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Profissional
Fechamento desta edição [15.04.2018]
ISBN 978-85-5321-416-7
PREFÁCIO
PREFÁCIO
1.1. Introdução
A Lei 13.465, de 11 de julho de 2017 (norma legislativa responsável pela
conversão da Medida Provisória 756/2016 em lei), promoveu profundas
alterações no sistema legal aplicado à regularização fundiária urbana.
O objetivo do artigo é analisar de maneira teórica e prática os principais
assuntos sobre regularização fundiária compreendidos no Título II, entre os
Capítulos I e IV (arts. 9° a 54), da lei em estudo, em atenção também às
reformas promovidas nas NSCGJSP pelo Provimento 51/2017. O legislador
agrupou o estudo da regularização fundiária urbana em quatro grandes
blocos, assim delimitados: Capítulo I – Disposições gerais; Capítulo II –
Instrumentos da Reurb; Capítulo III – Procedimento administrativo; Capítulo
IV – Do registro da regularização fundiária.
Por fim, mas não menos importante, acresço, a título de reflexão jurídica,
minha humilde posição no tocante à evidente inconstitucionalidade do
disposto no art. 13, § 1°, da Lei 13.465/17 em razão do que dispõe o art. 151,
inciso III, da Constituição Federal.
A Constituição Federal, em seu art. 151, inciso III, veda à União instituir
isenções de tributos de competência dos Estados, do Distrito Federal ou dos
Municípios (a natureza jurídica de tributo dos emolumentos extrajudiciais,
instituídos pelos Estados da Federação, encontra-se consolidada no E.
Supremo Tribunal Federal: ADI 1.378-ES, j. 13.10.2010, DJ de 09.02.2011,
rel. Min. Dias Toffoli).
Assim, reconhecida a natureza jurídica de tributo para os emolumentos
extrajudiciais instituídos pelos Estados – conforme posição pacífica do E.
STF –, é inconstitucional a isenção prevista no art. 13, § 1°, da Lei 13.465/17,
criada pela União (fundamento idêntico para sustentar a inconstitucionalidade
do disposto no art. 98, § 1°, inciso IX, do CPC/15 – ou seja, lei federal que
isenta o particular do pagamento de emolumentos previstos por lei estadual).
1.2.4. Legitimados para requerer a Reurb
Os legitimados para requerer a regularização fundiária, conforme o art.
14 da Lei 13.465/17, são:
2.1. Introdução
O estudo da propriedade imóvel no Direito atual deve acompanhar a
evolução histórica de sua adequação jurídica, que passou a ter a ingerência
obrigatória de conformidade com a sua função social, econômica, urbanística
e ambiental como finalidades constitucionais.
No presente artigo, pretendemos identificar o instituto do abandono de
bem imóvel como causa de perda da propriedade urbana e aprofundar seus
reflexos jurídicos e sociais principalmente relacionados às alterações
legislativas recentes que merecem uma nova leitura e interpretação.
O bem imóvel urbano abandonado é objeto de interesse social e jurídico.
O ordenamento jurídico protege tal interesse, e impõe à administração
municipal o dever de atuar sobre tais bens, de forma a possibilitar a sua
constatação, arrecadação e destinação que garanta a efetividade da função
social da propriedade e da coletividade envolvida, pelas diretrizes urbanas do
Município no uso e aproveitamento do solo urbano.
Destaca-se que o abandono do imóvel urbano pode causar o mau uso da
propriedade, fomentar fins ilícitos, danos graves ao plano diretor e aos seus
aspectos urbanísticos, jurídicos, econômicos e ambientais. Assim, para
impedir tais efeitos nefastos ao bem comum, o Poder Público tem a seu
dispor mecanismos legais para arrecadar o bem vago, dar imediata destinação
e uso, bem como, posteriormente, fazer com que o imóvel seja incorporado
ao patrimônio público, como se verá a seguir neste estudo.
O item 2.2 visa delimitar as diretrizes gerais sobre o abandono e a
renúncia de bem imóvel como casos de perda da propriedade definidos no
Código Civil, e apresentar os conceitos técnicos e as distinções mais
relevantes entre eles, que muitas vezes são confundidos impropriamente no
texto legislativo. Ainda, o item 2.3 traz noções iniciais sobre o destino da
coisa objeto de abandono ou renúncia identificados pela legislação e suas
alterações recentes para fins comparativos.
Por sua vez, no item 2.4 passamos a apresentar uma nova leitura do
instituto do imóvel abandonado, relacionada às questões de direito material
cuja exata compreensão e adequado entendimento são essenciais para que o
processo de arrecadação ocorra da forma mais adequada. São apontadas
questões preliminares sobre a formalização do ato unilateral de renúncia.
Ademais, são abordadas algumas questões controvertidas e é demonstrada a
necessidade de reinterpretação da doutrina majoritária sobre o abandono
pelos seus reflexos jurídicos. Nesse item encontra-se a interpretação jurídica
proposta por estes autores sobre a amplitude material do instituto da
arrecadação em vista da conjugação da situação normativa anterior e das
alterações trazidas pela Lei 13.465/2017, apresentando, como se verá, uma
interpretação inovadora em relação à doutrina e à jurisprudência em temas
delicados. Buscou-se apresentar as soluções mais harmoniosas para o
equilíbrio entre o interesse particular e o interesse público envolvidos e que
reflitam a realidade atual do conceito complexo de direito de propriedade e
das políticas públicas urbanas mais adequadas. Nestes pontos, desde logo
salientamos que não é o intuito destes autores elaborar ou apresentar soluções
absolutas ou inquestionáveis; ao contrário, o objetivo é trazer a reflexão de
novas alternativas para proporcionar a efetividade e maximização da função
social da propriedade urbana, em vista de mudanças promovidas pela Lei
13.465/2017.
No item 2.5 é apresentada uma proposta de etapa preliminar de
investigação, necessariamente anterior à abertura do processo administrativo
de arrecadação de bem imóvel abandonado, que, como se verá, presta-se a
averiguar o estado de abandono pelo proprietário e formar a convicção da
autoridade administrativa sobre se determinado bem está ou não sujeito a
arrecadação como bem vago. Em vista do interesse público indisponível,
verifica-se que não pode o agente público deixar de apurar casos em que
existam indícios de abandono da propriedade, sob pena de a omissão poder
configurar, em tese, improbidade administrativa.
No item 2.6 é apresentado o processo administrativo de arrecadação de
bem imóvel abandonado em si, com o desenvolvimento do contraditório e da
ampla defesa, e também é demonstrada a relevância da publicidade registral
imobiliária inicial sobre a existência desse processo administrativo de
arrecadação para atribuir eficácia erga omnes. Como se perceberá, não é
simples faculdade do agente público promover a arrecadação do imóvel
abandonado: é um dever de agir da administração pública nas hipóteses em
que estejam presentes os requisitos legais.
O item 2.7 trata sobre a forma de imissão do Município na posse
provisória do bem após a procedência do processo administrativo de
arrecadação para a imediata destinação social e econômica, provisória, no
imóvel. Será visto que tal imissão na posse pode se dar pela característica da
autoexecutoriedade, caso o bem não esteja na posse ou detenção de outrem
ou por meio de medida judicial, baseado na decisão do processo
administrativo específico, caso exista resistência de eventual ocupante sobre
o bem. Será verificado que a imissão na posse, em qualquer caso, deverá ser
objeto de registro no Registro de Imóveis competente.
No item 2.8 será abordada a questão de futura e eventual reivindicação
pelo proprietário no triênio legal previsto no art. 1.276 do Código Civil e,
ainda, o procedimento da administração pública caso o imóvel não seja
reivindicado durante o interregno legal, que fará com que a propriedade do
imóvel seja adquirida, de forma originária e definitiva, pelo Município. Nesse
caso, será demonstrado finalmente que a aquisição deverá ser objeto de
registro em sentido estrito no registro de imóveis, em favor do Município,
rompendo os vínculos com o proprietário anterior e eventuais sucessores.
Por fim, no item 2.9 serão apresentadas as conclusões e considerações
finais resultantes do desenvolvimento deste artigo, com a intenção de trazer
as primeiras reflexões e interpretações jurídicas sob um novo viés de
aplicação da função social da propriedade urbana abandonada.
Como foi visto no quadro comparativo no item 2.3 deste artigo, a Lei
13.465/2017 trouxe algumas inovações materiais e procedimentais ao
processo de arrecadação. O estudo do instituto, já atualizado com os
parâmetros da Lei 13.465/2017, é objeto de análise a seguir. Muitas questões
procedimentais e de interpretação do alcance de algumas expressões desse
conceito precisam ser aprofundadas, para dar maior clareza aos cidadãos
(proprietários e titulares de direitos reais) e especialmente ao Poder Público,
que tem uma importante responsabilidade na adequada identificação,
arrecadação e destinação dos bens vagos. Neste artigo discutiremos alguns
temas importantes e controversos, cientes de que o fazemos de maneira
precursora e de forma contrária à doutrina até então prevalente. Neste item
2.4.2 (e seus subitens) enfrentaremos duas das mais complexas questões.
A primeira questão a ser enfrentada é: o Município sempre precisaria
esperar cinco anos de “estado de abandono” e “inadimplência fiscal” para
iniciar o procedimento de arrecadação? E a resposta, como se verá, é
negativa. O Município deve iniciar o procedimento preliminar de arrecadação
tão logo tenha notícia de que um bem está abandonado pelo seu proprietário,
não existindo na legislação um prazo mínimo para tanto. A hipótese de
presunção ex lege de abandono será analisada no item 2.4.2.1 , a seguir, e
outras possibilidades de constatação/presunção de abandono serão analisadas
no item 2.4.2.2 , em que se percebe que o caso – dos cinco anos de abandono
e inadimplência fiscal – se presta para fins de mera presunção legal e como
mecanismo de facilitação da arrecadação do bem imóvel, e não um requisito
para tal procedimento.
A segunda questão é quanto aos efeitos e alcance da mudança trazida pela
Lei 13.465/2017, que suprimiu um pressuposto negativo antes previsto no
Código Civil: se o bem estivesse na posse de outrem, pela regra do Código
Civil, ele não poderia ser objeto de arrecadação. Tal pressuposto negativo foi
suprimido no texto da lei em tela. No item 2.4.2.3 tal questão e suas
consequências serão mais bem analisadas.
2.4.2.1. Hipótese de presunção legal de abandono
Nosso ordenamento jurídico assegura ao proprietário os direitos
fundamentais inerentes à propriedade, mas, por outro lado, impõe a ele
deveres de adimplir seus ônus, sejam fiscais, ambientais ou urbanísticos e,
também, o dever de conservar e dar a ela aproveitamento econômico e social,
cumprindo assim a função social da propriedade, um direito complexo,
conforme o comando constitucional (arts. 5°, incisos XII e XIII, da
Constituição Federal; e art. 1.228 do CC).
Mas, como todo direito disponível, o proprietário pode, se quiser,
renunciar ou abandonar a coisa. Em se tratando de bens imóveis urbanos, nos
casos em que há abandono, cabe ao Município a atribuição de arrecadar o
bem vago e dar a destinação adequada. Mas, como visto, o abandono não é
um ato formal, que pode ser constatado com tanta certeza ou segurança
jurídica – como o ato da renúncia –, e pode ser difícil, em alguns casos,
constatar e/ou comprovar a existência dos requisitos do abandono, em
especial o requisito subjetivo – o animus abandonandi .
Em vista da possível dificuldade inicial de se configurar o requisito
subjetivo, o Código Civil previu no § 2° do art. 1.276 que haveria uma
“presunção absoluta” da intenção de abandono do imóvel se, após cessados
os atos de posse, o proprietário deixasse de satisfazer os ônus fiscais por um
período de cinco anos.
