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Curso RDP

RETA FINAL
DPE-RJ PÓS-EDITAL

RESUMO DE
TUTELA COLETIVA

www.rumoadefensoria.com
DPE-RJ TUTELA COLETIVA

SUMÁRIO
TUTELA COLETIVA – DPE-RJ .................................................................................................................................................................................... 4
PARTE I ................................................................................................................................................................................................................... 4
1. EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA AÇÃO COLETIVA NO BRASIL E NO MUNDO ......................................................................................................... 4
2. PRINCÍPIOS DO PROCESSO COLETIVO ........................................................................................................................................................... 5
2.1 ACESSO À ORDEM JURÍDICA JUSTA ............................................................................................................................................................. 5
2.2 PRINCÍPIO DA PARTICIPAÇÃO...................................................................................................................................................................... 5
2.3 ECONOMIA PROCESSUAL ............................................................................................................................................................................ 6
2.4 PRINCÍPIO DO INTERESSE JURISDICIONAL NO CONHECIMENTO DO MÉRITO DO PROCESSO COLETIVO .................................................... 6
2.5 PRINCÍPIO DA MÁXIMA PRIORIDADE JURISDICIONAL DA TUTELA COLETIVA ............................................................................................. 6
2.6 PRINCÍPIO DA DISPONIBILIDADE MOTIVADA DA AÇÃO COLETIVA .............................................................................................................. 6
2.7 PRINCÍPIO DA NÃO TAXATIVIDADE DA AÇÃO COLETIVA ............................................................................................................................. 7
2.8 PRINCÍPIO DO MÁXIMO BENEFÍCIO DA TUTELA JURISDICIONAL COLETIVA COMUM ................................................................................. 8
2.9 PRINCÍPIO DA OBRIGATORIEDADE DA EXECUÇÃO COLETIVA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO ......................................................................... 9
2.10 PRINCÍPIO DA AMPLA DIVULGAÇÃO DA DEMANDA................................................................................................................................ 10
2.11 PRINCÍPIO DA INFORMAÇÃO AOS ÓRGÃOS LEGITIMADOS ..................................................................................................................... 10
2.12 PRINCÍPIO DA INTEGRAÇÃO ENTRE A LACP E O CDC ............................................................................................................................... 10
2.13 PRINCÍPIO DA COMPETÊNCIA ADEQUADA .............................................................................................................................................. 11
3. CONDIÇÕES DA AÇÃO.................................................................................................................................................................................. 15
3.1 LEGITIMIDADE AD CAUSAM ...................................................................................................................................................................... 15
3.1.1 LEGITIMIDADE ATIVA ............................................................................................................................................................................. 15
3.1.2 NATUREZA JURÍDICA: CONCORRENTE E DISJUNTIVA ............................................................................................................................. 15
3.1.3 LEGITIMIDADE DA DEFENSORIA PÚBLICA: APROFUNDAMENTO ........................................................................................................... 15
3.1.4 LEGITIMIDADE ORDINÁRIA E EXTRAORDINÁRIA .................................................................................................................................... 20
3.1.5 REPRESENTATIVIDADE ADEQUADA (OU ADEQUACY REPRESENTATION) .............................................................................................. 21
3.1.6 O MINISTÉRIO PÚBLICO.......................................................................................................................................................................... 21
3.1.7 ENTES DA ADMINISTRAÇÃO DIRETA ...................................................................................................................................................... 22
3.1.8 ENTES DA ADMINISTRAÇÃO INDIRETA ................................................................................................................................................... 22
3.1.9 ASSOCIAÇÕES ......................................................................................................................................................................................... 23
3.1.10 LEGITIMIDADE ATIVA SUBSIDIÁRIA ...................................................................................................................................................... 26
3.1.11 LEGITIMIDADE PASSIVA ....................................................................................................................................................................... 26
3.1.12 AÇÃO COLETIVA PASSIVA (LEGITIMIDADE EXTRAORDINÁRIA PASSIVA) .............................................................................................. 27
3.2 INTERESSE PROCESSUAL ........................................................................................................................................................................... 28
3.2.1 AÇÕES PSEUDOCOLETIVAS..................................................................................................................................................................... 28
4. LITISCONSÓRCIO ......................................................................................................................................................................................... 29
4.1 LITISCONSÓRCIO ATIVO INICIAL DE COLEGITIMADOS............................................................................................................................... 29
4.2 LITISCONSÓRCIO ATIVO SUPERVENIENTE DE COLEGITIMADOS ............................................................................................................... 29
5. CONEXÃO, CONTINÊNCIA E LITISPENDÊNCIA .............................................................................................................................................. 30
5.1 EFEITO DA CONEXÃO OU CONTINÊNCIA: PRORROGAÇÃO DA COMPETÊNCIA ......................................................................................... 30
5.2 PRORROGAÇÃO DE COMPETÊNCIA E OS LIMITES TERRITORIAIS DA COISA JULGADA COLETIVA .............................................................. 31
5.4 EFEITO DA LITISPENDÊNCIA ...................................................................................................................................................................... 32
TUTELA COLETIVA – DPE-RJ .................................................................................................................................................................................. 33
PARTE II................................................................................................................................................................................................................. 33
PROCESSO ESTRUTURAL ................................................................................................................................................................................. 33
TUTELA COLETIVA – DPE-RJ .................................................................................................................................................................................. 37
PARTE III................................................................................................................................................................................................................ 37
1. ORIGEM DA IDEIA DE PROTEÇÃO DOS GRUPOS VULNERÁVEIS ................................................................................................................... 37
2. INTERESSE PRIMÁRIO E SECUNDÁRIO ......................................................................................................................................................... 38
3. REVISANDO AS ONDAS RENOVATÓRIAS ..................................................................................................................................................... 39
4. RESOLUÇÃO DE CONFLITOS NA DIMENSÃO MOLECULAR........................................................................................................................... 41
5. DIREITOS DIFUSOS, COLETIVOS E INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS.................................................................................................................. 42
6. DANO MORAL COLETIVO ............................................................................................................................................................................. 44
7. DANO TEMPORAL........................................................................................................................................................................................ 48
8. TEORIA DO DESVIO PRODUTIVO ................................................................................................................................................................. 48
9. DANOS SOCIAIS ........................................................................................................................................................................................... 49
10. TERMO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA ................................................................................................................................................. 49

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TUTELA COLETIVA – DPE-RJ .................................................................................................................................................................................. 54


PARTE IV ............................................................................................................................................................................................................... 54
A INFLUÊNCIA DAS CLASS ACTIONS NO BRASIL ............................................................................................................................................... 54
OPT-OUT E OPT-IN........................................................................................................................................................................................... 55
INTERESSE OU DIREITO SUBJETIVO? ............................................................................................................................................................... 56
COISA JULGADA NAS AÇÕES COLETIVAS ......................................................................................................................................................... 57
SENTENÇA COLETIVA ENVOLVENDO DIREITOS DIFUSOS ................................................................................................................................ 58
SENTENÇA COLETIVA ENVOLVENDO DIREITOS COLETIVOS STRICTO SENSU .................................................................................................. 58
SENTENÇA COLETIVA ENVOLVENDO DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS ................................................................................................ 58
SUSPENSÃO DA AÇÃO INDIVIDUAL ................................................................................................................................................................. 59
TRANSPORTE IN UTILIBUS DA COISA JULGADA ............................................................................................................................................... 61
LIQUIDAÇÃO E EXECUÇÃO DA SENTENÇA COLETIVA ...................................................................................................................................... 70

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TUTELA COLETIVA – DPE-RJ


PARTE I
Evolução histórica (Brasil e mundo). Ordem constitucional. Condições da ação coletiva. Litispendência e conexão.
Prescrição. Sentença e coisa julgada. A integração normativa (Constituição Federal, Lei da Ação Civil Pública, Código
de Defesa do Consumidor, Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei do Mandado de Segurança, Lei da Ação Popular,
Estatuto da Pessoa com Deficiência e outras leis especiais).

1. Evolução histórica da ação coletiva no Brasil e no mundo

Olá, meus amigos. Nosso edital para DPE-RJ traz diversos pontos importantes, e tentaremos trazer o máximo
de conteúdo para vocês nesse resumo.

Sabemos que ainda não há, no Brasil, um código específico que regule o processo coletivo. Deste modo,
diversos são os diplomas que fazem parte do sistema microssistema de tutela coletiva. E no aspecto processual, os
de mais importância são o CDC e a Lei da Ação Civil Pública.

Além disso, a própria CF/88 traz os princípios que regem o processo coletivo (artigos 5º, caput, I, XXXV, LIII,
LIV, LV, LVI, LX, LXXVIII; 93, IX), bem como, especificamente, da tutela do consumidor, do meio ambiente e de outros
direitos difusos (artigos 5º, XXXII, LXX, LXXIII, 127, 129, 170, 225 etc.)

Contudo, também há outras leis que se referem ao processo coletivo, como a Lei da Ação Popular, o ECA, a
Lei de Improbidade Administrativa, o Estatuto da Cidade, entre outras.

No que tange à influência internacional no Direito Brasileiro, trago o escólio de Patricia Miranda em sua obra
sobre Tutela Coletiva (2020, p. 47):

(...) As fontes de inspiração das normas contidas no CDC são o Code de la Consommation,
as leis gerais da Espanha, de Portugal, do México e de Quebec, além da Rule 23 norte-
americana etc. Ressalte-se a importância dos movimentos sociais (trabalhadores, negros,
consumidores) ocorridos nas décadas de 1950 e 1960 nos Estados Unidos para o
desenvolvimento da ação coletiva 9. Também a doutrina italiana exerceu grande influência
sobre os autores do anteprojeto, especialmente em razão de duas obras coletivas
resultantes de dois Congressos realizados na década de 1970 (Le azioni a tutela di interessi
collettivi, Atti del convegno di studio, Università di Pavia, 11-12 giugno 1974; La tutela degli
interessi diffusi nel diritto comparato, con particolare riguardo alla protezione
dell’ambiente e dei consumatori,III Congresso Nazionale dell’Associazione Italiana di Diritto
Comparato, Università degli Studi di Salerno, 22-25 maggio 1975), bem como de uma obra
monográfica pioneira de Vicenzo Vigoritti, denominada Interessi collettivi e processo: la
legitimazione ad agire, publicada em 1979. O Congresso de Pavia contou com a
participação de muitos juristas, como Vittorio Denti, Mauro Cappelletti, Andrea Proto
Pisani e outros, tendo produzido importantes trabalhos, que incentivaram o estudo do
processo coletivo. Podem ser citados a Relazione introdutiva, de Vittorio Denti, bem como
os artigos de Mauro Cappelletti (Appunti sulla tutela giurisdizinale di interessi collettivi o
diffusi), Stefano Rodotà (Le azioni civilistiche) e outros.

O Congresso de Salerno, por sua vez, promovido pela Associazione Italiana di Diritto
Comparato, naquela ocasião presidida por Mauro Cappelletti, também gerou valiosos

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frutos, especialmente no que tange à análise do direito comparado, pois demonstrou como
vinha sendo tratada à época a tutela coletiva nos ordenamentos estrangeiros.

Mauro Cappelletti, no artigo supracitado, aborda alguns pontos fundamentais. Inicia


tratando da tradicional dicotomia público-privado e da sua inadequação na sociedade
contemporânea. Sustenta ser essa dicotomia insuficiente, superada pela realidade de uma
sociedade de massa, de conflitos de massa, muito mais complexa e articulada do que
aquela simplista dicotomia tradicional. Preocupa-se depois o autor em demonstrar a
inadequação do processo civil tradicional (com seus institutos fundamentais, do
contraditório à prova, à coisa julgada) à proteção dos direitos coletivos. Cuida da
necessidade de adequação do processo e das instituições processuais às exigências de
tutela de tais novos interesses, afirmando que o antigo tema da necessidade de tutela e
de acesso à justiça assume uma configuração nova, enfatizando o desencontro entre as
duas concepções de processo civil (que resolve lides interindividuais e que resolve lides
envolvendo a coletividade) e as dificuldades de ordem política (porque a várias forças
interessa manter o status quo) e psicológica (a resistência natural do homem à novidade)
do superamento da concepção tradicional. A legislação brasileira é, hoje, uma das
melhores do mundo quanto à ação coletiva, pois houve uma preocupação em criar regras
não apenas de direito material, mas também de direito processual, o que propicia uma
proteção ao direito coletivo muito mais efetiva do que ocorre em outros países, em que as
normas de direito material são boas, mas não encontram no sistema processual um meio
adequado e eficaz de proteção”.1 (GRIFOS NOSSOS).

2. Princípios do Processo Coletivo

Ponto expresso em nosso edital!

2.1 Acesso à ordem jurídica justa

A doutrina estabelece que o acesso à ordem jurídica justa decorre do princípio da inafastabilidade da
jurisdição, pois esse tem dois aspectos:

(...) a relação entre a jurisdição e a solução administrativa de conflitos e o acesso à


ordem jurídica justa, que dá novos contornos ao princípio, firme no entendimento
de que a inafastabilidade somente existirá concretamente por meio do
oferecimento de um processo que efetivamente tutele o interesse do titular do
direito material.2

Esse princípio também é chamado de “acesso à tutela jurisdicional adequada”.

2.2 Princípio da participação

Para Daniel Assumpção Neves (em sua obra sobre Processo Coletivo, 2020), podemos falar ainda em um
chamado “princípio da participação”.

1Pizzol, Patricia Miranda. Tutela Coletiva, Processo Coletivo e Técnicas de Padronização das decisões. Ed. Revista dos Tribunais, 2020.
2Neves, Daniel Amorim Assumpção. Manual de processo coletivo: volume único / Daniel Amorim Assumpção Neves - 4. Ed. atual, e ampl. -
Salvador: Ed. JusPodivm, 2020, p.115/116.

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Isso porque “diferente do que ocorre com o processo individual, o resultado positivo do processo coletivo
afetará uma quantidade considerável de pessoas, levando-se em conta que os titulares do direito serão a coletividade
ou um grupo, classe ou categoria de pessoas. Portanto, se a participação pelo processo é garantida a uma quantidade
razoável de sujeitos que compõem a coletividade ou comunidade tutelada, é correto concluir que esses sujeitos não
terão participação no processo em que se busca a tutela de direitos materiais. O resultado, afinal, terá repercussão
subjetiva significativa e a tutela do direito material proveniente do processo coletivo fará com que os sujeitos que
não puderam participar do processo sejam diretamente beneficiados pelo seu resultado. Conforme já teve
oportunidade de afirmar acertadamente a doutrina, no processo coletivo existe uma menor participação no processo
e uma maior participação pelo processo”.3

Cleber Masson, Landolfo Andrade e Adriano Andrade, dissertando sobre esse mesmo princípio, pontuam
que

“Pode-se falar em dois tipos de princípios processuais da participação: o que


assegura a "participação no processo" e o que contempla a "participação pelo
processo". Participar no processo, em suma, é ter assegurado o direito ao
contraditório, ou seja, de ser informado acerca dos atofs processuais e de praticá-
los. Participar pelo processo, diversamente, é utilizá-lo para influir nos destinos da
nação e do Estado, ou seja, é empregá-lo com vistas ao seu escopo político.” (2017,
p. 41).
2.3 Economia processual

Para este princípio, o direito deve resolver os conflitos de interesse, empregando o mínimo possível de
atividades processuais.

2.4 Princípio do interesse jurisdicional no conhecimento do mérito do processo coletivo

Para a doutrina, no âmbito processual coletivo é necessário o abandono do formalismo excessivo, devendo
o magistrado dar prioridade ao conhecimento do mérito do processo coletivo.

2.5 Princípio da máxima prioridade jurisdicional da tutela coletiva

Alguns motivos recomendam que se dê prioridade ao processamento e julgamento dos feitos coletivos em
relação aos individuais:

• A resolução de processos coletivos evita a proliferação de diversas demandas individuais;


• Afasta a existência de diversas decisões conflitantes;
• Em regra, o interesse social prevalece sobre o individual, o que justificaria a preferência às ações coletivas.

2.6 Princípio da disponibilidade motivada da ação coletiva

Tendo em vista a relevância social, em regra não se pode desistir das ações coletivas. Segundo a doutrina,
para este princípio:

(...) a desistência infundada ou o abandono da ação coletiva demandam a assunção


do polo ativo pelo Ministério Público ou por outro legitimado (LACP, art. 5.º , § 3º ;
LAP, art. 9.º ).

3 Ibidem, p. 120.

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Se a desistência for fundada (motivada), até mesmo o Ministério Público estará


dispensado de assumir o polo ativo. Quando o autor da ação for o Ministério Público,
o magistrado poderá se opor a uma desistência que considere infundada ou ao
abandono da ação, submetendo tal ato ao controle de um outro órgão do Parquet.

Defendemos que tal órgão deve ser o Conselho Superior do Ministério Público, por
analogia ao art. 9.º , § 4.º , da LACP, embora haja quem entenda que o órgão
apropriado, por analogia ao art. 28 do CPP, seja o chefe da instituição (Procurador-
Geral de Justiça ou Procurador-Geral da República).8

De todo modo, urge atentar que tal princípio refere-se à disponibilidade da ação,
mas não de seu objeto. Deste, o autor da ação jamais poderá abrir mão, uma vez
que não é seu titular, ou, pelo menos, não é seu titular exclusivo, e sim um mero
portador (representante adequado, legitimado extraordinário) dos interesses
levados a juízo”.4 (GRIFOS NOSSOS).

2.7 Princípio da não taxatividade da ação coletiva

Antes do CDC, a Lei da Ação Civil Pública estabelecia, no art. 1º, as espécies de bens que poderiam ser
defendidos por meio de ACP. Basicamente eram: meio ambiente, consumidor, bens e direitos de valor artístico,
estético, histórico, turístico e paisagístico. Acontece, contudo, que o CDC incluiu o inciso IV ao art. 1º da LACP, que
assim passou a constar:

IV - a qualquer outro interesse difuso ou coletivo. (Incluído pela Lei nº 8.078 de 1990)

Ainda, o art. 90 do CDC estabeleceu o diálogo das fontes e a aplicação subsidiária da LACP ao CDC:

Art. 90. Aplicam-se às ações previstas neste título as normas do Código de Processo
Civil e da Lei da Ação Civil Pública inclusive no que respeita ao inquérito civil, naquilo
que não contrariar suas disposições.

Já o art. 21 da Lei de Ação Civil Pública estabeleceu o seguinte:

Art. 21. Aplicam-se à defesa dos direitos e interesses difusos, coletivos e individuais,
no que for cabível, os dispositivos do Título III da lei que instituiu o Código de Defesa
do Consumidor. (Incluído Lei nº 8.078, de 1990)

Desta forma, como salienta a doutrina:

“A integração entre o artigo 90 do CDC e o artigo 21 da LACP, também se tomou


possível a defesa, via ação civil pública, de quaisquer espécies de interesses
individuais homogêneos. Não se pode, desde então, falar em taxatividade dos bens
defensáveis por ações coletivas.”5

4 Andrade, Adriano Interesses difusos e coletivos esquematizado I Adriano Andrade, Cleber Masson, Landolfo Andrade - 6. ed. rev .• atual. e
ampl.- Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2016, 43.
5 Andrade, Adriano Interesses difusos e coletivos esquematizado I Adriano Andrade, Cleber Masson, Landolfo Andrade - 6. ed. rev .• atual. e

ampl.- Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2016, 44.

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2.8 Princípio do máximo benefício da tutela jurisdicional coletiva comum

Esse princípio quer dizer, em outras palavras, que os efeitos da sentença de procedência de uma ação
coletiva têm o condão de beneficiar as vítimas e sucessores, que poderão invocar o direito nela reconhecido e
proceder à liquidação e execução do título de maneira individual. Ou seja, havendo uma decisão em uma ação
coletiva que beneficie aquela determinada vítima/sucessor, não será mais necessário o ajuizamento de uma ação
individual visando obter o título judicial.

A doutrina chama esse fenômeno de transporte ou extensão in utilibus da coisa julgada coletiva, e é
assegurado no art. 103, § 3º, do CDC. Aplica-se às ações coletivas comuns em geral (ação civil pública, ação popular,
mandado de segurança coletivo). Chamo sua atenção para esse tema, porque já caiu algumas provas da Defensoria.
É importante que você conheça o art. 103 e o art. 104 do CDC:

Art. 103. Nas ações coletivas de que trata este código, a sentença fará coisa julgada:

I - erga omnes, exceto se o pedido for julgado improcedente por insuficiência de


provas, hipótese em que qualquer legitimado poderá intentar outra ação, com
idêntico fundamento valendo-se de nova prova, na hipótese do inciso I do parágrafo
único do art. 81;

II - ultra partes, mas limitadamente ao grupo, categoria ou classe, salvo


improcedência por insuficiência de provas, nos termos do inciso anterior, quando se
tratar da hipótese prevista no inciso II do parágrafo único do art. 81;

III - erga omnes, apenas no caso de procedência do pedido, para beneficiar todas as
vítimas e seus sucessores, na hipótese do inciso III do parágrafo único do art. 81.

§ 1° Os efeitos da coisa julgada previstos nos incisos I e II não prejudicarão interesses


e direitos individuais dos integrantes da coletividade, do grupo, categoria ou classe.

§ 2° Na hipótese prevista no inciso III, em caso de improcedência do pedido, os


interessados que não tiverem intervindo no processo como litisconsortes poderão
propor ação de indenização a título individual.

§ 3° Os efeitos da coisa julgada de que cuida o art. 16, combinado com o art. 13 da
Lei n° 7.347, de 24 de julho de 1985, não prejudicarão as ações de indenização por
danos pessoalmente sofridos, propostas individualmente ou na forma prevista neste
código, mas, se procedente o pedido, beneficiarão as vítimas e seus sucessores, que
poderão proceder à liquidação e à execução, nos termos dos arts. 96 a 99.

§ 4º Aplica-se o disposto no parágrafo anterior à sentença penal condenatória.

Art. 104. As ações coletivas, previstas nos incisos I e II e do parágrafo único do art.
81, não induzem litispendência para as ações individuais, mas os efeitos da coisa
julgada erga omnes ou ultra partes a que aludem os incisos II e III do artigo anterior
não beneficiarão os autores das ações individuais, se não for requerida sua
suspensão no prazo de trinta dias, a contar da ciência nos autos do ajuizamento da
ação coletiva.

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O artigo 104 autoriza que, aquele indivíduo que já tenha ajuizado sua ação individual, seja informado do
ajuizamento da ação coletiva e exerça a escolha de vincular-se aos efeitos da demanda coletiva, aproveitando-se do
transporte in utilibus, suspendendo sua ação individual em 30 dias, ou opte por prosseguir com a sua demanda
individual, não se vinculando ao resultado da ação coletiva (aquilo que a doutrina chama de right to opt out), fugindo
dos efeitos da coisa julgada coletiva.

CAIU NA DPE-GO-2010-INSTITUTO CIDADES6: Tratando-se da defesa do consumidor em juízo, é correto afirmar:

A Admite-se o transporte, in utilibus, dos efeitos da coisa julgada produzida em ação coletiva para as ações individuais
de reparação de danos.

B Os legitimados ativos para a propositura da ação coletiva são obrigados ao pagamento das custas processuais e
dos honorários advocatícios, em caso de sucumbência

C A improcedência do pedido por insuficiência de prova na ação coletiva que tutela direito difuso impede a
propositura de nova ação coletiva, mesmo que colacionada nova prova.

D A coisa julgada na ação coletiva, que tutela direitos coletivos em sentido estrito, terá eficácia erga omnes entre as
partes litigantes e o grupo, categoria ou classe.

E O Ministério Público é parte ilegítima para a propositura da ação coletiva que tutela interesses individuais
homogêneos.

CAIU NA PROVA PARA PROMOTOR - MP-SC - 2019 - CONSUPLAN: No regime jurídico da coisa julgada, nos processos
coletivos, existe a possibilidade do aproveitamento do resultado do processo na esfera jurídica individual, que se
denomina transporte in utilibus.7

2.9 Princípio da obrigatoriedade da execução coletiva pelo Ministério Público

No processo coletivo comum, caso o autor da ação deixe de executar a sentença, o Ministério Público é
obrigado a fazê-lo. Na ACP, essa obrigação torna-se necessária DEPOIS do trânsito em julgado (art. 15, LACP):

Art. 15. Decorridos 60 dias do trânsito em julgado da sentença condenatória, sem


que a associação autora lhe promova a execução, deverá fazê-lo o Ministério
Público, facultada igual iniciativa aos demais legitimados. (Redação dada pela Lei nº
8.078, de 1990)

Contudo, na Lei da Ação Popular, obrigação existirá tanto em relação à execução definitiva (já transitada em
julgado), como em relação à execução provisória (contudo, nas ações populares, apenas a sentença de segunda
instância é passível de execução provisória, nos termos do art. 16 da LAP).

Art. 16. Caso decorridos 60 dias da publicação da sentença condenatória de segunda


instância, sem que o autor ou terceiro promova a respectiva execução. o
representante do Ministério Público a promoverá nos 30 dias seguintes, sob pena
de falta grave.

6 GAB: A.
7 GAB: C.

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Diferentemente do princípio da indisponibilidade mitigada da ação coletiva, o princípio da indisponibilidade


da execução coletiva é absoluto, não admitindo mitigação.

2.10 Princípio da ampla divulgação da demanda

Previsto no art. 94 do CDC:

Art. 94. Proposta a ação, será publicado edital no órgão oficial, a fim de que os
interessados possam intervir no processo como litisconsortes, sem prejuízo de
ampla divulgação pelos meios de comunicação social por parte dos órgãos de defesa
do consumidor.

A doutrina entende que muito embora tal dispositivo seja especificamente voltado para as ações coletivas
em prol das vítimas das relações de consumo, isso não impede que a regra seja aplicada, com as devidas adaptações,
às ações coletivas em geral.

Tem por objetivo evitar a proliferação de ações individuais, por meio da comunicação sobre a existência de
uma ação coletiva.

2.11 Princípio da informação aos órgãos legitimados

Busca estimular a propositura da ação coletiva. Estabelecido no art. 6º e 7º da LACP:

Art. 6º Qualquer pessoa poderá e o servidor público deverá provocar a iniciativa do


Ministério Público, ministrando-lhe informações sobre fatos que constituam objeto
da ação civil e indicando-lhe os elementos de convicção.

Art. 7º Se, no exercício de suas funções, os juízes e tribunais tiverem conhecimento


de fatos que possam ensejar a propositura da ação civil, remeterão peças ao
Ministério Público para as providências cabíveis.

2.12 Princípio da integração entre a LACP e o CDC

Este princípio informa que o microssistema da tutela coletiva adota a teoria do diálogo das fontes, ou
“diálogo sistemático de coerência”, o qual admite a aplicação simultânea de duas leis, podendo uma servir de base
conceitual para a outra, visando a harmonia e a integração.

Trata-se do resultado da conjugação do art. 90 do CDC com o art. 21, que ele introduziu na LACP.

As principais normas de direito coletivo partem do núcleo básico formado pela LACP + CDC, pois, como vimos,
não existe um Código ou uma lei que trata especificamente do processo coletivo.

Assim, a ACP e o CDC são consideradas NORMAS DE REENVIO, pois o CDC, art. 90, manda aplicar, para tudo
que ele trata, a LACP; e a LACP, em seu art. 21, manda aplicar o CDC em tudo que ela trata. Vejam:

Art. 90 do CDC. Aplicam-se às ações previstas neste título as normas do Código de Processo
Civil e da Lei n° 7.347, de 24 de julho de 1985, inclusive no que respeita ao inquérito civil,
naquilo que não contrariar suas disposições.

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Art. 21 da LACP. Aplicam-se à defesa dos direitos e interesses difusos, coletivos e


individuais, no que for cabível, os dispositivos do Título III da lei que instituiu o Código de
Defesa do Consumidor.

Sobre o núcleo básico (ACP + CDC), são aplicadas todas as demais normas que integram o microssistema da
tutela coletiva: Ação Popular, ECA, MS Coletivo, MI coletivo, ECA, etc.

Prof, mas integratividade é a mesma coisa que subsidiariedade? Não. Vamos diferenciar:

A integratividade do microssistema processual coletivo é aplicada por meio da interpenetração recíproca de


todas as leis que tratam de processo coletivo. Se distingue da subsidiariedade, pois permite a aplicação das normas
independentemente de existir a norma ou não na lei específica. Deve-se analisar o sistema como um todo. Na
subsidiariedade, só se aplica uma lei quando não existir lei específica para aquela situação.

Um exemplo da aplicação integrativa do sistema coletivo: os conceitos de direitos difusos, coletivos e


individuais homogêneos estão no CDC, e são aplicados a todas as ações coletivas, tais como ACP e AP, mesmo que
não verse sobre direito do consumidor, e mesmo que não haja previsão específica na Lei da ACP, da AP, etc.

E o CPC, faz parte desse sistema integrativo do microssistema coletivo?

Não. O CPC não faz parte do sistema integrativo que compõe o diálogo das fontes, sendo sua aplicação
subsidiária e supletiva. Ex.: prazo de apelação (que não é tratado pelas leis do microssistema).

