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ARTIGO: Regime de Bem-estar Social no Brasil: Três Períodos Históricos, Três Diferenças em Relação ao Modelo Europeu Social-democrata
Regimen of social welfare in Brazil: three historical periods, three differences with the European social
democratic model
Resumo
O regime de bem-estar social no Brasil pode ser comparado com o modelo social-democrata europeu em três períodos históricos,
apesar das especificidades e diferenças que aqui adquiriu. No período 1930-1964, serão abordadas a importância da concepção de
cidadania regulada para a definição de direitos sociais no Brasil e a comparação com o desenvolvimento da cidadania nacional e o
papel dos sindicatos no welfare state na Europa. No período 1964-1985, será apresentada a forma como se estruturou a política social
do regime militar, enquanto, na Europa, havia um ambiente democrático, com direitos sociais universais e participação social como
bases do regime de bem-estar social. No período após 1985, com ênfase na fase da segunda reforma social iniciada pós-Plano Real
(1994), será destacada a visão mais generosa e universalizante de direitos sociais. Para esse período, será importante apontar como,
na Europa, nesse momento, se questionaram as bases materiais e a concepção do welfare state, visando, ao mesmo tempo, revisar
alguns fundamentos para mantê-lo como padrão de solidariedade social.
Abstract
The social welfare system in Brazil can be compared with the European social democratic model in three
historical periods, despite the specificities and differences. The period of 1930-1964 will address the
importance of the concept of citizenship regulated to the definition of social rights in Brazil and compare it
with the development of national citizenship and the role of trade unions in the welfare state in Europe. The
period of 1964-1985 will present the structure of the military regime’s social policy while in Europe there was
a democratic environment with universal social rights and social participation as the basis for the system of
social welfare. The period after 1985, with emphasis on the second phase of social reform initiated after the
Real Plan (1994), will highlight the more generous and universalizing vision of social rights. This period will
be important to compare as Europe, at that time, questioned the material foundation and the design of the
welfare state while aiming to review some grounds to keep it as a pattern of social solidarity.
Key words: Citizenship – Rights – Equality – Democracy - Inequality.
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Se esse mesmo modelo for utilizado para para consolidar a cidadania nacional e a
se analisar a evolução dos direitos sociais participação na comunidade política. No
no Brasil, contudo, nada parece confirmar Brasil, com a exclusão dos analfabetos
a mesma trajetória de desenvolvimento. do direito de votar até 1985, não foi com a
Sobretudo, como será visto, houve um grande educação política pública universal que se
atraso histórico para o País se aproximar da constituiu a cidadania. Educação e direito de
trilha da universalização dos direitos. Antes voto tiveram um peso menor na construção
de garantir direitos mínimos para amplas da “cidadania nacional” 2.
parcelas da população, criou-se um sistema
que aprofundou a desigualdade social Na Europa, sobretudo na Inglaterra, a
e a exclusão, pautado por incorporação expansão da indústria influenciou a ação
meramente formal, ainda que legalmente política da classe trabalhadora em busca
amparada. Esse modelo, iniciado após 1930, de direitos sociais. No Brasil, com a
ao se basear na estratificação funcional industrialização, apenas os estratos inseridos
com base no mercado de trabalho, só fez no mercado de trabalho tiveram direitos
ampliar os níveis de desigualdade real entre reconhecidos. Antes de universalização,
setores da sociedade. No Brasil, pelo menos houve a construção de uma comunidade
até meados da década de 1980, o status política “regulada” pelo Estado e restritiva, ao
formal de cidadão e sua situação social real conferir direitos como tradução da ocupação
alimentaram, assim, uma lógica marcada funcional no mercado de trabalho (SANTOS,
por baixos níveis de inclusão dos indivíduos. 1979)3. Não houve luta política dos “de baixo”
É sob esse enfoque comparado que o para ampliar direitos, mas uma política das
artigo aborda, considerando três períodos novas elites dominantes para criar uma
históricos, até o final dos anos 1990, como cidadania limitada.
