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Revista Brasileira de Terapia

e-ISSN: 1982-3541 Comportamental e Cognitiva

Um modelo experimental do transtorno obsessivo-

PESQUISA ORIGINAL | ARTICLE | ARTÍCULO


compulsivo baseado em respostas verbais e não verbais
An experimental model of obsessive-compulsive disorder based
on verbal and nonverbal responses

Un modelo experimental del trastorno obsesivo compulsivo basado


en respuestas verbales y no verbales

RESUMO: O presente estudo apresenta um modelo expe-


rimental de transtorno obsessivo-compulsivo (TOC) utili-
zando delineamentos de tratamentos alternados. Participa- Paulo Roberto Abreu 1*
ram 16 adultos verbalmente habilidosos e sem diagnóstico Maria Martha Costa Hübner 2   
clínico. Os Experimentos 1 e 2 mostram o modelo baseado  Universidade de São Paulo
1, 2

em algumas relações funcionais estabelecidas entre instru- Correspondente


ções, uma tarefa de separação de sementes e as repostas não * pauloabreu@iaccsul.com.br

verbais de checagem. Foi testado se instruções com especi- Departamento de Psicologia Experimental,
Instituto de Psicologia, Universidade
ficação de consequência aversiva ou apetitiva poderiam au- de São Paulo - Av. Prof. Mello Moraes,
mentar a porcentagem de respostas de checagem. No Expe- 1721 - Bloco G - CEP 05508-030 - Cidade
Universitária - São Paulo.
rimento 1, cinco de oito participantes apresentaram maiores
porcentagens de checagens sob instruções com especifica-
ção de consequência aversiva. No Experimento 2, sete de
oito participantes apresentaram maiores porcentagens sob
instruções com especificação de consequência apetitiva.
Concluiu-se que determinadas instruções alteraram a fun- Dados do Artigo
ção discriminativa e/ou motivadora dos estímulos envolvi-
DOI: 10.31505/rbtcc.v21i2.1153
dos na tarefa experimental.
Palavras-chave: comportamento governado por regras, mo- Recebido: 05 de Junho de 2018
Revisado: 23 de Maio de 2019
delo experimental, transtorno obsessivo-compulsivo, respos-
Aprovado: 10 de Junho de 2019
ta de checagem, humanos
Agência de Fomento: Capes

Como citar este documento


ABSTRACT: The current study demonstrates an experimen- Abreu, P.R., & Hübner, M.M.C. (2019).
tal model of obsessive-compulsive disorder using a single Um modelo experimental do transtor-
no obsessivo-compulsivo baseado em
subject design with 16 verbally skilled participants without
respostas verbas e não verbais. Revista
clinical diagnosis. Experiments 1 and 2 show a model of ob- Brasileira de Terapia Comportamental e
sessive-compulsive disorder based on some functional rela- Cognitiva, 21(2), 135-149. https://doi:
10.31505/rbtcc.v21i2.1153
tions established between instructions, a task of separating
seeds, and the non-verbal checking responses. We investi-
gated whether instructions specifying aversive or appetitive
consequences could increase the percentage of checking re- É permitido compartilhar e adaptar. Deve dar o crédito
apropriado, não pode usar para fins comerciais.
sponses. In Experiment 1, five of the eight participants in-

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creased their checking responses when they received instructions that specified an aversive con-
sequence. In Experiment 2, seven of the eight participants showed an increase when they received
instructions that specified an appetitive consequence. We concluded that the instructions altered
the discriminative and/or motivating function of the stimuli involved in the experimental task.
Keywords: rule-governed behavior, experimental model, obsessive compulsive disorder, check-
ing response, humans

RESUMEN: El presente estudio presenta un modelo experimental de trastorno obsesivo-com-


pulsivo (TOC) utilizando delineamientos de tratamientos alternativos. Participaron 16 adultos
verbalmente habilidosos y sin diagnóstico clínico. Los experimentos 1 y 2 muestran el modelo
basado en algunas relaciones funcionales establecidas entre instrucciones, una tarea de separa-
ción de semillas, y las respuestas no verbales de chequeo. Se probó si las instrucciones con es-
pecificación de consecuencia aversiva o apetitiva podrían aumentar el porcentaje de respuestas
de chequeo. En el experimento 1, cinco de ocho participantes presentaron mayores porcentajes
de chequeos bajo instrucciones con especificación de consecuencia aversiva. En el experimen-
to 2, siete de ocho participantes presentaron mayores porcentajes bajo instrucciones con espe-
cificación de consecuencia apetitiva. Se concluyó que ciertas instrucciones alteraron la función
discriminatoria y / o motivadora de los estímulos involucrados en la tarea experimental.
Palabras clave: comportamiento gobernado por reglas, modelo experimental, trastorno obsesi-
vo-compulsivo, respuesta de chequeo, humanos.