NCPC. Art. 15. Na ausência de normas que regulem processos eleitorais, trabalhistas
ou administrativos, as disposições deste Código lhes serão aplicadas supletiva e
subsidiariamente.

Assim, o CPC não é aplicado integrativamente com as normas que formam o microssistema da tutela coletiva
(ACP, CDC, ECA, MS, etc), mas apenas subsidiariamente, isto é, quando o microssistema coletivo não dispuser sobre
a questão, como no exemplo que demos acima sobre o prazo da apelação.

2.13 Princípio da competência adequada

É possível que as regras de competência territorial façam surgir, no caso concreto, foros concorrentes para
que o autor escolha onde deseja ajuizar a demanda, exceto quando houver apenas uma comarca ou uma seção
judiciária competente para o caso concreto, em hipótese de menor repercussão.

No entanto, a regra é que a escolha será do autor, que a fará mediante um juízo de oportunidade e
conveniência.

Contudo, o princípio da competência adequada, segundo a doutrina, retira do autor essa liberdade,
apontando para a existência de uma obrigatoriedade do foro que se mostrar o MAIS ADEQUADO ao caso concreto.

Esse princípio deriva do direito internacional e do direito-americano, chamado de forum non conveniens, que
servirá para excluir o forum shopping, ou seja, a liberdade do autor em escolher entre mais de um foro que a lei
prevê como competentes.

Sobre o ponto abordado, importante são as palavras da doutrina:

@CURSOEBLOGRDP #DPERJ 11
DPE-RJ TUTELA COLETIVA

(...) As razões para a exigência de um determinado foro no caso concreto,


independentemente da vontade das partes, ainda que existam outros previstos
como competentes pela lei, parece ter como fundamento as mesmas razões que
levaram o legislador a tornar absoluta a regra de competência territorial no processo
coletivo. Dessa forma, a proximidade do ato ilícito discutido no processo, bem como
de suas repercussões nocivas mais diretas, além da facilidade na atuação
jurisdicional, em especial no tocante à colheita de provas, leva parcela da doutrina a
defender o princípio da competência adequada. (...) A regra consagrada no art. 93
do CDC, em especial no tocante aos danos regionais e nacionais, causa distorções à
própria regra de que a competência para a ação civil pública é do foro do local do
dano. Ao exigir a competência da comarca da Capital do Estado ou do Distrito
Federal, é plenamente possível que a escolha do autor afaste a ação do local do
dano, bastando para isso pensar na possibilidade de escolha da comarca do Distrito
Federal em dano regionalizado em Estados de uma das regiões do Brasil. Que
sentido teria uma ação coletiva voltada a impugnar ato ilícito que gera danos aos
Estados da região Norte tramitar no Distrito Federal? Nesse sentido, entendo que o
princípio ora analisado é interessante e por vezes até mesmo necessário para evitar
situações como a descrita, nas quais a própria razão de ser da competência absoluta
do local do dano é colocada em xeque. Registre-se, entretanto, que os precedentes
do Superior Tribunal de Justiça que tratam expressamente do forum non conveniens
e do forum shopping o entendimento foi em sentido contrário à aplicação da tese
ora sugerida, com o fundamento, de que, mesmo sendo reconhecido em países
estrangeiros, não encontra respaldo nas regras processuais brasileiras”8. Por outro
lado, ainda que não fazendo qualquer menção às expressões forum non conveniens
e do forum shopping, há interessante decisão do Superior Tribunal de Justiça em
ação de improbidade administrativa na qual o tribunal, apesar da competência
corrente de três comarcas de Capitais, indicou como competente aquela na qual o
maior número de atos ilícitos havia sido praticado e na qual haveria a maioria dos
documentos necessários ao julgamento da demanda”. No julgamento, o
entendimento foi fundado nos princípios da celeridade processual, ampla defesa e
duração razoável do processo, mas não resta dúvida de que bem poderia ser
explicado pelo princípio ora analisado.9

Com base na competência adequada, o STJ, ao julgar caso envolvendo a tragédia do rompimento da
barragem de Fundão, em Mariana/MG, fixou a escolha do foro competente a partir do Juízo com melhores condições
de dirimir as controvérsias decorrentes do acidente ambiental. Vejamos:

PROCESSUAL CIVIL. CONFLITO POSITIVO DE COMPETÊNCIA. AÇÕES CIVIS PÚBLICAS


AFORADAS NO JUÍZO ESTADUAL E NA JUSTIÇA FEDERAL DE GOVERNADOR
VALADARES/MG. ROMPIMENTO DA BARRAGEM DE FUNDÃO EM MARIANA/MG.
FORNECIMENTO DE ÁGUA POTÁVEL. DANOS SOCIOAMBIENTAIS. RIO DOCE. BEM
PÚBLICO PERTENCENTE À UNIÃO. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. FORO
COMPETENTE. SITUAÇÃO DE MULTICONFLITUOSIDADE. IMPACTOS REGIONAIS E
NACIONAL. CONEXÃO ENTRE AS AÇÕES CIVIS PÚBLICAS OBJETO DO CONFLITO E
OUTRAS QUE TRAMITAM NA 12ª VARA FEDERAL DE BELO HORIZONTE/ MG.
PREVENÇÃO. APLICAÇÃO DA REGRA ESTABELECIDA NA LEI DE AÇÃO CIVIL PÚBLICA.

8 STJ, 3» turma. REsp 1.633.275/SC, rei. MIn. Ricardo Villas Bôas Cueva.j. 08/11/2016, DJe 14/11/2016; STJ, 3* Turma, MC 15,398/RJ, rei. Mín.
Nancy Andríghí, J. 02.04.2009, DJe 23.04.2009
9 Andrade, Adriano Interesses difusos e coletivos esquematizado I Adriano Andrade, Cleber Masson, Landolfo Andrade - 6. ed. rev .• atual. e

ampl.- Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2016, 157.

@CURSOEBLOGRDP #DPERJ 12
DPE-RJ TUTELA COLETIVA

1. Conflito de competência suscitado pela empresa Samarco Mineração S.A. em


decorrência da tramitação de ações civis públicas aforadas na Justiça Estadual e na
Justiça Federal de Governador Valadares/MG, com o objetivo de determinar a
distribuição de água mineral à população valadarense, em virtude da poluição do Rio
Doce ocasionada com o rompimento da barragem de Fundão, em Mariana/MG. (...)
FORO COMPETENTE (BELO HORIZONTE). 9. A problemática trazida nos autos deve
ser analisada à luz do microssistema do processo coletivo, notadamente no que diz
respeito à tutela de interesses difusos e metaindividuais, decorrentes todos eles de
um único evento, qual seja, o desastre ambiental consistente no rompimento da
barragem de Fundão, no dia 5 de novembro de 2015, ocorrido na unidade industrial
de Germano, entre os distritos de Mariana e Ouro Preto (cerca de 100 km de Belo
Horizonte). 10. Nos termos do art. 2º da Lei 7.347/85, o legislador atrelou dois
critérios fixadores ou determinativos de competência, sendo o primeiro o local do
fato - que conduz à chamada competência “relativa”, prorrogável, porque fundada
no critério território, estabelecida, geralmente, em função do interesse das partes;
o outro – competência funcional - que leva à competência “absoluta”, improrrogável
e inderrogável, porque firmada em razões de ordem pública, em que se prioriza a
higidez do próprio processo. 11. A questão que se coloca como premente na
hipótese, decorrente da tutela dos interesses difusos, caracterizados pela
indeterminação dos sujeitos e indivisibilidade do objeto, é como se dará a fixação do
foro competente quando o dano vai além de uma circunscrição judiciária. Outra
resposta não há, senão pela prevenção. 12. Muito embora o conflito positivo de
competência aqui erigido tenha se instaurado entre o Juízo estadual e o Juízo federal
de Governador Valadares, há outras questões mais amplas a serem consideradas
para que se possa definir, com a maior precisão possível, o foro federal em que
devem ser julgadas as ações em comento. (...) 17. Dessas circunstâncias, observa-se
que a 12ª Vara Federal da Secção Judiciária de Minas Gerais possui melhores
condições de dirimir as controvérsias aqui postas, decorrentes do acidente
ambiental de Mariana, pois além de ser a Capital de um dos Estados mais atingidos
pela tragédia, já tem sob sua análise processos outros, visando não só a reparação
ambiental stricto sensu, mas também a distribuição de água à população dos
Municípios atingidos, entre outras providências, o que lhe propiciará, diante de uma
visão macroscópica dos danos ocasionados pelo desastre ambiental do rompimento
da barragem de Fundão e do conjunto de imposições judiciais já direcionadas à
empresa Samarco, tomar medidas dotadas de mais efetividade, que não corram o
risco de ser neutralizadas por outras decisões judiciais provenientes de juízos
distintos, além de contemplar o maior número de atingidos. EXCEÇÕES À REGRA
GERAL. 18. Há que se ressalvar, no entanto, as situações que envolvam aspectos
estritamente humanos e econômicos da tragédia (tais como o ressarcimento
patrimonial e moral de vítimas e familiares, combate a abuso de preços etc) ou
mesmo abastecimento de água potável que exija soluções peculiares ou locais, as
quais poderão ser objeto de ações individuais ou coletivas, intentadas cada qual no
foro de residência dos autores ou do dano. Nesses casos, devem ser levadas em
conta as circunstâncias particulares e individualizadas, decorrentes do acidente
ambiental, sempre com base na garantia de acesso facilitado ao Poder Judiciário e
da tutela mais ampla e irrestrita possível. Em tais situações, o foro de Belo Horizonte
não deverá prevalecer, pois significaria óbice à facilitação do acesso à justiça, marco
fundante do microssistema da ação civil pública. 19. Saliento que em outras ocasiões
esta Corte de Justiça, valendo-se do microssistema do processo coletivo, aplicou a
regra específica de prevenção estabelecida na Lei de Ação Civil Pública para definir

@CURSOEBLOGRDP #DPERJ 13
DPE-RJ TUTELA COLETIVA

o foro em que deveriam ser julgadas as ações coletivas. Precedentes. DISPOSITIVO.


(...) STJ, CC 144.922/MG, Rel. Min. DIVA MALERBI, j. 22/06/2016.

E sobre a tragédia de Brumadinho, o STJ também elegeu o foro mais adequado para à defesa do meio
ambiente, afastando a regra geral do foro do local do domicílio do autor da ação popular:

CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. DIREITO AMBIENTAL. DESASTRE DE


BRUMADINHO. ROMPIMENTO DE BARRAGEM DA EMPRESA VALE DO RIO DOCE.
AÇÃO POPULAR. LEI 4.717/1965. COMPETÊNCIA PARA JULGAR A AÇÃO POPULAR
QUANDO JÁ EM ANDAMENTO AÇÃO CIVIL PÚBLICA COM OBJETO ASSEMELHADO.
DISTINGUISHING. TEMA AMBIENTAL. FORO DO LOCAL DO FATO. APLICAÇÃO
SUBSIDIÁRIA DA LEI DE AÇÃO CIVIL PÚBLICA. HISTÓRICO DA DEMANDA (...) A
JURISPRUDÊNCIA DO STJ À LUZ DAS CIRCUNSTÂNCIAS PECULIARES DO CASO
CONCRETO 3. Não se desconhece a jurisprudência do STJ favorável a que, sendo
igualmente competentes o juízo do domicílio do autor popular e o do local onde
houver ocorrido o dano (local do fato), a competência para examinar o feito é
daquele em que menor dificuldade haja para o exercício da Ação Popular. A
propósito: CC 47.950/DF, Rel. Ministra Denise Arruda, Primeira Seção, DJ 7/5/2007,
p. 252; CC 107.109/RJ, Rel. Ministro Castro Meira, Primeira Seção, DJe 18/3/2010. 4.
Malgrado isso, as circunstâncias do caso concreto devem ser analisadas de forma
que se ajuste o Direito à realidade. Para tanto, mister recordar os percalços que
envolveram a definição da competência jurisdicional no desastre de Mariana/MG, o
que levou o STJ a eleger um único juízo para todas as ações, de maneira a evitar
decisões conflitantes e possibilitar que a Justiça se realize de maneira mais objetiva,
célere e harmônica. 5. A hipótese dos autos apresenta inegáveis peculiaridades que
a distinguem dos casos anteriormente enfrentados pelo STJ, o que impõe adoção de
solução mais consentânea com a imprescindibilidade de se evitar tumulto
processual em demanda de tamanha magnitude social, econômica e ambiental.
Assim, necessário superar, excepcionalmente, a regra geral contida nos precedentes
invocados, nos moldes do que dispõe o art. 489, § 1º, VI, do CPC/2015. De fato, a
tragédia ocorrida em Brumadinho/ MG invoca solução prática diversa, a fim de
entregar, da melhor forma possível, a prestação jurisdicional à população atingida.
Impõe-se, pois, ao STJ adotar saída pragmática que viabilize resposta do Poder
Judiciário aos que sofrem os efeitos da inominável tragédia. DISTINGUISHING: AÇÃO
POPULAR ISOLADA E AÇÃO POPULAR EM COMPETIÇÃO COM AÇÃO CIVIL PÚBLICA
COM OBJETO ASSEMELHADO 6. A solução encontrada é de distinguishing à luz de
peculiaridades do caso concreto e não de revogação universal do entendimento do
STJ sobre a competência para a ação popular, precedentes que devem ser mantidos,
já que lastreados em sólidos e atuais fundamentos legais e justificáveis argumentos
políticos, éticos e processuais. 9. Assim, a regra geral do STJ não será aplicada aqui,
porque deve ser usada quando a Ação Popular for isolada. Contudo, na atual
hipótese, tem-se que a Ação Popular estará competindo e concorrendo com várias
outras Ações Populares e Ações Civis Públicas, bem como com centenas, talvez
milhares, de ações individuais, razão pela qual, em se tratando de competência
concorrente, deve ser eleito o foro do local do fato. (...) COMPETÊNCIA DO LOCAL
DO FATO 12. Na presente hipótese, é mais razoável determinar que o foro
competente para julgamento desta Ação Popular seja o do local do fato. Logo, como
medida para assegurar a efetividade da prestação jurisdicional e a defesa do meio
ambiente, entende-se que a competência para processamento e julgamento do
presente feito é da 17ª Vara Federal da Seção Judiciária do Estado de Minas Gerais.

@CURSOEBLOGRDP #DPERJ 14
DPE-RJ TUTELA COLETIVA

CONCLUSÃO 13. Conflito de Competência conhecido para declarar competente o


Juízo suscitante. STJ, CC 164.362/MG, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, j. 12/06/2019.

3. Condições da ação

São condições da ação a legitimidade ad causam e o interesse processual. A possibilidade jurídica do


pedido, de acordo com o NCPC, é matéria de mérito.

Sabemos que a ausência de qualquer dessas condições leva à extinção do processo sem resolução do
mérito, por carência da ação. Além disso, a análise das condições da ação é feita, inicialmente, in statu assertionis.
Isso quer dizer que o magistrado simplesmente se baseia na descrição fático-jurídica apresentada na petição inicial.

3.1 Legitimidade ad causam

Também chamada de legitimação ad causam, trata-se da qualidade necessária para ser autor (legitimidade
ativa) ou réu (legitimidade passiva) em uma determinada ação. Começaremos com a legitimidade ativa.

3.1.1 Legitimidade ativa

Nas ações civis públicas em geral, a legitimidade é extraída da combinação do art. 129, III, e § 1.º , da CF, o
art. 5.º , caput e § 4º , da LACP, e os arts. 82, caput e § 1.º , e 91, ambos do CDC.

Da leitura desses dispositivos, percebemos que o modelo adotado no Brasil para distribuir a legitimidade
ativa nas ACPs é diferente do sistema vigente na class action dos EUA, vejamos:

“(...) Lá (nos EUA), qualquer pessoa física ou jurídica, desde que possua
representatividade adequada, pode ser autor de um class action. Idêntico poder não
foi atribuído aos nossos cidadãos. Não obstante, isso não permite concluir que nosso
modelo adotou uma solução publicista, uma vez que a legitimidade não foi atribuída
apenas a entes públicos, mas também a instituições privadas (associações). Conclui-
se, portanto, que nosso sistema é misto ou pluralista, em que tanto entes públicos
como privados (associações) estão legitimados a agir.” 10 (GRIFOS NOSSOS).

Ademais, cabe distinguir a natureza jurídica da legitimidade (concorrente e disjuntiva).

3.1.2 Natureza jurídica: concorrente e disjuntiva

• Concorrente: porque a legitimidade não foi deferida com exclusividade a determinado ente. Desde que
preenchidos os requisitos legais, todos aqueles previstos nas citadas normas podem propor a ação civil
pública (Ex: Defensoria, MP, associações, entidades da administração, etc).

• Disjuntiva: cada legitimado pode agir sozinho, caso queira. O litisconsórcio com qualquer ou quaisquer dos
outros legitimados é facultativo.

3.1.3 Legitimidade da Defensoria Pública: aprofundamento

10Andrade, Adriano Interesses difusos e coletivos esquematizado I Adriano Andrade, Cleber Masson, Landolfo Andrade - 6. ed. rev .• atual. e
ampl.- Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2016, 59.

@CURSOEBLOGRDP #DPERJ 15
DPE-RJ TUTELA COLETIVA

De fato, o microssistema de tutela coletiva confere legitimidade ativa à Defensoria Pública (art. 5º da LACP).
Embora isso seja relativamente “óbvio” hoje, nem sempre foi assim.

É que essa previsão legislativa foi fruto de alteração feita, em 2007, na LACP, embora mesmo antes da
previsão expressa, já havia entendimento no sentido da legitimidade da Defensoria por se tratar de órgão da
administração pública.

Nesse sentido o STJ:

AÇÃO CIVIL PÚBLICA. LEGITIMIDADE. DEFENSORIA PÚBLICA. INTERESSE.


CONSUMIDORES. A Turma, por maioria, entendeu que a defensoria pública tem
legitimidade para propor ação civil pública na defesa do interesse de consumidores.
Na espécie, o Nudecon, órgão vinculado à defensoria pública do Estado do Rio de
Janeiro, por ser órgão especializado que compõe a administração pública direta do
Estado, perfaz a condição expressa no art. 82, III, do CDC. (...)”. (STJ, 3ª Turma, REsp
555.111/RJ, Rel. Min. Castro Filho, j. 5.9.2006)

Por outro lado, é curioso lembrar que essa alteração promovida em 2007, que inseriu a Defensoria Pública
no rol dos legitimados à propositura de ação civil pública, gerou discussão na doutrina e na jurisprudência acerca da
constitucionalidade da regra, assim como dos limites na sua aplicação. A prova disso é que foi promovida uma ADI
pela CONAMP (Associação Nacional dos Membros do Ministério Público) com o objetivo de reconhecer a
inconstitucionalidade da referida lei que deu legitimidade à DP.

Que coisa, não?

Contudo, o STF, ao julgar a ADI 3.943, em 2015, entendeu pela constitucionalidade da Lei n. 11.448/2007,
que alterou a Lei da Ação Civil Pública, prevendo que Defensoria Pública tem legitimidade para propor ação civil
pública na defesa de direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos.

Indo além, o STF também entendeu que a Constituição Federal não assegura ao Ministério Público a
legitimidade exclusiva para o ajuizamento de ação civil pública (STF, Plenário, ADI 3943/DF, rel. Min. Cármen Lúcia,
j. 6 e 7/5/2015, Info 784).

EMENTA: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NA AÇÃO DIRETA DE


INCONSTITUCIONALIDADE. REGÊNCIA: CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL/1973.
LEGITIMIDADE ATIVA DA DEFENSORIA PÚBLICA PARA AJUIZAR AÇÃO CIVIL PÚBLICA
(INC. II DO ART. 5º DA LEI N. 7.347/1985, ALTERADO PELO ART. 2º DA LEI N.
11.448/2007). TUTELA DE INTERESSES TRANSINDIVIDUAIS (COLETIVOS STRITO
SENSU E DIFUSOS) E INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS. ACESSO À JUSTIÇA. NECESSITADO:
DEFINIÇÃO SEGUNDO PRINCÍPIOS DE INTERPRETAÇÃO QUE GARANTEM A
EFETIVIDADE DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS PREVISTAS NOS INCS. XXXV, LXXIV E
LXXVIII DO ART. 5º DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. A LEGITIMIDADE DA
DEFENSORIA PÚBLICA PARA AJUIZAR AÇÃO CIVIL PÚBLICA NÃO ESTÁ
CONDICIONADA À COMPROVAÇÃO PRÉVIA DA HIPOSSUFICIÊNCIA DOS POSSÍVEIS
BENEFICIADOS PELA PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. AUSÊNCIA DE CONTRADIÇÃO,
OMISSÃO OU OBSCURIDADE. A QUESTÃO SUSCITADA PELA EMBARGANTE FOI
SOLUCIONADA NO JULGAMENTO DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO N. 733.433/MG,
EM CUJA TESE DA REPERCUSSÃO GERAL SE DETERMINA: “A DEFENSORIA PÚBLICA
TEM LEGITIMIDADE PARA A PROPOSITURA DA AÇÃO CIVIL PÚBLICA EM ORDEM A

@CURSOEBLOGRDP #DPERJ 16
DPE-RJ TUTELA COLETIVA

PROMOVER A TUTELA JUDICIAL DE DIREITOS DIFUSOS E COLETIVOS DE QUE SEJAM


TITULARES, EM TESE, PESSOAS NECESSITADAS” (DJ 7.4.2016). EMBARGOS DE
DECLARAÇÃO REJEITADOS. (STF, Plenário, BEM. DECL. ADI 3943/DF, rel. Min.
Cármen Lúcia, j. 18/05/2018, DJe 31-07-2018)

Entendimento que também já vinha sendo compartilhado pelo STJ:

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. FORNECIMENTO DE ÁGUA. INEXISTÊNCIA DE


VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. TARIFA SOCIAL.
LEGITIMIDADE ATIVA DA DEFENSORIA PÚBLICA. FUNDAMENTO AUTÔNOMO DO
ACÓRDÃO RECORRIDO NÃO IMPUGNADO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 283/STF. DANO
MORAL COLETIVO. POSSIBILIDADE. REDUÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO.
SÚMULA 7/STJ. 1. Verifica-se que o acórdão recorrido analisou todas as questões
necessárias ao desate da controvérsia, só que de forma contrária aos interesses da
parte. Logo, não padece de vícios de omissão, contradição ou obscuridade, a
justificar sua anulação por esta Corte. Tese de violação do art. 535 do CPC repelida.
2. O entendimento desta Corte é no sentido de que a Defensoria Pública possui
legitimidade para propor ações coletivas em defesa de interesses difusos, coletivos
ou individuais homogêneos. 3. Na espécie, o Tribunal de origem consignou que a
questão referente à legitimidade ativa da Defensoria Pública já havia sido objeto de
decisão proferida em agravo de instrumento interposto contra a concessão da tutela
antecipada, sem que houvesse recurso da parte interessada. Contudo, a parte
recorrente não impugnou tal fundamento em suas razões recursais, visto que insiste
na tese de ilegitimidade ativa da recorrida, o que torna o recurso deficiente em sua
fundamentação, a atrair o óbice da Súmula 283/STF. 4. No mérito, o acórdão
recorrido, ao contrário do alegado pela recorrente, não questiona a legalidade dos
requisitos exigidos pela legislação estadual para concessão da tarifa social, mas sim
entendeu ser abusiva a supressão do benefício sob o argumento de suspensão do
programa, considerando que não houve prova de que tal suspensão obedeceu as
formalidades legais. Assim, o recurso, quanto ao ponto, carece de fundamentação
razoável, o que atrai a incidência da Súmula 284/STF. 5. A jurisprudência desta Corte
admite o cabimento de danos morais coletivos em sede de ação civil pública. 6.
Entendimento pacífico do STJ no sentido de que a quantia estipulada a título de
danos morais, quando não exorbitante ou irrisória, não pode ser revista, em razão
da Súmula 7 desta Corte Superior. 7. Agravo regimental não provido. (STJ, AgRg no
REsp 1404305/RJ, 2ª. T., rel. Min. MAURO CAMPBELL MARQUES, j. 25/08/2015, DJe
03/09/2015). (grifo nosso)

Em resumo, a Defensoria tem legitimidade para a propositura de ação coletiva destinada a tutela de qualquer
espécie de direito, seja coletivo, difuso ou individual homogêneo.

“Entende-se que a Defensoria Pública tem legitimidade para a propositura de ação


coletiva, destinada à tutela de qualquer tipo de direito coletivo, seja difuso, coletivo
ou individual homogêneo, desde que haja, no grupo atingido, algum necessitado (no
caso do direito difuso, como os seus titulares são indeterminados e indetermináveis,
a Defensoria sempre tem legitimidade). Se antes da alteração da LACP, já era
possível sustentar a legitimidade da Defensoria, por se tratar de órgão da
Administração Pública, com maior razão, com a previsão expressa no artigo 5º da
LACP, entende-se pela existência de tal legitimidade. Como a sentença de
procedência no processo coletivo produz coisa julgada erga omnes ou ultra partes,

@CURSOEBLOGRDP #DPERJ 17
DPE-RJ TUTELA COLETIVA

conforme o tipo de direito tutelado, a ação proposta pela Defensoria Pública pode
beneficiar, além dos necessitados, os não necessitados, o que não retira a
legitimidade da instituição. Trata-se de uma consequência do caráter especial da
coisa julgada no processo coletivo. Também não parece correto afirmar que a
sentença deva, em tal hipótese, beneficiar apenas os necessitados. Vale dizer que,
na hipótese de direito difuso, os seus titulares sequer podem ser identificados e, no
caso do direito coletivo stricto sensu, embora os seus titulares sejam identificáveis,
como o objeto é indivisível, a coisa julgada atinge toda a classe, grupo ou categoria.”
(2020, p. 170).11

Não podemos esquecer que ainda há discussão na doutrina a respeito do conceito de necessitado.

Para uma parcela da doutrina, com a qual não devemos aderir, sobretudo em provas abertas, o conceito de
necessitado se restringe apenas à perspectiva econômica. Por outro lado, há quem sustente, e com razão, que tal
conceito não se restringe apenas ao aspecto econômico.

Esse é o entendimento, inclusive, da saudosa Ada Pellegrini Grinover:

“Existem os que são necessitados no plano econômico, mas também existem os


necessitados do ponto de vista organizacional. Ou seja, todos aqueles que são
socialmente vulneráveis: os consumidores, os usuários de serviços públicos, os
usuários de planos de saúde, os que queiram implementar ou contestar políticas
públicas, como as atinentes à saúde, à moradia, ao saneamento básico, ao meio
ambiente etc”12.

Nesse sentido as decisões mais recentes do Superior Tribunal de Justiça:

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. CÓDIGO DE


PROCESSO CIVIL DE 2015. APLICABILIDADE. FUNDAMENTAÇÃO DEFICIENTE.
SÚMULA N. 284/STF. DEFENSORIA PÚBLICA. LEGITIMIDADE PARA PROPOR A AÇÃO
CIVIL PÚBLICA. HIPOSSUFICIÊNCIA JURÍDICA. SÚMULA N. 83/STJ. AUSÊNCIA DE
PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA N. 211/STJ. ASTREINTES. CRITÉRIOS DE FIXAÇÃO.
MATÉRIA FÁTICA. SÚMULA N. 7/STJ. ARGUMENTOS INSUFICIENTES PARA
DESCONSTITUIR A DECISÃO ATACADA. APLICAÇÃO DE MULTA. ART. 1.021, § 4º, DO
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. DESCABIMENTO. I – Consoante o decidido
pelo Plenário desta Corte na sessão realizada em 09.03.2016, o regime recursal será
determinado pela data da publicação do provimento jurisdicional impugnado. In
casu, aplica-se o Código de Processo Civil de 2015 para o presente Agravo Interno,
embora o Recurso Especial estivesse sujeito ao Código de Processo Civil de 1973. II
– O recurso cinge-se a alegações genéricas e, por isso, não demonstra, com
transparência e precisão, qual seria o ponto omisso do acórdão recorrido, bem como
a sua importância para o deslinde da controvérsia, o que atrai o óbice da Súmula 284
do Supremo Tribunal Federal. III – O acórdão recorrido adotou entendimento
consolidado nesta Corte, segundo o qual a Defensoria Pública possui legitimidade
ativa para o ajuizamento de ações coletivas buscando a tutela de direitos difusos,

11Pizzol, Patricia Miranda. Tutela Coletiva, Processo Coletivo e Técnicas de Padronização das decisões. Ed. Revista dos Tribunais, 2020
12Ada Pellegrini Grinover, parecer a respeito da constitucionalidade da Lei 11.448/07, que conferiu legitimidade ampla à Defensoria Pública
para a ação civil pública”. In: SOUSA, José Augusto Garcia de. (Coord.). Uma nova Defensoria Pública pede passagem: reflexões sobre a Lei
Complementar 132/09. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 483; GRINOVER, Ada Pellegrini. Legitimidade da Defensoria Pública para ação civil
pública. In: Revista de Processo, São Paulo, n. 165, 2008, p. 308.