evoluíram os direitos sociais no Brasil e
no modelo clássico europeu. A primeira Na Europa, o operariado industrial lutou
parte trata dessa questão no período que para garantir o direito de associação e de
se estende de 1930 até o golpe militar em organização sindical (BENDIX, 1996). No
1964. Em seguida, discute-se o termo dos Brasil, o Estado regulou o conflito social
governos militares, que se encerrou em 1985. criando sindicatos dependentes legal e
A última seção abarca a fase da retomada da financeiramente. O “sindicato público” e
democracia e avança até o início dos anos a regulamentação da profissão foram os
2000. parâmetros legais da cidadania e de sua
incorporação na comunidade nacional
2. Cidadania Nacional e Cidadania (SANTOS, 1979)4. A estratificação funcional
Regulada: as Políticas Sociais no Brasil legalizou as bases da cidadania regulada,
entre 1930-1964 e a sindicalização foi o meio para gerar o
reconhecimento dos direitos da cidadania, que
Reivindicar igualdade foi central na luta da criou uma incorporação desigual ao controlar
classe trabalhadora europeia no século XIX. o acesso formal das massas trabalhadoras
Para Bendix (1996), a oferta de educação como cidadãos.
pública e o direito de voto materializavam
essas reivindicações e contribuíram Para analisar como os países estruturam
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São os sistemas de políticas sociais ou, mais Nesse período, enquanto, na Europa, o
especificamente, o Estado de bem-estar, o desafio, segundo Esping-Andersen (2000),
ponto de partida da análise para articular o consistia em responder à crise do welfare
desenvolvimento econômico e a política social. state na economia pós-industrial, no Brasil,
Por mais que seja fragmentada a visão de um se avançava para um sistema mais generoso
ou outro programa social, é a perspectiva do de políticas sociais. Ao mesmo tempo, a
sistema de proteção social como um todo ampliação da democracia e a participação
que possibilita examinar os efeitos dinâmicos social passaram ser instrumentos-chave
da política social no tempo, acompanhando para, desde o final dos anos 1980,
o mesmo tratamento dinâmico com que se implantar as políticas sociais (DRAIBE,
examina o desenvolvimento econômico. 1998). Essa engenharia institucional possui
duas distinções em relação ao modelo
Na próxima seção, ver-se-á como essa “Estado, Mercado e Família” de Esping-
concepção é útil para a análise do sistema de Andersen (2000)8: a) a participação da
políticas sociais no Brasil após 1994. sociedade civil por meio de Organizações
Não Governamentais (ONGs) e outros
5. Sistema de Políticas Sociais e tipos de parceria e; b) a descentralização
Desenvolvimento Econômico no Brasil Pós- de políticas públicas, que não é abordada
1994 como forma político-organizativa do regime
de bem-estar no caso europeu9. Há outras
A partir de 1994, com o Plano Real já em vigor, distinções do sistema de políticas sociais
gerou-se uma estratégia de desenvolvimento no Brasil, desde 1995, se comparado à
social baseada na universalidade, visão clássica social-democrata na Europa,
solidariedade, igualdade de oportunidades, que buscam romper o legado do “deficit
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garantir incentivos para que os municípios state europeu parece ter sido diferente: as
assumam novas responsabilidades. Superados políticas sociais eram ofertadas de maneira
os desafios iniciais, o regime de bem-estar no centralizada.
Brasil passou a ser implantado de maneira
descentralizada, cabendo ao governo federal No Brasil, a descentralização foi coerente
financiar e regular as políticas. Diferentemente com a maior universalização e ampliação do
do que dizem Haggard e Kaufaman (2008), acesso e benefícios a amplas parcelas da
a reforma das políticas sociais no Brasil foi população. A descentralização foi o formato
eficaz, mesmo que o sistema político conviva político e administrativo na organização
com veto points na arena federativa. federativa do regime de bem-estar social
no Brasil. Não se encontram referências a
Uma saída para esse problema, segundo um processo com essas características em
Arretche (2002) argumenta, é que, após a fase Esping-Andersen (2000) para propor, por
de aprovação das leis, se desloca para o governo exemplo, a reorganização do welfare state
federal a autoridade sobre os conteúdos das diante dos novos desafios colocados pela
políticas. E, nesse momento, as burocracias economia pós-industrial. No limite, o que se
passam a decidir, independentemente do depreende da visão desse autor seria uma
Legislativo, a tradução das leis em política descentralização para a sociedade, quando
efetiva por meio de regras de implantação sugere que as famílias poderiam ser atores
(como as NOBs para a saúde). A ação da relevantes, visando garantir direitos e
burocracia no contexto de descentralização manter a solidariedade social.