O  Manual Diagnóstico dos Transtornos


Mentais da Associação de Psiquiatria
Americana, em sua quinta edição, afirma que
do TOC é de 1,2%, sendo similar internacional-
mente com índices entre 1,1% a 1,8% (Ameri-
can Psychiatric Association, 2013).
o transtorno obsessivo-compulsivo é caracteri- Diversas hipóteses biológicas para a etio-
zado, sobretudo, pela recorrência de obsessões logia do transtorno foram propostas, contudo
e compulsões. As obsessões se manifestam por biomarcadores diagnósticos confiáveis não es-
ideias recorrentes, imagens, impulsos, medos tão disponíveis, e sua patogênese continua in-
e dúvidas. São experimentadas como autôno- definida. É possível que apenas um subtipo de
mas, e ainda que os pacientes possam resistir TOC associado à resposta autoimune em crian-
a elas, frequentemente não conseguem fazê-lo. ças possa ser um candidato devido à infecção
As compulsões, por seu turno, ocorrem igual- por estreptococo B-hemolítico do grupo A.
mente com grande variabilidade de topografias. Contudo mesmo esse subtipo ainda carece de
Os indivíduos com transtorno obsessivo-com- mais evidências (Macerollo, & Martino, 2013).
pulsivo podem ser compelidos a tocar, contar, Para a análise do comportamento, o conjun-
checar, arranjar algo sistematicamente, ou ain- to de fenômenos a que se convencionou cha-
da lavar repetidamente as suas mãos. Esforços mar de psicopatologia é, sobretudo, o aumento
para resistir às compulsões eliciam grande an- ou diminuição da frequência de certos compor-
siedade. Quando o paciente emite as compul- tamentos, em geral não desejados na cultura
sões, produz alívio da ansiedade (American da pessoa e que, por isso mesmo, podem tra-
Psychiatric Association, 2013). A prevalência zer sofrimento significativo e prejuízo funcio-

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nal (Ullmann & Krasner, 1975). Dentro dessa tos animais nos modelos de psicopatologia,
concepção, e diferentemente do modelo médi- vistos os problemas éticos, sociais, legais ou
co, os comportamentos “patológicos” não di- financeiros envolvidos em se utilizar humanos.
ferem dos de uma pessoa considerada normal, Animais são utilizados em laboratório também
exceto pela diferença expressiva em suas fre- sob a suposição de que ao pesquisador é pos-
quências (Ferster, 1973). sível modelar o comportamento patológico se-
A explicação comportamental tradicional- melhante ao que ocorre em humanos (Willner,
mente mais aceita para o transtorno obsessi- 1991). Mas alguns transtornos como o obses-
vo-compulsivo tem sido a de Dollard e Miller sivo-compulsivo continuam a ser de difícil re-
(1950). Nela, os comportamentos obsessivos produção em laboratório com animais.
e compulsivos estariam sob o controle aversi- O transtorno obsessivo-compulsivo abran-
vo. Os autores fundamentaram sua concepção ge comportamentos característicos dos critérios
na teoria dos dois estágios de Mowrer (1960) diagnósticos que muitas vezes escapam do po-
para a aquisição de respostas de medo e evita- tencial explicativo de um modelo animal. Em-
ção. Na teoria de Mowrer (1960), em um pri- bora um modelo animal tenha o potencial de
meiro momento, um estímulo neutro é associado produzir compulsões em ratos (e.g., Woods et
a um estímulo aversivo que provoca ansiedade al., 1993), por exemplo, ainda assim continu-
e desconforto. Por pareamento pavloviano, o aria existindo uma limitação relevante no seu
estímulo neutro passa a ter a mesma função de alcance explicativo dos comportamentos obser-
estímulo com o estímulo anteriormente pare- vados em humanos com o diagnóstico. O pro-
ado. No segundo estágio, o organismo desen- blema é que o modelo não consegue replicar
volveria respostas de fuga ou esquiva do estí- os pensamentos repetidos ou “obsessões”, um
mulo condicional (CS) com a função de aliviar fenômeno verbal característico no diagnóstico
o sofrimento. Dollard e Miller (1950) aplica- em humanos (Abreu & Hübner, 2011). Em al-
ram a concepção de Mowrer (1960) ao trans- guns casos do transtorno obsessivo-compulsi-
torno obsessivo-compulsivo, afirmando que os vo, por exemplo, indivíduos mostram compor-
pensamentos “obsessivos”, e as circunstâncias tamentos de lavar repetidamente as mãos, que
que os evocam, seriam CSs dos quais o indiví- supostamente estariam sob o controle verbal de
duo tentará escapar ou esquivar com a emissão autorregras especificadoras de contaminação.
dos comportamentos “compulsivos”. Dentro desse contexto, o estudo básico do
Da mesma forma que as concepções clínicas, comportamento governado por regras pode ser
a ciência básica comportamental propõe que os importante para o aprimoramento dos modelos
modelos experimentais de psicopatologia não experimentais de transtorno obsessivo-com-
seriam de natureza distinta dos comportamen- pulsivo, pois algumas relações entre variáveis
tos assumidos como sendo normais, mas pro- verbais e não verbais são de grande relevância
duto de um histórico de reforçamento em con- na reprodução do fenômeno clínico em labo-
tingências extremadas (Falk & Kupfer, 1998; ratório. Um subtipo de indivíduos com o diag-
Sidman, 1960; Skinner, 1972a; 1972b). Assim, nóstico do transtorno obsessivo-compulsivo,
para que um modelo prove ser adequado nas in- chamados de “checadores” (Franklin & Foa,
vestigações experimentais, é necessário unica- 2008), por exemplo, parece apresentar uma re-
mente que ele englobe variáveis relevantes aos lação R-R entre respostas abertas e encobertas.
problemas de saúde mental (Skinner, 1972a). Nela, o primeiro elo da díade seria constituído
Comumente, a psicologia e a análise expe- pelas autorregras contidas nas “respostas obses-
rimental do comportamento empregam sujei- sivas”, e o segundo elo, pelas respostas verbal-