@CURSOEBLOGRDP #DPERJ 18
DPE-RJ TUTELA COLETIVA

coletivos stricto sensu e individuais homogêneos. Na presente demanda, a


Defensoria Pública da União busca, em ação civil pública, a concessão de
atendimento de saúde a pessoas com obesidade mórbida, restando evidente a
hipossuficiência jurídica dos representados para atuar na defesa dos interesses de
toda a coletividade. Aplicação da Súmula n. 83/STJ. (...). (STJ, AgInt no REsp 1704581
/ MG, rel. Min. REGINA HELENA COSTA, 1ª. T., j. 03/05/2018, DJe 14/05/2018). (grifo
nosso)

PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL.


CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. APLICABILIDADE. SERVIDORES PÚBLICOS
MILITARES. CONCESSÃO DE AUXÍLIO TRANSPORTE. AÇÃO CIVIL PÚBLICA.
INTERESSES DIFUSOS, COLETIVOS OU INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS. LEGITIMIDADE
ATIVA DA DEFENSORIA PÚBLICA. EXISTÊNCIA. PRECEDENTE DO SUPREMO TRIBUNAL
FEDERAL. CONCEITO DE NECESSITADO. CONCEPÇÃO AMPLIATIVA PARA ABRANGER
OS HIPOSSUFICIENTES JURÍDICOS. PRECEDENTE DESTA CORTE. ARGUMENTOS
INSUFICIENTES PARA DESCONSTITUIR A DECISÃO ATACADA. I – Consoante o
decidido pelo Plenário desta Corte na sessão realizada em 09.03.2016, o regime
recursal será determinado pela data da publicação do provimento jurisdicional
impugnado. In casu, aplica-se o Código de Processo Civil de 2015. II – O Supremo
Tribunal Federal, ao julgar a ADI n. 3.943/DF, declarou a constitucionalidade do art.
5º, II, da Lei n. 7.347/85, com redação dada pela Lei n. 11.448/07, consignando ter
a Defensoria Pública legitimidade para propor ação civil pública em defesa de
direitos difusos, coletivos, e individuais homogêneos. III – O Superior Tribunal de
Justiça, ao interpretar os requisitos legais para a atuação coletiva da Defensoria
Pública, encampa exegese ampliativa da condição jurídica de "necessitado", de
modo a possibilitar sua atuação em relação aos necessitados jurídicos em geral, não
apenas dos hipossuficientes sob o aspecto econômico. Caso concreto que se inclui
no conceito apresentado. IV – A Agravante não apresenta, no agravo, argumentos
suficientes para desconstituir a decisão recorrida. V – Agravo Interno improvido.
(STJ, AgInt no REsp 1510999 / RS, rel. Min. REGINA HELENA COSTA, 1ª. T., j.
08/06/2017, DJe 19/06/2017). (grifo nosso)

Embora exista, também, precedente do STJ do ano de 2014 em sentido contrário:

Processual civil. Ação civil pública. Embargos infringentes. Legitimidade da


Defensoria Pública para a propositura de ação civil pública. Limitador constitucional.
Defesa dos necessitados. Plano de saúde. Reajuste. Grupo de consumidores que não
é apto a conferir legitimidade àquela instituição. 1. São cabíveis embargos
infringentes quando o acórdão não unânime houver reformado, em grau de
apelação, a sentença de mérito, ou houver julgado procedente a ação rescisória
(CPC, art. 530). Excepcionalmente, tem-se admitido o recurso em face de acórdão
não unânime proferido no julgamento do agravo de instrumento quando o Tribunal
vier a extinguir o feito com resolução do mérito. 2. Na hipótese, no tocante à
legitimidade ativa da Defensoria Pública para o ajuizamento de ação civil pública,
não bastou um mero exame taxativo da lei, havendo sim um controle judicial sobre
a representatividade adequada da legitimação coletiva. Com efeito, para chegar à
conclusão da existência ou não de pertinência temática entre o direito material em
litígio e as atribuições constitucionais da parte autora acabou-se adentrando no
terreno do mérito. 3. A Defensoria Pública, nos termos do art. 134 da CF, “é

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instituição essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a orientação


jurídica e a defesa, em todos os graus, dos necessitados, na forma do art. 5º, LXXIV”.
É, portanto, vocacionada pelo Estado a prestar assistência jurídica integral e gratuita
aos que “comprovarem insuficiência de recursos” (CF, art. 5º, LXXIV), dando
concretude a esse direito fundamental. 4. Diante das funções institucionais da
Defensoria Pública, há, sob o aspecto subjetivo, limitador constitucional ao exercício
de sua finalidade específica – “a defesa dos necessitados” (CF, art. 134) –, devendo
os demais normativos serem interpretados à luz desse parâmetro. 5. A Defensoria
Pública tem pertinência subjetiva para ajuizar ações coletivas em defesa de
interesses difusos, coletivos ou individuais homogêneos, sendo que no tocante aos
difusos, sua legitimidade será ampla (basta que possa beneficiar grupo de pessoas
necessitadas), haja vista que o direito tutelado é pertencente a pessoas
indeterminadas. No entanto, em se tratando de interesses coletivos em sentido
estrito ou individuais homogêneos, diante de grupos determinados de lesados, a
legitimação deverá ser restrita às pessoas notadamente necessitadas. 6. No caso, a
Defensoria Pública propôs ação civil pública requerendo a declaração de abusividade
dos aumentos de determinado plano de saúde em razão da idade. 7. Ocorre que, ao
optar por contratar plano particular de saúde, parece intuitivo que não se está
diante de consumidor que possa ser considerado necessitado a ponto de ser
patrocinado, de forma coletiva, pela Defensoria Pública. Ao revés, trata-se de grupo
que ao demonstrar capacidade para arcar com assistência de saúde privada
evidencia ter condições de suportar as despesas inerentes aos serviços jurídicos de
que necessita, sem prejuízo de sua subsistência, não havendo falar em necessitado.
8. Diante do microssistema processual das ações coletivas, em interpretação
sistemática de seus dispositivos (art. 5º, § 3º, da Lei n. 7.347/1985 e art. 9º da Lei n.
4.717/1965), deve ser dado aproveitamento ao processo coletivo, com a
substituição (sucessão) da parte tida por ilegítima para a condução da demanda.
Precedentes. 9. Recurso especial provido. (STJ. 4ª Turma. REsp 1.192.577/RS, Rel.
Min. Luis Felipe Salomão, j. 15/5/2014, Info 541). (grifo nosso)

3.1.4 Legitimidade ordinária e extraordinária

Distinção feita pela doutrina13


Ordinária Extraordinária
A legitimação é ordinária quando a parte na relação A legitimação é extraordinária quando a parte na
jurídica processual se diz titular do direito subjetivo relação jurídica processual diz estar defendendo direito
material por ela invocado. Na legitimação ordinária, há subjetivo material de terceiro. Na definição mais
pertinência subjetiva, ou seja; há identidade entre o popular, inspirada no art. 6º do CPC/1973, diz-se que a
autor da ação e aquele que, segundo se alega na petição legitimação é ordinária quando se defende, em nome
inicial, é o titular do direito material. próprio, direito próprio, e que é extraordinária quando
se defende, em nome próprio, direito alheio. Logo, na
legitimação extraordinária, não há pertinência
subjetiva, pois não há identidade entre o autor da ação
e aquele que, segundo se alega na petição inicial, é o
titular do direito material.

13Andrade, Adriano Interesses difusos e coletivos esquematizado I Adriano Andrade, Cleber Masson, Landolfo Andrade - 6. ed. rev .• atual. e
ampl.- Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2016, 60.

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3.1.5 Representatividade adequada (ou adequacy representation)

No sistema “class action”, adotado nos EUA, o controle da representatividade adequada é feito pelo juiz, em
face de cada caso concreto. Diferentemente, no Brasil os requisitos estão previstos quase que exclusivamente pela
lei, havendo pouquíssima discricionariedade para o magistrado avaliá-la.

Por exemplo, veja o que estabelece o art. 5º da LACP:

Art. 5º Têm legitimidade para propor a ação principal e a ação cautelar:

V - a associação que, concomitantemente:

a) esteja constituída há pelo menos 1 (um) ano nos termos da lei civil; (Incluído pela
Lei nº 11.448, de 2007).

b) inclua, entre suas finalidades institucionais, a proteção ao patrimônio público e


social, ao meio ambiente, ao consumidor, à ordem econômica, à livre concorrência,
aos direitos de grupos raciais, étnicos ou religiosos ou ao patrimônio artístico,
estético, histórico, turístico e paisagístico.

É bom lembrar que a pertinência temática nada mais é do que a finalidade institucional da associação, que
deve haver relação com o direito que se busca proteger na ação coletiva. Além disso, nos termos do art. 5º, § 4° da
LACP, o requisito da associação estar constituída há mais de 01 ano poderá ser dispensado no caso concreto.

Art. 5º, § 4.° O requisito da pré-constituição poderá ser dispensado pelo juiz,
quando haja manifesto interesse social evidenciado pela dimensão ou
característica do dano, ou pela relevância do bem jurídico a ser protegido.

Veremos mais sobre associações à frente.

3.1.6 O Ministério Público

Não nos aprofundaremos sobre esse legitimado ativo, apenas veremos os pontos principais, pois serão o
suficiente para nossa prova.

Bem! A própria Constituição Federal incumbe o MP de propor ação civil pública para a defesa do patrimônio
público e social e do meio ambiente (art. 129, III). Mas não é só isso. A Lei da Política Nacional do Meio Ambiente -
LPNMA (Lei 6.938/1981), no seu art. 14, § 1.º, concede-lhe a legitimidade para promover as ações voltadas à
responsabilidade civil por danos ambientais (direitos difusos). Enquanto isso, a Lei 7.853/1989 atribui-lhe a
propositura de ações civis públicas para a proteção dos direitos difusos e coletivos das pessoas “portadoras” de
deficiência (art. 3.º).

A Lei 7.913/1989 também confere legitimação ao MP para a propositura de ação de responsabilidade por
danos causados aos investidores no mercado de valores mobiliários (direitos individuais homogêneos).

O próprio ECA traz o MP em como uma espécie “defensor” dos direitos supraindividuais afetos às crianças e
adolescentes (arts. 201, V, e 210).

Já o CDC confere ao MP a defesa coletiva dos interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos dos
consumidores e das vítimas (art. 82, I, c/c o art. 81, parágrafo único);

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O Estatuto do Idoso outorga ao Ministério Público, por exemplo, a defesa dos interesses difusos, coletivos e
individuais homogêneos do idoso (art. 74, I).

A LACP, por fim, traz o MP como legitimado à ACP em seu art. 5º, inciso I.

Art. 5º Têm legitimidade para propor a ação principal e a ação cautelar:

I - o Ministério Público;

Em 2018 o STJ aprovou a presente súmula:

Súmula 601-STJ: O Ministério Público tem legitimidade ativa para atuar na defesa de
direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos dos consumidores, ainda que
decorrentes da prestação de serviço público.

3.1.7 Entes da Administração direta

A LACP, em seu art. 5º, III, confere à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios a legitimidade
para a propositura das ações civis públicas em prol dos bens arrolados no art. 1º.

O CDC faz o mesmo no art. 82, II, no que toca à defesa do consumidor.

Art. 82. Para os fins do art. 81, parágrafo único, são legitimados concorrentemente:

I - o Ministério Público,

II - a União, os Estados, os Municípios e o Distrito Federal;

III - as entidades e órgãos da Administração Pública, direta ou indireta, ainda que


sem personalidade jurídica, especificamente destinados à defesa dos interesses e
direitos protegidos por este código;

IV - as associações legalmente constituídas há pelo menos um ano e que incluam


entre seus fins institucionais a defesa dos interesses e direitos protegidos por este
código, dispensada a autorização assemblear.

3.1.8 Entes da Administração indireta

O art. 5º da LACP confere legitimidade à autarquia, empresa pública, fundação ou sociedade de economia
mista, que são entes da Administração indireta.

Por outro lado, o art. 82, III, do CDC refere-se genericamente a entidades e órgãos da Administração Pública,
direta ou indireta.

Art. 82. Para os fins do art. 81, parágrafo único, são legitimados concorrentemente:

I - o Ministério Público,

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II - a União, os Estados, os Municípios e o Distrito Federal;

III - as entidades e órgãos da Administração Pública, direta ou indireta, ainda que


sem personalidade jurídica, especificamente destinados à defesa dos interesses e
direitos protegidos por este código;

É bom lembrar que diferente do que ocorre em relação aos entes da Administração direta, a legitimação dos
entes da Administração indireta está condicionada à existência de pertinência temática.

3.1.9 Associações

LACP, Art. 5º Têm legitimidade para propor a ação principal e a ação cautelar:

V - a associação que, concomitantemente: a) esteja constituída há pelo menos 1


(um) ano nos termos da lei civil; b) inclua, entre suas finalidades institucionais, a
proteção ao patrimônio público e social, ao meio ambiente, ao consumidor, à ordem
econômica, à livre concorrência, aos direitos de grupos raciais, étnicos ou religiosos
ou ao patrimônio artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico.

Como vimos, o ordenamento jurídico brasileiro não adotou o sistema utilizado nos Estados Unidos (class
action), cuja análise da representatividade adequada cabe no caso concreto. No Brasil, caso a associação esteja
constituída há pelo menos um ano e tenha a finalidade estatutária de defesa dos direitos do consumidor (ou de
direitos coletivos em geral), ela tem legitimidade para a propositura da ação coletiva.

As associações possuem legitimidade para defesa dos direitos e dos interesses coletivos ou individuais
homogêneos, independentemente de autorização expressa dos associados. STJ. 2ª Turma. REsp 1796185/RS, Rel.
Min. Herman Benjamin, julgado em 28/03/2019.

Essa autorização é um traço que distingue a legitimidade das entidades associativas (art. 5º, XXI) em relação
à legitimidade das entidades sindicais (art. 8º, III):14

AÇÃO COLETIVA PROPOSTA POR ASSOCIAÇÃO AÇÃO COLETIVA PROPOSTA POR ENTIDADES SINDICAIS
Art. 5º (...) Art. 8º (...)
XXI - as entidades associativas, quando expressamente III - ao sindicato cabe a defesa dos direitos e interesses
autorizadas, têm legitimidade para representar seus coletivos ou individuais da categoria, inclusive em
filiados judicial ou extrajudicialmente; questões judiciais ou administrativas;
A associação atua como representante processual O sindicato atua como substituto processual (em nome
(atua em nome dos associados). próprio defendendo direito alheio).
A associação precisa da autorização dos associados O sindicato não precisa da autorização dos membros
para propor a ação coletiva na defesa de seus da categoria (trabalhadores) para propor a ação
interesses. coletiva na defesa de seus interesses.
A associação é obrigada a apresentar a relação O sindicato não precisa apresentar a relação nominal
nominal dos associados que autorizaram a demanda dos substituídos juntamente com a petição inicial da
juntamente com a petição inicial da ação proposta. ação proposta.

As associações de classe atuam como representantes processuais, sendo obrigatória a autorização individual
ou assemblear dos associados - STF, RE 573.232. Esse entendimento, todavia, não se aplica na hipótese de a

14 Tabela disponível em: https://dizerodireitodotnet.files.wordpress.com/2020/08/info-670-stj.pdf. Acesso em 29 de março de 2021.

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associação buscar em juízo a tutela de interesses ou direitos difusos - art. 82, IV, do CDC. STJ. 4ª Turma. AgInt no
REsp 1335681/SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 26/02/2019.

Por se tratar do regime de substituição processual, a autorização para a defesa do interesse coletivo em
sentido amplo é estabelecida na definição dos objetivos institucionais, no próprio ato de criação da associação, sendo
desnecessária nova autorização ou deliberação assemblear. As teses de repercussão geral resultadas do julgamento
do RE 612.043/PR e do RE 573.232/SC tem seu alcance expressamente restringido às ações coletivas de rito
ordinário, as quais tratam de interesses meramente individuais, sem índole coletiva, pois, nessas situações, o autor
se limita a representar os titulares do direito controvertido, atuando na defesa de interesses alheios e em nome
alheio. STJ. 3ª Turma. REsp 1649087/RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 02/10/2018. STJ. 3ª Turma. AgInt no
REsp 1719820/MG, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 15/04/2019.

Resumindo:

As associações precisam de autorização específica dos associados para ajuizar ação coletiva? A resposta é
depende15:

1) Ação coletiva de rito ordinário proposta pela associação na defesa dos interesses
de seus associados:

SIM. O disposto no artigo 5º, inciso XXI, da Carta da República encerra representação
específica, não alcançando previsão genérica do estatuto da associação a revelar a
defesa dos interesses dos associados. As balizas subjetivas do título judicial,
formalizado em ação proposta por associação, é definida pela representação no
processo de conhecimento, presente a autorização expressa dos associados e a lista
destes juntada à inicial. STF. Plenário. RE 573232/SC, rel. orig. Min. Ricardo
Lewandowski, red. p/ o acórdão Min. Marco Aurélio, julgado em 14/5/2014
(repercussão geral) (Info 746).

Neste caso, a associação atua como representante processual dos seus associados
que autorizaram expressamente a propositura da ação, podendo tal autorização ser
dada em assembleia ou individualmente, sendo insuficiente a autorização prevista
no estatuto da associação. Neste caso, estamos tratando de ação coletiva de rito
ordinário – que não se confunde com a ACP e demais demandas coletivas – em que
a associação defende os interesses dos associados, na qualidade de representante
processual.

2) Ação civil pública (ação coletiva proposta na defesa de direitos difusos, coletivos
ou individuais homogêneos):

NÃO. As associações possuem legitimidade para defesa dos direitos e dos interesses
coletivos ou individuais homogêneos, independentemente de autorização expressa
dos associados. STJ. 2ª Turma. REsp 1796185/RS, Rel. Min. Herman Benjamin,
julgado em 28/03/2019.

15CAVALCANTE, Márcio André Lopes. As associações possuem legitimidade para defesa dos direitos difusos, coletivos e individuais
homogêneos, independentemente de autorização expressa dos associados. Buscador Dizer o Direito, Manaus. Disponível em:
<https://www.buscadordizerodireito.com.br/jurisprudencia/detalhes/219c507b38ddfc07899fc1f01ff40c44>. Acesso em: 29/03/2021.

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Nesse caso, estamos falando da atuação da associação em prol de direitos difusos,


coletivos ou individuais homogêneos, de titularidade da coletividade, e não de
interesse dos seus associados. Por isso, diz-se que a associação atua como substituta
processual ao ajuizar ACP para a proteção de tais direitos, sendo dispensada a
autorização dos associados, já que não estão em jogo os direitos deles. O rito é o do
processo coletivo, e segue as diretrizes das normas que integram o microssistema
coletivo.

Com relação ao mandado de segurança coletivo, o STJ entendeu que este configura
hipótese de substituição processual, por meio da qual o impetrante, no caso a
associação, atua em nome próprio defendendo direito alheio, pertencente aos
associados ou parte deles, sendo desnecessária, para a impetração do mandamus,
apresentação de autorização dos substituídos ou mesmo lista nominal. Por tal razão,
os efeitos da decisão proferida em mandado de segurança coletivo beneficiam todos
os associados, ou parte deles cuja situação jurídica seja idêntica àquela tratada no
decisum, sendo irrelevante se a filiação ocorreu após a impetração do writ. STJ. 2ª
Turma. AgInt no REsp 1841604-RJ, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em
22/04/2020 (Info 670).

No caso do MS coletivo, a CF não exige a autorização dos associados para a sua


impetração, seja ela por parte das associações, seja por parte dos sindicados. Trata-
se de substituição processual.

Ainda, segundo o STJ, em ação civil pública, é possível a substituição da associação autora por outra
associação caso a primeira venha a ser dissolvida:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL. ADOÇÃO DE PREMISSA


INSUBSISTENTE NO ACÓRDÃO EMBARGADO. RECONHECIMENTO.
INAPLICABILIDADE DA TESE FIRMADA PELO STF NO RE N. 573.232/SC À HIPÓTESE.
VERIFICAÇÃO. REJULGAMENTO DO RECURSO. NECESSIDADE. AÇÃO COLETIVA.
ASSOCIAÇÃO. LEGITIMIDADE ATIVA. EXPRESSA AUTORIZAÇÃO ASSEMBLEAR.
PRESCINDIBILIDADE. SUCESSÃO PROCESSUAL NO POLO ATIVO. ADMISSÃO.
PRECEDENTES DESTA CORTE. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO ACOLHIDOS COM
EFEITOS INFRINGENTES PARA JULGAR IMPROVIDO O RECURSO ESPECIAL DA PARTE
ADVERSA. 1. Constatada a inaplicabilidade do entendimento adotado pelo STF à
hipótese dos autos, tal como posteriormente esclarecido pela própria Excelsa Corte,
é de se reconhecer, pois, a insubsistência da premissa levada a efeito pelo acórdão
embargado, assim como a fundamentação ali deduzida, a ensejar, uma vez superado
o erro de premissa, o rejulgamento do recurso. 2. Não se aplica ao caso vertente o
entendimento sedimentado pelo STF no RE n. 573.232/SC e no RE n. 612.043/PR,
pois a tese firmada nos referidos precedentes vinculantes não se aplica às ações
coletivas de consumo ou quaisquer outras demandas que versem sobre direitos
individuais homogêneos. Ademais, a Suprema Corte acolheu os embargos de
declaração no RE n. 612.043/PR para esclarecer que o entendimento nele firmado
alcança tão somente as ações coletivas submetidas ao rito ordinário. 3. O
microssistema de defesa dos interesses coletivos privilegia o aproveitamento do
processo coletivo, possibilitando a sucessão da parte autora pelo Ministério Público
ou por algum outro colegitimado, mormente em decorrência da importância dos
interesses envolvidos em demandas coletivas. 4. Embargos de declaração acolhidos,

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com efeitos infringentes, para julgar improvido o recurso especial interposto pela
parte adversa. (EDcl no REsp 1405697/MG, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE,
TERCEIRA TURMA, julgado em 10/09/2019, DJe 17/09/2019)

O STF já entendeu que associação privada, na condição de autora de uma ação civil pública, pode fazer
transação com o réu e pedir a extinção do processo, nos termos do art. 487, III, “b”, do CPC. O art. 5º, § 6º da Lei nº
7.347/85 (Lei da Ação Civil Pública) prevê que os órgãos públicos podem fazer acordos nas ações civis públicas em
curso, não mencionando as associações privadas. Apesar disso, a ausência de disposição normativa expressa no que
concerne a associações privadas não afasta a viabilidade do acordo. Isso porque a existência de previsão explícita
unicamente quanto aos entes públicos diz respeito ao fato de que somente podem fazer o que a lei determina, ao
passo que aos entes privados é dado fazer tudo que a lei não proíbe. STF. Plenário. ADPF 165/DF, Rel. Min. Ricardo
Lewandowski, julgado em 1º/3/2018 (Info 892).

3.1.10 Legitimidade ativa subsidiária

Legitimidade ativa subsidiária é a estabelecida no § 3º do art. 5º da LACP, que dispõe que, em caso de
desistência infundada ou abandono da ação por associação legitimada, o Ministério Público ou outro legitimado
assumirá a titularidade ativa.

§ 3º Em caso de desistência infundada ou abandono da ação por associação


legitimada, o Ministério Público ou outro legitimado assumirá a titularidade ativa.

Neste caso, chamamos de subsidiária porque quem assume o polo ativo o faz em substituição ao autor
original.

3.1.11 Legitimidade passiva

Vimos que os legitimados ativos à ação coletiva estão previstos em lei (rol fechado). Por outro lado, o CDC e
a LACP nada estabelecem sobre a legitimação passiva, de modo a concluir que qualquer pessoa, física ou jurídica,
que seja responsável pelo dano ou pela ameaça de dano a direito difuso, coletivo, ou individual homogêneo, poderá
ser ré.

De igual maneira, até mesmos os entes despersonalizados podem figurar no polo passivo, quando dotados
de personalidade judiciária (ex: condomínios, massas falidas, sociedades de fato, etc).

Praticamente todas as pessoas que podem figurar no polo ativo também podem estar no polo passivo de
uma ACP, exceto os órgãos estatais destituídos de personalidade jurídica. É o caso, por exemplo, da Defensoria
Pública ou do Ministério Público.

Vejam:

“Na hipótese de o Parquet causar dano ou ameaça de dano a um interesse


supraindividual, não poderá ser réu na ação civil pública, que deverá ser proposta
em face do respectivo ente federativo (a União, no caso do MPT, MPM, MPF ou
MPDFT; ou o respectivo Estado, tratando-se de MPE).” 16

16Andrade, Adriano Interesses difusos e coletivos esquematizado I Adriano Andrade, Cleber Masson, Landolfo Andrade - 6. ed. rev .• atual. e
ampl.- Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2016, 97.

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O mesmo se dá com relação aos órgãos despersonalizados da Administração direta ou indireta.

3.1.12 Ação coletiva passiva (legitimidade extraordinária passiva)

Estudamos que determinados entes (Defensoria, MP, associações, etc) podem propor, em nome próprio,
ações civis públicas em defesa de interesses da coletividade, ou de determinada classe, grupo ou categoria de
pessoas. Isso nada mais é do que a legitimidade ativa extraordinária.

Até aí tudo bem!

No entanto, seria possível propor uma ACP contra determinado ente, que defenderia, em nome próprio,
interesses de uma classe, grupo ou categoria de pessoas? Ou seja, inverter a ação coletiva?

No direito norte-americano isso é completamente possível, por meio da figura das defendant class actions.

Perceba que se trata de situação inversa à legitimidade extraordinária ativa, sendo conhecida pela doutrina
como legitimidade extraordinária passiva, o que faz ocorrer uma possível “ação coletiva passiva”. Esse tema já caiu
em algumas provas orais da Defensoria Pública.

No Brasil, temos algumas posições.

o Cândido Ragel17: minoritária. Para o autor, não existe ação coletiva passiva,
pois não há previsão legal para tanto.

o Ada Pelegrine18: Alega-se, em tal defesa, que o art. 5º, § 2.º, da LACP
facultaria ao Poder Público e as associações legitimadas se habilitarem
como litisconsortes de quaisquer das partes, inclusive do réu. Nesta última
hipótese, a ação teria sido proposta contra os interesses de determinada
coletividade, e o litisconsorte passivo a estaria defendendo em legitimidade
extraordinária passiva. Aduz-se, também, que os artigos 81 e 82 do CDC não
restringem a defesa dos interesses transindividuais ao polo ativo. Seria
mister, porém, para admitir a legitimação coletiva passiva, que o juiz
controlasse, caso a caso, a representatividade adequada dos réus (controle
da representatividade ope judicis), a exemplo do que se dá nos Estados
Unidos. Ada Pellegrini cita, como hipóteses de aplicação dessa legitimação
passiva, os seguintes exemplos de Kazuo Watanabe: uma ação civil pública
ajuizada contra uma associação de moradores de um bairro que decidisse
bloquear o acesso de automóveis a determinadas ruas, ou outra em que o
Ministério Público buscasse a proibição do ingresso das torcidas
organizadas aos estádios de futebol.19

É bom lembrar que o anteprojeto do Código Brasileiro de Processos Coletivos estabelece o seguinte:
“qualquer espécie de ação pode ser proposta contra uma coletividade organizada, mesmo sem personalidade
jurídica, desde que apresente representatividade adequada, se trate de tutela de interesses ou direitos difusos e
coletivos e a tutela se revista de interesse social”.

17 DINAMARCO, Pedro da Silva. Ação Civil Pública. São Paulo: Saraiva, 2001. p. 268-271
18 GRINOVER, Ada Pellegrini. Ações Coletivas Ibero-americanas: Novas Questões sobre a Legitimaçãoe a Coisa Julgada. Revista Forense, Rio de
Janeiro: Forense. v. 361, p. 7, maio-jun. 2002
19 Andrade, Adriano Interesses difusos e coletivos esquematizado I Adriano Andrade, Cleber Masson, Landolfo Andrade - 6. ed. rev .• atual. e

ampl.- Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2016, 98.

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3.2 Interesse processual

Vimos, até o presente momento, a condição da ação “legitimidade”. Agora veremos o interesse processual,
que também é chamado pela doutrina de interesse de agir ou interesse jurídico.

Sem nenhuma novidade, a legitimidade processual segue as regras do processo civil. Sobre o tema, trago
uma excelente síntese:

“O interesse processual (também mencionado na doutrina como interesse de agir


ou interesse jurídico) afigura-se quando o autor tem necessidade de buscar um
provimento jurisdicional para concretizar sua pretensão, e desde que haja
adequação entre o pedido por ele deduzido e a pretensão a ser satisfeita (em outros
termos: aquele deve ser útil para a satisfação desta). No que se refere às ações civis
públicas, um legitimado terá necessidade de ajuizá-la sempre que houver lesão ou
ameaça de lesão a um interesse supraindividual que lhe caiba tutelar, e não for
possível afastá-la sem a propositura da ação perante o Poder Judiciário. Se o
responsável pela lesão já a reparou integralmente, ou o causador da ameaça já
tomou as medidas cabíveis para afastá-la, não haverá necessidade da propositura
da ação, e, portanto, interesse processual. Já no que toca à adequação, deve-se
aferir, em cada caso concreto, se o pedido (no que toca ao objeto imediato, ao
provimento jurisdicional requerido) se mostra apto a afastar a lesão ou a ameaça de
lesão ao interesse supraindividual narrada na causa de pedir.” 20

3.2.1 Ações pseudocoletivas

Você já ouviu falar em “ações pseudocoletivas”?

