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2020.

Lei Especial
Abuso de Autoridade
(Lei 13.869/2019)

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.
APRESENTAÇÃO................................................................................................................................ 3
PARTE GERAL .................................................................................................................................... 4
1. ORIGEM DA NOVA LEI DE ABUSO DE AUTORIDADE ............................................................ 4
2. BEM JURÍDICO TUTELADO ....................................................................................................... 4
3. ELEMENTO SUBJETIVO ESPECIAL .......................................................................................... 5
PREJUDICAR OUTREM ....................................................................................................... 5
BENEFICIAR A SI MESMO OU A TERCEIRO .................................................................... 6
MERO CAPRICHO OU SATISFAÇÃO PESSOAL ............................................................... 6
ESPECIAL FIM DE AGIR DO ART. 29 DA LEI DE ABUSO DE AUTORIDADE ................. 6
INDICAÇÃO DO ELEMENTO SUBJETIVO.......................................................................... 7
CRIMES DE INTENÇÃO ....................................................................................................... 7
ESPECIAL FIM DE AGIR x DOLO EVENTUAL ................................................................... 7
4. VEDAÇÃO DO CRIME DE HERMENÊUTICA............................................................................. 8
5. SUJEITOS DOS CRIMES DE ABUSO DE AUTORIDADE ....................................................... 10
SUJEITO ATIVO ................................................................................................................. 10
5.1.1. Concurso de agentes públicos com particulares (extraneus) ..................................... 11
SUJEITO PASSIVO ............................................................................................................ 11
6. COMPETÊNCIA CRIMINAL ....................................................................................................... 11
7. AÇÃO PENAL ............................................................................................................................. 12
8. EFEITOS DA CONDENAÇÃO ................................................................................................... 13
9. PENAS RESTRITIVAS DE DIREITO ......................................................................................... 14
10. PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE....................................................................................... 15
11. SANÇÕES DE NATUREZA CIVIL E ADMINISTRATIVA ...................................................... 15
CRIMES DE ABUSO DE AUTORIDADE .......................................................................................... 17
1. DECRETAÇÃO DE MEDIDA DE PRIVAÇÃO DA LIBERDADE EM MANIFESTA
DESCONFORMIDADE COM AS HIPÓTESES LEGAIS .................................................................. 17
PREVISÃO LEGAL ............................................................................................................. 17
SUJEITO ATIVO ................................................................................................................. 17
MEDIDA DE PRIVAÇÃO DA LIBERDADE ......................................................................... 17
MANIFESTA DESCONFORMIDADE COM AS HIPÓTESES LEGAIS.............................. 18
PENA ................................................................................................................................... 18
CONDUTAS EQUIPARADAS ............................................................................................. 20
NÃO REALIZAÇÃO DE AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA ........................................................ 21
2. DECRETAÇÃO DE CONDUÇÃO COERCITIVA DE TESTEMUNHA OU INVESTIGADO
MANIFESTAMENTE INCABÍVEL OU SEM PRÉVIA INTIMAÇÃO .................................................. 22
PREVISÃO LEGAL ............................................................................................................. 22
CONCEITO DE CONDUÇÃO COERCITIVA ...................................................................... 22
SUJEITO ATIVO ................................................................................................................. 22
SUJEITO PASSIVO ............................................................................................................ 23
INCONSTITUCIONALIDADE DA CONDUÇÃO COERCITIVA PARA INTERROGATÓRIO
24
PRÉVIA NOTIFICAÇÃO ..................................................................................................... 24
3. OMISSÃO QUANTO À COMUNICAÇÃO DA PRISÃO EM FLAGRANTE À AUTORIDADE
JUDICIÁRIA NO PRAZO LEGAL E FIGURAS EQUIPARAS ........................................................... 25
4. CONSTRANGIMENTO DE PRESO OU DETENTO .................................................................. 26
5. CONSTRANGIMENTO AS DEPOR, SOB AMEAÇA DE PRISÃO, DE PESSOA QUE DEVA
GUARDAR SEGREDO OU RESGUARDAR SIGILO EM RAZÃO DE FUNÇÃO, MINISTÉRIO OU
PROFISSÃO, E FIGURAS EQUIPARADAS ..................................................................................... 28
6. OMISSÃO DE IDENTIFICAÇÃO OU IDENTIFICAÇÃO FALSA AO PRESO ........................... 29
7. SUBMISSÃO DE PRESO A INTERROGATÓRIO POLICIAL DURANTE O PERÍODO DE
REPOUSO NOTURNO ...................................................................................................................... 30

CS – ABUSO DE AUTORIDADE 1
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8. IMPEDIMENTO OU RETARDAMENTO DO ENVIO DE PLEITO DO PRESO À AUTORIDADE
JUDICIÁRIA COMPETENTE ............................................................................................................. 31
9. RESTRIÇÃO, SEM JUSTA CAUSA, DA ENTREVISTA PESSOAL OU RESERVADA COM
SEU ADVOGADO .............................................................................................................................. 31
10. MANUTENÇÃO DE PRESOS DE AMBOS OS SEXOS NA MESMA CELA OU ESPAÇO DE
CONFINAMENTO .............................................................................................................................. 32
11. VIOLAÇÃO DE DOMICÍLIO EM UM CONTEXTO DE ABUSO DE AUTORIDADE .............. 33
12. FRAUDE PROCESSUAL EM ESPECIAL CASO DE ABUSO DE AUTORIDADE ............... 35
13. CONSTRANGIMENTO DE FUNCIONÁRIO OU EMPREGADO DE INSTITUIÇÃO
HOSPITALAR PÚBLICA OU PRIVADA A ADMITIR PARA TRATAMENTO PESSOA MORTA ..... 36
14. OBTENÇÃO DE PROVA POR MEIO MANIFESTAMENTE ILÍCITO .................................... 36
15. REQUISIÇÃO OU INSTAURAÇÃO DE PROCEDIMENTO INVESTIGATÓRIO SEM
QUAISQUER INDÍCIOS .................................................................................................................... 37
16. DIVULGAÇÃO DE GRAVAÇÃO SEM RELAÇÃO COM A PROVA QUE SE PRETENDA
PRODUZIR, EXPONDO A INTIMIDADE OU A VIDA PRIVADA DO INVESTIGADO OU ACUSADO
38
17. FALSA INFORMAÇÃO SOBRE PROCEDIMENTO JUDICIAL, POLICIAL, FISCAL OU
ADMINISTRATIVO ............................................................................................................................ 38
18. DEFLAGRAÇÃO DE PERSECUÇÃO PENAL, CIVIL OU ADMINISTRATIVA SEM JUSTA
CAUSA FUNDAMENTADA OU CONTRA QUEM SABE INOCENTE .............................................. 39
19. PROCRASTINAÇÃO INJUSTIFICADA DE INVESTIGAÇÃO EM PREJUÍZO DO
INVESTIGADO................................................................................................................................... 39
20. NEGATIVA DE ACESSO AOS AUTOS DE PROCEDIMENTO INVESTIGATÓRIO E DE
EXTRAÇÃO DE CÓPIAS DE DOCUMENTOS ................................................................................. 40
21. EXIGÊNCIA DE INFORMAÇÃO OU DO CUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÃO SEM
EXPRESSO AMPARO LEGAL .......................................................................................................... 41
22. DECRETAÇÃO DA INDISPONIBILIDADE DE ATIVOS FINANCEIROS EM QUANTIA QUE
EXTRAPOLA EXACERBADAMENTE O VALOR ESTIMADO PARA A SATISFAÇÃO DA DÍVIDA E
SUBSEQUENTE NEGATIVA DE CORREÇÃO DO EXCESSO ....................................................... 41
23. DEMORA DEMASIADA E INJUSTIFICADA NO EXAME DE PROCESSO DE QUE TENHA
REQUERIDO VISTA EM ÓRGÃO COLEGIADO .............................................................................. 42
24. ANTECIPAÇÃO DE ATRIBUIÇÃO DE CULPA POR MEIO DE COMUNICAÇÃO,
INCLUSIVE REDE SOCIAL, ANTES DE CONCLUÍDAS AS APURAÇÕES E FORMALIZADA A
ACUSAÇÃO ....................................................................................................................................... 42
25. APLICAÇÃO DO CÓDIGO PENAL, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL E DA LEI N.
9.099/95 AOS CRIMES DE ABUSO DE AUTORIDADE .................................................................. 42
26. DEFESA OU RESPOSTA PRELIMINAR ............................................................................... 43
27. VIOLAÇÃO DE DIREITOS E PRERROGATIVAS DO ADVOGADO ..................................... 43
28. VIGÊNCIA DA NOVA LEI DE ABUSO DE AUTORIDADE .................................................... 44

CS – ABUSO DE AUTORIDADE 2
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APRESENTAÇÃO

Olá!

Inicialmente, gostaríamos de agradecer a confiança em nosso material. Esperamos que seja


útil na sua preparação, em todas as fases. Quanto mais contato temos com uma mesma fonte de
estudo, mais familiarizados ficamos, o que ajuda na memorização e na compreensão da matéria.

A Lei Especial Abuso de Autoridade possui como base as aulas do Professor Renato
Brasileiro, bem como as explicações do Professor Márcio Cavalcante (Dizer o Direito) e, ainda, o
Livro Nova Lei de Abuso de Autoridade (Renato Brasileiro)

Na parte jurisprudencial, utilizamos os informativos do site Dizer o Direito


(www.dizerodireito.com.br), os livros: Principais Julgados STF e STJ Comentados, Vade Mecum de
Jurisprudência Dizer o Direito, Súmulas do STF e STJ anotadas por assunto (Dizer o Direito).
Destacamos: é importante você se manter atualizado com os informativos, reserve um dia da
semana para ler no site do Dizer o Direito.

Ademais, no Caderno constam os principais artigos de lei, mas, ressaltamos, que é


necessária leitura conjunta do seu Vade Mecum, muitas questões são retiradas da legislação.

Como você pode perceber, reunimos em um único material diversas fontes (aulas + doutrina
+ informativos + súmulas + lei seca + questões) tudo para otimizar o seu tempo e garantir que você
faça uma boa prova.

Por fim, como forma de complementar o seu estudo, não esqueça de fazer questões. É muito
importante!! As bancas costumam repetir certos temas.

Vamos juntos!! Bons estudos!!

Equipe Cadernos Sistematizados.

CS – ABUSO DE AUTORIDADE 3
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PARTE GERAL

1. ORIGEM DA NOVA LEI DE ABUSO DE AUTORIDADE

A Nova Lei de Abuso de Autoridade está relacionada à Operação Lava-Jato, foi sancionada
com 33 vetos, sendo que 18 vetos foram derrubados pelo Congresso Nacional, com o claro intuito
de “frear” a Polícia, o Ministério Público e o Poder Judiciário.

Importante consignar que a antiga Lei de Abuso de Autoridade, vigente desde 1965, já
estava ultrapassada, previa apenas pena de detenção de 10 dias a seis meses. Portanto, perceba
que eram infrações de menor potencial ofensivo, consequentemente, a competência era dos
Juizados Especiais Criminais. Além disso, como a pena prevista era inferior a um ano, a prescrição
ocorria em apenas três anos, nos termos do art. 109, VI do CP. Por isso, a maioria dos crimes de
abuso de autoridade prescrevia, sem que fosse imposta uma sanção penal.

CP Art. 109, VI - em 3 (três) anos, se o máximo da pena é inferior a 1 (um)


ano.

Segundo Renato Brasileiro, por mais que a intenção do Congresso Nacional tenha sido
barrar a Operação Lava-Jato, a lei é bem-vinda e serve para otimizar o trabalho de todo agente
público.

2. BEM JURÍDICO TUTELADO

Ao criminalizar a decretação de uma medida privativa de liberdade em manifesta


desconformidade com a lei ou ao criminalizar a demora demasiada em órgão colegiado para
analisar um processo, o legislador está tutelando (protegendo) mais de um bem jurídico. Por isso,
a doutrina afirma que os crimes previstos na Lei de Abuso de Autoridade são PLURIOFENSIVOS.

Perceba, então, que crime pluriofensivo é aquele que tutela mais de um bem jurídico.

Importante consignar que o primeiro bem jurídico tutelado SERÁ SEMPRE o dever de
lealdade/probidade do agente público. Em outras palavras, ao desempenhar a função pública, o
agente público deverá respeitar os princípios basilares (legalidade, impessoalidade, moralidade,
publicidade e eficiência).

Já o segundo bem jurídico dependerá do crime em questão, poderá ser:

a) Liberdade de locomoção

b) Honra objetiva e honra subjetiva

c) Liberdade individual

d) Assistência de advogado

CS – ABUSO DE AUTORIDADE 4
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3. ELEMENTO SUBJETIVO ESPECIAL

Observe a redação do art. 1º, §1º da Lei 13.869/2019:

Art. 1º, § 1º As condutas descritas nesta Lei constituem crime de abuso de


autoridade quando praticadas pelo agente com a finalidade específica de
prejudicar outrem ou beneficiar a si mesmo ou a terceiro, ou, ainda, por mero
capricho ou satisfação pessoal.

Os crimes de abuso de autoridade são compostos por um elemento subjetivo geral do tipo
(dolo genérico) e um elemento subjetivo especial do tipo (dolo específico ou especial fim de agir). A
ausência do elemento subjetivo especial é causa de atipicidade da conduta.

Imagine a seguinte situação hipotética: Joana, Promotora de Justiça do Estado de Rio


Grande do Sul, deixa de oferecer denúncia dentro do prazo legal. Joana incorreu no crime de
prevaricação (art. 319 do CP), já que deixou de praticar ato de ofício? Apenas com as informações
do nosso exemplo, percebe-se que não houve o crime de prevaricação, tendo em vista que ausente
o elemento subjetivo especial do tipo: “para satisfazer interesse ou sentimento pessoal”.

Art. 319 - Retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou


praticá-lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou
sentimento pessoal:
Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa.

Com isso, fica fácil perceber que, assim como na prevaricação usada em nosso exemplo,
os crimes previstos na Lei de Abuso de Autoridade também são dotados de um especial fim de agir.
ESPECIAL FIM DE AGIR

Prejudicar outrem

Beneficiar a si ou
a terceiro

Mero capricho

Satisfação pessoal

PREJUDICAR OUTREM

A conduta de um agente público, em regra, irá prejudicar alguém. Por isso, a doutrina
entende que o prejuízo deve transcender/ir além do exercício regular da função do agente público.

Por exemplo, o Delegado de Polícia instaura um Inquérito com o intuito de prejudicar o


síndico do seu prédio, pois estavam possuem desavenças.

