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9.

DISTRIBUIÇÃO, MUDANÇA E POLÍTICAS DE


POPULAÇÃO

Objetivos

1. Descrever os traços gerais de evolução da população;


2. Fazer o ponto da situação demográfica contemporânea a nível mundial e
distinguir os países em desenvolvimento dos desenvolvidos;
3. Compreender como é que a população está distribuída no mundo;
4. Analisar as consequências da distribuição da população;
5. Conhecer algumas das políticas de população que influenciam a
fecundidade, a mortalidade e a migração.

9.1. EVOLUÇÃO DA POPULAÇÃO NO MUNDO ATUAL

Uma parte importante do interesse levantado pela questão demográfica no período


após a Segunda Guerra Mundial está relacionada com o ritmo inusitado de
crescimento da população mundial durante este período. Na medida que um número
crescente de países entrou na segunda fase da sua transição demográfica, a
população mundial sentiu o efeito sobre as suas taxas de crescimento globais. Em
1950 o mundo tinha 2,5 mil milhões de habitantes e em 1987 chegou a 5 mil
milhões; em 2015 eram 7,35 mil milhões, ou seja, quase o triplo de 1950. A taxa de
crescimento anual da população mundial alcançou o seu ponto mais alto em 1967,
quando chegou a 2,1% anuais. Trata-se de uma taxa sem precedentes na história.
Antes de 1750 o crescimento foi muito lento, como corresponde à primeira fase da
transição: uma média de aproximadamente 0,1% ao ano entre 1000 e 1750. O
mundo em 1500 provavelmente não tinha mais de 500 milhões de habitantes.
Estima-se que no início da Revolução Industrial, em 1750, eram 791 milhões.
Portanto, o crescimento anual médio entre 1750 e 1950 foi de 0,58%, apesar da
transição demográfica nos países mais desenvolvidos (Grupo de Foz, 2021, p.72).

Como já mencionámos1, durante muitos séculos, a população mundial aumentou muito


lentamente. A partir de meados do século XVIII, registou-se um crescimento
significativo. Depois do final da Segunda Guerra Mundial, a população aumentou
exponencialmente (de forma muito acentuada). Em 2014 estimava-se que viviam na
Terra cerca de 7,2 mil milhões de pessoas e este número continuou a aumentar até

Ver Capítulo 1.
1

247
aos dias de hoje. Atualmente estima-se que vivam na Terra cerca de 7,7 mil milhões
de pessoas. Em 2014, os estudos apontavam que o planeta teria, em 2050, cerca de
9,6 mil milhões de habitantes, mas, os estudos mais recentes apontam para os 10 mil
milhões de pessoas.

O mundo contemporâneo conhece uma transformação demográfica considerável


composta por três componentes: crescimento populacional, evolução da fecundidade e
da mortalidade e mudanças correspondentes na pirâmide etária (Bloom, 2020).

O rápido crescimento populacional foi limitado principalmente à Europa


Ocidental. Noutras regiões, as taxas de natalidade e mortalidade permaneceram altas.
O declínio da mortalidade nas nações desenvolvidas foi seguido por um declínio na
fecundidade. Na década de 1930, as taxas de crescimento populacional estavam em
declínio. Ao contrário do declínio populacional anterior, desta vez o crescimento foi
muito lento devido à baixa fecundidade e à baixa mortalidade. As taxas de mortalidade
permaneceram muito altas nas regiões menos desenvolvidas até depois da Segunda
Guerra Mundial.

Demorou mais de 50 000 anos para que a população mundial atingisse mil milhões.
Desde 1960, milhares de milhões de habitantes foram adicionados a cada dez ou vinte
anos. A população mundial era de três mil milhões em 1960; atingiu seis mil milhões
na viragem do século e, segundo projeções da Organização das Nações Unidas (ONU),
ultrapassará nove mil milhões até 2037. Essa taxa de crescimento populacional
desacelerou, após atingir mais de 2% por ano no final da década de 1960, está agora
em torno de 1%, e deverá cair para a metade até 2050.

Embora, o rendimento mundial por habitante tenha mais do que duplicado, a


esperança de vida tenha aumentado em cerca de 16 anos e a educação das crianças,
ao nível primário, tenha praticamente se generalizado entre 1960 e 2000, o rápido
crescimento populacional apresenta inúmeros desafios, tanto públicos quanto privados,
incluindo: atender às crescentes necessidades de alimentos, roupas, habitação,
educação e infraestrutura; integrar efetivos consideráveis em empregos produtivos; e
proteger o meio ambiente com mais rigor. Receios antigos de uma “explosão”
demográfica mundial deram lugar a outros receios de um rápido crescimento
populacional, especialmente em alguns países e regiões.

O crescimento demográfico global oculta algumas diferenças consideráveis na


distribuição da população mundial dependendo do estado de desenvolvimento e da
região geográfica. Os países classificados pela ONU como menos desenvolvidos
contavam com 68% dos habitantes do planeta em 1950; hoje representam 84%. Esta

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proporção continuará a aumentar, pois aos 2 mil milhões de habitantes que deverão
juntar-se à população mundial, nos próximos 30 anos, praticamente todos nascerão
em países menos desenvolvidos. Este é um grande desafio, uma vez que as regiões
menos desenvolvidas tendem a ser mais frágeis, a nível político, social, económico e
ambiental, do que as regiões mais desenvolvidas.

Como já tínhamos visto anteriormente2, a Índia e a China representam atualmente os


países mais populosos do mundo, com mais de mil milhões cada um. Foi em 2023 que
a Índia passou a ser o país mais populoso do mundo, ultrapassando a China. A
previsão desta transição em 2023 já era esperada desde o relatório Perspetivas
Populacionais Mundiais 2022, lançado em 2022, no Dia Mundial da População. Este
fenómeno resultou principalmente da fecundidade mais baixa dos chineses e do facto
da taxa de crescimento natural da Índia ser três vezes maior que a da China, ou seja,
1,5 por cento contra 0,5 por cento.

Em termos populacionais, os Estados Unidos seguem-se à China, estes dois países


apesar de semelhantes em tamanho, não o são em população. Até 2050, prevê-se que
a Nigéria (que deverá ultrapassar os Estados Unidos, tornando-se o terceiro país com
mais população do planeta) e o Paquistão (que já se encontra entre os dez países com
maior população) vão igualmente conhecer um elevado crescimento (Bloom, 2020).

