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DISCURSO

'- '_:5- PRONUNCIADO

" -~:~.~~~~.~
PEL9

EXM. SR. DR. ANTONIO FERREIRA VIANNA

Na camara dos Srs. deputados em sessão de 10


de Junho de 1869

POR

Ocoasl40 da disoussão dos arUaos addUlvGs ao


projeoto da leI do orçaD1ento

RJ:O DJi JANDU~O


TYP. DO ·-DIARIO DO RIO DE JANEIRO
fJ7 RUA do Ouvidor \li

1869
"... . .
9 Sr. FerreiraVialloa:..- Parecerá estranho,
Sr. presidente, que eu venha defender uma vic-
lima protegida a qual não
ouço levantar~se só palavra·, e
entretanto certo está em pe-
rigol
Oiscutindo-se acredito que a
medida proposta pelo additivo ~fiscal; porque, se
o pensamento da cummissãofosse mais amplo até
. alcançar as instituições monasticas existentes no
paiz, eu consideraria o additivo uma iniquidadp-
com a circumstaneia aggravante da sorpl'ezü.
Cumpre das differentes
emendas em o substitutivo
e a emenda provincia dI)
Ceará.
O additivo commissão
de fazenda estabelece contra as ordens regulares
uma contribuição progressiva e iHimitada, Ó ii

\
----------------------~ ..
-4-
absorpção da propriedade monastica pelo fisco. O
substitutivo hvje offerecido pela commissão limita
a progressão a .21 na renda dos predios rusticos,
%

a 30 na dos urbanos, e a 30~na taxa dos escra-


%

vos maiores ele 12 annos. A emenda do nobre


deputado pela provincia do Ceará obriga tanto as
ordens regu lares como todas as corporações de
mão-morta a dispõr de seus bens immoveis des-
necessari05 ao serviço, dentro do pras o de cinco
Bnnos, sob pena'da venda forçada em hastll pu-
blica e c.onversão do producto em apolices intrans-
feri veis a béneficio dos respectivos proprietarios.
O pensamento que domina qualqu er das provi-
dencias propostas, attenla contra o pleno direito
de propriedarle garantido pela constituiçãO, como
foi hontem brilhantemente demonstrado pelo meu
distincto amigo monsenhor Pinto de Campos,
depu~do pela provincia de Pernambuco, ou a
desapro[)riação se cffectue pelo recurso exorbitante
do imposto progressivo, ilLimita.lo, ou pelo im-
posto limitado, mas excessivo, insupportavel e
odioso, ou pela venela forçada em hasta publica,
é fóra de duvida que as ordens regulares ficarão
sob o peso de inj usto e vfülento vexame.
O nobre deputado pela provincia do Ceará, hon-
radissimo magistrado, como foi hontem com- toda
a justiça qualificado pelo nos~o douto collega por
----------------------~~ -

-6-
gencia ou contradicçâo éntre a emenda e as'
opiniões do nobre deputado manifestadas durante
o deqate, senio aos estlmulos da ar~umentação,
mas peÇü:"lhe licença para mais confiar no que
escreveu, do que rio. que falIou; o escripto
presuppõe a meditação, e à: meditação de um
juriséonsulto como o nobre deputado offerece
maior garantia. ,..
O SR, ALENCAR AnARIPE: - JIr. sei a que se
retere; ã expressão propl'Íá deve ser possuidores
e não proprietariOs.
O SR.. FERRÉlRA VIANNA: -".. a expressão
prôprietarios é a confissã.o mais completa que o
nobre deputado podia fazer do reconhecimentu
do pleno dominio das ordens regulares sobre todos
os bens quecoristiluem o páttimonio, A commissÁ.o,
porédl, foi mais sagaz; sagacidade propria dos
velhos parlamentares. O seu fim ~eservado é
destruir ás ortiens monasticàs, disfarçado por uma
providencia de câtacter fiscal, incluida de modo
forçado na lei do orçamentd. Sinto profundamente
estar constrangido nos estreitos limites de uma
unica discusSão, e receioso de retardar a approva-
ção do orçamento, recladlada com urgencia pelo
honrado Sr, presidente do conselho; desejava
uma discussão mais larga, e que o substitutivo
fosse d.esannexado do orçamento, para desenvólvet