Masson, Landolfo e Adriano, em seu curso de Tutela Coletiva 21, lembram que “já houve casos em que
associações, em substituição processual, intentaram ações com pedidos individualmente concretos em favor de seus
membros. Nas espécies, pleiteou-se, concretamente, o levantamento dos valores de contas vinculadas do FGTS de
seus associados. Como argutamente observa Araújo Filho, tais ações não se confundem com as verdadeiras ações
coletivas, já que não buscam uma condenação genérica, tendo sido por ele classificadas como ações
pseudocoletivas”:

(...) Nas ações pseudocoletivas, em realidade, conquanto tenha sido proposta a ação
por um único legitimado extraordinário, na verdade estão sendo pleiteados,
específica e concretamente, os direitos individuais de inúmeros substituídos,
caracterizando-se uma pluralidade de pretensões que, em tudo e por tudo, é
equiparável à do litisconsórcio multitudinário, na feliz e consagrada expressão de
Cândido Rangel Dinamarco, devendo sua admissibilidade, portanto, submeter-se,
em princípio, às mesmas condições, ou seja, somente poderiam ser consideradas
admissíveis quando não prejudicassem o pleno desenvolvimento do contraditório
ou o próprio exercício da função jurisdicional.22

20 Andrade, Adriano Interesses difusos e coletivos esquematizado I Adriano Andrade, Cleber Masson, Landolfo Andrade - 6. ed. rev .• atual. e
ampl.- Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2016, 99.
21 Andrade, Adriano Interesses difusos e coletivos esquematizado I Adriano Andrade, Cleber Masson, Landolfo Andrade - 6. ed. rev .• atual. e

ampl.- Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2016, 98.


22 ARAÚJO FILHO. Luiz Paulo da Silva. Ações coletivas: a tutela jurisdicional dos direitos individuais ho· mogêneos. Rio de Janeiro: Forense,

2000, p. 200. A alusão por ele feita a Cândido Rangei Dinamarco refere-se à obra Litisconsórcio. 4. ed., São Paulo, Malheiros. 1996, p. 344 e ss.
Apesar da analogia com o litisconsórcio multitudinário, Araújo Filho não admite a possibilidade de o magistrado invocar o art. 46, parágrafo

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E ações pseudoindividuais?

São ações individuais cujos resultados geram necessariamente efeitos sobre toda uma coletividade, por ser
a relação jurídica substancial incindível. Exemplo clássico da doutrina: anulação de uma prova de concurso. Nessas
hipóteses, Kazuo Watanabe defende a vedação dos processos individuais, porém prevalece a posição defendida por
Fred Didier, que descarta tal vedação por significar limitação ao acesso à justiça.

O projeto do novo CPC previa a coletivização das ações nesses casos, contudo tal dispositivo foi vetado.

4. Litisconsórcio

4.1 Litisconsórcio ativo inicial de colegitimados

Vimos que a legitimidade ativa nas ações coletivas é concorrente e disjuntiva. Deste modo, é correto afirmar
que cada colegitimado pode ajuizar a ação civil pública isoladamente (porque a legitimação é concorrente e
disjuntiva), mas isso não impede que dois ou mais colegitimados a proponham em litisconsórcio. Por exemplo, a
Defensoria Pública do Rio de Janeiro e o MPE-RJ podem propor, juntos, uma mesma ACP.

Assim, trata-se de litisconsórcio ativo facultativo unitário, porque o provimento de mérito será o mesmo
para todos os litisconsortes (no exemplo, o MPE-RJ e a DPE-RJ terão uma sentença uniforme).

Art. 116, NCPC. O litisconsórcio será unitário quando, pela natureza da relação
jurídica, o juiz tiver de decidir o mérito de modo uniforme para todos os
litisconsortes.

4.2 Litisconsórcio ativo superveniente de colegitimados

Acima vimos o litisconsórcio ativo INICIAL, ou seja, quando os litisconsortes decidem ajuizar juntos uma
ação coletiva (portanto no início do processo).

Por outro lado, a LACP autoriza, em seu art. 5º, § 2º, que o Poder Público e outras associações legitimadas
que não tenham ajuizado a ação possam posteriormente habilitar-se como litisconsortes:
§ 2° Fica facultado ao Poder Público e a outras associações legitimadas nos termos
deste artigo habilitar-se como litisconsortes de qualquer das partes.

Desta forma, a lei permite que os colegitimados se habilitem como litisconsortes "de qualquer das partes",
o que permite concluir, em tese, pela existência do litisconsórcio ulterior ativo ou passivo.

Por fim, a doutrina entende que embora o § 2º visto acima estabeleça apenas ao Poder Público e às
associações legitimadas, suas disposições aplicam-se a qualquer colegitimado, ou seja, qualquer deles poderá intervir
posteriormente como litisconsorte de qualquer das partes.

único. do CPC/1973 (no novo CPC, corresponde ao art. 113, § 1.0 ). para limitar o número de substituídos na ação pseudocoletiva. pois a
legitimidade extraordinária das associações em geral e dos sindicatos em especial tem assento na própria Constituição Federal. De todo modo',
para assegurar as garantias da ampla defesa e do devido processo legal. afirma que "caberia ao ente legitimado nomear e qualificar todos os
substituídos. para permitir a identificação dos titulares dos direitos efetivamente pleiteados, bem como detalhar os elementos de cada uma
das relações jurídicas" (op. cit .. p. 201 ).

@CURSOEBLOGRDP #DPERJ 29
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5. Conexão, continência e litispendência

Reza o art. 55 do novo CPC que duas ações serão conexas quando lhes for comum o pedido (objeto) ou a
causa de pedir.

Por outro lado, a continência, nos termos do art. 56 do NCPC, ocorrerá sempre que houver identidade
quanto às partes e à causa de pedir de duas ou mais ações, mas o pedido (objeto) de uma, por ser mais amplo,
abranger o da(s) outra(s).

Pois bem!

Inicialmente, saibam que são perfeitamente possíveis a conexão e a continência entre ações civis públicas.
Abaixo, a doutrina traz um exemplo prático de conexão entre duas ações civis públicas:

“Um exemplo de conexão entre duas ações civis públicas dar-se-ia se elas fossem
propostas tendo por causa de pedir a colocação, por um fornecedor, de produtos
defeituosos no mercado, e, em uma delas, fosse requerida sua condenação na
obrigação de consertá-los, substituí-los, ou recolhê-los, e devolver o dinheiro dos
consumidores lesados (interesses individuais homogêneos - consumidores
determináveis, objeto divisível), enquanto, em outra, fosse postulada sua
condenação na obrigação de abster-se de comercializar novas unidades do produto
defeituoso (interesses difusos- consumidores indetermináveis, objeto indivisível).”23

Segundo o art. 55, § 1º do NCPC, os processos de ações conexas serão reunidos para decisão conjunta, salvo
se um deles já houver sido sentenciado.

Já como hipótese de continência, a doutrina aponta o seguinte exemplo:

(...) imaginem-se duas ações coletivas que tivessem por causa de pedir a utilização,
por um fornecedor, de contratos de consumo com cláusulas abusivas, e, em uma
das ações, fosse requerida a anulação integral de todos os contratos já celebrados,
ao passo que, em outra, fosse postulada, simplesmente, a anulação das cláusulas
ilegais: o pedido desta estaria contido no daquela.24

E aqui eu vos lembro que também é possível a conexão ou continência entre ações civis públicas e ações
populares. Igualmente, é admissível a conexão ou continência entre uma ação civil pública e um mandado de
segurança coletivo.

5.1 Efeito da conexão ou continência: prorrogação da competência

Caso seja o caso de reunião de ações pela conexão ou continência, diz-se que o juiz onde se der a reunião
tem sua competência "prorrogada", pois, graças à reunião de ações, tem sua jurisdição ampliada para abranger
aquelas que tramitavam originariamente perante outros juízos. Tal reunião, em se tratando de conexão, perfaz-se
no juízo prevento (art. 58 do novo CPC).25

23 Andrade, Adriano Interesses difusos e coletivos esquematizado I Adriano Andrade, Cleber Masson, Landolfo Andrade - 6. ed. rev .• atual. e
ampl.- Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2016, 157.
24 Ibidem, p. 157.
25 Andrade, Adriano Interesses difusos e coletivos esquematizado I Adriano Andrade, Cleber Masson, Landolfo Andrade - 6. ed. rev .• atual. e

ampl.- Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2016, 159.

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Contudo, em se tratando de continência, o STJ decidiu que a reunião deve dar-se não no juízo prevento, mas
sim naquele onde tramitar a ação do pedido mais abrangente (ação continente) 26. O julgado está em consonância
com o NCPC:

Art. 56. Dá-se a continência entre 2 (duas) ou mais ações quando houver identidade
quanto às partes e à causa de pedir, mas o pedido de uma, por ser mais amplo,
abrange o das demais.

Art. 57. Quando houver continência e a ação continente tiver sido proposta
anteriormente, no processo relativo à ação contida será proferida sentença sem
resolução de mérito, caso contrário, as ações serão necessariamente reunidas

5.2 Prorrogação de competência e os limites territoriais da coisa julgada coletiva

Veja o que dispõe o (debatido) art. 16 da Lei da Ação Civil Pública:

Art. 16. A sentença civil fará coisa julgada erga omnes, nos limites da competência
territorial do órgão prolator, exceto se o pedido for julgado improcedente por
insuficiência de provas, hipótese em que qualquer legitimado poderá intentar outra
ação com idêntico fundamento, valendo-se de nova prova.

No recurso Extraordinário (RE) nº 1101937, que discutia a constitucionalidade do artigo 16 da Lei da Ação
Civil Pública (Lei 7.347/1985), que limita a eficácia dessas sentenças à competência territorial do órgão que a proferir,
o STF declarou a inconstitucionalidade do artigo 16 da Lei da Ação Civil Pública (Lei 7.347/1985), alterada pela Lei
9.494/1997.

Desta maneira, o STF fixou as seguintes teses:

“I - É inconstitucional o art. 16 da Lei 7.347/1985, alterada pela Lei 9.494 /1997.

II – Em se tratando de ação civil pública de efeitos nacionais ou regionais, a


competência deve observar o art. 93, II, da Lei 8.078/1990.

III – Ajuizadas múltiplas ações civis públicas de âmbito nacional ou regional, firma-se
a prevenção do juízo que primeiro conheceu de uma delas, para o julgamento de
todas as demandas conexas”. Recurso Extraordinário (RE) 1101937, com
repercussão geral reconhecida (Tema 1075).

5.3 Litispendência

A litispendência ocorre quando há coincidência entre os elementos da ação (partes, causa de pedir e pedido)
de duas ou mais ações em curso (novo CPC, art. 337):
§ 1º Verifica-se a litispendência ou a coisa julgada quando se reproduz ação
anteriormente ajuizada.

§ 3º Há litispendência quando se repete ação que está em curso.

26 REsp 1.318.917/BA, 4.• T., rei. Min. Antonio Carlos Ferreira. j. 12.03.2013, DJe 23.04.2013.

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DPE-RJ TUTELA COLETIVA

No processo coletivo, é possível haver litispendência entre ações civis públicas, ou entre elas e outras ações
coletiva (mandado de segurança coletivo, ação popular, etc).

E uma coisa que precisa ficar clara para você diz respeito ao polo ativo. Isso porque sua identidade é
desnecessária para configurar a litispendência nas ações coletivas, de modo que basta a identidade de réus, das
causas de pedir e dos pedidos, para que haja identidade de ações (e, portanto, litispendência).

5.4 Efeito da litispendência

Segundo o art. 485, V, do NCPC, a litispendência é causa de extinção do processo sem resolução do mérito.

Art. 485. O juiz não resolverá o mérito quando:

V - reconhecer a existência de perempção, de litispendência ou de coisa julgada;

A finalidade, como sabemos, é a de evitar conflito entre julgados. Por isso, o processo a ser extinto é aquele
onde houver a citação válida mais tardia, isso porque, nos termos do art. 240 do NCPC, a citação válida, ainda quando
ordenada por juízo incompetente, induz litispendência.

Art. 240. A citação válida, ainda quando ordenada por juízo incompetente, induz
litispendência, torna litigiosa a coisa e constitui em mora o devedor, ressalvado o
disposto nos arts. 397 e 398 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil).

Essa mesma ideia se aplica na litispendência entre uma ação civil pública e outra ação coletiva (mandado de
segurança coletivo ou ação popular).

Contudo, a doutrina estabelece que “no último caso, e desde que as ações tenham sido propostas por autores
diferentes, parte da doutrina sustenta ser melhor, em atenção ao ideal de efetividade do processo e à garantia do
acesso à justiça, a reunião dos processos, mesmo porque a extinção de algum deles não impediria que seu autor
interviesse no processo remanescente, como assistente litisconsorcial.” 27

27Andrade, Adriano Interesses difusos e coletivos esquematizado I Adriano Andrade, Cleber Masson, Landolfo Andrade - 6. ed. rev .• atual. e
ampl.- Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2016, 163.

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TUTELA COLETIVA – DPE-RJ


PARTE II
PROCESSO ESTRUTURAL

Ponto expresso em nosso edital da DPE-RJ e uma grande aposta para a prova.

Bem! No âmbito da Tutela Coletiva, os Processos Estruturais podem ser definidos como sendo aquelas
demandas que têm por finalidade a implementação de uma reforma estrutural em determinadas organizações, entes
ou instituições, visando a concretização de direitos fundamentais ou interesses sociais relevantes.

Sobre o conceito dos Processos Estruturais, invocamos as lições de Fredie Didier Jr., Hermes Zaneti Jr. e
Rafael Alexandria de Oliveira28:

"A decisão estrutural (structural injunction) é, pois, aquela que busca implantar uma
reforma estrutural (structural reform) em um ente, organização ou instituição, com
o objetivo de concretizar um direito fundamental, realizar uma determinada política
pública ou resolver litígios complexos. Por isso, o processo em que ela se constrói é
chamado de processo estrutural."

Com base no conceito acima expresso, podemos identificar algumas das principais características dos
Processos Estruturais:

a) Conflitos dotados de um alto grau de complexidade, cuja solução depende da


atuação conjunta e coordenada de diversos entes e órgãos;

b) Atuação do Poder Judiciário na mediação e coordenação das medidas a serem


efetivadas, visando sempre a satisfação de direitos fundamentais e interesses sociais
juridicamente relevantes;

c) Via de regra, as decisões proferidas nestes processos têm por característica a


definição de linhas amplas de atuação por parte dos entes envolvido. Desta decisão,
frequentemente surgem diversos outros provimentos jurisdicionais dela derivados.
É o que a doutrina chama de decisões em cascata, mais bem aprofundadas a seguir.

A decisão do STF que reconheceu o Estado de Coisas Inconstitucional no sistema prisional brasileiro
representa um relevante exemplo de Processo Estrutural no ordenamento jurídico pátrio (ADPF 347 MC).

Na ocasião, o STF reconheceu a existência "a existência de um quadro de violação generalizada e sistêmica
de direitos fundamentais, causado pela inércia ou incapacidade reiterada e persistente das autoridades públicas em
modificar a conjuntura, de modo que apenas transformações estruturais da atuação do Poder Público e a atuação de
uma pluralidade de autoridades podem modificar a situação inconstitucional.”.

Neste diapasão, entendeu-se que somente transformações estruturais da atuação do Poder Público e a
atuação de uma pluralidade de autoridades podem modificar a situação inconstitucional. Agindo dessa forma, o STF
proferiu uma decisão estruturante, cuja ementa segue:

28DIDIER JUNIOR, Fredie; ZANETI JUNIOR, Hermes; OLIVEIRA, Rafael Alexandria de. Notas sobre as decisões estruturantes. In: ARENHART,
Sérgio Cruz; JOBIM, Marco Félix (Coord.). Processos Estruturais. Salvador: Juspodivm, 2017. Cap. 11. p. 355.

@CURSOEBLOGRDP #DPERJ 33
DPE-RJ TUTELA COLETIVA

CUSTODIADO – INTEGRIDADE FÍSICA E MORAL – SISTEMA PENITENCIÁRIO –


ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL – ADEQUAÇÃO.
Cabível é a arguição de descumprimento de preceito fundamental considerada a
situação degradante das penitenciárias no Brasil. SISTEMA PENITENCIÁRIO
NACIONAL – SUPERLOTAÇÃO CARCERÁRIA – CONDIÇÕES DESUMANAS DE
CUSTÓDIA – VIOLAÇÃO MASSIVA DE DIREITOS FUNDAMENTAIS – FALHAS
ESTRUTURAIS – ESTADO DE COISAS INCONSTITUCIONAL – CONFIGURAÇÃO.
Presente quadro de violação massiva e persistente de direitos fundamentais,
decorrente de falhas estruturais e falência de políticas públicas e cuja modificação
depende de medidas abrangentes de natureza normativa, administrativa e
orçamentária, deve o sistema penitenciário nacional ser caraterizado como “estado
de coisas inconstitucional”. FUNDO PENITENCIÁRIO NACIONAL – VERBAS –
CONTINGENCIAMENTO. Ante a situação precária das penitenciárias, o interesse
público direciona à liberação das verbas do Fundo Penitenciário Nacional.
AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA – OBSERVÂNCIA OBRIGATÓRIA. Estão obrigados juízes e
tribunais, observados os artigos 9.3 do Pacto dos Direitos Civis e Políticos e 7.5 da
Convenção Interamericana de Direitos Humanos, a realizarem, em até noventa dias,
audiências de custódia, viabilizando o comparecimento do preso perante a
autoridade judiciária no prazo máximo de 24 horas, contado do momento da prisão.
(ADPF 347 MC, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Tribunal Pleno, julgado em
09/09/2015, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-031 DIVULG 18-02-2016 PUBLIC 19-02-
2016).

São exemplos de ações classificadas como estruturais no âmbito do STF, segundo a doutrina:

(...) A Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental – ADPF 347 (quadro


de violação massiva e persistente de direitos fundamentais no sistema penitenciário,
identificado como estado de coisas inconstitucional, decorrente de falhas
estruturais e falência de políticas públicas e cuja modificação depende de medidas
abrangentes de natureza normativa, administrativa e orçamentária); a Ação Popular
3.388/RR (caso Raposa Serra do Sol), na qual se estabeleceu condições para o
exercício do usufruto da terra demarcada; a ADPF 709/DF, com objetivo de que o
Poder Público tome medidas específicas para proteger os povos indígenas no
cenário de pandemia global causada pela disseminação do Covid-19.29

O conceito de Processo Estruturante tem sua origem no direito norte-americano, mais precisamente no
precedente "Brown x Board of Education". Na época, ainda vigorava nos EUA o sistema de ensino sectário, que
distinguia os alunos de acordo com a cor de sua pele. Desta feita, ao se deparar com a ausência de instrumentos
suficientemente aptos à concretização e efetivação da decisão proferida, a Suprema Corte Americana passou a
desenvolver o conceito de decisões estruturais.

Nesse sentido o escólio de Edilson Santana, Defensor Público Federal:

(...) A Corte decidiu que a separação (entre negros e brancos) não é igualitária e que
a segregação violava a cláusula de tratamento não discriminatório (previsto na
quarta emenda) 5. O processo de alteração no sistema de educação causado pela
decisão naquele processo é fenômeno que se denominou de reforma estrutural

29 FILHO, Edilson Santana Gonçalves. Defensoria Pública e a tutela coletiva de direitos. 2a Ed. Editora Juspodvim. Salvador, 2020

@CURSOEBLOGRDP #DPERJ 34
DPE-RJ TUTELA COLETIVA

(structural reform). Nos países periféricos, esta questão ganha relevo diante dos
evidentes problemas econômicos e sociais, o que, certamente, explica, em parte, a
intensa atividade do Poder Judiciário neste campo em estados como o Brasil,
chamado constantemente a resolver casos desta natureza.30

Uma das características mais marcantes nos Processos Estruturais é a prolação de uma primeira decisão de
caráter mais genérico e abstrato, definindo, em linhas gerais, as medidas que devem ser adotadas para solucionar o
problema estrutural reconhecido. Nas lições de Sérgio Cruz Arenhart 31, esta primeira decisão tem por finalidade
precípua a criação do "núcleo da posição jurisdicional sobre o problema”.

Após definidas as linhas gerais pela decisão estrutural, seguem-se diversos provimentos em cascata, de
cunho mais específico, visando a efetiva solução do problema. Ainda segundo Sérgio Cruz Arenhart 32, surge uma
"ampla cadeia de decisões, que implicarão em avanços e retrocessos no âmbito de proteção inicialmente afirmado,
de forma a adequar, da melhor forma viável, a tutela judicial”.

Recentes decisões do STJ também trataram dos processos estruturais e sua importância. Vejamos:

No informativo 673, foi divulgado entendimento exarado no REsp 1.854.842/CE, julgado em 2 de junho de
2020, o qual tratou de Ação Civil Pública que versava sobre acolhimento institucional de menores por período
superior ao fixado em lei, tendo o STJ decidido pela inadmissibilidade do julgamento de improcedência liminar do
pedido ou julgamento antecipado da lide em sede de ACPs que tratam de litígios estruturais.

A Min. Rel. Nancy Andrighi, na oportunidade, conceituou: “os litígios de natureza estrutural, de que é exemplo
a ação civil pública que versa sobre acolhimento institucional de menor por período acima do teto previsto em lei,
ordinariamente revelam conflitos de natureza complexa, plurifatorial e policêntrica, insuscetíveis de solução
adequada pelo processo civil clássico e tradicional, de índole essencialmente adversarial e individual. Para a adequada
resolução dos litígios estruturais, é preciso que a decisão de mérito seja construída em ambiente colaborativo e
democrático, mediante a efetiva compreensão, participação e consideração dos fatos, argumentos, possibilidades e
limitações do Estado em relação aos anseios da sociedade civil adequadamente representada no processo, por
exemplo, pelos amici curiae e pela Defensoria Pública na função de custos vulnerabilis, permitindo-se que processos
judiciais dessa natureza, que revelam as mais profundas mazelas sociais e as mais sombrias faces dos excluídos, sejam
utilizados para a construção de caminhos, pontes e soluções que tencionem a resolução definitiva do conflito
estrutural em sentido amplo.”

Ainda, o STJ, no AgInt no REsp 1437344/SP, Rel. Min. OG Fernandes, julgado em 5 de março de 2020,
reconheceu o litígio estrutural envolvendo o controle judicial de políticas públicas relacionadas à superpopulação
carcerária.

No REsp 1733412/SP, o STJ reconheceu o litígio estrutural em ACP envolvendo reforma e melhora em
hospital psiquiátrico:
“1. O controle judicial de políticas públicas é possível, em tese, ainda que em circunstâncias
excepcionais. Embora deva ser observada a primazia do administrador na sua consecução, a
discricionariedade cede às opções antecipadas pelo legislador, que vinculam o executor e
autorizam a apreciação judicial de sua implementação. 2. A existência de pedidos diversos e
complexos não significa automática pretensão de substituição do administrador. Ao
contrário, pressupõe cuidado do autor diante de uma atuação estruturante, que impõe
também ao Judiciário a condução diferenciada do feito. 3. Nos processos estruturais, a

30 FILHO, Edilson Santana Gonçalves. Defensoria Pública e a tutela coletiva de direitos. 2a Ed. Editora Juspodvim. Salvador, 2020.
31 ARENHART, Sérgio Cruz. Decisões estruturais no direito processual civil brasileiro. Revista de Processo, v. 225, 2013, p. 392.
32 ARENHART, Sérgio Cruz. Decisões estruturais no direito processual civil brasileiro. Revista de Processo, v. 225, 2013, p. 392.

@CURSOEBLOGRDP #DPERJ 35
DPE-RJ TUTELA COLETIVA

pretensão deve ser considerada como de alteração do estado de coisas ensejador da violação
dos direitos, em vez de se buscar solucionar pontualmente as infringências legais, cuja
judicialização reiterada pode resultar em intervenção até mais grave na discricionariedade
administrativa que se pretenderia evitar ao prestigiar as ações individuais. 4. No caso
concreto, a consideração genérica de impossibilidade de intervenção judicial nas falhas de
prestação do serviço de saúde configura efetiva omissão da instancia ordinária quanto às
disposições legais invocadas que, acaso mantida, pode inviabilizar o acesso das partes às
instancias superiores.” (REsp 1733412/SP, Rel. Ministro OG Fernandes, Segunda Turma,
julgado em 17/09/2019, DJe 20/09/2019).

@CURSOEBLOGRDP #DPERJ 36
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TUTELA COLETIVA – DPE-RJ


PARTE III
Tutela coletiva de direitos e tutela de direitos coletivos. Classificação dos direitos coletivos. Meios alternativos
(adequados) de composição dos conflitos coletivos. Termo de ajustamento de conduta. Processo coletivo. Interação
entre as ações coletivas e as ações individuais.

Inicialmente, saibam que a Defensoria Pública está prevista no art. 134 da CF e lá se encontra a sua gênese,
que pode ser dividida em três eixos: 1) DP enquanto instrumento e expressão do regime democrático; 2) DP
promotora de direitos humanos; 3) DP voltada para a salvaguarda dos direitos das pessoas e grupos necessitados
(acepção ampla do termo necessitados).

Ademais, de acordo com Gregório Assagra (2008, p. 422-428), há 03 fases evolutivas das ações coletivas:

Fase da absoluta
predominância
Inaugurada com o CC/16, que determinou o fim das ações populares como ações coletivas.
individualistas da tutela
jurídica
Fase da proteção Passaram a ser tutelados algumas espécies de direitos coletivos, predominando a
fragmentária dos dimensão individualista dos direitos. Marcado pela Ação Popular e pela Lei da Política
direitos transindividuais Nacional do Meio Ambiente.
Fase da tutela integral, Iniciada com a CF/88, que reconheceu expressamente os direitos e deveres coletivos como
irrestrita ou ampla direitos fundamentais. Há ainda o surgimento da Lei de Ação Civil Pública e o advento do
CDC.

1. Origem da ideia de proteção dos grupos vulneráveis

Retorna-se para as origens do próprio Estado de Direito, nos séculos XVI, XVII e, principalmente, XVIII.

O momento das revoluções burguesas do século XVIII revelou certa preocupação com a inclusão política e
social. Para Sieyès, o terceiro estado, na perspectiva da organização estamental na França pré-revolucionária, era
responsável, basicamente, por tudo, entretanto, não detinha o controle da vontade estatal, que era exercida pela
classe dominante da época (clero e nobreza). Nesse momento, o terceiro estado era considerado o grupo vulnerável
e, é nesse contexto, que se inicia a revolução (um marco para o mundo contemporâneo).

Surge, então, o estado liberal, com a proposta de universalização de direitos (sobretudo, aqueles de primeira
dimensão). A revolução do terceiro estado foi efetivada pela burguesia, mas após isso, este grupo se aliou aos
estamentos antigos de dominação e a proposta de universalização (liberdade, igualdade e fraternidade) não chegou
a ser efetivada. Dá-se início ao período de exploração do trabalho e a classe proletária, que se destaca como um
segundo grande grupo vulnerável.

Nesse contexto, no início do século XX, explodem as revoluções sociais, inspiradas nos ideais socialistas.
Surge, então, o Estado Social de Direito (que exige uma atuação positiva do Estado), com destaque para os direitos
trabalhistas.

Após, há a ascensão de estados totalitários e os horrores perpetrados na 2ª Guerra Mundial. Constatou-se


que o Estado Social não garantiria todos os direitos, sobretudo aqueles relacionados à democracia. Surge, então, um
período de retorno da moral e princípios, que, com caráter normativo, passam a integrar os textos das Constituições.

@CURSOEBLOGRDP #DPERJ 37
DPE-RJ TUTELA COLETIVA

Trata-se do estado Democrático de Direito, que, na verdade, não abandona o estado social, mas também, garante a
democracia.

O Brasil, com a CF de 1988, adota um estado social democrático de direito.

Todo esse percurso histórico é marcado por algo bem evidente: a luta por inclusão na formação da vontade
pública e na efetivação de direitos. Alguns grupos, hoje, ainda têm mais dificuldades, são, então, classificados como
grupos vulneráveis. A Defensoria Pública surge como um instrumento público, voltado para estimular, garantir e
fomentar a inclusão social e democrática. A tutela coletiva é uma das ferramentas para isso.

Assim, como esse processo histórico de inclusão de direitos e sua efetivação são penosos, a caminhada da
Defensoria Pública também não é fácil. Dentre essas duas perspectivas ainda se encontra a carência de informação.
Muitas vezes, os indivíduos desconhecem a Defensoria e seu direito de acesso à instituição. Por isso, a educação em
direitos surge como um paradigma emancipatório institucional e individual.

