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TREINAMENTO E
GESTAO DA -
QUALIDADE
PALAVRAS-CHAVE:
Qualidade, recursos humanos, treinamento, polivalência, desenvolvimento
gerencial, montadoras.
KEYWORDS:
Quality. human resources, training, multifuncional workers, management deve-
lopment, autoparts firms.
Revista de Administração de Empresas São Paulo, v. 35, n.3, p. 13-19 Mai./Jun. 1995 13
EXECUTIVA
H
á um certo consenso presente tan- meio de questionários e de entrevistas
to nas referências de caráter mais abertas com vários níveis gerenciais. Em
normativo de gestão da qualidade! média, foram entrevistadas sete pessoas
quanto nas de natureza mais acadêmica- em cada empresa. En1 todos os casos as
de que o sucesso de um programa de qua- entrevistas foram seguidas de uma ou
lidade não depende unicamente da intro- mais visitas ao chão de fábrica. Construiu-
dução de técnicas estatísticas ou equipa- se uma base de indicadores, baseados nos
mentos avançados de produção / ensaio / critérios do Prêmio Nacional da Qualida-
controle, mas também, e, talvez principal- de, para avaliar a gestão da qualidade e a
mente, de profundas transformações ge- organização do treinamento nas empresas.
renciais. Entre estas últimas, citam-se Além desses dados, a pesquisa levantou
freqüentemente as mudanças na área de um histórico detalhado da implementação
gestão de recursos humanos. Apesar des- dos programas de qualidade em cinco
se consenso, ainda não foi suficientemente empresas da amostra. Foi graças a essa
estudada a maneira como se dá a interação análise mais profunda que se pôde obser-
entre a gestão de pessoal e o programa de var melhor a interação entre o treinamen-
qualidade de uma empresa. Permanece a to e os resultados obtidos com os progra-
questão básica quanto à maneira como as mas de qualidade.
várias funções ligadas à gestão de recur-
sos humanos podem afetar os resultados RESULTADOS OBSERVADOS
de um programa de qualidade.
O treinamento é provavelmente a fun- Situação geral do treinamento: levanta-
ção de gestão de pessoal mais destacada mento de necessidades e avaliação
na literatura teórica e prática sobre melho- Alguns critérios iniciais que permitem
1. DEMING, W E. Oústity, pro- ria da qualidade. Uma hipótese básica é apreciar a importância conferida ao trei-
ductivity and competitive
position. Cambridge, MA: MIT
que a organização sistemática do treina- namento pelas empresas são mostrados na
Center for Advanced Enginee- mento é um fator importante para o su- tabela P. Pode-se observar ai que é
ring Study, 1982; JURAN, J. M. cesso de um programa de melhoria da significante (quase um terço) o número de
Juran on planning for quality
New York: Free Press, 1988; qualidade. O que nos interessa explorar empresas que ainda não quantifica o mon-
FEIGENBAUM, A. V. Total que- aqui são as maneiras como a organização tante gasto em treinamento. Isso nos leva
lity controi. New York: Mc- do treinamento afeta a implementação e o a questionar até que ponto as empresas
Graw-Hill, 1983.
desempenho de programas de qualidade consideram o treinamento uma atividade
2. GARVIN, D. Managing qua- numa empresa. estratégica",
lity - the strategic and com-
petitive edçe. New York: Free
Press, 1988; HILL. S. How do Tabela 1
you manage a flexible firm? The
total quality model. Work. Em- Situação geral do treinamento
ployment and Society, v. 4, n. Foram selecionadas 19 empresas fabri- Empresa N.E.*
3, p. 397-415, __ . Why qua- cantes de autopeças para compor a amos- ACompanha gasto com 13
lity circles failed but total quality tra da pesquisa. Essa amostra não foi es- treinamento
control might succeed, London
School of Economics (mimeo). colhida de forma aleatória. Procuraram-se Faz levantamento sistemático 9
empresas que fossem fornecedoras de pri- das necessidades de treinamento
3. As tabelas 1 a 5 apresentam Monitora eficácia do treinamento 10
o número de empresas da
meira linha das montadoras, uma vez que
amostra onde cada um dos era de se esperar que nelas fosse mais in- *N.E: Número de empresas.