- -7-

com plena liberdade as minha~ OplnlOeS sobre a


necessidade de restaurar as abatidas ordens regula-
res.
O desígnio de todas as providencias em discus-
são é abreviar os dias das ordens religiosas,
apressar a liquidação de seus patrimonios, não
em beneficio dos proprietarios, mas em vantagem
do fisco, transpondo embol'a os limites da lei,
concu lcando direitos sageados e consagrados, atro-
pellando garantias constitucionaes, suffocando
nobres vocações, prohibindo a liberdade do voto
de consciencia, e quebrando uma das mais po-
derosas armas do catholicismo em defeza contra
as aggressõ~s progressivamen'te violentas da impie. .
dade. O fim reservado das medidas em discussão
é a destruição das communidades religwsas; e
em vez do emprego dos meios decisivos das
revoluções, pretende -se usar dos indirectos e
fiscaes; a morte pela longa e dolorosa agonia.
(Muitos apoiados.)
Impellido pela consciencia de catholico aposto-
lico romano, não posso deixar de agradecer neste
augusto recinto as francas declarações do illusbado
membro relator da c~missão, do nobre ministro
do Imperio. e de todos os demais 8rs. deputa<Jos
que fallaram em abono das providencias · em
discussão, tendentes ao reconhecimento da neces-
-8-
sidade de restaurar as ordens regulares do Im-
perio.
A palavra foi concedida ao homem pelo Creador
para orgão fiel de seu pensamento. Insph'ado pelo
dever de christão, confiado na boa fé dos homens,
depositando pleno con~ito nas pessoas que fizeram
essas declarações, eu saúdo as ordens religiosai
pelo porvir de grandeza que se afigura dourado
n08 horizontes.(lVuito bem)
O Sr. ministro do Imperio declaroU.', e a
camara ouviu: o meu desejo, o desejo e.~pontaneo
de catholico (que não ('"ade em seu fervor, nem
ao catholicismo autorisado do ungido do Senhor,
o illustre deputado pela provincia de Pernambuco,
monsenhor Pinto de Campos) é que as ordens
monasticas se rehabilitem, e que enas se restaurem
do abatimento em que jazem I
Eis a razão por que eu vos dizia- venho
defender a victima protegida por todos (apoiados):
venho defender a victima que, se podesse faUar,
supplicaria aos protectores: «Levantae vossa mão
que esmaga, libertae-me de vossa cruel protecção,
restitui-me.na posição em que sempre me achei de
desprotegida, tratae-me cqp1 a graça. de vosso
esquecimento e desamparo, quero para mim os
vexames que supportam os demais proprietarios
que. usufruem as vantagens do vosso desfavor.
·-9-
o . . osso apoio quer dizer imposto illimitado e
progressivo, que em vez de segurar-me á beira do
abysmo lança-me no que tem de mais profundo I
Por piedade, dae-me um ar de vosso desagrado,
derradeira esperança de minha salvação. »
Entretanto, vêde, senhores. a resignação destes
homens humildes, destes homens do trabalho, da
m~lditaçàO e do estudo, nem um queixume {azec"
ouvir;confiam nas ferventes preces que nas solidões
do claustro elevam A'quelle que. tudo domina.
Esperam remedio e conforto nos dias de tribulação
daquella fonte de todo o bem. A milicia gloriosa
da sagrada cruz defende-se com a resignação,
suprema vingança das causas nobres quando
immoladas. (Muito bem.)
O pesado imposto com que os amigos das
ordens religiosas querem protegeI-as, é um grande
atrentado aos principios constitucionaes, aos inte-
resses de nossa santa religião, ás regras de justiça
na distribuição das contribuições, e injustificavel
esquecimento do glorioso ebeneftco passado dessas
illustres communidades.(Muito bem.)
E' serio, Sr. pl'esidente, muito serio, pretender
julgar o passado: primeiro, porque nós não vive-