Em termos da distribuição por grandes regiões, 61% da população mundial vive na


Ásia (4,7 mil milhões de indivíduos), 17% na África (1,3 mil milhões de habitantes),
10% na Europa (750 milhões de pessoas), 8% na América Latina e Caraíbas (650
milhões) e os restantes 4% encontram-se na América do Norte (370 milhões) e na
Oceânia (43 milhões) (United Nations, 2019).

As projeções populacionais ou projeções demográficas sugerem que ocorrerá


um equilíbrio na população. Uma projeção populacional refere-se ao número de
pessoas que formarão a população de uma área em algum momento futuro, de acordo
com suposições demográficas claramente definidas sobre os processos demográficos
de fecundidade, mortalidade e migrações, na definição de um cenário central de
projeção3.

Ver Capítulo 1.
2

3
Definiram-se quatro cenários de projeção da população: cenário baixo, cenário central, cenário
alto e cenário sem migrações, com base em diferentes conjugações das hipóteses alternativas
de evolução das componentes demográfica – hipótese pessimista, hipótese central e hipótese
otimista para a fecundidade e para a mortalidade; e hipótese pessimista, hipótese central e
hipótese otimista para as migrações, a que se juntou ainda uma hipótese sem migrações.
Cenário Central: neste cenário foram consideradas as hipóteses de evolução central da
fecundidade, central da mortalidade e central das migrações.

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As projeções de população mostram como o volume e a estrutura de uma população
podem hipoteticamente evoluir no futuro. O principal objetivo é o de auxiliar na
compreensão da dinâmica da população e contribuir para o debate sobre possíveis
mudanças na sociedade.

No caso de Portugal e mais concretamente do INE (INE, 2020), o exercício de


projeções de população assenta em hipóteses e com base em cenários de evolução
futura das componentes demográficas fecundidade, mortalidade e migrações. Estas
projeções são elaboradas tendo por base vários cenários de evolução futura,
resultantes da conjugação de hipóteses de evolução das componentes de variação da
população. As projeções de população representam uma análise do tipo “se-então”:
ilustram trajetórias possíveis de variação da população sendo os resultados
condicionados quer pela estrutura e composição da população de partida quer pelas
diferentes hipóteses de evolução da fecundidade, da mortalidade e das migrações ao
longo do período de projeção.

De acordo com o INE, relativamente às Projeções de População Residente 2018-2080,


os resultados obtidos não devem ser entendidos como previsões, mas sim lidos com
um carácter condicional “se-então”, uma vez que são condicionados pelo volume e
pela estrutura da população, no momento de partida (2018) e pelos diferentes padrões
de comportamento da fecundidade, da mortalidade e das migrações, estabelecidos em
cada um dos cenários, ao longo do período de projeção4.

No destaque do INE (INE, 2020), o cenário central considera que a população


residente em Portugal tenderá a diminuir e que o país perderá população até 2080,
passando dos atuais 10,3 milhões para 8,2 milhões de residentes. Neste cenário, a
população ficaria abaixo do limiar de 10 milhões de habitantes em 2042 e de 9 milhões
em 2064 (INE, 2020).

No contexto mundial, a população está projetada para atingir 8,1 mil milhões em 2025,
9,6 mil milhões em 2050 e 10,9 mil milhões em 2100. O cenário mediano indica que a
população mundial continuará a crescer. Pode parecer contraditório projetar aumentos
tão importantes enquanto a própria taxa de crescimento está em queda. Três fatores
são responsáveis por isso: primeiro, a própria população está a expandir-se; em
segundo lugar, as taxas de mortalidade infantil caíram rapidamente em muitos países
em desenvolvimento; em terceiro, em qualquer população jovem, há um impulso para
o crescimento (impulso populacional).

4
https://www.ine.pt/xportal/xmain?xpid=INE&xpgid=ine_destaques&DESTAQUESdest_boui=40
6534255&DESTAQUESmodo=2&xlang=pt

250
As projeções baseiam-se em variações médias, que pressupõem uma queda na taxa
de fecundidade e um aumento na esperança de vida em muitos países. Mais de
metade do crescimento da população mundial até 2050 irá ocorrer em África.
Proporcionalmente, esta é a região que experimentará a mudança demográfica mais
forte. A população da África subsaariana, por exemplo, deverá duplicar até esse ano.
Apesar de várias incertezas quanto às projeções relacionadas com a taxa de
fecundidade, a perspetiva é de um boom demográfico, principalmente porque um
grande número de jovens atingirá a idade adulta nos próximos anos e estará em idade
fértil.

Um estudo da revista The Lancet (2020) contradiz a previsão da ONU que afirmava
que em 2100 o planeta teria cerca de 11,2 mil milhões de habitantes. A prestigiada
revista indica que a tendência crescente alcançará seu pico em 2060 e, a partir desse
momento, se reduzirá até chegar a 8,8 mil milhões em 2100. Este fenómeno deve-se
essencialmente à melhoria do nível educacional das mulheres e a um maior acesso a
métodos contracetivos. (Emil Vollset et al. 2020). De acordo com a ONU, em 2050 a
população mundial pode chegar aos 9,7 mil milhões de habitantes. A principal
divergência em relação à previsão da The Lancet é afirmar que o crescimento não
parará durante a segunda metade do século XXI e que, consequentemente, o planeta
alcançará seu ponto populacional máximo no final do século, ultrapassando o número
de mais de 11 mil milhões de habitantes.

Segundo a ONU, três fatores determinam o crescimento da população mundial: as


taxas de fecundidade, o aumento da longevidade e a migração internacional5.

A taxa de fecundidade: o crescimento da população mundial dependerá fortemente da


evolução da taxa de fecundidade global. Prevê-se que passe de 2,5 filhos por mulher
em 2019 para 2,2 filhos por mulher em 2050.

O aumento da longevidade/ a esperança de vida à nascença: no geral, a esperança de


vida aumentou nos últimos anos. De acordo com os números mais recentes, espera-se
que a esperança de vida ao nascer aumente de 72,6 anos em 2019 para 77,1 em
2050. Um progresso notável foi feito na redução das desigualdades na esperança de
vida entre os países, mas ainda há fortes disparidades a nível global. Em 2019, a
esperança de vida ao nascer nos países menos desenvolvidos estava 7,4 anos abaixo
de média global, em grande parte devido às altas taxas de mortalidade infantil e
materna, violência e conflitos ou consequências da HIV/SIDA.