CS – ABUSO DE AUTORIDADE 5
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BENEFICIAR A SI MESMO OU A TERCEIRO

Considera-se qualquer benefício, pouco importando se é de ordem material, patrimonial ou


moral.

Obs.: a depender do benefício em questão, pode-se estar diante de uma vantagem indevida quando
o agente público exigir algo. Por exemplo, o Desembargador pede vistas do processo e demora
para analisar, está incorrendo no crime previsto no art. 37 da Lei da Abuso de Autoridade e, ao
mesmo tempo, exige uma vantagem indevida para dar prosseguimento ao processo. Neste caso,
haverá concurso de crimes, responderá tanto pelo art. 37 da Lei 13.869/2019 quanto pelo crime de
corrupção passiva (art. 317 do CP).

MERO CAPRICHO OU SATISFAÇÃO PESSOAL

De acordo com a doutrina, “capricho” é vontade repentina desprovida de qualquer


justificativa, uma obstinação arbitrária. Já a satisfação pessoal é o sentimento pessoal capaz de
causar um contentamento ao agente público, a exemplo da amizade, do ódio, da vingança etc.

Salienta-se que a satisfação pessoal não pode ser a causa da conduta do agente público,
mas sim a consequência.

ESPECIAL FIM DE AGIR DO ART. 29 DA LEI DE ABUSO DE AUTORIDADE

Importante consignar que o art. 1º, §1º da Lei de Abuso de Autoridade é considerada uma
regra geral, ou seja, será aplicada para todos os crimes previstos na referida lei (em tese). Assim,
por exemplo, o crime previsto no art. 9º deve ser conjugado com o §1º do art. 1º ambos da Lei
13.869/19.

Contudo, a doutrina aponta situações específicas, a exemplo do crime previsto no art. 29,
em que haverá outra finalidade específica (elemento subjetivo do tipo), mais restrita, diversa da
“prejudicar outrem ou beneficiar a si mesmo ou a terceiro, ou, ainda, por mero capricho ou satisfação
pessoal”.

Art. 29. Prestar informação falsa sobre procedimento judicial, policial, fiscal
ou administrativo com o fim de prejudicar interesse de investigado:
Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa.

Neste caso, considera-se o art. 29 uma norma especial quando comparada ao art. 1º, §1º,
fica restrito ao “prejudicar”. Por isso, por exemplo, quando prestar informação falsa sobre
procedimento judicial, policial, fiscal ou administrativo com o fim de beneficiar o interesse de
investigado não haverá a incidência da Lei de Abuso de Autoridade, mas sim do crime de
prevaricação previsto no art. 319 do Código Penal.

O Enunciado 19 do Conselho Nacional de Procuradores-Gerais dos Ministérios Públicos dos


Estados e da União e do Grupo de Coordenadores de Centro de Apoio Criminal, apesar de não
possuir efeito vinculante, elucida o tema perfeitamente.

Enunciado n. 19 O legislador, na tipificação do crime do art. 29 da Lei de


Abuso de Autoridade, optou por restringir o alcance do tipo, pressupondo por

CS – ABUSO DE AUTORIDADE 6
.
parte do agente a finalidade única de prejudicar interesse do investigado.
Agindo com finalidade de beneficiar, pode responder por outro delito, como
prevaricação (art. 319 do CP), a depender das circunstâncias do caso
concreto.

INDICAÇÃO DO ELEMENTO SUBJETIVO

Ressalta-se que o elemento subjetivo especial deve constar na denúncia, sob pena de
inépcia e, consequentemente, rejeição. Além disso, deve constar nos casos de representação
(notitia criminis), sob pena da configuração do crime de denunciação caluniosa.

Observe o Enunciado 29 do CNPG e GNCCRIM:

Enunciado n. 29 do Conselho Nacional de Procuradores-Gerais dos


Ministérios Públicos dos Estados e da União (CNPG) e do Grupo Nacional de
Coordenadores de Centro de Apoio Criminal (GNCCRIM): Representações
indevidas por abuso de autoridade podem, em tese, caracterizar crime de
denunciação caluniosa (CP, art. 339), dano civil indenizável (CC, art. 953) e,
caso o reclamante seja agente público, infração disciplinar ou político-
administrativa.

CRIMES DE INTENÇÃO

Como todos os crimes da Lei de Abuso de Autoridade demandam um especial fim de agir,
pode-se afirmar que são crimes de intenção (delito de tendência interna transcendente). Ou seja,
são crimes que requerem um agir com ânimo, uma intenção de obter um resultado ulterior distinto
do tipo penal.

Consequentemente, o abuso de autoridade é considerado um delito de resultado cortado.


Ou seja, o crime é praticado visando determinado resultado, mas este fica fora do tipo penal e não
conta com a intervenção do autor, a exemplo do que ocorre na extorsão mediante sequestro (a
vantagem econômica não precisa ocorrer para que o crime esteja caracterizado).

Perceba, portanto, que no abuso de autoridade a conduta deve ser praticada com a
finalidade específica, mas a finalidade em si não precisa ser alcançada.

ESPECIAL FIM DE AGIR x DOLO EVENTUAL

Em decorrência do especial fim de agir, há vozes na doutrina sustentando a


incompatibilidade dos crimes de abuso de autoridade com o dolo eventual (o agente não quer o
resultado, mas assume o risco de produzi-lo).

Salienta-se que NÃO prevalece. Os crimes de abuso de autoridade, em regra, podem ser
punidos a título de dolo direto ou de dolo eventual, não há restrição, salvo nos casos expressamente
previsto em lei, como ocorre com os art. 19, parágrafo único, art. 25, parágrafo único e art. 30 todos
da Lei 13.869/19 em que serão punidos apenas a título de dolo direto.

Art. 19. Parágrafo único. Incorre na mesma pena o magistrado que, ciente
do impedimento ou da demora, deixa de tomar as providências tendentes a

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saná-lo ou, não sendo competente para decidir sobre a prisão, deixa de
enviar o pedido à autoridade judiciária que o seja.
Art. 25. Parágrafo único. Incorre na mesma pena quem faz uso de prova, em
desfavor do investigado ou fiscalizado, com prévio conhecimento de sua
ilicitude.

Art. 30. Dar início ou proceder à persecução penal, civil ou administrativa


sem justa causa fundamentada ou contra quem sabe inocente:

Não há modalidade culposa nos crimes de abuso de autoridade.

4. VEDAÇÃO DO CRIME DE HERMENÊUTICA

O agente público, no desempenho de suas funções, ora fará uma interpretação da norma
ora fará uma avaliação de fatos e de provas. Perceba que, inevitavelmente, em ambos os casos
haverá subjetivismo e poderá haver interpretações distintas, principalmente quando os dispositivos
legais possuem conceitos jurídicos indeterminados, bem como em relação aos princípios.

Diante disso, o art. 1ª, §2º da Lei 13.869/19 é expresso ao afirmar que interpretações legais
e avaliações de fatos e provas de maneiras diversas, por si só, não caracterizam abuso de
autoridade.

Art. 1º, § 2º A divergência na interpretação de lei ou na avaliação de fatos e


provas não configura abuso de autoridade.

Trata-se de normal geral, devendo ser aplicada a todos os crimes da lei de abuso de
autoridade.

Veda-se, claramente, o crime de hermenêutica (nomenclatura cunhada por Rui Barbosa)


que ocorre quando o operador do Direito (em especial o magistrado) é responsabilizado
criminalmente pelo simples fato de sua intepretação ter sido considerada errada pelo Tribunal
revisor.

Observe os exemplos trazidos pelo Professor Márcio Cavalcante1, do site Dizer o Direito, ao
comentar a Lei de Abuso de Autoridade:

Exemplo 1: Membro do Ministério Público denuncia o acusado afirmando que sua conduta
configura o crime “X”. Ocorre que existe uma segunda corrente – diversa daquela sustentada pelo
MP – que defende que essa conduta é atípica. O juiz adota essa segunda posição e rejeita a
denúncia por entender que a situação não se amolda àquele tipo penal. O simples fato de haver
essa divergência de interpretação não gera a conclusão de que o integrante do Parquet tenha agido
com abuso de autoridade.

Exemplo 2: Promotor de Justiça denuncia o acusado por furto por entender que ele é o único
que estava no local quando o bem foi subtraído, tendo ele sido visto pelas testemunhas com um
objeto escondido debaixo da camisa. Durante a instrução ficou demonstrado que o acusado não
estava com a res furtiva e que, portanto, ele era inocente. A simples divergência na avaliação dos

1
Disponível em: https://www.dizerodireito.com.br/2019/11/lei-de-abuso-de-autoridade-parte-1.html

CS – ABUSO DE AUTORIDADE 8
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fatos e das provas não gera a conclusão de que o membro do MP tenha agido com abuso de
autoridade.

Importante consignar que os Tribunais Superiores, na vigência da antiga Lei de Abuso de


Autoridade, já vedavam o crime de hermenêutica.

STJ: “(...) AÇÃO PENAL ORIGINÁRIA. ABUSO DE AUTORIDADE. ART. 4º,


“A”, DA LEI N.º 4.898/65. DESEMBARGADOR. DECISÃO JUDICIAL.
CONFRONTO COM DECISÃO DE RELATOR DO STF. CONDUÇÃO
COMPULSÓRIA PARA LAVRATURA DE TERMO CIRCUNSTANCIADO.
QUESTÕES ATINENTES À ATIVIDADE JUDICANTE. ATRIBUTOS DA
FUNÇÃO JURISDICIONAL. 1. Faz parte da atividade jurisdicional proferir
decisões com o vício in judicando e in procedendo, razão por que, para a
configuração do delito de abuso de autoridade há necessidade da
demonstração de um mínimo de “má-fé” e de “maldade” por parte do julgador,
que proferiu a decisão com a evidente intenção de causar dano à pessoa. 2.
Por essa razão, não se pode acolher denúncia oferecida contra a atuação do
magistrado sem a configuração mínima do dolo exigido pelo tipo do injusto,
que, no caso presente, não restou demonstrado na própria descrição da peça
inicial de acusação para se caracterizar o abuso de autoridade. 3. Ademais,
de todo o contexto, o que se conclui é que houve uma verdadeira guerra de
autoridades no plano jurídico, cada qual com suas armas e poderes, que, ao
final, bem ou mal, conseguiram garantir a proteção das instituições e dos seus
representantes, não possibilitando a esta Corte a inferência da prática de
conduta penalmente relevante. 4. Denúncia rejeitada”. (STJ, Corte Especial,
APn 858/DF, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 24/10/2018, DJe
21/11/2018).

No mesmo sentindo o Enunciado 2 do CNPG e do GNCCRIM:

Enunciado n. 2 do Conselho Nacional de Procuradores-Gerais dos Ministérios


Públicos dos Estados e da União (CNPG) e do Grupo Nacional de
Coordenadores de Centro de Apoio Criminal (GNCCRIM): “A divergência na
interpretação de lei ou na avaliação de fatos e provas, salvo quando
teratológica, não configura abuso de autoridade, fixando excluído o dolo”.

Salienta-se que não é toda interpretação divergente que será causa de atipicidade da
conduta de abuso de autoridade, deverá haver razoabilidade e não poderá haver limitação literal ou
limitação jurisprudencial.

• Limitação Literal – trata-se de hipótese de interpretação que atenda contra a literalidade


da norma. Por exemplo, 2h da manhã o Delegado decide cumprir o mandado de busca
e apreensão. Neste caso, estando presente o especial fim de agir, responderá pelo
abuso de autoridade, tendo em vista que a lei é clara em relação aos horários para o
cumprimento, não há que se falar em interpretação distinta.

• Limitação Jurisprudencial – trata-se de casos em que não há mais espaço para


interpretações, eis que já há decisões, em caráter vinculante, dos Tribunais Superiores.
Por exemplo, o juiz determina a prisão do depositário infiel, contrariando a Súmula
Vinculante 25 do STF. Neste caso, estando presente o especial fim de agir, estará
caracterizado o abuso de autoridade.

CS – ABUSO DE AUTORIDADE 9
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5. SUJEITOS DOS CRIMES DE ABUSO DE AUTORIDADE

SUJEITO ATIVO

Os crimes previstos na Lei de Abuso de Autoridade só podem ser praticados por AGENTES
PÚBLICOS. Como exigem uma qualidade especial do seu autor (ser agente público), são chamados
de crimes PRÓPRIOS.

A definição de agente público encontra-se no art. 2º da Lei 13.869/2019. Observe:

Art. 2º É sujeito ativo do crime de abuso de autoridade qualquer agente


público, servidor ou não, da administração direta, indireta ou fundacional de
qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos
Municípios e de Território, compreendendo, mas não se limitando a:
I - servidores públicos e militares ou pessoas a eles equiparadas;
II - membros do Poder Legislativo;
III - membros do Poder Executivo;
IV - membros do Poder Judiciário;
V - membros do Ministério Público;
VI - membros dos tribunais ou conselhos de contas.
Parágrafo único. Reputa-se agente público, para os efeitos desta Lei, todo
aquele que exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por
eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de
investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função em órgão ou
entidade abrangidos pelo caput deste artigo.

Importante consignar que para configurar o crime de abuso de autoridade é necessário nexo
funcional (crime propter officium), ou seja, o agente público deve estar no exercício de suas funções
ou a pretexto de exercê-la. Portanto, os arts. 1º e 2º da Lei 13.869/2019 devem sempre ser
conjugados.

Imagine, por exemplo, que Fernando, policial militar, realiza um “bico” de segurança no
Supermercado JC. Determinado dia, percebe que Guilherme está furtando alguns produtos do
estabelecimento comercial e resolve prendê-lo, mas extrapola os limites da força. Neste caso, não
haverá o crime de abuso de autoridade, tendo em vista que Fernando não estava no exercício de
suas funções.

Destaca-se que, apesar da redação do parágrafo único do art. 2º da Lei 13.869/2019 ser
semelhante à redação do caput do art. 327 que define funcionário público, a figura do funcionário
público por equiparação (art. 327, §1º do CP) não será considerada como agente público para fins
de incidência da Lei de Abuso de Autoridade, tendo em vista que seria uma analogia in malam
partem.

Art. 327 - Considera-se funcionário público, para os efeitos penais, quem,


embora transitoriamente ou sem remuneração, exerce cargo, emprego ou
função pública.
§ 1º - Equipara-se a funcionário público quem exerce cargo, emprego ou
função em entidade paraestatal, e quem trabalha para empresa prestadora
de serviço contratada ou conveniada para a execução de atividade típica da
Administração Pública.

