essencial — Igualdade do papel da mulher no ca-
para o desenvolvimento desta atitude samento.
("mentalidade urbana"). — Oportunidade para um maior desen-
Entre os principais fatôres que favore- volvimento da personalidade e inde-
ceram a limitação da natalidade em ci- pendência.
dades citam-se: Vida famliar menos coe- — Maior grau de participação da mu-
sa; crianças não são consideradas uma lher na fôrça do trabalho. Tal fator
vantagem econômica; aspiração de me- tem sido freqüentemente relacionado
lhor status social e econômico; prevalece ao grau de urbanização e industriali-
maior racionalização e libertação de tra- zação. Diversos censos têm mostra-
dições. do que o número de filhos de mulhe-
res casadas que trabalham é menor
É importante chamar a atenção que,
que o das que não trabalham.
em geral, a diferença entre fertilidade
— Com a industrialização, as atividades
urbana e rural existiu em muitos países
econômicas exigem que a mulher fi-
antes do início da queda da natalidade que fora do lar, competindo com o
(séc. 17 e 18 na Europa e América do seu trabalho caseiro e com as ativi-
Norte). No séc. 19, a fertilidade urbana dades de cuidar de crianças. Hoje
e rural começou a decrescer em alguns é largamente aceito que nas socieda-
países, sendo que a queda da urbana foi des industrializadas as mulheres evi-
mais rápida. Em geral, tem sido encon- tam criar crianças ou restringe seu
trado que quanto maior é a cidade mais número a fim de manter o emprêgo
baixa é a fertilidade9. fora de casa.
— A mudança no padrão da organiza- nuição do número ideal de filhos. Como
ção familiar tem sido responsável pe- resultado, as crianças têm que ser man-
lo declínio da natalidade e do tama- tidas por seus pais por um período mais
nho familiar. Um importante fator, longo. O melhor padrão da assistência
responsável pela queda da fertilidade, médica, o maior cuidado dedicado à cri-
foi a transição de família tradicional- ança e o aumento do padrão geral de
mente estável para instável. vida, aumentaram substancialmente o
Autores mais recentes enfatizam que custo da criação da criança.
a família não é mais a unidade eco-
nômicamente produtiva e que a sua f) Ocupação
função na criação da criança tem si-
do favorecer principalmente um maior Censos em diversos países fornecem
nível educacional e vida associativa. dados do número de filhos de mulheres
Conseqüentemente, um aumento da casadas, classificadas pela atividade eco-
concentração emocional sôbre a crian- nômica de seus esposos. Geralmente,
ça tem paradoxalmente sido a razão quanto mais diferenciada é a ocupação
para a limitação do tamanho da fa- e melhor a qualificação da mão de obra,
mília. menor é a fertilidade.

e) Nível de vida e custo na criação de g) Educação


crianças
Estudos sôbre fertilidade, relacionados
As famílias são menores nos países ao nível educacional do marido e da mu-
onde os níveis de vida são mais altos. lher, têm geralmente mostrado que quan-
Dentro do período da queda da natali- to maior escolaridade, menor é o número
dade os ricos têm, geralmente, menos cri- de filhos. Em geral, as mulheres de ní-
anças do que os pobres, o que tem sido vel colegial e universitário têm baixa fer-
sugerido que um aumento na riqueza di- tilidade, casam menos do que a popula-
minui a fertilidade. Tem sido notado ção em geral e o fazem em idade mais
que, acompanhando a queda da natali- avançada (principalmente as universitá-
dade entre os ricos, o declínio tem sido rias) .
apresentado também nos grupos pobres.
Particularmente isto tem sido verdadeiro h) Religião e padrões de casamento
para as grandes cidades.