Nos estudos das Jornadas da Justiça Federal de Direito Civil 30 , foram
lançados enunciados sobre o abandono da propriedade imóvel que merecem
destaque, como o Enunciado 243, da II jornada, o qual prevê que “a
presunção de que trata o § 2° do art. 1.276 não pode ser interpretada de modo
a contrariar a norma-Princípio do art. 150, inc. IV, da Constituição da
República”. Tal dispositivo constitucional tem como princípio definido na
doutrina o não confisco, isto é, veda-se expressamente que os entes públicos
– União, Estados, Distrito Federal e Municípios – se utilizem do tributo com
efeito de confisco. O enunciado busca proteger situações que não configuram
abandono de imóvel, às quais não cabe a aplicação da presunção “absoluta”
apenas pela simples inadimplência tributária, porque deve ser ressalvado o
direito do proprietário de discutir eventuais débitos lançados por
procedimento administrativo ou judicial para proteção de direitos
fundamentais.
Também reforça o devido processo legal o Enunciado 242, da II Jornada
de Direito Civil, o qual menciona que a “aplicação do art. 1.276 depende do
devido processo legal, em que seja assegurado ao interessado demonstrar a
não cessação da posse”.
Flávio Tartuce 31 indica a forte crítica de juristas sobre uma alteração que
foi promovida pelo Código Civil de 2002, que passou a tratar a presunção do
animus abandonandi como absoluta em caso de cessação da posse a
inadimplência de ônus fiscais. Cita o Professor Titular da USP Carlos Alberto
Dabus Maluf, que entende ser essa presunção inconstitucional, tendo-se
pronunciado da seguinte maneira:
É de causar espécie a possibilidade de ser considerado abandonado o
imóvel cujo proprietário não venha pagando os impostos sobre ele devidos,
uma vez que a inadimplência pode ter como causa, inclusive, a discussão,
administrativa ou judicial, dos valores lançados, ou mesmo motivos de
força maior, sendo tal possibilidade um autêntico confisco, vedado pela
CF/1988, que assegura, também, o direito de propriedade maculado por
essa hipótese 32 .
2.10. Referências
ARRUDA ALVIM NETO, José Manuel de; CAMBLER, Everaldo Augusto;
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VENOSA, Sílvio de Salvo . Direito civil : direitos reais. 7. ed. São Paulo: Atlas, 2007.
1. Art. 589. Além das causas de extinção considerada neste Código, também se
perde a propriedade imóvel: I – Pela alienação. II – Pela renúncia. III – Pelo
abandono. IV. Pelo perecimento do imóvel. § 1° Nos dois primeiros casos
deste artigo, os efeitos da perda do domínio serão subordinados à transcrição
do título, ou do ato renunciativo, no registro do lugar do imóvel. § 2° O imóvel
abandonado arrecadar-se-á como bem vago, passará, dez anos depois, ao
domínio do Estado, onde se achar, ou da União, se estiver no Distrito Federal
ou em território não constituído em estado. (Vide Decreto do Poder Legislativo
3.725, de 1919) § 2° O imóvel abandonado arrecadar-se-á como bem vago e
passará ao domínio do Estado, do Território ou do Distrito Federal se se achar
nas respectivas circunscrições: (Redação dada pela Lei 6.969, de 1981) a) 10
(dez) anos depois, quando se tratar de imóvel localizado em zona urbana;
(Incluído pela Lei 6.969, de 1981) b) 3 (três) anos depois, quando se tratar de
imóvel localizado em zona rural.
2. LOUREIRO, Francisco Eduardo. In: PELUSO, Cezar (Coord.). Código Civil
comentado . 10. ed. rev. e atual. Barueri: Manole, 2016. p. 1204.
3. CHALHUB, Melhim Namem. O novo Código Civil e o registro de imóveis:
novos aspectos obrigacionais do direito imobiliário. Boletim Eletrônico do
IRIB, n. 677. Disponível em: [http://irib.org.br/boletins/detalhes/3161]. Acesso
em: 02.01.2018.
4. Não se pode ignorar, contudo, que, embora sejam minoritárias, há na doutrina
vozes que sustentam que existiria “renúncia em favor de terceiro”, como Maria
Helena Diniz e Melhim Namem Chalhub.
5 . QUINTELLA, F.; DONIZETTI, E. Curso didático de direito civil . 6. ed. São
Paulo: Atlas, 2017. p. 777.
6 . TARTUCE, Flávio; SIMÃO, José Fernando. Direito civil 4 : direito das
coisas. 4. ed. São Paulo: Método, 2012. p. 203.
7 . TARTUCE, Flávio; SIMÃO, José Fernando. Direito civil 4 : direito das
coisas. 4. ed. São Paulo: Método, 2012. p. 203.
8. DOWER, Nelson Godoy Bassil. Curso moderno de direito civil 4: coisas. 2.
ed. São Paulo: Nelpa, 2004. p. 185.
9 . VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direitos reais. 7. ed. São Paulo:
Atlas, 2007. p. 235.
10 . VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direitos reais. 7. ed. São Paulo: Atlas,
2007. p. 235.
11 . NADER, Paulo. Curso de direito civil: direito das coisas. 7. ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2016. v. 4. p. 237.
12 . PENTEADO, Luciano. Direito das coisas. São Paulo: Ed. RT, 2008. p. 305.
13 . LOUREIRO, Francisco Eduardo. In: PELUSO, Cezar (Coord.). Código Civil
comentado. 10. ed. Barueri: Manole, 2016. p. 1204.
14 . Por exemplo: art. 1.382 do CC (que permite ao dono do imóvel serviente
abandonar a propriedade em favor do dono do imóvel dominante para se
exonerar da necessidade de realizar obras necessárias ao uso e conservação da
servidão); art. 1.479 do CC (o abandono de imóvel pelo adquirente de imóvel
hipotecado para se exonerar de hipoteca, desde que o adquirente não se tenha
obrigado pessoalmente a pagar as dívidas aos credores hipotecários); e art.
1.316 do CC (que prevê a renúncia da parte ideal pelo condômino para eximir-
se do pagamento das despesas e dívidas, e os seus §§ 1° e 2°, que estabelecem
que os condôminos que assumirem tais despesas e dívidas respectivas
aproveitarão a renúncia e adquirirão a parte ideal do renunciante, na proporção
dos pagamentos que fizerem; não havendo condômino que faça os pagamentos,
a coisa comum será dividida). Entretanto, tais casos não serão aprofundados
neste artigo. É preciso apenas observar que, antes que o bem abandonado ou
objeto de renúncia em tais casos seja arrecadado pelo Poder Público, deve-se
respeitar o direito atribuído, ex lege , a um determinado terceiro.
15 . Usucapião de bens imóveis, a exemplo dos casos do arts. 1.238 a 1.247; e
1.260 a 1.262 do CC, e art. 183 da CF, ou, ainda, a ocupação de bens móveis,
na forma do art. 1.263 do CC.
16 . Conforme o art. 1.276 do Código Civil e o recente art. 64 da Lei 13.465/2017.
17 . Não será objetivo deste artigo analisar as diferentes posições sobre a existência
de posse ou detenção, ou a possibilidade de aquisição por usucapião caso a
posse tenha iniciado (ou continuado) na clandestinidade, em vista, v.g ., do art.
1.208 do Código Civil, e a possibilidade ou não de modificação da detenção ou
posse precária em posse, v.g. , da interversio possessionis . Estando fora do
escopo deste artigo o aprofundamento em tais questões, apenas se adverte o
leitor de que este tema apresenta diferentes percepções na doutrina. Contudo, é
certo que, na prática, pessoas que invadem imóveis, se lograrem êxito em
manter-se neles sem objeção por longo prazo, têm obtido o reconhecimento da
usucapião, ainda que na forma extraordinária, passando o bem à propriedade de
um particular que não tinha qualquer justo título e inicialmente teve má-fé.
18 . O art. 1.276, § 1°, do Código Civil estabelece que, se o imóvel for rural, a
competência para sua arrecadação e aquisição decorrente do abandono será da
União. Assim, cabe à União a mais difícil tarefa de identificar imóveis rurais
vagos por abandono. E, após a identificação, cabem à União as medidas para
arrecadação e aquisição da propriedade de tais bens.
19 . Proprietário tabular é aquele que consta na matrícula do registro de imóveis
como proprietário.
20 . PENTEADO, Luciano. Direito das coisas. São Paulo: Ed. RT, 2008. p. 304.
21 . Caso o imóvel objeto da renúncia tenha valor superior a 30 salários mínimos,
por exigência do art. 108 do Código Civil, tal manifestação de vontade deve ser
feita perante Tabelião de Notas, e formalizada por escritura pública. Em que
pese o art. 108 faça referência a “negócios jurídicos” e a renúncia se trate de
ato jurídico em sentido estrito, ainda assim se deve interpretar que é exigível a
escritura pública caso o valor do imóvel seja superior a 30 salários mínimos,
especialmente porque o mesmo artigo é específico ao incluir a “renúncia” entre
os atos para os quais se exige a solenidade.
22 . Adverte-se que em alguns momentos neste artigo estes autores utilizaram a
expressão “registro” da renúncia de maneira genérica, sem a precisão
terminológica que distinguiria o ato de registro em sentido estrito de um ato de
averbação. Estes autores entendem que o ato a ser praticado na renúncia pura e
abdicativa seria o ato de averbação, apesar de importantes e respeitabilíssimas
vozes em sentido contrário. Com máxima vênia, parece-nos cabível ato de
registro em sentido estrito para a “renúncia” somente quando esta não for uma
verdadeira “renúncia abdicativa”, mas uma “renúncia in favorem”, que na
realidade tem natureza de cessão (que pode ser gratuita ou onerosa), e que
somente nesse caso deveria ingressar na matrícula do imóvel por registro,
situação em que o terceiro beneficiado pela renúncia, e que passa a ser o novo
proprietário do bem renunciado, já deve constar no texto do ato registral.
23 . VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direitos reais. 8. ed. São Paulo: Atlas,
2008. p. 245.
24 . Art. 158 do Código Civil e art. 790, VI, do CPC/2015.
25 . Na Apelação Cível 957-6/9, julgamento em 11.11.2008 e publicação no DJ em
27.01.2009, de relatoria do Des. Ruy Camilo, assim decidiu o E. Conselho
Superior da Magistratura do Estado de São Paulo: “Embora a renúncia consista
em um ato unilateral, ela só pode, porém, ser exercida se não acarretar prejuízo
a terceiros. Na hipótese dos autos, a área a que se refere a renúncia em exame
corresponde a uma faixa de proteção de manancial non aedificandi , que
integrou o projeto de loteamento denominado Jardim Veneza, conforme se
verifica dos docs. de fls. 07/19, o que impede, portanto, a renúncia pretendida,
sem que haja a correspondente anuência dos demais interessados”.
26 . Lei 6.938/81. Ainda que não houvesse positivação legal de tais deveres, a
função social da propriedade, a proteção constitucional do meio ambiente e a
boa-fé impediriam que o proprietário renunciasse à propriedade imóvel
buscando se eximir de obrigações ambientais.
27 . Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os
princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os
deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e
notadamente: […] II – retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de
ofício […]
28 . Embora não haja lei expressa, é fortemente recomendável que os tabeliães e
oficiais comuniquem o Município. Poderia ser adequado, ainda, que as
Corregedorias de Justiça estipulassem norma nesse sentido, a fim de facilitar a
identificação dos imóveis formalmente vagos pelo Poder Público.