CS – ABUSO DE AUTORIDADE 10
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5.1.1. Concurso de agentes públicos com particulares (extraneus)

É perfeitamente possível o concurso de pessoas nos crimes de abuso de autoridade, desde


que seja demostrado que o particular tinha consciência de que estava ao lado de um agente público.

De acordo com Márcio Cavalcante, embora sejam crimes próprios, os delitos previstos na
Lei 13.869/2019 admitem a coautoria e a participação. Isso porque a qualidade de “agente público”,
por ser elementar (dados essenciais da figura típica, cuja ausência poderá produzir uma atipicidade
absoluta ou relativa) do tipo, comunica-se aos demais agentes, nos termos do art. 30 do CP, desde
que eles tenham conhecimento dessa condição pessoal do autor:

Art. 30. Não se comunicam as circunstâncias e as condições de caráter


pessoal, salvo quando elementares do crime.

SUJEITO PASSIVO

Os crimes de abuso de autoridade possuem uma dupla subjetividade passiva, ou seja, há


dois sujeitos passivos.

Sujeito passivo secundário ou mediato – é o Estado (Poder Público), já que sua imagem,
sua credibilidade e, até mesmo, o seu patrimônio pode ser lesado pela conduta do agente público.

Sujeito passivo principal ou imediato – pessoa física ou jurídica prejudicada pela conduta.

6. COMPETÊNCIA CRIMINAL

Em regra, o abuso de autoridade será julgado na primeira instância federal ou estadual.

• Se o delito foi praticado por autoridade (agente público) federal no exercício dessa
função: o crime será de competência da Justiça Federal, considerando que, neste caso,
o delito terá sido praticado em detrimento de um serviço público federal, nos termos do
art. 109, IV, da CF/88.

Art. 109 (...) IV - os crimes políticos e as infrações penais praticadas em


detrimento de bens, serviços ou interesse da União ou de suas entidades
autárquicas ou empresas públicas, excluídas as contravenções e ressalvada
a competência da Justiça Militar e da Justiça Eleitoral;

Obviamente, para a competência ser da Justiça Federal, o crime deve estar relacionado
com as funções federais exercidas pelo agente público, conforme se aprende pela
súmula 147 do STJ.

Súmula 147-STJ: Compete à justiça federal processar e julgar os crimes


praticados contra funcionário público federal, quando relacionados com o
exercício da função.

CS – ABUSO DE AUTORIDADE 11
.
• Se o delito foi praticado por autoridade (agente público) estadual ou municipal no
exercício dessa função: o crime será, em regra, de competência da Justiça Estadual, que
é residual.

Contudo, ficando demostrado que o crime foi praticado durante o exercício funcional e em
razão das funções por agente público com foro por prerrogativa, a competência será dos tribunais
(competência originária).

STF Info 900 - O foro por prerrogativa de função aplica-se apenas aos crimes
cometidos durante o exercício do cargo e relacionados às funções
desempenhadas.

Obs.: A Súmula 172 do STJ previa a competência da justiça comum para processar e julgar o militar
que praticasse abuso de autoridade, ainda que praticado em serviço. Contudo, após o advento da
Lei 13.491/2017 este entendimento encontra-se superado, tendo em vista que a conduta praticada
pelo agente, para ser crime militar com base no inciso II do art. 9º, pode estar prevista no Código
Penal Militar ou na legislação penal “comum”. Dessa forma, o abuso de autoridade, mesmo não
estando previsto no CPM pode agora ser considerado crime militar (julgado pela Justiça Militar) com
base no art. 9º, II, do CPM. Portanto, a Justiça Militar poderá julgar o crime de abuso de autoridade.

Importante consignar que segundo o atual entendimento do STF, a Justiça Eleitoral possui
força atrativa “universal”, o que autoriza julgar, inclusive, crimes que são da competência da Justiça
Federal quando conexos com crimes eleitorais. Portanto, em tese, poderá julgar crime de abuso de
autoridade quando praticado em conexão ou continência com um crime eleitoral.

Compete à Justiça Eleitoral julgar os crimes eleitorais e os comuns que lhes


forem conexos. Cabe à Justiça Eleitoral analisar, caso a caso, a existência
de conexão de delitos comuns aos delitos eleitorais e, em não havendo,
remeter os casos à Justiça competente. STF. Plenário. Inq 4435 AgR-
quarto/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 13 e 14/3/2019 (Info 933).

7. AÇÃO PENAL

Conforme previsto no art. 3º da Lei 13.869/2019, a ação penal nos crimes de abuso de
autoridade é pública incondicionada. Além disso, no caso de inércia do Ministério Público será
admitida ação penal subsidiária da pública.

Art. 3º Os crimes previstos nesta Lei são de ação penal pública


incondicionada.
§ 1º Será admitida ação privada se a ação penal pública não for intentada no
prazo legal, cabendo ao Ministério Público aditar a queixa, repudiá-la e
oferecer denúncia substitutiva, intervir em todos os termos do processo,
fornecer elementos de prova, interpor recurso e, a todo tempo, no caso de
negligência do querelante, retomar a ação como parte principal.
§ 2º A ação privada subsidiária será exercida no prazo de 6 (seis) meses,
contado da data em que se esgotar o prazo para oferecimento da denúncia

Salienta o Professor Márcio Cavalcante que “para que o ofendido possa ajuizar a ação
privada subsidiária, é necessário que o membro do MP fique completamente inerte no prazo legal

CS – ABUSO DE AUTORIDADE 12
.
do art. 46 do CPP, ou seja, que não adote nenhuma dessas quatro providências. Assim, se o
Promotor de Justiça/Procurador da República pedir o arquivamento do inquérito policial, o ofendido,
mesmo que discorde disso, não poderá ajuizar a ação privada subsidiária considerando que não
houve inércia do MP. Se o ofendido oferecer ação privada subsidiária neste caso, o juiz deverá
rejeitar a queixa substitutiva por ilegitimidade de parte”.

8. EFEITOS DA CONDENAÇÃO

A Lei de Abuso de Autoridade regula os efeitos da condenação em seu art. 4º. Observe:

Art. 4º São efeitos da condenação:


I - tornar certa a obrigação de indenizar o dano causado pelo crime, devendo
o juiz, a requerimento do ofendido, fixar na sentença o valor mínimo para
reparação dos danos causados pela infração, considerando os prejuízos por
ele sofridos;
II - a inabilitação para o exercício de cargo, mandato ou função pública, pelo
período de 1 (um) a 5 (cinco) anos;
III - a perda do cargo, do mandato ou da função pública.
Parágrafo único. Os efeitos previstos nos incisos II e III do caput deste artigo
são condicionados à ocorrência de reincidência em crime de abuso de
autoridade e não são automáticos, devendo ser declarados motivadamente
na sentença.

EFEITOS DA CONDENAÇÃO

CÓDIGO PENAL LEI DE ABUSO DE AUTORIDADE

Tornar certa a obrigação de indenizar o dano


causado pelo crime (efeito obrigatório de
qualquer sentença penal com trânsito em
julgado), devendo o juiz, a requerimento do
Tornar certa a obrigação de indenizar o dano ofendido, fixar na sentença o valor mínimo para
causado pelo crime (art. 91, I do CP); reparação dos danos (material, moral, estético)
causados pela infração, considerando os
prejuízos por ele sofridos (semelhante ao art.
384, IV do CPP, a única diferença é a
necessidade de requerimento do ofendido).

A perda em favor da União, ressalvado o direito


do lesado ou de terceiro de boa-fé: a) dos A inabilitação para o exercício de cargo,
instrumentos do crime, desde que consistam mandato ou função pública, pelo período de 1
em coisas cujo fabrico, alienação, uso, porte ou (um) a 5 (cinco) anos.
detenção constitua fato ilícito; b) do produto Não é efeito automático, deve ser declaro na
do crime ou de qualquer bem ou valor que sentença. E, ainda, o agente público deverá ser
constitua proveito auferido pelo agente com a reincidente em crime de abuso de autoridade.
prática do fato criminoso.

CS – ABUSO DE AUTORIDADE 13
.
A perda do cargo, do mandato ou da função
A perda de cargo, função pública ou mandato pública.
eletivo: a) quando aplicada pena privativa de
Não é efeito automático, deve ser declaro na
liberdade por tempo igual ou superior a um ano,
sentença
nos crimes praticados com abuso de poder ou
violação de dever para com a Administração Além disso, aqui, não há exigência de
Pública; b) quando for aplicada pena privativa condenação a pena privativa de liberdade e
de liberdade por tempo superior a 4 (quatro) nem tempo de pena. Contudo, o agente público
anos nos demais casos. deverá ser reincidente em crime de abuso de
autoridade.

9. PENAS RESTRITIVAS DE DIREITO

O art. 5º da Lei 13.869/2019 trata das penas restritivas de direito, vejamos:

Art. 5º As penas restritivas de direitos substitutivas das privativas de


liberdade previstas nesta Lei são:
I - prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas;
II - suspensão do exercício do cargo, da função ou do mandato, pelo prazo
de 1 (um) a 6 (seis) meses, com a perda dos vencimentos e das
vantagens;
Parágrafo único. As penas restritivas de direitos podem ser aplicadas
autônoma ou cumulativamente.

Destaca-se que o art. 5º é uma norma especial em relação ao art. 43 do CP.


Consequentemente, as únicas penas restritivas de direito passiveis de aplicação para os crimes de
abuso de autoridade são a prestação de serviço à comunidade ou a entidades públicos e a
suspensão do exercício do cargo, da função ou do mandato, pelo prazo de 1 a 6 meses, com perda
dos vencimentos e das vantagens. Não serão aplicadas as penas restritivas de direito do Código
Penal.

CP - Art. 43. As penas restritivas de direitos são:


I - prestação pecuniária;
II - perda de bens e valores;
III - limitação de fim de semana.
IV - prestação de serviço à comunidade ou a entidades públicas;
V - interdição temporária de direitos;
VI - limitação de fim de semana.

Por outro lado, a Lei de Abuso de autoridade nada dispõe sobre os requisitos de aplicação
das penas restritivas de direito, o que enseja a aplicação do art. 44 do CP, já que as regras gerais
do Código Penal se aplicam à legislação especial quando esta nada dispor e houver
compatibilidade.

Art. 44. As penas restritivas de direitos são autônomas e substituem as


privativas de liberdade, quando:

CS – ABUSO DE AUTORIDADE 14
.
I – aplicada pena privativa de liberdade não superior a quatro anos e o crime
não for cometido com violência ou grave ameaça à pessoa ou, qualquer que
seja a pena aplicada, se o crime for culposo;
II – o réu não for reincidente em crime doloso;
III – a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do
condenado, bem como os motivos e as circunstâncias indicarem que essa
substituição seja suficiente.
§ 2o Na condenação igual ou inferior a um ano, a substituição pode ser feita
por multa ou por uma pena restritiva de direitos; se superior a um ano, a pena
privativa de liberdade pode ser substituída por uma pena restritiva de direitos
e multa ou por duas restritivas de direitos.
§ 3o Se o condenado for reincidente, o juiz poderá aplicar a substituição,
desde que, em face de condenação anterior, a medida seja socialmente
recomendável e a reincidência não se tenha operado em virtude da prática
do mesmo crime.
§ 4o A pena restritiva de direitos converte-se em privativa de liberdade quando
ocorrer o descumprimento injustificado da restrição imposta. No cálculo da
pena privativa de liberdade a executar será deduzido o tempo cumprido da
pena restritiva de direitos, respeitado o saldo mínimo de trinta dias de
detenção ou reclusão.
§ 5o Sobrevindo condenação a pena privativa de liberdade, por outro crime,
o juiz da execução penal decidirá sobre a conversão, podendo deixar de
aplicá-la se for possível ao condenado cumprir a pena substitutiva anterior.

10. PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE

A Lei de Abuso de Autoridade prevê apenas a pena de DETENÇÃO. Não há previsão de


pena de reclusão na Lei 13.869/2019.

11. SANÇÕES DE NATUREZA CIVIL E ADMINISTRATIVA

Em regra, as penas previstas na Lei 13.869/2019 devem ser aplicadas independentemente


das sanções de natureza civil ou administrativa cabíveis.

Art. 6º As penas previstas nesta Lei serão aplicadas independentemente das


sanções de natureza civil ou administrativa cabíveis.
Parágrafo único. As notícias de crimes previstos nesta Lei que descreverem
falta funcional serão informadas à autoridade competente com vistas à
apuração.

Há, contudo, duas ressalvas.

a) Se o juízo criminal decidir sobre a existência ou a autoria do fato, essas questões não
poderão mais ser questionadas nas esferas civil e administrativa.

b) Faz coisa julgada em âmbito cível, assim como no administrativo-disciplinar, a sentença


penal que reconhecer ter sido o ato praticado em estado de necessidade, em legítima defesa, em
estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito.

CS – ABUSO DE AUTORIDADE 15
.
Art. 7º As responsabilidades civil e administrativa são independentes da
criminal, não se podendo mais questionar sobre a existência ou a autoria do
fato quando essas questões tenham sido decididas no juízo criminal.

Art. 8º Faz coisa julgada em âmbito cível, assim como no administrativo-


disciplinar, a sentença penal que reconhecer ter sido o ato praticado em
estado de necessidade, em legítima defesa, em estrito cumprimento de dever
legal ou no exercício regular de direito.

CS – ABUSO DE AUTORIDADE 16
.
CRIMES DE ABUSO DE AUTORIDADE

1. DECRETAÇÃO DE MEDIDA DE PRIVAÇÃO DA LIBERDADE EM MANIFESTA


DESCONFORMIDADE COM AS HIPÓTESES LEGAIS

PREVISÃO LEGAL

Está tipificado no art. 9º da Lei 13.869/2019.

Art. 9º Decretar medida de privação da liberdade em manifesta


desconformidade com as hipóteses legais:
Pena - detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.

SUJEITO ATIVO

Em relação ao sujeito ativo, podemos citar duas correntes doutrinárias.

1ª C – apenas o juiz poderá ser o sujeito passivo, tendo em vista que é o único capaz de
decretar uma medida de privação de liberdade.

2ª C – para o caput do art. 9º qualquer agente público, a lei não restringe. Entende que
decretar foi utilizado em sentindo amplo, devendo ser entendido como determinar, decidir, ordenar.