mos nelle; depois, porque lhe devemos muito: o
que possuímos de mais elevado nas artes e nas
sciencias delle nos veio.· Maldito daquelle que
- to-
dissipar essa heran.ça. Nosso grande dever é
oonserval-a, augmentando.8.. para transmittir ao
futuro. (Apoiados: Muito bem.)
Eu creio, Sr. presidente, que estou a coberto de
qualq uer suspeita em relação á situação politica
e aos futuros destinos do partido conservador:
não venho, nem pas')ou pelo meu pensamento.
concorrer pura que esta situação estremeça; de
minha leaWade e dedicação tenho dado penhores
mais solidos do que seriam as minhas proprias
palavras. (Muitos apoiados)
~[as eu não me julgo neste;momento em presen-
ça dos meus amigos politicos, ou no recinto da
camara dos Srs. deputados, estou dentro da minha
consciencia, e considero esta assembléa quasi
que um templo, em que por dever, que não
posso renunciar, venho expôr os meus escrupulos
contra a adopção de providencias legislativas que
averbo de olrensivas aos direitos das ordens regula-
res, aos santos interesses e fecunda influencia
do verdadeiro catholicismo. (Apoiados.)
Sou um daquelles cegos que não quer ver,
na accentuada phrase do illustrado relator da la
commissão de fazenda; e se mais densa é minha

cegueira depois do discurso do nobre deputado,
altribuo esta infelicidade á luz que em ondas
dorramou sobre tão importante discussão.
-11-
Sou tatilbem dos' que se deixam' arrebatar pelo
entbusiasm'o. Oenthusiasmo é a nobre paixão qu'e
levant~ os corações e robustece as crenças; é o
fogo sagrado da fé e o poderoso exeeutor das'
grandes idéas. Tudo o que o povo tem feito de
fecundo e glorioso deve-se ao enthusiasmo. O
calculo faz o que passa, o enthusiasmo o que
fiM.. (Muito bem).
A situação politica que o Jmperio hoje occupa
entre as nações não tem outra base senão os
sacrificios de um povo opprimido (muito beni)
impostos pelo entbusiasmo que inspirou a grandeza
de seus destinos, a consciencia de seu podêr e' a fé
em seus direito~. Ir além rle seu dever, é conql1is"-'
tal' a gloria; não transpor 03 limites da obrigação,
é manter o bem-sstat inJi "idual. S3m enthusiasmo
não se vae adiante do uever; fica-se áquem da
gloria·. (A poiados. Muito bem)
Eu muito aprecio as mánlfestações dos meus
collegas, mas hão de me perdoar que lhes dig.a,
e digo.:.o invocando o testemunho de Deu~ : nestag
mat.~rias pouco me importa ficar só; porque fico
com a minha consciencia. (Muito bem.)
S:·. presidente, iS razões claras que serviram
de fundamento ao adclitivo, enunciadas pelo meu.
honrado amigo depu lado pela provincia do
Para ná, clJja autoridade muit o respeito, corrobo-
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radas pelo'! outros membros que fanaram, se me
. não falta a memoria, são-que as ordens monas-
ticas teem gasto desordenadamente os bens que
constituem seus patrimonios.
Entendem ainda os illustrados propugnadores
das providencias em discussão, que em bem dos
interesses da religião cumpre cohibir taes abusos,
e previnir a dissipação do ultimo quociente de
tão consideraveis acervos. Não resistirei jamais a
medidas tendentes á conservação de bens desti-·
nados á manutenção do culto com toda a necessa-
ria dignidade; mas affirmo que os meios aconse-
lhados pela cClmmissão e adoptados pelo Sr. minis-
tro do Imperio, ou propllstos pelo nobre deputado
pela provincia do CeariÍ, produzirão resultados
muito differentes se não 0~post9s.
Em que consiste u disú;llÇão dos bens das or-
dens regulares? 03 defenso,es das providencias em
discussão, denunciam a diminuição da renda e
augmento crascente do passivo. Esta accusação não
pódecaber á administração benedictina e nem á
de S. Francisco.
O augmento do imposto,o imposto progres~ivo e
illimitado,.a obrigação de conv&rter no praso im-
prorogavel de cinco annos os bens em apolices in-
transferiveis da divida publica,éum singular meio
de corrigir os abusos, de impedir a repetição de
13 -
excessos monastica, é
singular ! (Risadas.)
Eis ha pouco eu me
da DrCltecc,/)o defensores das
discussão dispensam em favor das ordens regula-
res. A vingarem as proviJencias ém discussão, a
administração monastica tornar-se-ha desnecessa-
ria, porque desapparect'l'ão os bens, absorvidos
pelo imposto .Não, O fim não é aperfeiçoar a admi-
uistração, é incorporar os bens religiosos ao tqe-
sou suave e maIS
remedio é para curar o
tornar impossi velo
mento. que os illuslrados
das sejam dominados
juizoeconomico que o imposto promov0 a produc-
ção e particularmente o imposto sobrca base de
falta de renua. Seria mais logico, ou pelo menos
mais franco, decretar ctuertamente a extincção das
commllllidal~3 l'Jligíosas, do que promover a re-
minislra~.iío pela aggra vação