O aumento do ingresso econômico tor- Tem sido, muitas vêzes, admitido que
na possível uma maior seleção das ativi- o declínio do interêsse religioso tem con-
dades no lazer e no tempo. O cuidado tribuido para a limitação do tamanho da
à criança pode ser considerado uma in- família. É inferido que o interêsse re-
terferência na satisfação de outros dese- ligioso tem diminuído, como valor tradi-
jos. cional, à medida que o pensamento ra-
O custo econômico na criação de cri- cionalista tem lugar.
anças aumentou consideràvelmente du- Em geral, quando há praticidade da
rante o período de declínio da natalida- religião, a prática do uso de contracepti-
de. O emprêgo de crianças em agricul- vos é menor e a fertilidade é maior, com-
tura e indústrias tem sido cada vez mais parativamente com os não praticantes.
restringido. A influência da legislação, Grandes diferenças têm sido observa-
proibindo o emprêgo de crianças, obriga- das na fertilidade diferencial dos diversos
toriedade no atendimento escolar e a ex- grupos religiosos. Numerosos estudos sô-
tensão do período educacional, tem sido, bre Católicos, Protestantes e Judeus, em
muitas vêzes, responsabilizado pela dimi- vários países Europeus e nos EUA, Ca-
nadá e Austrália, têm demonstrado que Para a América Latina a natalidade
a fertilidade é geralmente maior entre os nos anos de 1932-1938, variou de 30 nas-
católicos e menor entre os judeus. Con- cimentos vivos por mil habitantes (Ve-
tudo, mesmo a fertilidade entre católicos nezuela) para 47,7/mil (Guatemala).
tem declinado enormemente em todos os Para o período de 1946-1950, êste coefi-
países europeus e nos EUA. As diferen- ciente variou de 33,1/mil (Chile) até
ças de fertilidade entre os grupos religio- 48,0/mil (Brasil) e 50,5/mil (Guatema-
sos, tomados como um todo, parecem es- la). Para 1970, êste coeficiente variou
tar ìntimamente relacionadas às diferen- de 22/mil (Argentina) para 49/mil (Hon-
ças econômicas e ocupacionais discutidas ras) 5. Êste aumento de fertilidade que se
anteriormente. Entre membros da mes- verificou para anos mais recentes, tem
ma ocupação e nível econômico, os cató- tido diversas interpretações, entre elas, a
licos, em média, são mais férteis que os melhoria do registro de dados. Para os
protestantes. No entretanto, as diferen- países da África, Ásia e Oceania a na-
ças de fertilidade entre pessoas da mesma talidade alcançou, para o período de
religião mas de diferentes graus de ocupa- 1946-1950, o valor de 43,0/mil no Egito,
ção, ingresso per capita, nível educacio- 43,4/mil em Singapura e 46,0/mil em
nal, etc., são muito grandes. Nova Zelândia e para 1970 a natalidade
A proporção da dissolução de casamen- oscilou de 22,6 (Nova Zelândia) para 50
tos ou da viuvez tem sido considerada (Nigéria).
como menos importante na mudança de Embora os dados para países com alta
fertilidade a longo prazo. fertilidade sejam fragmentados, a natali-
dade parece estar geralmente em tôrno
i) Outros fatôres ou acima de 40/mil.
A queda da mortalidade entre crianças
e jovens tem sido um dos fatôres respon- 3.2.1 Fatôres que afetam a alta fertili-
sáveis para o declínio do tamanho da fa- dade
mília. A proporção de crianças que so-
brevivem tem aumentado, o que indicará 3.2.1.1 Padrões de casamento
uma carga maior para o seu sustento.
Deficit habitacional, pobreza, insegu- Onde os dados existem, êles geralmen-
rança econômica, desemprêgo e mêdo de te mostram que, em países de alta ferti-
guerra têm sido outras causas que suge- lidade, o casamento de mulheres ocorre
rem a explicação do declínio da natali- em idades mais precoces. No Ceilão
dade. (1946) 71% das mulheres no grupo etá-
rio de 20-24 anos foram ou estavam ca-
3.2 Tendência da fertilidade nos países sadas; na Índia (1931) esta proporção
subdesenvolvidos foi de 95%. No Egito (1946) 88%;
Para êstes países, a estatística de nata- Trinidade (1946) 62%; Peru (1940)
lidade, quando existe, é de qualidade bas- 52%; Brasil (1940) 46%. Esta propor-
tante precária. As populações da Áfri- ção menor de casamentos para a América
ca, Ásia, América Latina e da Oceania Latina em relação aos da Ásia e África
(fazem exceção os europeus ou seus des- foi atribuída a um grande número de
cendentes) apresentam alta fertilidade. casamento consensual.