das políticas sociais, combinada com arenas
federativas de decisão, tal como a Comissão Devem ser apontados, contudo, os
Tripartite para a Saúde, gerou um peculiar problemas da visão que associa
desenho institucional. O sistema de políticas descentralização com mais democracia
sociais, além de ser descentralizado, criou no plano local, ampliação da equidade,
mecanismos de controle resultantes das redução do clientelismo e do desvio de
pressões democratizantes da sociedade e do recursos públicos destinados à área social.
policy learning das burocracias (ARRETCHE, A organização de conselhos de políticas
2002; AMENTA; SKOCPOL, 1986). públicas foi, segundo Draibe (1998), uma
das fortes inflexões para articular interesses
Distintamente do modelo europeu, não se da sociedade na formulação de políticas e
instalou um modelo de peak associations tomada de decisões. A forma “conselhos”
(sindicatos e partidos) que decidem políticas municipais de políticas públicas deveria
de bem-estar em conjunto com o governo, tal ser capaz de exercer controle social sobre
como a experiência social-democrata europeia. o poder público e canalizar energias
No Brasil, aprofundaram-se a descentralização democráticas. Conforme Draibe (1998),
da execução e a gestão de serviços sociais porém, esses fóruns foram limitados em
para as localidades. Ao mesmo tempo, criaram- controlar as ações dos governantes, em
se mecanismos federativos de articulação que face de sua dependência do poder público
incorporaram vários atores e interesses que e de sua baixa capacidade técnica. Diante
podem atuar como veto points. Mais uma vez, da histórica relação entre clientelismo e
o desenho político-institucional do welfare assistencialismo no Brasil, é plausível
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admitir-se uma distorção na concepção própria, não pode nem deve, sozinho, tudo
democrática dos conselhos diante da fazer, fórmula que se traduz no reforço das
influência dos governos locais, sobretudo suas parcerias com os setores privados
por se tratar de instâncias que autorizam ou não-lucrativos [...]” (DRAIBE, 1998, p. 119).
vetam o uso de recursos públicos. ONGs passaram, assim, a executar serviços
públicos, por exemplo, na assistência social
Outra inovação da descentralização na (convênios para serviços de creches ou
década de 1990 foi ampliar os canais de cuidados com a terceira idade) e na saúde
participação em relação à sociedade civil. (equipes de Programa Saúde da Família e
Para Barros e Carvalho (2003), a participação agentes comunitários).
comunitária ajustou melhor os programas
às necessidades locais e aumentou sua Quando confrontado com o provimento
eficácia operacional. A descentralização de serviços do modelo social-democrata,
e a participação da sociedade foram, estatal e centralizado, tal como concebido
como destacado por Draibe (1994; 1998) e por Esping-Andersen (2000), a configuração
Fagnani (1997), formas de contrarrestar a adotada no Brasil é inovadora. Pelo menos
centralização decisória que vigorou durante duas ressalvas, porém, podem ser feitas: a)
o regime militar nas políticas sociais. ineficaz controle gerencial do Estado para
Mecanismos de parceria com a sociedade avaliar como o recurso público é utilizado
civil, o apoio a ONGs e o reforço a entidades e se os serviços ofertados pela ONG são
com a presença direta da clientela, como eficazes e condizem com o perfil da demanda;
Associações de Pais e Mestres nas escolas, b) o repasse de ações como formular e
passaram a compor o cardápio de opções planejar políticas públicas às ONGs pode
governamentais para descentralizar as desestimular a construção de burocracias
políticas sociais. Ao final da década de 1990, mais qualificadas, especialmente no nível
com os programas sociais descentralizados local, se contratam tais serviços.
para os governos subnacionais, sobretudo
para municípios, as inovações institucionais Emblemático dessa concepção de parceria
passam a ser a aproximação com a com a sociedade foi o programa Comunidade
sociedade civil para ampliar a capacidade Solidária, que, para Draibe (1998), focou-
de atendimento das políticas públicas. se no combate à pobreza. Suas inovações
foram ações sociais integradas, com
Em setores como saúde, educação e delimitação territorial da clientela mais
assistência social, a descentralização e pobre e apoio do setor privado e filantrópico.
a participação da sociedade buscaram Buscava-se garantir, segundo Draibe
ampliar a oferta de serviços para responder (1998), uma concepção de direitos sociais
aos limites da provisão diretamente estatal. universalizantes e afastada do clientelismo.
