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lendas do alto minho

Alto minho

Afonso Gonçalves da Silva


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lendas do alto minho

índice

Lenda do Mosteiro de Ermelo 3

Lenda da Veiga da Matança 5

Lenda do Juiz do Soajo 7

Lenda da Moura (Sabadim) 9

Lenda da Fundação do Convento do Lugar de S. Bento 11

Lenda de Egas Moniz 12

Lenda do Santo Lenho (Grade) 14

Lenda da Senhora da Peneda 14

Lenda da Cabeça da
Velha
Afonso Gonçalves da Silva
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lendas do alto minho

Era uma vez uma jovem chamada Leonor, de rara beleza e dona de fartos haveres.Órfã de pais, vivia
com um tio, D. Bernardo, num pequeno lugar situado na Serra da Peneda, no Norte português, junto
às terras da Galiza.D. Bernardo, também ele abastado, tinha a sobrinha em muita estima e desejava,
para ela, um casamento feliz mas tardio, para poder beneficiar, até ao fim da sua vida, que prometia
ser longa, pois o fidalgo era, em extremo, robusto e saudável, dos cuidados e carinhos de Leonor.A
jovem, porém, já se havia enamorado de um seu primo, D. Afonso, moço belo e inteligente, com
nobre solar na região.Conhecia Leonor os propósitos egoístas de D. Bernardo.Mas o coração
negava-se-lhe a acatar-lhe decisão tão cruel.E, não resistindo ao sentimento que nutria pelo primo,
passou a encontrar-se com ele, no mais rigoroso segredo.Tinha uma cúmplice, em tais arrebatados
encontros.Era Marta, uma velha serviçal do tio, que, havendo-a criado de menina, tinha por fiel
confidente.Marta alegrava-se de poder apadrinhar o amor dos dois primos, que a
enternecia.Temendo, no entanto, que a criada, pela fraqueza da velhice, alguma ocasião caísse em
revelar ao amo aquela paixão proibida,Leonor lembrou-se, gravemente, o mal que atingiria os três, se
D. Bernardo soubesse da desobediência da sobrinha.Marta indignou-se.A sua lealdade estava acima
de qualquer suspeita.E afirmou a Leonor:- Minha ama: se alguma vez vos trair, ou for obrigada a
trair-vos, que me transforme em pedra, como essas dos cabeços, frias e rudes!Um dia, D. Afonso
esperou por Marta, no recato de um ermo, para lhe entregar uma carta dirigida a Leonor, a rogar-lhe
que fugisse com ele, numa noite próxima, libertando-a da tirania do tio.E, na carta, indicava o lugar
aprazado para o encontro dos dois fugitivos.Ele levá-la-ia para o seu solar e lá casariam na capela
que, como em todas as grandes moradias fidalgas, se lhe avultava à ilharga, sempre florida e
cuidada.Marta recebeu a carta e regressou a casa.Mas, de repente, saiu-lhe ao caminho, vindo do
interior de uma mata, onde se entretinha a caçar, a figura do amo.Estranhou ele a presença da serva
naquele local tão distante do solar.E logo uma forte desconfiança lhe assaltou o espírito ao ver, na
mão da velha criada, a carta secreta.

Com voz autoritária, exigiu que ela lha entregasse.Marta procurou resistir àquela ordem que iria fazer
a desgraça dos dois jovens e a sua própria.Mas D. Bernardo teve artes de lha arrancar, lendo-a de
seguida, com as feições transtornadas pela revelação desse amor que ignorava.Devolvendo, calado,
a carta ao terror de Marta, afastou-se num passo incerto.Marta pasmou daquele silêncio, supondo,
porém, que D. Bernardo, pela muita estima em que tinha Leonor, aceitara, resignado, os sentimentos
dos sobrinhos.E correu a entregar a carta comprometedora à sua querida ama, ocultando-lhe,
todavia, o encontro com D. Bernardo e a sua estranha atitude.Na noite combinada, Leonor, embuçada
numa capa escura e comprida, escapou-se do solar do tio, não sem um olhar húmido de saudade,
para procurar os braços de D. Afonso e o desejado enlace.Na sombra, umas sombras seguiam-na ao