pela província
tem da commissão
da; apenas no meio pratico
lisaI-o. A commissão emprega o meio indirecto da
elevação da taxa do imposto, o nobre deputado
14
determina a conversão em periodo illlproro-
gaveI.
Sei,que ha J})Olitjcos de e~periencia e saber que
,preferem P .uso dos ,meios indireli:t.os para ,reaU~ar
ce~~os fins, aos ,meios direct.oS: .o temp.o desta
politi~ pasaou.
NãQ.approv.o as maximas des~ escola p.olitica
,PQl'qp.eentend.o que ao; illu"óes Stã.o h.oje difficeisn.o
Ig.o.verno da pQblicidade, ao ,pa~so que dão teste-
Jnunh.o de ip.decisã.o.nas resoluções da adminis-
,traçã.o. .E' nec~ssari.o c.ollocar as questões com
fil'me,za e sillCerida.de. (ApQiados,)
~ -abolição das, ordens religi.osas.é uma ques~.o
renovada, sempre que .o g.overno ci.vil $ente-se ,em
difficuldades fiuanceciras.,Ou accusem os religiosos
de inimig.os irrec.onciliaveis d.o pr.ogn~sso, .ou c.or-
demnem a vida d.o ~laustr.o c.om.o um sacrifici.o
inutil, .ou averbem de prej'\(licial á riqueza publica
a imm.obilidade d.os patrimoni.os, .ou finalmente
de dissipad.ora a administraçã.o, .o espirito inn.ova-
dor nã.o perde de mira .os bens d.o claustro. ~Ias .o
espírito conservad.or, sempre disp.ost.o a reparar.
resiste ás intenções d.os destruid.ores. Os religi.os.os
sã.o tratad.os c.omo f.oram .os ju41eus. Uns confiscad.os
s.ob a presumpçã.o de serem christà.os n.ov.os,.outros
.sob o pretexto de serem christã.os velh.os.
Infeliz do governo e do paiz que prestar .ouvidos
- 1'5-
aos máos instinctos, sempre avidos e sempre insa-
ciaveis, que aspiram o impossivel e se lançam
sobre o desconhecido. Esses são os ditfamadores
das ordens (Ilonasticas, .sÓ .pela razão de st'rem
instituições antigas.
Os governos revolucionarios, ou poJ.l circumstan- '
cias imprevistas, ou col1(i)cados na dolorosa .O(i)U-
dição de cederem aos impu]sQs da revoluQão .voo-
cedora, não deliberam, obedecem ..Nesta crise su-
prema, a abolição· das ordens religiosas foi deore-
tada. No meio da agitação se resolveu.a ex:tincçflo
das communidades religiosas em todo o reino ida
Italia, como em ·França, em Portugal e na Ues-
panha.
O claustro algumas vezes tem d~putado. seus
direitos recorrendo ao apoio do seculo. Se não é
legitimo que os homens da oração se defendampe-
los meios temporaes,ao menos é esctlsavel,porque
na revolução elIes reconhecem seus constan tes
inimigos. bem como do altar e do throno. Alguns
conventos intervieram nas lutas que precederam a
annexação de diversos Estados que hoje formam o
reino da Ilalia, mas o prisioneiro revestido da es-
tamenha grossüra cto monge, e com signaes da
polvora nos labios, pagou caro 11 dereza do throno
cahido e do altar vacillante. As orden~ religiosas
succumbiram, e s~ms bens despedaçados não cor-
-16 -
respondem ás lisongciras ('speranças dos que os
absorvt:ram,
Nós não estamos nessas tristes circumstancias.
O SR. PINTO DE CAMPOS: -Felizmente.
O SR ..FERREIRA VIANNA:-OS nossos poucos reli-
giosos são mais que submissos, victima~ que ca-
10inham para o abysmo Jo desapparecimento sem
proferir uma só palavra.
E notae bem. Aqui a injustiça tem todas as cÔres
de um attentado ..
Elles tudo' abandonaram, as heranças de seus
antepassado;, lodos os direitos politicos e civis.
Elles voltaram o rosto ao mundo, e fizeram seu
voto de consciencia a Deus.
Como é que o governo do paiz, constante man-
tenedor (los principios de ordem, e que tem tão
largas vocações para a liberdade, ousa (fizer a es-
tes desherdados, a estes homens que renunciaram
tudo para viver em comtllLlIIidadi~, para adorai' ü
. seu Beus pelo meio mais s~guro, como tal rec\J-
nhecido e coniagrado pelos santos concilios e pelos
ponlifices : eu nilo consinto na eontinuação de
vossa ordem; disponde de vosso patrimonio; paga(~­
me um impost.o impossível etprüparae-vos a rom-
per o voto de vossa consciencia?
Independente da memoria dos valiosos serviços
prestados I.t humanidade pelas cl)mmunidade~ re-
- 17-
-t.
ligiosas, existencia glo-
riosa durante independente de seus
direitos poderia assistir
mudo ao saciar a avidez
doforle.Filho obediente da Santa Igreja Catholica, •
julgo-me no rigoroso dever de defender a institui-
ção monastica reconhecida pelo Summo Pontifice,
meu soberano 'espiritual, parte mais nobre de meu
ser.
O SR. PINTO bem.
O SR. esbulho é uma
violencia. não podem ser
cerradas.Fechal-as,e sempre. é uma
immoralidade, immoralidade. (A poia-
dos e não apoiúdos.)
Estudae, senhores, a natureza humana, estu-
dae-a, ~ cada um de vós seja o juiz, interrogando
um por um os dias de sua vida.
Quem é, quem é este espirito desvairado, des-
cuidoso, que não teve um dia de decepção amarga,
um dia de que não se sen;..
I ,
tiu no fundo como um phantas-
I .instinclos da
conservação seus dias? Esta
triste posição tem uma unica esperança, um
conforto: fechar atraz de si aS' portas do mundo,
~ncerrar-se nas solidões do claustro .


