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Romulo Avelar

O Avesso da Cena
ll' Notas sobre produção e gestão cultural

Belo Horizonte
2013-3ed.
\.
1

3' ediçlo 201 ~


Copyright C Romulo Jaot A,~lar Fon!l<'Ca - 200!!

Contato com o autor: romul~ --a,~ «xl acena.com.br


w·w ,,·.rui,~!l<\\, ~C'rna .C\.""'·t,ir

Coordenaçãc- editonal: Maria Helma Cunha


Romulo Awlar
Equi.pe~apo,o: Fernando Lara
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Leitura cnba : Beto Franco


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Márcio Rimei Nobn,
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Nestor Sant' Anna
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Assessoria jwidica: Drummond &e Neumayr Advocacia
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◄ Mart.- Fomadari
Guto Muniz
Martuse Fomaciari
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Nemer Fomaciari Design

~ 'llP!dcaçAo (CIP)

Avelar, Romulo
A948 O avesso da cena : nelas sobre produção e gestão cultural /
RonuoAvelar. -3.ed. -Belo Horizonte: Ed. do Autor, 2013.
490p.

ISBN: 978-85-915020-0-4

1. Política a.iltural 2. Produção a.iltural 3. Gestão a.iltural 4.


Cultura 5. Tealro, dança, roosica - produção e gestão 6. Grupos
culturais -gestão 7. Instituições culturais - gestão 1. Titulo A primeira edição deste livro foi parcialmente realizada com recunos do ~~do M~d~al
COO: 306 de Cultura de Belo Horizonte. tendo o autor oferecido contrapartidas SOCWS ao murudpto.

lllüscária 1aspon1MI: CleideA. Femaides CRB6/'2334 A primeira e ·a segunda~ foram íétas em patt'ttͪ com a Duo Editorial.
II
Gestor Cultural
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·' , -~ft?,Í:,,~!111al brasileiro verific~da ~os últi- ·· ' ~


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·: dos ágentes envolvidos na pro uçao•-~ ,.,tura ; '· • · ; ' ·.- e' · ··,
. ;f::~M~~!1~;i r~peito aos procedim~11!°:s p~ ~ o~tenção · : . ,,,;~/;{· :.,
. f·'.:d~;~ ! ; i:·q ii~t~ aos processos de gestão. novos Nesses ... "• - ......11111
,, .. :.;,-r~. p: , _. ·· :.~W/iiiiã~há mais lugar para o improviso e o amadorismo
..' - . -~, /~:;it.t~~p~~ ~peraram no universo cultural brasil~iro. As
~it~f/{~~~9#;,b.aseadas 1.111Ícamente na experimentação já não se
'~."~/;·'."s'~t~ntáíri;-em wri mercado cada vez mais severo e E!?(igente
~ i;;-;/:.i"--:\:, ~~i~•aos p~drõesde qualidade. É patente a ~;cessi~ade de
' "'"'·'"· · a~i:~ij~;,; . ::;--, :~ ~~ :~ :P~. o_;p~;ell:l:/ _... , ·,~1
;uriçõ~sJ,:~an~ ,~ ~últiplos. desaflos ,que·,:'.· , '.,,, .~ ~

;:;T,,~-,~;.>T~ c:./f~m:n~~ ·novo ~ii'texfo.'J\J~e~~~ad_i.4~.}';fis~~,'.. ·...


· ·. :· ·:~. · · .nàlizaçãobate às portas das instituições culturais públicas e
_ (,1:-... ·':-:,'.'º: :::-.:-_. . .: . ·_'_, . . .:.·.,,.-.:~.l!;·.t:_;.";•.f ·-:'.·:·~.•
· '· · privadas/dos grupos artísticos e também das emp~as que
utilizam o patrocínio à cultura como estratégia de aproxima-
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! ção com seus públicos prefere~ciais. Aos poucos, di~te das
pressões do próprio mercado, o trabalho dos produtores e
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Produtor~ ~l'~tor: detinindo os papéis I·
1
Inicialmente, é importante buscar entendimento claro sobre o perfil dos produtores
e gestores culturais e sobre suas atribuições. Quem são esses profissionais? Qual
é sua esfera de atuação? Qual é o seu papel? Obter respostas a essas perguntas é
fundamental não somente para as pessoas que se dedicam a essas profissões ou
pretendem abraçá-las, mas também para todos aqueles que se envolvem com o fazer
cultural, sejam eles artistas, pesquisadores, administradores, empresários ou agentes
públicos. Até hoje as funções dos produtores e gestores são çercadas de dúvidas,
mesmo para aqueles que vivem o cotidiano da área.

Os diagramas apresentados nas figuras 2.1 e 2.2 buscam lançar um pouco de luz
sobre essas questões. Neles estão representados os diversos agentes envolvidos
no processo: os artistas e demais profissionais da cultura, responsáveis pela criação
e pela execução de ações culturais; as mi,msas patrocinadoras, que incentivam
Figura 2.2 - Os 'lug,res"" do gestor cultural
projetos; o Pode Público, a quem cabe a formulação e a implementação de políticas
para o fomento e o finanàamento do setor; a mfdia, que promove a difusão das
Assim como ocorre com o produtor, ao gtslor cultural também cabe, com freqü~cia,
realizações; os espaços culturais, que abrigam o que é produzido; e o próprio público,
0 papel de interface. Isso acontece quando ele se propõe a desenvolver p':°jetos
benefiàário das ações empreendidas. Vale obs"ervar que são wúversos diferentes 1
de cunho coletivo ou administrar grupos, instituições ou empresas culturais que
entre si, com particularidades divergentes e realidades freqüentemente conflitantes.
Cada um desses setores tem sua linguagem própria, muitas vezes incompreensível
tenham que lidar, em seu dia-a-dia, com artistas, outros profissionais da cultura e
patrocinadores públi<:os ou privados. No entanto, o gestor cultund pode estar presente
r
para pessoas que pertençam ao outro wúver.;o. Como exemplo, é possível citar as
enormes dificuldades que os artistas têm para compreensão da lógica empresarial e
vice-e-versa.
também em outros contextos, como contratado de uma empresa para o trato das
questões relativas ao patrocínio à cultura, como agente vinculado a órgão público t
1 ou como administrador de um espaço cultural privado, público ou pertencente a
organi2ação não-governamental.