Ademais, apenas o parágrafo único se refere à autoridade judiciária, não houve restrição no
caput. Nesse sentindo, o Enunciado 5 do CNPG e do GNCCRIM:

Enunciado n. 5 do Conselho Nacional de Procuradores-Gerais dos


Ministérios Públicos dos Estados e da União (CNPG) e do Grupo Nacional de
Coordenadores de Centro de Apoio Criminal (GNCCRIM): “O sujeito ativo do
art. 9º, caput, da Lei de Abuso de Autoridade, diferentemente do parágrafo
único, não alcança somente autoridade judiciária. O verbo núcleo ‘decretar’
tem o sentido de determinar, decidir e ordenar medida de privação da
liberdade em manifesta desconformidade com as hipóteses legais”.

MEDIDA DE PRIVAÇÃO DA LIBERDADE

Trata-se de uma expressão ampla que abrange:

• Prisão cautelar (prisão temporária, prisão preventiva);

• Prisão para cumprimento da execução provisória da pena;

• Prisão para cumprimento da execução definitiva da pena;

• Medida de segurança detentiva (internação) (art. 96, I, do CP);

• Semiliberdade (art. 120 do ECA);

CS – ABUSO DE AUTORIDADE 17
.
• Internação (art. 121 do ECA);

• Internação psiquiátrica (art. 6º da Lei nº 10.216/2001).

MANIFESTA DESCONFORMIDADE COM AS HIPÓTESES LEGAIS

Novamente, estamos diante de um conceito vago e indeterminado.

Imagine, por exemplo, que Amanda é chefe de uma organização criminosa. O juiz, a
requerimento do MP, decreta a prisão preventiva de Amanda. O Tribunal, no julgamento do habeas
corpus impetrado por Amanda, entende que a prisão é desnecessária pois os indícios são fracos.
Neste caso, não está configurado o crime do art. 9º da Lei 13.869/2019, já que se trata de
divergência de interpretação (veda-se o crime de hermenêutica).

Por outro lado, quando o juiz de ofício decreta prisão temporária durante o processo criminal
pela prática de furto simples. Neste caso, presente o especial fim de agir, estará caracterizado o
crime do art. 9º, uma vez que a prisão temporária não pode ser decretada de ofício e, muito mesmo,
durante o processo (com o pacote anticrime, nem a prisão preventiva pode ser decretada de ofício
na fase processual), bem como não cabe temporária em caso de furto simples. Perceba que a
prisão está completamente em desconformidade com as hipóteses legais.

PENA

A pena será de detenção de 1 a 4 anos e multa. Portanto, a competência será do juízo


comum, aplica-se o procedimento comum ordinário, observada a defesa preliminar (art. 514 do
CPP).

Em tese, será cabível acordo de não persecução penal (art. 28-A do CPP), desde que o
crime não tenha sido praticado com violência.

Art. 28-A. Não sendo caso de arquivamento e tendo o investigado confessado


formal e circunstancialmente a prática de infração penal sem violência ou
grave ameaça e com pena mínima inferior a 4 (quatro) anos, o Ministério
Público poderá propor acordo de não persecução penal, desde que
necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime, mediante as
seguintes condições ajustadas cumulativa e alternativamente: (Incluído
pela Lei nº 13.964, de 2019)
I - reparar o dano ou restituir a coisa à vítima, exceto na impossibilidade de
fazê-lo; (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
II - renunciar voluntariamente a bens e direitos indicados pelo Ministério
Público como instrumentos, produto ou proveito do crime; (Incluído pela Lei
nº 13.964, de 2019)
III - prestar serviço à comunidade ou a entidades públicas por período
correspondente à pena mínima cominada ao delito diminuída de um a dois
terços, em local a ser indicado pelo juízo da execução, na forma do art. 46 do
Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código
Penal); (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
IV - pagar prestação pecuniária, a ser estipulada nos termos do art. 45 do
Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), a entidade
pública ou de interesse social, a ser indicada pelo juízo da execução, que

CS – ABUSO DE AUTORIDADE 18
.
tenha, preferencialmente, como função proteger bens jurídicos iguais ou
semelhantes aos aparentemente lesados pelo delito; ou (Incluído pela Lei
nº 13.964, de 2019)
V - cumprir, por prazo determinado, outra condição indicada pelo Ministério
Público, desde que proporcional e compatível com a infração penal
imputada. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
§ 1º Para aferição da pena mínima cominada ao delito a que se refere
o caput deste artigo, serão consideradas as causas de aumento e
diminuição aplicáveis ao caso concreto. (Incluído pela Lei nº 13.964, de
2019)
§ 2º O disposto no caput deste artigo não se aplica nas seguintes
hipóteses: (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
I - se for cabível transação penal de competência dos Juizados Especiais
Criminais, nos termos da lei; (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
II - se o investigado for reincidente ou se houver elementos probatórios que
indiquem conduta criminal habitual, reiterada ou profissional, exceto se
insignificantes as infrações penais pretéritas; (Incluído pela Lei nº 13.964,
de 2019)
III - ter sido o agente beneficiado nos 5 (cinco) anos anteriores ao
cometimento da infração, em acordo de não persecução penal, transação
penal ou suspensão condicional do processo; e (Incluído pela Lei nº 13.964,
de 2019)
IV - nos crimes praticados no âmbito de violência doméstica ou familiar, ou
praticados contra a mulher por razões da condição de sexo feminino, em favor
do agressor. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
§ 3º O acordo de não persecução penal será formalizado por escrito e será
firmado pelo membro do Ministério Público, pelo investigado e por seu
defensor. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
§ 4º Para a homologação do acordo de não persecução penal, será realizada
audiência na qual o juiz deverá verificar a sua voluntariedade, por meio da
oitiva do investigado na presença do seu defensor, e sua
legalidade. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
§ 5º Se o juiz considerar inadequadas, insuficientes ou abusivas as condições
dispostas no acordo de não persecução penal, devolverá os autos ao
Ministério Público para que seja reformulada a proposta de acordo, com
concordância do investigado e seu defensor. (Incluído pela Lei nº 13.964,
de 2019)
§ 6º Homologado judicialmente o acordo de não persecução penal, o juiz
devolverá os autos ao Ministério Público para que inicie sua execução
perante o juízo de execução penal. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
§ 7º O juiz poderá recusar homologação à proposta que não atender aos
requisitos legais ou quando não for realizada a adequação a que se refere o
§ 5º deste artigo. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
§ 8º Recusada a homologação, o juiz devolverá os autos ao Ministério Público
para a análise da necessidade de complementação das investigações ou o
oferecimento da denúncia. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
§ 9º A vítima será intimada da homologação do acordo de não persecução
penal e de seu descumprimento. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
§ 10. Descumpridas quaisquer das condições estipuladas no acordo de não
persecução penal, o Ministério Público deverá comunicar ao juízo, para fins
de sua rescisão e posterior oferecimento de denúncia. (Incluído pela Lei nº
13.964, de 2019)

CS – ABUSO DE AUTORIDADE 19
.
§ 11. O descumprimento do acordo de não persecução penal pelo investigado
também poderá ser utilizado pelo Ministério Público como justificativa para o
eventual não oferecimento de suspensão condicional do processo. (Incluído
pela Lei nº 13.964, de 2019)
§ 12. A celebração e o cumprimento do acordo de não persecução penal não
constarão de certidão de antecedentes criminais, exceto para os fins
previstos no inciso III do § 2º deste artigo. (Incluído pela Lei nº 13.964, de
2019)
§ 13. Cumprido integralmente o acordo de não persecução penal, o juízo
competente decretará a extinção de punibilidade. (Incluído pela Lei nº
13.964, de 2019)
§ 14. No caso de recusa, por parte do Ministério Público, em propor o acordo
de não persecução penal, o investigado poderá requerer a remessa dos autos
a órgão superior, na forma do art. 28 deste Código.

Não sendo cabível o acordo de não persecução penal, poderá haver suspensão condicional
do processo, já que requisito básico é a pena mínima de 1 ano.

Lei 9.099/95 - Art. 89. Nos crimes em que a pena mínima cominada for igual
ou inferior a um ano, abrangidas ou não por esta Lei, o Ministério Público, ao
oferecer a denúncia, poderá propor a suspensão do processo, por dois a
quatro anos, desde que o acusado não esteja sendo processado ou não
tenha sido condenado por outro crime, presentes os demais requisitos que
autorizariam a suspensão condicional da pena (art. 77 do Código Penal).

CONDUTAS EQUIPARADAS

Estão previstas no parágrafo único do art. 9º, observe:

Parágrafo único. Incorre na mesma pena a autoridade judiciária que, dentro


de prazo razoável, deixar de:
I - relaxar a prisão manifestamente ilegal;
II - substituir a prisão preventiva por medida cautelar diversa ou de conceder
liberdade provisória, quando manifestamente cabível;
III - deferir liminar ou ordem de habeas corpus, quando manifestamente
cabível.’

Perceba que se trata de um crime omisso próprio, tendo em vista que o verbo do tipo é
“deixar de”, a autoridade deveria ter praticado determinada conduta, mas se omitiu.

Apenas o juiz poderá ser sujeito ativo, podendo ser o juiz das garantias (decisão proferida
na fase investigatória – embora esteja com eficácia suspensa) ou o juiz da instrução e do
julgamento.

Por exemplo, o réu está preso preventivamente a 90 dias sem que tenha sido reavaliada a
necessidade da restrição de liberdade, o que poderá acarretar uma prisão manifestamente ilegal.

Art. 316. O juiz poderá, de ofício ou a pedido das partes, revogar a prisão
preventiva se, no correr da investigação ou do processo, verificar a falta de
motivo para que ela subsista, bem como novamente decretá-la, se

CS – ABUSO DE AUTORIDADE 20
.
sobrevierem razões que a justifiquem. (Redação dada pela Lei nº 13.964,
de 2019)
Parágrafo único. Decretada a prisão preventiva, deverá o órgão emissor da
decisão revisar a necessidade de sua manutenção a cada 90 (noventa) dias,
mediante decisão fundamentada, de ofício, sob pena de tornar a prisão
ilegal.

Em relação ao PRAZO RAZOÁVEL, na doutrina aponta algumas soluções, uma vez que se
trata de um termo indeterminado.

• Deixar de relaxar a prisão manifestamente ilegal e de substituir a prisão preventiva por


medida cautelar diversa ou conceder liberdade provisória, assemelham-se as previsões
do art. 310, I e III do CPP que são concedidas na audiência de custódia. Portanto, o
prazo é de 24h.

Caso não tenha ocorrido audiência de custódia, a doutrina entende que o prazo será de
até 48h, nos termos do art. 322, parágrafo único do CPP, já que a fiança é uma das
cautelares diversas da prisão, portanto, seria possível aplicar para as demais hipóteses.

CPP
Art. 310. Após receber o auto de prisão em flagrante, no prazo máximo de até
24 (vinte e quatro) horas após a realização da prisão, o juiz deverá promover
audiência de custódia com a presença do acusado, seu advogado constituído
ou membro da Defensoria Pública e o membro do Ministério Público, e, nessa
audiência, o juiz deverá, fundamentadamente: (Redação dada pela Lei nº
13.964, de 2019)
I - relaxar a prisão ilegal; ou
(...)
III - conceder liberdade provisória, com ou sem fiança.

Art. 322. A autoridade policial somente poderá conceder fiança nos casos de
infração cuja pena privativa de liberdade máxima não seja superior a 4
(quatro) anos.
Parágrafo único. Nos demais casos, a fiança será requerida ao juiz, que
decidirá em 48 (quarenta e oito) horas.

• Deixar de deferir liminar ou ordem de habeas corpus, quando manifestamente cabível,


no início (liminar) e no final (ordem) do julgamento do HC

NÃO REALIZAÇÃO DE AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA

O art. 310 do CPP, com a redação dada pelo pacote anticrime, prevê a realização da
audiência de custódia. Por sua vez, o §3º determina que a autoridade que deixar de realizar a
audiência de custódia, sem motivação idônea, responderá administrativa, civil e penalmente.
Vejamos:

Art. 310. Após receber o auto de prisão em flagrante, no prazo máximo de até
24 (vinte e quatro) horas após a realização da prisão, o juiz deverá promover
audiência de custódia com a presença do acusado, seu advogado constituído

CS – ABUSO DE AUTORIDADE 21
.
ou membro da Defensoria Pública e o membro do Ministério Público, e, nessa
audiência, o juiz deverá, fundamentadamente:
(...).
§ 3º A autoridade que deu causa, sem motivação idônea, à não realização da
audiência de custódia no prazo estabelecido no caput deste artigo
responderá administrativa, civil e penalmente pela omissão.
§ 4º Transcorridas 24 (vinte e quatro) horas após o decurso do prazo
estabelecido no caput deste artigo, a não realização de audiência de
custódia sem motivação idônea ensejará também a ilegalidade da prisão, a
ser relaxada pela autoridade competente, sem prejuízo da possibilidade de
imediata decretação de prisão preventiva.

Diante disso, indaga-se: a não realização de audiência de custódia configura crime de abuso
de autoridade?

1ªC – o parágrafo único do art. 9º da Lei 13.869/2019 não previu a não realização de custódia
como crime de abuso de autoridade, por isso não poderá ser tipificado. Além disso, é possível
conceder liberdade provisória, o que não causará prejuízo à pessoa presa.

2ªC – de fato a Lei de Abuso de Autoridade não previu a não realização de audiência de
custódia. Contudo, o §4º prevê que transcorrido o prazo de 24h após o decurso do prazo em que
deveria ter sido realizada a audiência de custódia (24h da prisão), a prisão passa a ser ilegal,
devendo ser relaxada. Perceba, portanto, que estaremos diante da hipótese prevista no inciso I, do
parágrafo único, do art. 9º da Lei 13.869/2019.

Conclui-se, assim, que o crime, em si, não seria a não realização da audiência de custódia,
mas sim o fato da não realização da audiência de custódia acarretar a ilegalidade da prisão, e o juiz
se omitir quanto ao dever de relaxamento.

2. DECRETAÇÃO DE CONDUÇÃO COERCITIVA DE TESTEMUNHA OU INVESTIGADO


MANIFESTAMENTE INCABÍVEL OU SEM PRÉVIA INTIMAÇÃO

PREVISÃO LEGAL

Art. 10. Decretar a condução coercitiva de testemunha ou investigado


manifestamente descabida OU sem prévia intimação de comparecimento ao
juízo:
Pena - detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.

CONCEITO DE CONDUÇÃO COERCITIVA

Trata-se de uma medida cautelar pessoal, diversa da prisão, em que há a condução de


determinada pessoa contra a sua vontade para prática de um ato que depende da sua presença.

SUJEITO ATIVO

CS – ABUSO DE AUTORIDADE 22
.
O STF, em julgado antigo, entendeu que o Delegado de Polícia poderia decretar condução
coercitiva. Consequentemente, poderia ser sujeito ativo do crime do art. 10 da Lei 13.869/2019.