29 . Tal autorização da lei civil, como visto, na realidade gera um dever de agir ao
agente público, e não simplesmente uma faculdade. O Direito Administrativo
não faculta ao agente público o cuidado e zelo com o patrimônio público (ou
que poderá vir a ser público). Assim, essa autorização deve ser entendida como
uma verdadeira obrigação do agente público de, imediatamente após receber
notícias de abandono, averiguar de forma documentada e, conforme os fatos,
iniciar desde logo o procedimento de arrecadação.
30 . Jornadas de Direito Civil I, III, IV e V: enunciados aprovados. Coordenador
científico: Ruy Rosado de Aguiar Júnior. Brasília: Conselho da Justiça Federal,
Centro de Estudos Judiciários, 2012. Disponível em:
[file:///C:/Users/giova/Downloads/compilacaoenunciadosaprovados1-3-
4jornadadircivilnum.pdf]. Acesso em: 03.01.2018.
Jornada de Direito Civil VII: enunciados aprovados. Coordenadores
científicos: Ministro Ruy Rosado de Aguiar Júnior e Roberto Rosas. Brasília:
Conselho da Justiça Federal, Centro de Estudos Judiciários, 28 e 29 de
setembro de 2015. Disponível em:
[file:///C:/Users/giova/Downloads/Enunciados-VI-jornada.pdf]. Acesso em:
03.01.2018.
31 . TARTUCE, Flávio; SIMÃO, José Fernando. Direito civil 4: direito das coisas.
4. ed. São Paulo: Método, 2012.
32 . MALUF, Carlos Alberto Dabus. Novo Código Civil comentado. São Paulo:
Saraiva, 2004. p. 1166. Apud TARTUCE, Flávio; SIMÃO, José Fernando.
Direito civil 4: direito das coisas. 4. ed. São Paulo: Método, 2012.
33 . NISHIYAMA, Adolfo Mamoru. A inconstitucionalidade do art. 1.276 do novo
CC e a garantia do direito de propriedade. Revista de Direito Privado, São
Paulo: Ed. RT, 2004. n. 18. p. 9 e segs. Apud NADER, Paulo. Curso de direito
civil: direito das coisas. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016. v. 4. p. 237.
34 . Proposta de alteração: “Art. 1.276. […]§ 2° Presumir-se-á a intenção a que se
refere este artigo, quando, cessados os atos de posse, deixar o proprietário de
satisfazer os ônus fiscais”. (NR). Fonte: [
http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra;jsessionid=F97807C67B027
-codteor=848554&filename=PL+699/2011 ].
35 . TARTUCE, Flávio. Direito civil 4: direito das coisas. 6. ed. rev., atual. e ampl.
São Paulo-Rio de Janeiro: Forense/Método, 2014. p. 178-180.
36 . Com máxima vênia a eventuais entendimentos diversos, para nós está claro
que após a Lei 13.465/2017 o processo de arrecadação e posterior aquisição da
propriedade pelo Município pode ser inteiramente administrativo, manejado
perante o órgão competente da administração pública municipal. Não se faz
mais necessário, portanto, processo judicial. Naturalmente, o acesso ao Poder
Judiciário poderá ser realizado, se preciso for, tanto pelo particular quanto pelo
Poder Público.
37 . FREITAS, Vladimir Passos de. Segunda leitura: função social e abandono de
imóveis urbanos. Disponível em: [ https://www.conjur.com.br/2009-jan-
04/funcao_social_abandono_imoveis_urbanos ]. Acesso em: 29.11.2017.
38 . O art. 64, § 2°, da Lei 13.465/2017 estabelece que compete ao Poder
Executivo Municipal, por decreto ou ato executivo apropriado, estabelecer as
regras procedimentais para a arrecadação dos bens vagos.
39 . Deve-se levar em conta o parágrafo único do art. 227 do Código Civil,
segundo o qual, “qualquer que seja o valor do negócio jurídico, a prova
testemunhal é admissível como subsidiária ou complementar da prova por
escrito”. Ainda, deve-se considerar os arts. 442 a 449 do CPC/2015. Para a
autoridade administrativa destinatária da prova, aplica-se analogicamente o
artigo 371 do CPC/2015, que dispõe: “Art. 371. O juiz apreciará a prova
constante dos autos, independentemente do sujeito que a tiver promovido, e
indicará na decisão as razões da formação de seu convencimento”. Eventual
equívoco ou abuso por parte da autoridade administrativa poderá ser corrigida
mediante ação ao Poder Judiciário pelo interessado. Logo, a prova testemunhal
passa a ser cabível apenas de forma subsidiária, qualquer que seja o valor da
causa, excetuada a hipótese de impossibilidade moral ou material, tal como
dispõe o art. 406 do NCPC. É evidente que, seja uma ou outra a corrente de
interpretação, ficará a cargo do juiz avaliar as provas produzidas nos autos,
expondo de forma fundamentada suas razões de decidir (art. 371 do NCPC).
40 . GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito das coisas. 12.
ed. São Paulo: Saraiva, 2017. v. 5. p. 367-368.
41 . Disponível em: [ www.cjf.jus.br/enunciados/enunciado/855 ]. Acesso em:
20.01.2018.
42 . Por exemplo, se a posse for de boa ou má-fé, justa ou injusta (decorrente de
esbulho, precariedade ou clandestinidade), razoável ou adequada para a função
social daquela propriedade ou não.
43 . Sobre a função social da posse, assim discorre Flávio Tartuce: “Na doutrina
contemporânea, vários autores discorrem sobre a função social da posse.
Merecem destaque as palavras do ex-defensor público e atual Desembargador
do TJRJ Marco Aurélio Bezerra de Melo: ‘A densidade axiológica da posse,
mormente em uma sociedade que oscila entre a pobreza e a miséria e que adota
como modelo tradicional para a aquisição de bens a compra e venda e o direito
hereditário, a posse deve ser respeitada pelos operadores do direito como uma
situação jurídica eficaz a permitir o acesso à utilização dos bens de raiz, fato
visceralmente ligado à dignidade da pessoa humana (art. 1°, III, da CRFB) e ao
direito constitucionalmente assegurado à moradia (art. 6° da CRFB). Importa,
por assim dizer, que ao lado do direito de propriedade, se reconheça a
importância social e econômica do instituto’. Ainda em sede doutrinária, a
ideia de função social da posse consta de enunciado aprovado na V Jornada de
Direito Civil, de 2011, com a seguinte redação: ‘A posse constitui direito
autônomo em relação à propriedade e deve expressar o aproveitamento dos
bens para o alcance de interesses existenciais, econômicos e sociais
merecedores de tutela’ (Enunciado n. 492). A título de exemplo, pode ser
citado o contrato de gaveta, em que o possuidor tem um direito autônomo à
propriedade, merecendo proteção pela utilidade positiva que dá à coisa. O tema
da posse como um direito autônomo foi objeto de dissertação de mestrado
desenvolvida por Marcos Alberto Rocha Gonçalves e defendida na PUCSP.
Conforme as conclusões finais do trabalho, às quais se filia, ‘a valorização da
função social da posse representa o rompimento do formalismo individualista
diante das demandas sociais. Compreende-se, a partir desse modelo, a
construção de possíveis pontes entre as necessidades de uma sociedade
multifacetada (e desigual) e o caminhar rumo a um efetivo Estado
democraticamente organizado, afastando-se da dogmática estruturada na ficção
da igualdade formal. Titularidades formais e fruição real das possibilidades
emergentes de bens que atendam às necessidades é, ainda, um caminho a
percorrer. Se historicamente o discurso jurídico aproximou propriedade e
posse, é tempo, pois, de desvincular forçosa construção, pois, consoante há
muito tempo anunciou José Saramago, ‘ter não é possuir’’. Em complemento,
conforme as precisas lições de Paulo Lôbo, ‘a autonomia da posse cada vez
mais se afirma, tendo sido fortalecida pelas investigações iluminadas pelo
direito civil constitucional. Os fundamentos da posse precisam ter em conta a
promoção dos valores sociais constitucionalmente estabelecidos (Tepedino,
2011, p. 44) e sua relação com os direitos fundamentais’ (TARTUCE, Flávio.
Manual do direito civil: volume único. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2017. p.
605-608).
44 . TARTUCE, Flávio. Manual do direito civil: volume único. 7. ed. Rio de
Janeiro: Forense, 2017. p. 676; GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil
brasileiro: direito das coisas. 12. ed. São Paulo: Saraiva, 2017. v. 5. p. 367-368;
Enunciado da VII Jornada de Direito Civil da Justiça Federal n. 597, que define
que “A posse impeditiva da arrecadação”, prevista no art. 1.276 do Código
Civil, é efetiva e qualificada por sua função social”.
45 . Como no caso da herança jacente até ser declarada vacante. Vide TJSP,
Apelação 01433205620108260100, 19 a Câmara, Rel. João Camillo de Almeida
Prado Costa, j. 20.10.2014, data de publicação: 24.10.2014; STJ, AgRg
2011/0296320-7, no AREsp 126047/RJ, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, órgão
julgador: Quarta Turma, data do julgamento: 26.11.2013, data da publicação:
DJe 03.12.2013. 2. “O bem integrante de herança jacente só é devolvido ao
Estado com a sentença de declaração da vacância, podendo, até ali, ser
possuído ad usucapionem . Incidência da Súmula 83/STJ” (AgRg no Ag
1212745/RJ, Rel. Min. Sidnei Beneti, Terceira Turma, julgado em 19.10.2010,
DJe 03.11.2010); e STJ, AgRg 2009/0188164-0 no Ag 1212745/RJ, Rel. Min.
Sidnei Beneti, órgão julgador: Terceira Turma, data do julgamento:
19.10.2010, data da publicação: DJe 03.11.2010; STJ, REsp 36.873/SP,
Recurso Especial, 1993/0019669-3, Rel. Min. Ari Pargendler, órgão julgador:
Terceira Turma, data do julgamento: 29.03.2001, data da publicação: DJ
28.05.2001. (Grifo nosso)
46 . Pode o Município precisar tomar medidas possessórias de natureza cautelar
baseado em situações fáticas relevantes ou em situação jurídica relevante.
Usualmente situações fáticas relevantes, como a destinação ou uso inadequado
do bem que estivesse colocando em risco a segurança, a saúde pública ou a
ordem pública, ou a construção sem alvará, podem ser autoexecutadas pela
Administração Pública com base em seu poder de polícia. Já situações jurídicas
relevantes, como o risco de que o possuidor-invasor complete tempo de
usucapião do imóvel durante o processo de arrecadação, podem exigir medidas
judiciais cautelares, visando interromper o decurso da prescrição aquisitiva por
meio de uma ação, legítima, que fará com que a posse não seja mansa e
pacífica e, assim, não possa ser contada para fins de usucapião.
47 . É possível que haja entendimento diverso sobre a possibilidade de registro da
“notificação” como “citação”. De toda forma, é evidente a importância da
publicidade registral sobre a existência do processo administrativo. Se for
entendido que por ser processo administrativo não se teria uma “ação”, no
mínimo, deveria tal fato ser publicizado por meio de averbação, com
fundamento no art. 246 da Lei 6.015/73 (corroborado pelo princípio da
concentração, consagrado no parágrafo único do art. 54 da Lei 13.097/2015).
48 . ARRUDA ALVIM NETO, José Manuel de. CAMBLER, Everaldo Augusto;
CLÁPIS, Alexandre Laizo. Lei de Registros Públicos: comentada.
Coordenação Alexandre Laizo Clápis, Everaldo Augusto Cambler. Rio de
Janeiro: Forense, 2014.