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largo.Procurando por todas as salas desertas do solar a presença de D. Bernardo e dos criados,
Marta compreendeu, por fim, que o amo não perdoara aos sobrinhos e se dispunha a castigá-los,
numa emboscada vingativa.Correu, então, quanto podiam as suas pernas cansadas da idade, por
desvios, por atalhos a avisar Leonor e D. Afonso da cilada de D. Bernardo.Chegou a tempo.Sem
atenção, D. Afonso sentou Leonor na garupa do seu cavalo, e, num galope alucinado, afastou-se da
perseguição do tio e dos seus criados bem armados.Ao olharem, porém, para trás, para agradecerem
a Marta aquela prova de lealdade que lhes salvara a vida e o amor, apenas distinguiram a rijeza de
uma pedra, onde se esculpia a face rugosa da velha criada: o seu nariz adunco, a saliência do
queixo.A jura de Marta havia-se cumprido.Feita pedra, a velha parecia despedir-se de Leonor e de
Afonso, a cavalgarem já longe, com os seus olhos cegos, que um manto de musgo começava a
cobrir, macio e piedoso.

Lenda do Mosteiro de
Ermelo

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Era uma vez um rei chamado Ordonho II, que governava as Astúrias e todos os territórios para o
Sul, conquistados aos guerreiros do Islão.

Neles, figurava o Vale do Vez, com as suas altas montanhas e a beleza do seu rio.

Tinha uma filha: D. Urraca, princesa piedosa, protetora de igrejas e conventos, devotadamente
dedicada à divulgação da fé cristã, em que despendia grande parte das suas riquezas.

Um dia, decidiu fundar um Mosteiro para frades, em lugar sossegado e fecundo, rodeado de
vegetação e boas águas, onde vicejasse uma horta e frutificasse um pomar; onde houvesse
ermos floridos para meditação, vinhedos e trigais que fornecessem o pão e o vinho para o
mistério eucarístico e a sobrevivência da comunidade.

Com o consentimento real, acompanhada das suas aias e alguns soldados protetores, meteu
pés a caminho, por montes e vales do seu reino.

Chegada à Serra da Peneda, que lhe prometia larga vista sobre uma paisagem pacífica e alegre,
o silêncio e a oração, começou a subi-la, com entusiasmo, parando, ora aqui, ora ali, para ganhar
forças e melhor contemplar quanto a rodeava. Uma dessas paragens chama-se, ainda, Bouças
das Donas, lembrando o arvoredo onde D. Urraca e as suas aias repousaram, abrigadas do Sol
ardente.

Junto à vila do Soajo, onde se aconchegavam algumas casas de pedra e colmo, achou lugar
apropriado para edificação do Mosteiro e logo contratou pedreiros para lhe abrir os alicerces.

Contente com o lugar que obedecia às condições desejadas, D. Urraca correu à Corte de seu pai,
a participar a D. Ordonho a feliz decisão.

Perguntou-lhe a curiosidade do rei:

- E o que se avista dessas alturas?

Respondeu-lhe a princesa:

- Longes e longes. Vêem-se, para o Sul, as torres da Sé de Braga e o imenso casario da antiga
cidade. Para o Norte, as Catedrais de Tuy e de Ourense, junto ao rio Minho. Para o Oeste, praias
onde vão quebrar-se as ondas bravias do mar. Para Leste, campos e montes sem conta, onde
pastam rebanhos e cavalgam guerreiros dos vossos exércitos.

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D. Ordonho manteve-se por uns momentos calado, com uma ruga na testa, como quem segue a
seriedade de um pensamento.

Depois, disse a D. Urraca:

- Minha filha, gostaria bem de satisfazer a tua vontade de servir a Deus, com a construção desse
Mosteiro. Mas não posso, para isso, despender, em tal projeto, metade do meu reino. É
demasiadamente grande esse horizonte. Terás que descobrir outro sítio menos amplo para
morada dos teus frades.

Triste com esta decisão real, a princesa, todavia, não desistiu do seu intento e resolveu, então,
mandar edificar o seu Mosteiro, não no desafogo dos cimos do monte, mas na profundeza do
vale, quase oculto pela densidade das brenhas, sempre coberto de sombras, escutando um rio
discreto, mirando a solidão do ermo.

E deu-lhe o nome de Mosteiro de Ermelo.

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Lenda da Veiga da
Matança
Era uma vez uma veiga a que chamam a Veiga da Matança, em terras de beleza e viço dos Arcos
de Valdevez.