Importante consignar que o Professor Márcio Cavalcante sustenta que se tratando da


primeira parte do art. 10 “quando a condução for manifestamente descabida” poderá ser praticada
por outras autoridades, como é o caso do Delegado de Polícia, do membro do Ministério Público e
do presidente de CPI. Assim, se o Delegado de Polícia decretar condução coercitiva
manifestamente descabida, poderá ser responsabilizado pelo crime do art. 10 da Lei.

Contudo, Renato Brasileiro afirma que este entendimento isolado do STF é errôneo, uma
vez que, por se tratar de uma medida cautelar pessoal, à luz do art. 282, §2º do CPP, com redação
dada pelo Pacote Anticrime, apenas o juiz poderá determinar a condução coercitiva, portanto, será
o único sujeito ativo.

CPP - Art. 282, § 2º As medidas cautelares serão decretadas pelo juiz a


requerimento das partes ou, quando no curso da investigação criminal, por
representação da autoridade policial ou mediante requerimento do Ministério
Público. (Redação dada pela Lei nº 13.964, de 2019)

SUJEITO PASSIVO

Inicialmente, salienta-se que de acordo com o CPP, poderão ser conduzidos


coercitivamente:

• O ofendido

Art. 201. Sempre que possível, o ofendido será qualificado e perguntado


sobre as circunstâncias da infração, quem seja ou presuma ser o seu autor,
as provas que possa indicar, tomando-se por termo as suas declarações.
§ 1o Se, intimado para esse fim, deixar de comparecer sem motivo justo, o
ofendido poderá ser conduzido à presença da autoridade.

• O perito

Art. 278. No caso de não-comparecimento do perito, sem justa causa, a


autoridade poderá determinar a sua condução.

• As testemunhas

Art. 218. Se, regularmente intimada, a testemunha deixar de comparecer


sem motivo justificado, o juiz poderá requisitar à autoridade policial a sua
apresentação ou determinar seja conduzida por oficial de justiça, que poderá
solicitar o auxílio da força pública.

• O investigado

Art. 260. Se o acusado não atender à intimação para o interrogatório,


reconhecimento ou qualquer outro ato que, sem ele, não possa ser realizado,
a autoridade poderá mandar conduzi-lo à sua presença

CS – ABUSO DE AUTORIDADE 23
.
Entretanto, de acordo com a Lei de Abuso de Autoridade o crime do art. 10 só estará
caracterizado quando a condução coercitiva for determinada contra o investigado ou contra as
testemunhas.

INCONSTITUCIONALIDADE DA CONDUÇÃO COERCITIVA PARA


INTERROGATÓRIO

Salienta-se que o STF, na ADPF 395/DF, firmou entendimento de que não é válida a
condução coercitiva do investigado ou do réu para interrogatório no âmbito da investigação ou da
ação penal.

O CPP, ao tratar sobre a condução coercitiva, prevê o seguinte:

Art. 260. Se o acusado não atender à intimação para o interrogatório,


reconhecimento ou qualquer outro ato que, sem ele, não possa ser realizado,
a autoridade poderá mandar conduzi-lo à sua presença.

O STF declarou que a expressão “para o interrogatório” prevista no art. 260 do CPP não foi
recepcionada pela Constituição Federal, tendo em vista o princípio do nemo tenetur se detegere
(ninguém é obrigado a produzir provas contra si mesmo), o acusado possui direito ao silêncio.
Assim, caso seja determinada a condução coercitiva de investigados ou de réus para interrogatório,
tal conduta poderá ensejar:

• a responsabilidade disciplinar e civil do agente ou da autoridade

• a ilicitude das provas obtidas

• a responsabilidade civil do Estado

• crime de abuso de autoridade previsto no art. 10.

Portanto, manifestamente descabida será a condução do investigado para fins de


interrogatório. Como a decisão do STF possui efeito vinculante não se aplica o art. 1º, §2º da Lei
13.869/2019.

PRÉVIA NOTIFICAÇÃO

A condução coercitiva só poderá ser determinada com a notificação prévia, sua ausência
poderá ensejar abuso de autoridade.

Enunciado n. 7 do Conselho Nacional de Procuradores-Gerais dos Ministérios


Públicos dos Estados e da União (CNPG) e do Grupo Nacional de
Coordenadores de Centro de Apoio Criminal (GNCCRIM): “A condução
coercitiva pressupõe motivação e descumprimento de prévia notificação”.

CS – ABUSO DE AUTORIDADE 24
.
3. OMISSÃO QUANTO À COMUNICAÇÃO DA PRISÃO EM FLAGRANTE À AUTORIDADE
JUDICIÁRIA NO PRAZO LEGAL E FIGURAS EQUIPARAS

Art. 12. Deixar injustificadamente de comunicar prisão em flagrante à


autoridade judiciária no prazo legal (24h):
Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa.
Parágrafo único. Incorre na mesma pena quem:
I - deixa de comunicar, imediatamente, a execução de prisão temporária ou
preventiva à autoridade judiciária que a decretou;
II - deixa de comunicar, imediatamente, a prisão de qualquer pessoa e o local
onde se encontra à sua família ou à pessoa por ela indicada;
III - deixa de entregar ao preso, no prazo de 24 (vinte e quatro) horas, a nota
de culpa, assinada pela autoridade, com o motivo da prisão e os nomes do
condutor e das testemunhas;
IV - prolonga a execução de pena privativa de liberdade, de prisão temporária,
de prisão preventiva, de medida de segurança ou de internação, deixando,
sem motivo justo e excepcionalíssimo, de executar o alvará de soltura
imediatamente após recebido ou de promover a soltura do preso quando
esgotado o prazo judicial ou legal.

Trata-se de crime omisso próprio, que tutela a liberdade de locomoção, com pena de 06
meses a 2 anos e multa. Portanto, trata-se de infração de menor potencial ofensivo, a competência
será do JECrim, caberá transação penal e suspensão condicional do processo.

O sujeito ativo será o Delegado de Polícia que possui a obrigação de comunicar a prisão em
flagrante à autoridade judiciária.

Obs.: A comunicação deverá ser feita ao juiz das garantias, nos termos do art. 3º-B, II do CPP
(atualmente está com a eficácia suspensa em razão da decisão do Min. Fux)

(Eficácia suspensa) Art. 3º-B. O juiz das garantias é responsável pelo controle
da legalidade da investigação criminal e pela salvaguarda dos direitos
individuais cuja franquia tenha sido reservada à autorização prévia do Poder
Judiciário, competindo-lhe especialmente: (Incluído pela Lei nº 13.964, de
2019)
I - receber a comunicação imediata da prisão, nos termos do inciso LXII
do caput do art. 5º da Constituição Federal;
II - receber o auto da prisão em flagrante para o controle da legalidade da
prisão, observado o disposto no art. 310 deste Código;

Importante consignar que o caput do art. 12 da Lei 13.869/2019 é uma norma penal em
branco homogênea heterovitelina, tendo em vista que a expressão “prazo legal” é complementada
pelo art. 306, §1º do CPP.

Art. 306. § 1o Em até 24 (vinte e quatro) horas após a realização da prisão,


será encaminhado ao juiz competente o auto de prisão em flagrante e, caso
o autuado não informe o nome de seu advogado, cópia integral para a
Defensoria Pública.

Portanto, de acordo com a doutrina, o prazo legal a que se refere o art. 12 da Lei 13.869/2019
será de 24h.

CS – ABUSO DE AUTORIDADE 25
.
Obs.: Em relação a expressão “imediatamente”, contida nos incisos I e II, do art. 12 da Lei
13.869/2019, há na doutrina quem sustente que seriam 24h (mesmo período do caput). De acordo
com Renato Brasileiro, não é a melhor interpretação, devendo ser feita sem interrupção, uma vez
que o legislador utilizou outro termo.

A Constituição garante ao preso o direito de identificação dos responsáveis por sua prisão,
visando inibir a tortura e abusos, através do recebimento da nota de culpa nos casos de prisão em
flagrante.

Em regra, na nota de culpa deverá constar o nome do condutor e de testemunhas. Porém,


as Lei 12.880/13 e 9.807/99 preveem a possibilidade de ocultar os nomes das testemunhas com o
intuito de protegê-la. A ausência da entrega da nota de culpa, presente o especial fim de agir,
caracterizará o crime de abuso de autoridade.

Salienta-se que a Lei 7.960/89 em seu art. 2ª, §4ª-A (com redação dada pela Lei de Abuso
de Autoridade) prevê que o mandado de prisão deverá conter o seu período de duração, incluindo
o dia de cumprimento do mandado de prisão, e a data específica em que haverá a soltura do
investigado.

Lei 7.960/89 Art. 2º, § 4º-A O mandado de prisão conterá necessariamente


o período de duração da prisão temporária estabelecido no caput deste
artigo, bem como o dia em que o preso deverá ser libertado.

Por fim, colacionamos o Enunciado 9 do CNPG e GNCCRIM que se refere à execução do


alvará de soltura.

Enunciado n. 9 do Conselho Nacional de Procuradores-Gerais dos Ministérios


Públicos dos Estados e da União (CNPG) e do Grupo Nacional de
Coordenadores de Centro de Apoio Criminal (GNCCRIM): “A execução
imediata do alvará de soltura deve ocorrer após o cumprimento dos
procedimentos de segurança necessários, incluindo a checagem sobre a
existência de outras ordens de prisão e da autenticidade do próprio alvará”.

4. CONSTRANGIMENTO DE PRESO OU DETENTO

Art. 13. Constranger o preso ou o detento, mediante violência, grave


ameaça ou redução de sua capacidade de resistência, a:
I - exibir-se ou ter seu corpo ou parte dele exibido à curiosidade pública;
II - submeter-se a situação vexatória ou a constrangimento não autorizado
em lei;
III - produzir prova contra si mesmo ou contra terceiro:
Pena - detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa, sem prejuízo da pena
cominada à violência.

O verbo “constranger” significa obrigar alguém a fazer algo que não deseja, seja mediante
violência, grave ameaça ou reduzindo sua capacidade de resistência.

Perceba que a lei utilizou duas palavras “preso” ou “detento” há diferença entre elas ou são
sinônimas?

CS – ABUSO DE AUTORIDADE 26
.
PRESO DETENTO

A prisão da pessoa está formalizada, A prisão ainda não foi formalizada,


ou seja, foi lavrado APF. mas a pessoa está privada de sua
liberdade de locomoção.

a) Exibir-se ou ter seu corpo ou parte dele exibido à curiosidade pública

Em regra, não há nenhuma finalidade pública que justifique a exibição do preso. Visa evitar
o “show midiático” promovido por determinados programas de televisão e por certos agentes
públicos que, até pouco tempo, faziam publicações em suas redes sociais particulares sobre a
prisão de algumas pessoas.

Contudo em determinados crimes, a exemplo dos crimes sexuais, a exibição da imagem do


preso pode fazer com que outras vítimas compareçam para fazer o seu reconhecimento.

b) Submeter-se a situação vexatória ou constrangimento não autorizado em lei

Refere-se, principalmente, as situações que os agentes públicos submetem determinados


presos, a exemplo da prisão no aniversário de 18 anos e a filmagem dos parabéns, a obrigação de
andar pela rua e pedir desculpas, tudo sendo filmado e compartilhado em grupos de Whatsaap.

Salienta-se que a prisão em flagrante, por si só, já é um constrangimento, mas autorizado


por lei.

Obs.: Apesar de não haver na Lei de Abuso de Autoridade o crime autônomo de uso de algemas
(foi vetado), pode configurar um constrangimento não autorizado por lei (art. 13, II).

c) Produzir prova contra sim mesmo ou contra terceiro

Como exemplo, cita-se o constrangimento do preso para fornecer a senha do celular para
que o agente público tenha acesso as suas mensagens.

Importante consignar que o art. 3º-F, do CPP (eficácia suspensa pelo Min. Fux), confere ao
juiz das garantias a obrigação de assegurar o cumprimento das regras de tratamento dos presos,
inclusive em relação a exibição de imagens na imprensa.

(Eficácia Suspensa) Art. 3º-F. O juiz das garantias deverá assegurar o


cumprimento das regras para o tratamento dos presos, impedindo o acordo
ou ajuste de qualquer autoridade com órgãos da imprensa para explorar a
imagem da pessoa submetida à prisão, sob pena de responsabilidade civil,
administrativa e penal. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
Parágrafo único. Por meio de regulamento, as autoridades deverão
disciplinar, em 180 (cento e oitenta) dias, o modo pelo qual as informações
sobre a realização da prisão e a identidade do preso serão, de modo
padronizado e respeitada a programação normativa aludida no caput deste
artigo, transmitidas à imprensa, assegurados a efetividade da persecução
penal, o direito à informação e a dignidade da pessoa submetida à
prisão. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)

CS – ABUSO DE AUTORIDADE 27
.
Por fim, o crime do art. 13, III da Lei 13.869/2019 não se confunde com o art. 1º, I da Lei de
Tortura.

Lei 9.455/97 Art. 1º. Constitui crime de tortura:


I – constranger alguém com emprego de violência ou grave ameaça,
causando-lhe sofrimento físico ou mental:
a) com o fim de obter informação, declaração ou confissão da vítima ou de
terceira pessoa;

ABUSO DE AUTORIDADE TORTURA -CONFISSÃO

(art. 13, III) (art. 1º, I, a)

Crime próprio, nos termos do art. 2º, ou Crime comum (pode ser praticado por
seja, praticado por agente público. qualquer pessoa)

Praticado com violência, grave ameaça ou Praticado com violência ou grave ameaça.
violência imprópria (retira a capacidade de
resistência da vítima).

Não há necessidade de produzir Necessário que o resultado cause


sofrimento físico ou mental sofrimento físico ou mental

Deve estar presente o especial fim de agir Deve estar presente o especial fim de
de prejudicar outrem ou beneficiar a si obter informação, declaração ou confissão
mesmo ou a terceiro, ou, ainda, por mero da vítima ou de terceira pessoa.
capricho ou satisfação pessoal.

5. CONSTRANGIMENTO AS DEPOR, SOB AMEAÇA DE PRISÃO, DE PESSOA QUE DEVA


GUARDAR SEGREDO OU RESGUARDAR SIGILO EM RAZÃO DE FUNÇÃO, MINISTÉRIO
OU PROFISSÃO, E FIGURAS EQUIPARADAS

Art. 15. Constranger a depor, sob ameaça de prisão, pessoa que, em razão
de função, ministério, ofício ou profissão, deva guardar segredo ou
resguardar sigilo:
Pena - detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.
Parágrafo único. Incorre na mesma pena quem prossegue com o
interrogatório:
I - de pessoa que tenha decidido exercer o direito ao silêncio; ou
II - de pessoa que tenha optado por ser assistida por advogado ou defensor
público, sem a presença de seu patrono.