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mente governadas, tradicionalmente concebi- checagem em relação à apresentação de instru-


das na literatura como sendo as “compulsões” ções sem especificação de consequência aver-
(Abreu & Prada, 2005; Zamignani & Banaco, siva. O Experimento 2 teve como objetivo tes-
2005). De acordo com essa conceituação clás- tar se uma instrução dada com especificação de
sica, os indivíduos poderiam apresentar com- consequência apetitiva poderia, também, ter o
pulsões de checagem sob o controle de obses- efeito de produzir maiores porcentagens de res-
sões relacionadas às regras que especificam postas de checagem. O Experimento 2 também
alguma consequência aversiva, como em uma teve o objetivo de testar a hipótese da emissão
autoinstrução em que um indivíduo diz a si das respostas de checagem sob controle de con-
mesmo que “sua família correrá perigo se não textos apetitivos (cf. Dollard & Miller, 1950).
conferir a válvula do gás”.
Na análise de uma relação R-R entre autor- Experimento 1
regras e respostas abertas, precisaríamos antes
investigar quais são as variáveis atuais antece- Método
dentes e consequentes que estariam controlan-
do determinada relação. A checagem controlada Participantes. Oito participantes adultos
por regras ocorreria por meio de respostas re- sem diagnóstico clínico, sendo sete mulheres
petidas, cuja função seria esquivar ou escapar e um homem, verbalmente habilidosos, entre
de algum evento aversivo externo ao organis- 22 e 60 anos.
mo, sendo esse evento, em geral, consequente
a uma resposta inefetiva em produzir mudan- Ambiente experimental. Os participantes
ças específicas no ambiente (Abreu & Hübner, realizaram a separação das sementes no segun-
2011). Nesse sentido, para o indivíduo com o do andar de um restaurante. Esse andar esteve
transtorno obsessivo-compulsivo, o contato com vazio, sem a circulação de pessoas no recinto.
o evento aversivo é consequência de uma res- Para separação, foram utilizados dez potes de
posta de checagem inefetiva, e, para que isso plástico opacos com capacidade para um litro
não ocorra, novas respostas de checagem de- cada. Os potes traziam etiqueta como nome das
verão, portanto, ser emitidas. sementes. Os potes foram dispostos em cima de
Um modelo do transtorno obsessivo-compul- uma mesa de 120x80 cm, colocada logo abai-
sivo utilizando um método experimental com- xo da câmera de segurança própria do estabe-
parando o sujeito consigo próprio, sob o efei- lecimento. No início da separação, os potes já
to de diferentes manipulações verbais sobre as estavam parcialmente cheios em 1/3 de sua
respostas de checagem, poderá ajudar na iden- capacidade. Dez tipos de sementes de cores e
tificação das relações comportamentais envol- dimensões semelhantes (e.g., soja, fava bran-
vidas (Abreu & Hübner, 2011). Os Experimen- ca e feijões rajado, bolinha, de corda, carioca,
tos 1 e 2 propostos apresentam um modelo do roxo, branco, jalo e fradinho) foram mistura-
transtorno obsessivo-compulsivo baseado em dos em uma bacia retangular com capacidade
algumas relações funcionais estabelecidas en- para 20 litros. As sementes foram misturadas
tre instruções, o contexto de uma tarefa de se- em igual proporção.
paração de sementes e as respostas não verbais
de checagem. O objetivo do Experimento 1 foi Procedimento. Na ocasião do convite para
testar se uma instrução com especificação de participar da tarefa, os participantes não foram
consequência aversiva poderia ter o efeito de informados de que se tratava de um experimen-
produzir maiores porcentagens de respostas de to de psicologia. Eles foram apenas convida-

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dos na rua por um auxiliar de pesquisa a aju- consequência aversiva nas fases B; no caso, o
dar em uma tarefa de separação de sementes anúncio “meu chefe pode querer descontar di-
em um restaurante, sendo conduzidos até o lo- nheiro dos seus R$ 20,00”. Em delineamentos
cal. Foi instruído que o trabalho demandaria 45 de tratamentos alternados, quatro sujeitos foram
minutos e que ganhariam R$ 20,00 como aju- submetidos à sequência de fases ABA, e outros
da de custos ao final da tarefa. Somente ao fi- quatro à sequência BAB. A Tabela 1 apresen-
nal da sessão, o experimentador revelou o es- ta as instruções apresentadas em ABA e BAB.
tudo, explicando ao participante os objetivos Variável dependente. Como dimensão da va-
e procedência da pesquisa com a solicitação riável dependente no Experimento 1, foram men-
de assinatura em termo de consentimento so- suradas as porcentagens das respostas de che-
bre o uso dos dados obtidos. O termo de con- cagem de cada fase. As respostas de checagem
sentimento livre e esclarecido foi previamente foram definidas operacionalmente como sendo a
aprovado pelo Conselho de Ética em Pesqui- verificação das sementes já separadas nos potes
sa do Hospital Universitário da Universidade com função de evitar ou corrigir erros. Na che-
de São Paulo: 1161/11, sob o registro Sisnep cagem, as seguintes topografias de resposta fo-
CAAP: 0048.0.198.000-11 no Sistema Nacio- ram registradas: a manipulação dentro do pote
nal de Ética em Pesquisa. sem a retirada de uma das sementes; o despejar
As sessões experimentais de 45 minutos fo- na mão ou mesa com a retirada de uma semen-
ram divididas em três fases de 15 minutos. O te de um grupo já separado; o tirar uma semente
tempo da apresentação das instruções não foi de um pote; o transferir a semente erroneamente
contabilizado vista a variação na diferença do ta- separada de um pote para outro; o inclinar/me-
manho das instruções. O cronômetro foi iniciado xer o pote para uma melhor visualização duran-
ao final da apresentação da instrução e pausado te 2s ou mais; bem como a observação do pote
ao término do tempo de cada fase. Com exceção por 2s ou mais sem manipulação direta.
da primeira instrução que foi feita pessoalmen-
te, as outras instruções foram passadas por um Resultados
telefone celular simples, dado pelo experimen-
tador ao final da primeira instrução para fins de A Figura 1 apresenta as porcentagens das
comunicação ao longo da tarefa. Esse cuidado respostas de checagem do Experimento 1, se-
ocorreu na primeira instrução com o objetivo quência de fases ABA para os participantes 1,
de aproximar as circunstâncias envolvidas na 3, 5 e 7, e sequência de fases BAB para os par-
insígnia para a tarefa experimental com a situ- ticipantes 2, 4, 6 e 8.
ação de “solicitação para separação de semen- Fases ABA. O participante 1 apresentou 29%
tes de um restaurante”. O uso posterior do ce- das respostas de checagem na fase A, 42% na
lular nas outras fases foi para garantir um maior fase B de apresentação da instrução com espe-
controle de eventuais variáveis intervenientes, cificação de consequência aversiva e 29% das
como as possíveis perguntas adicionais do par- checagens na fase A. O participante 3 apre-
ticipante logo após a apresentação de uma ins- sentou 0% das respostas checagens na fase A,
trução. Depois de apresentada a primeira ins- 100% na fase B e 0% na fase A. O participan-
trução, o experimentador ia para uma sala ao te 5 apresentou 17% das respostas de checa-
lado do recinto experimental, assistindo e gra- gem na fase A, 66% na fase B e 17% na fase
vando o desempenho do participante por meio A. O participante 7 apresentou 62% das res-
de uma câmera do restaurante. O Experimento postas de checagem na fase A, 12% na fase B
1 apresentou instruções com especificação de e 26% na fase A.