5
https://www.un.org/es/global-issues/population

251
A migração internacional: esta influencia as mudanças demográficas, mas em grau
muito menor do que o número de nascimentos e a taxa de mortalidade. No entanto,
em várias regiões de países do mundo, a migração tem consequências para o tamanho
da população, principalmente em países que recebem grande número de emigrantes
económicos ou dos quais grande número sai, bem como em países afetados pelo
aumento do fluxo de refugiados6.

O crescimento da população mundial tem aspetos positivos para o desenvolvimento


sustentável da sociedade, mas também provoca efeitos negativos no planeta. A seguir,
enumeramos os mais importantes:

- Acelera as mudanças climáticas. As mudanças climáticas referem-se às alterações do


clima atribuídas, direta ou indiretamente, às atividades humanas. Portanto, quanto
mais seres humanos, maior será o impacto. Aqui entram em jogo os gases de efeito
estufa que se acumulam na atmosfera e retêm calor, aumentando os seus efeitos e
contribuindo para a elevação da temperatura média do planeta.

- Diminui a segurança alimentar. Segundo a FAO (Organização das Nações Unidas para
Alimentação e Agricultura), a segurança alimentar ocorre quando todas as pessoas têm
acesso físico, social e económico permanente a alimentos seguros, nutritivos e em
quantidade suficiente para satisfazer as suas necessidades nutricionais. A explosão
demográfica afeta os fundamentos da segurança alimentar, ou seja, a sua
disponibilidade, estabilidade, acesso e consumo.

- Incide na perda de biodiversidade. A perda de biodiversidade refere-se à diminuição


ou desaparecimento da diversidade biológica, ou seja, a variedade de seres vivos que
habitam o planeta. O crescimento populacional tem consequências na biodiversidade
ao intensificar a atividade humana e a presença do artificial sobre o natural, fenómeno
conhecido como Antropoceno.

- Exploração intensiva dos recursos. Os seres humanos estão a esgotar os recursos


naturais do planeta. É o que adverte o Fundo Mundial para a Natureza (WWF): a atual
exploração intensiva dos recursos naturais está a gerar um enorme défice, pois
anualmente consomem-se 20 % a mais em relação à quantidade regenerada e essa
percentagem continua a aumentar7.

Independentemente destas previsões, a humanidade tem um desafio pela frente:


minimizar o impacto do crescimento populacional e, por conseguinte, das mudanças
climáticas. Para evitar que o planeta seja conduzido a uma situação limite, é crucial

6
https://www.un.org/fr/sections/issues-depth/population/index.html
7
https://www.iberdrola.com/sustentabilidade/evolucao-da-populacao

252
trabalhar conjuntamente para reduzir a pegada de carbono, construir infraestruturas e
edificações em linha com um desenvolvimento urbano sustentável, promover a
mobilidade inteligente e sustentável, favorecer a economia circular, o consumo
responsável e fomentar as energias renováveis8.

Os dados sobre a população mundial são publicados com alguma regularidade através
das diversas organizações, nomeadamente: Nações Unidas9, Banco Mundial10, PRB
(Population Reference Bureau)11, União Europeia (Eurostat)12, Conselho da Europa,
Serviços Nacionais de Estatística, “Our World in Data13, entre outros. Os dados são
traduzidos por onze indicadores: a superfície, população no meio do ano civil, taxa de
natalidade, taxa de mortalidade, projeção, taxa de mortalidade infantil, índice sintético
de fecundidade, proporção de indivíduos com menos de 15 anos e mais de 65 anos,
esperança de vida dos homens e das mulheres, produto nacional bruto por habitante e
o produto interno bruto por habitante14.

A característica demográfica definidora dos tempos recentes é a “explosão”


populacional moderna. A população mundial continua a crescer hoje, mas agora a sua
taxa de crescimento começou a diminuir. À medida que muitas nações passam pelo
outro lado das suas transições demográficas, a principal preocupação demográfica do
século XXI acabará por se voltar para o envelhecimento da população (IIASA, 2012).
Alguns países já começaram a enfrentar esse processo. O envelhecimento da
população global, num futuro próximo, é um resultado direto das transições de
mortalidade e fecundidade que acompanharam a explosão populacional do século
passado (Lundquist, Anderton, Yaukey, 2015).

Com uma população mundial que triplica de 2 mil milhões para 6 mil milhões ao longo
do século 20, alcançando 7,2 mil milhões apenas 14 anos depois, não há tendência
demográfica mais óbvia do que o crescimento populacional. A população está
projetada para continuar a crescer no futuro, embora mais lentamente, nivelando-se
perto de 10,9 mil milhões de pessoas no século 22 (Nações Unidas, 2013).

A “explosão” populacional moderna não foi igualmente intensa em todo o mundo.


Tudo começou onde hoje são os países mais desenvolvidos. Eles experimentaram, com

8
https://www.iberdrola.com/sustentabilidade/evolucao-da-populacao
9
https://www.un.org/development/desa/pd/
10
https://data.worldbank.org/
11
https://www.prb.org/
12
https://ec.europa.eu/eurostat/
13
https://ourworldindata.org/
14
Ver https://www.unfpa.org/data/world-population-dashboard

253
a sua modernização, uma sequência de declínios nas taxas de mortalidade e natalidade
descrita como a transição demográfica. Alguns desses países, mesmo agora, têm uma
fecundidade abaixo do índice de reposição (Lundquist, Anderton, Yaukey, 2015).

De acordo com o relatório de Rodrigues e Henriques (2017), o atual contexto


demográfico da Europa é marcado por três fatores já referidos, de forma negativa em
termos de crescimento populacional: uma taxa de fecundidade inferior à necessária
para assegurar a reposição das gerações, conjugada com um aumento significativo da
longevidade e com os quantitativos migratórios insuficientes, agravando o quadro de
envelhecimento da população.

Na Europa, prevê-se que o crescimento populacional continue a diminuir, pelo menos


até 2050, e vários países tenham o seu declínio demográfico em cerca de 15% até
essa data (Bósnia, Bulgária, Croácia, Hungria, Letónia, Lituânia, República da Moldávia,
Roménia, Sérvia e Ucrânia).