O seu nome nasce da convicção popular de que, em 1143, aí se travou uma batalha sanguinária
entre as hostes de D. Afonso Henriques e as de seu primo, o Imperador e rei D. Afonso VII, de
Leão.

O motivo da contenda residia na quebra do tratado de Tuy, em que o primeiro rei de Portugal
prometia vassalagem ao soberano vizinho.

Mas D. Afonso Henriques era um espírito rebelde, valente e determinado, disposto a fazer do
Condado Portucalense que exigira, pelas armas, a sua mãe D. Teresa, um país independente e
dilatado á custa das conquistas dos territórios da Moirama, a estenderem-se do Mondego ao
reino do Algarve.

Tivera, já, sob a proteção divina, uma batalha decisiva, nos Campos de Ourique, além-Tejo, contra
cinco reis moiros.

Como memória desta vitória e da milagrosa presença de Cristo, pois a lenda afirma o seu
aparecimento ao rei, encorajando-o à luta contra os infiéis, a bandeira de D. Afonso Henriques
passou a ostentar, em cinco quinas, as cinco chagas do Crucificado.

Sabendo da entrada do imperador pelo norte do país que estava a construir, com entusiasmo, o
rei português sobe aos Arcos, disposto a terçar armas pelos direitos do seu sonho patriótico. E
foi ocupar logo, para dar batalha, um lugar privilegiado, o alto Castelo de Santa Cruz, onde os
seus cavaleiros aguardaram, impacientes, o inimigo leonês.

Em piores condições encontrava-se D. Afonso VII, à frente das suas mesnadas.

Combater o primo, em tais apuros, era uma temeridade!

Então, sabiamente aconselhado, propôs a D. Afonso Henriques o encontro dos dois exércitos na
planura da veiga, não para a violência de uma batalha, mas apenas para a destreza de um
torneio, ou baforada, como então era chamado.

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Assim, cada cavaleiro português desafiava um cavaleiro leonês, para um confronto singular.

E venceria quem mais inimigos houvessem derrubado.

D. Afonso Henriques aceitou o repto e, rodeado de bons e esforçados cavaleiros, experientes em


manejar a lança e a espada no corpo do contendor, saiu-se vencedor do bafordo, obrigando o
imperador a regressar aos seus domínios de além-Minho.

Pouco tardou que D. Afonso VII não assinasse um armistício com o primo português,
aceitando-lhe, diante de um alto dignitário da Igreja, o título de rei.

Graças ao acordo entre dois monarcas, a veiga arcuense assistiu, assim, não a uma carnificina,
mas quase a um espetáculo palaciano, embora temerário, que, noutras circunstâncias, poderia,
até, ser admirado por damas e donzéis, entre guiões de seda e ornamentos de festa. Mas a
lenda sobrepõe-se à História.

E, séculos atrás de séculos, o povo olha a pujança pacífica daquela extensa veiga cultivada,
como local fatídico de uma horrenda batalha, com a terra empapada em sangue, cavalos
desventrados, guerreiros agonizantes, segurando, ainda, na mão exangue, lanças, escudos,
espadas, gemendo de dor, suspirando de morte. Incólume, no meio desta hecatombe,
empunhado a branca bandeira das quinas, montando um cavalo banhado de espuma, mas de
crinas agitadas ao vento da glória, qualquer pode imaginar o vulto espesso e nobre de D. Afonso
Henriques, o rei-herói, anunciando, naquela veiga, naquela matança, o Dia Primeiro de Portugal!