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Tabela 1
Instruções apresentadas nas sequências ABA e BAB, sendo as fases B com especificação
de consequên­cias aversivas

“[Nome do participante], aqui estão misturados dez ti- “[Nome do participante], essas sementes vão ser forne-
pos de sementes nobres. Sua tarefa vai ser separá-las e cidas para a merenda das crianças de uma escola. Por
colocá-las nesses dez potes menores. Eu vou estar em isso, se encontrar erros na separação, meu chefe pode
reunião em outra sala, mas, se precisar falar com você, querer descontar dinheiro dos seus R$ 20,00. Eu vou
farei por este telefone celular.” estar em reunião em outra sala, mas, se precisar falar
com você, farei por este telefone celular.”
“[Nome do participante], essas sementes vão ser forne- “[Nome do participante], eu e meu chefe vimos que
cidas para a merenda das crianças de uma escola. Por esse é um lote mais antigo que não irá para a merenda
isso, se encontrar erros na separação, meu chefe pode das crianças. Então é só você separar as sementes. Da-
querer descontar dinheiro dos seus R$ 20,00.” remos garantidos seus R$ 20,00 no final.”
“[Nome do participante], eu e meu chefe vimos que “Desculpe, eu me enganei. Esse lote é o que realmente
esse é um lote mais antigo que não irá para a merenda vai para a merenda da escola. Por isso, se encontrar
das crianças. Então é só você separar as sementes. Da- erros na separação, meu chefe pode querer descontar
remos garantidos seus R$ 20,00 no final.” dinheiro dos seus R$ 20,00.”

Como efeito comum entre os participantes sendo essa a menor porcentagem apresentada
da sequência ABA, observou-se uma maior por esse participante em uma fase.
porcentagem das respostas de checagem nas Ainda, para os participantes que apresenta-
fases B (de instrução com especificação de ram as maiores porcentagens de checagens nas
consequên­cia aversiva) para os participantes 1, fases B, observou-se efeito de reversão total nas
3 e 5, com 42%, 100% e 66% das checagens, fases A finais no comportamento dos partici-
respectivamente. Diferentemente, na fase B, o pantes 1, 3 e 5, com 29%, 0% e 17% das checa-
participante 7 apresentou 12% das checagens, gens, respectivamente. Essas porcentagens são
FIGURA 1
Porcentagens de respostas de
checagem (%)

Figura 1. Porcentagens das respostas de checagem apresentadas pelos participantes 1, 3, 5 e 7 ao longo


das fases ABA e 2, 4, 6 e 8 ao longo das fases BAB. Cada fase do Experimento 1 foi programada para
demandar 15 minutos.

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exatamente as mesmas apresentadas por esses Discussão