Possìvelmente, na maioria dos casos, a
natalidade foi mais alta do que na Eu- 3.2.1.2 Fatôres sociais e econômicos
ropa Ocidental antes do início da grande
queda que começou nos meados do séc. — Menor prática da limitação da nata-
19. lidade.
— Casamento em idade precoce: alguns 4. POLÍTICA POPULACIONAL
autores acreditam que a reprodução,
nestes países, está perto do limite da Como foi descrito na análise do cres-
capacidade biológica. cimento populacional, os continentes que
compõem o assim chamado terceiro mun-
— Baixo nível educacional. do são os que apresentarão o maior con-
— Grande dependência das atividades tingente populacional quando comparado
agrícolas. com os países que formam o mundo de-
senvolvido.
— Baixo nível econômico. Esta situação preocupa, cada vez mais,
— Atitude fatalista em relação ao nas- os países, principalmente os desenvolvi-
cimento e morte. dos. Recentemente, o Presidente do Ban-
co Mundial (Robert Mac Namara (1) ) de-
— Injunções religiosas. clarou que um bilhão de nascimentos de-
— Forma de organização familiar. vem ser "evitados" no Terceiro Mundo,
nos próximos 30 anos, para conter a ex-
— Alta mortalidade resultando em pe- plosão demográfica. De 68 países sub-
queno número de crianças com sobre- desenvolvidos, 20 têm política oficial de
vida. contrôle populacional e programas de
planejamento familiar, 20 não têm po-
3.2.1.3 Fertilidade diferencial lítica definida mas desenvolvem progra-
As diferenças de fertilidade urbano-ru- mas de planejamento familiar e 28 não
ral, por tipo de ocupação, religião e edu- têm nem política oficial e nem progra-
cação apresentam, em linhas gerais, o mas, conforme Tabela 5.
mesmo grau de interpretação da análise De acôrdo com a posição governamen-
feita para os países que apresentam ferti- tal, 66% da população de todos os países
lidade baixa. subdesenvolvidos está sob uma política

(1) A Folha de São Paulo, 22 set. 1970. p. 19.


antinatalista oficial. O continente que Nos países subdesenvolvidos, os con-
mais contribui com esta política é o asiá- traceptivos mais utilizados pelos progra-
tico, pois 98% da população da Ásia mas de planejamento familiar são, em
Oriental e 81% da Ocidental estão sob ordem decrescente: Dispositivo Intra Ute-
uma política oficial de contrôle popula- rino (DIU), Esterilização e Pílulas. Sò-
cional. A distribuição populacional por mente a Índia, durante um período de 4
região sob os diferentes tipos de políticas anos (1964-68), esterilizou 5.200.000
populacionais a que estão submetidas, é habitantes, com uma idade média de 32,2
apresentada na Tabela 6. anos; o Paquistão 597.000, a Tailândia
123.000 pessoas. A seguir, apresentamos, e controvertido problema da relação en-
por país, o número acumulado de recep- tre tamanho da população, índice de cres-
tores por tipo de contraceptivo utilizado cimento populacional e desenvolvimento
em alguns países. econômico deve-se, em cada caso parti-
Pode-se afirmar, no entretanto, que a cular, estudar as condições concretas de
taxa de natalidade, na maioria dêstes paí- relação entre recursos naturais e popula-
ses, não foi reduzida. Não estaria a ção e a capacidade de assimilação de mão-
queda da fertilidade relacionada ao de- de-obra pelo processo de desenvolvimento
senvolvimento social e econômico, como de cada sistema econômico. As relações
ocorreu nos países desenvolvidos com a entre desenvolvimento econômico e popu-
revolução industrial? É o desenvolvimen- lação, bem como as motivações econômi-
to demográfico acelerado a verdadeira cas, sociais e culturais tendentes a con-
causa do subdesenvolvimento? Qual a dicionar índices diferenciais da fertilida-
natureza do problema? Trata-se de pro- de, são de natureza complexa merecendo,
blema médico? Será a explosão demo- certamente, estudos complementares.
