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Edição Agosto de 1997

Índice

Charadas e descobertas do passado, cheias de aritmética e cálculo mental, dão novo


encanto ao aprendizado

Ricardo Falzetta
Jardim
itágoras e Ptolomeu foram grandes pensadores da antiga civilização
grega. Trabalharam em diversos campos do conhecimento e suas
teorias influenciaram centenas de gerações. Até hoje, causam admiração
as saídas intuitivas que encontraram para os mistérios matemáticos de
sua época. Você pode empregar esses sábios como assistentes de classe
para dar encanto e eficácia às suas aulas.

Tempero diferente
A recomendação é de dois professores que se empenham em mudar a
cara geralmente amarrada da disciplina: Washington José Santos Alves e
Marcelo Ribeiro. A experiência prática lhes permite assegurar que o
rendimento dos alunos melhora se o professor tempera as aulas com
truques extraídos da história da Matemática. Ela está cheia de situações
favoráveis ao ensino, como você verá nas sugestões desta reportagem,
que recorrem a Pitágoras, a Ptolomeu e a uma charada romana de quase
2000 anos.

Marcelo leciona no Colégio Santo Agostinho, no Rio de Janeiro, e mantém


uma divertida página na Internet, a MatNet (veja o endereço no quadro "Mais informações"). Washington é
professor do Colégio Magno, em São Paulo, e consultor da Editora Ática.

O DESAFIO DE PTOLOMEU - Para quinta a oitava série


Curiosidades sobre famosos matemáticos da história da humanidade têm um poder especial de atração.
"Misturam um pouco de aventura, ficção e muito conteúdo", diz o professor Marcelo Ribeiro. A maioria delas
pode ser resumida em pequenos contos matemáticos como este, sobre Ptolomeu.

O PROBLEMA
Certa vez, em suas andanças pelo Egito, Ptolomeu teria sido desafiado por um faraó a medir a altura de uma
de suas pirâmides. Mas havia uma condição. Ele não poderia se aproximar dela com nenhum tipo de
instrumento de medida.

O artifício que Ptolomeu usou para resolver o desafio foi simples: usou a noção de proporcionalidade.

Uma proporção, como ensina o professor Marcelo Ribeiro, pode ser escrita em forma de fração, de modo a
relacionar duas grandezas. Por exemplo, podemos dizer que, se em uma fileira de 15 centímetros de
comprimento conseguimos acomodar lado a lado três bananas,

outra fileira que tenha o triplo do tamanho terá disponível um espaço onde caberão três vezes mais bananas.
Essa proporção se traduz em: 15 centímetros está para 3 bananas assim como 45 centímetros está para 9
bananas. Ou, escrevendo matematicamente...

A SOLUÇÃO
Para resolver seu desafio, Ptolomeu utilizou o seguinte
estratagema: apoiou uma estaca de tamanho conhecido, 1
metro, sob a luz do Sol. O objetivo era comparar a sombra
da pirâmide com aquela projetada pela estaca. Como as
faces da pirâmide são inclinadas, Ptolomeu precisou fazer
um ajuste. Acrescentou metade do lado da base da
pirâmide à medida de sua sombra, para obter a distância
até o centro da base. O passo seguinte foi estabelecer
uma relação entre essas duas medidas.

A proporção pôde então ser escrita:


Calculando o numerador da segunda fração, teremos a altura da pirâmide.
Neste exemplo, é 20, ou seja, a pirâmide media 20 metros

Uma observação: as medidas estão adaptadas para padrões atuais. Ptolomeu certamente fez seus cálculos
usando côvados (antiga medida equivalente a 3 palmos — 0,66 metro) ou braças (equivalente a 10 palmos —
2,2 metros).

Depois de contar essa história, convide seus alunos a dar uma volta no pátio da escola e descobrir uma
edificação que possa ter sua altura determinada com a mesma técnica. Se possível, o próprio prédio da
escola.