A taxa de fecundidade em todos os países europeus é atualmente inferior à necessária


para atingir um limiar de renovação populacional a longo prazo (ou seja, uma média
de 2,1 filhos por mulher). Como refere o relatório de Rodrigues e Henriques (2017):
“Portugal não escapa a esta tendência europeia e os desafios populacionais integram o
leque dos maiores reptos colocados à sociedade portuguesa. Portugal encontra-se
numa verdadeira encruzilhada demográfica, caracterizada pelo envelhecimento da
estrutura etária da população residente, pela baixa taxa de natalidade e fecundidade e,
consequentemente, pelo aumento do índice de dependência, associado a fluxos
migratórios negativos e a fatores que não favorecem a tão desejada capacidade de
renovação das populações”.

No que respeita às grandes tendências da demografia em Portugal, o relatório


identificou as características e tendências seguintes: Portugal é um dos países mais
envelhecido do mundo; desde 2010 é um dos poucos países europeus com tendência a
ter, por vezes, os dois saldos (natural e migratório) negativos; e simultaneamente
apresenta um diferencial entre fecundidade real e desejada.

Por outro lado, Portugal é considerado um país com um bom acolhimento dos
imigrantes; fez elevados progressos ao nível da saúde pública, fazendo de Portugal um
dos países com melhores indicadores ao nível da mortalidade infantil e juvenil e da
esperança de vida; e teve uma evolução notável do nível de escolarização (Rodrigues,
Henriques, 2017).

254
9.2. DISTRIBUIÇÃO DA POPULAÇÃO

Os habitantes não estão distribuídos igualmente por todo o planeta. Algumas partes do
mundo são densamente povoadas, enquanto outras não. Seja olhando para o planeta
Terra, para África ou para os Estados Unidos, é claro que a população está longe de
estar distribuída igualmente. A maioria sabe que a população da China é de mais de
1,4 mil milhões e que a população dos Estados Unidos é de cerca de 340 milhões. No
entanto, muitos podem não estar cientes de que a China e os Estados Unidos são
muito próximos em tamanho geográfico. Em alguns países, é mais provável que as
pessoas sejam rurais do que urbanas. Geralmente, no entanto, há um movimento
de urbanização em todo o mundo:

“Sem dúvida, a característica dominante da distribuição espacial nos Estados Unidos e


em outros países desenvolvidos é a concentração da população em áreas urbanas
densamente povoadas” (Poston e Bouvier, 2017, p. 365).

Apenas cerca de um terço da superfície da Terra é habitada permanentemente. Áreas


como o Ártico e a Antártica, bem como os vastos desertos, por exemplo o Saara, têm
muito poucas pessoas. A situação é semelhante quando as montanhas escarpadas
tornam quase impossível a sobrevivência dos humanos. A distribuição geográfica da
população global concentra-se no Sul da Ásia (principalmente Índia) e no Leste
Asiático (principalmente China), sendo estas as regiões mais populosas do mundo, e a
Oceânia (principalmente a Austrália) a menos populosa. Hoje, sete países têm
populações que ultrapassam 200 milhões e são liderados pela Índia e pela China (em
1930, a Grã-Bretanha, França, Alemanha e Itália estavam entre as dez maiores nações
do mundo).

As mudanças demográficas desde então refletem o rápido crescimento nas nações em


desenvolvimento e o crescimento lento e até em declínio em muitas das nações
desenvolvidas.

Outra forma de considerar este fenómeno é através do conceito de densidade


populacional, ou seja, o número de pessoas por quilómetro quadrado. A densidade
populacional mundial é de cerca de 50 pessoas por quilómetro quadrado. A densidade
dos Estados Unidos é de cerca de 37 e a da China, de 149, e a da India, de 480. A
Europa Ocidental é muito mais densamente povoada do que a Ásia Ocidental, e o
Leste Asiático é a mais densamente povoada e a mais populosa de todas as regiões.
Nos Estados Unidos, vastos territórios dos estados montanhosos são escassamente
habitados em comparação com o Nordeste e os territórios da Costa Oeste.

255
Diferenciação em termos de ocupação territorial que também existe, de forma
acentuada, em países como a Rússia e a Austrália.

A medida de densidade populacional usada é uma medida rudimentar porque divide o


número de pessoas na população pelo número de quilómetros quadrados (ou milhas)
de território no país ou área. Uma alternativa e talvez uma medida mais significativa e
precisa usa a quantidade de área de terra arável como denominador. Uma dessas
medidas é a densidade fisiológica, que é calculada dividindo o número de pessoas no
país pela quantidade de terras aráveis do país (em quilómetros quadrados ou milhas).

Muitos fatores influenciam a distribuição da população, incluindo fatores geográficos


(clima, terreno e solos, recursos naturais), fatores económicos, sociais e políticos (o
tipo de atividade económica e a forma de organização social) e fatores demográficos
(principalmente as taxas de mudança populacional devido aos três processos de
fecundidade, mortalidade e migração). Esses fatores continuam a contribuir para a
distribuição da população mundial, alguns mais do que outros (Poston e Bouvier,
2017).

9.2.1. Distribuição geográfica e urbanização

Ao observar a distribuição da população, é costume os demógrafos examinarem as


percentagens das populações que vivem em áreas rurais e urbanas. A economia das
áreas rurais tende a ser predominantemente agrícola em comparação com as áreas
urbanas, que são mais diversificadas e não agrícolas. Os sociólogos há muito apontam
que os estilos de vida tendem a ser diferentes em áreas rurais e urbanas.
Normalmente, existem diferenças demográficas acentuadas entre as áreas rurais e
urbanas. A fecundidade é geralmente mais alta nas áreas rurais do que nas urbanas. O
nível de escolaridade geralmente é menor nas áreas rurais. Nas nações
industrializadas, muitas das diferenças entre o rural e o urbano foram reduzidas devido
à difusão dos media modernos e à rápida comunicação. Mas as diferenças ainda são
muito aparentes nas nações menos desenvolvidas do mundo. Ao longo da maior parte
da história, os humanos foram moradores rurais. Depois da Revolução Agrícola, muitos
ainda viviam em quintas, mas não precisavam mais de andar à procura de alimento e
abrigo. A verdadeira urbanização ocorreu após a Revolução Industrial na Europa
Ocidental e nas suas colónias (Poston e Bouvier, 2017, p 370).

A urbanização em grande escala (mudanças na proporção de pessoas que moram nas


cidades) é um desenvolvimento moderno.