-------_._.. "'-'~~"':

-.18 -
Não está provado pelas mais competentes autori-
dades que os suicidio3 se te3m multiplicado depois
que os desesperados, privados da mansão dos élaus-
tros,foram obrigados a lutar no tumulto das paixões
e dos interesses do seculo ,
O SR. PINTO DE CAMPOS : -E' uma verdade ..
O SR. FERREIRA VIANNA : - Se, porém,aiJlustre
commissão me assegura, e o governo, representado
pelo Sr. ministro do Imperio, confirma que se per-
siste no desejo de restaurar as ordens regulares,
não pouparei esforços, e concorrerei como poder
para a realisação de tão fecundo pensamento.
(Apoiados ).
E' tempol Em vez de lhes apertar a garganta com
o baraço do tributo, facilitemo-lhes os meios de
prompta e solida regeneração. Já não me seduzem
fallazes illusõeslAs min has desconfianças crescem,
e eu percebo atravez de todas essas douradas pro-
messas a dolúrosa realidade I As ordens religio-
sas estã,) no vacuo medonho, a machina pneu-
matica, o imposto, "ae pausadamente extrtthindo
o ar, até que o ultimo monge, e com elle a ordem,
morram asph.yxiados. (JJl'uito bem.)
Entretanto tenho fé, e mujto robusta, que assim
como o tempo teve força para abater, terá tambem
o poder de levantar.
A causa das ~rdens regulares no Brasil não está
___ ..LI_ _ _ _ _ _. . ._