As dificuldades ficam aparentes quando se analisa a legitimidade da DP para os institutos coletivos. Em 2007,
a Lei da Ação Civil Pública passa a prever, expressamente, a legitimidade da DP para a propositura dessa ação coletiva,
mas que, mesmo diante de toda a resistência, já era possível no ordenamento jurídico, diante de um microssistema
de processo coletivo (com base nas normas previstas no CDC). Mesmo com a positivação, a resistência continua, em
todas as atuações da DP na tutela coletiva (MS coletivo, MI coletivo, HC coletivo, ação de improbidade administrativa,
custos vulnerabilis, etc.).

Fatores determinantes de vulnerabilidade (que indicam a necessidade de atuação da defensoria pública)


migrações (refugiados) e fatores de pertencimento a grupos (mulheres, LGBTQI+, negros, indígenas, idosos,
quilombolas, etc.). Em geral, esses fatores não se apresentam sozinhos, eles podem ser conjugados. Para fins de se
definir a assistência jurídica gratuita, deve-se identificar se esses fatores impedem ou dificultam o acesso à justiça.

2. INTERESSE PRIMÁRIO E SECUNDÁRIO

Você sabe o que é interesse público primário e secundário? Esse tema costuma estar presente nos nossos
editais.

INTERESSE PRIMÁRIO INTERESSE SECUNDÁRIO


Os interesses públicos primários são os interesses Já os interesses públicos secundários são os interesses
diretos do povo, os interesses gerais imediatos. imediatos do Estado na qualidade de pessoa jurídica,
titular de direitos e obrigações, isto é, interesse da
Fazenda Pública.

Obs.: Caso sejam indagados sobre qual interesse prevalece em eventual conflito, respondam que prevalece o
interesse PRIMÁRIO, eis que o Estado existe para tutelar os interesses da sociedade, e não os seus enquanto pessoa
jurídica. Isso traz reflexos diretos em situações cotidianas, como no caso de um sujeito passivo (contribuinte ou
responsável tributário) que inicia um procedimento administrativo para reaver créditos tributários pagos a mais ao
Ente tributante. Nesse caso, há um claro conflito entre o interesse público primário (consubstanciado no direito de a
população ser tributada apenas na medida legal) e o interesse público secundário (consubstanciado na vontade de o
Estado manter suas receitas). Conforme dito, pelo menos em tese, se ficar comprovado que houve cobrança
excessiva, deve o Estado devolver o dinheiro do sujeito passivo, justamente pela prevalência do interesse público
primário.

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3. REVISANDO AS ONDAS RENOVATÓRIAS

Amigos, façam também o link mental com as “ondas renovatórias” idealizadas por Bryant Garth e Mauro
Cappelletti. Deem atenção para a 2ª Onda, que traz uma visão coletivizada do processo.

Embora já tenhamos visto, vamos rever e aprofundar um pouco mais!

Mauro Cappelletti e Bryant Garth, na célebre obra “Acesso à justiça”, dividiram em três ondas os principais
movimentos renovatórios do acesso à justiça, vejamos:

Franklyn Roger e Diogo Esteves ensinam que esta primeira onda renovatória guarda referência com
a assistência judiciária aos pobres, com isenção de custas aos pobres, cujo obstáculo era econômico
e financeiro, revelando a necessidade de órgãos encarregados de prestar assistência aos menos
afortunados, patrocinando os direitos desta parcela humilde da população. Prevalece na doutrina
que o surgimento da Defensoria Pública se deu logo na primeira onda, embora em todas as ondas
seja possível visualizar a atuação da DP como importante instrumento de acesso à justiça.

Segundo a doutrina, realizando a análise da gradativa evolução da assistência jurídica no mundo,


pode-se identificar o surgimento de diversos movimentos (ou sub-movimentos) distintos, que
conformam sete sub-ondas renovatórias de acesso à justiça:

a) primeira sub-onda de assistência jurídica: da caridade ao reconhecimento como direito pelo


ordenamento jurídico.

PRIMEIRA b) segunda sub-onda de assistência jurídica: o welfare state e a ascensão do sistema judicare na
ONDA europa.

c) terceira sub-onda de assistência jurídica: a crise do welfare state e o declínio do sistema judicare
na Europa.

d) quarta sub-onda de assistência jurídica: o incremento da rede de amparo social e o


fortalecimento dos serviços de assistência jurídica no leste da Ásia.

e) quinta sub-onda de assistência jurídica: o social liberalismo e o desenvolvimento do salaried staff


model na América Latina.

f) sexta sub-onda de assistência jurídica: o intervencionismo estatal e a autonomia dos salaried stafs
latino-americanos.

g) sétima sub-onda de assistência jurídica: tecnologização da assistência jurídica.


Refere-se à representação dos interesses difusos em juízo e visa contornar o obstáculo
SEGUNDA organizacional do acesso à justiça. Trata-se da coletivização do processo, tendo em vista que a
ONDA aplicação do processo civil individual era insuficiente para a tutela de determinados direitos com
feição transindividual.
Tem como escopo instituir técnicas processuais adequadas, céleres, com redução dos custos do
TERCEIRA
processo, concentração dos ritos processuais e também adoção de métodos alternativos de solução
ONDA
de conflitos, como a arbitragem, a conciliação e a mediação.

Além dessas conhecidas ondas, a doutrina ainda defende a existência de mais duas. Vale ressaltar que essas
duas novas ondas não fazem parte dos estudos de Mauro Cappelletti e Bryant Garth.

@CURSOEBLOGRDP #DPERJ 39
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Segundo Diogo Esteves e Franklyn Roger Alves Silva, surge como base da sensação comum
na sociedade moderna de estar-se rodeado de injustiças e ao mesmo tempo não se sabe
onde está a justiça. O professor Kim Economides defende a existência dessa onda expondo
a dimensão ética e política da administração da justiça. De acordo com esse professor, o
problema não está mais no acesso dos cidadãos à justiça, mas inclui também o acesso dos
advogados à justiça.
QUARTA ONDA
A crítica doutrinária à tese do prof. Kim é de que os estudos das ondas renovatórias foram
pensados em relação à população, que se vale dos serviços do sistema de justiça, e a
facilitação do acesso daquela ao referido sistema. Por outro lado, ao tratar da questão do
acesso à justiça dos advogados, está-se discorrendo acerca dos próprios atores do sistema
legal, o que se distanciaria do foco original de Garth e Cappelletti.
A quinta onda surge com a internacionalização da proteção dos Direitos Humanos. Ao longo
QUINTA ONDA da segunda metade do século XX, os Direitos Humanos vêm sofrendo uma readaptação,
pois sofreram muito com as duas guerras mundiais.
SEXTA ONDA Tecnologização da Assistência Jurídica

Em resumo:

1ª ONDA: Superar obstáculos financeiros de acesso à justiça.

2ª ONDA: Superar a dificuldade na tutela de direitos coletivos em sentido amplo.


Buscar a adoção do modelo multi-portas de acesso à justiça, favorecendo métodos
3ª ONDA: autocompositivos e/ou extrajudiciais.
Kim Economides defende como 4ª ONDA a ética e humanização dos profissionais do
4ª ONDA: direito.
Franklyn Roger defende como 5ª ONDA a internacionalização da proteção dos direitos
5ª ONDA:
humanos.
A partir de uma análise da gradativa evolução da assistência jurídica no mundo, Diogo
Esteves e Franklyn Roger Alves Silva identificaram o surgimento de diversos movimentos
(ou sub-movimentos) distintos. Naquilo que passou a ser denominado de sexta onda
renovatória de acesso à justiça pela “nova edição do Projeto Florença” (Global Access to
Justice Project), a Tecnologização da Assistência Jurídica é assim explicada pelos autores:
“Dentro do atual cenário mundial de crise econômica e de busca pela otimização de
recursos, diversos países passaram a investir em tecnologia como forma de reduzir ou,
pelo menos, estabilizar os gastos orçamentários com os serviços jurídico-assistenciais
6º ONDA:
públicos. Atualmente, os serviços de call center são utilizados por grande parte dos
modelos de assistência jurídica no mundo, como etapa preliminar para o atendimento
presencial ou como forma de prestar orientação jurídica extrajudicial. Essa ferramenta
tem possibilitado a redução do custo inerente ao deslocamento físico dos advogados e a
maximização do tempo gasto na prestação de orientações jurídicas, além de facilitar a
superação de obstáculos geográficos que poderiam dificultar o acesso das classes mais
pobres à justiça. A crescente difusão do acesso à internet tem possibilitado, também, o
fornecimento de assistência jurídica on-line, seja por intermédio de chats ou, até mesmo,

@CURSOEBLOGRDP #DPERJ 40
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por videoconferência. Outrossim, foram desenvolvidos websites interativos que auxiliam


o usuário a resolver pequenos problemas jurídicos (selfhelp systems)”33.

Após a segunda guerra, a tutela dos direitos humanos vem ganhando significativas atenções. Segundo Diogo
Esteves e Franklyn Roger Alves Silva34, o processo de generalização da proteção internacional dos Direitos Humanos
desencadeou o surgimento de um novo movimento de acesso à justiça, que conforma o desenvolvimento de uma
nova onda renovatória, dedicada à efetividade da proteção jurídica do indivíduo em face do próprio Estado que
deveria protegê-lo.

Marcos Vinícius Manso Lopes Gomes35 defende que, fazendo uma ligação da quinta onda especificamente
com as atribuições da Defensoria Pública, poderíamos relacioná-la com as atuações em prol dos Direitos Humanos,
principalmente diante de Tribunais Internacionais, nos termos do art. 4º, VI, da LC nº 80/94, buscando a garantia de
direitos que transbordam a competência dos Tribunais nacionais.

Já que a Defensoria Pública pode representar aos sistemas internacionais de proteção dos direitos humanos,
postulando perante seus órgãos, há uma relação com a internacionalização dos Direitos Humanos, porque o próprio
Estado tem a obrigação de defender seus cidadãos, devendo responder por qualquer violação ou omissão na garantia
dos direitos humanos.

Feitas essas observações, vamos continuar.

4. RESOLUÇÃO DE CONFLITOS NA DIMENSÃO MOLECULAR

A doutrina estabelece que “o tratamento judicial que tradicionalmente se encontra no Brasil acontece via
conflitos individuais, como “demanda átomo”. Ocorre que principalmente nos últimos 20 anos ganha destaque a
resolução dos conflitos na dimensão “molecular”, ou seja, via demanda coletiva, que além de permitir o acesso mais
rápido e barato aos mecanismos judiciais, traz a possibilidade de ser conferido a ela adequado peso político,
diferentemente do que ocorre com a fragmentação dos pedidos. Esse tipo de demanda conquista, desde a década
de 80, com a Lei das Ações Civis Públicas, cada vez maior relevância no cenário jurídico brasileiro. Em razão disso os
operadores do direito se deparam com problemas relacionados à dificuldade de coordenação entre ações coletivas
e individuais com objetos total ou parcialmente coincidentes.”36

Como já falamos logo aí acima, pautado no diálogo das fontes, o processo coletivo é formado por uma rede
que interliga leis e estatutos, como por exemplo: Lei do Mandado de Segurança (12.016/09), Estatuto da Criança e
do Adolescente (8.069/90), Estatuto da Pessoa com Deficiência (13.146/15), Estatuto do Idoso (10.741/03), Estatuto
da Cidade (10.257/01), Lei da Ação Popular (4.717/65), Lei da Ação Civil Pública (7.347/85), CDC, Lei de Improbidade
Administrativa (8.429/92). Tanto o CDC quanto a Lei de Ação Civil Pública funcionam como pontos de partida para os
demais atos normativos, sendo o CPC aplicável de forma subsidiária.

33 Disponível em: https://www.conjur.com.br/2020-jul-07/tribuna-defensoria-crise-covid-19-tecnologizacao-defensoria-publica. Acesso em:


10/02/2021.
34 ESTEVES, Diogo; ALVES SILVA, Franklyn Roger. Princípios Institucionais da Defensoria Pública. 2 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2017, p. 43.
35 GOMES, Marcos Vinícius Manso Lopes Direitos humanos e princípios institucionais da defensoria pública. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 166.

– (Coleção defensoria pública: ponto a ponto).


36 Disponível em:
https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/3383742/mod_resource/content/1/tese_a%C3%A7%C3%B5es_coletivas_como_meio_de_molecul
ariza%C3%A7%C3%A3o_de_demandas%20pdf.pdf. Acesso em: 10/02/2021.

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5. DIREITOS DIFUSOS, COLETIVOS E INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS

Sobre interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos, observem nossa tabela:

DIREITOS DIFUSOS DIREITOS COLETIVOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS


(art. 81, I, CDC) (art. 81, II, CDC) (art. 81, III, CDC)

São transindividuais, ou seja, São igualmente transindividuais, São individuais, porém são tratados
transcendem a pessoa de seus porém a titularidade é mais restrita coletivamente em virtude da
titulares, como o meio ambiente, por do que em relação aos direitos necessidade da proteção coletiva
exemplo. difusos. de certos interesses de natureza,
principalmente, social. Também
chamados de acidentalmente
coletivos.
São titularizados por todos os São titularizados por indivíduos Os titulares possuem interesse de
indivíduos indistintamente, que são pertencentes a mesmo grupo, origem comum.
ligados, entre si, por circunstâncias categoria ou classe de pessoas Ex.: familiares das vítimas de um
de fato. Como por exemplo a ligadas entre si por uma relação acidente aéreo.
população vitimada por poluição jurídica base (usuário de um plano
ambiental. de saúde, por exemplo).
Os titulares são indeterminados de Os titulares são indeterminados de Os titulares são determináveis
natureza absoluta natureza relativa, mas
determináveis

CAIU NA DP-DF-2019-CESPE: “Os interesses difusos, coletivos strictu sensu e individuais homogêneos possuem como
característica comum a indivisibilidade do objeto”.37

Amigos do RDP, os direitos coletivos são gênero, do qual são espécies os direitos difusos, os direitos coletivos
em sentido estrito e os direitos individuais homogêneos (também chamado de direitos acidentalmente coletivos).

Veja abaixo uma questão dissertativa que caiu em 2016 na segunda fase da DPE-MT.

Dando continuidade, qual seria a legitimidade da Defensoria Pública para a tutela dos interesses individuais

37 ERRADO. Justificativa da banca: “A doutrina é pacífica quanto à divisibilidade do objeto no caso dos direitos individuais homogêneos. Os
direitos individuais homogêneos são divisíveis, pois a lesão sofrida por cada titular pode ser reparada na proporção da respectiva ofensa, o
que permite ao lesado optar pelo ressarcimento de seu prejuízo via ação individual. Nos direitos difusos e nos coletivos, pelo contrário, o
objeto é indivisível. Portanto, esse é o principal traço distintivo dos direitos individuais homogêneos”.

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homogêneos? É ampla?

Sim, pessoal.

A Defensoria Pública possui, conforme já pacificado pelos Tribunais Superiores, legitimidade ativa para a
propositura de ações coletivas para a tutela de direitos coletivos em sentido amplo, se presentes, nos interesses
violados, a ofensa a direitos de grupos, ou indivíduos vulneráveis, como por exemplo, hipossuficientes econômicos e
demais grupos marginalizados.

Em relação à legitimidade para a propositura de ação civil pública por parte da Defensoria Pública não restam
dúvidas, o Supremo Tribunal Federal já julgou improcedente uma ADI que questionava essa legitimidade (ADI 3943,
Rel. Min. Cármen Lúcia).

A rigor, devemos ter em mente que antes mesmo da alteração da Lei nº 7.347/85, que em 2007 incluiu a
Defensoria no rol de legitimados para a ACP em seu art. 5º, II (e que gerou a interposição da ADI supramencionada),
já se reconhecia a legitimidade da instituição para ajuizar ações coletivas.

Além disso, entende o STF que no processo coletivo vigoram os princípios do máximo benefício, da máxima
efetividade e da máxima amplitude. Dessa feita, podendo haver hipossuficientes beneficiados pelo resultado da
demanda, deve-se admitir a legitimidade da Defensoria Pública. É o caso, por exemplo, de consumidores de energia
elétrica, que tanto podem abranger pessoas com alto poder aquisitivo, como hipossuficientes. STF. Plenário. RE
733433/MG, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 4/11/2015 (repercussão geral). Nessa esteira, em relação à ADI 394338:

(...) A recente rejeição dos Embargos de Declaração na ADI 3.943, através dos quais a parte
embargante argumentava que a legitimidade da Defensoria Pública para o ajuizamento de
ACP somente deveria ser admitida quando houvesse prévia comprovação de
hipossuficientes envolvidos e interessados, buscando, ainda, claramente, vincular a
necessidade ao aspecto econômico, afastou qualquer pretensão de condicionar a
legitimidade para a propositura de ação civil pública pela instituição à prévia comprovação
da necessidade (seja econômica ou de outra ordem) dos potenciais beneficiários da ação.

Na decisão dos embargos restou consignado que a legitimidade da Defensoria Pública para
ajuizar ação civil pública não está condicionada à comprovação prévia da hipossuficiência
dos possíveis beneficiados pela tutela jurisdicional. Tal inteligência já era extraída da
decisão embargada (na ADI 3.943), motivo pelo qual os embargos foram rejeitados, por
demonstrarem “apenas inconformismo e resistência em pôr termo a processos que se
arrastam em detrimento da eficiente prestação jurisdicional” (trecho em aspas retirado do
inteiro teor — ADI 3.943 ED/DF).

O simples fato de a ação ser patrocinada pela Defensoria Pública, portanto, já revela, em
tese, o interesse subjacente de pessoas vulneráveis, já que, por natureza, a atuação
institucional é voltada à defesa dos necessitados. A presunção de que no rol dos possíveis
afetados pelos resultados da ação coletiva ajuizada pela instituição constem pessoas
necessitadas é suficiente para justificar a legitimidade da Defensoria Pública.

O STJ no REsp 1192577 (Info 573) ampliou o conceito de necessitados, de modo que este deve ser
interpretado além daqueles indivíduos que não possuem condições econômicas, mas sim, para todos aqueles que

38GONÇALVES FILHO, Edilson Santana. Legitimidade da Defensoria não exige comprovação de hipossuficiência. In Tribuna da Defensoria.
Disponível em: https://www.conjur.com.br/2018-ago-14/tribuna-defensoria-legitimidade-defensoria-nao-exige-comprovacao-
hipossuficiencia. Acesso em: 10/02/2021.

@CURSOEBLOGRDP #DPERJ 43
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sejam juridicamente necessitados. Vale a pena conferir abaixo:

DIREITO CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. LEGITIMIDADE DA DEFENSORIA PÚBLICA


PARA PROPOR AÇÃO CIVIL PÚBLICA EM DEFESA DE JURIDICAMENTE NECESSITADOS. A
Defensoria Pública tem legitimidade para propor ação civil pública em defesa de interesses
individuais homogêneos de consumidores idosos que tiveram plano de saúde reajustado
em razão da mudança de faixa etária, ainda que os titulares não sejam carentes de recursos
econômicos.

A atuação primordial da Defensoria Pública, sem dúvida, é a assistência jurídica e a defesa


dos necessitados econômicos. Entretanto, ela também exerce atividades de auxílio aos
necessitados jurídicos, os quais não são, necessariamente, carentes de recursos
econômicos. Isso ocorre, por exemplo, quando a Defensoria exerce as funções de curador
especial (art. 9º, II, do CPC) e de defensor dativo (art. 265 do CPP). No caso, além do direito
tutelado ser fundamental (direito à saúde), o grupo de consumidores potencialmente
lesado é formado por idosos, cuja condição de vulnerabilidade já é reconhecida na própria
Constituição Federal, a qual dispõe no art. 230 que: "A família, a sociedade e o Estado têm
o dever de amparar as pessoas idosas, assegurando sua participação na comunidade,
defendendo sua dignidade e bem-estar e garantindo-lhes o direito à vida". Dessa forma,
nos termos do assentado no julgamento do REsp 1.264.116-RS (Segunda Turma, DJe
13/4/2012).

Em outro julgado, pontou a Corte Cidadã:

“A expressão 'necessitados' (art. 134, caput, da Constituição), que qualifica, orienta e


enobrece a atuação da Defensoria Pública, deve ser entendida, no campo da Ação Civil
Pública, em sentido amplo, de modo a incluir, ao lado dos estritamente carentes de
recursos financeiros - os miseráveis e pobres -, os hipervulneráveis (isto é, os socialmente
estigmatizados ou excluídos, as crianças, os idosos, as gerações futuras), enfim, todos
aqueles que, como indivíduo ou classe, por conta de sua real debilidade perante abusos ou
arbítrio dos detentores de poder econômico ou político, 'necessitem' da mão benevolente
e solidarista do Estado para sua proteção, mesmo que contra o próprio Estado”. EREsp
1.192.577-RS, CORTE ESPECIAL. Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 21/10/2015, DJe
13/11/2015.

Vamos agora abordar um tema importante para nossa prova, que é o dano moral coletivo.

6. DANO MORAL COLETIVO

Segundo Humberto Theodoro Júnior39, o art. 6º do CDC é claro ao proclamar que, entre os direitos básicos
do consumidor figura “a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e
difusos” (inciso VI). Ainda no mesmo rol de direitos básicos se assegura “o acesso aos órgãos judiciários e
administrativos, com vistas à prevenção ou reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos ou
difusos” (inciso VII).

Salienta o autor “que os danos cuja reparação a legislação consumerista garante, induvidosamente podem
ser materiais ou morais, individuais ou coletivos. Daí a possibilidade, reconhecida pelo art. 81 do CDC, de que a defesa

39 Theodoro Júnior, Humberto Direitos do consumidor/Humberto Theodoro Júnior. – 9. ed. ref., rev. e atual. – Rio de Janeiro: Forense, 2017,
p. 155.

@CURSOEBLOGRDP #DPERJ 44
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dos interesses e direitos dos consumidores e das vítimas seja exercida em juízo tanto individualmente como a título
coletivo. A ação civil coletiva pode ser manejada em defesa de direitos difusos ou coletivos, nos moldes da Lei da Ação
Civil Pública (CDC, art. 90), e pode, também, defender direitos individuais homogêneos de consumidores, segundo as
regras dos arts. 91 a 100 do CDC. Em casos de dano moral coletivo, o dano não se restringe à “alteração de um estado
anímico” caracterizador de dor psíquica, que é inerente às pessoas físicas, mas reflete, também, “o dever de reparar
quaisquer danos extrapatrimoniais (ou, não patrimoniais) de natureza coletiva, com o fim de corresponder ‘ao anseio
justo, legítimo e necessário apresentado pela sociedade de nossos dias’”.40

Pontua Theodoro Júnior (2017, p. 155), ainda que:

(...) Segundo Carlos Alberto Bittar, “dano moral coletivo é a injusta lesão da esfera moral
de uma dada comunidade, ou seja, é a violação antijurídica de um determinado círculo de
valores”. Assim, dano moral coletivo ocorre quando “o patrimônio valorativo de uma certa
comunidade (maior ou menor), idealmente considerado, foi agredido de maneira
absolutamente injustificável do ponto de vista jurídico: quer isso dizer, em última instância,
que se feriu a própria cultura, em seu aspecto imaterial”. (GRIFOS NOSSOS).

Imagine que você como Defensor@ Públic@ ajuíze uma ACP para pedir uma indenização em prol de vários
consumidores de um celular X que explodiu e lesionou diversas pessoas. Nessa situação, em sua peça é indispensável
que você abra um tópico para falar sobre danos morais coletivos, certo?

Recentemente, a Quarta Turma do STJ41 entendeu que a violação de direitos individuais homogêneos,
reconhecida em ACP, não é causa para a indenização por dano moral coletivo.

O Relator do REsp. 1610821, Ministro Luis Felipe Salomão, declarou que o dano moral coletivo é aferível in
re ipsa (presumido), de forma que sua configuração decorre da mera apuração da prática de conduta ilícita que viole
direitos de conteúdo extrapatrimonial da coletividade de maneira injusta e intolerável, sendo dispensável a
demonstração de prejuízos concretos ou de efetivo abalo moral.

Ele ressaltou ainda que não se trata do número de pessoas concretamente prejudicadas pela lesão em certo
período, mas sim do dano decorrente da conduta antijurídica, que deve ser "ignóbil e significativo", de modo a atingir
valores e interesses coletivos fundamentais.

Discordando da tese levantada pelo MPRJ, Salomão consignou que os danos morais coletivos têm como
destinação os interesses difusos e coletivos, e não os individuais homogêneos, cujos titulares são pessoas
determinadas. "O dano moral coletivo é essencialmente transindividual, de natureza coletiva típica", apontou o
ministro.

Por essa razão – acrescentou –, a condenação em danos morais coletivos tem natureza eminentemente
sancionatória, e o valor da indenização é arbitrado em prol de um fundo criado pelo artigo 13 da LACP, enquanto na
violação de direitos individuais homogêneos, que leva à fixação de danos morais cujos valores se destinam às vítimas,
há uma condenação genérica, seguida pela liquidação prevista nos artigos 97 a 100 do CDC.

Assim, conforme o ministro, o valor arbitrado a título de dano moral coletivo é destinado ao Fundo do art.
13 da Lei da ACP, ao passo que para as vítimas (direito individual homogêneo), é possível ser arbitrada indenização
genérica, a ser liquidada individualmente pelas vítimas, conforme previsto no CDC.

40Idem, p. 155.
41 https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/02022021-Violacao-de-direitos-individuais-homogeneos-nao-gera-
dano-moral-coletivo--entende-a-Quarta-Turma-.aspx

@CURSOEBLOGRDP #DPERJ 45
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Certo, entendi o dano moral coletivo.

Ah, antes que eu esqueça, vamos tratar sobre uma decisão IMPORTANTÍSSIMA do STJ para nossa prova, isso
porque a referida decisão foi tomada tendo como base uma ação coletiva intentada pela Defensoria Pública.

De início, eu faço a seguinte pergunta a vocês: é cabível indenização por danos morais individuais em caso
de demora excessiva para atendimento na fila do banco?

E danos morais coletivos?

Vamos entender melhor isso.

Pessoal, alguns municípios editaram leis regulamentando tempo máximo (geralmente 15 minutos) de espera
em filas de banco, supermercados, etc. Isso não é mais novidade para nós, tendo em vista que o STF, em diversos
julgados, já entendeu que essas leis são constitucionais, por tratarem de interesse local, nos termos do art. 30, I da
Constituição Federal.

A dúvida é a seguinte: se uma pessoa ficar na fila mais do que o tempo permitido, isso gera dano moral in re
ipsa 42?

Não. O STJ decidiu, em 26 de fevereiro de 2019, no REsp 1647452/RO, que o simples fato de a pessoa ter
esperado por atendimento bancário por tempo superior ao previsto na legislação municipal não enseja indenização
por danos morais por si só.

No entanto, em casos pontuais, o STJ reconheceu haver dano moral indenizável, cujos exemplos são trazidos
pelo Márcio Cavalcante do Dizer o Direito, vejam:

“Ex1: em um caso concreto, o STJ reconheceu que houve dano moral indenizável porque restou provado que a
consumidora, no dia do fato, estava com a saúde debilitada e ficou esperando, em pé, durante muito mais tempo
do que a lei estabelecia, sem que houvesse um banheiro que ela pudesse utilizar. A indenização foi fixada em R$ 3
mil (STJ. 3ª Turma. REsp 1218497-MT, Rel. Min. Sidnei Beneti, julgado em 11/9/2012).

Ex2: em outra situação, o STJ reconheceu que houve dano moral na hipótese em que o consumidor ficou aguardando
2h07m para ser atendido na agência bancária. O STJ afirmou que tal período de tempo configura uma espera
excessiva, que é causa de danos extrapatrimoniais. A indenização foi fixada em R$ 5 mil (STJ. 3ª Turma. REsp
1662808/MT, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 02/05/2017).”

Por outro lado, o mais importante para nossa prova é o que veremos agora.

Se o Banco X não cumpre a referida Lei Municipal, e existem diversas reclamações nesse sentido, é cabível
ação civil pública objetivando, além do cumprimento da Lei, indenização por danos morais coletivos?

Sim, amig@s.

O STJ entendeu, em um caso concreto, que “a instituição financeira optou por não adequar seu serviço aos
padrões de qualidade previstos em lei municipal e federal, impondo à sociedade o desperdício de tempo útil e
acarretando violação injusta e intolerável ao interesse social de máximo aproveitamento dos recursos produtivos, o

42 Danomoral “in re ipsa” quer dizer “presumido”, ou seja, um dano que não é preciso demonstrar sofrimento, dor, pois há uma presunção de
que o próprio fato em si já é capaz de gerar um dano aos direitos da personalidade.

@CURSOEBLOGRDP #DPERJ 46
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que é suficiente para a configuração do dano moral coletivo. A condenação em danos morais coletivos cumprirá sua
função de sancionar o ofensor, inibir referida prática ilícita e, ainda, de oferecer reparação indireta à sociedade, por
meio da repartição social dos lucros obtidos com a prática ilegal com a destinação do valor da compensação ao fundo
do art. 13 da Lei nº 7.347/85.43

E o mais importante disso tudo é que a ação originária era uma Ação Civil Pública ajuizada pela Defensoria
Pública do Estado, portanto, MUITO importante para nossas provas.