itens listados foi encontrado. tensa a preocupação com qualidade em
Como muitas empresas utiliza-
vam mais de um dos itens lis- função da pressão exercida por esse tipo Chamou a atenção o fato de que mais
tados nessas tabelas, o soma- de cliente. A idéia também foi trabalhar da metade das empresas da amostra não
tório da segunda coluna exce- com empresas com processos produtivos atendia ao requisito presente tanto no Prê-
de o número de observações da
amostra (19 empresas). semelhantes, de modo que a natureza dis- mio Nacional da Qualidades quanto nas
tinta dos processos não influísse nos re- normas ISO 9000 de realizar um levanta-
4. HOLDEN,L. European trends
in training and development. sultados obtidos. Concentrou-se, assim, a mento sistemático das necessidades de
Intemational Joumal of Hu- amostra entre empresas metal-mecânicas treinamento de seus empregados (ver ta-
man Resource Management, v. com produção seriada e em massa. Todas bela 1). Menos da metade das empresas
2, n. 2, p. 113·31, 1991.
as empresas estavam introduzindo progra- (nove), de fato, realizava um trabalho de
5. FUNDAÇÃOPARAO PRÊMIO mas de qualidade quando foram contac- levantamento formal das necessidades de
NACIONAL DA QUALIDADE. tadas, embora os estágios atingidos fossem treinamento. Nas demais, os próprios ge-
Critérios de Excelência - o es-
tado da arte da gestão da qua- distintos. rentes de recursos humanos reconheciam
lidade total, São Paulo, 1983. As informações foram coleta das por que o treinamento tinha um caráter reati-
vo, sendo ministrado apenas em resposta sabilidades pela qualidade aos trabalha-
a problemas severos ou recorrentes'. dores da produção sem propiciar os meios
Nas nove empresas, nas quais as neces- necessários (treinamento) para que eles
sidades de treinamento foram diagnosti- possam efetivamente controlar a qualida-
cadas, os procedimentos mais usuais para de do que produzem. No que se refere à
esse fim eram informais (ver tabela 2): re- escolaridade, o primeiro ponto a ser ob-
quisições dos funcionários e da gerência servado é que a maioria das empresas não
de linha. Apenas uma empresa procurava possuía um acompanhamento sistemáti-
elaborar seu programa de treinamento a co da escolaridade de seu pessoal. Isso é
partir da análise de seu plano de negócios. grave, à medida que informações sobre
As auditorias de treinamento só foram escolaridade são um dado básico para ali-
encontradas em cinco empresas. O proble- mentar um programa de treinamento.