11-----

- 1~1-

perdida; pelo contrario, julgo-a eflicazmente


apoiada pelo solemne compromisso que hontem
fez o Sr. ministro do Imperio.
Entretanto cumpre não occultar a verdade. Se
os conventos dissipam df'sordenadamente seu pa-
trimonio, o governo tem sido cumplicc (Apoia:los.)
O SR CORRêl: - Não apoiado, não tem sido
eumplice.
O SR. FERREIRA. VIA.NNA.:--Quando falIo em-
governo - é escusado dizer ao meu nobr~ amigo
que não mB refiro ao ministerio de 16 de Julho .
. O SR. CORdA: - Ainda não sei qual o governo
do paiz que tenha sido cumplice nas' dissipações
das ordens religiosas. .
O SR. FERREIR.~ VIA.NN,~: - ))ir-lhe-hei em pou-
cas palavras.
Pela lei de 9 de Dezembro de L~30 as ordens
regulares, sob pena de nullidade, não podem
fazer contratos onerosos, nem alienações de qllal-
quer esp:~cie, sem intet'venção e con3enti~nento do
governo.
Á. exigencia de expressa e precedente licença do
governo para a celebração de taes contratos, collo-
cou as ordens regula.es sob a immediata e con-
stante inspecção do governo na disposição do· pa-
trimonio. O governo deve conhecer préviamen~e
da necessidade e conveniencia do contrato, tem ~
- 20-
direito dp. fixar o minimo do preço da alienação,
e até acautelar o emprego do producto.
O SR. CORRtA: "- E quando contrúem dividas
e passam letras?
O SR. FERREIRA VJANNA: - Não podem contrahir
dividas; e se as contráem são nullas, salvo se
recübirem sobre as novidades de suas terras de
lavoura, rendas de seus predios urbanos e bens
moveis não adherentes ás fabricas agricolas, ou
necessarios ao culto divino.
Mas a este respeito o projecto não toma provi-
dencia alguma.
O SR. ANDRADE FIGUElRA: - A lei de 1830 tam-
bem falla dos bens moveis:
O SR. FERREIRA VUNNA: - Sim, senhor; dos
moveis e semoventes.
Portanto, eu tenho o direito de declarar á
camara dos Srs. deputados que se os conventos
teem dissipado seus patrimonios, o governo do paiz
tem sido cumplice. (,tpoiados e não apoiados.)
Então em que consistem as dissipações?
Senhores, não ha maior injustiça, e, eu peço
perdão para dizer, temeridade, do que o poder
civil accusar as congregl.ções monasticas de
dissipação.
O SR. CORRÊ A: -No relatorio está a divida dos
&onventos.
21
o SR. FERREIIlA VIANNA: - Nós não temos o
direito de lev:mtar semelhante a ccusação, bem
como nenhum dos governos da culta Europa, por-o
que nos dias de crise, na vespera das bancarotas,
os governos, aturdidos, recorrem aos acervos das
communidades religiosas, e com elles enche~ os
abysmos aberto~ pelas guerras de capricho, pelas
enormes despezas de ostentação e pela voraci-
dade da clienteUa de .que não podem prescindir.
(Apn iado.~.)
Dissipadores os religiosos I Os confi"scados accu-
sadof> de prodigos pelos confiscadores I Procurae
os titulos de acquisição da propriedade dos reli-
giosos regulares e reconhecer~is sua antiguidade
quasi immemorial. São pergaminhos enegrecidos
pelo tempo, e que já se não podem ler. Os religio-
sos são deposita rios dessas riquezas que devem só
e sómente á pi edade nos tempos de fé ardente e de
devoção sincera.
O SR. SOUZA REIS: -E quem tem feito dos con-
ventos quarteis de soldados' Quem tem concorrido
para o estrago dessas casas?
O SR. FERREiRA VIANNA : - Isto tem succedido
pela regra-que o s~dado é o herdeiro forçado do
padre. (Hilaridade.)
Foi, senhores, nos claustros que os goyernos
primitivos do municipalismo aprenderam as leis
- 22-
da economia. A minima moeda lançada pela pie-