Se, por um lado, essa função de "tradução# de linguagens es~ bastante presente
nas rotinas de trabalho dos produtores e gestores, por outro, também se destacam
as atribuições cotidianas inerentes ao campo da administração. ~ preciso observar
que produção e ges~o cultural são atividades essencialmente administrativas. A
consciência desse fato ~ ºpônto primordial para o sucesso de qualquer empreen-
dimento na área. lrifelizmnt~ ainda hoje existe certo pudor, notadamente entre
os artistas, de reconhecer a itnportlncia de utilizar téaricas e prindpios da admi-
(
nistração em benefício de seu trabalho. Persiste o preconceito de que a estruturação
\1 ~J_l,c (,, _, das atividades de produção e gestão em bases profissionais provoca, necessaria-
mente, conflitos com o processo de criação. Na verdade, a experiência tem mostrado
r
1··
u) \ 1
que, ao contrário, a correta utilização de tais téaricas abre novas perspectivas para
os criadores, uma vez que os liberta de uma série de amarras de ordem operacional
e burocrática. A equipe de criação do Grupo Corpo, por exemplo, pode se dedicar
integralmente às suas funções diretamente relacionadas com a dança. porque dispõe
de uma sólida base administrativa. A profissionalização da produção e da gestão da
O produtor cultural é um agente que deve ocupar a posição central nesse processo, Companhia, desde os seus primeiros tempos, na década de 1970, foi certamente um
desempenhando o papel de interface entre os profissionais da mltura e os demais dos aspectos que tomaram possível o sucesso de sua trajetória.
segmentos. Nessa perspectiva, precisa atuar como "tradutor" das diferentes lingua-
gens, amtribuindo para que o sistema funcione harmoniosamente. Sua primeira Feitas essas considerações preliminares sobre os papéis desempenhados pelos pro-
função é a de cuidar para que a comwúcação e a troca entre os agentes ocorram de dutores e gestores, é possível b ~ uma SÚltese de suas funções com as definições
modo eficiente. seguintes.
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t·,
511
OAvesso da Cena OProdutor e o Gestor Cultural 51
Produtor cultural

Profissional que cria e edministra diretamente eventos e projetos culturais, intermediando as rela-
ções dos artistas e demais profissionais da 6rn com o Poder Público, as empresas patrocinadores,
os espaços culturais • o público consumidor de cultura.
Segundo Rubim (2007, p . 18), a predominância do termo produtor é sintoma das
próprias singularidades da organização da cultura no Brasil.

Apesar de ser possível falar em políticas culturais no Brasil , desde os anos 30,
com base nos experimentos de Mário de Andrade e de Gustavo Capanema,
não se pode afirmar o desenvolvimento de uma tradição de atenção e mesmo
de formação na área da gestão cultural. Esse descuido das políticas culturais
inibiu a valorização da gestão, seu reconhecimento e a conseqüente circu-
-
Gestor cultural lação entre nós da noção de gestão cultural.

j Pn,fissional que administra grupos e instituições culturais, intermediando as relações dos artistas e
dos demais profissionais da 6re1 com o Poder Público, as empresas patrvcinadoras, os espaços cultu-
rais I o púbico consumidor de cultura; ou que desenvolve e administra atividades voltadas pera a cul-
tura em empresas privadas, órvlos públicos, orvanizações nlo-govemamentais e espaços culturais.
Rubim também atribui esse processo à forte presença das leis de incentivo no cenário
cultural brasileiro, que determinou a prevalência do mercado sobre o Estado na
organização do setor.

Produtor ou gestor cultural? Assim, não só a predominância da noção de produção cultural sobre a de gestão
cultural pode começar a ser elucidada, como, simultaneamente, a discussão faz
emergir os graves sintomas associados a tal dominância. Dentre eles, podem
As fronteiras entre as atividades de produção e gestão são bastante tênues. Em diver-
ser citados: a ausência, no pa is, de políticas culturais visando qualificar a organiA
sas situações, um mesmo profissional pode atuar simultaneamente como produtor zação da cultura, inclusive atenta à formação profissional na área; a omissão do
e gestoi; acumulando as duas funções. Assim, a divisão do campo de trabalho dos Estado na conformação de políticas culturais; e a hegemonia do mercado como
empreendedores culturais entre produtores e gestores é algo que acaba por suscitar re_g ulador da cultura no Brasil, em particular entre 1986 e 2002.
muitas dúvidas e algumas discussões polêmicas. Seria esta separação apenas uma
questão irrelevante de nomenclatura, ou existem diferenças reais nos perfis e nas A grande dúvida que permeia a discussão do tema é se seria estratégico dividir
•\ funções desses profissionais? em duas vertentes um campo profissional que sequer obteve reconhecimento por
i
parte da soáedade brasileira. Seria perda de poder ou de espaço político separar
j • nou
O primeiro curso da área surgido no Brasil, iniciativa conjunta das Faculdades
profissionais cuja atuação é tão intimamente ligada?
Cândido Mendes* e da Fundição Progresso do Ri.o de Janeiro, formava produtores,
numa perspectiva de capaátação bastante abrangente. Os cursos de graduação
Para o professor Gilberto Gouma, idealizador do Curso de Graduação em Produção
criados posteriormente na Bahia e também no Rio de Janeiro seguiram a mesma
Cultural da Universidade Federal Fluminense, trata-se apenas de uma questão de
nomenclatura, reforçando o uso do termo produtor para identificação do empreen-
nomenclatura. .
dedor cultural. O título de gestor, empregado habituàlmente em países ibero-
americanos, apenas recentemente passou a ser adotado no pafs.
Vejamos o exemplo de um médico. No decorrer de seu processo de formação,
ele pode até se especializar em alguma coisa. Ele pode ser desde,um clínico
Olltru lldai~ até um cirurgião. Passa por todas as disciplinas e, por uma inclinação pessoal,
se volta para uma delas. Mas ele é um médico. Pelo currículo do nosso curso,
"Pl'lldlllor: 1. Empras6rio que investa diretamente ou se encarrega da obtançio de recursos finan- o aluno tanto pode ser um produtor executivo, que vai montar um espetá-
ceiros e de outras formas da patrocínio, controle as despesas necessárias e arregimenta os meios culo ou produzir .um filme, como um gestor, que irá atuar num órgão público,
· técnicos e materiais indispanséveis li realização de obras cinematogrãficas, teatrais, operfsticas, pensando políticas, ou administrar um espaço cultural. "Produtor• foi o nome
coreogr6fic11 ou de espetáculos musicais. f•• ) 2. Profiuionel respons6vel, em última instllncia, pala que ficou . Mas eu acho que, se você começa a seccionar, vai acabar chegando
obtençlo e coordenaçlo de recursos técnicos e materiais exigidos na realizaçlo de programas
naquela frase interessante: •o especialista é aquele que sabe cada vez mais
radiofõnicos ou televisivos." {Cunha, 2003, p. 517)
sobre cada vez menos, até saber tudo de nada7 Então, eu acho que não se
·o produtor cultun1I crie e organiza projetos a produtos artlsticos a culturais, como espetáculos de deve restringir. Pelo contrário, é importante ampliar a formação. Alguém que
teatro, dança e música, produções cinematogr6ficas e televisivas, festivais, mostras e eventos. Ele pretende trabalhar com cultura deve se preparar para toda essa amplitude de
cuida de todas as etapas do processo, da captação da recursos à realízaçlo final. Pode trabalhar possibilidades: produtor, gestor ou administrador. Eu confesso que não sei se
tinto com anístas quanto em organizações e empresas voltadas pua a 6rBB cultural. "produtor• seria a nomenclatura mais adequada. A críti.c a ao uso do termo
é de que ele fica muito vinculado à produção industrial, à cultura de massa.
Como produtor executivo,faz o orçamento do projeto, de~ne cron~grames e busca recursos para a Hoje, fazendo uma revisão crítica, a palavra • gestor" talvez seja mais ampla,
montagem da obra. Em in.stituições e empresas, traça a polflíca de investimentos no setor, analisa mais abrangente. Seria uma questão até de rever isso, mas eu volto a dizer:
as propostas da patrocínio cultural que lhe sio encaminhadas a verifica se slo adequafjas ao pa_rfil não faz diferença.
da empresa. Atua ainda no gerenciamento de instituições e órgãos públicos culturais, elaborando
1 polilicas públicas pera a arte e e cultura." (Gci, do &tud1ntf. Di1ponlv1I em <il1tpJ/gui1do1stud1nt1.1bril.com.br/
profissotalno_n114.shtmb. Ac,110 1m 27 d• dezembro dt 2007). Eduardo Barata, jornalista e produtor teatral do Rio de Janeiro, tem a seguinte
opinião sobre o assunto:

1 52
OAvesso da Cena OProdutor e o Gestor Cultural
53
r
;
É tudo rótulo, não é mesmo? Mas eu sinto que há uma diferença: produtor é de chefia, o sujeito começa sua carreira nos restaurantes, necessariamente
1.
quem realiza o espetáculo, e o gestor não' é necessariamente um produtor. O
gestor é o cara que pode administrar um teatro, mas que pode não entender
nada do "fazer teatral7 O cara pode entender de leis de Incentivo, de prestação
cortando batatas, lavando o chão, servindo no balcão, passando por cada uma
diis funções, trabalhando de verdade. Ele faz um estágio em cada uma delas,
porque tem que entender toda a linha de produção e a innuencia de uma
função sobre a outra. Assim, aprende como um negócio se desenvolve, pelo
1/
de contas, mas não entender da realização de uma peça, de um show, de uma
exposição. São caminhos muito diferentes. No meu entender, o gestor cultu- estreito contato que estabelece com todas as áreas inerentes à atividade da
ral, no formato em que está estabelecido hoje, se coloca num processo mais
burocrático e administrativo do que artístico.
empresa. Isso vale também para a formação de um gestor na área cultural. Ele
tem que passar pela prática. Por outro lado, o produtor cultural precisa ter a 1
I'
laia Deheinzelin, empreendedora cultural e especialista em a-onomia criativa e
noção de como funcionam as coisas no sistema público e nas empresas.
u
No livro Gtslão Cultural - Proftssilo tm Formação, a gestora cultural Maria Helena
desenvolvimento, de São Paulo, faz clara distinção entre as funções de_produtor e
gestor: cunha analisa questões relativas à constituição desse campo profissional. Quanto à I·
diferenciação entre produtores e gestores, tem a seguinte posição: r
Eu acho que o gestor se coloca uma oitava acima do produtor. Quando eu falo A indefinição da dÍiuença entre produtor ou gestor cultural não é só uma
isso, não estou me referindo a uma questão de mérito, mas de função e de questão de nomenclatura, mas tem se tornado um tema relevante, pois pas-
recorte. O produtor é, no meu entender, alguém que está preocupado com o sou a ser uma discussão (... ) de posicionamento no próprio mercado de tra-
produto, como diz o próprio nome, e o gestor é alguém que está mais ligado balho. o que difere um produtor de um gestor cultural? Essa diferenciação é
com processos. O produtor tem uma tarefa clara: há uma 'coisa que não existe uma ação ou o reflexo da realidade vivida por esses profissionais que, diante
e precisa passar a existir, e que precisa funcionar direito. O gestor tem· esse da complexificação das relações de trabalho, se deparam com esse queatlo-
desafio também, só que com um "antes· e um "depois~ Ele tem que garantir namento, no qual o produtor tem sido colocado como um profissional mais
a continuidade do trabalho. É ele quem pensa: O que fazer com o conhe- executivo e o gestor no âmbito das ações mais estratégicas. No entanto, ape-
cimento que temos? Como vamos sistematizar esse conhecimento? Como sar de serem identificadas como duas profissões diferentes, elas se confun- ·
vamos pensar o futuro? Que tipo de parcerias iremos articular? O produtor dem em relação à ocupação de espaços de atuação no mercado cultural e,
produz coisas em linha. Tem um trabalho mais linear, com começo, meio e principalmente, aos saberes desenvolvido_s em cada profissão, coexistindo
fim. Já o gestor funciona em rede. Ele cria um tecido de sustentação para (... ) no mercado de trabalho. (Cunha, 2007, p. 118)
aquilo que está fazendo e, portanto, tem uma formação mais complicada. A
formação do produtor, embora tenha muita coisa em comum com a do ges- Nessa discussão percebe-se com nitidez que, a despeito de existir uma grande área de
tor, no meu entender, não é a mesma.
interseção entre os conhecimentos e habilidades necessários a produtores e gestores,
a distinção de suas funções e dos lugares que ocupam no mercado é fato irreversível,
A produtora e gestora cultural Miriam Brum, do Rio de Janeiro, se interessa, cada
que resulta do próprio amadurecimento da área. Enquanto os produtores buscam a
vez mais, pela junção dos dois papéis na sua atividade profissional.
viabilização de produtos e eventos, os gestores se ocupam com,o desenvolvimento
de programas e atividades essenciais ao funcionamento de grupos, empresas e
Um gestor cultural sem a vivência do cotidiano de uma produção acaba
instituições ligadas ao faz.ex cultural.
realizando um mero exercício teórico. Por outro lado, um produtor sem o
conhecimento da máquina burocrática não tem a dimensão e o alcance de
seu universo de trabalho.
A .,dmini,tr,,ç;;o no conte,to cultur,,I
Para ser um produtor cultural, é preciso conhecer esse universo. No Brasil,
onde os patrocínios para produção e circulação acontecem, via de regra, por Segundo o conceito clássico proposto por Fayol (1989, p. 26), administrador é o
meio das leis de incentivo ou de editais, onde grande parte dos teatros perten- profissional a quem compete atingir determinados objetivos, a partir do desempenho
ce à rede pública, o produtor tem que conhecer a lógica da máquina pública
de ànco atividades: prever, organizai:, comandai; coordenar e controlar.
para conseguir eficácia. Uma produção se inicia com a concepção de uma
1
idéia, passa por sua transformação em um produto cultural e se completa
através de sua difusão e circulação. Já a gestão trabalha com os produtos Prever é perscrutar o futuro e traçar o programa de ação.
culturais em uma dimensão maior, mais política e de maior alcance. Traba- Organizar é constituir o duplo organismo, material e social, da empresa.
lha para fazer com que produtos culturais diferenciados atinjam públi~os Comandar é dirigir o pessoal.
diferenciados, ganhando escala. O gestor tem um grande papel estratégico
Coordenar ti ligar, unir e harmonizar todos os atos e todos os esforços.
como integrador e coordenador, além de ser um grande difusor. Ele tem que
gerar as condições, através de instituição em que trabalha, para que as ca- Controlar é valar para que tudo corra de acordo com as regras estabelecidas
-deias produtivas das diversas áreas consigam funcionar. Isso tanto na área e as ordens dadas. i\r , ,.., "'I , \ \. ,
' · pública quanto na área privada. Para ser um bom gestor, é fundamental que t f, "\ " ' ~ )(. ' - lo,,- •• ' \