256
A urbanização refere-se à percentagem da população de uma região ou país que vive
numa área urbana. O crescimento urbano refere-se a um aumento no número de
pessoas que vivem nas áreas urbanas. A partir de 1900, a rápida urbanização começou
em muitas partes do mundo. As Nações Unidas definem aglomeração urbana como
uma área urbana de pelo menos 1 milhão de habitantes, incluindo todos os habitantes
do território circundante que vivam em níveis urbanos de densidade residencial (Poston
& Bouvier, 2017).

As cidades surgiram pela primeira vez na China há mais de 2 mil anos. Para que a
urbanização e as cidades se desenvolvessem tinha de haver um excedente de produtos
agrícolas, um meio de transporte desses produtos para as áreas urbanas, para serem
processados em alimentos, roupas e abrigo, uma tecnologia suficientemente
desenvolvida nas áreas urbanas para usar os produtos agrícolas e criar empregos para
o habitante urbano.

Os Estados Unidos servem de exemplo de como os impactos da Revolução Industrial


contribuíram para o crescimento das cidades, principalmente do meio de transporte
disponível. No início do século XIX, a água era a principal fonte de transporte. Depois
veio a era da rede ferroviária no século XIX. Isso abriu mais áreas para o crescimento
urbano. O automóvel e a construção do sistema de autoestradas também contribuíram
para esse crescimento urbano. Em 1800, apenas 3% da população mundial era
classificada como urbana. Como as mudanças tecnológicas e económicas criaram
grandes excedentes agrícolas, as pessoas começaram a migrar para as cidades em
busca de empregos nas fábricas - a urbanização estava em andamento. Em 1950, 29%
de todos os residentes viviam em áreas urbanas. Em 2014, 54% de todos os
habitantes do mundo foram classificados como urbanos.

Embora o mundo tenha-se virado em direção à urbanização ao longo da história, a


industrialização desencadeou uma explosão urbana. As regiões mais desenvolvidas
industrializadas começaram as suas explosões urbanas, antes das outras. Atualmente
as regiões menos desenvolvidas estão a crescer a um ritmo acelerado de urbanização.
O crescimento da população urbana supera em muito o da população rural. Além
disso, podemos esperar maiores e mais megacidades e corredores urbanos no futuro
próximo que podem ser encontrados nas regiões menos desenvolvidas.

A migração foi sempre a principal causa demográfica da urbanização e continua a ser.


Há uma preocupação generalizada nos países menos desenvolvidos sobre as
consequências da migração massiva do meio rural para o urbano (dentro e fora dos
países).

257
A pressão constante e imediata do rápido crescimento urbano pode mascarar outros
benefícios. As políticas de migração para controlar este fluxo de migração rural-urbana
têm tido pouco efeito. Uma razão para a ineficácia das políticas de migração é a forte
expetativa de muitos migrantes de que a cidade oferece um futuro mais promissor,
independentemente dos custos imediatos da migração. Outra razão pela qual as
políticas de migração têm pouco impacto é que muitas vezes entram em conflito com
políticas de desenvolvimento económico que encorajam o crescimento económico
contínuo nas áreas urbanas, o que por sua vez reduz a procura de mão-de-obra
agrícola nas zonas rurais. As políticas que enfatizam a sustentabilidade do crescimento
nas cidades estão agora a desenhar um planeamento urbano estratégico nas regiões
menos desenvolvidas. Enquanto as regiões menos desenvolvidas estão preocupadas
com a alta velocidade do crescimento metropolitano, as regiões mais desenvolvidas
experimentaram uma grande desconcentração urbana.

A tendência é para a suburbanização e mudanças regionais nas atividades industriais e


oportunidades de emprego. A suburbanização envolve a fuga de residentes mais
abastados das cidades bem como o surgimento de outras cidades e subúrbios
metropolitanos.

No início do século XXI, houve sinais de um ligeiro movimento de reurbanização de


volta à vida na cidade. No entanto, a recessão global de 2007-2009 levou à estagnação
no crescimento e nos movimentos populacionais regionais.

A tendência global em direção à urbanização - tanto nas cidades centrais quanto nos
subúrbios - ao longo do século XXI é provável que continue a aumentar e uma
percentagem crescente da população mundial viverá a experiência urbana (Poston e
Bouvier, 2017).

Para além da distribuição geográfica e da urbanização, a distribuição da população


pode ser classificada de acordo com o seu nível de desenvolvimento económico,
através de dois indicadores, o rendimento per capita e o consumo de energia per
capita.

Cada medida produz resultados semelhantes em relação à distribuição da população.


Menos de 20% da população mundial reside nas regiões mais desenvolvidas
economicamente. Espera-se que essa proporção diminua no futuro. Em 2050, pode
estar abaixo de 15% porque as taxas de crescimento populacional são maiores nas
regiões em desenvolvimento do que nas regiões mais desenvolvidas. A migração em
massa das regiões em desenvolvimento para as regiões mais desenvolvidas é
improvável devido às barreiras políticas erguidas por algumas regiões ou países, para

258
impedir tais movimentos internacionais. No entanto, e apesar das muitas e variadas
limitações, estima-se que um grande número de pessoas, cerca de 30 a 35 milhões,
esteja a mudar-se de um país para outro, ainda que possam fazê-lo de forma irregular,
como também já foi abordado (Poston e Bouvier, 2017).

9.3. POLÍTICAS DE POPULAÇÃO

May (2012) descreve as políticas de população como “as ações tomadas explícita ou
implicitamente pelas autoridades públicas para prevenir, atrasar ou lidar com os
desequilíbrios entre as mudanças demográficas, por um lado, e os objetivos sociais,
económicos e políticos, por outro”(May, 2012, p.42).

Segundo a definição da Encyclopedia of Population (Demeny e McNicoll, 2003 citado


em Grupo Foz, 2021), uma política de população trata de “arranjos institucionais
deliberadamente construídas ou modificadas e/ou programas específicos pelos quais os
governos, direta ou indiretamente, influenciam a mudança demográfica” (Demeny e
McNicoll, 2003 conforme citado em Grupo Foz, 2021, p.86). Os dois elementos da
segunda definição que precisam de ser destacados são a intenção explícita de
influenciar os processos demográficos e a atuação do estado para alcançar os objetivos
desejados. Este segundo aspeto exclui políticas fora do domínio público. Por exemplo,
as práticas (aliás ilegais) de empresas de preferir funcionárias solteiras ou que não
pretendem ter filhos no futuro próximo, para evitar o pagamento de benefícios de
maternidade, podem ser consideradas políticas internas de manejo de pessoal que têm
repercussões demográficas, mas não são políticas de população no sentido anterior.