ATRASO DE QUATORZE SÉCULOS


Claudio Ptolomeu (90-169) viveu parte de sua vida em Alexandria, no Egito. Foi
matemático, geógrafo e astrônomo. E saiu-se bem nas três áreas. Em sua
principal obra, Almagesto, fez uma síntese das idéias dos astrônomos gregos da
Antiguidade. Catalogou 1022 estrelas, das quais 172 descobertas por ele
próprio, e inventou o astrolábio, um instrumento para medir a altura de um astro
acima do horizonte. Mas foi por sua idéia equivocada sobre o centro do universo
que o pensador ficou eternamente conhecido. Para Ptolomeu, a Terra ocupava
essa posição privilegiada, com as estrelas e os planetas girando ao seu redor.
Era a teoria geocêntrica, conceito que predominou durante quase 1400 anos. Foi
somente com Nicolau Copérnico (1473-1543), astrônomo polonês, que surgiu
uma nova teoria, mais próxima da realidade: a heliocêntrica. O Sol passava a ser O grego Ptolomeu:
considerado centro do universo, com a Terra e os planetas girando ao seu redor. teoria equivocada
Foi a primeira concepção de sistema solar de que se tem notícia. Para chegar a ela, Copérnico retomou
idéias de outro pensador grego, Aristarco de Samos (310 a.C.-230 a.C.), que, curiosamente, viveu 400
anos antes de Ptolomeu.

RAIZ QUADRADA É FÁCIL - Para sexta série

Veja neste exercício, sugerido pelo professor Washington Alves, como o Teorema de
Pitágoras pode ajudar a calcular a raiz quadrada aproximada de alguns números. Só para
recordar, lembre-se de que há duas opções para explicar aos alunos o conceito de raiz
quadrada, um tema quase sempre mal compreendido:
1) extrair a raiz de x é descobrir um número que, multiplicado por ele mesmo (ou seja,
elevado ao quadrado), resulta em x. Por exemplo, a raiz de 25 é 5, pois 52 =25.
2) raiz quadrada de um número é a medida do lado de um quadrado cuja área é esse
número. Por exemplo:

A maioria dos professores usa apenas a primeira explicação. A segunda geralmente é deixada de lado. "Mas,
por ser mais geométrica e concreta, fica mais fácil de entender", diz Washington. Ao usar também essa
opção, você tem oportunidade de aplicar com seus alunos cálculos alternativos de raiz quadrada que deixam
o conceito mais consistente.

Em seguida, verifique qual a composição do número 13 na tabela. No caso, 9 e 4 (ou 32 e 22, que, somados,
resultam 13). O Teorema de Pitágoras nos ensina que o quadrado da hipotenusa — o lado maior do triângulo
retângulo, oposto ao ângulo de 90 graus — é igual à soma dos quadrados dos catetos — os outros dois
lados. A medida da hipotenusa será a raiz quadrada da soma dos quadrados dos catetos (neste caso, 13).

Basta, então, construir um triângulo retângulo com catetos de 3 e 2 centímetros usando a margem e uma das
linhas do caderno, que formam entre si um ângulo de 90 graus. Depois, mede-se a hipotenusa resultante,
chegando ao valor aproximado da raiz. No caderno do aluno, ficaria assim:

NO PRÓPRIO CADERNO PAUTADO


Para treinar raiz quadrada com seus alunos, o professor Washington ensina uma técnica que, além do
Teorema de Pitágoras, usa o caderno pautado e uma régua. O método tem uma restrição. Só vale para
números que possam ser decompostos em dois outros quadrados perfeitos, isto é, números que têm raiz
quadrada exata. O número 85, por exemplo, decompõe-se em 36 e 49, de raízes 6 e 7. Mas você pode
começar com um valor menor, como 13, que pode ser decomposto em 9 e 4, cujas raízes são 3 e 2.
Acompanhe a técnica.

Construa uma tabela auxiliar com duas colunas que contenham a seqüência inicial dos quadrados perfeitos

1 1 (quadrado perfeito de 1) 1²
4 4 (quadrado perfeito de 2) 2²
9 9 (quadrado perfeito de 3) 3²
16 16 (quadrado perfeito de 4) 4²
25 25 (quadrado perfeito de 5) 5²
36 36 (quadrado perfeito de 6) 6²
49 49 (quadrado perfeito de 7) 7²

PITÁGORAS OU PITAGÓRICOS?