vocé conheça a prática. Se for observado o dia-a-<lia de um projeto ou de uma instituição cultural, fica patente
a necessidade de cada uma das funções-clássicas apontadas por FayoL mesmo que,
A única coisa que eu gosto no Me Donald's - além das batatas fritas e do
em grande parte das vezes;,~s próprios produtores e gestores não se dêem conta
sorvete de baunilha - é da filosofia de trabalho. Para ser gerente ou ter cargo

54 OProdutor e o Gestor Cultural 55


OAvesso da Cena
l...conc:lunoJ
disso. As atividades tipicas desses profissionais se encaixam perfeitamente nesse:.
conhecimentos sobre regionalismo, sociologia Música popular
modelo, o que toma evidente a vinculação da produção e da gestão cultural ao\
universo da administração. ;f_ urbana e rural
O~erenças básicas sobre música popular para
1
Conhecimentos sobre mitologia, danças, música,
lestes e manijestações regionais propaganda, lilme, teatro, clipe e documeptário
1
Em 1999, o Conselho Regional de Administração de São Paulo - CRA-SP lançou O ·;,fu
i Perfil do Administrador Cultural, um documento que estabelece os conhecimentos e as J Conhecimentos básicos sobre a resultante da Música erudita

1 ferramentas que o profissional da área precisa dominar. Produzido por um grupo de t tusio de influências exercidas pelas culturas
trazidas peles imigrações com a cultura local de
vinte pessoas envolvidas diretamente com projetos culturais, esse Perfil representa o . ; cada regílo brasileira
reconhecimento do produtor como administrador e indica caminhos a serem seguidos t Costumes e heranças indígenas e suas
: situações de permanência e extinção na cultura
D~erenças básicas entre música erudita a
popular
no sentido do aperfeiçoamento da categoria. O CRA-SP identifica o setor como um ''·
1 dos campos profissionais emergentes, fruto das p'rofundas transfonnações em curso no brasileira
Música erudita brasileira
mundo e nas relações de trabalho, e enumera os conhecimentos básicos que devem ser Técnicas de lazer
dominados pelos profissionais da área. Tais conhecimentos são listados no Quadro 2.1. Criação Noçio geral sobre condições normais de uma
sala de concerto
Produção de arte Noção sobre técnicas de pesquisa e
Quadro 2.1 - Conhecimentos básicos do administrador cultural
restauração de parthuras antigas .
Plar,ajamento estratégico Veiculas de comunicação e mídia em geral Audiovisual
Editoração
Contabilidade Recursos humanos Técnicas glificas Fotografia
Administração financeira Liderança Técnicas da ralações públi~as Televisão
Negociação Motivação Geografia tisica - ecossistema Artas cênicas
Legislação sobra incentivos fiscais para a Técnicas de treinamento Geografi_a política - antropologia e etnologia Cinema
cultura
Turismo
Legislaçlo tribut6ria Gestão da qualidade
Fonte: Conselho Regional de Administração de São Paulo
Consthuiçlo federal Linguas
Legislação trabalhista Informática
A todas essas áreas complementares citadas pelo CRA-SP podem-se acrescentar
Tratados e acordos internacionais na área Organização, sistemas e métodos diversas outras, também opcionais, em função do campo específico de trabalho
!' cultural
escolhido pelo administrador cultural, conforme apresentado no Quadro 2.3.
Direitos autorais Internet
11
Seguros Ciência política Quadro 2-3 - Outros conhecimentos úteis ao administrador cultural
Pesquisa em cultura Globalização
Cenografia Técnicas da divulgaçlo
Política cultural Empreendedorismo
Modelos da espaços cênicos Redaçlo de projetos a documentos
Markllling Ética
Funcion1m1nto da um• caixa cinica - Noções sobra o funcionamento da entidades do
Administr1çlo de eventos nomenclatura dos 1quipamantos e dos recursos 111rc,iro setor
Fonte: ConNtho Regional d• Admlnlatr1çio d, Slo Paulo
técnicos de uma casa de espat.ículos
Figurinos legislação referente à maia-entrada em eventos
Além de todos esses conhecimentos, o CRA-SP destaca diversos outros que se colo- culturais
cam como complementares à formação do administrador cultural e que se apresentam Sonorizaçlo legislações f1der1is, estaduais a municipais
como temas opcionais, em função da área específica com a qual ele esteja envolvido. referentes ao setor cultural
Os conhecimentos complementares são apresentados no Quadro 2.2. llumin1çlo Estatuto da Criança a do Adolescent,
Adminislnçlo da bilheteria Código de Defesa do Consumidor
Quadro 2.2- Conhecimentos complementares do administrador cultural Funcionamento das entidades arrecadadoras da Obtençio da licenças, vistos e alvarés para a • noto
direitos autorais: ECAD, SBAT realização da eventos culturais
História da cultura Arqueologia eABRAMUS• ECAO: úuildno C..nl do
Amcldlçlo t llil1rilluiçio
Sociologia Bi~iÓteconomia Noções sobra o processo de libaraçio de Seguros SBAT: Socitdtdt llmiloi11
Psicologí1 Museologia · direitos autorais pari gravações de Autor11 Teatrais
Filosofia Arquitetura Noções sobre o funcionamento dos estúdios de Funcionamento da Ordem dos Músicos do Brasil ABRAMUS: Associaçio llflsiloira dt
gravaçio - OMB Mlllicl t Ann
Folclore Artes plásticas
(continua ...) tcontinu■.. ,I

51 57
OAvesso da Cena OProdutor a o Gestor Cultural
(...conctudol
Montagem dt uposiç6u Funcionamento do SATEO - Sindicato dos Segundo Dolabela, empreendedorismo é um neologismo derivado da livre tradução
Artistas e Técnicos em Espet6culos da da palavra mtreprmeurship e utilizado para designar os estudos relativos ao empreen-
0iversl!es dedor. Pode ser definido como a capacidade de tomar iniciativas e buscar soluções
Desipn
Transpone de cargas (ntcional e intemecionell inovadoras, na condução de projetos, pesquisas e negócios.