gráfica uma doença a merecer tratamen- O que não se pode aceitar de modo
to médico urgente ou será uma crise so- pacífico é o ponto de partida de muitos
cial a exigir medidas de âmbito e natu- autores neo-malthusianos que reduzem o
reza diferentes? desenvolvimento econômico ao crescimen-
O problema demográfico é diferente a to de renda per capita, atribuindo a di-
cada país, porém, as generalizações de visão do Produto Nacional Bruto, pelos
abordá-lo não correspondem à realidade novos indivíduos que nascem, como um
brasileira e nem de muitas outras na- fator de atraso social e estagnação eco-
ções. No que se refere ao importante nômica.
"O tamanho, a estrutura e o crescimen- pulação, etapa importante para o planeja-
to da população têm um efeito duplo sô- mento. Os estudos de mortalidade e mor-
bre o funcionamento da economia: êles bidade representam, também, uma con-
são os principais determinantes da oferta tribuição relevante para o planejamento
de fôrça de trabalho e, ao mesmo tempo, de saúde. Para se determinar o padrão
influem fortemente no consumo. Os efei- quantitativo ou necessidades dos recursos
tos da dinâmica populacional são, por- de saúde, torna-se necessário o dado de-
tanto, sentidas simultâneamente tanto do mográfico população, a fim de se anali-
lado da oferta como do lado da procura sar a proporção de habitantes por tipo
de bens e serviços" 6. de equipamento existente, tais como, po-
"É fora de dúvida que população e ní- pulação teòricamente coberta por unida-
vel de renda são os principais determi- de sanitária, número de leitos por mil
nantes do tamanho do mercado; do ponto habitantes, população atingida pela rêde
de vista das economias da escola, a po- de abastecimento de água e esgoto, nú-
pulação é o fator mais significativo. Em- mero de habitantes por médico e pessoal
bora a proposição de que o crescimento paramédico, assim como muitas outras
demográfico amplia o mercado não possa correlações.
ser generalizada irrestritamente, continua, Tendo em vista o progresso nas análi-
não obstante, a ser verdade que, para, ses e projeções demográficas, a demogra-
pràticamente, qualquer país capaz de de- fia deverá desenvolver um papel mais im-
senvolver sua economia, uma população portante no planejamento dos serviços de
maior significa um mercado maior e, con- saúde.
seqüentemente, uma maior latitude de in-
Exige o planejamento moderno de saú-
dustrialização. Ao contrário da integra- de características mais completas e exa-
ção econômica, o crescimento populacio-
nal não depende de acôrdos com outros tas da população. Torna-se fundamental,
países e representa, por isso, uma "solu- neste planejamento, levar-se em conta as
ção" de mais fácil aplicação para um pro- variáveis demográficas e a composição
social da população para se construir mo-
blema vital. Daí se concluir que, exceto
dêlos mais realistas, possibilitando pro-
no caso de alguns países com população
bem grande, a expansão populacional é gramar efetivamente as necessidades de
um fator positivo, a longo prazo, para o saúde, tais como: unidades sanitárias,
desenvolvimento. Portanto, a avaliação leitos hospitalares, pessoal médico e auxi-
do efeito do crescimento populacional pa- liar de saúde, etc. A análise da distri-
ra o desenvolvimento deve ser feito à luz buição da população e de sua migração
das condições específicas em que cada torna-se elemento fundamental para ca-
país se encontra" 6. racterizar o tipo e a organização da as-
sistência médico sanitária. O conheci-
Assim sendo, podemos considerar, de mento da natalidade, fertilidade e nup-
início, que a demografia desempenha em
saúde pública as seguintes funções pri- cialidade permite avaliar a necessidade
mordiais : de leitos maternidades e infantis, assim
como de serviços pré-natais.