As políticas de população podem servir interesses de uma comunidade ou de um país


expressos nos seus planos e projetos de desenvolvimento social, humano e económico.
O caso das políticas relacionadas com as migrações15 ou com a natalidade são um bom
exemplo. Atualmente também os governos enfrentam inúmeros desafios populacionais
relacionados com o envelhecimento e a longevidade das populações.

Uma política populacional é um programa deliberadamente construído através do qual


os governos influenciam, direta ou indiretamente, as mudanças demográficas. Estes
programas no interesse da sobrevivência nacional são medidas legislativas, programas
administrativos e outras ações governamentais com o propósito de alterar ou modificar
algumas tendências populacionais e o bem-estar.

Ver Capítulo 8.
15

259
As políticas populacionais são geralmente entendidas como representativas de
estratégias para governos, ou às vezes, embora com menos frequência, para
organizações não-governamentais (ONGs), no sentido de atingir objetivos específicos.

Os países que apresentam condições demográficas de crescimento muito alto ou muito


baixo costumam desenvolver políticas cujos objetivos são tentar restaurar o equilíbrio
demográfico (Poston e Bouvier, 2017).

Geralmente os governos influenciam indiretamente o comportamento demográfico.


Mas, muitas vezes, a mera legislação ou propaganda é insuficiente para atingir o
objetivo pretendido. Nestes casos, os governos irão agir diretamente para aumentar ou
diminuir os níveis de fecundidade ou para forçar as pessoas a mudarem-se ou não.

A tarefa de formular uma política populacional é complicada porque pode haver


alguma discordância quanto à magnitude do problema de crescimento ou declínio
populacional.

A questão do crescimento da população humana como um problema ou questão


preocupante é realmente um fenómeno do século XX. Durante o século XVIII, Malthus
declarou que a sobrepopulação era limitada pela natureza. Mas foi somente na década
de 1960 e no início da década de 1970 que o público tomou consciência do problema.
A partir da década de 1970, houve um debate considerável nos círculos académicos,
com muitos defendendo o planeamento familiar voluntário.

Em 1965, o presidente Lyndon Johnson estabeleceu um Gabinete de População no


Departamento de Estado e a Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento
Internacional (USAID). O objetivo da USAID era convencer os governos dos países em
desenvolvimento a promover o uso de contracetivos entre os seus cidadãos. E os
Estados Unidos trabalharam com as Nações Unidas para ajudar a criar, em 1969,
o Fundo das Nações Unidas para a População (FNUAP). O FNUAP serviu como uma
importante fonte de recursos para iniciativas populacionais em países em
desenvolvimento. Posteriormente, três conferências mundiais sobre a população foram
realizadas em 1974, 1984 e 1994 e emolduraram a história do planeamento familiar
internacional que se desenvolveu desde os anos 1970.

A Primeira Conferência Mundial da População foi realizada em Bucareste,


Roménia em 1974. Organizada por membros da ONU, foi uma tentativa de reunir
funcionários do governo de todo o mundo e demonstrar os factos e as consequências
do rápido crescimento populacional (problema populacional). Em vez disso, a maioria
das nações em desenvolvimento enfatizou a sua preocupação com a importância do
desenvolvimento socioeconómico. Clamavam por uma “Nova Ordem Económica” cuja

260
posição estava resumida na expressão “O desenvolvimento é o melhor contracetivo”. A
Conferência de 1974 em Bucareste ficou dividida entre os que visavam o controlo da
reprodução e os que defendiam o desenvolvimento socioeconómico. No contexto da
Guerra Fria, os países capitalistas mais ricos, capitaneados pelos Estados Unidos,
defendiam a conceção neomalthusiana de reduzir a fecundidade para promover o
desenvolvimento e a erradicação da pobreza. Mas a União Soviética e os países do
Terceiro Mundo, liderados pela China e pela Índia, defendiam a prioridade do
fortalecimento das políticas de apoio ao desenvolvimento em contraposição ao controlo
da natalidade e ao planeamento familiar.

A Segunda Conferência Mundial da População foi realizada na Cidade do México


em 1984. Muitos países em desenvolvimento mudaram as suas opiniões sobre o
crescimento populacional e estavam interessados em assistência direcionada para os
seus programas de planeamento familiar incipientes. Um programa de planeamento
familiar é um esforço sistemático para promover o controlo moderno da fecundidade.
Nessa altura, a China comunista, que liderou o combate ao neomalthusianismo em
Bucareste, passou a adotar, a partir de 1979, a política de filho único, ou seja, a
política neomalthusiana mais draconiana da história. Os Estados Unidos, por outro
lado, sob a liderança do governo neoliberal de Ronald Reagan, abandonaram a defesa
do controlo da natalidade e passaram a defender o laissez-faire populacional, ou seja,
a não-intervenção estatal.

A Terceira Conferência Mundial da População ou a Conferência Internacional


sobre População e Desenvolvimento (CIPD), ocorreu em 1994 no Cairo. O principal
resultado foi uma nova definição de política populacional, dando destaque à saúde
reprodutiva e minimizando o olhar estritamente demográfico para a política
populacional. De acordo com o demógrafo John May (2012), a conferência do Cairo
“enfatizou a importância das escolhas individuais e a necessidade de dar poder ainda
mais às mulheres”. Também não houve uma posição "antipopulação" na Conferência
de 1994. A CIPD do Cairo ocorreu após o fim da Guerra Fria e foi a primeira a
incorporar a palavra desenvolvimento no seu título. Também incluiu os princípios da
Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, conhecida como
Rio-92, apontando a necessidade de os países adotarem políticas públicas no sentido
de promover o "crescimento económico sustentado no contexto de um
desenvolvimento sustentável". Se o consenso do Cairo apontou a necessidade da
estabilização do crescimento da população mundial, deu-se por razões evidentes de
que não é possível haver crescimento infinito num mundo finito, mas a CIPD não
marcou data nem criou os meios para concretizar tal objetivo. O ponto forte da CIPD

261
do Cairo foi a defesa dos direitos humanos e dos direitos reprodutivos. No capítulo II
do Programa de Ação estão explicitados os 15 princípios gerais da Conferência. O
princípio 1 reafirma os compromissos da Declaração Universal dos Direitos Humanos
de 1948. O princípio 2 diz que o ser humano é o elemento central do desenvolvimento
sustentável e tem o direito a uma vida sã e produtiva em harmonia com a natureza,
sendo que todos têm o direito a um nível de vida adequado para si e a sua família. A
CIPD definiu os direitos reprodutivos como sendo a liberdade de escolha das pessoas
para definir como, quando e quantos filhos querem ter (incluindo o direito à
fecundidade zero, evitando a maternidade forçada). A Conferência do Cairo defendeu o
direito à conceção e à anticoncepção, ficando a cargo dos cidadãos e cidadãs decidir,
livremente, sobre as opções de escolha.