A palavra empreendedor, de emprego amplo, é utilizada (...) para designar


O J'l'lfll do prndulnr ,, do g,,,1t11 cullm,11 principalmente as atividades de quem se dedica à geração de riquezas, seja
na transformação de conhecimentos em produtos ou serviços, na geração do
próprio conhecimento ou na inovação em áreas como mar1ceting, produção,
Em fun.-4~ d dº · d
""' ~ murusmo o setor e da necessidade de relacionamento com públicos organização etc. (Dolabela, 1999, p. 43)
totalmente diversos, alguns atributos podem ser considerados essenciais a quem
pretenda abraçar as profissões de produtor ou gestor cultural. Alguns deles são Ser empreendedor não é somente uma questão de acúmulo de conheci-

l enumerados no Quadro 2.4.

Ouadro 2.4 - Atributos essenciais ao produtor e ao gestor cultural


Perfil empreendedor
mento, mas a introjeção de valores, atitudes , comportamentos, formas de
percepção do mundo e de s i mesmo voltados para atividades em que o risco,
a capacidade de inovar, perseverar e de conviver com a incerteza são elemen-
tos indispensáveis. (Dolabela, 1999, p. 441

Verntilidtde Empreendedor é, pois, alguém que identifica oportunidades, propõe inovações, atua
Iniciativa como agente de mudanças e se abre para o risco. Alguém que não se imobiliza pelo
Agilidade medo do fiacasso. O empreendedorismo é, dessa forma, um atributo recomendável
para um profissional que pretenda atuar na esfera da produção e da gestão cultural.
Habilidade para lidar com questões administrativas e financeiras
Habilidade para soluçlo de problemas Os principais atributos na opinião de alguns profissionais da área
Aexibilidade e "jogo de cintura·
Capacidade de liderança Aluízer Malab, gestor cultural e empresário da banda Pato Fu, de Belo Horizonte,
acredita que o atributo mais importante no perfil de um p rodutor é a visão do tod o.
Habilidades interpessoais
Bom humor A atividade de coordenação exige essa visão, que só pode ser obtida com o
Senso critico apurado domínio de conheri1'1;entos gerais e com experiências práticas diversificadas
que vão se acumúi~.,do ao longo do tempo. Outra característica essencial
Sensibilidada artistice e apuro estético nesse profissional é o empreendedorismo. O produtor é aquele que • mo nta
Conhecimentos gerais o circo• para que o espetáculo aconteça. Além disso, ele deve ter algo de
psicólogo, para estabelecer uma relação saudável com os membros da equi-
pe. Isso é fundamental para que as coisas fluam de maneira harmônica. O
A necessidade de lidar simultaneamente com públicos de naturezas distintas exige papel do líder está muito ligado à capacidade de organizar, mas também à
dos produtores e gestores o domúúo de diferentes linguagens.Ahabilidade para o uso habilidade de extrair das pessoas aquilo que elas têm de melhor. É preciso
correto de tais linguagens é imprescindível para o sucesso de um profissional na área. "cuidar da galinha, para que ela continue botando ovos~ Um produtor tem
A relação com os artistas se pauta por boas doses de subjetividade e informalidade. que gostar de gente.
A interface com as empresas exige, por outro lado, posturas de grande objetividade,
Para Rosa V-tllas-Boas, gestora cultural e diretora do Teatro do Sesi do Rio Vermelho, em
enquanto o contato com o setor público requer um grau elevado de formalidade.
Salvador, o profissional da área tem que dominar ferramentas de gestão, mas precisa
O grande desafio da profissão está exatamente no desenvolvimento da capacidade
ter também "o outro lado", que é a sensibilidade para o trabalho com cultura.
de alternai; de forma ágil e precisa, linguagens tão diversas.

A grande questão é unir esses dois lados. O mercado cultural é diferente, não
Empreendedorismo é como produzir e vender qualquer produto. Não basta ser um gestor com
formação administrativa apenas. É preciso também conhecer a área cultural.
O trabalho no âmbito cultural envolve certos riscos, talvez pelo fato de lidar direta- Isso é que é complicado na questão da produção da cultura.
mente com as incertezas inerentes ao alo da criação. Some-se a isso o fato de se tratar
de um novo campo de trabalho, que exige dos produtores e gestores detenninação 11na Vasconcelos, produtora executiva da banda Skank e sócia da Retina Marketing
e capacidade de abrir caminhos. Assim, dentre os vários traços de personalidade e Eventos, de Belo Horizonte, d~fine uma competência essencial do produtor: ser
1
enumerados no Quadro 2.4, faz-se necessário destacar o perfil empreendedor. detalhista.