a) Em planejamento de saúde. É Estudos relativos à estrutura e à dinâ-
através das combinações das variações mica populacional, assim como a sua ten-
demográficas, tais como: natalidade, mor- dência, são bastante necessários para con-
talidade e tamanho da população segundo tribuir na formulação de uma política de
a composição por sexo e idade, que se saúde.
permite calcular os coeficientes compo- O desenvolvimento futuro dos meios
nentes dos indicadores globais e específi- técnicos e da estatística enriquecerão ain-
cos que medem o estado de saúde da po- da mais a informação acêrca dos progres-
sos demográficos e irá, portanto, contri- dade deve ser também uma importante
buir para o aperfeiçoamento da planifica- preocupação nas pesquisas biológicas e
ção da assistência médica. médicas. Portanto, constitui o planeja-
mento familiar parte de um serviço or-
b) O correlacionamento entre migra- ganizado de saúde, sem impedir, no en-
ção e saúde constitui também uma im- tretanto, sua função preventiva e curati-
portante aplicação da demografia em saú- va mas sim integrando-a. Esta posição
de pública, embora esta dimensão da de- foi definida também pela 19.a Assembléia
mografía em saúde tenha sido ainda pre- da OMS (1966). Sendo assim, não é
cária, necessitando maiores estudos e in- preciso justificativas econômicas, sociais e
vestigações. demográficas, para incluir o planejamen-
to familiar como um dos muitos progra-
c) Estudos sôbre a erradicação das mas de assistência materno infantil. Têm
doenças de massa e o seu efeito sôbre a sido os médicos e outros profissionais de
redução da mortalidade, trazendo como saúde os que mais se utilizam dêste ar-
conseqüência, o crescimento populacional, gumento, apesar de faltar-lhes, em geral,
merece, também, atenção especial da saú- conhecimentos básicos de economia, ciên-
de pública a fim de fornecer subsídios cias sociais e demografia.
para os programas e planejamento de de-
senvolvimento social e econômico. Tem sido também a incidência do abôr-
to induzido superestimada para justificar
d) Nos programas de higiene mater- a implantação do Planejamento Familiar.
no infantil, o estudo das correlações en- Com exceção do trabalho de HUTCHIN-
tre variáveis demográficas e saúde forne- SON 3 (1964) e MILANESI 4 (1968), (a
cem importantes informações para inte- incidência de abôrto provocado encontra-
grar o planejamento familiar aos progra- do foi de 9,2% e 10,7% respectivamen-
mas de saúde. Para isto, tornam-se im- te), os dados que existem no Brasil refe-
portantes investigações que mostrem co- rem-se a dados hospitalares, o que impe-
mo se comporta, por exemplo, a natimor- de o conhecimento da magnitude real do
talidade e mortalidade infantil de acôrdo problema e das variáveis nêle implicadas,
com a paridade, idade materna e espaça- uma vez que tais dados são, por natureza,
mento entre os nascimentos; que benefí- selecionados, não refletindo o que se pas-
cios traz o aumento do espaçamento na sa na população, não permitindo, portan-
saúde materna; qual a relação encontra- to, a sua extrapolação para tôda a popu-
da entre idade materna e incidência de lação feminina, como tem sido feito por
prematuridade e malformações congêni- alguns autores. De acôrdo com a inves-
tas; que correlações existem entre pari- tigação realizada sôbre o Ensino do Con-
dade, perdas fetais e prematuridade; pa- trôle da Fertilidade nas Escolas Médicas
ridade e câncer genital; qual o efeito da Brasileiras (YUNES10, 1970), o abôrto
lactação na fertilidade; e o do casamento provocado não se apresentou como indi-
consanguíneo nas malformações congêni- cação prioritária para o planejamento fa-
tas. miliar, tendo ocupado o quarto lugar,
A par do tamanho da família deve ser precedido das indicações por motivos de
de livre escolha do casal, as condições doenças e problemas psiquiátricos; retar-
médicas e biológicas constituem um im- damento mental; limitação do tamanho
portante fator para o aconselhamento do da família e problema sócio-econômico;
planejamento familiar. Esta prática, defeito genético e aumento de espaçamen-
acompanhada de um programa de educa- to.