O Código de Processo Penal, em seu art. 207, lista as pessoas que são proibidas de depor.
Observe:

CS – ABUSO DE AUTORIDADE 28
.
CPP - Art. 207. São proibidas de depor as pessoas que, em razão de função,
ministério, ofício ou profissão, devam guardar segredo, salvo se,
desobrigadas pela parte interessada, quiserem dar o seu testemunho.

O crime do art. 15 da Lei 13.869/2019 reforça a proibição contida no art. 207 do CPP.

As figuras equiparadas do parágrafo único são autônomas em relação ao caput, uma vez
que não há constrangimento. O tipo penal refere-se apenas ao interrogatório, que poderá ser policial
(fase investigatória) ou judicial (fase processual), configurando crime de abuso de autoridade
quando:

a) A pessoa decidiu exercer o seu direito ao silencio, mas o interrogatório prossegue.

Por exemplo, na primeira pergunta a pessoa afirma que fará uso do seu direito ao silêncio
e, mesmo assim, continuam sendo feitas outras indagações e em todas é necessário reafirmar que
não irá responder.

Portanto, presente o especial fim de agir, ao prosseguir com o interrogatório de pessoa que
invocou o seu direito ao silêncio estará configurado o crime de abuso de autoridade.

O direito ao silêncio não contempla a identificação e a qualificação.

b) A pessoa optou por ser assistida por advogado ou defensor público, mas o interrogatório
prossegue sem a presença do patrono

O Estatuto da OAB, em seu art. 7º, XXI, prevê que o advogado possui o direito de assistir
os seus clientes no interrogatório.

• Interrogatório judicial – presença obrigatória;

• Interrogatório policial ou ministerial – presença, até o advento da Lei de Abuso de


Autoridade, era facultativa, mesmo que a pessoa solicitasse, o interrogatório prosseguia.
Atualmente, se a pessoa optar pela assistência do advogado o interrogatório não pode
ser feito.

6. OMISSÃO DE IDENTIFICAÇÃO OU IDENTIFICAÇÃO FALSA AO PRESO

Art. 16. Deixar de identificar-se ou identificar-se falsamente ao preso por


ocasião de sua captura ou quando deva fazê-lo durante sua detenção ou
prisão:
Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa.
Parágrafo único. Incorre na mesma pena quem, como responsável por
interrogatório em sede de procedimento investigatório de infração penal,
deixa de identificar-se ao preso ou atribui a si mesmo falsa identidade, cargo
ou função.

Perceba que há no caput uma conduta omissiva, quando o agente público deixa de
identificar-se, e uma conduta comissiva, nos casos em que o agente público se identifica
falsamente.

CS – ABUSO DE AUTORIDADE 29
.
Assemelha-se a conduta prevista no art. 307 do CP.

Art. 307 - Atribuir-se ou atribuir a terceiro falsa identidade para obter


vantagem, em proveito próprio ou alheio, ou para causar dano a outrem:
Pena - detenção, de três meses a um ano, ou multa, se o fato não constitui
elemento de crime mais grave.

Importante consignar, ainda, que o art. 16 da Lei 13.869/2019 reforça a ideia contida na
Constituição Federal (art. 5º, LXIV) que garante ao preso conhecer os responsáveis por sua prisão.

7. SUBMISSÃO DE PRESO A INTERROGATÓRIO POLICIAL DURANTE O PERÍODO DE


REPOUSO NOTURNO

Art. 18. Submeter o preso a interrogatório policial durante o período de


repouso noturno, salvo se capturado em flagrante delito ou se ele,
devidamente assistido, consentir em prestar declarações:
Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa.

No Brasil, não há liberdade de autodeterminação do interrogando, ou seja, poderá acontecer


por horas, em diversos períodos.

O crime do art. 18 refere-se apenas à pessoa presa e ao interrogatório policial.

O conceito de abuso noturno é encontrado na própria Lei de Abuso de Autoridade, período


compreendido entre 21h e 5h. Observe a redação do art. 22, § 1º, II:

Art. 22, § 1º , III - cumpre mandado de busca e apreensão domiciliar após as


21h (vinte e uma horas) ou antes das 5h (cinco horas).

Não se aplica a proibição de interrogatório em período noturno para os casos de flagrante


delito ou nos casos em que o preso assistido por profissional concordar.

Observe os Enunciados do CNPG e do GNCCRIM:

Enunciado n. 11 do Conselho Nacional de Procuradores-Gerais dos


Ministérios Públicos dos Estados e da União (CNPG) e do Grupo Nacional de
Coordenadores de Centro de Apoio Criminal (GNCCRIM): “Para efeitos do
art. 18 da Lei de Abuso de Autoridade, compreende-se por repouso noturno
o período de 21h00 a 5h00, nos termos do art. 22, §1º, III, da mesma Lei”.

Enunciado n. 12 do Conselho Nacional de Procuradores-Gerais dos


Ministérios Públicos dos Estados e da União (CNPG) e do Grupo Nacional de
Coordenadores de Centro de Apoio Criminal (GNCCRIM): “Ressalvadas as
hipóteses de prisão em flagrante e concordância do interrogado devidamente
assistido, o interrogatório extrajudicial do preso iniciado antes, não pode
adentrar o período de repouso noturno, devendo ser o ato encerrado e, se
necessário, complementado no dia seguinte.”

CS – ABUSO DE AUTORIDADE 30
.
8. IMPEDIMENTO OU RETARDAMENTO DO ENVIO DE PLEITO DO PRESO À
AUTORIDADE JUDICIÁRIA COMPETENTE

Art. 19. Impedir ou retardar, injustificadamente, o envio de pleito de preso à


autoridade judiciária competente para a apreciação da legalidade de sua
prisão ou das circunstâncias de sua custódia:
Pena - detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.
Parágrafo único. Incorre na mesma pena o magistrado que, ciente do
impedimento ou da demora, deixa de tomar as providências tendentes a
saná-lo ou, não sendo competente para decidir sobre a prisão, deixa de
enviar o pedido à autoridade judiciária que o seja.

Impedir significa criar um obstáculo instransponível, fazendo com que o pleito (demanda)
não chegue à autoridade judiciário. Por outro lado, retardar é demorar para levar as solicitações.

De acordo com Renato Brasileiro, o pleito poderia ser equiparado a uma verdadeira petição
de habeas corpus, tendo em vista que é o instrumento de proteção à liberdade de locomoção.

9. RESTRIÇÃO, SEM JUSTA CAUSA, DA ENTREVISTA PESSOAL OU RESERVADA COM


SEU ADVOGADO

Art. 20. Impedir, sem justa causa, a entrevista pessoal e reservada do preso
com seu advogado:
Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa.
Parágrafo único. Incorre na mesma pena quem impede o preso, o réu solto
ou o investigado de entrevistar-se pessoal e reservadamente com seu
advogado ou defensor, por prazo razoável, antes de audiência judicial, e de
sentar-se ao seu lado e com ele comunicar-se durante a audiência, salvo no
curso de interrogatório ou no caso de audiência realizada por
videoconferência.

É direito do cliente/assistido ter uma entrevista pessoal e reservada com seu


advogado/defensor público, para auxiliar o trabalho da defesa técnica e para o melhor exercício da
autodefesa. Salienta-se que poderá haver a negativa quando presente uma justa causa, a exemplo
da negativa de entrevista às 2h em um presídio de segurança máxima.

A figura equiparada do parágrafo único aplica-se ao acusado preso, ao acusado solto e ao


investigado. Além disso, o direito de comunicação não poderá ser exercido durante o ato de
interrogatório.

Apesar de não haver ressalva no art. 20 da Lei 13.869/2019, o art. 217 do CPP deve ser
observado, permanece possível a retirada do acusado da audiência para que a testemunha preste
seu depoimento.

CPP - Art. 217. Se o juiz verificar que a presença do réu poderá causar
humilhação, temor, ou sério constrangimento à testemunha ou ao ofendido,
de modo que prejudique a verdade do depoimento, fará a inquirição por
videoconferência e, somente na impossibilidade dessa forma, determinará a
retirada do réu, prosseguindo na inquirição, com a presença do seu defensor.

CS – ABUSO DE AUTORIDADE 31
.
10. MANUTENÇÃO DE PRESOS DE AMBOS OS SEXOS NA MESMA CELA OU ESPAÇO DE
CONFINAMENTO

Art. 21. Manter presos de ambos os sexos na mesma cela ou espaço de


confinamento:
Pena - detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.
Parágrafo único. Incorre na mesma pena quem mantém, na mesma cela,
criança ou adolescente na companhia de maior de idade ou em ambiente
inadequado, observado o disposto na Lei nº 8.069, de 13 de julho de
1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente).

O art. 21, de certa forma, foi uma resposta do legislador ao caso de Abaetetuba/PA, em que
uma menina de 15 anos ficou 26 dias em uma cela com mais 20 presos do sexo masculino, sendo
estuprada diversas vezes para que tivesse acesso à comida e a materiais de higiene.

Tal dispositivo reforça o art. 5º, XLVIII da CF que garante o cumprimento de pena em
estabelecimentos distintos, considerando-se o sexo e a idade das pessoas custodiadas. Previsão
semelhante há na Lei de Execução Penal (art. 82, §1º).

Art. 82. Os estabelecimentos penais destinam-se ao condenado, ao


submetido à medida de segurança, ao preso provisório e ao egresso.
§ 1° A mulher e o maior de sessenta anos, separadamente, serão recolhidos
a estabelecimento próprio e adequado à sua condição pessoal .

O Ministério da Justiça, por meio da Portaria Interministerial 210/2014, instituiu a Política


Nacional de Proteção às Mulheres privadas de liberdade. Já a Resolução Conjunta 1/2014 do
Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária e do Conselho Nacional de Combate à
Discriminação consagrou os parâmetros de recolhimento e acolhimento de pessoas LGBT.

A jurisprudência entende que deve ser levada a identidade de gênero, inclusive para fins de
cumprimento de pena nos estabelecimentos penais. Observe a notícia retirada do site do Supremo
Tribunal Federal.

O ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF),


determinou que L.F. e M.E.L.(nomes sociais), que se identificam como
travestis, sejam colocadas em estabelecimento prisional compatível com sua
identidade de gênero. Ambas estão presas desde dezembro de 2016 na
Penitenciária de Presidente Prudente (SP) por determinação do juiz de Direito
da Vara Criminal da Comarca de Tupã (SP). A defesa de L.F., que sofreu
condenação à pena de seis anos pela prática do crime de extorsão mediante
restrição da liberdade da vítima, pedia para que ela aguardasse em liberdade
o julgamento do recurso de apelação pelo Tribunal de Justiça de São Paulo
(TJ-SP) ou a fixação de regime mais brando para o cumprimento da pena.
Em caso de rejeição dos pedidos, a defesa requereu a transferência, pela
Secretaria de Administração Penitenciária de São Paulo, para local
adequado, posto que, a despeito de sua identidade de gênero, encontra-se
em penitenciária masculina, numa cela com 31 homens, “sofrendo todo o tipo
de influências psicológicas e corporais”. O Habeas Corpus (HC) 152491
questionou acórdão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), mas teve seu
seguimento negado pelo relator por razões processuais, por ser substitutivo
de recurso ordinário e porque alguns pontos não foram discutidos nas

CS – ABUSO DE AUTORIDADE 32
.
instâncias anteriores. No entanto, o ministro Barroso concedeu a ordem de
ofício para que L.F. seja colocada em estabelecimento prisional compatível
com sua identidade de gênero e estendeu a decisão a M.E.L., condenada no
mesmo processo. Em sua decisão, o ministro Barroso citou a Resolução
Conjunta nº 1, de 15/04/2014, do Conselho Nacional de Combate à
Discriminação, que trata do acolhimento de pessoas LGBT em privação de
liberdade no Brasil e estabelece, entre outros direitos, que a pessoa travesti
ou transexual deve ser chamada pelo seu nome social, contar com espaços
de vivência específicos, usar roupas femininas ou masculinas, conforme o
gênero, e manter os cabelos compridos e demais características de acordo
com sua identidade de gênero. A resolução também garante o direito à visita
íntima. O ministro também citou a Resolução SAP nº 11, de 30/01/2014, do
Estado de São Paulo, que dispõe sobre a atenção a travestis e transexuais
no âmbito do sistema penitenciário paulista.

Por fim, a redação do paragrafo único visa coibir a colocação de criança ou de adolescente
junto de maiores de idade, pouco importando se o maior de idade é ou não do mesmo sexo.

11. VIOLAÇÃO DE DOMICÍLIO EM UM CONTEXTO DE ABUSO DE AUTORIDADE

Art. 22. Invadir ou adentrar, clandestina ou astuciosamente, ou à revelia da


vontade do ocupante, imóvel alheio ou suas dependências, ou nele
permanecer nas mesmas condições, sem determinação judicial ou fora das
condições estabelecidas em lei:
Pena - detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.
§ 1º Incorre na mesma pena, na forma prevista no caput deste artigo,
quem:
I - coage alguém, mediante violência ou grave ameaça, a franquear-lhe o
acesso a imóvel ou suas dependências;
III - cumpre mandado de busca e apreensão domiciliar após as 21h (vinte
e uma horas) ou antes das 5h (cinco horas).
§ 2º Não haverá crime se o ingresso for para prestar socorro, ou quando
houver fundados indícios que indiquem a necessidade do ingresso em razão
de situação de flagrante delito ou de desastre.

Trata-se de uma espécie de violação de domicílio praticada em contexto de abuso de


autoridade, aplica-se aqui as considerações do art. 150 do CP.

Art. 150 - Entrar ou permanecer, clandestina ou astuciosamente, ou contra a


vontade expressa ou tácita de quem de direito, em casa alheia ou em suas
dependências:
Pena - detenção, de um a três meses, ou multa.
§ 1º - Se o crime é cometido durante a noite, ou em lugar ermo, ou com o
emprego de violência ou de arma, ou por duas ou mais pessoas:
Pena - detenção, de seis meses a dois anos, além da pena correspondente
à violência.
§ 3º - Não constitui crime a entrada ou permanência em casa alheia ou em
suas dependências:
I - durante o dia, com observância das formalidades legais, para efetuar
prisão ou outra diligência;

CS – ABUSO DE AUTORIDADE 33
.
II - a qualquer hora do dia ou da noite, quando algum crime está sendo ali
praticado ou na iminência de o ser.
§ 4º - A expressão "casa" compreende:
I - qualquer compartimento habitado;
II - aposento ocupado de habitação coletiva;
III - compartimento não aberto ao público, onde alguém exerce profissão ou
atividade.
§ 5º - Não se compreendem na expressão "casa":
I - hospedaria, estalagem ou qualquer outra habitação coletiva, enquanto
aberta, salvo a restrição do n.º II do parágrafo anterior;
II - taverna, casa de jogo e outras do mesmo gênero.