Veremos agora algumas espécies de dano que podem aparecer na sua prova.

Quais são os danos clássicos? E os contemporâneos?

A doutrina moderna subdivide os danos em duas categorias: danos clássicos ou tradicionais e os danos novos
ou contemporâneos. Os danos clássicos ou tradicionais seriam os danos materiais e danos morais. Por outro lado, os
danos novos ou contemporâneos seriam os danos estéticos, danos morais coletivos, danos sociais e danos por perda
de uma chance, etc.44

DANOS CLÁSSICOS (TRADICIONAIS) DANOS CONTEMPORÂNEOS (NOVOS)


Danos estéticos, danos morais coletivos, danos sociais e
Danos morais e materiais
danos por perda de uma chance, etc.

No dano material, o que são danos positivos e negativos?

Segundo Flávio Tartuce, os danos emergentes são também conhecidos como danos positivos, que é o que
efetivamente se perdeu. Lembra o autor, como exemplo típico, o estrago do automóvel, no caso de um acidente de
trânsito. Como outro exemplo, a regra do art. 948, I, do CC, para os casos de homicídio, devendo os familiares da
vítima ser reembolsados pelo pagamento das despesas com o tratamento do morto, seu funeral e o luto da família.

Para o mesmo autor, o lucro cessante (também chamados de danos negativos) trata-se daquilo que
razoavelmente se deixou de lucrar. No caso de acidente de trânsito, poderá pleitear lucros cessantes o taxista, que
deixou de receber valores com tal evento, fazendo-se o cálculo dos lucros cessantes de acordo com a tabela fornecida
pelo sindicato da classe e o tempo de impossibilidade de trabalho (TJSP, Apelação Cível 1.001.485-0/2, São Paulo,
35.ª Câmara de Direito Privado, Rel. Artur Marques, 28.08.2006, v.u., Voto 11.954). Como outro exemplo de lucros
cessantes, cite-se, no caso de homicídio, a prestação dos alimentos indenizatórios, ressarcitórios ou indenitários,
devidos à família do falecido, mencionada no art. 948, II, do CC.

DANOS POSITIVOS DANOS NEGATIVOS


Danos emergentes Lucros cessantes

Dano moral próprio e impróprio.

A doutrina aponta que, quanto ao sentido da categoria, o dano moral pode ser subdivido em dano moral em
sentido próprio, que constitui aquilo que a pessoa sente (dano moral in natura), causando na pessoa dor, tristeza,
vexame, humilhação, amargura, sofrimento, angústia e depressão. Em dano moral impróprio (ou em sentido amplo),

43 STJ.2ª Turma. REsp 1402475/SE, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 09/05/2017.
STJ. 3ª Turma. REsp 1737412/SE, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 05/02/2019.
44 Flávio Tartuce, Manual de Direito Civil – Volume Único, 8ª edição, p. 499.

@CURSOEBLOGRDP #DPERJ 47
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este último como sendo qualquer lesão aos direitos da personalidade, como, por exemplo, à orientação sexual. Na
linha do exposto não necessita da prova do sofrimento em si para a sua caracterização.

DANO MORAL PRÓPRIO DANO MORAL IMPRÓPRIO


Constitui aquilo que a pessoa sente (dano moral in Qualquer lesão aos direitos da personalidade, não
natura), causando na pessoa dor, tristeza, vexame, necessitando da prova do sofrimento em si para a sua
humilhação, amargura, sofrimento, angústia e caracterização.
depressão.

7. DANO TEMPORAL

O conceito de dano temporal pode, em um primeiro momento, trazer alguma confusão no tocante à sua
natureza jurídica, isso porque parte da doutrina entende ser o dano temporal uma espécie autônoma, ao lado de
dano moral, material, dano estético, etc., e outra parte, inclusive o STJ, entende ser o dano temporal uma espécie
de dano moral.

Kissy de Paula Andrade e Guilherme Augusto Giovanoni da Silva em trabalho científico recente (2019) sobre
o tema, tendo como título “DANO TEMPORAL: a responsabilidade civil por desvio produtivo do consumidor” 45,
lembram que Fernando Antônio de Lima (2018) define o dano temporal como um dano autônomo, tendo em vista
que o tempo se revela como verdadeiro direito fundamental implícito, que possui nítida autonomia dos danos
morais.

Em seu trabalho, Kissy de Paula Andrade e Guilherme Augusto Giovanoni da Silva esclarecem que Marcos
Dessaune (2017, p.274), em sua teoria do Desvio Produtivo do Consumidor46, defende que o dano temporal é uma
lesão ao bem vital, sendo este “Dano extrapatrimonial de natureza existencial, corriqueiramente chamado de Dano
Moral “Lato Sensu”, que afeta o bem jurídico, integridade psicofísico do consumidor”. Por sua vez, Victor Guglinski
(2018, p.188) em posicionamento análogo preceitua que: “a doutrina vem se posicionando no sentido de que, o dano
moral reste configurado, não é necessário o desencadeamento de sentimentos humanos negativos, sendo portanto,
para o referido autor, o dano temporal um dano moral, pois, este prescinde de sentimentos”.

8. TEORIA DO DESVIO PRODUTIVO

O STJ já mencionou expressamente a teoria do desvio produtivo. Já tratamos dessa teoria em nosso Blog47,
mas vamos relembrar. Um dos responsáveis por introduzir essa teoria no direito brasileiro é o advogado MARCOS
DESSAUNE por meio do livro "Desvio Produtivo do Consumidor: o prejuízo do tempo desperdiçado”. Segundo a Teoria,
o desvio produtivo do consumidor ocorre quando há um problema de consumo gerado ao consumidor, seja em
virtude de vício ou fato do serviço/produto, fazendo com que ele perca um tempo vital, existencial ou produtivo para
resolver algo que o fornecedor deveria fazer de forma simples, num tempo razoável e de forma eficiente.

CAIU NA DPE-AM-2018-FCC: “No ano de 2017, no julgamento do REsp 1.634.851, foi abordada a tese de que o
comerciante pode ser responsabilizado pelo desgaste sofrido pelo consumidor, na tentativa de obter solução para o
vício apresentado pelo produto ou serviço junto ao fabricante. Em outros julgados, acompanhando a tese esposada
no aresto acima, em especial, os AREsp 1.241.259/SP e AREsp 1.132.385/SP, duas Turmas do Superior Tribunal de
Justiça também se pautaram pelo cabimento de dano moral indenizável pela falta de pronta solução pelo fornecedor

45 Disponível em: http://viannasapiens.com.br/revista/article/view/577/321. Acesso em: 10/02/2021.


46 É importante lembrar que para o autor, “o desvio produtivo caracteriza-se quando o consumidor, diante de uma situação de mau
atendimento, precisa desperdiçar o seu tempo e desviar as suas competências — de uma atividade necessária ou por ele preferida — para
tentar resolver um problema criado pelo fornecedor, a um custo de oportunidade indesejado, de natureza irrecuperável”.
47 Disponível em: https://rumoadefensoria.com/artigo/desvio-produtivo-do-consumidor. Acesso em: 10/02/2021.

@CURSOEBLOGRDP #DPERJ 48
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para reparos dos vícios apresentados pelo produto e serviço, e pelo tempo gasto pelo consumidor para tentar, sem
conhecimento técnico, solucioná-los. Tal tese denomina-se de desvio produtivo do consumidor”.48

9. DANOS SOCIAIS

Dano moral coletivo seria o mesmo que danos sociais? Nãooooooo!

São coisas distintas, vejam:49

“Os danos sociais, nas palavras de Antônio Junqueira de Azevedo (apud TARTUCE, 2009), são aqueles que causam
um rebaixamento no nível de vida da coletividade e que decorrem de conduta socialmente reprováveis. Tal tipo de
dano dá-se quando as empresas praticam atos negativamente exemplares, ou seja, condutas corriqueiras que causam
mal-estar social. Envolvem interesses difusos e as vítimas são indeterminadas ou indetermináveis (correspondem ao
art. 81, parágrafo único, inciso I do CDC).

Nesse caso, quando o juiz percebe condutas socialmente reprováveis, fixa a verba compensatória e aquela de caráter
punitiva a título de dano social. Essa indenização derivada do dano social não é para a vítima, sendo destinada a um
fundo de proteção consumerista (art. 100 do CDC), ambiental ou trabalhista, por exemplo, ou até mesmo instituição
de caridade, a critério do juiz (art. 883, parágrafo único do CC). Enfim, é a aplicação da função social da
responsabilidade civil (é cláusula geral; norma de ordem pública).

Alguns casos práticos podem ser citados. Um deles é a decisão do TRT-2ª Região (processo 2007-2288), que condenou
o Sindicato dos Metroviários de São Paulo e a Cia do Metrô a pagarem 450 cestas básicas a entidades beneficentes
por greve abusiva.”

Em resumo:

DANO MORAL COLETIVO DANO SOCIAL


Os danos morais coletivos estão atrelados à 3ª geração do Os danos sociais, nas palavras de Antônio Junqueira de
constitucionalismo: a solidariedade. Segundo Bittar Filho Azevedo (apud TARTUCE, 2009), são aqueles que
(apud TARTUCE, 2009), estão presentes quando há causam um rebaixamento no nível de vida da
violação a direitos da personalidade em seu aspecto coletividade e que decorrem de conduta socialmente
individual homogêneo ou coletivo em sentido estrito, em reprováveis. Tal tipo de dano dá-se quando as
que as vítimas são determinadas ou determináveis. empresas, por exemplo, praticam atos negativamente
exemplares, ou seja, condutas corriqueiras que
causam mal-estar social. Envolvem interesses difusos
e as vítimas são indeterminadas ou indetermináveis.
Exemplo clássico trazido pela doutrina é a conduta do
indivíduo que joga lixo na rua, poluindo o meio
ambiente; e a conduta do indivíduo que fuma durante
o voo, sabendo que é proibido, colocando todos os
passageiros em risco.

10. TERMO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA

Ponto expresso em nosso edital.

48CORRETO.
49 Disponível em: https://ambitojuridico.com.br/cadernos/direito-civil/os-novos-danos-danos-morais-coletivos-danos-sociais-e-danos-por-
perda-de-uma-chance/. Acesso em: 10/02/2021.

@CURSOEBLOGRDP #DPERJ 49
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A lei da ACP assim prevê em seu art. 5º. § 6º:

§6º Os órgãos públicos legitimados poderão tomar dos interessados compromisso de ajustamento de sua conduta
às exigências legais, mediante cominações, que terá eficácia de título executivo extrajudicial. (Incluído pela Lei nº
8.078, de 11.9.1990).

O termo de ajustamento de conduta, também chamado de compromisso de ajustamento de conduta, é o


instrumento, com natureza de negócio jurídico, que constitui título executivo extrajudicial.

Cleber Masson e Ernani Vilhena Jr (2019, p. 335/336 50) apontam as seguintes características para o TAC:

Extrajudicial: a assinatura de um TAC decorre da atuação administrativa do Ministério Público (e também da


Defensoria Pública. É possível a assinatura de um TAC havendo ação judicial em curso. Em tal situação, ou o TAC é
submetido à homologação judicial, o que afastaria sua natureza de título extrajudicial, assumindo a natureza de um
simples acordo entre as partes; ou a validade do TAC ficaria condicionada à desistência da ação, sob pena de correr-
se o risco de o Judiciário decidir de maneira diversa ao que foi avençado.

Procedimental: o TAC deve ser firmado no seio de um procedimento, que pode ser um inquérito civil ou
mesmo um procedimento administrativo.

Objeto e limites: o objeto do termo de ajustamento de conduta é a composição para adequação de


determinada situação à lei, sem renúncia ao direito sobre o qual se transaciona. Não havendo possibilidade de
renúncia, as cláusulas de um TAC deverão tratar apenas da interpretação da norma em relação ao caso concreto;
especificando-se as obrigações assumidas em relação ao modo, tempo e lugar de cumprimento. Não havendo
possibilidade de reparação do dano, o TAC deverá versar sobre a compensação e a indenização respectivas.

Abrangências: o objeto do TAC pode ser parcial, ou seja, apenas uma parte da situação em
discussão/investigação pode ser solucionada no TAC, enquanto o inquérito civil continua em curso para a solução da
questão não abrangida pelo TAC. É possível, igualmente que seja objeto do TAC uma composição provisória. Uma ou
mais etapas podem ser pactuadas antes de se alcançar a solução definitiva. Em todos os casos, o TAC será submetido
à homologação do órgão de controle, sendo o objeto do inquérito civil arquivado total ou parcialmente, dependendo
da abrangência da solução tratada no TAC.

Astreintes: o TAC deverá prever, obrigatoriamente, a incidência de multa diária em caso de descumprimento
de qualquer das obrigações assumidas pelo compromitente.

Destinações de indenizações e multas: as indenizações compensatórias, em caso de direitos difusos ou


coletivos cuja reparação não for possível, e o valor arrecadado pela execução de multas deverão ser destinados a
fundos como o previsto no art. 13 da Lei da Ação Civil Pública. É possível também que tais recursos sejam destinados
a projetos de reparação ou prevenção de danos a bens jurídicos da mesa natureza.

Imagine que você seja Defensor Público da Comarca de Natal (amo essa cidade), Rio Grande do Norte, e
verifica que o Estado do RN não está fornecendo um insumo X, essencial para que crianças com problemas de
desnutrição possam viver. Verificando a conduta ilegal, face ao direito fundamental à saúde, você não deverá, de
imediato, propor uma ação judicial. Como assim? Olha, um dos primeiros erros dos concurseiros, em provas de
Defensoria, é esquecer da função extrajudicial que a Defensoria desempenha.

50Prática Penal, civil e tutela coletiva: Ministério Público. Cleber Masson, Ernani de Menezes Velhena Jr. 4, Ed. Rio de Janeiro. Forense. São
Paulo. Método, 2019.

@CURSOEBLOGRDP #DPERJ 50
DPE-RJ TUTELA COLETIVA

Nesse caso, você primeiro deveria tentar resolver de maneira extrajudicial, isso porque nossa lei orgânica É
EXPRESSA em indicar ao Defensor ou à Defensora que a solução extrajudicial dos conflitos deve ser prioridade (art.
4º, II, LC 80/94). Caso a administração estadual, através da Secretaria, acordasse em fornecer os insumos, você, como
Defensor Púbico, estabeleceria ao Estado a assinatura de um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), que tem
natureza jurídica de título executivo extrajudicial (art. 784, IV, CPC). Não cumpriu? Execução pelo procedimento
previsto no NCPC.

Mas pode celebrar em face do Estado?

Sim, amig@s. Veja o § 4º do art. 3º da LC 80:

§ 4º O instrumento de transação, mediação ou conciliação referendado pelo Defensor Público valerá como título
executivo extrajudicial, inclusive quando celebrado com a pessoa jurídica de direito público. (Incluído pela Lei
Complementar nº 132, de 2009).

Lembre-se que a solução extrajudicial dos litígios é função institucional prevista no art. 4º, inciso II da LC
80/1994:

II – promover, prioritariamente, a solução extrajudicial dos litígios, visando à composição entre as pessoas em conflito
de interesses, por meio de mediação, conciliação, arbitragem e demais técnicas de composição e administração de
conflitos; (Redação dada pela Lei Complementar nº 132, de 2009).

Há inúmeras possibilidades de o Defensor Público resolver situações sem que seja preciso judicializar, como
por exemplo audiências públicas, requisições, TAC’s, recomendações, inquérito civil51, etc.

Sobre a recomendação administrativa, saiba que se trata de ato formal, pelo qual a Defensoria Pública dá
ciência de determinada situação e segure ao destinatário a adequação de uma conduta ao ordenamento jurídico. O
artigo 4º, incisos II e X, da LC 80/94 aponta que são funções institucionais da Defensoria Pública a promoção prioritária
da solução extrajudicial de conflitos, bem como a realização da mais ampla defesa dos direitos fundamentais dos
necessitados.

Segundo o Defensor Público Hugo Fernandes Matias:52

(...) Dois pontos importantes em relação às recomendações merecem destaque: cabe ao


membro da Defensoria Pública, ao expedi-las, sempre que possível, uma postura proativa
de indicar medidas pertinentes para a superação ou prevenção da situação de violação de
direitos, inclusive por conta da incidência do princípio da boa-fé objetiva. Além disso, as
recomendações não possuem carácter coercitivo, por falta de previsão legal, embora
sirvam para fins de constituição do destinatário em mora. Entretanto, em caso de
descumprimento das orientações expedidas pela Defensoria Pública, após razoável prazo
ofertado, não haverá óbice à utilização de instrumentos judiciais para a tutela individual ou
coletiva dos direitos envolvidos. Tampouco para a adoção de outras medidas
administrativas pertinentes, como, por exemplo, a convocação de audiências públicas

51 A rigor, doutrina tradicional afirma que o inquérito civil é privativo do MinistérioPúblico (art. 8º, §1º, LACP). Ocorre que doutrina defensorial
tem suscitado a possibilidade de o membro da Defensoria também ser apto a instaurar o referido instrumento; isso porque a LC 80/94 prevê
em seu art. 4º, V, ser função institucional da Defensoria utilizar todas as medidas capazes de propiciar a adequada e efetiva defesa de seus
assistidos, dentre os quais se incluiria o inquérito civil. Na prática, algumas defensorias, como a de São Paulo, instauram procedimentos prévios
à ACP semelhantes ao inquérito civil, mas sem o referido nomen iuris.
52 Disponível em: https://www.conjur.com.br/2019-mai-14/tribuna-defensoria-uso-recomendacoes-atuacao-institucional-defensoria. Acesso

em: 10/02/2021.

@CURSOEBLOGRDP #DPERJ 51
DPE-RJ TUTELA COLETIVA

(artigo 4º, XXII, da LC 80/94), a depender da estratégia jurídica planejada. Temos observado
o crescimento da expedição de recomendações pela Defensoria Pública, por si só, ou em
conjunto com outros órgãos como o próprio Ministério Público, valendo destacar situações
recentes ligadas a direitos de adolescentes transexuais, maus-tratos e tortura, direito à
saúde, direitos da mulher e também em relação ao crime de Mariana, dentre outros. Essa
atuação extrajudicial e compromissada da Defensoria Pública indica que a instituição
amadurece e caminha para sua consolidação como essencial ao regime democrático
brasileiro, com singular participação na luta pela efetivação da Constituição de 1988 para a
parcela mais pobre e vulnerável da população brasileira.”

#APROFUNDARDP: VOCÊ SABE O QUE É A JUSTIÇA MULTIPORTAS? A justiça multiportas53 é justamente essa
possibilidade de se encarar o processo judicial como última porta. Antes dela, há outras formas e mecanismos de
pacificação de um conflito, tais como a mediação, arbitragem, conciliação, além de outros métodos de solução de
conflitos. Por isso devemos recordar que acesso à justiça não é o mesmo que acesso ao judiciário, pois o primeiro é
bem mais amplo.

Por fim, e mudando de assunto, gostaria de registrar uma alteração recente na Lei Nacional de Assistência
Social (Lei nº 8.742/93).

Vejam bem.

Todos vocês sabem que a saúde, direito fundamental de segunda dimensão, é um direito de todos e um
dever do Estado (art. 196 da CF/88). Implica dizer que todas as pessoas, independente de sua situação econômica,
têm direito de receber do Estado assistência integral à saúde.

No entanto, acontece que quando chegamos a um hospital público ou posto de saúde, são exigidos
documentos pessoais para que se viabilize um cadastro prévio.

Por outro lado, nós que estudamos para Defensoria Pública sabemos mais que quaisquer outros estudantes,
que existem pessoas que não têm documentos pessoais, sobretudo aquelas em situação de rua.

Isso quer dizer que uma pessoa sem documentos pessoais passará por grandes transtornos ao chegar a um
hospital, já que será praticamente impedida de ser atendida por não portar documentais pessoais.

Isso acontecia antes da edição da Lei nº 13.714/2018, pois esta acrescentou um dispositivo na Lei Orgânica
de Assistência Social a fim de que o atendimento das pessoas em situação de vulnerabilidade ou risco social e pessoal
que procuram pelos serviços de saúde agora deve ser feito mesmo que elas não tenham documentos ou inscrição
no SUS.

Vejamos:

Art. 19 (...) Parágrafo único. A atenção integral à saúde, inclusive a dispensação de medicamentos e produtos de
interesse para a saúde, às famílias e indivíduos em situações de vulnerabilidade ou risco social e pessoal, nos termos
desta Lei, dar-se-á independentemente da apresentação de documentos que comprovem domicílio ou inscrição no
cadastro no Sistema Único de Saúde (SUS), em consonância com a diretriz de articulação das ações de assistência
social e de saúde a que se refere o inciso XII deste artigo. (Incluído pela Lei nº 13.714/2018)

53 Interessante notar que for a publicada a Lei nº 13.867/19, que permite o uso de mediação ou arbitragem para definir os valore s de
indenização nas desapropriações por utilidade pública, reforçando a adoção cada vez mais da justiça multiportas.

@CURSOEBLOGRDP #DPERJ 52
DPE-RJ TUTELA COLETIVA

Nessa mesma pegada de inovação legislativa, não podemos esquecer de uma grande novidade relativa ao
direito à educação, que ao lado do direito à saúde, também se trata de direito social de segunda dimensão,
considerando que se exige uma prestação positiva do estado a fim de concretizá-lo.

Estou me referindo à Lei nº 13.632/2018, que altera dois dispositivos da Lei nº 9.394/96 (Lei de Diretrizes e
Bases da Educação - LDB), também expressa em nosso edital da DPE-RJ.

É importante para nossas provas, porque o objetivo da Lei foi afirmar que todos possuem, independente de
idade e de qual fase da vida esteja, direito à educação e à aprendizagem.

Assim, a Lei nº 13.632/2018 acrescentou o inciso XIII ao art. 3º da LDB:

Art. 3º O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:


(...)
XIII - garantia do direito à educação e à aprendizagem ao longo da vida. (Incluído pela Lei nº 13.632/2018).

Por fim, é importante registrar que Lei nº 13.632/2018 também tratou sobre a educação de jovens e adultos
e a educação especial.

O art. 37, a partir de agora, tem a seguinte redação:

Art. 37. A educação de jovens e adultos será destinada àqueles que não tiveram acesso ou continuidade de estudos
nos ensinos fundamental e médio na idade própria e constituirá instrumento para a educação e a aprendizagem ao
longo da vida. (Redação dada pela Lei nº 13.632/2018)

@CURSOEBLOGRDP #DPERJ 53
DPE-RJ TUTELA COLETIVA

TUTELA COLETIVA – DPE-RJ


PARTE IV
A INFLUÊNCIA DAS CLASS ACTIONS NO BRASIL

Segundo a Doutrina54 “as class actions são ações coletivas existentes em países de sistema jurídico common
law. Elas foram criadas para suprir a ineficácia das clássicas ações individuais na tutela de direitos supraindividuais.
O modelo norte-americano de class actions conta com mais de 70 anos de existência, e veio influenciar não apenas
as class actions de outros países do sistema common law (Austrália e Canadá), mas também inspirou as concepções
das ações coletivas em países de civil law, como é o caso do Brasil. Não é por menos que nossa ação coletiva é por
vezes chamada de class action brasileira. Daí a importância de conhecermos a class action norte-americana, para
bem compreendermos nosso modelo de ação coletiva.

Nos Estados Unidos, os Estados também têm competência para legislar sobre suas próprias regras
processuais, o que deu azo ao surgimento de grande variedade de modelos de class actions, vigentes nas justiças
estaduais. Nas cortes federais, porém, as class actions são regidas pela Federal Rule of Civil Procedure 23, ou,
simplesmente, Rule 23. Essa norma foi promulgada em meio às demais federal rules of procedure em 1938, e sofreu
alterações posteriores, sendo a mais significativa a de 1966. Para que uma demanda possa ser processada com o
status de class action, precisa preencher alguns requisitos previstos na Rule 23, e outros fixados pela jurisprudência.
Uma vez constatada a presença de todos eles, a ação recebe do juízo a certificação (certification), que consiste na
sua admissão como class action. Caso tais pressupostos de admissibilidade não sejam preenchidos, a demanda não
é admitida como ação coletiva, mas, eventualmente, pode ter andamento na forma de ação individual. Entre os vários
requisitos para a certificação podemos citar a comunhão de questões de fato ou de direito, e a representatividade
adequada.

Os autores trazem, ainda, quatro informações importantes que precisamos saber sobre a class actions: 1)
Pressuposto da comunhão de questões de fato ou de direito; 2) Legitimidade ativa; 3) Coisa julgada; 4) Pressuposto
da representatividade adequada (adequacy of representation). Vejamos:

Nas palavras de Adriano Andrade, Cleber Masson, Landolfo Andrade55:

1) Pressuposto da comunhão de questões de fato ou de direito: um dos requisitos para a


admissibilidade das class actions é a existência, entre os interessados que se pretende
tutelar, de uma comunhão de questões de fato ou de direito. Existe, nessa condição,
evidente semelhança com a ação civil pública do direito pátrio. A propósito, observe-se que
o art. 81, parágrafo único, I, do CDC exige, para que se admita uma ação coletiva para a
defesa de interesses difusos, que seus titulares estejam ligados por “circunstâncias de fato”.
Já para a defesa judicial dos direitos coletivos no inciso II se impõe que seus titulares
estejam ligados “entre si” ou com a parte contrária por uma “relação jurídica base”.
Finalmente, no que se refere aos direitos individuais homogêneos, o inciso III impõe que
sejam aqueles decorrentes de “origem comum”. Pode-se considerar, portanto, como um
ponto de influência sobre nossa ação civil pública.

2) Legitimidade ativa. Aqui temos diferenças e semelhanças. Nas class actions, qualquer dos

54 Andrade, Adriano Interesses difusos e coletivos esquematizado/Adriano Andrade, Cleber Masson, Landolfo Andrade – 5. ed. rev., atual. e
ampl. – Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2015. (Esquematizado), p. 610.
55 Andrade, Adriano Interesses difusos e coletivos esquematizado/Adriano Andrade, Cleber Masson, Landolfo Andrade – 5. ed. rev., atual. e

ampl. – Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2015. (Esquematizado).

@CURSOEBLOGRDP #DPERJ 54
DPE-RJ TUTELA COLETIVA

integrantes do grupo, classe ou categoria interessada tem legitimidade para a propositura


da ação. Ele atua como “representante” (representative) dos demais interessados, sem que
seja necessário que eles expressamente lhe outorguem poderes para tanto. Nas ações civis
públicas brasileiras, diferentemente, a legitimidade ativa é atribuída pela lei apenas a
determinados órgãos ou entidades (p. ex., art. 5.º, incisos I a V, da LACP).

3) Coisa julgada. Nas class actions norte-americanas, os efeitos da coisa julgada alcançam
todos os componentes do grupo, classe ou categoria, ainda que não tenham participado
do contraditório, nem tenham expressamente desejado submeter-se a tal sentença.
Ademais, essa eficácia se dá pro et contra, quer dizer: seja a sentença de procedência ou
de improcedência. Esse modelo influenciou parcialmente o sistema brasileiro.

4) Pressuposto da representatividade adequada (adequacy of representation). Trata-se de


mais um requisito para a certificação de uma class action. Uma vez que no sistema das
ações coletivas norte-americanas a coisa julgada atinge todos os integrantes de um grupo,
mesmo os que não participaram do processo, é necessário garantir que tais pessoas não
sejam prejudicadas pela inépcia daquele que compareceu em juízo arvorando-se na
condição de representante dos interesses do grupo. Por tal razão, em qualquer fase do
processo, o juiz deve verificar se o autor tem ou teve capacidade para defender adequada
e eficazmente o interesse do grupo, ou seja, se o grupo será por ele adequadamente
representado em juízo. Logo, representatividade adequada ou representação adequada é
a qualidade que habilita alguém a comparecer em juízo como representante dos interesses
de um grupo, classe ou categoria de pessoas, e a exercer com zelo e competência a defesa
judicial desses interesses. Para constatar se o autor preenche tal requisito, o magistrado
deve atentar para diversos fatores. Primeiro, deve constatar se o interesse não é apenas do
grupo, mas do próprio representante, pois, assim, ele, decerto, zelará por bem defendê-lo.
O magistrado deve apurar, ainda, a idoneidade moral, intelectual e econômica do
representante, sua boa-fé, sua experiência, e a capacidade técnica de seu advogado. No
Brasil, o problema da representatividade adequada assume dimensão diferente. Aqui, a
condição de representante de interesses metaindividuais e a capacidade para bem
representá-los em juízo é controlada pela lei (ope legis), que a presume de modo absoluto
(iuris et de iure): desde que o autor seja um dos órgãos ou entidades previstos nos
respectivos diplomas legais, e preencha os requisitos nela especificados (caso das
associações), não cabe ao julgador contestar sua representatividade adequada, ao
contrário do sistema norte-americano, em que cabe ao magistrado, em cada caso concreto,
verificar se há representatividade adequada (o controle é ope judicis). Ademais, em nosso
país, de fato, não há tanta necessidade de se constatar a representatividade adequada, pois
a coisa julgada normalmente só alcança os demais interessados para beneficiá-los (coisa
julgada in utilibus).56

OPT-OUT E OPT-IN

No estudo do direito coletivo, vocês já ouviram falar em Opt-out e opt-in? Masson, Adriano e Landolfo (2015,
p. 81/82) lembram que:

“Há vários tipos de class actions nos Estados Unidos. Um deles é especificamente voltado
à defesa de interesses individuais homogêneos: as class actions for damages.