dade publica nas mãos do monge fructificava.
Com esses mingoados recursos, os hoje condemna-
dos como dissipadores, levantaram magnificos
templos, abriram escolas, ensinaram as arhlS e
officios, e mantiveram o culto divino com mag-
nificencia. Edificavam por toda a parte; no fundo
quasi impenetravel das florestas, nos cimos in··
accessiveis das penhas e no centro (las cidades!
'Os mais habeis e mod~rnos administradores
contemplam com pasmo essas construc~ões mara-
vilhosas.
Para fundar a accusação de dissipadores levan-
tada contra as ordens regulares, tem-se avançado
nesta casa que seus bens não dão renda propor-o
cionaI.
O espirito que domina a administração monas-
tica não é o mesmo da administração do seculo. O
patrimonio, das ordens religio ias é mais dos pobres
do que da communidade. As suas terras estão
retalhadas em pequenas fracções, distribuidas
pelos necessitados, que pagam insignificante rmida
nos annos de abundancia, e em vez de pagar
ainda recebem esmolas nos.maos annos. Seus
escravos trabalham menos, porque nas fazendas
dos -religiosos respeitam-se todos os dias sanetifi-
cados, os direitos naturaes da familia, e além
----------------------==""~"~', .
- 24-
amor de congregação, de ordem. O convento.
é o seu mundo; elIe deseja que seu nome, suas
glorias se perpetuem na historia de sua ordem,
que ene pensa immortal. Considerae, porém, que-
o religioso tenha na consciencia a certeza do des-
apparecimento prompto de sua ordem, que e11e
vê de dia em dia approximu-se do occaso; por
que e para que trabalhar e poupar? .
Emfim, como regularisar··se a administração se
os administradores morrem e não são substituidos?
Fechaes as partas dos conventos, e accusaes os
religiosos. que mal podem acudir ao serviço do
culto divino, de relaxados e dissipadores!
O religioso não tom familia, mas tem o espirito
de sua congregação. (Apoiados.)
Os poucos que restam aguardam tristes o signal
d,as exequias de sua ordem, segunda patria I
Quaes guerreiros de Ossian, contentam-se com re-
memorar a gloria do passado.
Não contesto, e antes tenho razões para crer, que
nas ordens religiosas se dêm abusos que cumpre
cohibir; mas não concordo que sejam extinctas,
pelo meio indirecto e odioso do imposto, institui-
ções que durante tantos secu~s prestaram yaliosos
serviços ás leUras, ás artes e á humanidade. Se os
abusos justificassem a destruição das instituições,
nenhuma poderia escapar á definitiva condem-
-!5-
nação. Cortem-se do tronco sagra-
do, e os renovos A vida das
ordens religiosas nós. Â instituição
monastica ; emquaato o
homem não passar por outro molde, a communi-
dade claustral subsistirá. A França aboliu os con-
ventos e elles se multiplicam, assim na Inglaterra,
• nos Estados-Unidos e em outros paizes. (Apoiados.)
Â. prevalecer a providencia offerecida pela l'
commissão de fazenda, os bens das ordens religio-
sas serão pagamento de
impostos. aproveitará, e
muito menos
Senhores, impiedade. A impie-
dade cresce, e com a inundação da anarchia.
(Apoiados) .
O principio da autoridade continua a ser ata-
cado em seu fundamento. a autoridade de Deus,
autor de todas as cousas. ( A.poiados.) .
De!xemos ás revoluções a gloria de destruir uma
instituição otravessado t ,300
annos, grandes catastro-
pbes politicas naufragios sal-
vando tudo e duravel. Os
monges são das penedias.
Em verdade, senhores, fui sorprendido; ,are-
cia-me impossivel que o partido conservador, na
- 26-
plenitude de sua influencia, se arriscasse a tentar