Por imóvel alheio, parte da doutrina entende que deve ser retirado do Direito Civil; já Renato
Brasileiro sustenta que equivale a casa, conceito retirado do art. 150, §§4º e 5º do CP.

A entrada em domicílio está sujeita à reserva de jurisdição, ou seja, somente pode ser
realizada com autorização judicial, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar
socorro.

O caput do art. 22 da Lei de Abuso de Autoridade é uma norma penal em branco homogênea
heterovitelina, tendo em vista que se busca em outra normal legal os requisitos para o cumprimento
de um mandado judicial, ou seja, as condições para que a polícia possa ingressar na casa de
alguém. Em regra, estão nos arts. 243 e seguintes do CP.

Obs.: O STJ entende que é indispensável que o mandado de busca e apreensão tenha objetivo
certo e pessoa determinada, não se admitindo ordem judicial genérica e indiscriminada de busca e
apreensão para a entrada da polícia em qualquer residência

AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. APURAÇÃO DE CRIMES


PRATICADOS EM COMUNIDADES DE FAVELAS. BUSCA E APREENSÃO
EM RESIDÊNCIAS. DECLARAÇÃO DE NULIDADE DA DECISÃO QUE
DECRETOU A MEDIDA DE BUSCA E APREENSÃO COLETIVA, GENÉRICA
E INDISCRIMINADA CONTRA OS CIDADÃOS E CIDADÃS DOMICILIADOS
NAS COMUNIDADES ATINGIDAS PELO ATO COATOR. 1. Configurada a
ausência de individualização das medidas de apreensão a serem cumpridas,
o que contraria diversos dispositivos legais, dentre eles os arts. 240, 242, 244,
245, 248 e 249 do Código de Processo Penal, além do art. 5º, XI, da
Constituição Federal: a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela
podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de
flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por
determinação judicial. Caracterizada a possibilidade concreta e iminente de
ofensa ao direito fundamental à inviolabilidade do domicílio. 2. Indispensável
que o mandado de busca e apreensão tenha objetivo certo e pessoa
determinada, não se admitindo ordem judicial genérica e indiscriminada de
busca e apreensão para a entrada da polícia em qualquer residência.
Constrangimento ilegal evidenciado. 3. Agravo regimental provido. Ordem
concedida para reformar o acórdão impugnado e declarar nula a decisão que
decretou a medida de busca e apreensão coletiva, genérica e indiscriminada
contra os cidadãos e cidadãs domiciliados nas comunidades atingidas pelo
ato coator (Processo n. 0208558-76.2017.8.19.0001). (AgRg no HC
435.934/RJ, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA,
julgado em 05/11/2019, DJe 20/11/2019)

CS – ABUSO DE AUTORIDADE 34
.
Quando o inciso III, do §1º, do art. 22 da Lei 13.869/2019 determina o período que o
mandado de busca e apreensão não poderá ser cumprido, remete ao entendimento constitucional
de que só será possível entrar no domicílio durante o dia. Havia na doutrina três correntes acerca
do que se entende por dia. Vejamos:

1ª C – dia é o período compreendido entre o nascer e o pôr do sol.

2ª C – dia é o período compreendido entre 6h e 18h.

3ª C – dia é o período compreendido entre 6h e 18h, devendo ser observada a luminosidade


solar.

Com a Nova Lei de Abuso de Autoridade o legislador trouxe o conceito de noite (período
entre às 21h até às 5h), qual é o período, a partir de agora, considerado como dia? Novamente,
temos três correntes:

1ª C – o legislador incorreu em uma inconstitucionalidade, tendo em vista que não se pode


ampliar o conceito de dia, já que às 20:59 não mais há luminosidade solar.

2ª C – o inciso III é válido, mas desde que submetido a uma interpretação conforme a
Constituição. Assim, havendo luminosidade solar é possível o cumprimento do mandado.

3ª C – Renato Brasileiro entende que dia é o período compreendido entre 5h às 21h, sem
necessidade de luminosidade solar, o inciso III é constitucional. A ideia não está relacionada à
luminosidade solar, mas sim ao repouso noturno.

Salienta-se que para o ingresso na residência em caso de flagrante delito pressupõe a


existência de uma causa provável, ou seja, deve haver indícios de que um crime está praticado.

Por fim, destaca-se que se o mandado não for de busca e apreensão não haverá crime. Cita-
se, como exemplo, mandado de exploração local para colocação de grampos, em que o STF
entendeu que seria possível no período noturno. Além disso, nada impede que respeitado o horário
o cumprimento se estenda (começou às 18h e termina às 22:30).

Enunciado n. 15 do Conselho Nacional de Procuradores-Gerais dos


Ministérios Públicos dos Estados e da União (CNPG) e do Grupo Nacional de
Coordenadores de Centro de Apoio Criminal (GNCCRIM): “O mandado de
busca e apreensão deverá ser cumprido durante o dia (art. 5º, XI, CF/88).
Mesmo havendo luz solar, veda-se seu cumprimento entre 21h00 e 5h00, sob
pena de caracterizar abuso de autoridade (art. 22, §1º, inc. III)”.

12. FRAUDE PROCESSUAL EM ESPECIAL CASO DE ABUSO DE AUTORIDADE

Art. 23. Inovar artificiosamente, no curso de diligência, de investigação ou de


processo, o estado de lugar, de coisa ou de pessoa, com o fim de eximir-se
de responsabilidade ou de responsabilizar criminalmente alguém ou agravar-
lhe a responsabilidade:
Pena - detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.
Parágrafo único. Incorre na mesma pena quem pratica a conduta com o
intuito de:

CS – ABUSO DE AUTORIDADE 35
.
I - eximir-se de responsabilidade civil ou administrativa por excesso praticado
no curso de diligência;
II - omitir dados ou informações ou divulgar dados ou informações
incompletos para desviar o curso da investigação, da diligência ou do
processo.

Trata-se da reprodução do art. 347 do CP, que trata da fraude processual. Quando praticado
com abuso de autoridade, o art. 23 da Lei 13.869/2019 prevalecerá sobre o Código Penal.

13. CONSTRANGIMENTO DE FUNCIONÁRIO OU EMPREGADO DE INSTITUIÇÃO


HOSPITALAR PÚBLICA OU PRIVADA A ADMITIR PARA TRATAMENTO PESSOA
MORTA

Art. 24. Constranger, sob violência ou grave ameaça, funcionário ou


empregado de instituição hospitalar pública ou privada a admitir para
tratamento pessoa cujo óbito já tenha ocorrido, com o fim de alterar local ou
momento de crime, prejudicando sua apuração:
Pena - detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa, além da pena
correspondente à violência.

Ocorre, por exemplo, quando agentes públicos levam ao hospital pessoa que já está morta,
para fins de ocultar o momento do óbito e o local em que ocorreu, dificultando a apuração do crime
de homicídio.

14. OBTENÇÃO DE PROVA POR MEIO MANIFESTAMENTE ILÍCITO

Art. 25. Proceder à obtenção de prova, em procedimento de investigação ou


fiscalização, por meio manifestamente ilícito:
Pena - detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.
Parágrafo único. Incorre na mesma pena quem faz uso de prova, em
desfavor do investigado ou fiscalizado, com prévio conhecimento de sua
ilicitude.

A Constituição é expressa em proibir a admissão de provas ilícitas, com o advento da Lei de


Abuso de Autoridade passou a ser crime específico a produção de provas ilícitas, incorrendo nas
mesmas penas quem faz uso de prova ilícita sabendo sua origem (dolo apenas direito).

Entende-se por meio manifestamente ilícito, segundo Renato Brasileiro:

a) As provas ilícitas - obtidas com violação a regra de direito material, a exemplo da


confissão mediante tortura;

b) As provas derivadas das ilícitas – Teoria dos Frutos da Árvore Envenenada.

Por outro lado, não estão abrangidas pelo conceito a prova ilícita pro reo (grampo sem
autorização judicial que comprava a inocência de acusado por homicídio, por exemplo), Teoria da
Fonte Independente, Teoria da Mancha Purgada etc.

CS – ABUSO DE AUTORIDADE 36
.
Enunciado n. 16 do Conselho Nacional de Procuradores-Gerais dos
Ministérios Públicos dos Estados e da União (CNPG) e do Grupo Nacional de
Coordenadores de Centro de Apoio Criminal (GNCCRIM): “Ressalvadas
situações excepcionais pacificadas, o uso da prova derivada da ilícita está
abrangido pelo tipo penal incriminador do art. 25 da Lei de Abuso de
Autoridade, devendo o agente ter conhecimento inequívoco da sua origem e
do nexo de relação entre a prova ilícita e aquela dela derivada”.

O Pacote Anticrime incluiu o §5º ao art. 157 do CPP determinado que o juiz que conhecer o
conteúdo de uma prova que foi declarada inadmissível não poderá proferir sentença ou acordão,
encontra-se com sua eficácia suspensa pelo Ministro Fux. Trata-se da descontaminação do julgado.

(Eficácia Suspensa) CPP Art. 157, § 5º O juiz que conhecer do conteúdo da


prova declarada inadmissível não poderá proferir a sentença ou acórdão.

15. REQUISIÇÃO OU INSTAURAÇÃO DE PROCEDIMENTO INVESTIGATÓRIO SEM


QUAISQUER INDÍCIOS

Art. 27. Requisitar instauração ou instaurar procedimento investigatório de


infração penal ou administrativa, em desfavor de alguém, à falta de qualquer
indício da prática de crime, de ilícito funcional ou de infração administrativa:
Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa.
Parágrafo único. Não há crime quando se tratar de sindicância ou
investigação preliminar sumária, devidamente justificada.

Está relacionado às funções do Delegado de Polícia e do Promotor de Justiça.

A lei trata de procedimento investigatório, não se refere apenas ao inquérito policial. Além
disso, o crime estará caracterizado quando a requisição for feita sem qualquer indício, lembre-se
que indício pode ser utilizado como:

• Prova indireta (art. 239 do CPP)

• Prova semiplena – juízo de probabilidade, a exemplo do que ocorre na prisão preventiva,


na pronúncia e no art. 27 da Lei de Abuso de Autoridade.

Há vozes no Ministério Público que sustentam a inconstitucionalidade do art. 27, pois violaria
os poderes do MP, previstos no art. 129 da CF. Renato Brasileiro entende que não nenhuma
inconstitucionalidade, já que os poderes do Parquet não podem ser ilimitados, é exercício da
requisição deve ser legítimo.

A investigação preliminar sumária, no processo penal é chamada de VPI (verificação de


procedência de informações) comum nos casos de denúncia anônima, que antecede a instauração
do inquérito policial não tipifica o crime do art. 27.

Observe o Enunciado 17:

Enunciado n. 17 do Conselho Nacional de Procuradores-Gerais dos


Ministérios Públicos dos Estados e da União (CNPG) e do Grupo Nacional de
Coordenadores de Centro de Apoio Criminal (GNCCRIM): “A configuração do

CS – ABUSO DE AUTORIDADE 37
.
abuso de autoridade pela deflagração de investigação criminal com base em
matéria jornalística, necessariamente, há de ser avaliada a partir dos critérios
interpretativos trazidos pela Lei (art. 1º, §1º) e da flagrante ausência de
standard probatório mínimo que a justifique”.

16. DIVULGAÇÃO DE GRAVAÇÃO SEM RELAÇÃO COM A PROVA QUE SE PRETENDA


PRODUZIR, EXPONDO A INTIMIDADE OU A VIDA PRIVADA DO INVESTIGADO OU
ACUSADO

Art. 28. Divulgar gravação ou trecho de gravação sem relação com a prova
que se pretenda produzir, expondo a intimidade ou a vida privada ou ferindo
a honra ou a imagem do investigado ou acusado:
Pena - detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.

A gravação poder resultado de uma interceptação telefônica ou ambiental. Salienta-se que


para a tipificação do crime previsto no art. 28, a divulgação não pode estar relacionada com a prova
que se pretende produzir, havendo relação com a prova estará caracterizado o crime do art. 10-A
da Lei de Interceptação Telefônica.

Enunciado n. 18 do Conselho Nacional de Procuradores-Gerais dos


Ministérios Públicos dos Estados e da União (CNPG) e do Grupo Nacional de
Coordenadores de Centro de Apoio Criminal (GNCCRIM): “O crime do art. 28
da Lei de Abuso de Autoridade (Divulgar gravação ou trecho de gravação
sem relação com a prova que se pretenda produzir, expondo a intimidade ou
a vida privada ou ferindo a hora ou a imagem do investigado ou acusado)
pressupõe interceptação legal (legítima e lícita), ocorrendo abuso no
manuseio do conteúdo obtido com a medida”.

17. FALSA INFORMAÇÃO SOBRE PROCEDIMENTO JUDICIAL, POLICIAL, FISCAL OU


ADMINISTRATIVO

Art. 29. Prestar informação falsa sobre procedimento judicial, policial, fiscal
ou administrativo com o fim de prejudicar interesse de investigado:
Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa.

Trata-se de modalidade especial de falsidade ideológica. O agente público presta


informações falsas em um procedimento judicial, policial, fiscal ou administrativo, para prejudicar o
interesse do investigado.

Aqui, há uma norma especial, pois restringe o especial fim de agir, conforme já analisado.

Enunciado n. 19 do Conselho Nacional de Procuradores-Gerais dos


Ministérios Públicos dos Estados e da União (CNPG) e do Grupo Nacional de
Coordenadores de Centro de Apoio Criminal (GNCCRIM): “O legislador, na
tipificação do crime do art. 29 da Lei de Abuso de Autoridade, optou por
restringir o alcance do tipo, pressupondo por parte do agente a finalidade
única de prejudicar interesse do investigado. Agindo com finalidade de

CS – ABUSO DE AUTORIDADE 38
.
beneficiar, pode responder por outro delito, como prevaricação (art. 319 do
CP), a depender das circunstâncias do caso concreto”.

18. DEFLAGRAÇÃO DE PERSECUÇÃO PENAL, CIVIL OU ADMINISTRATIVA SEM JUSTA


CAUSA FUNDAMENTADA OU CONTRA QUEM SABE INOCENTE

Art. 30. Dar início ou proceder à persecução penal, civil ou administrativa


sem justa causa fundamentada ou contra quem sabe inocente:
Pena - detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.