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Lenda do Juiz do Soajo

Era uma vez um homem chamado João Congosta que exercia as funções de juiz na vila do
Soajo, situada na aba da serra do mesmo nome, sobranceira ao Vale do Lima.Isto passou-se há
muitos e muitos anos, quando o Soajo era terra notável na defesa da fronteira com a Espanha,
com foral concedido por D. Manuel e pelourinho onde se executava a justiça.João Congosta era
homem inteligente e honesto, admirado pelo povo que lhe aprovava as sentenças, quase
sempre sobre pequenos delitos: o furto de um anho, por ocasião da Páscoa, ou de uns pés de
coives galegas pelos frios de Natal.Mais sério, as sacholadas por via da mudança de um marco
ou desvio de umas águas do regadio.Mas, um dia, viu-se a braços com um crime grave, que
pôs toda a vila em polvorosa: a morte violenta de um lavrador soajeiro abastado, mandado
assassinar por um fidalgo dos Arcos de Valdevez, que lhe devia um grosso de moedas.O caso
levou seu tempo a resolver, com buscas e interrogatórios dos culpados, falsas juras de
inocência, provas forjadas, o diabo!Todavia, João Congosta acabou por desdobrar a meada dos
enredos e julgar, com saber e severidade, condenando o fidalgo e os seus cúmplices à pena
máxima.O pior é que o principal criminoso tinha padrinhos na Corte, gente pronta a influenciar
El-Rei contra a sentença do juiz do Soajo, que descreviam como um pobre rústico, estúpido e
ignorante.Impressionado com tais palavras de mentira e de intriga, El-Rei remeteu o caso aos
seus juízes que, por sua vez, convocaram João Congosta para mais perfeitos
esclarecimentos.João Congosta era um homem simples e que apenas uma única vez saíra da
sua vila, indo por dever de profissão, até à vizinha Arcos, sede do seu julgado.Recebeu, pois,
com desagrado, aquela intimação para se deslocar à Corte.Mas, embrulhado na sua
inseparável capa de estamenha usada nas audiências, ala!Até ao porto de Viana, onde
embarcaria para Lisboa, pois a viajem por terra era demasiado morosa e
insegura.Desembarcado no Terreiro do Paço, a Capital perturbou-o, com o seu ruído, com o seu
movimento de cavalos, bois, carroças e carruagens, gente de tantas raças, envergando os seus
trajos tradicionais, algum animal exótico, para pasmo popular, e em mercado vivo e colorido,
soltando os seus pregões, exibindo os seus produtos do campo e de além-mar.Depressa se
dirigiu ao Paço Real, magnífico na sua arquitetura, atravessou, com dificuldade, as barreiras da
soldadesca, dos lacaios e dos pajens, chegando, por fim, ao vasto salão, onde o aguardavam
os seus colegas da Corte, comodamente refastelados em solenes cadeirões de

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magistrados.João Congosta procurou o seu, para um descanso, mas, sobretudo, para a


tranquilidade de melhor ponderar e discutir.Porém, todos eles se encontravam ocupados.Os
juízes da Corte não reconheciam, naquele labroste, vindo do cabo do mundo, sem modos nem
pensamento, o direito à dignidade de uma cátedra.O juiz do Soajo não hesitou.Tirou dos ombros
a capa das audiências, dobrou-a bem dobrada, num aumento conveniente de volume, pô-la no
chão e sentou-se nela, ficando, assim, ao nível dos colegas, e aguardou que o consultassem
sobre os motivos e a justeza da sua sentença.Com uma admiração que, pouco a pouco, se ia
tornando maior e mais entusiástica, os juízes da Corte viram que a sua própria experiência e
sabedoria, e mesmo a manha com que obrigavam os réus a contradições e confusões de
espírito, nada valiam ante a limpidez de raciocínio, a agudeza dos argumentos, o brilho da
inteligência do parolo das serras, criado no convívio de gente boçal e entre matagais
selvagens.Terminada a sessão, todos louvaram a sentença de morte dada aos três assassinos,
louvando, também, quem a proferira.Levantou-se João Congosta e, com uma vénia,
aproximou-se da porta de saída.Então, um dos presentes advertiu-o que havia deixado, por
esquecimento, a sua capa de audiências no chão do salão.Com voz bem alta e clara, ouvida
por todos, João Congosta retorquiu, numa lição ao desprezo de que fora vítima, ao entrar ali:- O
juiz de Soajo nunca levou consigo cadeira em que se sentou!Reconhecendo a grosseria que
haviam cometido, os juízes da Corte coraram e baixaram os olhos, de vergonha.João Congosta
não quis ficar um instante mais em Lisboa.Tomou o primeiro barco para Viana e não tardou a
voltar a gozar a beleza da sua serra, a entregar-se às obrigações do seu cargo, a receber o
respeito e amizade dos seus conterrâneos.