49 . Art. 26 da Lei 13.465/2017, em que o prazo para conversão da legitimação de
posse em propriedade é contado expressamente a partir da data do registro.
50 . FREITAS, Vladimir Passos de . Segunda leitura: função social e abandono de
imóveis urbanos. Disponível em: [ www.conjur.com.br/2009-jan-
04/funcao_social_abandono_imoveis_urbanos ]. Acesso em: 29.11.2017.
51 . VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil : direitos reais. 7. ed. São Paulo: Atlas,
2007. p. 237.
52 . DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito das coisas. 25.
ed. São Paulo: Saraiva, 2010. v. 4. p. 185.
53 . Poder-se-ia sustentar que é outra espécie de aquisição originária, e que não
seria um caso sui generis de usucapião. Poder-se-ia entender que essa espécie
de aquisição originária também tem similaridades com o novo instituto da
legitimação fundiária, espécie de aquisição originária prevista na mesma Lei
13.465/2017 com a seguinte definição expressa na lei: “Art. 11. […] VII –
legitimação fundiária: mecanismo de reconhecimento da aquisição originária
do direito real de propriedade sobre unidade imobiliária objeto da Reurb”. É
certo, contudo, que, apesar de previsto na mesma lei que instituiu a
“legitimação fundiária” como nova modalidade de aquisição originária, a Lei
13.465/2017 criou essa nova modalidade tão somente para a legitimação da
propriedade em favor de beneficiário de Reurb. Assim, salvo melhor juízo, a
aquisição pelo Poder Público após o processo de arrecadação é uma espécie de
usucapião especial.
54 . Tal exigência se mostra impositiva nos casos em que a arrecadação se der
administrativamente diretamente pelo Município, na forma instituída pela Lei
13.465/2017. Para casos anteriores a essa lei, em que o trâmite da arrecadação
se tenha dado de forma judicial, deve o oficial observar o decurso de três anos
entre a data de preclusão da decisão de procedência de arrecadação e a data em
que se vier a praticar o ato de registro da aquisição pelo Município.
55 . O ato é de registro em sentido estrito, com base no art. 167, I, 21, da Lei
6.015/73, conforme fundamentado no item 2.6 deste estudo.
56 . O ato é de averbação, conforme o art. 167, II, 12, da Lei 6.015/73, como
fundamentado no item 2.6 deste estudo.
57 . Como visto no item 2.8 , o ato de efetiva aquisição originária pelo Poder
Público deve ser objeto de registro em sentido estrito, de forma similar à
usucapião.
3
O DIRETO REAL DE LAJE – LEI 13.465/2017
Outra não poderia ser a linha de raciocínio, uma vez que, mediante uma
análise sistemática da Carta Maior, encontram-se ainda outros dispositivos
sinalizando para tal fim.
Tome-se, por exemplo, o artigo 3°, que dispõe sobre os denominados
objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, citando a
construção de uma sociedade livre, justa e solidária; a garantia do
desenvolvimento nacional; a erradicação da pobreza e da marginalização; a
redução das desigualdades sociais e regionais; e finalmente a promoção do
bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer
outras formas de discriminação.
Ora, não é muito complexo o raciocínio segundo o qual, para serem
observados os objetivos fundamentais referidos, necessariamente se deve
atender ao direito basilar à moradia digna de todo e qualquer ser humano, em
conexão com a igualdade material, a cidadania e a dignidade da pessoa
humana, uma vez que a Constituição Cidadã fora elaborada por
representantes do povo e se dirige, primordialmente, aos desejos, anseios e
necessidades desse mesmo povo.
O artigo 7° da Lei Maior também faz expressa referência ao direito à
moradia dos trabalhadores urbanos e rurais, bem como de suas famílias, no
sentido de se tratar de uma necessidade vital básica, conforme o caput e
respectivo inciso IV.
Portanto, constata-se que o direito constitucional à moradia é pura
irradiação da dignidade da pessoa humana.
O artigo 23, inciso, IX, por sua vez, estatui que competem a todos os
entes federativos a promoção e o desenvolvimento de programas de
construção de moradias e a melhoria das condições habitacionais e de
saneamento básico, em consonância com o direito fundamental à moradia
digna.
Os princípios constitucionais aplicáveis ao direito à moradia digna
(dignidade, cidadania, igualdade material…) possuem perfeito
enquadramento como direitos e garantias individuais fundamentais, uma vez
que conferem aos indivíduos a mínima proteção necessária em matéria de
tutela de sua dignidade, realizando uma harmonização entre as respectivas
finalidades do Estado e os demais princípios fundamentais estabelecidos.
Nessa linha de pensamento, firma-se o caráter pétreo do qual se reveste
toda a base principiológica do sistema, no qual se inclui a matéria relativa ao
direito social à moradia, expressamente estabelecido no artigo 6°, caput , da
Carta da República.
Os direitos fundamentais são considerados uma densificação
(materialização) do Princípio da Justiça Social. Entende-se que os direitos
sociais, elencados no art. 6° da CF/88 são cláusulas pétreas, e o Supremo
Tribunal Federal possui vasta e recente jurisprudência nesse sentido. Assim
sendo, não podem ser abolidos, sendo possível tão somente a sua alteração
em favor da sociedade […] 11 .
3.5. Conclusão
Efetivamente, louvável a iniciativa legislativa do regramento formal do
direito de laje, esta velha conhecida dos brasileiros, seja por experiência
própria, seja por inevitável desconhecimento, ainda que pelo senso comum.
A laje disseminou-se em imponente informalidade, suprindo necessidades
de moradia de um povo criativo e esperançoso, ganhando proporções que lhe
conferiram, por fim, o justo regramento legal como instituto autônomo,
qualificado no rol de direitos reais.
Ao se falar em laje, naturalmente e quase de forma automática, vem à
mente a imagem de construção de feições economicamente desfavoráveis,
sem muito aprumo estético, provavelmente em morros, nos quais se
formaram as favelas, atualmente designadas pelo termo ‘’comunidades’’, mas
que se tornaram verdadeiras cidades, por assim dizer.
O quadro descrito não é sem motivo, uma vez que a laje sempre foi, em
nossa cultura nacional, meio de sobrevivência típico de população social e
economicamente desfavorecida, que não tinha condições financeiras de
promover construções regulares nas cidades, tendo permanecido sempre à
margem e encontrado refúgio nos morros.
Historicamente, a população foi realmente dividida em decorrência de
questões referentes a poder aquisitivo, classes sociais e todos os seus
consectários – não se pretende fazer aqui estudo moral sobre tais pontuações.
Nessa senda, fora inevitável o reconhecimento da cristalização dessa
realidade social consolidada, frequente, diária, internalizada coletivamente
como algo já integrante da cultura nacional, como modo de viver e
estabelecer moradia.
A beleza do Direito em suas raízes mais profundas está justamente na
constatação da legitimidade de sua criação, desenvolvimento e aceitação
como fato social.
Afinal, o Direito é mecanismo a serviço da sociedade, a qual é a razão
primária de sua existência, ditando a direção para onde os ventos são
favoráveis aos regramentos e pacificação social.
Esse instrumento de pacificação social, em seu âmago, visa justamente ao
regramento das realidades fáticas de um determinado povo: a laje
historicamente supriu informalmente a necessidade de moradia de muitas
pessoas, tendo adquirido feições próprias de uma nova cultura que sobre ela
se desenvolveu e frutificou.
Ressalta-se que nos dias hodiernos o instituto em comento permanece em
plena expansão, não mais delimitado ao âmbito das comunidades originadas
em morros por parcela considerável de pessoas socialmente excluídas.
O legislador vislumbrou essa realidade e regrou a laje de forma a
abranger objetivamente – e não subjetivamente – seus destinatários.
Eis uma boa aplicação legislativa à máxima efetividade dos direitos
fundamentais, entre os quais a moradia qualificada pelo predicativo da
dignidade, postulado informador e basilar de nosso Estado Democrático.
A moradia digna é direito inafastável e titularizado por todos,
indistintamente, sendo importante atribuir a tal prerrogativa âmbito de
abrangência prospectiva, sem delimitações prévias, salvo quanto aos
regramentos urbanísticos e moldura legal, que deverão ser observados, os
quais, em última análise, se constituem em mecanismos de segurança do
próprio direito que se está a proteger.
O presente estudo buscou tratar de maneira inicial o tema da laje e propor
discussões acerca da matéria, pois muitas implicações sociais e jurídicas
surgirão e serão discutidas no âmbito doutrinário, judicial e legislativo.
Portanto, com relação ao direito de laje, tudo está por vir.
Alea iacta est !
3.6. Referências
ARRUDA ALVIM; COUTO, Mônica Bonetti. Comentários ao Código Civil
brasileiro: do direito das coisas. Rio de Janeiro. Forense, 2009.
ARRUDA ALVIM; COUTO, Mônica Bonetti. Confronto entre situação de direito real
e de direito obrigacional. Prevalência da primeira, prévia e legitimamente
constituída – salvo lei expressa em contrário. Parecer publicado na Revista de
Direito Privado , São Paulo: Ed. RT, v. 1, jan.⁄mar. 2000.
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PELUSO, Cezar (Coord.). Código Civil comentado : doutrina e jurisprudência. 10. ed.
São Paulo: Manole, 2016; 11. ed. 2017.
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Condomínio e incorporações . 11. ed. Rio de Janeiro:
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ROSA JÚNIOR, Luiz Emygdio Franco da. Manual de direito financeiro & direito
tributário . 17. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2003.
SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo . 23. ed. São Paulo:
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TAVARES, Alexandre Macedo. Fundamentos de direito tributário . Florianópolis:
Momento Atual, 2003.
1. CANOTILHO e MOREIRA. Apud SILVA, José Afonso da. Curso de direito
constitucional positivo . 23. ed. rev. e atual. São Paulo: Malheiros, 2003. p. 92.
2. ESPÍNDOLA, Ruy Samuel. Conceito de princípios constitucionais . 2. ed.
rev., atual. e ampl. São Paulo: Ed. RT, 2002. p. 80-81.
3. BRASIL, Constituição Federal (1988). Constituição da República Federativa
do Brasil . Brasília: Senado, 1988. p. 17.
4 . TAVARES, Alexandre Macedo. Fundamentos de direito tributário .
Florianópolis: Ed. Momento Atual, 2003. p. 11.
5 . HIGA, Renato Kenji. A dignidade da pessoa humana e o positivismo jurídico.
Disponível em: [
www.pge.sp.gov.br/centrodeestudos/boletins/boletim12001/doutrina/adignidade.htm
]. Acesso em: 08.11.2017.
6 . HERKENHOFF, João Batista. Direito e utopia . 4. ed. Porto Alegre: Livraria
do Advogado, 2001. p. 20.
7. TJPE. 26 a Vara Cível da Comarca de Recife – Seção B. Ações de usucapião
002769184. 2013.8.17.0001 e 0071376-44.2013.8.17.0001. Julgamento em 14
de julho de 2017. Disponível em: [www.megajuridico.com/wp-
content/uploads/2017/08/Sentenca-Usucapiao-ExtraordinarioDireito-de-
laje.pdf]. Acesso em: 09.11.2017.
8 . BARBOSA, Rui. Apud ROSA JÚNIOR, Luiz Emygdio Franco da. Manual de
direito financeiro & direito tributário. 17. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p.
344.
9 . CAMBI, Eduardo; SILVA, Reinado Pereira e; LEWIS, Sandra A. Lopes B. et
al. Constituição, justiça e sociedade. Editora OAB/SC, 2007. v. 1. p. 54-55.