J 51
DAvesso da Cana OProdutor e o Gestor Cultural 59
Um ~m profissional deve estar sempre atento aos detalhes e atinado para Alguns anos atrás, todo mundo queria ter acesso à carteira de contatos dos
as coisas nas qua·15 1 ém - . produtores que faziam as grandes turnês. O produtor era algo misterioso e
• n ngu presta atençao. Deve ter um olhar especial para
1
aqui O qu_e todos consideram óbvio. Isso porque, na produção, nada é óbvio. O tinha os contatos só para ele. Atualmente, esse tipo de informação está dispo- 1
gra nde diferencial de um bom produtor é o cuidado c;om detalhes. Isso tudo, nível para qualquer um. Você acha tudo na Internet e também os sistemas de
natur~lmente, sem perder a visão do todo. Outra característica importante para acesso às empresas e às fundações estão mais transparentes.
atuaçao na área é a capacidade de solução de problemas. O produtor precisa
tomar decisões e, para isso, uma boa dose de bom senso é fundamental. Hoje, esse profissional precisa ter um nível de abe rtura e de entendimento para
interlocução com diversas áreas da sociedade. Precisa conhecer um pouco de
outras disciplinas, como administração, marketing, história. Ele não pode ser
Cláudio Costa, produtor do grupo Uakti, também de Belo Horizonte, afirma que um só um técnico.Tem que conhecer de cultura e trabalhar a partir de um conceito.
atributo essenáal é a confiabilidade. Não se vende qualquer coisa porque é grande, porque é maravilhosa. Hoje,
você vende pela idéia. O que cria diferencial, o que promove e dá visibilidade
~ tundamental que o profissional tenha crédito, tanto ~ntre os artistas quanto é O conceito. Você pode articular o seu local com uma coisa extremamente
entre os fornecedores. Qualquer deslize pode ser motivo para ele se • quei- global. Pode, a partir de uma cidadezi~ha como Xique-xiq~~- no.inte'.ior da
mar• no próprio meio. Bahia, se comunicar com o mundo inteiro, com uma boa 1de1a. Alem disso, o
produtor também tem que ser muito antenado e trabalha r em rede. Não no
11 Outra ~racteristica importante é a disponibilidade pa ra trabalhar mu ito. Pro- sentido apenas de pertencer a um organismo físico, mas de receber, distribuir
e retroalimentar. Ao contrário daquele produtor antigo que fechava, ele tem
1'
a
dutor nao tem horário. Tem que estar ligado 24 horas por dia.
que abrir. Quanto mais ele abre, mais recebe de volta. Por exemplo, se eu re•
cebo informações de diversas organizações, de agências da Europa e dos Esta-
Mauríáo Pessoa, da MP Produções e Eventos Culturais, de Salvador, da m esma
.dos Unidos, de fundações que dão prêmios, de produtores que distribuem, de
forma, defende a posição de que é essenáal a manutenção de uma conduta séria . editais, eu tenho uma série de informações que são úteis. Elas me chegam e,
se eu não as distribuo de volta, na minha comunidade, elas ficam bloqueadas
Os produtores têm má fama no mercado. Hoje, quando você chega a algum e a rede pára ali. Se eu as distribuo, retroalimento e catalogo o que recebo, eu
lugar para fazer um negócio e diz que é de uma empresa de produção, en- começo a juntar um património, seja na minha rua, seja no meu bairro, seja na
contra restrições. O profissional deve ter, portanto, um compromisso com a minha comunidade. Eu posso trabalhar construindo um capital coletivo.
palavra, pois nós precisamos reverter esse quadro. Deve ter sensibilidade
para as relações humanas e para lidar com arte. A profissão exige tam'bém Eu acho que o gestor e o produtor, hoje, precisam ter essa visão mais ampla.
"jogo de cintura; mobilidade e muito otimismo. Isso tudo é fundamental, A não ser que ele seja apenas um produtor executivo, com uma função bem
porque arte é sonho. Ser produtor cultural é sonhar e realizar. Se a pessoa i especifica. Mas se ele vai levantar um projeto, precisa ter a visão do local, da
não tem essa capacidade, não tem jeito. rua, do bairro, da cidade, e não pode perder de vista o pais e o planeta, porque
tudo, hoje, se articula em escala global.
Também para Paulo André, produtor independente e sócio da Astronave Iniciativas
Culturais, de Recife, a flexibilidade é 111'!1'; característica que define a própria A agenda do produtor
sobrevivênáa do profissional no Brasil
,. Um dos aspectos cruciais para o trabalho de produção é a montagem de uma boa
Se um produtor quiser fazer tudo do seu jeito, vai encontrar muita dificuldade e agenda que re1lna contatos de artistas, grupos, entidad es, autoridades, patroánadores,
talvez não sobreviva. Tem muita gente que não consegue ter "jogo de cintura: espaços culturais, fornecedores, prestadores d e serviços etc. Trata-se de um instru-
Não tem o perfil que a profissão exige, em minha opinião. mento simples, mas que agiliza consideravelmente a produção e pode, em casos
de emergência, #salvar a pátria#. Um bom profissional deve ter sempre à mão sua
Para Ana Luísa Lima, da Sarau Agência de Cultura Brasileira, do Rio d e Janeiro, são
agenda e fazer com que ela seja uma ferramenta confiável para o exerd cio de suas
múltiplos os atributos para ser um produtor cultural. atividades. Para tanto, é preciso não somente cadastrar sistematicamente todos os
contatos, como também mantê-los atualizados.
Em função do refinamento do setor, que está cada vez se especializando mais,
são muitos os parti, po11lveis. Se a pessoa for boa em matemática, boa em
cálculo, boa em planilha .. , pode 1er uma ótima produtora cultural. A pessoa ~ recomendável também que o produtor adote como procedimento de rotina o
que tem muita iniciativa, tem multa atitude, faz e acontece ... também pode arquivamento de catálogos, mostruários e folders, que faálitarão a cotação de preços
ser. Antigamente, havia o biótipo do produtor cultural: "o deacolado7 Mas e a especificação de produtos e serviços, poupando tempo em produções futuras.
isso é coisa do passado. Hoje existe o profissional que planeja, que gosta de
pesquisar e fundamenta bem os projetos . Há gente que lida bem com papéis,
contratos, documentação, Essa divisão do trabalho é uma coisa muito boa. Cnfdito., ,10 trJb,1lhu d~ produç.iu

Para Ruy César, gestor cultural e diretor da Casa Via Magia, de Salvador, responsá· O trabalho de produção pode receber diversos tipos de créditos. Vários tennos são
vel pela realização do evento Mercado Cultural, os atributos necessários ao trabalho empregados para designar aqueles que criam e administram eventos e projetos
na área mudaram muito. culturais. Os mais freqüentes são os seguintes:

• OAvesso da Cena OProdutor e o Gestor Cultural


:. ·j
1

• ~dutor. É o grande responsáve1 pe1a obtençao• dos recursos e pelo andamento


iniciativa privada e no terceiro setor, as oportunidades se m~ltiplicam rapidamente,
do trab~lho. Assume os riscos do empreendimento, inclusive sob o ponto de vista atraindo muitos interessados. A seguir, alguns dos campos de atuação para esses
financei~. Pode ser tanto o mentor do projeto quanto um profissional convidado profissionais são enumerados. É preciso observar que as áreas de audiovisual, rv,
pelo. artiS t a ou grupo para desenvolvê-lo. Uma alternativa bastante usual para 0 rádio e produção editorial não foram abordadas porque não fazem parte do foco
crédito de produtor é diretor de produção. Nesse caso, 'o termo diretor visa coruerir temático desta publicação.
status equivalente ao do diretor artístico.
• Produtor
. executivo·· Embora possa parecer o contráno, · o produtor executivo é , produção de espetácul JiJ,' Este é talvez o campo onde a presença dos produ-
subordinado ao produtor ou diretamente ao artista. É o profissional que executa a tores culturais seja mais \ ,isfvel para o público. Compõem esse grupo aqueles
produção de terceiros, sem o peso da responsabilidade pela obtenção dos recursos profissionais que se dedicam à montagem de espetáculos e shows, desde a sua
e sem o risco financeiro. concepção, ou que são contratados no meio do processo, co mo executores d as
idéias de terceiros.
• Assistente de produção: Trata-se de um profissional que dá ~uporte ao trabalho de
um produtor ~u produtor executivo. Esta função geralmente é desenvolvida por , Produção de turnês: Tão importantes quanto aqueles que concebem e montam
11
11 pessoas que amda não estão suficientemente preparadas para enfrentar, sozinhas, 05 espetáculos são os profissionais que promovem a sua circulação. Nessa cate-
11 a complexidade de uma produção. goria inserem-se ainda os produtores locais, que cuidam da infra-es trutura para a
leia+

! • Estagiário de produção: É um aprendiz na área, que oferece sua força de trabalho


recepção de produções de outras cidades, estados e países, e os produtores de fren -
te, que fazem viagens prévias ao longo de todo o roteiro de uma turnê, cuidando
J)rodutOfn loud ,
produto,e-s de lrtl'llt
em troca de conhecimentos práticos. p. na
dos procedimentos necessários à concretização das apresentações.
• Empresário: Trata-se de um profissional que administra a carreira do artista, pla-
• Empresariamento: São muitos os produtores que se dedicam exclusivamomte à
nejando e direcionando suas atividades. Esse profissiona.l assume, geralmente,
carreira de um artista ou grupo, trabalhando como empresários. Tais profissionais
a posição de linha de frente daquele que o contrata, prot•! gendo seus interesses,
têm como função planejar as atividades e administrar o dia-a-d.ia dos artistas, de-
filtr3étdo as demandas do público, da imprensa e dos contratantes, cuidando de
fender'seus interesses e atuar como seus representantes junto a eventuais contra-
sua agenda de compromissos e dos detalhes administrativos, jurídicos e comer-
ciais de seu trabalho. tantes e fornecedores e ao público em geral.

• Secretário de produção: Esse crédito é encontrado principalmente na área tea- • Produção fonográfica: Embora seja nítido o movimento de queda das grandes
gravadoras, a produção de registros musicais em selos independentes é outro seg-
tral, para designar o profissional que cuida dos aspectos operacionais de uma
temporada, após a estréia. mento que se expande rapidamente, à medida que a temologia toma mais aces-
sível ao artista a realização e a distribuição de sua criação. O trabalho dos produ•
E o produtor musical? tores fonográficos engloba ações de levantamento de recursos para as gravações e
coordenação dos procedimentos operacionais e administrativos, não devendo ser
confundido com a atividade dos produtores musicais.
É importante observar que, na área da mú~ica, os termos referentes à produção têm
significado diverso dos apresentados acima. A figura do produtor musical não deve • Produção de eventos culturais: Freqüentemente, os produtores se envolvem com
ser confundida com o produtor executivo ou o produtor fonográfico, que têm função de a criaçãG e produção de eventos. Tais aconteàmentos são concebidos para marcar
administração da produção. A definição do perfil desse profissional é apresentada alguma data ou fato especffico e têm, portanto, caráter efêmero.
no site Overmundo pelo produtor musical vCruz, do !cone Studio, de Natal: • Criação e gestão de iniciativas cultura.is: É grande o número de profissionais que se
dedicam à criação e ao gerenciamento de iniciativas de continuidade na área. Cabe aqui
Na música, é o Produtor Musical - nos moldes do diretor da peça teatral -
fazer a diferenciação entre esse trabalho e a promoção de eventos culturais. Enquanto
quem direciona o andar dos trabalhos no estúdio. É ele quem cuida do proces-
so que precisa captar a essência e os conceitos do trabalho da banda, cuida estes se esgotam com sua própria realização, tais iniciativas tendem a se estender por
para que cada músico faça a sua parte da melhor maneira possfvel, diz se o períodos mais l<>ngo11, tendo romo aspectos relevantes a regularidade e a permanência.
takatá bom ou não, opina em timbres etc. (Di1pon1-.1 em <hap://www.owrmundo.com. • Gestão de espaços culturais: Cada novo centro cultural, teatro, museu, galeria, )4:..
br/bloga/o-qu.....,rodutor-mualcal>. AeNao em 03 de fevereiro de 2001)
cinema ou casa de shows que se abre ao público resulta na criação de postos de
trabalho para gestores cu\turais,
C.1111pos de ,1lu,1ç;;o dos prnduton·s e geslurcs cullur.iis • Gestão cultural em 6rgãJ~ públicos: O gestor pode atuar em instituições públi·
cas, administrando o dia-a-dia, planejando e conduzindo projetos e participando
Nos últimos tempos, como resultado do crescimento do setor cultural brasileiro, do processo de formulação de políticas para o setor. Nesse caso, além dos conhe-
surgiram inúmeros novos postos de trabalho cujos pré-req~tos se adequam cimentos espedficos sobre o fazer cultural, deve dominar aspectos burocráticos
perfeitamente aos perfis do produtor e do gestor cultural. No Poder Público, na inerentes à administração pública.