participantes nas fases A iniciais.
Fases BAB. O participante 2 apresentou No Experimento 1, cinco de oito participan-
93% das respostas de checagem na fase B, 0% tes apresentaram maiores porcentagens de che-
na fase A e 7% das checagens na fase B. O par- cagens sob especificação de consequência aver-
ticipante 4 apresentou 94% das respostas de siva. Sobre a propriedade de evocar as respostas
checagem na fase B, 0% na fase A e 6% das especificadas, Schlinger e Blakely (1987; Blake-
checagens na fase B. O participante 6 não apre- ly & Schlinger, 1987) pontuam que uma regra
sentou nenhuma checagem ao longo das fases não pode ter função de SD para o seu seguimen-
experimentais BAB. O participante 8 apresen- to, pois antes ela altera a função dos estímulos
tou 15% das respostas de checagem na fase B, especificados na formulação verbal. Dessa for-
65% na fase A e 20% das checagens na fase B. ma, no comportamento governado por regras,
Como efeito comum entre os participantes os autores aproximam os efeitos comportamen-
da sequência BAB, observou-se que houve uma tais do estímulo verbal dos efeitos alteradores
maior porcentagem de respostas de checagem de função do condicionamento operante e res-
nas fases B (de instrução com especificação de pondente. Por esse motivo, ao invés do termo
consequência aversiva) para os participantes 2 regra, os autores adotaram o termo estímulo es-
e 4, com respectivamente, 93% e 94% nas fases pecificador da contingência (CSS) (Blakely &
B iniciais, 7% e 6% nas fases B finais. Schlinger, 1987; Schlinger & Blakely, 1987) e,
Diferentemente dos outros participantes, o mais recentemente, operação verbal alteradora
participante 6 não apresentou qualquer emissão de função (Schlinger 2008a, 2008b). Um CSS
de respostas de checagem ao longo das fases produz mudanças nos estímulos especificados
experimentais. Já o participante 8 apresentou pela regra, sendo eles estímulos discriminativos,
uma maior porcentagem na fase A de instrução eliciadores, operações estabelecedoras (OE) ou
para separação em relação às fases B. Para os estímulos consequentes. Nos presentes experi-
participantes 2 e 4, que apresentaram as maio- mentos, optou-se por adotar o termo CSS, visto
res porcentagens de checagens nas fases B, ob- a especificação da contingência, embora Schlin-
servou-se ainda uma expressiva diferença das ger (1993, 2008a, 2008b) tenha ressaltado mais
porcentagens de checagens entre a fase B ini- recentemente a não necessidade de qualquer re-
cial e a fase B final (B93% - B7% e B94% - querimento formal como a especificação da con-
B6%, respectivamente). tingência de reforçamento no estímulo verbal.
Concordância entre os observadores. No No Experimento 1, ainda que os CSSs apresen-
Experimento 1, com o uso da gravação em ví- tados pessoalmente (e.g., fase inicial) ou por te-
deo, um segundo observador independente tam- lefone (e.g., outras fases) tenham controlado o
bém fez as medições das respostas de checagem comportamento de separação como evento an-
apresentadas pelos participantes. O acordo foi tecedente, sua característica principal é alterar
obtido a partir do tempo integral de cada fase. a função estabelecedora e discriminativa de es-
Para cada participante foi feito, então, o cálculo tímulos previamente neutros, fortalecendo ou
de concordância entre os observadores (CEO), enfraquecendo as relações que dados estímulos
do tipo média de contagem por intervalo (Coo- guardam com as respostas de checagem.
per, Heron, & Heward, 2007), por meio da fór- O seguimento dos CSSs com a especifica-
mula [(CEO fase 1 + CEO fase 2 + CEO fase ção de consequência aversiva para a resposta
3) / 3 fases] X 100. A Tabela 2 mostra as por- inefetiva de separação pode ser evidenciado
centagens médias de acordo entre observadores. por meio do aumento da porcentagem das res-

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Tabela 2
Amplitude e porcentagem média de concordância entre observadores para cada participante
do Experimento 1
Condição
Participante CEO fase A CEO fase B CEO fase A Amplitude CEO média
1 94 100 87 87-100 94
3 100 93 100 93-100 98
5 100 100 100 100
7 100 100 100 100
  CEO fase B CEO fase A CEO fase B    
2 96 100 100 96-100 99
4 85 100 100 85-100 95
6 100 100 100 100
8 100 100 100   100

postas de checagem nas fases B. Houve o au- checagens nas fases B, observou-se efeito de
mento da porcentagem para os participantes 1, reversão total no comportamento dos partici-
3, 5 (ABA) e 2, 4 (BAB). Os CSSs apresenta- pantes 1, 3 e 5 para o delineamento ABA. As
dos nas fases B funcionaram como uma opera- porcentagens apresentadas por esses participan-
ção que estabeleceu maior valor aversivo para tes nas fases A finais foram iguais às apresen-
o comportamento inefetivo de separação, sen- tadas nas fases A iniciais. Já no delineamento
do esse um comportamento incompatível com BAB, os participantes 2 e 4 apresentaram re-
o desempenho especificado. Os CSSs também versão parcial, com uma expressiva diferença
fortaleceram a função discriminativa que os de porcentagens entre as fases B finais e fases
estímulos relacionados aos erros de separação B iniciais. Segundo Catania (1998), “efeitos
(e.g., colocar o feijão branco no pote da fava reversíveis são mudanças na performance que
branca) mantinham com as respostas de che- são eliminadas, imediatamente ou algum tem-
cagem. Para esquivar ou fugir do evento aver- po depois, quando as operações que a produ-
sivo, frente a essa estimulação discriminativa, zem são descontinuadas (e.g., se o responder
os participantes simplesmente precisaram se- retorna ao nível inicial após a punição, os efei-
guir os CSSs, tendo suas respostas reforçadas tos da punição são reversíveis)” (p. 408). Sen-
ao final do experimento por evitar a consequên- do assim, o efeito de um CSS das fases B com
cia da perda de dinheiro. As respostas contro- a especificação de uma consequência aversiva
ladas pelos CSSs tiveram, portanto, a função pode estar sendo revertido com a apresentação
de evitar os erros na separação das sementes. de um novo CSS sem especificação de conse-
Embora as instruções contidas em nas fases quência aversiva (e.g., Fases A).
A de ABA e fases B de BAB sejam topogra- No Experimento 1, houve ainda um menor
ficamente diferentes, o critério funcionalmen- seguimento dos CSSs apresentados nas fases B
te-orientado que permitiu correlacioná-las no pelos participantes 7 (ABA), 6 e 8 (BAB). Os
delineamento adotado foi o efeito de reversão participantes 7 e 8 apresentaram menores por-
exercido sobre as respostas de checagem (e.g., centagens das respostas de checagem, e o parti-
Abreu & Hübner, 2011). Para os participantes cipante 6 não apresentou nenhuma resposta. Os
que apresentaram maiores porcentagens das participantes 7 e 8 apresentaram ainda maiores