10 . MIRANDA, Jorge. Apud SILVA, José Afonso da. Curso de direito
constitucional positivo . 23. ed. rev. e atual. São Paulo: Malheiros, 2003. p. 95-
96.
11 . ESCOBAR, Vinicius de Freitas. A proteção dos direitos sociais no Brasil pelo
Ministério Público do Trabalho. Disponível em: [
www.ambitojuridico.com.br/site/index.php?
n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=8022 ]. Acesso em: 08.11.2017.
12 . Comentários ao Código Civil brasileiro , v. XI, t. II, p. 55.
13 . ARRUDA ALVIM. Confronto entre situação de direito real e de direito
obrigacional. Prevalência da primeira, prévia e legitimamente constituída –
salvo lei expressa em contrário. Parecer publicado na Revista de Direito
Privado , São Paulo: Ed. RT, v. 1, jan.⁄mar. 2000. p. 103-106.
14 . LOUREIRO, Francisco Eduardo. In: PELUSO, Cezar (Coord.). Código Civil
comentado, p. 1515.
15 . LOUREIRO, Francisco Eduardo. In: PELUSO, Cezar (Coord.). Código Civil
comentado, p. 1468.
16 . A laje é uma nova espécie de direito real de propriedade sobre coisa própria…
sobre um espaço tridimensional que se expande a partir da laje de uma
construção-base em direção ascendente ou a partir do solo dessa construção em
direção subterrânea. OLIVEIRA, Carlos Eduardo Elias de. O que é direito real
de laje à luz da Lei n. 13.465/17, parte 1 e 2 . Publicado eletronicamente pelo
Colégio Notarial do Brasil. Disponível em: [ www.cnbsp.org.br ]. Acesso em:
07.11.2017.
17 . PEREIRA, Caio Mário da Silva. Condomínio e incorporações . 11. ed. Rio de
Janeiro: 2014. p. 123.
4
CONJUNTOS HABITACIONAIS SEGUNDO A
LEI 13.465, DE 11 DE JULHO DE 2017
4.1. Introdução
O propósito deste estudo é expor o retrocesso que representa, no processo
de crescimento sustentável dos municípios brasileiros, a regularização dos
núcleos urbanos informais na forma estabelecida nos artigos 59 e 60 da Lei
13.465/2017.
Para tanto, faz-se necessário espelhar o impacto das mutações sociais na
concepção jurídica da propriedade privada, deixando o direito de propriedade
de ser entendido como direito real absoluto regulamentado pelo Direito Civil,
passando a ser delineado pelo Direito Constitucional, tanto no âmbito da
propriedade individual quanto no âmbito do direito social, com a consagração
na Constituição Federal de 1988 do princípio da função social da
propriedade .
Após a contextualização do direito de propriedade e sua função social,
passaremos a discorrer sobre a regularização dos núcleos urbanos informais
como conjuntos habitacionais na forma estabelecida na Lei 13.465/2017, por
meio da utilização da metodologia de exegese constitucional de forma a
identificar as linhas mestras da função social da propriedade e de outros
princípios intrinsecamente a ela relacionados que podem ser extraídos dos
mandamentos constitucionais e das legislações infraconstitucionais que os
regulamentam.
4.5.1.1. Legitimação
Extrai-se da leitura do texto legal que o legislador se respalda em várias
medidas jurídicas, urbanísticas ambientais e sociais com o objetivo de
estimular a regularização dos assentamentos irregulares, concedendo titulação
aos seus possuidores, de modo a atender ao princípio constitucional do direito
à moradia digna, tratado como direito social pela Carta da República e
inserido no rol das garantias e direitos fundamentais, bem como insere nessas
medidas jurídicas princípios constitucionais inerentes à função social da
propriedade urbana e do meio ambiente ecologicamente sustentável.
Nesse contexto, a Lei cria o instituto jurídico da legitimação nas espécies
de legitimação de posse (artigo 11, VI) e legitimação fundiária (artigo 11,
VII).
A legitimação da posse se dá por ato exclusivo do poder público, que, ao
reconhecer a posse do imóvel objeto da Reurb, em qualquer de suas duas
modalidades, identificando seus ocupantes, indicando o tempo de ocupação e
a natureza da posse, confere o título, que poderá ser convertido em direito
real de propriedade, ou seja, ela constitui a forma originária de aquisição de
direito real.
A legitimação fundiária é o meio pelo qual se legitima o direito real de
propriedade sobre o imóvel localizado em área pública ou privada, objeto de
Reurb, não importando sua modalidade. Por meio dela, o beneficiário da
Reurb-S tem direito à concessão da propriedade plena antes do prazo de
cinco anos necessário para a usucapião especial, desde que obedecidos os
requisitos prescritos na Lei.
4.5.1.2. Direito de laje
Usos e costumes, também denominados de direito informal, são fontes do
direito. Nas unidades habitacionais irregulares, a comunidade cria regras de
convivência, sendo tais regras erigidas espontaneamente, resultantes das
necessidades das pessoas que nela convivem. Assim surgiu o direito de laje ,
principalmente nas favelas, consistindo na cessão da laje – espaço plano
situado na parte superior da unidade habitacional – pelo ocupante da moradia
a um terceiro, permitindo que este construa para si outra moradia, que
também pode ser transferida a outrem. Esse instituto é similar ao instituto
suíço denominado sobrelevação ou direito de superfície, por meio do qual o
concessionário está autorizado a construir sobre a superfície sua propriedade.
As formalizações dessas transferências de direito sobre a moradia se
operacionalizam por meio das associações de moradores, que atuam como
Cartórios de Registro Imobiliário, emitindo instrumento próprio ou recibos,
nos quais constam as mesmas informações necessárias para a compra e venda
formal, na presença de testemunhas e com reconhecimento de firma pela
associação de moradores, que, após toda a tramitação, registra a transferência
dos direitos de habitação.
O legislador ordinário recepcionou os usos e costumes das comunidades
informais na Lei, criando o instituto do direito de laje , introduzindo-o no
campo do direito formal no artigo 55, acrescendo mais um direito real ao
ordenamento jurídico pátrio, estabelecendo a possibilidade de titulação às
pessoas que construam puxadinhos no espaço superior ou no subsolo de
edificações titularizadas por terceiros, desde que por estes autorizadas.
4.5.1.3. Conjuntos habitacionais
Do histórico das políticas públicas habitacionais implementadas no Brasil
extrai-se que conjuntos habitacionais são conglomerados de casas em
determinada região com características em comum na construção, geralmente
pertencente a programas sociais de habitação.
O Provimento 58/1989 da Corregedoria Geral da Justiça do Estado de
São Paulo (CGJ/SP), no item 172.1 do Capítulo XX, assim conceitua
conjunto habitacional: “[…] o empreendimento em que o parcelamento do
imóvel urbano, com ou sem abertura de ruas, é feito para alienação de
unidades habitacionais já edificadas pelo próprio empreendedor”.
Pretende a Lei 13.465/2017 promover a regularização fundiária urbana
(Reurb), consistindo em um dos instrumentos por ela utilizados para alcançar
esse objetivo os conjuntos habitacionais . Para tanto, prescreve no artigo 59:
Art. 59. Serão regularizados como conjuntos habitacionais os núcleos
urbanos informais que tenham sido constituídos para a alienação de
unidades já edificadas pelo próprio empreendedor, público ou privado.
4.8. Referências
BULOS, Uadi Lammêgo. Mutação constitucional. São Paulo: Saraiva, 1997.
BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de direito constitucional. 10. ed. São Paulo: Saraiva,
2017.
BULOS, Uadi Lammêgo. Constituição Federal anotada . 12. ed. São Paulo: Saraiva,
2017.
CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito constitucional e teoria da Constituição. 7. ed. 18.
reimp. Coimbra: Almedina, 2003.
CARDOSO, Adauto Lucio. Política habitacional no Brasil: balanço e perspectivas.
Observatório IPPUR/UFRJ . Última atualização em 28.01.2008. Disponível
em: [http://
observatoriodasmetropoles.ufrj.br/download/adauto_polhab_brasil.pdf.htm ].
Acesso em: 20.12.2017.
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE). A
população brasileira é eminentemente urbana. 2001.
LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 21. ed. São Paulo: Saraiva,
2017.
REVISTA DE DIREITO DA CIDADE, Direito Formal e direito informal nos centros
urbanos brasileiros. v. 7, n. 2, Rio de Janeiro: UFRJ, 2011, p. 673.
TARTUCE, Flávio. Direito civil: direito das coisas. 8. ed. São Paulo: Forense, 2016. v.
4.
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direitos reais. 16. ed. São Paulo: Atlas, 2016.
v. 5.
5.1. Introdução
O Brasil experimentou no século passado o fenômeno do êxodo rural, de
forma que a população brasileira migrou da área rural para a urbana.
Esse fluxo migratório gerou, em escala exponencial, o aumento
desenfreado dos núcleos urbanos, que cresceram sem a observância das
regras do parcelamento do solo, trazendo como consequência a carência de
equipamentos públicos como áreas verdes para o lazer, escolas e postos de
saúde.
Além da desorganização dos centros urbanos, a grande concentração de
pessoas elevou o número de infrações penais cometidas, fato este que produz
um sentimento crescente de insegurança na população.
Com a propulsão do número de crimes, criou-se uma necessidade
inevitável nos ocupantes dos centros urbanos, qual seja, a de procurar formas
de repelir ou diminuir a sensação de insegurança. Uma das formas
encontradas foi a criação de loteamentos com acesso controlado, pois, com a
adoção dessa forma de parcelamento do solo, evita-se o ingresso de pessoas
estranhas no seio da comunidade, gerando o sentimento de segurança. Com
isso, elas passam a acreditar que as medidas adotadas servem como barreiras
capazes de ao menos diminuir o avanço da marginalidade.
A vigência da Lei 13.465, de 11 de julho de 2017, em seu artigo 78,
inovou o sistema legislativo com a inclusão do § 8° no artigo 2° da Lei
6.766/1979, prevendo de forma expressa a figura do loteamento com acesso
controlado, que era admitido pela jurisprudência nacional desde que
condicionado à existência de prévia lei municipal.
Percebemos dos escólios acima citados que nos bens de uso comum do
povo os usuários dos mesmos são indeterminados e anônimos, uma vez que
poderão ser utilizados por qualquer indivíduo componente do povo de um
determinado território. Por sua vez, os bens de uso especial terão os seus
usuários identificados de forma direta ou indiretamente, porém o sujeito será
passível de determinação.
5.3.2.2. Momento da transmissão da propriedade privada em área
loteada para o poder público
O fracionamento de uma gleba em lotes com o intuito de serem ofertados
ao público tem como requisito para a sua aprovação a separação de parte de
seu território para compor os equipamentos públicos, e, por consequência de
determinação legal, serão considerados bens públicos.
Essa transmissão de propriedade ocorrerá nos termos do artigo 22 da Lei
6.766/79, no momento do registro do loteamento, ou seja, os espaços
públicos integram de forma imediata o conjunto de bens públicos no instante
em que o loteamento é registrado. A essa transmissão dá-se o nome de
concurso voluntário. Nesse sentido, temos a lição de Diogo de Figueiredo
Moreira Neto 10 :
Com efeito, o preceito do art. 22 da Lei 6.766/1979 diz que com o registro
do loteamento esses bens passam para o domínio do município, porém, não
há discriminação do regime jurídico dominial respectivo, de sorte que
caberá à afetação fixar a categoria dominial que o imóvel integrará. E se o
imóvel vem, desde sua gênese, já afetado com destinação diversa,
induvidosamente que esse bem nunca esteve e não está inserido na
categoria de bem de uso comum do povo. […]
Parece claro que não basta a circunstância de ser projetado via de
comunicação, praça, ou espaço livre dentro de um loteamento urbano que
outorga ao imóvel, por si só, a característica dominial de bem de uso
comum do povo, porém sua efetiva afetação para esse fim é que vai
determinar sua classificação e destinação.