A descentralização de serviços sociais Por outro lado, diante do desenho do welfare
configurou o que Bresser-Pereira (1997) state mais universalizante em que o Estado
definiu como um modelo de provisão é o provedor central de serviços sociais,
“público, mas não estatal”. Fortaleceu-se uma o programa Comunidade Solidária tem
“compreensão de que o Estado, sem abdicar distinções relevantes. Sua natureza focada
de sua responsabilidade e sua identidade nas localidades mais carentes, selecionadas
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Notas
FARIA, V. E. Reformas institucionales y
coordinación gubernamental en la proteción 1. O autor agradece os pareceristas anônimos
social de Brasil. Revista de la Cepal, por seus valiosos comentários, que contribuíram
Santiago, n. 77, p. 7-24, 2002. para elucidar pontos fundamentais deste artigo.
2. Ainda que Draibe e Aureliano (1989) enfatizem
Haggard, S.; Kaufman, R. Development, que, após 1930, a educação se tornou uma
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questão nacional com sua centralização na União, saneamento básico que, só na década de 1990
o sistema era marcadamente urbano, embora, recuperaram o fôlego para investimentos.
até 1960, 55% da população vivesse no campo e, 6. Será utilizada a expressão sistema de política
até 1950, 51,6% da população fosse analfabeta social para discutir, no caso brasileiro, o regime
(SANTOS, 1987). de bem-estar social, como tradução do que a
3. Como a União legislava sobre a cidadania no literatura chama de welfare state. Essa opção
tocante ao exercício da profissão reconhecida também se deve ao fato de, conforme Esping-
para atividades técnico-científicas e liberais Andersen (1990), existirem três tipos de welfare
e, por meio do direito do trabalho, regulava as state na Europa, mas o Brasil não se encaixa
demais profissões, tem-se, assim, a dimensão do em nenhum desses.
monopólio estatal sobre o acesso da população 7. Para Draibe (2003), no primeiro governo
à sociedade organizada e seus direitos sociais Fernando Henrique Cardoso (1995-1998), a
(SANTOS, 1987). base social democrata dos programas teve três
4. A comparação com a Inglaterra é menos eixos: direito social, igualdade de oportunidades
histórica e mais da forma como se processou a luta e proteção aos grupos mais vulneráveis.
política dos trabalhadores e dos sindicatos e sua Os serviços sociais básicos ampliaram seu
incorporação no interior da cidadania nacional. aspecto redistributivo, a descentralização e
5. A relação entre ampliação do aparato burocrático a participação social. O combate à pobreza
estatal e a privatização do espaço público é deu-se por meio do programa “Comunidade
apresentada em Fagnani (1997). Para o autor, a Solidária”, em parceria com estados, municípios,
centralização decisória das políticas sociais deu-se iniciativa privada e a sociedade. A principal
com a construção de grandes estruturas burocráticas diferença do segundo mandato (1999-2002)
como o Sistema Financeiro de Habitação (SFH), foram os programas de transferência direta de
o Sistema Nacional de Previdência e Assistência renda focada nas famílias mais pobres, para
Social (Sinpas) e o Sistema Financeiro de melhorar a proteção contra situações de risco
Saneamento (SFS). Esses órgãos formulavam e social.
implantavam políticas públicas com autonomia 8. Parece que essa seria uma estratégia de
decisória e recursos financeiros. Os vínculos entre a sobrevivência familiar alternativa às regras
burocracia e os interesses privados manifestaram- de mercado e sua crescente exclusão da
se em diversas políticas sociais, sem considerar força do trabalho na sociedade pós-industrial
critérios de relevância e foco nas clientelas mais mencionada pelo autor.
necessitadas. Deu-se pouca importância à 9. Mesmo que na Europa prevaleçam
capacidade de sustentação no longo prazo, para democracias parlamentaristas, não parece
não inviabilizar os mecanismos de financiamento que a descentralização de políticas públicas
que poderiam produzir vácuos em diversas áreas seja uma característica intrínseca de países
de ação do Estado, como foi o caso da habitação e federalistas.
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