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frequências nas fases A (A62% - A26%, A65%, extra. Igualmente ao Experimento 1, o expe-
respectivamente). Esses dados sugerem que os rimentador revelou o estudo somente ao fi-
CSSs das fases B enfraqueceram a função es- nal da sessão, solicitando assinatura em ter-
tabelecedora e discriminativa dos eventos re- mo de consentimento também aprovado pelo
lacionados aos erros de separação, ou mesmo Conselho de Ética em Pesquisa do Hospital
que pode ter havido um maior controle pelas Universitário da Universidade de São Pau-
contingências ao longo das fases, em compa- lo: 1161/11, sob o registro SISNEP CAAP:
ração com o controle verbal. 0048.0.198.000-11 no Sistema Nacional de
O participante 6, ao seu turno, separou as se- Ética em Pesquisa.
mentes em porções no tampo da mesa, não che- O Experimento 2 apresentou instruções com
gando a transferi-las para os potes. Na sessão especificação de consequência apetitiva nas fa-
“Método” do presente estudo, as respostas de ses B, no caso, o anúncio do ganho de um “di-
checagem foram definidas operacionalmente nheiro extra caso não houvesse erros na se-
como sendo a verificação das sementes já sepa- paração”. Em delineamento de tratamentos
radas nos potes com função de evitar ou corri- alternados, quatro sujeitos foram submetidos à
gir erros. Esse cuidado experimental foi adota- sequência de fases ABA, e outros quatro à se-
do com o objetivo de criar um critério estável quência BAB. A Tabela 3 apresenta as instru-
para o registro das respostas de separação, bem ções apresentadas em ABA e BAB.
como facilitar a contagem das respostas de che-
cagem, dirimindo eventuais ambiguidades inter- Variável dependente. Ao longo de todas
pretativas entre os observadores. Por esse mo- as fases do Experimento 2, a dimensão da
tivo, as respostas do participante 6 não foram variável dependente mensurada foi a mes-
contadas visto a necessidade da separação pré- ma do Experimento 1. Foram registradas as
via efetiva nos potes, de onde as checagens se- porcentagens das respostas de checagem de
riam então registradas. cada fase.

Experimento 2 Resultados

Método A Figura 2 apresenta as porcentagens das


respostas de checagem do Experimento 2, para
Participantes. Oito participantes adultos a sequência de fases ABA e BAB.
sem diagnóstico clínico, sendo seis mulheres
e dois homens, verbalmente habilidosos, entre Fases ABA. O participante 9 apresentou 60%
16 e 65 anos. das respostas de checagem na fase A, 20% na
Ambiente experimental. O mesmo adota- fase B de apresentação da instrução com espe-
do no Experimento 1. cificação de consequência apetitiva e 20% das
checagens na fase A. O participante 11 apre-
Procedimento. O convite para participar sentou 19% das respostas checagens na fase A,
da tarefa de separação foi o mesmo do Expe- 63% na fase B e 19% na fase A. O participan-
rimento 1, com um único diferencial adota- te 13 apresentou 30% das respostas de checa-
do para os participantes da sequência BAB. gem na fase A, 50% na fase B e 20% na fase
A esses participantes foi instruído que, além A. O participante 15 apresentou 18% das res-
da ajuda de custos de R$ 20,00, seria ainda postas de checagem na fase A, 82% na fase B
dada uma quantia de R$ 10,00 como prêmio e 0% das checagens na fase A.

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Tabela 3
Instruções apresentadas nas sequências ABA e BAB, sendo as fases B com especificação
de consequências apetitivas
ABA BAB
“[Nome do participante], aqui estão misturados dez “[Nome do participante], essas sementes vão ser
tipos de sementes nobres. Sua tarefa vai ser separá-las fornecidas para a merenda das crianças de uma escola.
e colocá-las nesses dez potes menores. Eu vou estar Então eu lhe darei um dinheiro extra se não tiver erros
em reunião em outra sala, mas se precisar falar com na sua separação. Eu vou estar em reunião em outra
você, farei por este telefone celular.” sala, mas se precisar falar com você, farei por este
telefone celular.”
“Esse lote de sementes será fornecido para a merenda “[Nome do participante], eu e meu chefe vimos que
das crianças de uma escola. Então eu lhe darei um
FIGURA 1
esse é um lote mais antigo que não irá para a merenda
dinheiro extra se não tiver erros na sua separação.” das crianças. Então é só você separar as sementes.
Daremos garantidos seus R$ 20,00 no final.”
“[Nome do participante], eu e meu chefe vimos que “[Nome do participante], desculpe, eu me enganei.
esse é um lote mais antigo que não irá para a merenda Esse lote é o que realmente vai para a merenda da
das crianças. Então é só você separar as sementes. escola. Por isso, darei um dinheiro extra se não tiver
Porcentagens de respostas de

Daremos garantidos seus R$ 20,00 no final.” erros na sua separação.”


checagem (%)

Como efeito comum entre os participantes, Para os participantes que apresentaram as


observou-se que há uma maior porcentagem de maiores porcentagens de checagens nas fases
respostas de checagem nas fases B (de instru- B, observou-se efeito de reversão total na fase
ção com especificação de consequência ape- A final nas respostas do participante 11, na qual
titiva) para os participantes 11, 13 e 15, com retornou para 19% das checagens. Esse índice
63%, 50% e 82% das checagens, respectiva- é igual ao apresentado na fase A inicial (A19%
mente. Diferentemente, o participante 9 na fase – A19%). Os participantes 13 e 15 apresenta-
B apresentou a menor porcentagem de checa- ram reversão parcial (A30% – A20% e A18%
gens, com 20%. Essa mesma porcentagem se – A0%, respectivamente).
repetiu na fase A seguinte.
FIGURA 2
Porcentagens de respostas de
checagem (%)

Figura 2. Porcentagens das respostas de checagem apresentadas pelos participantes 9, 11, 13 e 15 ao


longo das fases ABA e 10, 12, 14 e 16 ao longo das fases BAB. Cada fase do Experimento 2 foi
programada para demandar 15 minutos.