ma do uso exclusivo desses procedimentos Existe, contudo, um certo consenso entre
informais é que se produz uma avaliação o pessoal de recrutamento da maioria das
pouco sistemática de como o treinamento empresas de que, com o avanço dos pro-
pode ir ao encontro do planejamento estra- gramas de qualidade, haveria uma tendên-
tégico da empresa, aí incluídos os seus es- cia a elevar a escolaridade formal da mão-
forços na área de melhoria da qualidade'. de-obra. Algumas empresas já estavam
exigindo requisitos mínimos de escolari-
Tabela 2 dade (1 º e, até mesmo, 2º grau) para a
contratação de pessoal. Além disso, as de-
Métodos utilizados para levantar
necessidades de treinamento missões recentes tinham se concentrado
l\ilétodos N.E. nos funcionários analfabetos ou com me-
Análise dos planos de negócios 1 nor nível de escolaridade. Finalmente,
Auditorias de treinamento 5 quanto ao item c das 16 empresas que ti-
Requisições da gerência de linha 9 nham esse dado, i{7,5% tinham menos de
Avaliação de desempenho 5 cinco dias/ ano de treinamento para os tra-
Requisições dos funcionários 7 balhadores da produção, 12,5% tinham en- 6. Numa das empresas, por
exemplo, o treinamento em Ma-
tre cinco e dez dias e nenhuma mais do temática e Estatística básica
Quando se observa o comportamento que isso. Holden? encontrou para o Reino para os operadores da produ-
Unido (país que tem uma das médias mais ção só foi realizado quando o
dos gastos com treinamento nas empresas departamento de controle da
que possuem esse dado, verifica-se que as baixas da Europa) os seguintes dados para qualidade informou à direção
maiores ampliações ocorreram no treina- as categorias respectivas: 81,13 e 6%. Isso que o programa de implemen-
tação do Controle Estatístico de
mento gerencial e no treinamento dirigi- é grave, pois no Brasil parte-se de uma ba- Processo corria o risco de fra-
do ao pessoal semi e não-qualificado da se de escolaridade formal bem mais bai- cassar em função da incapaci-
produção. De certo modo, isso aponta para xa, e, além disso, a amostra é composta ba- dade geral do pessoal de pro-
dução de preencher as cartas de
o fato de que as empresas estão conscien- sicamente de empresas líderes do setor de controle.
tes das novas exigências feitas aos geren- autopeças (o que deve retratar, pois, um
quadro otimista da situação do treinamen- 7. HOLDEN, L Does strategic
tes por um sistema de Gestão da Qualida- training policy exist? Some
de Total. A ampliação do gasto em treina- to industrial no país). Já para o treinamen- evidence from ten European
mento para os trabalhadores da produção to gerencial, a média de dias nas empre- countries. Persannel Review, v.
21, n. 1, p. 12-23, 1992.
decorre dos seguintes fatores: a. a sas da amostra não está muito defasada
efetivação dos programas de qualidade em relação ao quadro europeu. O fato de 8. REITSPERGER, W O., DA-
25% das empresas em posse da informa- NIEL, S. J. Dynamic manufac-
envolvendo a noção de autocontrole e o turing: a comparison of attitu-
aumento da responsabilidade para o pes- ção dedicarem mais de dez dias/ ano ao des in the US and Japan. Ma-
soal de produção exige uma ampliação da treinamento gerencial é especialmente sig- nagement Internatianal Re-
view, v. 30, n. 3, p. 203-216,
qualificação desse pessoal; b. a base de nificativo. 1990; TRIBUS, M. Prize-win-
escolaridade formal do pessoal de produ- É pequeno também o número de empre- ning Japanese firms' quality
ção das empresas é bastante fraca compa- sas que realiza um acompanhamento dos management programs pass
inspection. Management Re-
rada com a de países industrializados; c. resultados dos treinamentos ministrados view, p. 31-7, Feb. 1984; GAR-
a média de treinamento dedicada a esse (ver tabelas 1 e 3). Algumas, porém, já in- VIN, O. Quality problems, poli'
troduziram formas mais elaboradas de cies, and attitudes in the United
pessoal pelas empresas da amostra ainda States and Japan: an explora-
é baixa. avaliação da eficácia do treinamento. Em tory study. Academyaf Mana-
Em relação ao item a existe evidência outros casos, a única inovação verificada gement Journal, v. 29, p. 653-
tendia a ser um sistema melhorado de 73,1986.
na literatura" de que grande parte dos in-
sucessos dos programas de qualidade de- armazenamento dos dados de treinamen- 9. HOLDEN, L. Does strategíc
ve-se ao fato de a empresa exigir respon- to. Existem vantagens associadas a um training policy ... Op, cít,
área adotaram um sistema de carreiras dos quais as competências gerenciais são 20. STOREY, J. ou cit.
Artigo recebido pela Redação da RAE em fevereiro/1995, avaliado e aprovado para publicação em março/1995. 19