ção sexual, representa uma importante e) Os países subdesenvolvidos indi-
medida de higiene materno infantil e, cam, em geral, como prioritários os pro-
portanto, de saúde pública. A esterili- blemas ligados ao saneamento básico, nu-
trição, educação, assistência médica hos- pela análise feita por êste estudo,
pitalar, combate às moléstias transmissí- isto ocorreu para os países conside-
veis, problemas diretamente ligados à es- rados hoje desenvolvidos.
trutura econômica e social da nação e
que só podem ser resolvidos com as trans- — A demografia tem aplicações im-
formações sociais necessárias ao processo portantes em saúde pública, princi-
de desenvolvimento. palmente em planejamento de saú-
de.
f) Não cabe ao setor saúde, isolada- — O planejamento familiar deve ser
mente, definir uma política de população, parte integrante da assistência ma-
cabendo esta tarefa à esfera federal, de terno-infantil, respeitando sempre
acôrdo com a política de desenvolvimento as prioridades de um programa de
social e econômico definida pelo govêrno. saúde.
Em resumo, é o Brasil um país de ex-
tensa área geográfica, com um grande — Não é preciso justificativas demo-
contingente populacional e imensos re- gráficas, econômicas e sociais para
cursos naturais. Não cremos que um se incluir o planejamento familiar
país com estas características necessite de em programas de saúde, uma vez
uma política de contrôle populacional pa- que a causa de pobreza e de subde-
ra resolver o problema de seu subdesen- senvolvimento não reside no tama-
volvimento. Mas sim, de reformas es- nho da família.
truturais e políticas que o conduzam a — A política populacional deve ser de-
um desenvolvimento social e econômico finida pelo govêrno federal de acôr-
integrado e harmônico. Isto não impe- do com a política de desenvolvi-
de, no entretanto, que se desenvolva o mento social e econômico do país.
planejamento familiar, a nível de indi-
víduos e famílias, através dos serviços de
assistência materno-infantil, proporcionan- YUNES, J. — [Population dynamics on the
do, portanto, uma assistência médica glo- developed and underdeveloped countries].
bal e integrada. É competência exclusi- Rev. Saúde públ., S. Paulo, 5:129-50, 1971.
va de cada nação soberana decidir sôbre SUMMARY — The main factors that con-
êstes assuntos e não devem ser impostos tributed to the population dynamic in
programas de planejamento familiar por developed and underdeveloped countries and
nenhum organismo internacional em sua the policies of these countries used, even
the aplication of demography in Public
programação regional ou subregional. Health, are analysed. The greater popula-
tion growth in under developed countries
is observed. Thus, by the year 2000, the
5. C O N C L U S Õ E S region called "third world" will present the
higger population contingent, for the un-
— O crescimento populacional acele- derdeveloped countries will contribute with
79% from the total world population. The
rado ("explosão demográfica") é first demographic transition began in 17th
conseqüência e não causa do sub- century in Europe with the process of in-
desenvolvimento e como tal não é dustrial revolution while in underdeveloped
problema médico. countries this occurred in the beginning of
1940 with a deep difference since the decline
of mortality rate presented was not followed
— Sòmente o ingresso dos países sub- either by a significative decline of birth
desenvolvidos no processo de desen- rate, or even by the modernization of their
volvimento econômico e social re- economics. Among the main factors that
influenced mortality and fertility factors are
duzirá substancialmente a mortali- the influence of economic and social develop-
dade e fertilidade. Històricamente ment, and also the progress in medical
and public health fields. 66% of underde- teiras, de 15 a 49 anos, residentes no Dis-
veloped countries population is under birth trito de São Paulo, em 1965. São Paulo,
rate control and in a decrescent order the 1968. [Tese — Faculdade de Higiene e
most used contraceptive has been the in- Saúde Pública-USP].
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