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Fases BAB. O participante 10 apresentou 43% vação em vídeo, um observador independente


das respostas de checagem na fase B, 14% na fase também fez a medição das respostas de checa-
A e 43% das checagens na fase B. O participan- gem apresentadas por cada participante. A fór-
te 12 apresentou 45% das respostas de checagem mula para o cálculo do CEO foi igual à utili-
na fase B, 25% na fase A e 30% das checagens zada no Experimento 1. A Tabela 4 mostra as
na fase B. O participante 14 apresentou 63% das porcentagens médias de concordância entre ob-
respostas de checagem na fase B, 14% na fase A servadores do Experimento 2, do tipo média de
e 23% das checagens na fase B. O participante 16 contagem por intervalo.
apresentou 13% das respostas de checagem na fase
B, 5% na fase A e 81% das checagens na fase B. Discussão
Como efeito comum entre os participantes,
houve uma maior porcentagem de respostas de No Experimento 2, sete de oito participantes
checagem nas fases B (de instrução com especi- apresentaram maiores porcentagens de checa-
ficação de consequência apetitiva) para os par- gens sob instruções com especificação de con-
ticipantes 10, 12, 14 e 16, com respectivamen- sequência apetitiva. Essas instruções também
te 43%, 45%, 63% e 13% nas fases B iniciais funcionaram como estímulos especificadores
e 43%, 30%, 23% e 81% nas fases B finais. de contingência (CSSs) (Schlinger & Blakely,
Nesses participantes com as maiores porcen- 1987; Blakely & Schlinger, 1987) pelo fato de
tagens de checagens nas fases B, observou-se alterarem a função dos estímulos especificados
que o participante 10 apresentou reversão to- na formulação verbal. Assim, os CSSs com es-
tal na fase B final (B43% – B43%), e o parti- pecificação de consequência apetitiva fortalece-
cipante 12 apresentou reversão parcial (B45% ram a função discriminativa dos erros de sepa-
– B30%). Os participantes 14 e 16, ao seu tur- ração das sementes, o que ocasionou um maior
no, apresentaram reversão parcial, mas com número de respostas de checagem.
expressiva diferença de porcentagens (B63% Para o delineamento ABA, observou-se que
– B23% e B13% – B81%, respectivamente). houve uma maior porcentagem de respostas de
checagem nas fases B para os participantes 11,
Concordância entre observadores. Simi- 13 e 15. Já no delineamento BAB, todos os par-
larmente ao Experimento 1, com o uso da gra- ticipantes apresentaram maiores porcentagens
Tabela 4
Amplitude e porcentagem média de concordância entre observadores para cada participante
do Experimento 2
Condição
Participante CEO fase A CEO fase B CEO fase A Amplitude CEO média
9 100 100 100 100
11 100 100 83 83-100 94
13 100 100 100 100
15 100 90 100 90-100 97
  CEO fase B CEO fase A CEO fase B    
10 100 100 83 83-100 94
12 95 92 100 92-100 96
14 94 100 100 94-100 98
16 87 100 88 87-100 92

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de checagem nas fases B em comparação com conta de explicar a “etiologia” e a “sintoma-