56Há de se frisar que existe doutrina que entende de forma diferente; ou seja, mesmo que os legitimados estejam previstos em lei, o juiz teria
a possibilidade de aferir, no caso concreto, se existe essa representatividade adequada. Ex.: se a Defensoria, ao ajuizar uma ação coletiva em
tutela de direitos individuais homogêneos, iria, de fato, tutelar pessoas hipossuficientes.

@CURSOEBLOGRDP #DPERJ 55
DPE-RJ TUTELA COLETIVA

Particularmente nessa espécie de class action existe o direito de opt-out (direito de optar
por ficar de fora do raio de ação do julgado), por força do qual é possível a qualquer
interessado requerer, tempestivamente, não ser atingido pelos efeitos da futura sentença”.

Nesse sentido, para que fique mais claro, explicam os autores:

“Funciona da seguinte maneira: caso a ação seja admitida na forma de uma class action,
ou seja, obtenha a certificação (certification), os interessados devem ser notificados sobre
a existência do processo. Essa notificação é denominada fair notice. Uma vez cientificados,
se não se opuserem expressamente, estarão sujeitos aos efeitos da futura sentença e de
sua coisa julgada, tendo adotado, tacitamente, uma postura de opt-in. Poderão, em vez
disso, tempestivamente requerer sua exclusão desses efeitos, exercendo o direito de opt-
out, ou, ainda, integrar a lide como litisconsortes. Outra oportunidade de opt-out deve ser
concedida aos interessados na hipótese de ser celebrado um acordo durante o processo,
mas antes de sua homologação judicial. Nas ações civis públicas para defesa de interesses
individuais homogêneos também existe um mecanismo de controle da submissão dos
interessados aos efeitos dos julgados, mas ele opera “às avessas” da sistemática
estadunidense: se lá a extensão dos efeitos da sentença a terceiros decorre
automaticamente da inércia dos interessados, aqui ela depende de sua conduta ativa. De
fato, no Brasil, se o interessado já houver ajuizado uma ação individual, somente poderá
ser beneficiado pelos efeitos de futura sentença em uma ação civil pública que verse sobre
direitos individuais homogêneos, caso, no prazo de 30 dias depois de ter ciência da
existência dessa ação coletiva, requeira a suspensão de sua ação individual (CDC, art. 104).
Pode-se dizer, nessa hipótese (guardadas as devidas diferenças em relação ao sistema
norte-americano), que se previu um mecanismo assemelhado a um direito de opt-in. Por
sua vez, se o interessado permanecer inerte, estar-se-ia valendo de seu direito de opt-out,
de modo que não será beneficiado pela futura sentença”

EM RESUMO:
Nos EUA -> O Opt In será tácito caso o sujeito não se manifeste no sentido de não querer que a sentença coletiva
o afete;
No Brasil -> O Opt In deverá emanar de uma conduta positiva do sujeito; caso ele se mantenha inerte, ocorrerá o
Opt Out tacitamente.

INTERESSE OU DIREITO SUBJETIVO?

Alguns autores chamam, por exemplo, a matéria Difusos e Coletivos de “Interesses Difusos e Coletivos”. Neste
caso, há alguma diferença entre interesse e direito? A doutrina aponta que sim!

INTERESSE DIREITO SUBJETIVO


Interesse é qualquer pretensão em geral, é o desejo de Direito subjetivo, por sua vez, segundo Reale, é “a
obter determinado valor ou bem da vida, de satisfazer possibilidade de exigir-se, de maneira garantida, aquilo
uma necessidade. O interesse de alguém pode que as normas de direito atribuem a alguém como
encontrar, ou não, respaldo no ordenamento jurídico. próprio”. É, portanto, a posição jurídica que o
(Masson, 2015, p. 42). ordenamento jurídico assegura a uma pessoa, a um
grupo de pessoas ou a um ente, em relação a um
determinado bem e/ou pessoas. Imagine-se que uma
ação busque a tutela de determinado valor cuja
proteção, ao final, seja recusada, por ausência de
amparo no ordenamento. Ela terá visado à defesa de

@CURSOEBLOGRDP #DPERJ 56
DPE-RJ TUTELA COLETIVA

simples interesses. Pense-se, agora, em outra, que


postule a tutela de valores cuja proteção, por fim, seja
deferida, ante a existência de respaldo no
ordenamento. Ela terá visado, portanto, à defesa de
direitos subjetivos. Não queremos dizer, com isso, que o
direito subjetivo depende sempre de um prévio
reconhecimento judicial. A manifestação do Estado-juiz,
muitas vezes, é meramente declaratória de um direito
subjetivo preexistente.” (MASSON, 2015, p. 43).

CAIU NA DP-DF-2019-CESPE: “Entende o STJ que, no âmbito do direito privado, é de cinco anos o prazo prescricional
para ajuizamento de execução individual em pedido de cumprimento de sentença proferida em ação civil pública,
contado esse prazo a partir do trânsito em julgado da sentença exequenda”.57.

Continuando o ponto, outro detalhe tem sido cobrado com bastante frequência: os efeitos proferidos em
cada decisão relativa aos direitos em questão, isto é, a chamada COISA JULGADA NAS AÇÕES COLETIVAS.

COISA JULGADA NAS AÇÕES COLETIVAS

Ponto expresso em nosso edital da DPE-RJ.

Saiba, inicialmente, que a coisa julgada nas ações coletivas encontra disciplina nos artigos 103 e 104 do
Código de Defesa do Consumidor. Isso mesmo, no CDC. Mas calma, não se assuste, vamos entender isso.

Anote em seu caderno que pode a coisa julgada ser erga omnes ou ultra partes, conforme seja a ação
fundada em direito ou interesse difuso, coletivo ou individual homogêneo.

Art. 103. Nas ações coletivas de que trata este código, a sentença fará coisa julgada:

I - erga omnes, exceto se o pedido for julgado improcedente por insuficiência de provas, hipótese em que qualquer
legitimado poderá intentar outra ação, com idêntico fundamento valendo-se de nova prova, na hipótese do inciso I
do parágrafo único do art. 81; (DIFUSOS)

II – ultra partes, mas limitadamente ao grupo, categoria ou classe, salvo improcedência por insuficiência de provas,
nos termos do inciso anterior, quando se tratar da hipótese prevista no inciso II do parágrafo único do art. 81;
(COLETIVOS EM SENTIDO ESTRITO)

III – erga omnes apenas no caso de procedência do pedido, para beneficiar todas as vítimas e seus sucessores, na
hipótese do inciso III do parágrafo único do art. 81. (INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS)

Um ponto que você precisa saber é que com relação ao limite subjetivo da coisa julgada, diferentemente do
que ocorre no processo individual, as sentenças em processos coletivos, EM REGRA, alcançam um grupo de pessoas
(direito difuso; coisa julgada erga omnes) ou todos os integrantes do grupo, classe ou categoria (direitos coletivos
stricto sensu; coisa julgada ultra partes) ou todas as pessoas unidas pela origem comum (direito individual
homogêneo; coisa julgada erga omnes).

Caso haja sentença de extinção SEM resolução do mérito, isso produz apenas coisa julgada formal. Em outras
palavras, as partes podem propor uma nova ação coletiva sem qualquer problema.

57 CERTO.

@CURSOEBLOGRDP #DPERJ 57
DPE-RJ TUTELA COLETIVA

Tratando-se de interesse ou direito difuso (inciso I do parágrafo único do artigo 81), sendo promovida ação
coletiva por um dos legitimados do art. 82, a coisa julgada terá eficácia de coisa julgada material erga omnes, salvo
se o pedido deduzido for julgado improcedente por insuficiência de provas (coisa julgada secundum eventum
probationis), hipótese em que qualquer legitimado poderá ingressar com nova ação, com idêntico fundamento,
valendo-se de nova prova (inciso I do art. 103).

Vamos ver com calma!

SENTENÇA COLETIVA ENVOLVENDO DIREITOS DIFUSOS

Aqui é simples. A sentença produz efeito erga omnes, exceto se o pedido for julgado improcedente por
insuficiência de provas, hipótese em que qualquer legitimado poderá intentar outra ação, com idêntico fundamento
valendo-se de nova prova.

Então imagine que o MP proponha uma ACP questionando a existência de um dano ambiental. A sentença
foi de improcedência, por não ter havido provas suficientes do dano causado. Nesse caso qualquer dos legitimados
coletivos poderão propor uma nova ação com base em uma nova prova (o próprio MP, a Defensoria, o Município, o
Estado, etc.). A doutrina chama isso de coisa julgada secundum eventum probationis, em outras palavras, “segundo
o resultado da prova”.

No entanto, atenção para um detalhe: reparem que a possibilidade de nova ação coletiva em caso de
improcedência é apenas se for POR FALTA DE PROVAS. Se na ação que tutela direito difuso houver ANÁLISE DE
MÉRITO e a consequente improcedência do pedido, então NÃO SERÁ possível uma nova ação coletiva com base nos
mesmos fatos.

Decorem isso!

SENTENÇA COLETIVA ENVOLVENDO DIREITOS COLETIVOS STRICTO SENSU

No caso do interesse ou direito tutelado ser da espécie coletivo stricto sensu (inciso II do parágrafo único do
artigo 81), teremos a formação de coisa julgada material ultra partes para o grupo, categoria ou classe, salvo se o
pedido for julgado improcedente por insuficiência de provas. É a mesma ideia da sentença que julga direitos difusos.
Aqui também opera a chamada coisa julgada secundum eventum probationis.

Aqui, vale o mesmo cuidado em relação à ação de direito difuso julgada improcedente com análise de mérito.

SENTENÇA COLETIVA ENVOLVENDO DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS

Atenção, pois aqui há uma particularidade.

Em se tratando de direito individual homogêneo (inciso III do parágrafo único do artigo 81), a coisa julgada
terá eficácia de coisa julgada material erga omnes, no caso de procedência do pedido (art. 103, III, do CDC).

Sendo julgada procedente, opera-se efeito contra todos (erga omnes), pois a coisa julgada só poderá
beneficiar os individuais, lembram? Nunca prejudica-los, exceto no caso do art. 94 do CDC, que prevê a intervenção
dos particulares como litisconsortes, os quais sofrerão os efeitos da coisa julgada coletiva, procedente ou
improcedente (art. 103, §2º, CDC).

@CURSOEBLOGRDP #DPERJ 58
DPE-RJ TUTELA COLETIVA

Assim, sendo procedente a ação coletiva, o indivíduo poderá requerer o transporte in utilibus dessa sentença
coletiva, liquidando-a individualmente nos termos do art. 97 e ss do CDC.

Até aí tudo bem.

Por outro lado, no caso de improcedência, ainda que por insuficiência de provas ou outro motivo, também
haverá a formação da coisa julgada material erga omnes, impedindo nova ação coletiva ainda que com base em
prova nova. Os indivíduos não serão prejudicados pela sentença coletiva, com uma exceção: somente aqueles que
NÃO intervieram na ação coletiva como assistentes litisconsorciais (nos termos do art. 94 do CDC), poderão ajuizar
as respectivas demandas individuais, não sendo atingidos pela coisa julgada coletiva. Aqueles que atuaram em
litisconsórcio na ação coletiva sofrerão os efeitos da coisa julgada formada, não podendo ajuizar ações individuais.

Não se confunde com a possibilidade daquele que pediu a suspensão da sua ação individual, nos termos do
art. 104 do CDC, quando soube do ajuizamento da ação coletiva. Os efeitos da coisa julgada só poderão beneficiar o
indivíduo que pediu a suspensão da sua ação individual, nunca prejudicá-lo. Caso improcedente a ação coletiva, ele
poderá retomar o processamento da sua ação individual que estava suspensa.

Vigora aqui a chamada coisa julgada secundum eventum litis (e não mais a “secundum eventum probationis”).

Assim, é secundum eventum litis porque depende do resultado da demanda: se for procedente ou
improcedente (se por falta de prova ou por análise de mérito) haverá coisa julgada MATERIAL.

Por fim, não é demais lembrarmos que, segundo o STJ, o prazo para execução individual de sentença
proferida contra planos de saúde em ação civil pública é de cinco anos. AgInt no REsp 1.807.990-SP, Rel. Min. Maria
Isabel Gallotti, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 20/04/2020, DJe 24/04/2020. É o que foi noticiado no
Inf. 671 do STJ:

"Na falta de dispositivo legal específico para a ação civil pública, aplica-se, por analogia, o
prazo de prescrição da ação popular, que é o quinquenal (art. 21 da Lei nº 4.717/1965),
adotando-se também tal lapso na respectiva execução, a teor da Súmula 150/STF. A lacuna
da Lei nº 7.347/1985 é melhor suprida com a aplicação de outra legislação também
integrante do microssistema de proteção dos interesses transindividuais, como os
coletivos e difusos, a afastar os prazos do Código Civil, mesmo na tutela de direitos
individuais homogêneos (pretensão de reembolso dos usuários de plano de saúde que
foram obrigados a custear lentes intraoculares para a realização de cirurgias de catarata)"
(REsp 1473846/SP, Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em
21/2/2017, DJe 24/2/2017). Assim, a despeito da existência de recurso especial julgado sob
o rito dos recursos repetitivos sobre a prescrição trienal para ações de cobrança contra
plano de saúde, nota-se que esse versou sobre as ações ordinárias individuais, de modo
que o entendimento referente à aplicação do prazo quinquenal às tutelas coletivas é
específico e, consequentemente, prevalece no caso.”

SUSPENSÃO DA AÇÃO INDIVIDUAL

Precisamos entender uma coisa: é possível que um consumidor prejudicado, por exemplo, proponha uma
ação individual contra a empresa fornecedora.

Tudo bem.

@CURSOEBLOGRDP #DPERJ 59
DPE-RJ TUTELA COLETIVA

No entanto, suponha que a Defensoria tenha ajuizado uma ACP (portanto uma ação coletiva) visando o
mesmo objetivo. Para que o indivíduo prejudicado possa ser beneficiado pela ação coletiva proposta pela Defensoria,
ele terá que requerer a SUSPENSÃO de seu processo individual. É o que prevê o art. 104 do CDC.

Assim, ele (autor da ação individual) poderá prosseguir com a ação individual, sob sua conta e risco de, em
caso de eventual improcedência do pedido da ação individual, não poder ser beneficiado pela sentença coletiva. Ou,
por precaução, poderá o autor da ação individual requerer a suspensão de seu processo individual para que depois
possa beneficiar-se da sentença coletiva (se procedente, claro).

Imagine, por outro lado, que ele requeira a suspensão do processo individual, tudo direitinho. Por azar do
destino, a sentença coletiva foi julgada improcedente. E agora, ele se prejudica?

A resposta é não. O princípio da máxima efetividade da tutela coletiva ensina que o particular só poderá ser
beneficiado pela ação coletiva, jamais prejudicado.

Sendo a sentença coletiva julgada improcedente, poderá ser requerido o prosseguimento do feito individual.
Outra coisa, o pedido de suspensão da ação individual poderá ser feito pela parte no prazo de 30 (trinta) dias a contar
da ciência, nos autos, do ajuizamento da ação coletiva, o que se permite concluir que todos aqueles que tenham
ajuizado ações individuais devem ser informados da propositura da demanda coletiva.

Vejam o art. 104 do CDC:

Art. 104. As ações coletivas, previstas nos incisos I e II e do parágrafo único do art. 81, não induzem litispendência
para as ações individuais, mas os efeitos da coisa julgada erga omnes ou ultra partes a que aludem os incisos II e III
do artigo anterior não beneficiarão os autores das ações individuais, se não for requerida sua suspensão no prazo de
trinta dias, a contar da ciência nos autos do ajuizamento da ação coletiva.

MEGA ATENÇÃO: Amig@s, fiquem atentos pois, pela letra de lei, o autor da ação individual é quem deverá
manifestar a intenção de se beneficiar da sentença coletiva favorável (right to opt in).

No entanto, o STJ possui precedente no sentido de que, ajuizada a ação coletiva, o juiz da ação individual DEVE
SUSPENDER o processo, independentemente de manifestação do autor. É um entendimento questionável haja
vista contrariar a literalidade da legislação, mas ele existe e vocês precisam saber (o STJ argumenta que há apenas
uma “interpretação” do art. 104, CDC). Vejam:

RECURSO REPETITIVO. PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. ART. 543-
C DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. AÇÃO COLETIVA. SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL. piso salarial profissional
nacional para os profissionais do magistério público da educação básica, nos termos da Lei nº 11.738/08.
SUSTAÇÃO DE ANDAMENTO DE AÇÕES INDIVIDUAIS. POSSIBILIDADE. 1. Segundo precedentes deste Superior
Tribunal, "ajuizada ação coletiva atinente a macrolide geradora de processos multitudinários, suspendem-se as
ações individuais, no aguardo do julgamento da ação coletiva". (v.g.: REsp 1110549/RS, Rel. Ministro SIDNEI
BENETI, Segunda Seção, julgado em 28/10/2009, DJe 14/12/2009).

2. Este STJ também compreende que o posicionamento exarado no referido REsp 1.110.549/RS, "não nega
vigência aos aos arts. 103 e 104 do Código de Defesa do Consumidor; com os quais se harmoniza, atualizando-
lhes a interpretação extraída da potencialidade desses dispositivos legais ante a diretriz legal resultante do
disposto no art. 543-C do Código de Processo Civil, com a redação dada pela Lei dos Recursos Repetitivos (Lei nº

@CURSOEBLOGRDP #DPERJ 60
DPE-RJ TUTELA COLETIVA

11.672, de 8.5.2008)". 3. Recurso Especial conhecido, mas não provido. (REsp 1353801/RS, Rel. Ministro MAURO
CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 14/08/2013, DJe 23/08/2013). 58

RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. AÇÃO INDIVIDUAL DE INDENIZAÇÃO POR SUPOSTO


DANO AMBIENTAL NO MUNICÍPIO DE ADRIANÓPOLIS. AÇÕES CIVIS PÚBLICAS. TUTELA DOS DIREITOS
INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS. EVENTO FACTUAL GERADOR COMUM. PRETENSÕES INDENIZATÓRIAS
MASSIFICADAS. EFEITOS DA COISA JULGADA. INEXISTÊNCIA DE PREJUÍZO À REPARAÇÃO DOS DANOS INDIVIDUAIS
E AO AJUIZAMENTO DE AÇÕES INDIVIDUAIS. CONVENIÊNCIA DA SUSPENSÃO DOS FEITOS INDIVIDUAIS.
EXISTÊNCIA.

1. A tese a ser firmada, para efeito do art. 1.036 do CPC/2015 (art. 543-C do CPC/1973), é a seguinte: Até o
trânsito em julgado das Ações Civis Públicas nº 5004891-93.2011.4004.7000 e nº 2001.70.00.019188-2, em
tramitação na Vara Federal Ambiental, Agrária e Residual de Curitiba, atinentes à macrolide geradora de
processos multitudinários em razão de suposta exposição à contaminação ambiental decorrente da exploração
de jazida de chumbo no Município de Adrianópolis-PR, deverão ficar suspensas as ações individuais. REsp nº
1525327/PR (2015/0037555-8).59

TRANSPORTE IN UTILIBUS DA COISA JULGADA

Já falamos do transporte in utilibus em tópico anterior, mas agora vamos aprofundar.

Imagine que em uma sentença em ação coletiva que trate sobre direitos essencialmente coletivos (difusos
ou coletivos em sentido estrito), o juiz tenha reconhecido a existência de um dano.

Certo.

Esse dano foi causado por uma empresa, e afetou centenas de pessoas individuais. O magistrado fixou uma
indenização de 100 mil reais, que a gente sabe que, a princípio, não se reverte individualmente para as vítimas,
porque geralmente esse valor vai para algum fundo.

Nesse caso, poderia a parte prejudicada (vítima) utilizar essa sentença para liquidação e posterior execução
de seu dano individual?

Sim, é o que chamamos de transporte in utilibus da coisa julgada.

E onde isso está positivado?

Fácil, está positivado no art.103, § 3º do CDC:

§ 3º - Os efeitos da coisa julgada de que cuida o art. 16, combinado com o art. 13 da Lei nº 7.347, de 24 de julho de
1985, não prejudicarão as ações de indenização por danos pessoalmente sofridos, propostas individualmente ou na
forma prevista neste código, mas, se procedente o pedido, beneficiarão as vítimas e seus sucessores, que poderão
proceder à liquidação e à execução, nos termos dos arts. 96 a 99.

58 CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Suspensão dos processos individuais enquanto se aguarda o julgamento da ação coletiva. Buscador Dizer
o Direito, Manaus. Disponível em:
https://www.buscadordizerodireito.com.br/jurisprudencia/detalhes/c65d7bd70fe3e5e3a2f3de681edc193d Acesso em: 26/10/2020.
59 Disponível em:
https://ww2.stj.jus.br/processo/pesquisa/?aplicacao=processos.ea&tipoPesquisa=tipoPesquisaGenerica&termo=REsp%201525327. Acesso
em: 26/10/2020.

@CURSOEBLOGRDP #DPERJ 61
DPE-RJ TUTELA COLETIVA

CAIU NA DP-DF-2019-CESPE: “Tanto a vítima do dano quanto seus sucessores detêm legitimidade para promover
liquidação e execução de sentença condenatória coletiva proferida em ação coletiva para defesa de interesses
individuais homogêneos”.60.

Lembrem-se que o transporte in utilibus decorre do princípio da máxima efetividade da tutela coletiva,
segundo o qual o indivíduo somente poderá ser beneficiado pela coisa julgada coletiva, jamais prejudicado. Assim,
procedente a ação coletiva, poderá a vítima ou seus sucessores proceder a liquidação individual, conforme já foi dito
neste material.

Pessoal, um ponto que não podemos deixar de falar é sobre o FLUID RECOVERY.

Trata-se de liquidação/execução da pretensão coletiva residual (ou “reparação fluida”), encontra previsão
no art. 100 do CDC: Decorrido o prazo de um ano sem habilitação de interessados em numero compatível com a
gravidade do dano, poderão os legitimados do artigo 82 promover a liquidação e execução da indenização devida.
Parágrafo único. O produto da indenização devida reverterá para o Fundo criado pela Lei nº 7.347 de 24 de julho de
1985.

A pretensão coletiva que versar sobre direitos individuais homogêneos poderá ser liquidada e executada por
um dos legitimados coletivos caso, em 01 ano, não haja habilitação de interessados em numero compatível com a
gravidade do dano, devendo a indenização ser revertida ao Fundo. Veja que, em regra, a demanda que versar sobre
direitos individuais homogêneos, resultará em indenização a ser destinada às vítimas, já que os titulares são
determinados e as vítimas conhecidas. No entanto, no caso do fluid recovery, a indenização será destinada ao Fundo,
já que as vítimas individuais não se habilitaram em quantidade compatível com a gravidade do dano, em 1 ano,
cabendo a liquidação e a execução a algum legitimado coletivo, nos termos do art. 100 do CDC.

Retomando...

APROFUNDA RDP: VOCÊ LEMBRA O QUE É A AÇÃO COLETIVA PASSIVA? O tema já foi objeto de arguição de prova
oral em provas de Defensoria e está expresso em seu edital. Segundo Didier Jr, “há ação coletiva passiva quando um
agrupamento humano for colocado como sujeito passivo de uma relação jurídica afirmada na petição inicial.
Formula-se demanda contra uma dada coletividade”. Então, é justamente uma coletividade de pessoas,
representadas processualmente, por exemplo, pela Defensoria Pública, só que no polo passivo. A doutrina ainda
resiste em considerar existente a ação coletiva passiva.61

Agora entraremos especificamente na Lei da Ação Civil Pública (Lei nº 7.347/1985). Inicialmente, qual o
objeto da ACP? O art. 1º da Lei explica quais situações podem ser tutelas por esta Lei:

Art. 1º Regem-se pelas disposições desta Lei, sem prejuízo da ação popular, as ações de responsabilidade por danos
morais e patrimoniais causados
l - ao meio-ambiente;
II - ao consumidor;
III – a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico;
IV - a qualquer outro interesse difuso ou coletivo.
V - por infração da ordem econômica;
VI- à ordem urbanística.

60CORRETO. Assim dispõe o art. 97 do Código de Defesa do Consumidor: “Art. 97. A liquidação e a execução de sentença poderão ser
promovidas pela vítima e seus sucessores, assim como pelos legitimados de que trata o art. 82.”
61 Para saber mais sobre o tema: https://jus.com.br/artigos/46534/acao-coletiva-passiva-e-a-tutela-processual-coletiva-em-lides-

consumeristas. Acesso em: 26/10/2020.

@CURSOEBLOGRDP #DPERJ 62
DPE-RJ TUTELA COLETIVA

VII – à honra e à dignidade de grupos raciais, étnicos ou religiosos.


VIII – ao patrimônio público e social.

CAIU NA DP-DF-2019-CESPE: “O Ministério Público detém legitimidade ativa ad causam para propor ação civil pública
que vise anular termo de acordo de regime especial (TARE) firmado entre ente federativo e determinados
contribuintes”.62

Gente, uma pergunta importante: é possível ação civil pública para veicular pretensões que envolvam
tributos, contribuições previdenciárias e o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS?

De acordo com a Lei da ACP, a resposta é não; vejam:

Art. 1º. Parágrafo único. Não será cabível ação civil pública para veicular pretensões que envolvam tributos,
contribuições previdenciárias, o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço - FGTS ou outros fundos de natureza
institucional cujos beneficiários podem ser individualmente determinados. (Incluído pela Medida provisória nº 2.180-
35, de 2001).

A redação a esse parágrafo foi dada pela Medida provisória nº 2.180-35, de 2001. No entanto, há quem
sustente que esse parágrafo único seria inconstitucional. Para Hugo Nigro63,

“o parágrafo único do art. 1º da LACP, introduzido pela Medida Provisória nº 2.180-35/01,


fere, pois, a regra constitucional de que a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário
lesão ou ameaça a direito - não só o direito individual como o coletivo. Considerando que o
sistema processual clássico não viabiliza a defesa judicial em caso de lesões difusas,
coletivas ou individual homogêneas, a Constituição de 1988 instituiu o acesso coletivo à
jurisdição, garantia que tem a mesma índole que a referente ao acesso individual.
Suprimida que fosse a possibilidade de acesso coletivo, inúmeras lesões transindividuais
ficariam efetivamente sem proteção judicial, pois o acesso individual em casos de lesões
fragmentárias é simplesmente inviável”.

Acontece, no entanto, que o STF, no Informativo 955 noticiado em 11 de outubro de 2019, decidiu que o
Ministério Público tem legitimidade para a propositura de ação civil pública em defesa de DIREITOS SOCIAIS
relacionados ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). RE 643978/SE, rel. Min. Alexandre de Moraes,
julgamento em 9.10.2019. (RE-643978). Essa decisão é muito importante!

Dando continuidade, precisamos saber o local onde deverá ser ajuizada a ação civil pública.

Segundo o art. 2º da Lei da Ação Civil Pública, serão propostas no foro do local onde ocorrer o dano, cujo
juízo terá competência funcional (portanto absoluta) para processar e julgar a causa. Vejam:

Art. 2º As ações previstas nesta Lei serão propostas no foro do local onde ocorrer o dano, cujo juízo terá competência
funcional para processar e julgar a causa.

CAIU NA DP-DF-2019-CESPE: “Conforme previsão legal, é competente para a propositura de ação civil pública o foro

62 CORRETO. RE 576155 - O Ministério Público tem legitimidade para propor ação civil pública com o objetivo de anular Termo de Acordo de
Regime Especial - TARE firmado entre o Poder Público e contribuinte, em face da legitimação ad causam que o texto constitucional lhe confere
para defender o erário.
63 MAZZILLI, Hugo Nigro. A defesa dos interesses difusos em juízo: meio ambiente, consumidor, patrimônio cultural, patrimônio público e

outros interesses difusos e coletivos, 19ª ed. São Paulo: Saraiva, 2006, op. Cit., p. 122.

@CURSOEBLOGRDP #DPERJ 63
DPE-RJ TUTELA COLETIVA

do local do dano, cujo juízo terá competência funcional para processar e julgar a causa”. 64

No entanto, segundo o art. 93, II do CDC, ressalvada a competência da Justiça Federal, é competente para a
causa a justiça local do foro da Capital do Estado ou no do Distrito Federal, para os danos de âmbito nacional ou
regional, aplicando-se as regras do Código de Processo Civil aos casos de competência concorrente. Foi o caso da
tragédia ambiental ocorrida em Brumadinho, Minas Gerais, onde em razão da extensão do dano as ações civis
públicas foram propostas na capital, Belo-Horizonte.