Pitágoras de Samos (580 a.C.-500 a.C.) é considerado fundador da Escola de


Crotona, centro de estudos localizado numa colônia grega na Itália. Lá foram
estabelecidos os números irracionais (raízes inexatas, por exemplo) e o famoso
Teorema de Pitágoras, que mostra as relações matemáticas entre os lados do
triângulo retângulo. A Escola era freqüentada por uma turma de estudiosos com
hábitos um tanto diferentes. Eram todos vegetarianos e cultuavam o silêncio e o
anonimato. Para eles, os mais velhos eram sempre os mais sábios. Em sinal de
respeito ao fundador da Escola, assinavam todos os seus trabalhos em nome da
Fraternidade Pitagórica ou, simplesmente, em nome de Pitágoras. Uma decisão Pitágoras de Samos:
que até hoje confunde os historiadores. Os mais desconfiados chegam a supor legião de
que Pitágoras poderia até não ter existido. admiradores

O MISTÉRIO DOS PALÍNDROMOS - Para sexta série


Uma palavra ou frase que mantém o mesmo sentido ao ser lida da esquerda para a direita ou vice-versa é
chamada de palíndromo. Por exemplo, ovo, Mussum (humorista do programa "Os Trapalhões") e Menem
(presidente da Argentina, Carlos Menem). O termo palíndromo também é usado para os números que
seguem essa regra. Por exemplo, 121, 34543, 505, 12321. Lidos da direita para a esquerda, são os mesmos
números. Esse tema vira uma atividade bastante divertida nas aulas do professor Washington, que
descrevemos a seguir.

DAS LETRAS AOS NÚMEROS


Em primeiro lugar, fale sobre os palíndromos de texto e cite alguns exemplos. Prefira termos do cotidiano.
Assim, seus alunos vão perceber que, apesar de comuns, os palíndromos raramente são percebidos.

As palavras
MIRIM
RADAR
OSSO
ARARA

Ou a frase
SOCORRAM-ME SUBI NO ÔNIBUS EM MARROCOS

Em seguida, fale sobre uma das frases palíndromas mais famosas, escrita na
forma de um quadro, como na ilustração abaixo. A ocorrência mais remota
dessa inscrição em latim foi encontrada em um lavatório público nas ruínas de
Pompéia, cidade romana arrasada pela erupção do vulcão Vesúvio, no início
do milênio. Não se sabe quem a escreveu, mas ela aparece também em
igrejas e templos da era medieval. Alguns pesquisadores arriscam uma
tradução que homenageia os agricultores: "O semeador Arepo mantém o
mundo girando". Mais intrigante, porém, é que o quadro pode ser um código.
Com suas letras é possível escrever duas vezes a expressão "Pater Noster"
("Pai Nosso", em latim), na forma de cruz, tendo em comum a letra "N".
Sobram, nessa configuração, duas letras "A" e duas letras "O". Segundo
historiadores, essas letras, que correspondem à primeira e à última do alfabeto grego (alfa e ômega), eram
usadas pelos antigos cristãos para simbolizar a figura de Jesus.

P
A
T
E
R
A PATERNOSTER O
O
S
T
E
R

Uma atividade interessante é pedir aos alunos que tentem formar palíndromos com letras. Mesmo que
cheguem a expressões sem sentido, o importante é o estímulo ao raciocínio lógico que a atividade propicia.
Você pode até parar por aí, pedir que os alunos pensem em casa e voltem com suas descobertas na aula
seguinte. Encerrada a brincadeira, mostre um dos padrões matemáticos que geram uma seqüência de
números palíndromos: os quadrados dos números formados apenas com o algarismo 1.

12 = 1
112 = 121
1112 = 12321
11112 = 1234321

Então, sugira aos alunos que tentem descobrir a seqüência dos quadrados de números formados apenas
com 2, 3, 4 e assim por diante. Dificilmente vão descobrir o padrão que permite calcular essas seqüências
rapidamente. Deixe que façam tentativas e depois mostre a resposta e como chegar a ela usando a
propriedade distributiva da potenciação: (a.b)n = an.bn.

22= 4
222 = (2.11)2 = 22.112 = 4.112 = 4.121
2222 = (2.111)2 = 22.1112 = 4.1112 = 4.12321
22222 = (2.1111)2 = 22.11112 = 4.11112 = 4.1234321

32= 9
332 = (3.11)2 = 32.112 = 9.112 = 9.121
3332 = (3.111)2 = 32.1112 = 9.1112 = 9.12321
33332 = (3.1111)2 = 32.11112 = 9.11112 = 9.1234321

Washington José Santos Alves — R. Almirante Luís Penido Burnier, 513,


São Paulo, SP, CEP 05860-000, tel. (011) 5512-0869
Marcelo Ribeiro — Estrada do Soberbo, 838, Rio de Janeiro, RJ, CEP 20531-
370, tel. (021) 438-4900, e-mail: mribeiro@iis.com.br
MatNet — http://www.iis.com.br/~mribeiro

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