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Lenda da Moura
(Sabadim)
Lenda da Moura Reza uma velha lenda, a Lenda da Moura, que a poucos metros destes penedos,
chamados Penedos da Aguinadoira, havia o desaparecido Lugar da Lama, no alto deste monte, a
confinar com a Freguesia de Vascões. O lugar desapareceu em 1109. Um enorme terramoto
destruiu 12 fogos e tudo que ali havia. As pessoas daquela época sobreviviam da caça e da
lavoura. Coziam o pão numa telha de barro na lareira. Forno...? nem se ouvia falar..., não
existia!...Morava lá uma senhora muito generosa, que gostava de ajudar os mais pobres. As
pessoas todos os dias à noite mugiam o gado. Um dia por semana, essa senhora, mandava a
filha, rapariga dos seus 25 anos, levar um saco de milho a moer ao moinho, que ficava junto ao
ribeiro que nascia nesse lugar, chamado Rio do Frango e incumbia a filha de, sempre que fosse
ao moinho, levar um pedaço de pão da telha e uma caneca de leite a uma pessoa mais
desfavorecida que morava numa casinha, já destruída, junto ao moinho. O itinerário da rapariga
era sempre o mesmo. Ia por um carreiro antigo que passava pelo meio destes penedos. Como
sempre, desceu todo este monte pôs o moinho a moer o milho e, entregou a caneca de leite e o
pão ao pobre velho que morava sozinho e desamparado. Voltou para casa, mas ao passar
novamente no meio dos dois penedos, surgiu uma menina toda vestida de branco que lhe pediu:

- Não me dás uma caneca de leite e um pedaço de pão quente que tenho fome!...

Resposta da rapariga:

- Dou. Mas, para isso tenho de pedir à minha mãe. Esperas aqui que eu vou a casa e volto já.

E assim foi. A rapariga foi a casa, contou o sucedido à mãe, encheu novamente a caneca de
leite, partiu mais um pedaço de pão da telha e voltou aqui aos penedos. Só que quando chegou a
este local, procurou a menina por todo lado mas não a encontrou. Toda entristecida voltou para
casa, e quando se apressava para entrar novamente no carreiro batido, surge a menina do lado
direito deste penedo. E gritou:

- Estou aqui não me vês!...

A rapariga apreensiva reparou que a menina tinha na mão uma caneca com as mesmas
características da sua. Aproximou-se dela e disse:

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- Olha, em troca do pão e do leite que de dás, vou-te dar esta caneca mas, recomendo-te que não
tires o pano de cima da dela até chegares a casa e a entregares à tua mãe.

A rapariga aceitou, mas a curiosidade era tanta que ela não resistiu, em ver o que estava dentro
da caneca, e ao chegar junto da Capela da Senhora do Loreto, hoje de Santo Amaro, havia lá uma
carvalheira enorme. Junto ao pé, existia a fonte do lugar. A rapariga sentou-se, tirou o pano que
cobria a caneca e reparou que o que levava dentro eram carvões negros. Despejou a caneca na
água e toda enfurecida pelo sucedido, correu para casa a contar à mãe o que lhe tinha
acontecido. Por sua vez, a mãe, achou diabólico e muito estranho o caso que estava a acontecer
à filha. Voltaram as duas novamente à fonte para se inteirarem da verdade. E, ao chegarem à
fonte, repararam que os carvões tinham desaparecido. Existiam, isso sim, pequenos vestígios de
ouro puro na água corrente. Foi aí que a mãe e a filha se aperceberam que a menina tinha-lhes
recompensado a caneca de leite e o pão da telha, por barras de ouro. A partir desse dia os
penedos ficaram conhecidos pelos Penedos da Moura. Por muitos e longos anos as pessoas
deixaram de cá passar. Tinham arrepio que a Moura voltasse a aparecer.

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Lenda da Fundação do
Convento do Lugar de S.
Bento

O dono de uma quinta, chamada S. José, recebeu um dia dois frades que lhe foram pedir esmola.
Condoeu-se deles e ofereceu-lhes agasalho na quinta. No dia seguinte, muito comovido pela
desgraça dos frades, que não tinham casa nem dinheiro, perguntou para onde iam; responderam que
ficariam por ali se houvesse quem lhes desse um bocadinho de terra do tamanho de um couro de
boi. O dono da quinta disse que lhes dava ainda mais, o que eles recusaram; só queriam o que
pediam, mas dado com todas as seguranças que a lei oferece para não lhes ser tirado mais tarde. O
dono da quinta fez-lhes doação por escritura do terreno que desejavam, isto é: o tamanho do couro
de boi. Os frades, arranjaram um couro de boi, cortaram-no em tiras muito finas e fizeram com elas o
formato de um boi enormíssimo. O dono da quinta vendo o roubo ficou louco. Os frades fizeram
nesse terreno o convento, que ainda hoje existe, assim como a capela de Santo António, hoje
chamada de São Bento. A quinta do convento, vista de um alto, que a domina, mostra perfeitamente
o formato de um boi. Esta história está descrita com as datas nas matrizes da repartição de finanças
dos Arcos de Valdevez, terra onde isto se deu. A quinta chama-se Quinta do Convento, sita no lugar
de S. Bento.