as fases A (e.g., participantes 10, 12, 14 e 16). tologia” de alguns subtipos de transtorno ob-
Esses dados mostram que os CSSs com especi- sessivo-compulsivo, em especial o apresenta-
ficação de consequência apetitiva fortaleceram do pelos chamados de checadores (Franklin &
a relação discriminativa entre os erros de sepa- Foa, 2008). Em outras palavras, eles permitem
ração e as resposta de checagem. Para produzir investigar quais tipos de contingências produ-
o reforçamento positivo especificado, frente a zem e mantêm uma alta frequência de respos-
essa estimulação discriminativa, os participan- tas de checagem e, ainda, porque dadas con-
tes precisaram seguir o CSS, tendo suas respos- tingências produzem esses comportamentos
tas reforçadas ao final do experimento. As res- repetitivos característicos, e não outros. Por
postas controladas pelos CSSs e pelos erros de esse motivo, o estudo serviu à função de apre-
separação têm, portanto, a função de produzir sentar um modelo experimental de transtorno
o dinheiro extra. O seguimento dos CSSs pode obsessivo-compulsivo com humanos embasa-
ser evidenciado por meio do aumento da por- do nas relações empíricas estabelecidas entre
centagem das respostas de checagem nas fa- alguns estímulos verbais, o contexto da tarefa
ses B para os participantes 11, 13 e 15 (ABA) e o comportamento não verbal de checagem.
e 10, 12, 14 e 16 (BAB). O entendimento clássico da regra enquanto
Para os participantes que apresentaram maio- SD para o seu seguimento não explica como
res porcentagens das checagens nas fases B, uma única apresentação logo ao início da fase
observa-se no delineamento ABA efeito de re- experimental controlou uma maior porcenta-
versão total nas respostas do participante 11 e gem de respostas de checagens emitidas ao lon-
reversão parcial nas respostas dos participantes go dos 15 minutos da fase experimental. Uma
13 e 15. Já no delineamento BAB, o participan- interpretação do controle pela regra dessa na-
te 10 apresentou reversão total, e os participan- tureza teria que assumir a emissão consistente
tes 12, 14 e 16, reversão parcial. Em comum, das regras, de forma encoberta, sempre ante-
semelhantemente ao Experimento 1, o critério riormente à emissão de uma resposta de checa-
funcionalmente-orientado que permitiu corre- gem (e.g., Schlinger, 1990, 1993). Essa concep-
lacionar os CSSs das fases A de ABA e fases ção conceitual se torna difícil de ser sustentada
B de BAB foi o efeito de reversão exercido so- nos presentes experimentos. A interpretação de
bre as respostas de checagem. regra como CSS, por outro lado, evidencia o
Por fim, observou-se que não houve o au- controle múltiplo exercido pelo CSS conjunta-
mento da porcentagem das respostas do parti- mente com as circunstâncias relacionadas à ta-
cipante 9 na fase B (ABA) em relação à fase A refa. Nos Experimentos 1 e 2, os CSSs partici-
inicial. Contudo, na fase A final, a frequência param como eventos antecedentes, mas outras
apresentada foi a mesma da fase B. Esse dado variáveis ambientais, como os erros de separa-
não sugere um controle diferencial dos CSSs ção, também entraram no controle das respos-
sobre as respostas de separação nas fases A ou tas de checagem por terem função de estímu-
B e tampouco sugere um maior controle da lo discriminativo.
contingência sobre os CSSs ao longo das fases. O método do Experimento 1 parece emba-
sar a análise funcional clínica dos comporta-
Discussão Geral mentos de checagem enquanto comportamen-
tos de fuga e esquiva (e.g., Franklin & Foa,
Os presentes experimentos com delinea- 2008). Mais especificamente no fenômeno clí-
mentos de tratamentos alternados podem dar nico, as “obsessões” seriam a emissão encober-

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ta de um CSS especificador de consequência Foi o objetivo do método dos presentes ex-


aversiva para a resposta inefetiva em produzir perimentos testar se CSSs com especificação
mudanças específicas no ambiente. Já as “com- de consequência aversiva e apetitiva evocariam
pulsões” seriam as repostas de checagem em maiores porcentagens de respostas de checagem
maior frequência, sendo essas controladas, em em humanos sem o diagnóstico. No Experimen-
parte, pelo CSS encoberto. As respostas “com- to 1, cinco de oito participantes apresentaram
pulsivas” têm a função de esquivar ou escapar maiores porcentagens de checagens sob espe-
de algum evento aversivo. No caso do Experi- cificação de consequência aversiva. No Experi-
mento 1 a função foi evitar a perda de dinhei- mento 2, sete de oito participantes apresentaram
ro; no caso dos checadores em contextos natu- maiores porcentagens sob especificação de con-
rais, as funções mais comuns são a esquiva de sequência apetitiva. As contingências manipu-
danos provocados para si ou para alguma pes- ladas, ainda que verbais, foram suficientes para
soa querida (e.g., Franklin & Foa, 2008). produzir maiores porcentagens de checagem.
O Experimento 2, ao seu turno, teve como Os Experimentos 1 e 2 adotaram delinea-
objetivo testar se uma instrução com anúncio mentos de tratamentos alternados. Dados de-
de consequência apetitiva poderia produzir res- lineamentos foram preferidos ao delineamento
postas de checagem. Observou-se um aumento de grupo com controle estatístico pelo fato de o
da porcentagem das respostas de checagem nas estudo estar interessado em investigar o desem-
fases B com a apresentação de CSSs com espe- penho individual dos participantes. O método
cificação de consequência apetitiva. Os parti- experimental de sujeito único, diferentemente
cipantes parecem ter aumentado o número das da comparação estatística de grupos, permitiu
respostas de checagem com função de produzir derivar análises funcionais do fenômeno com-
melhor desempenho na separação e, com isso, portamental envolvido na psicopatologia. Es-
obter o ganho de dinheiro extra anunciado. Os sas análises funcionais, como produto do com-
dados expandem as possibilidades de análise portamento verbal dos pesquisadores, poderão
funcional das respostas de checagem no fenô- vir a controlar diferencialmente novas interven-
meno clínico, sugerindo um questionamento do ções dos terapeutas no futuro (e.g., Zamignani
modelo comportamental do transtorno obsessi- & Banaco, 2005).
vo-compulsivo embasado unicamente na hipóte-
se do controle aversivo (e.g., Dollard & Miller, Referências
1950). Existe alguma semelhança entre as rela-
ções comportamentais evidenciadas no Experi- American Psychiatric Association (2013). Diag-
mento 2 e as relações observadas no fenômeno nostic and statistical manual of mental di-
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na vigência de um ambiente com pouca esti- Abreu, P. R., & Hübner, M. M. C. (2011). Efei-
mulação aversiva, pode ocorrer a transposição to de instruções sobre respostas de checa-
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titiva, o reforço social normalmente apresen- Abreu, P. R., & Prada, C. G. (2005). Relação
tado pela família de uma mãe com transtorno entre os condicionamentos operante e res-
obsessivo-compulsivo que checa repetidamen- pondente no transtorno obsessivo-com-
te a segurança de seu bebê no berço. pulsivo [Operant and respondent condi-

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