contra a existencia das ordens religiosas, oppri-
mindo-as com imposições insupportaveis, injustas
e odiosas. (A poiados.)
O partido conservador nem deve aceitar e nem
provocar reformas radicaes, de (ond en cambie;
entretanto eu receio que o espirito de novidade
chegue até n6s, tanto elle se propaga. Entrar nesse
caminho do desconhecido, de reformas radteaes,
é sujeitar o paiz ao maior de todo~ os perigos, o de
transformações successivas. O paiz est.ará sempre
por organisar-se. Agrande, a li niversal força do par-
tido conservador reside na actividade que desen-
volve para melhorar, e na firmeza com que resiste
ao espirito de innovações irreflectidas. (Apoiados.)
Senhores, o Estado não é anima l1ili, mate ria
inerte e disposta a experiencias. (Apoilldl).~.) A opi-
niãoconservadora não póde,não deve, sem sacrifi-
cio de suá legitima influencia e autoridade, inspi-
rar-se nas exigencias temerarias dos innovadores
incorrigíveis. ( Apoiados. )
Tal tem sido a importancia moral das ordens re-
ligiosas, e tão geralmente reconhecida a sua ne-
cessidade, que a revolução rlTtlnceza em 1 i90, de-
cretada a extincção, foi compellida a revogaI-a re-
coooecendo o vazio insupprivel de que se sentiu
logo a sociedade ainda em convllsão. (Apoiados.)
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o SR. PINTO DE C.'MPOS : - B'lrnavc pedia a vol-
ta dos jesuitas.
a SR. FERREIRA VIANNA : - Reconheceram que
se é faeil destruir mais difficil é reconstruir.
a partido conservador não agita e nem promove
explosões; caminha com pru~encia e segurança.
Deixa obra segura e duradoura, aprende nas leis
da historia e da natureza.
Estou tranquillo, porque vejo á frente do minis-
teriode l~ de Julho um cidadão em quem deposito
inteira confiança, e estou certo que n~o transige a
respeito dos verdadeiros principios do partido con-
servador (apoiarlo~), conservar para melhorar e me-
lhorar para conservar. (Apoiados. Jf.uitu bCln.) .
Scnhorp,s, COlltra ornen desejo nego o meu insig-
nificante voto ás proposi,::jes em discmsão,porque
as cnnsiriefl) inju5ta~, (dio5as e excessivamente
oppressivas. Não ha r.uão para assim proceder
contra os conventos, e muito principalmente contrá
a ordem religiosa de S. Bento. Se exigem esses im"7
postos para acudir ás cxigencias do Estado, não
dC':em esquecer os grandes donativos que a ordem
be. Ledictina tem generosamente feito em todas 'ás
cii'~umstancias de neaessidade e perigo,. desde ()
dia cruel em que foi preciso comprar com dinheiro
o socego desta cidade bombardeada pela esquadra
do famoso almirante Duguay Trouin.
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Para armamento contribuiu com consideravel
quantia por occasião da ameaça ingleza em 1863.
Para esta guerra concorreu com grande numero de
voluntarios, f' sem intenção de obter condecorações
e baronatos.
Se pensaes em forçaI-os á emancipação dos cap-
tivos, não póde ser maior a injustiça. EstaqueSião
está resolvida na ordem benedictina desde 1865, e
se os religiosos não dão completa prova de sua re-
solução é por temor das consequencias.
Entretanto não te,ria duvida ~m votar pelo sub-
stitutivo offerecido pela commissão se o governo. se
obrigasse a consentir na entrada de noviços, em-
bora em numero limitado. Só assim comprehendo
a rehabilitação das ordens religiosas, e til. reorgani-
sação de sua administraçüo. (A.poiados. )
VOZES: - Muito bem; maito bem.

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