Cabe, ainda, mencionar a lição ofertada por Rodrigo Lelis Lopes, que em
seu trabalho Publicidade registral de atividades potencialmente
contaminadoras de solo, apresentado quando da conclusão do curso de
especialização em Direito Notarial e Registral, pela Faculdade Arthur
Thomas (2011), correlaciona o princípio da concentração e o da informação:
Como se vê o princípio da concentração no Direito Registral se inter-
relaciona com o princípio da informação ambiental do Direito Ambiental. A
razão dessa assertiva é que pelo princípio da concentração pretende-se que
todas as situações relevantes envolvendo um imóvel estejam concentradas
em um único documento, passível de publicidade plena, pois eventuais
adquirentes inevitavelmente terão acesso a tais registros públicos.
6.1. Introdução
Na esfera da regularização fundiária rural, as inovações da Lei
13.465/2017 não apresentam sérias dificuldades constitucionais.
A uma, porque a opção do legislador não foi pelo desenvolvimento
sistemático dessa matéria, reorganizando as normas num único diploma legal,
mas ele apenas alterou ou inseriu normas em outras leis federais, já em vigor,
que cuidam da regularização fundiária rural e não apresentam trauma de
infraestrutura jurídica acerca da constitucionalidade de cada uma, tal como se
colhe (i) na Lei 8.629/93, que disciplina a reforma agrária, fortemente
alterada pela Lei 13.465/2017, e (ii) na Lei 11.952/2009, que estabelece o
Programa Terra Legal e, então, dispõe sobre a regularização em terras da
União, no âmbito da Amazônia Legal, considerando, especialmente, as regras
que tratam da regularização fundiária rural, também com significativas
mudanças na Lei 13.465/2017.
A duas, porque, nesse âmbito, a própria Constituição Federal,
expressamente, prevê a competência legislativa privativa da União para
dispor sobre direito agrário (art. 22, I, da CF), sobre os próprios da União (e
boa parte das regras de regularização fundiária rural tocam bens próprios da
União), sobre política agrícola e fundiária, bem como sobre reforma agrária
(art. 184 da CF).
Contudo, no âmbito da regularização fundiária urbana (Reurb), as
inovações da Lei 13.465/2017 apresentam potenciais de conflitos com as
normas constitucionais em maior densidade, (i) quer em razão da opção do
legislador em disciplinar essa matéria em modo amplo, orgânico e
sistematizado num diploma legal de centralização ou de catálise da matéria,
com boa dose de regras principiológicas, indicativas de diretrizes gerais, de
instrumentos ou institutos jurídicos diversos de regularização e de
uniformização procedimental; (ii) quer em virtude do quadro concorrente de
legislação sobre direito urbanístico (art. 24, I, da CF), observada a feição
normativa nacional e de mera diretriz da União nesse ponto (art. 21, XX, c.c.
o art. 182, caput , ambos da CF), a exigir respeito à autonomia municipal (art.
30, I e VIII, da CF); (iii) quer em decorrência do confronto com as normas
constitucionais que desafiam, pontualmente, a exegese de um ou outro
instrumento, instituto ou norma jurídica da nova lei, tal como no foco dos
limites constitucionais da propriedade urbana em geral (art. 182, § 2°, da CF),
em regime privado (art. 5°, caput , XXII, XXIII e XXIV, e art. 170, II e III,
ambos da CF) ou público (v.g., art. 183, § 3°, da CF), ou, então, da garantia
constitucional da liberdade associativa (art. 5°, caput , XVII e XX, da CF).
Aliás, a circunstância de que já tramita no E. STF a ADI 5.771, ajuizada
pela Procuradoria-Geral da Pública, a ADI 5.787, ajuizada pelo Partido dos
Trabalhadores (PT), e a ADI 5.883, ajuizada pelo Instituto dos Arquitetos do
Brasil (IAB), todas na relatoria do Ministro Luiz Fux, com ataques materiais,
além dos formais, centrados em maior peso em pontos da disciplina da
Reurb, confirma essa evidência.
Assim, apenas nesse aspecto pertinente à Reurb e considerando tão
somente algumas dificuldades constitucionais da Lei 13.456/2017, sob o
enfoque intrínseco (material), este breve estudo está concentrado, sem
preocupação alguma em discorrer sobre inconstitucionalidade extrínseca (ou
formal) ou acerca dos variados ângulos das questões apresentadas nas ADIs
ajuizadas, e, enfim, sem pretensão alguma de esgotar tão vasta problemática
que a nova lei de regularização fundiária, dilatada em múltiplos regramentos,
encerra.
Ao que parece, a nova norma não é inconstitucional, pois ela não atua em
modo imperativo, mas apenas na expressa concordância do expropriado, e, se
assim é, com as vontades manifestadas do expropriante e do expropriado,
tudo se resolve como se fosse uma desapropriação amigável com maior
benefício ao expropriado, ou seja, com possibilidade de ele ainda discutir o
justo preço em juízo, recebendo, de futuro, a eventual diferença que houver.
Contudo, não se pode deixar de reconhecer que o caminho trilhado
significa, com efeito, certo enfraquecimento do direito de propriedade (da
posição do particular expropriado), em contraponto a um fortalecimento do
direito de desapropriação (da posição do ente público expropriante).
Nele se fomenta o tal acordo, não se olvidando que o expropriado, já
desapossado, está, não raramente, em situação de necessidade econômica,
precisando do dinheiro para compra de outro imóvel destinado à sua moradia,
por exemplo. Assim, fica realmente tentado a receber, desde logo, a
integralidade do depósito prévio.
Nele, ainda, com a dedução do valor a ser levantado pelo expropriado,
embora clausulado “a critério do juiz”, pode haver uma inversão do custeio
das despesas processuais (art. 34-A, § 3°), a incluir, então, os honorários
antecipados do perito, não mais ficando a antecipação dessa verba a cargo do
expropriante, como parece ser o devido 24 .
Nesse contexto, pois, cresce em importância a praxe judiciária da
avaliação preliminar e do depósito integral correspondente, prévio à imissão
provisória do expropriante, com bem aponta Luís Paulo Aliende Ribeiro:
O estudo da indenização da desapropriação leva à conclusão, portanto, de
que somente se apresenta conforme a Constituição a interpretação que
confere eficácia aos seus comandos de garantia de direitos fundamentais,
qual seja, a que impõe o depósito do valor integral da indenização, apurado
mediante avaliação expedita, como pressuposto necessário ao deferimento
judicial da imissão provisória da posse. Isso porque a indenização há de ser
prévia a qualquer sacrifício de direitos, o que abrange a perda do direito de
posse. São muitos os resultados positivos desse depósito prévio, que,
realizado com a cautela de que toda desapropriação significativa seja, a
requerimento do expropriante, precedida de estudo preliminar por
Comissão de Peritos designada para esse fim, garante ao cidadão a certeza
de que a imissão da expropriante na posse do imóvel expropriado se
efetivou depois que o valor da indenização, apurado por profissional com
capacidade técnica e experiência, se encontra depositado em conta judicial
com correção monetária, disponível 25 .
6.4. Conclusão
No esforço de enfrentar apenas algumas dificuldades constitucionais da
Lei 13.456/2017 em regularização fundiária urbana, sem a pretensão de
esgotar as inúmeras questões que, neste campo, a nova lei apresenta, bem
como sem arrogância alguma de apontar soluções definitivas em problemas
tão intricados e ainda de recente decantação doutrinária e jurisprudencial,
apresentam-se, neste estudo, tão somente reflexões, que, em resumo,
enunciam as seguintes conclusões:
6.4.1. Considerando a disciplina panorâmica da Reurb, na Lei
13.465/2017 (abstração ao exame pontual deste ou daquele instituto, desta ou
daquela norma), não se vislumbra, a priori , para o conjunto normativo
avaliado em sua integralidade, como um todo, inconstitucionalidade na
indicação de diretrizes genéricas e principiológicas, nem nas previsões e
disciplinas de instrumentos e institutos jurídicos diversos (alguns próprios de
regularização, outros próprios do direito civil ou do direito administrativo,
mas úteis e aplicáveis à regularização) para o fomento e potencialização da
regularização fundiária, nem, ainda, nas determinações para uniformização
elementar de procedimentos correlatos, na medida em que essas matérias
comportam regramento em lei pela União, no quadro de sua competência
para dispor em caráter diretivo sobre direito urbanístico, em atenção ao
interesse nacional, sem desrespeito aos interesses regionais e locais, e,
portanto, sem afogar as autonomias dos estados-membros e, particularmente,
dos municípios.
6.4.2. O exame pontual, contudo, de alguns institutos novos ou alterações
legais impostos pela Lei 13.465/2017 demanda acurada atenção em sua
exegese de confronto material com as normas e princípios constitucionais,
quer para podar as inconstitucionalidades, quer para apontar interpretações de
adequação e conformidade com a ordem constitucional.
6.4.3. O instituto da legitimação fundiária inserto na Lei 13.465/2017
apresenta inúmeras e graves dificuldades constitucionais, tudo indicando que
não é possível compatibilizá-lo com a CR/88 em área pública, bem como em
área privada, salvo, neste último caso, se houver prévia arrecadação de
imóvel urbano abandonado, na forma prevista nessa mesma lei.
6.4.4. Embora a Lei 13.465/2017, ao acrescer o art. 34-A ao Decreto-Lei
3.365/41, tenha flexibilizado a desapropriação, facilitando a incorporação do
imóvel expropriado ao domínio público antes do pagamento integral, e
fortalecendo a posição do expropriante em relação à do expropriado, não se
vislumbra inconstitucionalidade na inovação acrescida, mas se impõe reforçar
a orientação jurisprudencial de exigência de prévia e provisória avaliação, por
perito judicial, com o respectivo depósito integral, antes da imissão
provisória do expropriado na posse do bem, e, portanto, também antecedente
aos efeitos da concordância inserta nessa norma acrescida.
6.4.5. Quer na figura do condomínio de lotes, quer na figura do
loteamento de acesso controlado, que a Lei 13.465/2017 alçou ao plano
normativo federal, as contribuições destinadas ao pagamento das despesas
comuns e próprias da administração, manutenção e conservação do núcleo
urbano têm natureza de obrigações propter rem , em modo equiparado ao
regime condominial, nos termos do art. 36-A, caput e parágrafo único, da Lei
6.766/79, acrescido pela Lei 13.465/2017, cuja exigência não afronta a
garantia constitucional da liberdade associativa (art. 5°, caput , XVII e XX,
da CF), ainda que o titular da unidade ou lote não se vincule ou se retire da
associação sem fins lucrativos, que exerce a administração, observada a atual
previsão legal, em interpretação amarrada aos princípios da solidariedade, da
boa-fé e da vedação ao enriquecimento sem causa.
Daniela Freitas
Advogada. Pós-graduanda em Direito Notarial e Registral e também em Processo
Civil.
7.1. Introdução
Na lição de Caio Mário da Silva Pereira, “dá-se o condomínio quando a
mesma coisa pertence a mais de uma pessoa, cabendo a cada uma delas igual
direito, idealmente, sobre o todo e cada uma de suas partes” 1 .