O STJ, no caso de Brumadinho, entendeu que havendo ação popular concorrendo com várias outras ações
populares e ações civis públicas, deve haver a eleição do foro mais adequado à defesa do meio ambiente, afastando,
no caso concreto, o foro do local do domicílio do autor da ação popular.

CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. DIREITO AMBIENTAL. DESASTRE DE


BRUMADINHO. ROMPIMENTO DE BARRAGEM DA EMPRESA VALE DO RIO DOCE. AÇÃO
POPULAR. LEI 4.717/1965. COMPETÊNCIA PARA JULGAR A AÇÃO POPULAR QUANDO JÁ EM
ANDAMENTO AÇÃO CIVIL PÚBLICA COM OBJETO ASSEMELHADO. DISTINGUISHING. TEMA
AMBIENTAL. FORO DO LOCAL DO FATO. APLICAÇÃO SUBSIDIÁRIA DA LEI DE AÇÃO CIVIL
PÚBLICA. HISTÓRICO DA DEMANDA (...) A JURISPRUDÊNCIA DO STJ À LUZ DAS
CIRCUNSTÂNCIAS PECULIARES DO CASO CONCRETO 3. Não se desconhece a jurisprudência
do STJ favorável a que, sendo igualmente competentes o juízo do domicílio do autor
popular e o do local onde houver ocorrido o dano (local do fato), a competência para
examinar o feito é daquele em que menor dificuldade haja para o exercício da Ação Popular.
A propósito: CC 47.950/DF, Rel. Ministra Denise Arruda, Primeira Seção, DJ 7/5/2007, p.
252; CC 107.109/RJ, Rel. Ministro Castro Meira, Primeira Seção, DJe 18/3/2010. 4. Malgrado
isso, as circunstâncias do caso concreto devem ser analisadas de forma que se ajuste o
Direito à realidade. Para tanto, mister recordar os percalços que envolveram a definição da
competência jurisdicional no desastre de Mariana/MG, o que levou o STJ a eleger um único
juízo para todas as ações, de maneira a evitar decisões conflitantes e possibilitar que a
Justiça se realize de maneira mais objetiva, célere e harmônica. 5. A hipótese dos autos
apresenta inegáveis peculiaridades que a distinguem dos casos anteriormente enfrentados
pelo STJ, o que impõe adoção de solução mais consentânea com a imprescindibilidade de
se evitar tumulto processual em demanda de tamanha magnitude social, econômica e
ambiental. Assim, necessário superar, excepcionalmente, a regra geral contida nos
precedentes invocados, nos moldes do que dispõe o art. 489, § 1º, VI, do CPC/2015. De
fato, a tragédia ocorrida em Brumadinho/ MG invoca solução prática diversa, a fim de
entregar, da melhor forma possível, a prestação jurisdicional à população atingida. Impõe-
se, pois, ao STJ adotar saída pragmática que viabilize resposta do Poder Judiciário aos que
sofrem os efeitos da inominável tragédia. DISTINGUISHING: AÇÃO POPULAR ISOLADA E
AÇÃO POPULAR EM COMPETIÇÃO COM AÇÃO CIVIL PÚBLICA COM OBJETO ASSEMELHADO
6. A solução encontrada é de distinguishing à luz de peculiaridades do caso concreto e não
de revogação universal do entendimento do STJ sobre a competência para a ação popular,
precedentes que devem ser mantidos, já que lastreados em sólidos e atuais fundamentos
legais e justificáveis argumentos políticos, éticos e processuais. 9. Assim, a regra geral do
STJ não será aplicada aqui, porque deve ser usada quando a Ação Popular for isolada.
Contudo, na atual hipótese, tem-se que a Ação Popular estará competindo e concorrendo
com várias outras Ações Populares e Ações Civis Públicas, bem como com centenas, talvez
milhares, de ações individuais, razão pela qual, em se tratando de competência
concorrente, deve ser eleito o foro do local do fato. (...) COMPETÊNCIA DO LOCAL DO FATO

64 CORRETO.

@CURSOEBLOGRDP #DPERJ 64
DPE-RJ TUTELA COLETIVA

12. Na presente hipótese, é mais razoável determinar que o foro competente para
julgamento desta Ação Popular seja o do local do fato. Logo, como medida para assegurar
a efetividade da prestação jurisdicional e a defesa do meio ambiente, entende-se que a
competência para processamento e julgamento do presente feito é da 17ª Vara Federal da
Seção Judiciária do Estado de Minas Gerais. CONCLUSÃO 13. Conflito de Competência
conhecido para declarar competente o Juízo suscitante. STJ, CC 164.362/MG, Rel. Min.
HERMAN BENJAMIN, j. 12/06/2019.

Vimos este julgado do STJ quando estudamos o tópico da competência adequada.

Sobre a legitimidade ativa, é importante lembrarmos quem são as pessoas (órgãos/entes) que podem propor
a referida ação civil pública. Veremos, para isso, o art. 5º da LACP.

Art. 5º Têm legitimidade para propor a ação principal e a ação cautelar:


I - o Ministério Público;
II - a Defensoria Pública; (Redação dada pela Lei nº 11.448, de 2007).
III - a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios;
IV - a autarquia, empresa pública, fundação ou sociedade de economia mista;
V - a associação que, concomitantemente:
a) esteja constituída há pelo menos 1 (um) ano nos termos da lei civil;
b) inclua, entre suas finalidades institucionais, a proteção ao patrimônio público e social, ao meio ambiente, ao
consumidor, à ordem econômica, à livre concorrência, aos direitos de grupos raciais, étnicos ou religiosos ou ao
patrimônio artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico.

Perceba que para a associação a lei exige que esteja constituída há pelo menos 1 ano, e inclua, entre suas
finalidades institucionais, a proteção ao patrimônio público e social, ao meio ambiente, ao consumidor, à ordem
econômica, à livre concorrência, aos direitos de grupos raciais, étnicos ou religiosos ou ao patrimônio artístico,
estético, histórico, turístico e paisagístico.

CAIU NA DP-DF-2019-CESPE: “A apuração da legitimidade ativa das associações e dos sindicatos como substitutos
processuais em ações coletivas passa pelo exame da pertinência temática entre os fins sociais da entidade e o mérito
da ação proposta”.65

#APROFUNDARDP: É possível ao magistrado dispensar o requisito da pré-constituição de pelo menos 1 ano da


associação previsto em Lei? A resposta é sim, nos termos do § 4º do art. 5º da Lei da Ação Civil Pública.

“§ 4º O requisito da pré-constituição poderá ser dispensado pelo juiz, quando haja manifesto interesse social
evidenciado pela dimensão ou característica do dano, ou pela relevância do bem jurídico a ser protegido”.

CAIU NA DP-DF-2019-CESPE: “Segundo o STJ, o magistrado que concluir pela falta de legitimidade ativa coletiva do
autor proponente da demanda deve extinguir o feito sem exame do mérito e encaminhar as peças do processo ao
Ministério Público e à Defensoria Pública, para que tomem ciência e, caso queiram, promovam a demanda coletiva”. 66

65 CORRETO. Assim entende a jurisprudência do STJ, valendo destacar, exemplificativamente: “PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO COLETIVA DE
COBRANÇA. EXPURGOS INFLACIONÁRIOS. CADERNETAS DE POUPANÇA. ASSOCIAÇÃO DE AGRICULTORES. ILEGITIMIDADE ATIVA. PERTINÊNCIA
TEMÁTICA NÃO VERIFICADA. APRECIAÇÃO E INTERPRETAÇÃO DO ESTATUTO. ENUNCIADOS N. 5 E 7 DA SÚMULA DO STJ. 1. A apuração da
legitimidade ativa das associações e dos sindicatos como substitutos processuais, em ações coletivas, passa pelo exame da pertinência
temática entre os fins sociais da entidade e o mérito da ação proposta. Precedentes. (...) 3. Agravo regimental desprovido.” (AgRg no REsp
997.577/DF, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, QUARTA TURMA, julgado em 18/09/2014, DJe 26/09/2014).
66 ERRADO. Em diversos julgados, entendeu o STJ que a ilegitimidade ativa ou a irregularidade da representação processual não implica a

extinção do processo coletivo, competindo ao magistrado abrir oportunidade para o ingresso de outro colegitimado no polo ativo da demanda.
Sobre o tema: REsp 1388792/SE, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, Julgado em 06/05/2014, DJE 18/06/2014; REsp

@CURSOEBLOGRDP #DPERJ 65
DPE-RJ TUTELA COLETIVA

CAIU NA DP-DF-2019-CESPE: “Conforme entendimento do STF, a legitimidade para propositura de ação civil pública
que tutele direitos difusos restringe-se ao Ministério Público”.67

Agora atenção a um detalhe importante: O MP pode abrir inquérito civil ou requisitar, de qualquer organismo
público ou particular, certidões, informações, exames ou perícias. É o que estabelece o § 1º do art. 8º da Lei da Ação
Civil Pública:

§ 1º O Ministério Público poderá instaurar, sob sua presidência, inquérito civil, ou requisitar, de qualquer organismo
público ou particular, certidões, informações, exames ou perícias, no prazo que assinalar, o qual não poderá ser
inferior a 10 (dez) dias úteis.

Tudo bem até aqui!

Acontece que não há igual previsão para a Defensoria Pública. No entanto, em razão da teoria dos poderes
implícitos, deve-se estender à Defensoria Pública essa possibilidade.

Isso porque o art. 4º da LC 80/94, em seus incisos I, VII e X trata da possibilidade de a Defensoria tutelar da
maneira mais ampla possível direitos dos hipossuficientes. Vejam:

São funções institucionais da Defensoria Pública, dentre outras:


1. Prestar orientação jurídica e exercer a defesa dos necessitados, em todos os graus;
2. Promover ação civil pública e todas as espécies de ações capazes de propiciar a adequada tutela dos
direitos difusos, coletivos ou individuais homogêneos quando o resultado da demanda puder beneficiar grupo
de pessoas hipossuficientes;
3. Promover a mais ampla defesa dos direitos fundamentais dos necessitados, abrangendo seus direitos
individuais, coletivos, sociais, econômicos, culturais e ambientais, sendo admissíveis todas as espécies de ações
capazes de propiciar sua adequada e efetiva tutela;

Nessa esteira, se a própria legislação dispõe que ao membro da DP cabe maximizar a tutela de direitos
daqueles que são hipossuficientes, então não há razão para excluir a possibilidade de se instaurar inquérito civil. Ao
contrário, tendo em vista o fortalecimento da instituição, deve-se fazer uma interpretação do ordenamento jurídico
no sentido de comportar esse papel relevante que a Defensoria exerce.

De qualquer forma, na prática, observa-se um movimento em prol dessa atuação da Defensoria:

“Apesar de algumas resistências, várias defensorias estaduais já se valem do inquérito civil


para subsidiar ações coletivas, a exemplo das Defensorias de São Paulo, do Pará e de Goiás.
Na prática, contudo, a maioria dos defensores evitam nomear o procedimento instrutório
de inquérito civil, de forma a precaver-se contra eventual arguição de nulidade do feito.
Essa postura torna o assunto praticamente inexistente nos tribunais, evitando a formação

1372593/SP, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, Julgado em 07/05/2013, DJE 17/05/2013; REsp 1177453/RS, Rel. Ministro
MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, Julgado em 24/08/2010, DJE 30/09/2010; REsp 855181/SC, Rel. Ministro CASTRO MEIRA,
SEGUNDA TURMA, Julgado em 01/09/2009,DJE 18/09/2009.
67 ERRADO. É constitucional a Lei nº 11.448/2007, que alterou a Lei nº 7.347/85, prevendo a Defensoria Pública como um dos legitimados para

propor ação civil pública. Vale ressaltar que, segundo o STF, a Defensoria Pública pode propor ação civil pública na defesa de direitos difusos,
coletivos e individuais homogêneos." STF. Plenário. ADI 3943/DF, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 6 e 7/5/2015 (Info 784).

@CURSOEBLOGRDP #DPERJ 66
DPE-RJ TUTELA COLETIVA

de precedente positivo para a Defesa”.68

Mas cuidado: se aparecer em questões objetivas, marque o que está na Lei (não há a Defensoria). Mas em
questões subjetivas ou orais, desenvolvam o conteúdo crítico que o examinador chorará de emoção.
#ALUNORDPSEDESTACA

CAIU NA DP-DF-2019-CESPE: “Pacificou-se na doutrina o entendimento de que, com a ampliação da legitimidade para
a propositura de ação civil pública, as Defensorias Públicas passaram a ter a atribuição de instaurar inquéritos civis
destinados a coligir provas e quaisquer outros elementos de convicção aptos a fundamentar o ajuizamento de ação
civil pública”.69

Além disso, a lei da ACP diz que se o membro do MP arquivar o inquérito civil, deverá comunicar ao Conselho
Superior, sob pena de falta grave, no prazo de TRÊS DIAS.

§ 1º Os autos do inquérito civil ou das peças de informação arquivadas serão remetidos, sob pena de se incorrer em
falta grave, no prazo de 3 (três) dias, ao Conselho Superior do Ministério Público.

Outro ponto importante é sobre casos de condenação por dano em razão de discriminação étnica:

§ 2º Havendo acordo ou condenação com fundamento em dano causado por ato de discriminação étnica nos termos
do disposto no art. 1º desta Lei, a prestação em dinheiro reverterá diretamente ao fundo de que trata o caput e será
utilizada para ações de promoção da igualdade étnica, conforme definição do Conselho Nacional de Promoção da
Igualdade Racial, na hipótese de extensão nacional, ou dos Conselhos de Promoção de Igualdade Racial estaduais ou
locais, nas hipóteses de danos com extensão regional ou local, respectivamente. (Incluído pela Lei nº 12.288, de
2010) (Vigência)

Também devemos saber que operando o trânsito em julgado de uma ACP, se em até 60 dias a associação não
promover a execução, o MP deverá fazê-lo. Trata-se da materialização do princípio da indisponibilidade da execução
coletiva, lembram? Não há mitigação de tal princípio, sendo absoluto. Vejam:

Art. 15. Decorridos sessenta dias do trânsito em julgado da sentença condenatória, sem que a associação autora lhe
promova a execução, deverá fazê-lo o Ministério Público, facultada igual iniciativa aos demais legitimados.

Por fim, importante registrar que é de competência da justiça estadual julgar ação civil pública em que se
busque cessar degradação ambiental causada por partido político em propaganda eleitoral consistente em pichações
e pinturas em edificações urbanas:

“ADMINISTRATIVO. CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA.


PROPAGANDA ELEITORAL. DEGRADAÇÃO DO MEIO AMBIENTE. AUSÊNCIA DE MATÉRIA
ELEITORAL. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL. 1. A justiça eleitoral, órgão do Poder
Judiciário brasileiro (art. 92, V, da CF), tem seu âmbito de atuação delimitado pelo conteúdo
constante no art. 14 da CF e na legislação específica. 2. ‘As atividades reservadas à justiça
eleitoral aprisionam-se ao processo eleitoral, principiando com a inscrição dos eleitores,
seguindo-se o registro dos candidatos, eleição, apuração e diplomação, ato que esgota a
competência especializada (art. 14, parágrafo 10, CF)’ (CC 10.903/RJ). 3. In casu, sobressai
a incompetência da justiça eleitoral, uma vez que não está em discussão na referida ação

68 JÚNIOR, Raimundo José de Sales. A instauração de inquérito civil pela Defensoria Pública. Disponível em
https://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/9534/A-instauracao-de-inquerito-civil-pela-Defensoria-Publica. Acesso em: 26/10/2020.
69 ERRADO. Como vimos, o entendimento não é pacífico na doutrina, prevalecendo, inclusive, a tese de que somente o Ministério Público

detém atribuição para instaurar inquérito civil.

@CURSOEBLOGRDP #DPERJ 67
DPE-RJ TUTELA COLETIVA

civil pública direitos políticos, inelegibilidade, sufrágio, partidos políticos, nem infração às
normas eleitorais e respectivas regulamentações, isto é, toda matéria concernente ao
próprio processo eleitoral. 4. A pretensão ministerial na ação civil pública, voltada à tutela
ao meio ambiente, direito transindividual de natureza difusa, consiste em obrigação de
fazer e não fazer e, apesar de dirigida a partidos políticos, demanda uma observância de
conduta que extravasa período eleitoral, apesar da maior incidência nesta época, bem
como não constitui aspecto inerente ao processo eleitoral. 5. A ação civil pública ajuizada
imputa conduta tipificada no art. 65 da Lei nº 9.605/98 em face do dano impingido ao meio
ambiente, no caso especificamente, artificial, formado pelas edificações, equipamentos
urbanos públicos e comunitários e todos os assentamentos de reflexos urbanísticos,
conforme escólio do Professor José Afonso da Silva, não visa delimitar condutas regradas
pelo direito eleitoral; visa tão somente a tutela a meio ambiente almejando assegurar a
função social da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes, nos termos do art. 182
da Constituição Federal. (...)”. (CC 113.433/AL, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA,
PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 24/08/2011, DJe 19/12/2011).

CAIU NA DP-DF-2019-CESPE: “Conforme jurisprudência do STJ, é competência da justiça eleitoral julgar ação civil
pública em que se busque cessar degradação ambiental causada por partido político em propaganda eleitoral
consistente em pichações e pinturas em edificações urbanas”.70

Gente, anotem em seus cadernos que no fim de dezembro de 2019, no Recurso Especial nº 1.736.091 – PE,
a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, por unanimidade, que a ação coletiva de consumo
não se sujeita ao prazo prescricional de cinco anos fixado na Lei nº 4.717/1965. Para o colegiado, não há prazo para
o exercício do direito subjetivo público e abstrato de agir relacionado ao ajuizamento desse tipo de ação, o que afasta
a aplicação analógica do artigo 21 da Lei da Ação Popular.

Segundo noticiado pelo próprio STJ71:

“A relatora do caso julgado, ministra Nancy Andrighi, explicou que o exame da questão
demanda a distinção conceitual entre os institutos do direito subjetivo, da pretensão e do
direito de ação, esclarecendo que a prescrição se relaciona ao exercício da pretensão, e
não ao direito público subjetivo e processual de agir – que, por ser abstrato, não se
submete às consequências da inércia e da passagem do tempo nos mesmos moldes da
pretensão. A ministra afirmou que o direito público subjetivo e processual de ação deve
ser considerado, em si, imprescritível, haja vista ser sempre possível requerer a
manifestação do Estado sobre um determinado direito e obter a prestação jurisdicional,
mesmo que ausente o direito material.

Nancy Andrighi explicou que, embora a jurisprudência do STJ aplique por analogia o prazo
de cinco anos do artigo 21 da Lei da Ação Popular para a ação coletiva de consumo, por
não existir na Lei da Ação Civil Pública prazo expresso para o exercício dessa modalidade
de direito subjetivo público, o emprego da analogia é indevido, em razão da disparidade
de objetos e causas de pedir de cada uma dessas ações.
Para Nancy Andrighi, a Lei 4.717/1965 dispõe expressamente em seu artigo 1º que o
objetivo da ação popular é a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao
patrimônio público em sentido amplo, constatado a partir dos vícios enumerados no artigo
2º.

70ERRADO. Como vimos, é de competência da Justiça Estadual.


71Disponível em: http://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/Nao-ha-prazo-determinado-para-ajuizamento-de-acao-
coletiva-de-consumo--decide-Terceira-Turma.aspx. Acesso em: 26/10/2020.

@CURSOEBLOGRDP #DPERJ 68
DPE-RJ TUTELA COLETIVA

Já as ações coletivas de consumo atendem a um espectro de prestações de direito material


muito mais amplo, podendo não só anular ou declarar a nulidade de atos, como também
determinar outras providências capazes de propiciar a adequada tutela dos consumidores,
nos termos do artigo 83 do Código de Defesa do Consumidor.”

Ainda no que diz respeito à prescrição na tutela coletiva, vamos relembrar outras decisões importantes do
STJ e do STF.

O STJ, REsp 1.388.000/PR, em 2015, decidiu que: “Fincada a inaplicabilidade do CDC à hipótese, deve-se
firmar a tese repetitiva no sentido de que o prazo prescricional para a execução individual é contato do trânsito em
julgado da sentença coletiva, sendo desnecessária a providência de que trata o art. 94 da Lei n. 8.078/90”.

O art. 94 do CDC disciplina a hipótese de divulgação da notícia da propositura da ação coletiva, para que
eventuais interessados possam intervir no processo ou acompanhar seu trâmite, nada estabelecendo, porém,
quanto à divulgação do resultado do julgamento. Logo, a invocação do dispositivo não tem pertinência com a
definição do início do prazo prescricional para o ajuizamento da execução singular.

Quanto à autonomia das pretensões e dos prazos prescricionais das execuções de obrigação de fazer e de
pagar decorrentes do mesmo título, o STJ fixou, por intermédio da sua Corte Especial, nos autos do REsp
1.340.444/RS, julgado em 14/03/2019, algumas premissas.

“Quando a sentença coletiva transitada em julgado impõe obrigações de fazer e de pagar,


surgem em tese, no mesmo instante, duas pretensões executórias. Se o titular do direito
reconhecido propõe apenas uma dessas execuções, essa ação não vai interferir no prazo
prescricional da pretensão em relação à qual tenha ficado inerte, por se tratar de
pretensões autônomas. Consoante a jurisprudência do STJ, o ajuizamento de Execução
coletiva de obrigação de fazer, por si só, não repercute no prazo prescricional para
Execução individual de obrigação de pagar derivada do mesmo título.
Com o trânsito em julgado da sentença coletiva – que, além de condenação à obrigação de
fazer, impõe obrigação de pagar quantia certa, é possível identificar a presença de
interesse coletivo à execução da obrigação de fazer, e de interesses individuais de cada um
dos substituídos ao cumprimento de ambas as obrigações. Havendo execuções de
naturezas diversas, entretanto, a regra é de que ambas devem ser autonomamente
promovidas dentro do prazo prescricional.
Excepciona-se apenas a hipótese em que a própria decisão transitada em julgado, ou o
juízo da execução, dentro do prazo prescricional, reconhecer que a execução de um tipo
de obrigação dependa necessariamente da previa execução de outra espécie de
obrigação.”

Decidiu também o STJ: O ajuizamento de ação versando interesse difuso tem o condão de interromper o
prazo prescricional para apresentação de demanda judicial que verse interesse individual homogêneo. (REsp
1.641.167/RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 13/03/2018).

O caso tratava do reconhecimento de dano ambiental que violara diferentes espécies de direitos
transindividuais, sendo que o ajuizamento de ação coletiva versando sobre o dano ambiental difuso causa a
interrupção do prazo prescricional para as ações sobre direito ambiental individual homogêneo.

@CURSOEBLOGRDP #DPERJ 69
DPE-RJ TUTELA COLETIVA

Sobre dano ambiental, o STF reconheceu, em sede de repercussão geral (Tema 999), a imprescritibilidade
da pretensão de reparação civil de dano ambiental. (RE 654.833/AC, Rel. Min. Alexandre de Moraes, j. 20/04/2020).

Ademais, não podemos esquecer da célebre decisão do STF que fixou: são imprescritíveis as ações de
ressarcimento ao erário fundadas na prática de ato doloso tipificado na Lei de Improbidade Administrativa. (RE
852.475, Rel. Min. Alexandre de Moraes, j. 08/08/2018).

LIQUIDAÇÃO E EXECUÇÃO DA SENTENÇA COLETIVA

Para finalizar, pessoal, vamos falar da liquidação e da execução da sentença coletiva, em breve síntese, para
que vocês entendam.

Liquidação e execução de direitos difusos e coletivos

A sentença coletiva que trata de direitos difusos e coletivos pode dar ensejo à duas execuções: uma coletiva,
e outra individual.

a) Liquidação/execução COLETIVA: A execução da pretensão coletiva tem por legitimados aqueles previstos no art.
15 da LACP. Assim, primeiro deverá executar o autor (qualquer legitimado, a exemplo de uma associação, defensoria,
pessoa jurídica de direito público etc.). Se não o fizer em 60 dias, em razão do princípio da indisponibilidade da
execução da pretensão coletiva, deve fazê-lo o MP.

Havendo condenação em dinheiro, a indenização pelo dano deve ser revertida ao fundo de reparação de bens
lesados (art. 13, LACP).

Juízo competente: é o juiz da ação, que proferiu a sentença condenatória coletiva.

b) Liquidação/execução INDIVIDUAL: em razão do transporte in utilibus. Segue o modelo da liquidação de sentença


genérica envolvendo direitos individuais homogêneos.
Nos termos do art. 103, §3º do CDC, é possível fazer o chamado transporte “in utilibus” da coisa julgada. Assim, o
prejudicado individual pode apresentar a sentença proferida no processo coletivo perante o juízo cível, requerendo
apenas a liquidação e o pagamento (não necessita mais de certificação).

São legitimados: vítimas e sucessores.

A indenização será destinada às vítimas e sucessores, após prévia liquidação da sentença, que a doutrina chama de
‘liquidação imprópria’. Vamos entender.

Diferentemente do que ocorre no processo individual, a liquidação no processo coletivo não é só para apurar o
quanto devido (quantum debeatur), mas também o nexo de causalidade e o dano (an debeatur), razão pela qual há
“liquidação imprópria”, que avalia apenas o quantum debeatur.
Obviamente, apesar de ter que provar o débito, o lesado individual não precisa mais comprovar a ação culposa do
condenado na ação coletiva.

Na execução da pretensão individual, há foros competentes concorrentes. Com efeito, poderão julgar essa execução:

- o juízo da liquidação ou condenação (art. 98, §2º, I do CDC)


- o juízo do domicílio do lesado/sucessores (art. 101, I do CDC)

@CURSOEBLOGRDP #DPERJ 70
DPE-RJ TUTELA COLETIVA

Liquidação e execução de direitos individuais homogêneos

A execução, nos direitos individuais homogêneos, segue 3 modelos: individual, coletiva e coletiva residual
(fluid recovery)

a) Liquidação/execução individual: pelas vítimas e sucessores, já liquidadas (art. 97 do CDC).


Aplica-se, aqui, tudo aqui que foi dito no modelo da pretensão individual dos direitos difusos e coletivos.
Os legitimados são as vítimas e sucessores, que procedem à liquidação imprópria da sentença coletiva genérica.

Em síntese, deve-se provar:

a) O dano individual
b) O nexo de causalidade
c) O montante do dano

Não se prova a ocorrência do dano coletivo, o qual já foi assegurado na sentença coletiva, cabendo à vítima apenas
demonstrar que sofreu individualmente aquele dano firmado, o nexo de causalidade e o montante.

b) Liquidação/execução coletiva: pelos legitimados coletivos em representação das vítimas já identificadas e já


liquidadas (art. 98 do CDC).
O art. 98 do CDC prevê a possibilidade de o legitimado coletivo promover a execução das pretensões individuais já
liquidadas. Somente as vítimas que já tiverem indenizações fixadas em sentença de liquidação serão abrangidas.

Art. 98 do CDC. A execução poderá ser coletiva, sendo promovida pelos legitimados
de que trata o art. 82, abrangendo as vítimas cujas indenizações já tiveram sido
fixadas em sentença de liquidação, sem prejuízo do ajuizamento de outras
execuções. (Redação dada pela Lei nº 9.008, de 21.3.1995)

§ 1° A execução coletiva far-se-á com base em certidão das sentenças de liquidação,


da qual deverá constar a ocorrência ou não do trânsito em julgado.

§ 2° É competente para a execução o juízo:

I - da liquidação da sentença ou da ação condenatória, no caso de execução


individual;

II - da ação condenatória, quando coletiva a execução.

A indenização fixada será destinada às vítimas e sucessores que já tiverem liquidado a sentença coletiva.
Como visto, é competente o juízo da condenação.

Havendo concorrência entre concurso de créditos coletivos – destinados ao Fundo – e as indenizações individuais,
destinadas às vítimas, estas terão preferência no pagamento, vide art. 99 do CDC.

@CURSOEBLOGRDP #DPERJ 71
DPE-RJ TUTELA COLETIVA

c) Liquidação/execução da pretensão coletiva residual (fluid recovery): como vimos em ponto anterior, os legitimados
coletivos poderão proceder à liquidação residual fluida da sentença coletiva que veicula direitos individuais
homogêneos, caso não haja habilitação de interessados, no prazo de 1 ano.

A indenização será destinada para o Fundo do art. 13 da LACP.

Art. 100. Decorrido o prazo de um ano sem habilitação de interessados em número


compatível com a gravidade do dano, poderão os legitimados do art. 82 promover a
liquidação e execução da indenização devida.
Parágrafo único. O produto da indenização devida reverterá para o fundo criado pela
Lei n.° 7.347, de 24 de julho de 1985.

Relembrando: em regra, a execução, nos interesses individuais homogêneos, não gera a destinação da eventual
indenização para um fundo especial, mas para as próprias vítimas, que são identificadas. Só haverá destinação da
indenização ao Fundo no caso da fluid recovery.

@CURSOEBLOGRDP #DPERJ 72

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