As políticas de população que afetam a fecundidade, a mortalidade e a


migração

Antes do século XX, a maioria das políticas de fecundidade preocupava-se com o


aumento do crescimento populacional. Essas políticas geralmente eram de três tipos:
propaganda pró-natalista; medidas relacionadas à família, como programas de ajuda
às famílias e restrições à distribuição e uso de contracetivos e ao aborto.

No século XX, o movimento pró-natalista atingiu o seu auge na Alemanha, Itália e


Japão durante os anos entre a Primeira Guerra Mundial e a Segunda Guerra Mundial.
Países como França e Roménia adotaram políticas pró-natalistas em vários momentos
após a Primeira Guerra Mundial. Essas políticas representaram uma reação à baixa
fecundidade que acompanhou a modernização. Às vezes, os países adotam políticas
que têm efeitos pró-natalistas e antinatalistas (exemplo: França).

A determinação de diminuir o crescimento por meio da fecundidade reduzida foi muito


bem-sucedida. Esses esforços incluíram medidas indiretas, como melhores instalações
para saúde e educação. Da mesma forma, houve países que adotaram programas de
incentivo para aumentar o número de crianças por família. Até hoje, é pouco evidente
o sucesso no aumento da fecundidade e o Índice Sintético de Fecundidade (ISF)
permanece muito abaixo do nível de reposição. Em 2013, o ISF da Coreia do Sul era
1,2 e o de Taiwan 1,1. A China, sem dúvida, tem uma das políticas populacionais mais
rigorosas da história da humanidade. Na verdade, uma das razões pelas quais a China
é um país tão interessante e intrigante para os demógrafos analisarem é precisamente
as suas políticas de natalidade. Outra razão é que na China os líderes políticos são
capazes de controlar o número anual de nascimentos com considerável precisão.

262
Na China, a política do filho único foi implementada em 1979, em que as famílias
chinesas só podiam ter um filho. No entanto, devido à quebra demográfica registada, o
governo chinês aprovou, no final de 2013, uma lei que permite dois filhos por casal,
em algumas situações.

Em alguns países em desenvolvimento, que apresentam um elevado crescimento


populacional, o que origina, por exemplo, graves problemas de escassez de recursos
naturais, existem algumas das seguintes medidas antinatalistas: autorização de
práticas de esterilização e aborto; aumento da idade média do casamento; incentivo à
política do filho único; divulgação do planeamento familiar e dos métodos
contracetivos; distribuição gratuita de métodos contracetivos; recurso à ajuda
internacional para financiar programas de planeamento familiar.

No entanto, a incapacidade financeira de muitos países põe em causa a implementação


eficaz destas medidas, assumem um caráter repressivo, limitando a sua aplicação. O
sucesso ou insucesso da sua aplicação depende da conjugação com políticas de
desenvolvimento económico e social, o peso da religião impede a generalização do uso
de métodos contracetivos e também de práticas de aborto.

A taxa de natalidade nos países desenvolvidos tem vindo a diminuir. Para alterar esta
situação foram criadas políticas natalistas. Uma política pró-natalista é a introdução de
berçários nas empresas de modo a facilitar a conciliação da vida profissional com a
maternidade. Outras medidas concretas são: diminuição dos impostos para as famílias
numerosas; aumento da licença de maternidade e extensão para a licença paterna;
aumento dos abonos de família; penalização do aborto; escolaridade obrigatória
gratuita; subsídios de nascimento; aumento de impostos para os jovens de uma certa
idade que ainda não tenham filhos; remuneração dos períodos de licença com base
nos vencimentos auferidos pela mulher na altura do parto; desenvolvimento de
sistemas de proteção social dos mais jovens - creches e jardins de infância -
comparticipados pelo Estado; horários de trabalho reduzidos e flexíveis.

Estas políticas demográficas natalistas visam aumentar a população de modo a torná-la


mais jovem. Em termos de resultados concretos, a eficácia da aplicação destas
medidas ainda se encontra em estudo, no entanto já permitiram inverter tendências
verificadas em muitos países desenvolvidos onde as taxas de natalidade registaram um
pequeno aumento, o índice sintético de fecundidade aumentou para valores próximos
da renovação de gerações, permitiram melhorias em termos de trabalho da mulher na
medida em que se traduziu um maior respeito pelos seus direitos.

263
Todavia, a situação atual em praticamente todos os países do mundo desenvolvido é
de taxas de fecundidade bem abaixo do nível necessário para repor a população. Essas
taxas baixas durante um longo período têm muitas consequências, das quais um
envelhecimento dramático da população e, consequentemente uma redução no
tamanho da população.

“As preocupações crescentes com o adiamento da fecundidade passaram rapidamente


a ser uma preocupação não só dos demógrafos, mas, também, dos próprios governos,
levando a alterações nas medidas de política dos diferentes países, de forma a adequar
as sociedades aos novos comportamentos, e também com o objetivo de incentivar o
aumento da do número de filhos nas famílias.” (Mendes & Tomé, 2010).

Assim, há a preocupação com a fecundidade abaixo da reposição nos países do mundo


desenvolvido. E a preocupação não é apenas com o declínio populacional, mas
também com o envelhecimento da população como resultado da baixíssima
fecundidade.

O desenvolvimento de políticas pró-natalistas em tais países é difícil de


promover. Hoje, as políticas de planeamento familiar são baseadas numa lógica de
igualdade de oportunidades e visam ajudar as mulheres a combinar a criação dos filhos
com o emprego. Alguns países implementaram políticas de fecundidade envolvendo
incentivos financeiros para cada filho nascido, políticas liberais de licença parental e
garantia de cuidados infantis e escolaridade para as crianças. Em suma, as políticas de
fecundidade variam em todo o mundo, e isso acontece há décadas. Em algumas
regiões, as taxas de natalidade são altas; em outras, são baixas. As agências
governamentais e não-governamentais têm tentado restaurar algum equilíbrio
demográfico nas respetivas sociedades.