Do conceito trazido à colação,
[…] destacam-se duas características primordiais do condomínio: 1) a
cotitularidade dominial sobre uma mesma coisa; 2) o regime jurídico de
cotas ou partes ideais sobre a coisa, cabendo a cada condômino uma fração
ou percentagem sobre o todo, sem que o direito incida sobre uma parte
fisicamente determinada. Os direitos dos condomínios, assim, são
quantitativamente iguais, porque incidem em partes ideais sobre a
totalidade da coisa, embora possam ser quantitativamente distintos,
proporcionais à força de seus quinhões 2 .
7.3. Conclusão
O condomínio urbano simples, previsto no art. 61 e seguintes da Lei
13.465/17, surge do reconhecimento pelo Estado da existência do
compartilhamento da propriedade do bem imóvel – ou seja, inúmeras casas
no mesmo terreno; uma única casa com cômodos utilizados privativamente
por determinadas famílias ou ambas as situações no mesmo contexto
espacial.
Ainda que preferencialmente se tenha criado uma modalidade de
condomínio com o interesse precípuo de regularizar núcleos urbanos
informais ocupados por pessoas de baixa renda (ou qualificadas de maneira
diversa pela Municipalidade), nada impede a exploração da cotitularidade
dominial das coisas de maneira mais abrangente.
Afinal, muitos desejam ter uma casa à beira-mar, ou uma propriedade no
campo, um chalé nas montanhas ou um apartamento numa grande cidade,
tudo ao mesmo tempo.
Todavia, diversos são os entraves para a concretização desses sonhos –
pouca utilização para o tamanho do investimento, os altos preços do mercado
para compra do imóvel, entre outros embaraços.
No entanto, em sendo possível adquirir com exclusividade um cômodo
ou uma fração ideal de uma casa na praia, de uma propriedade no campo ou
de um chalé nas montanhas – sempre lembrando que a aquisição de cômodo
em condomínio urbano simples ocorrerá com a abertura de matrícula da
unidade autônoma, ou seja, com o reconhecimento de direitos e obrigações
individuais, o que gera maior tranquilidade quanto à preocupação de possível
acionamento judicial por dívidas pessoais de outros condomínios –, talvez
muitas pessoas se interessassem.
A Lei 13.465/17 ao criar o condomínio urbano simples, não trouxe
apenas mais uma ferramenta de regularização fundiária urbana, mas abriu um
novo horizonte para o fomento do mercado imobiliário e a concretização de
diversas formas da exploração da cotitularidade dominial.
1. Instituições de direito civil . 18. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002. v. IV. p.
175.
2. LOUREIRO, Francisco Eduardo. In: PELUSO, Cezar (Coord.). Código Civil
comentado. 10. ed. Barueri: Manole, 2016. p. 1241.
8
DO REQUERIMENTO DE CANCELAMENTO
DO LOTEAMENTO URBANO POR SUB-
ROGAÇÃO DOS DIREITOS DO LOTEADOR
ORIGINÁRIO
O que deve ser observado, assim, é se toda a área foi adquirida pela
sucessora por meio do mesmo instrumento, para que não se configure, na
verdade, a compra dos lotes individualmente.
As partes devem deixar claro que a compra se refere a um imóvel, ou
seja, não aos lotes individualizados.
Isso porque a ausência de clareza quanto à aquisição integral do
loteamento poderá gerar óbice ao cancelamento, justamente no que diz
respeito à legitimidade do loteador e à vedação de oferta dos lotes individuais
ao público.
Por vezes, verificando as matrículas abertas quando da regularização, é
possível avaliar se há indicativos de que ocorreu a aquisição individual dos
lotes decorrentes do parcelamento, ou se foi adquirido o loteamento inteiro.
A simples aquisição concomitante de todos os lotes pela sucessora não
descaracteriza a alienação individual de cada lote, não sendo suficiente para,
por si só, afastar o requisito legal de ausência de comercialização das parcelas
fruto do loteamento.
Alguns instrumentos de negócios jurídicos entabulados entre loteadores
originários e adquirentes sucessores chegam a conter a atribuição de um
mesmo valor simbólico para cada lote, consistente na divisão entre o
montante total pactuado para a aquisição do empreendimento e o número de
lotes.
Com base nisso, transmitem-se todos os direitos e deveres decorrentes do
loteamento, conforme deverá constar expressamente da própria escritura,
constando também que a compradora toma a posse, domínio e direitos,
inclusive de ações, que sobre o referido imóvel vinha exercitando a
vendedora, loteadora original.
Tudo isso para que fique claro que houve a aquisição de todo o
loteamento, e não a simples alienação de lotes, interpretando-se o negócio
jurídico como alienação de um único bem, qual seja, o loteamento, quando
então, de fato, ocorrerá a transferência dos direitos decorrentes desse negócio
jurídico.
8.2.3. Reversão de bens públicos
Quanto à incorporação de bens ao patrimônio do Município, diz o art. 22
da Lei 6.766/79 que:
Art. 22. Desde a data de registro do loteamento, passam a integrar o
domínio do Município as vias e praças, os espaços livres e as áreas
destinadas a edifícios públicos e outros equipamentos urbanos, constantes
do projeto e do memorial descritivo.
A possibilidade de intimação por hora certa foi novidade trazida pela Lei
13.465/2017 e incluída tanto no microssistema do Programa Minha Casa,
Minha Vida quanto na lei da alienação fiduciária de bens imóveis,
objetivando encontrar relação com o disposto no artigo 252 do Código de
Processo Civil, que dispõe sobre a citação por hora certa.
Nos termos da lei, após duas tentativas de localização do devedor
fiduciante e havendo suspeita motivada de ocultação, será possível realizar a
intimação de um terceiro, sendo da família ou não, acerca do retorno, no
próximo dia útil, oportunidade em que, ao retornar e não encontrando o
devedor, realizar-se-á a intimação por hora certa, na pessoa da família ou
vizinho.
Considerando que a lei trouxe expressamente a aplicação subsidiária do
Código de Processo Civil, ainda que o terceiro informado no dia anterior
quanto ao retorno do oficial não esteja no local ou se recuse a receber, a
intimação se dará, a rigor do artigo 253, § 2°, do diploma processual
mencionado.
Art. 7°-C. […].
§ 6° Nos condomínios edilícios ou outras espécies de conjuntos imobiliários
com controle de acesso, a intimação de que trata este artigo poderá ser feita
ao funcionário da portaria responsável pelo recebimento de
correspondência. (Incluído pela Lei 13.465, de 2017)
Igualmente inserida na Lei 11.977/2009 e na Lei 9.514/97, em seu artigo
26, § 3°-B, permite a intimação denominada por hora certa em locais de
acesso controlado e tem o escopo de adequar à norma a realidade cada vez
mais reclusa e vertical da sociedade atual. Desse modo, visando evitar
circunstancial dificuldade de intimação da pessoa residente em edifícios ou
condomínios, a intimação poderá ser realizada na pessoa do funcionário da
portaria, responsável pelo recebimento da correspondência.
Certamente a controvérsia da presente intimação circulará sobre o termo
responsável pelo recebimento da correspondência, ou seja, o funcionário
deverá ter a atribuição específica de receber as correspondências ou apenas o
fato de trabalhar na portaria já lhe confere a atribuição de receber tais
intimações? A nosso ver, exigir a expressa atribuição iria de encontro à mens
legis , já que facilitar é o objetivo, não merecendo guarida eventual tese da
atribuição específica.
Art. 7°-C. […].
§ 7° Caso não seja efetuada a intimação pessoal ou por hora certa, o oficial
de registro de imóveis ou de registro de títulos e documentos ou o
serventuário por eles credenciado promoverá a intimação do devedor
fiduciante por edital, publicado por três dias, pelo menos, em um dos
jornais de maior circulação ou em outro de comarca de fácil acesso, se no
local não houver imprensa diária, contado o prazo para o pagamento
antecipado da dívida da data da última publicação do edital.
Art. 26, § 3°-A. Quando, por duas vezes, o oficial de registro de imóveis ou
de registro de títulos e documentos ou o serventuário por eles credenciado
houver procurado o intimando em seu domicílio ou residência sem o
encontrar, deverá, havendo suspeita motivada de ocultação, intimar
qualquer pessoa da família ou, em sua falta, qualquer vizinho de que, no dia
útil imediato, retornará ao imóvel, a fim de efetuar a intimação, na hora que
designar, aplicando-se subsidiariamente o disposto nos arts. 252, 253 e 254
da Lei 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil).
9.5. Referências
AQUISIÇÃO NOS TERMOS DO FAR – FUNDO DE ARRENDAMENTO
RESIDENCIAL: aspectos práticos da qualificação no Registro de Imóveis.
Boletim Eletrônico do Portal do RI , n. 157/2014, 21.08.2014. Disponível em: [
www.portaldori.com.br/2014/08/21/aquisicao-nos-termos-do-far-fundo-de-
arrendamento-residencial-aspectos-praticos-da-qualificacao-no-registro-de-
imoveis/ ]. Acesso em: 09.11.2017.
CHALHUB, Melhim Namem. Alienação fiduciária: negócio fiduciário. 5. ed. Rio de
Janeiro: Forense, 2017.
DIP, Ricardo. Registro de Imóveis (princípios) . Série Registros sobre Registros; t. I.
São Paulo: Editora Primus, 2017.
FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Curso de direito civil: direitos
reais. 9. ed. Salvador: JusPodivm, 2013.
KÜMPEL, Vitor Frederico. Alienação fiduciária em garantia I . Disponível em: [
www.migalhas.com.br/Registralhas/98,MI196865,41046-
Alienacao+Fiduciaria+em+-Garantia+I ].
KÜMPEL, Vitor Frederico. Alienação fiduciária em garantia II . Disponível em: [
www.migalhas.com.br/Registralhas/98,MI197788,71043-
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KÜMPEL, Vitor Frederico. A natureza jurídica da alienação fiduciária . Disponível
em: [ www.migalhas.com.br/Registralhas/98,MI212459,61044-
A+natureza+juridica+da+alienacao+fiduciaria ].
LOUREIRO, Luiz Guilherme. Registros públicos: teoria e prática. 5. ed. São Paulo:
Método, 2014.
NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Leis civis comentadas. 3. ed.
São Paulo: Ed. RT, 2012.
OLIVEIRA, Renata; MATSUBARA, Patrícia. A utilização do pacto marciano em
contratos de alienação fiduciária . Disponível em: [
www.machadomeyer.com.br/pt/noticias-lexpress/a-utilizacao-do-pacto-
marciano-em-contratos-de-alienacao-fiduciaria ]. Acesso em: 09.11.2017.
TARTUCE, Flávio. Manual de direito civil . 6. ed. São Paulo: Método, 2016.
10.1. Introdução
A Constituição da República Federativa do Brasil assegura como um dos
fundamentos: os valores sociais do trabalho e da livre-iniciativa. Seguindo o
raciocínio jurídico constitucional, vem a ordem econômica e financeira com
os princípios gerais da atividade econômica:
A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre
iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os
ditames da justiça social, observados: […]
II – propriedade privada;
III – função social da propriedade […] 1 .