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Lenda de Egas Moniz


A batalha de Valdevez entre os exércitos de D. Afonso Henriques e Afonso VII de Castela não
teve um resultado decisivo para nenhuma das hostes envolvidas. D. Afonso Henriques retirou-se
para Guimarães com o seu aio Egas Moniz e com os outros chefes das cinco famílias mais
importantes do Condado Portucalense, interessadas na independência.

O monarca castelhano pôs cerco ao castelo de Guimarães mas o futuro rei de Portugal preferia
morrer a render-se ao primo. Egas Moniz, fundamentado na autoridade que a posição e a idade
lhe conferiam, decidiu negociar a paz com Afonso VII a troco da vassalagem de D. Afonso
Henriques e dos nobres que o apoiavam.

O rei castelhano aceitou a palavra de Egas Moniz de que D. Afonso Henriques cumpriria o voto
de vassalagem. Mas um ano depois, D. Afonso Henriques quebrou o prometido e resolveu
invadir a Galiza, dando origem a um dos momentos mais heroicos da nossa história. Vestidos de
condenados e com corda ao pescoço, Egas Moniz apresentou-se com toda a sua família na
corte de D. Afonso VII, em Castela, pondo nas mãos do rei as suas vidas como penhor da
promessa quebrada.

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O rei castelhano, diante da coragem e humildade de Egas Moniz, decidiu perdoar-lhe e


presenteou-o com favores. Este ato heroico impressionou também D. Afonso Henriques, que
concedeu ao seu velho aio extensos domínios.

Pensa-se que esta terá sido uma estratégia inteligente por parte de Egas Moniz para que o
primeiro rei de Portugal pudesse ganhar tempo. Ao entregar-se, Egas Moniz ressalvava a sua
honra e também a de Afonso Henriques, assegurando através da sua astúcia a futura
independência de Portugal.

Lenda do Santo Lenho


(Grade)
Segundo a lenda, na Veiga da Matança, batalha que opôs Afonso Henriques a seu primo Afonso
VII de Leão, foi encontrado uma relíquia sagrada, denominado Santo Lenho, que segundo a fé
cristã crê-se que seja um pedaço retirado da Cruz onde Cristo foi crucificado. Esta relíquia
encontra-se na freguesia de Grade, na Igreja Matriz, num sacrário com duas portas fechado a
sete chaves todas elas diferentes.

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Lenda da Senhora da
Peneda
Reza a lenda que enquanto uma criança pastoreava as suas cabras, a Senhora apareceu-lhe em
forma de uma pomba branca voando ao redor dela e, pediu-lhe que dissesse aos do seu lugar da
Gavieira para lhe edificarem naquele lugar uma ermida. A pastorinha foi ter com os seus pais e
falou da aparição da Senhora, mas sem efeito, porque não lhe deram crédito, não acreditando
nas palavras dela.

Noutro dia, voltando a pastorinha com as suas cabras por aquelas mesmas paragens, tornou-
lhe a aparecer a mesma Senhora na mesma lapa, não como na primeira vez, em forma de
pomba (como ela referia) mas na forma em que hoje se vê, e lhe disse:

- "Filha, já que te não querem dar crédito ao que eu mando, vai ao lugar de Roussas (que fica na
mesma freguesia de Gavieira) onde está uma mulher entrevada há dezoito anos e diz aos
moradores do lugar que tragam à minha presença, para que ela fique de perfeita saúde, e assim
te darão crédito ao que eu te ordeno."

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Assim o fez a venturosa pastorinha, e trouxe a mulher que se chamava Domingas Gregório.
Tanto que esta chegou à vista daquela Sagrada Imagem da Rainha dos Anjos, logo alcançou
uma perfeita saúde e ficou livre e sã de todos os males que padecia, louvando a Virgem Senhora
pelo singular benefício que lhe havia feito.

Nos dias de hoje, são muitos os devotos que louvam a Nossa Senhora da Peneda, tornando-se
um local de peregrinação e culto para milhares de fiéis.