Em relação à mortalidade, alguns demógrafos sustentam que as políticas relacionadas


com a mortalidade não devem ser consideradas políticas diretas de população. A
redução da mortalidade deve ser a meta de todos os governos, mesmo daqueles que
desejam reduzir as suas taxas de crescimento populacional. As políticas de combate à
mortalidade que recebem mais atenção são aquelas que apoiam o desenvolvimento do
conhecimento médico com potencial para expandir a esperança de vida. As políticas
governamentais podem contribuir diretamente para reduzir a mortalidade. Todos os
países desenvolvidos do mundo, com exceção dos Estados Unidos, oferecem, de algum
modo, assistência médica gratuita ou subsidiada a todos os seus cidadãos. Se
aceitarmos o facto de que existem medidas ou políticas governamentais que
contribuem para o declínio da mortalidade, devemos também aceitar o facto de que

264
algumas políticas governamentais podem levar ao aumento da mortalidade. Medidas
que colocam em risco a saúde, embora não intencionalmente, acabarão por aumentar
a mortalidade (Poston e Bouvier, 2017).

Relativamente às migrações, ao longo da maior parte da história humana, as pessoas


foram livres para se movimentar em busca de uma vida melhor. Essa liberdade de
movimento internacional foi significativamente restringida desde o final do século XIX,
em algumas regiões do mundo. Muitos países introduziram leis que infringem a
liberdade de circulação da migração internacional. Ao mesmo tempo, alguns governos
tomaram medidas para incentivar o movimento para algumas áreas e para fora de
outras. Alguns países encorajam a imigração, a fim de aumentar o tamanho de sua
população.

Hoje, no mundo desenvolvido, existem três tipos principais de regimes nacionais de


imigração. O primeiro regime é o denominado regime tradicional de imigração. Os
Estados Unidos, Canadá e Austrália são os três países tradicionais de imigração mais
importantes e consideráveis. O número de pessoas legalmente admitidas nesses três
países é classificado em termos de unificação familiar, necessidades económicas do
país e refugiados.

O segundo tipo de regime de imigração nacional é a categoria de países que permitem


principalmente a entrada de imigrantes como trabalhadores convidados. Estes são
principalmente “países europeus que recrutaram mão-de-obra temporária
(trabalhadores convidados) ou receberam migração colonial substancial durante as
expansões económicas pós-Segunda Guerra Mundial” (Freeman, 2003 conforme citado
em Poston & Bouvier, 2017, p. 405).

O terceiro tipo de regime de imigração são os países do sul e do leste europeu “que
têm mais probabilidade de receber do que de enviar migrantes” (Freeman, 2003
conforme citado em Poston & Bouvier, 2017, p. 405). Os quatro países mais
proeminentes nesta categoria são Grécia, Espanha, Portugal e Itália.

A migração, talvez, pudesse ser usada como um meio de repor a população perdida
com a baixa da fecundidade. Por exemplo, as projeções populacionais preparadas para
a Coreia do Sul, nas próximas décadas, indicam que os números absolutos e relativos
das populações mais velhas aumentarão muito. Sendo a migração internacional,
apresentada como uma estratégia que permitirá à Coreia do Sul trazer membros para a
sua população direta e imediatamente.

Em Portugal, recentemente, com os resultados dos Censos 2021, o Governo incorporou


na agenda política a demografia para definir e ajustar as políticas, de modo a

265
responder ao desafio demográfico da redução de população. O Governo afirmou que a
capacidade para atuar sobre as diferentes frentes da equação demográfica será
determinante para minimizar as consequências das tendências atuais. A demografia foi
identificada pelo Governo como um dos quatro desafios estratégicos da próxima
década, acrescentando que a situação atual impõe ainda medidas de promoção do
envelhecimento ativo e saudável.

Sobre a diminuição na natalidade em Portugal, o trabalho do Governo deverá passar


por medidas de promoção da natalidade, para que as pessoas possam ter os filhos que
desejam (fecundidade esperada é de 1,69, enquanto a desejada é de 2,15); de
combate à precariedade no emprego e na habitação; de conciliação entre a vida
pessoal, familiar e profissional e na área das migrações. Neste âmbito, destaca-se,
entre as várias medidas tomadas pelo Governo, a gratuitidade das creches para todas
as crianças do primeiro e do segundo escalão de rendimentos e dos manuais escolares,
a criação de mais 5.500 lugares em creches e 7.000 vagas no pré-escolar e os
aumentos extraordinários das pensões mais baixas e do complemento solidário para
idosos.

No âmbito da migração - cujos Censos 2021 referem que a mesma não foi suficiente
para compensar a redução da população portuguesa - as medidas tomadas pelo
Governo deviam garantir que, durante a pandemia, os imigrantes não perdem-se
acesso aos seus direitos, a criação de uma nova plataforma, que permitiu até à data, a
renovação automática de 128 mil títulos de autorização de residência, da
funcionalidade NISS na hora que abre portas ao processo de regularização.

É fundamental também corrigir as fortes assimetrias territoriais que têm conduzido, ao


longo dos anos, ao envelhecimento e desertificação dos territórios do interior e à
concentração de pessoas nas áreas metropolitanas. Este é um problema complexo que
exigirá um enorme compromisso e trabalho por parte do poder central e local, das
empresas e da sociedade em geral, conforme referiu o Governo português (República
Portuguesa, XXII Governo, 2021).

Muitos governos aprovaram leis e regulamentos que lidam com os seus níveis de
fecundidade, mortalidade e migração. Mas as políticas, quaisquer que sejam as suas
intenções e razões para a sua génese, nunca terão sucesso a menos que levem em
consideração o meio social, cultural e económico em que ocorre o comportamento
demográfico, e a menos que considerem os seus efeitos indiretos e diretos (Poston e
Bouvier, 2017).

266
ATIVIDADE FORMATIVA

1. Como é que a população está distribuída no mundo. Quais são as consequências


dessa distribuição da população?

2. Descreva cada uma das três Conferências da População Mundial realizadas em


1974, 1984 e 1994. Qual era o foco pretendido de cada conferência e o que cada
conferência alcançou?

3. Quais são os grandes desafios que os governos têm para enfrentar, ao nível da
redução de população, nomeadamente a descida da natalidade, os movimentos
migratórios e o envelhecimento da população (e o respetivo aumento da longevidade)?

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