10.3. Conceito
O instituto jurídico da alienação fiduciária instituído pela Lei 9.514/1997,
por meio dos contratos de compra e venda com alienação fiduciária,
ingressam no Registro de Imóveis apresentando incidência relevante no
mercado imobiliário. Na dinâmica delineada pela lei, Melhim Namem
Chalhub conceitua:
10.5. Características
Dentro do contexto doutrinário, pode-se afirmar que as características do
contrato de alienação fiduciária de imóveis são as seguintes:
a) Bilateral ou sinalagmático porque cria obrigações para ambos os
contraentes, que serão ao mesmo tempo credores e devedores. A
bilateralidade está no fato de estabelecer para o credor fiduciário a
obrigação de transferência da propriedade após o pagamento do débito e de
impor ao devedor fiduciante o dever de pagar o financiamento ajustado. Há
reciprocidade de obrigações. É muito importante essas características, pois
a execução da prestação por um dos contraentes será causa do cumprimento
da do outro, e, havendo inadimplemento de qualquer uma das obrigações,
romper-se-á o equilíbrio contratual;
b) Oneroso, porque ambas as partes contratantes auferem vantagens
patrimoniais, pois, de um lado, o sacrifício da perda da coisa corresponderá
ao proveito do recebimento do crédito que possibilitará a aquisição da plena
propriedade após o pagamento do débito, e, de outro, o sacrifício do
fornecimento do crédito corresponderá ao proveito da sua devolução
acrescido de juros e garantido pela propriedade resolúvel. Há, pois, uma
equivalência entre os ônus e as vantagens;
c) Comutativo, porque havendo objeto determinado, ter-se-á equivalência
das prestações e contraprestações e certeza quanto ao seu valor no ato da
celebração do negócio;
d) Típico, pois as regras que o disciplinam estão especificadas de maneira
precisa na lei, fazendo com que os contratantes adotem necessariamente a
forma legal;
e) É contrato por adesão e não de adesão, onde não há monopólio de fato
ou de direito, não sendo necessidade vital como é o fornecimento de água,
luz, gás, etc. Embora possa ser elaborado previamente e em grande escala,
pode o consumidor discutir uma ou mais cláusulas e propor até a inserção
de alguma outra, bastando não contratar se delas discordar. 15
Artigo 27. […] § 2°-A. Para os fins do disposto nos §§ 1° e 2° deste artigo,
as datas, horários e locais dos leilões serão comunicados ao devedor
mediante correspondência dirigida aos endereços constantes do contrato,
inclusive ao endereço eletrônico. (Incluído pela Lei 13.465, de 2017)
§ 2°-B. Após a averbação da consolidação da propriedade fiduciária no
patrimônio do credor fiduciário e até a data da realização do segundo
leilão, é assegurado ao devedor fiduciante o direito de preferência para
adquirir o imóvel por preço correspondente ao valor da dívida, somado aos
encargos e despesas de que trata o § 2 ° deste artigo, aos valores
correspondentes ao imposto sobre transmissão inter vivos e ao laudêmio, se
for o caso, pagos para efeito de consolidação da propriedade fiduciária no
patrimônio do credor fiduciário, e às despesas inerentes ao procedimento de
cobrança e leilão, incumbindo, também, ao devedor fiduciante o pagamento
dos encargos tributários e despesas exigíveis para a nova aquisição do
imóvel, de que trata este parágrafo, inclusive custas e emolumentos
(Incluído pela Lei 13.465, de 2017). […] 29 .
10.8. Jurisprudência
ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA – PRAZO DA DÍVIDA – REQUISITOS
FORMAIS.
1VRPSP – PROCESSO: 1100924-03.2017.8.26.0100. LOCALIDADE: São
Paulo. DATA DE JULGAMENTO: 28.11.2017. DATA DJ: 28.11.2017.
UNIDADE: 1. RELATOR: Tânia Mara Ahualli. LEI: LAF – Lei de
Alienação Fiduciária de Bem Imóvel – 9.514/1997. ART. 24 INC: II
Alienação fiduciária – prazo da dívida – requisitos formais. ÍNTEGRA
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO – COMARCA
DE SÃO PAULO – FORO CENTRAL CÍVEL – 1a VARA DE
REGISTROS PÚBLICOS
Processo Digital n. 1100924-03.2017.8.26.0100. Classe – Assunto Dúvida –
Registro de Imóveis. Requerente: BS Factoring Fomento Comercial Ltda.
Vistos.
Trata-se de dúvida suscitada pelo Oficial do 1° Registro de Imóveis da
Capital, a requerimento de BS. FACTORING FOMENTO COMERCIAL
LTDA, tendo em vista a negativa em se proceder ao registro de instrumento
público de instituição de alienação fiduciária, lavrada pelo Oficial do
Registro Civil e Tabelião de Notas de Pirapitingui – Itu, referente ao imóvel
objeto da matrícula n. 95.815.
O óbice registrário refere-se à ausência do prazo de vencimento da dívida e
das condições de pagamento no título apresentado, em dissonância com o
previsto no artigo 24, II, da Lei 9.514/97, o que acarretaria risco à
segurança jurídica dos negócios. Juntou documentos às fls. 04/175.
A suscitada apresentou impugnação às fls. 176/187. Argumenta que o
dispositivo legal não se aplica à presente hipótese, por se tratar de negócio
jurídico acessório, ou seja, visa garantir os títulos de crédito. Aduz que o
Código Civil expressamente permite a emissão de títulos de crédito sem
data de vencimento ou condições de pagamento, devendo prevalecer sobre a
Lei n. 9.514/97.
O Ministério Público opinou pela procedência da dúvida (fls. 193/194).
É o relatório. Passo a fundamentar e a decidir.
Saliento que a presente questão já foi objeto de análise no processo n.
1049051-95.2016.8.26.0100. Como é sabido, ao se constituir a alienação
fiduciária, tanto por instrumento público como particular, a propriedade do
imóvel é transferida para o credor, ficando o devedor na posse direta do
bem durante o período em que vigorar o financiamento. Caso haja o
inadimplemento da dívida, o Cartório de Registro de Imóveis notifica o
devedor, de modo a constituí-lo em mora e, persistindo em aberto a
obrigação, a propriedade será consolidada em favor do credor.
Ao par da alegação da suscitada, no tocante à existência de dispositivo legal
no Código Civil, versando sobre a possibilidade de emissão de títulos de
crédito sem a data de vencimento ou condições de pagamento, deve-se
atentar que o instituto da alienação fiduciária é regulado por lei específica,
qual seja, a Lei n. 9.514/97, que se sobrepõe à lei geral, no caso de conflito
de regulamento.
Neste contexto, incumbe ao Registrador ao examinar o instrumento
particular de constituição de alienação fiduciária em garantia e outras
avenças, verificar se foram observados os requisitos formais previstos no
artigo 24 da Lei 9.514/97: “Art. 24: O contrato que serve de título ao
negócio fiduciário conterá: I – o valor do principal da dívida; II – o prazo e
as condições de reposição do empréstimo ou do crédito do fiduciário; III – a
taxa de juros e os encargos incidentes; IV – a cláusula de constituição da
propriedade fiduciária, com a descrição do imóvel objeto da alienação
fiduciária e a indicação do título e modo de aquisição; V – a cláusula
assegurando ao fiduciante, enquanto adimplente, a livre utilização, por sua
conta e risco, do imóvel objeto da alienação fiduciária; VI – a indicação,
para efeito de venda em público leilão, do valor do imóvel e dos critérios
para a respectiva revisão; VII – a cláusula dispondo sobre os procedimentos
de que trata o art. 27”.
Ressalto que o rol estabelecido em lei é taxativo, apontando como
elementos indispensáveis ao contrato de alienação fiduciária o prazo e as
condições de reposição do empréstimo ou do crédito do fiduciário.
Assim, deve o Registrador, ao qualificar o título apresentado, constatar se
foram preenchidos todos os requisitos legais, sob pena de violação ao
princípio da legalidade. Como bem exposto pelo Oficial: “a data do
vencimento e as condições do negócio fiduciário, dizem respeito à sua
especialização a fim de que todos possam ter conhecimento da extensão dos
gravames sobre a propriedade imóvel, notadamente, terceiros que
eventualmente queiram contratar com o fiduciante, na hipótese deste
procedimento, como prestador de garantia”.
Neste contexto, o Egrégio Conselho Superior da Magistratura, já decidiu
que: “Registro de Imóveis – Dúvida – Contrato de alienação fiduciária em
que não observados integralmente os requisitos previstos no artigo 24, e
seus incisos, da Lei n. 9.514/97 – Registro inviável – Recurso não provido”
(Apelação Cível n. 254-6/0, da Comarca de Avaré; Apelante: Vilemondes
Garcia de Andrade Filho. Apelado: Oficial de Registro de Imóveis, Títulos
e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica da mesma Comarca. Rel.: Ex
Corregedor Geral da Justiça: José Mário Antonio Cardinale; j. 20.04.2005).
Confira-se do corpo do Acórdão: “… Por fim, anoto que ao oficial
registrador compete verificar a presença dos requisitos do contrato de
alienação fiduciária como condição para o registro, em cumprimento do
princípio da legalidade, afigurando-se correta a recusa quando ausentes
aqueles previstos em lei. Neste sentido a seguinte lição de José de Mello
Junqueira: ‘Todos esses elementos exigidos pelo art. 24 são obrigatórios e
devem constar do contrato, e ainda o prazo de carência previsto no § 2° do
art. 26. São requisitos de validade para o título de constituição da
propriedade fiduciária e que deverão ser observados, rigorosamente, pelas
partes, Tabeliães e registros de Imóveis e para que nasça o direito e garantia
real nele representado’ (Alienação Fiduciária de Coisa Imóvel , Ed.
ARISB, 1998, pág. 46). Logo, mostra-se correta a exigência imposta pelo
Registrador. Diante do exposto, julgo procedente a dúvida suscitada pelo
Oficial do 1° Registro de Imóveis da Capital, a requerimento de BS.
FACTORING FOMENTO COMERCIAL LTDA, e consequentemente
mantenho os óbices registrários. Deste procedimento não decorrem custas,
despesas processuais e honorários advocatícios. Oportunamente remetam-se
os autos ao arquivo. P.R.I.C..” 35
10.9. Conclusão
Diante da introdução e desenvolvimento do instituto da alienação
fiduciária, sem esgotar o assunto, pode-se concluir que, no quesito Sistema
Financeiro Imobiliário, as demais modalidades contratuais deixaram de ser
opção frequente dos usuários do serviço, diante das vantagens jurídicas que o
contrato de alienação proporciona, dinamizando as relações sociais e
econômicas no País.
Seguindo o raciocínio jurídico, a questão dos instrumentos particulares
com força de escritura pública ou de documento público, lavrado por meio de
escritura pública, pelo Tabelião de Notas, estatisticamente tem avançado
nestas duas décadas da existência da Lei 9.514/1997.
As partes contratantes possuem direitos e obrigações. Na contratação da
garantia fiduciária importa na transmissão da propriedade do bem ao credor,
sob condição resolutiva e o adimplemento, faz a reversão da propriedade ao
patrimônio do devedor fiduciante.
Nas condições pactuadas se incidir o inadimplemento/mora, será
necessário um procedimento administrativo de intimação extrajudicial, com
previsão legal e normativa e o direito aquisitivo não surtirá os efeitos
plenamente, ocorrendo a consolidação ao credor fiduciário.
Nota-se que, deve observar os requisitos do valor da dívida, do prazo,
taxa de juros, descrição do bem imóvel e prazo de carência, diante da
legalidade, boa-fé objetiva e a função social dos contratos, garantindo a
desjudicialização.
Portanto, a alienação fiduciária proporciona segurança às relações
jurídicas para os investidores serem atraídos para o crédito imobiliário, o que
certamente será viável para financiamento pelo Sistema Financeiro
Imobiliário (SFI), Sistema Financeiro de Habitação (SFH), Programa Minha
Casa, Minha Vida (PMCMV) e Fundo de Arrendamento Residencial (FAR)
do mútuo emprestado, permitindo que mais famílias tenham acesso a um
financiamento a partir de um planejamento prévio e consigam adquirir a tão
sonhada casa própria, garantindo o direito social à moradia, previsto na
Constituição da República Federativa do Brasil e fazendo circular riquezas e
a economia para a estabilidade nacional.