Lenda Santo Aginha


Há muitos, muitos anos, vivia na Serra d’Arga um perigoso salteador de estradas e casais, de seu
nome Aginha. Por entre os arvoredos, caminhos e casas da Serra corria o temor de algum dia
ser-se confrontado com tão perigoso meliante. A sua fama corria por todos os recantos,
espalhando um misto de pânico e admiração. Já ninguém se atrevia a cortar a serra sozinho e,
muito menos, de noite. Contavam-se histórias e histórias dos seus feitos, durante os serões da
serra, ao calor das fogueiras. Os mais velhos, querendo o respeito e a obediência das crianças,
ameaçavam com a presença do Aginha. Mas estas, depois da repreensão, preferiam brincar
recriando as aventuras do malvado.
Quando menos esperava, o viajante via aparecer-lhe pela frente, de punhal em riste e chapelão, o
malfadado Aginha! E se não levasse consigo fazenda ou moeda, passava um mau bocado,
porque o assaltante só desistia da presa depois de a esbulhar, nem que tosse da roupa que

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trazia. Qualquer gesto de autodefesa era suficiente para a aventura não ficar apenas pelo roubo.
Ao maltratar as vítimas mais intimoratas, Aginha marcava a fronteira do medo, e justificava a
impunidade conquistada. Descia um dia, ainda noite alta, um frade do convento de S. João para
a missa da matina em Arga de Baixo, quando o meliante lhe saltou ao caminho. A escuridão
confundiu-se no hábito do frade. Aginha só reconheceu o homem de Deus quando o confrontou
em pleno caminho. Mas Aginha não era homem de grandes rezas, e seria muito mau para a
fama conquistada, se não fizesse o que sempre fazia nestes casos. Por isso, apontando o
grande facalhão ao pobre do frade atónico, exigiu o salteador:
- A bolsa ou a vida!
A normalidade da sua exigência deu com a anormalidade do caminhante. O frade nem tinha
bolsa, nem se preocupava muito com a vida terrena:
- Ó meu filho, não tenho nada de valor comigo, a não ser as pobres vestes de frade e a cruz que
trago ao peito!

De que lhe serviam tais «trastes»? Nem umas botas ele trazia! Aginha não sabia o que fazer, pois
tal nunca lhe havia acontecido. Vendo-o assim sem jeito e mudo, o pobre do frade lá foi
conversando com o salteador, usando palavras mansas e sábias, às quais, perplexo, o Aginha,
sentado agora, respondeu com um longo silêncio. Ainda hoje ninguém sabe o que o frade lhe
disse! O certo é que, em puro milagre, decidiu abandonar aquela vida de salteador! Caindo aos
pés do frade, banhado em lágrimas de arrependimento, confessou os seus crimes e
converteu-se. Como penitência, impôs-lhe o frade a missão de permanecer na serra, ajudando
agora aqueles que antes havia maltratado.

Poucos dias depois, passou por ali um lavrador, decidido a atravessar a serra com um carro de
lenha. Ainda não era noite. Por isso, apesar de receoso, o nosso lavrador foi avançando
apressado, como sempre fazia quando passava por tão mal afamado sítio. Na pressa não
reparou numa grande pedra do caminho que, repentinamente, lhe tombou o carro em tremenda
barulheira.

Não podia o dia ser tão azarado! Como podia aquilo acontecer mesmo ali! Depois de soltar dois
ou três palavrões, sempre olhando em volta, assustado, decidiu o lavrador que a única solução
era levantar o carro e atrelar novamente os animais o mais depressa possível. Mas como podia
fazê-lo sozinho?

O estrondo do acidente atraiu Aginha. Vendo a incapacidade do lavrador, decidiu ir ajudá-lo, e


assim dar cumprimento à penitência prescrita pelo frade.

Afonso Gonçalves da Silva


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Quando os olhos do lavrador deram com a figura conhecida do Aginha, sentiu que o sangue lhe
fugia pelas pernas, e, por momentos, ficou petrificado, pois desconhecia a intenção do penitente.
Julgava o lavrador que Aginha vinha para o maltratar, já que não o sabia convertido. Mais refeito
da surpresa, e vendo-o sem guarda, pegou na machada de cortar a lenha, e desferiu-lhe um
golpe na cabeça, que o matou.