Relaciona-se às funções do Ministério Público.

O conceito de justa causa é um lastro probatório mínimo de autoria e participação, nos


termos do art. 395, III do CPP.

O CNPG entende que o crime do art. 30 deve ser declarado inconstitucional.

Enunciado n. 20 do Conselho Nacional de Procuradores-Gerais dos


Ministérios Públicos dos Estados e da União (CNPG) e do Grupo Nacional de
Coordenadores de Centro de Apoio Criminal (GNCCRIM): “O crime do art. 30
da Lei de Abuso de Autoridade deve ser declarado, incidentalmente,
inconstitucional. Não apenas em razão da elementar ‘justa causa’ ser
expressão vaga e indeterminada, como também porque gera retrocesso na
tutela dos bens jurídicos envolvidos, já protegidos pelo art. 339 do CP, punido,
inclusive, com pena em dobro”

O Professor Renato Brasileiro discorda, ressaltando que o dispositivo deve ser corretamente
interpretado.

19. PROCRASTINAÇÃO INJUSTIFICADA DE INVESTIGAÇÃO EM PREJUÍZO DO


INVESTIGADO

Art. 31. Estender injustificadamente a investigação, procrastinando-a em


prejuízo do investigado ou fiscalizado:
Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa.
Parágrafo único. Incorre na mesma pena quem, inexistindo prazo para
execução ou conclusão de procedimento, o estende de forma imotivada,
procrastinando-o em prejuízo do investigado ou do fiscalizado.

Estender significa alongar, prolongar a investigação para prejudicar o investigado. Não se


aplica ao processo.

O prazo para a investigação, previsto no Código de Processo Penal, para investigado preso
é de 30 dias (prorrogáveis) e de 10 dias (podendo ser prorrogado por mais 15 dias uma única vez,
nos termos do art. 3º-B, §2º do CPP).

(Eficácia suspensa) CPP, art. 3º, § 2º Se o investigado estiver preso, o juiz


das garantias poderá, mediante representação da autoridade policial e ouvido

CS – ABUSO DE AUTORIDADE 39
.
o Ministério Público, prorrogar, uma única vez, a duração do inquérito por até
15 (quinze) dias, após o que, se ainda assim a investigação não for concluída,
a prisão será imediatamente relaxada. (Incluído pela Lei nº 13.964, de
2019)

É possível afirmar que o art. 31 da Lei 13.769/2019 tutela a garantia da duração razoável do
processo, que se aplica para o inquérito policial.

Ademais, o crime estará caracterizado quando a procrastinação for injustificada. Havendo


motivos, a exemplo de diligências pertinentes não estará caracterizado o crime, a análise será feita
no caso concreto.

Enunciado n. 21 do Conselho Nacional de Procuradores-Gerais dos


Ministérios Públicos dos Estados e da União (CNPG) e do Grupo Nacional de
Coordenadores de Centro de Apoio Criminal (GNCCRIM): “A elementar
‘injustificadamente’ deve ser interpretada no sentido de que o excesso de
prazo na instrução do procedimento investigatório não resultará de simples
operação aritmética, impondo-se considerar a complexidade do feito, atos
procrastinatórios não atribuíveis ao presidente da investigação e ao número
de pessoas envolvidas na apuração. Todos fatores que, analisados em
conjunto ou separadamente, indicam ser, ou não, razoável o prazo para seu
encerramento”.

20. NEGATIVA DE ACESSO AOS AUTOS DE PROCEDIMENTO INVESTIGATÓRIO E DE


EXTRAÇÃO DE CÓPIAS DE DOCUMENTOS

Art. 32. Negar ao interessado, seu defensor ou advogado acesso aos autos
de investigação preliminar, ao termo circunstanciado, ao inquérito ou a
qualquer outro procedimento investigatório de infração penal, civil ou
administrativa, assim como impedir a obtenção de cópias, ressalvado o
acesso a peças relativas a diligências em curso, ou que indiquem a realização
de diligências futuras, cujo sigilo seja imprescindível:
Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa.

O art. 32 reforça o entendimento da Súmula Vinculante 14 e do Estatuto da AOB que


garantem o acesso aos autos de investigação preliminar. Observe:

Súmula vinculante n. 14 do STF: É direito do defensor, no interesse do


representado, ter acesso amplo aos elementos de prova que, já
documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com
competência de polícia judiciária, digam respeito ao exercício do direito de
defesa.

Lei n. 8.906/94 Art. 7º São direitos do advogado:


(...)
XIV - examinar, em qualquer instituição responsável por conduzir
investigação, mesmo sem procuração, autos de flagrante e de investigações
de qualquer natureza, findos ou em andamento, ainda que conclusos à
autoridade, podendo copiar peças e tomar apontamentos, em meio físico ou
digital;

CS – ABUSO DE AUTORIDADE 40
.
(...)
§10. Nos autos sujeitos a sigilo, deve o advogado apresentar procuração para
o exercício dos direitos de que trata o inciso XIV.
§11. No caso previsto no inciso XIV, a autoridade competente poderá
delimitar o acesso do advogado aos elementos de prova relacionados a
diligências em andamento e ainda não documentados nos autos, quando
houver risco de comprometimento da eficiência, da eficácia ou da finalidade
das diligências
§12. A inobservância dos direitos estabelecidos no inciso XIV, o fornecimento
incompleto de autos ou o fornecimento de autos em que houve a retirada de
peças já incluídas no caderno investigativo implicará responsabilização
criminal e funcional por abuso de autoridade do responsável que impedir o
acesso do advogado com o intuito de prejudicar o exercício da defesa, sem
prejuízo do direito subjetivo do advogado de requerer acesso aos autos ao
juiz competente

21. EXIGÊNCIA DE INFORMAÇÃO OU DO CUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÃO SEM


EXPRESSO AMPARO LEGAL

Art. 33. Exigir informação ou cumprimento de obrigação, inclusive o dever de


fazer ou de não fazer, sem expresso amparo legal:
Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa.
Parágrafo único. Incorre na mesma pena quem se utiliza de cargo ou função
pública ou invoca a condição de agente público para se eximir de obrigação
legal ou para obter vantagem ou privilégio indevido.

Exigir significa impor uma obrigação, o agente público aproveita-se das suas funções
públicas.

Incorrerá nas mesmas penas o agente público que utilizar o seu cargo ou função pública ou
invocar sua condição de agente público para se eximir de obrigação legal ou obter vantagem ou
privilégio indevido. Cita-se, como exemplo, a famosa “carteirada”.

Enunciado n. 22 do Conselho Nacional de Procuradores-Gerais dos


Ministérios Públicos dos Estados e da União (CNPG) e do Grupo Nacional de
Coordenadores de Centro de Apoio Criminal (GNCCRIM), referindo-se,
porém, ao crime de corrupção passiva: “Quem se utiliza de cargo ou função
pública ou invoca a condição de agente público para se eximir de obrigação
legal ou para obter vantagem ou privilégio indevido pratica abuso de
autoridade (art. 33, parágrafo único) se o comportamento não estiver atrelado
à finalidade de contraprestação do agente ou autoridade. Caso contrário,
outro será o crime, como corrupção passiva (art. 317 do CP)”.

22. DECRETAÇÃO DA INDISPONIBILIDADE DE ATIVOS FINANCEIROS EM QUANTIA QUE


EXTRAPOLA EXACERBADAMENTE O VALOR ESTIMADO PARA A SATISFAÇÃO DA
DÍVIDA E SUBSEQUENTE NEGATIVA DE CORREÇÃO DO EXCESSO

CS – ABUSO DE AUTORIDADE 41
.
Art. 36. Decretar, em processo judicial, a indisponibilidade de ativos
financeiros em quantia que extrapole exacerbadamente o valor estimado para
a satisfação da dívida da parte e, ante a demonstração, pela parte, da
excessividade da medida, deixar de corrigi-la:
Pena - detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.

Trata-se de um crime que possui duas condutas que devem ser praticadas de maneira
cumulativa, assim praticada apenas a primeira conduta não haverá crime.

23. DEMORA DEMASIADA E INJUSTIFICADA NO EXAME DE PROCESSO DE QUE TENHA


REQUERIDO VISTA EM ÓRGÃO COLEGIADO

Art. 37. Demorar demasiada e injustificadamente no exame de processo de


que tenha requerido vista em órgão colegiado, com o intuito de procrastinar
seu andamento ou retardar o julgamento:
Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa.

Há doutrina sustentando que o sujeito ativo do crime do art. 37 só poderia ser


Desembargador ou Ministro. Contudo, tal entendimento não deve prevalecer, tendo em vista que
há órgãos colegiados em primeira instancia com a participação de juízes.

A demora demasiada deve ser analisada de acordo com o caso concreto.

24. ANTECIPAÇÃO DE ATRIBUIÇÃO DE CULPA POR MEIO DE COMUNICAÇÃO,


INCLUSIVE REDE SOCIAL, ANTES DE CONCLUÍDAS AS APURAÇÕES E
FORMALIZADA A ACUSAÇÃO

Art. 38. Antecipar o responsável pelas investigações, por meio de


comunicação, inclusive rede social, atribuição de culpa, antes de concluídas
as apurações e formalizada a acusação:
Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa.

A intenção do art. 38 é tutelar a presunção de inocência. De acordo com Renato Brasileiro,


se alguém é presumido inocente, essa pessoa deve assim ser tratada até o final do julgamento.

Trata-se de infração de menor potencial ofensivo e, como tal, será processado e julgado no
JECRIM.

25. APLICAÇÃO DO CÓDIGO PENAL, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL E DA LEI N.


9.099/95 AOS CRIMES DE ABUSO DE AUTORIDADE

Art. 39. Aplicam-se ao processo e ao julgamento dos delitos previstos nesta


Lei, no que couber, as disposições do Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro
de 1941 (Código de Processo Penal), e da Lei nº 9.099, de 26 de setembro
de 1995.

CS – ABUSO DE AUTORIDADE 42
.
As disposições do JECRIM serão aplicadas ao processo e julgamento de abuso de
autoridade, desde que não haja incompatibilidade. Portanto, há crimes de abuso de autoridade que
são infrações de menor potencial ofensivo, quando a pena máxima não for superior a dois anos.

26. DEFESA OU RESPOSTA PRELIMINAR

A defesa preliminar é uma reação defensiva entre o oferecimento e o recebimento da peça


acusatória, está prevista na Lei de Drogas, na Lei 9.099/95 e no art. 514 do CPP que trata do
processo e julgamento dos crimes de responsabilidade dos funcionários públicos.

Art. 514. Nos crimes afiançáveis, estando a denúncia ou queixa em devida


forma, o juiz mandará autuá-la e ordenará a notificação do acusado, para
responder por escrito, dentro do prazo de quinze dias.
Parágrafo único. Se não for conhecida a residência do acusado, ou este se
achar fora da jurisdição do juiz, ser-lhe-á nomeado defensor, a quem caberá
apresentar a resposta preliminar.

Apesar de o abuso de autoridade não estar previsto no Código Penal, trata-se de crime
funcional que só pode, em regra, ser praticado por quem ostente a qualidade de funcionário público.
Logo, a defesa preliminar aplica-se para os crimes previstos na Lei 13.769/2019.

Enunciado n. 24 do Conselho Nacional de Procuradores-Gerais dos


Ministérios Públicos dos Estados e da União (CNPG) e do Grupo Nacional de
Coordenadores de Centro de Apoio Criminal (GNCCRIM): “Os crimes de
abuso de autoridade com pena máxima superior a dois anos, salvo no caso
de foro por prerrogativa de função, são processados pelo rito dos crimes
funcionais, observando-se a defesa preliminar do art. 514 do CPP”.

Enunciado n. 27 do Conselho Nacional de Procuradores-Gerais dos


Ministérios Públicos dos Estados e da União (CNPG) e do Grupo Nacional de
Coordenadores de Centro de Apoio Criminal (GNCCRIM): “A formalidade do
art. 514 do CPP é dispensável quando a denúncia envolver, além do crime
funcional, delito de outra natureza, ambos em concurso”.

Enunciado n. 25 do Conselho Nacional de Procuradores-Gerais dos


Ministérios Públicos dos Estados e da União (CNPG) e do Grupo Nacional de
Coordenadores de Centro de Apoio Criminal (GNCCRIM): “Por ser privativa
do servidor público, o particular concorrente no crime de abuso de autoridade
não faz jus à preliminar contestação prevista no art. 514 do CPP”.

27. VIOLAÇÃO DE DIREITOS E PRERROGATIVAS DO ADVOGADO

A Lei de Abuso de Autoridade alterou o Estatuto da OAB para considerar crime a violação
de direito ou prerrogativa do advogado, no exercício da advocacia, nos casos de:

CS – ABUSO DE AUTORIDADE 43
.
• a inviolabilidade de seu escritório ou local de trabalho, bem como de seus instrumentos
de trabalho, de sua correspondência escrita, eletrônica, telefônica e telemática, desde
que relativas ao exercício da advocacia; (Redação dada pela Lei nº 11.767, de 2008)

• comunicar-se com seus clientes, pessoal e reservadamente, mesmo sem procuração,


quando estes se acharem presos, detidos ou recolhidos em estabelecimentos civis ou
militares, ainda que considerados incomunicáveis;

• ter a presença de representante da OAB, quando preso em flagrante, por motivo ligado
ao exercício da advocacia, para lavratura do auto respectivo, sob pena de nulidade e,
nos demais casos, a comunicação expressa à seccional da OAB;

• não ser recolhido preso, antes de sentença transitada em julgado, senão em sala de
Estado Maior, com instalações e comodidades condignas, assim reconhecidas pela
OAB, e, na sua falta, em prisão domiciliar;

‘Art. 7º-B Constitui crime violar direito ou prerrogativa de advogado previstos


nos incisos II, III, IV e V do caput do art. 7º desta Lei:
Pena - detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, e multa.’”

28. VIGÊNCIA DA NOVA LEI DE ABUSO DE AUTORIDADE

Importante consignar que a Lei de Abuso de Autoridade possui três datas de vigência.

Em regra, a vigência ocorreu em 03 de janeiro de 2020, salvo em relação ao crime do art.


13 que entrou em vigor no dia 16 de janeiro de 2020.

Diante da derrubada de vetos pelo Congresso Nacional, os arts. 3º, 9º, 13, III, 15 § único, I
e II, 16, 20, 30, 32, 38 e 43, entraram em vigor no 25 de janeiro de 2020.

CS – ABUSO DE AUTORIDADE 44

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