Angustiado por tão hediondo crime, apesar de se julgar em autodefesa, arrastou o cadáver para
o matagal mais próximo, e regressou, ainda assustado, à aldeia.

Passados dias, chegou à Serra d’Arga uma ordem do rei que prometia grande prémio a quem
terminasse as aventuras do temível salteador, O lavrador, ao ter conhecimento desta ordem, e
desejando fazer-se ao prémio, logo denunciou o seu feito heróico. Porém, chegados ao local
onde tinha lançado o cadáver, povo e autoridades ficaram estarrecidos ao ver o corpo intacto!
Aproximaram-se mais um pouco e, segundo dizem, sentiram que o corpo exalava um suave
cheiro de flores silvestres, não obstante terem decorrido já alguns dias após o trágico desfecho.
A estupefação só ficou mitigada quando souberam, pelo frade, da conversão do ladrão.
Imediatamente o povo aclamou Aginha como santo, construindo ali uma capela em sua honra.

Lenda Santa Maria da


Ínsua

Afonso Gonçalves da Silva


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lendas do alto minho

Frei Diogo Arias olhou para a pequena ermida solitária, ali junto à foz do Minho, numa língua de
areia a querer invadir o mar. O santo frade tinha finalmente encontrado o lugar onde poderia
entregar-se a Deus e meditar as palavras divinas. Juntamente com um pequeno grupo de
irmãos, aventurou-se até à imagem da Senhora de Carmes e confiou-lhe o seu segredo. Servo do
menino que estava ao colo da Senhora, prometeu Frei Diogo que ali ergueria um convento, para,
longe do barulho do mundo, entregar-se à sua proteção.
Os irmãos que o seguiam, bem compreendiam e admiravam a vontade e coragem do seu
patrono, mas descriam das possibilidades de levar a bom termo tal propósito. Afinal, aquele
lugar não era tão sujeito aos caprichos e rumores do mar e suas tempestades? Como encontrar
ali o sossego? Ausente a vozoaria humana, como silenciar a dos elementos da natureza? E
como se podia ali viver em qualquer fonte de água doce?
Frei Diogo pressentia a descrença dos irmãos, mas não via neles qualquer desânimo, O
entusiasmo com que levava por diante as obras e a fé que transmitia, iam contagiando,
lentamente, todos os frades. — Valha-nos Deus e a Virgem! Era o crédito para todas as dúvidas.
Ao longe passavam os marinheiros e pescadores, os quais, atónitos, iam registando os
progressos das obras. Grande coragem e fé teriam que ter aqueles frades, para desejarem viver
tão pobremente, sem comodidade e sem água doce, pensavam os homens do mar.
Acabadas as obras e celebrada a inauguração e dedicação da capela, foram, logo desde os
primeiros dias, surpreendidos os frades por tão doce quietude do mar. Mas a surpresa aumentou
quando, por mais alterado que fosse o mar, e a tormenta afastasse qualquer navegador, dentro
do convento, principalmente na capela, não se ouvia qualquer barulho! Era o silêncio um convite
à oração, que assim lhes permitia elevar o espírito para as coisas celestes! Aquele era na
verdade um lugar protegido e abençoado pela Virgem Senhora da Conceição, que frei Diogo
Arias havia colocado no altar da capela, e que agora recebia o nome do local: Senhora da Ínsua!
E se a alegria e a fé cresciam a cada dia nos corações dos irmãos, ela ficou para sempre
fortalecida quando Frei Diogo lhes indicou, a mando da Senhora que lhe havia aparecido em
sonhos, um local para escavar. Assim fizeram. Ainda a escavação estava no início, e logo um
jorro de água doce a todos maravilhou! Milagre! Foi este o grito entusiasmado e fervoroso de
todos, pelo inusitado do local e pela qualidade da água que aí brotava.
Pelas redondezas passou o relato de tal feito milagroso. Todos acorriam para ver e beber de tão
ditosa fonte, vindo esta a ser conhecida como “Fonte Milagrosa”, e as suas águas pretendidas
para todas as curas.
Junto à imagem, Senhora da Conceição, Frei Diogo Arias agradecia as graças concedidas pela
Virgem que, daí em diante, seria sempre a Estrela-do-mar para os mareantes e pescadores, e o
último remédio para a saúde de todos

Afonso Gonçalves da Silva


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lendas do alto minho

fontes:
Lendas e Tradições - AltoMinho.pt

Afonso Gonçalves da Silva


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