IZ
OAvesso da Cena OProdutor e o Gestor Cultural 63
• Gestão cultural em empresas; A medida que cresce o número de empresas pa- a montagem de equipes com conhecimentos multidisciplinares e habilidades
trocinadoras, amplia-se também a demanda por profissionais habilitados para o complementares. O tempo do "bloco do eu sozinho" vai chegando ao fim.
desenvolvimento e a gestão de projetos próprios e programas de patrocínio, e para 1
o traio das relações com artistas, produtores e gestores públicos.
,\ i1n.1gem do produtor cultural
• Gestão cultural em organizações não-governamentais: Um campo de trabalho
que se expande rapidamente é o do terceiro setor. As oportunidades de atuação
A distribuição adequada de funções no universo cultural contribui sensivelmente
de gestores em Ongs que se valem das atividades culturais para a promoção ~o-
para a elevação do padrão de qualidade dos projetos desenvolvidos. Entretanto,
cial multiplicam-se em todo o país, abrindo perspectivas profissionais basta~te
na realidade brasileira, ainda se trabalha, muitas vezes, com baixo grau de
promissoras.
especialização. É comum encontrar artistas que, por falta de recursos financeiros
• Animação cultural: O desenvolvimento de atividades culturais voltadas para o para a c~ntratação de profissionais, ou por ingenuidade, partem para a execução de
público interno das empresas ou mesmo para as comunidades por elas atendidas suas produções sem preparo adequado para o desempenho das funções próprias
é outro segmento bastante próspero para os produtores e gestores culturais. No desse tipo de trabalho. Desconsideram seus limites pessoais e não se dão conta de
universo empresarial, é crescente a perce~:, da conveniência de se utilizar ati- como é difícil conciliar atividades tão discrepantes como a criação e a produção. De
vidades artísticas como ferramentas para a integração dos colaboradores e para um lado, estão procedimentos que lidam com questões subjetivas e, de outro, ações
a abordagem de temas específicos de seus aq;ibientes internos, como segurança, que dependem fundamentalmente da objetividade.
qualidade, saúde, limpeza. redução de desperdícios etc.
• Consultoria: É crescente também o número de empresas que descobrem nas Esse problema acaba por se tomar crítico às vésperas das estréias, lançamentos ou
atividades culturais um canal eficiente de comunicação com seu público-alvo. apresentações dos produtos finais ao público. Essas ocasiões são exatamente aquelas
Muitas delas têm recorrido ao trabalho de consultores especializados em produção que exigem maior concentração e dedicação dos artistas ao seu trabalho e também
e gestão cultural para o desenvolvimento de seus projetos. Esse tipo de demanda que obrigam os produtores a se dividirem entre incontáveis demandas da equipe
também é crescente entre instituições públicas e do terceiro setor que promovem envolvidá, dos patroánadores, dos convidados e do público em geral. Quase sempre,
atividades artísticas e culturais. Naturalmente, como em qualquer outra área, o o artista-produtor se vê em reais dificuldades para conduzir atividades tão diversas
trabalho de consultoria pressupõe vasta experiência do profi~sional contratado no e em volume tão grande.
trato das questões específicas do setor.
Na verdade, o acúmulo de funções sempre esteve presente em boa parte da produção
• Pesquisa: Com a expansão da área cultural, toma-se cada vez mais necessário
cultural brasileira, contribuindo para que a imagem dos produtores sofresse, ao
o suporte de pesquisas, como ocorre em qualquer outro setor. Estudos sobre a
longo dos anos, urna série de desgastes.
economia da cultura e sobre a dinâmica da área tendem a se tomar cada vez mais
freqüentes, exigindo, em sua aplicação e análise, profissionais com conhecimentos
Dois estudos importantes sobre o mercado cultural apontaram problemas no
específicos em gesUo cultural.
conceito da categoria. Embora realizados na década passada, permanecem como
• Ensino: Com o surgimento de cursos de produção e gestão cultural em várias ,referências dignas de registro. Um deles é a 1' PtSifUÍSII Qualillltiva sobre o M~CDdo
cidades brasileiras e a crescente demanda por formação de agentes culturais em Brasileiro ~ Patrocínio Cultural, realizada em 1994 pelo Sesc-SP e pelo Sebrae-SP e
cidades do interior, abre-se um novo e promissor campo de trabalho para os pro- coordenada pela Articultura, do produtor Yacoff Sarkovas. A partir de uma amostra
fissionais da área. A cada dia são recrutados, para essa atividade, produtores e de 48 entrevistas com executivos, num universo formado por centenas de grupos
gestores capazes de sistematizar e transmitir seu conhecimento. empresariais nacionais, o estudo revelou dados relevantes sobre a imagem dos
produtores culturais àquela época:
Com a ampliação da cadeia da produção cultural, o setor vem ganhando contornos
cada vez mais complexos e agregando diversas novas funções. É notável a tendência Os dirigentes das áreas de marketing atribuem pouca credibilidade aos produ-
de especialização do trabalho no campo da cultura, fato que vem atraindo, para o tores culturais, considerando-os amadores.
desenvolvimento de atividades específicas, pessoas de diversas áreas e com perfis
Essa visão, em alguns casos, nasce de experiências anteriores que a em-
antes inimagináveis nesse universo. ~te ~ o caso de profissionais especializados,
presa tomou conhecimento ou vivenciou com algum evento especifico e se
por exemplo, em gestão financeira e orçamentária, gestão de recursos humanos, generaliza para todos os eventos artístico-culturais, gerando uma imagem
planejamento estratégico, contabilidade, comunicação, marketing, direito cultur.i.l, estereotipada desses profissionais, decorrente de sua postura ou de ques-
incentivos fiscais, produção de textos e captação de recursos. Hoje, por mais tões de custo e controle dos eventos.
abrangente que seja a formação de um produtor ou gestor cultural, o trabalho em
Na medida em que os produtores culturais não conseguem aprovar seus pro-
grupo se impõe como necessidade premente. A própria complexificação da área e jetos, diminuem seus orçamentos originais, transmitindo a imagem de custos
também a dinamização das relações na sociedade contemporânea passam a exigir distorcidos e falta de consistência das propostas.

'4
OAvesso da Cena OProdutor e o Gestor Cult!Jral
~ ·áre11s de markering acreditam que os eventos artístico-culturais não podem ser tenham tempo e paciência para ouvir as suas "viagens~ Normalmente, não
controlados e que seus produtores não pem,item qualquer forma de Ingerência. fazem um projeto bem montado, em que explicam os objetivos daquele even-

Citam , ainda, casos de eventos patrocinados e não realizados (pela falta do


to, o que as partes envolvidas ganham com o patrocínio, que público visa a
atingir, cronograma, enfim, detalhes fundamentais para o convencimento do
1
artista ou de infra-estrutura), episódios atentatórios à moral ou polêmicos e potencial patrocinador.
até eventos simultaneamente patrocinados por empresas concorrentes.
Afirmam que a atuação desorganizada e amadora da grande maioria dos pro-
Muitos dirigentes de marketing consideram, ainda, os produtores culturais dutores( ... ) contribui para que as portas das empresas se fechem para O mer-
pedantes e prepotentes, por oferecerem seus eventos de forma impositiva, cado cultural (... ).
considerando apenas o conteúdo artístico, como se a empresa tivesse a obri- (... )
gação de patrociná-los, sem levar em conta a adequação do evento à sua es-
tratégia de comunicação e seus objetivos negociais. ( 1• Pesquisa Qualitativa ..., Outro fator que contribui para a dificuldade de viabilização de projetos cul-
p. 34-35) ., turais é a falta de união dos segmentos, dentro dos próprios e entre si. Não
há .'intercâmbio de informações e experiências e os produtores sequer se
co~hecem bem. Existe um clima de disputa, e não de concorrência saudável.
O problema de imagem da categoria dos produtores se revelou também no
Diante das dificuldades comuns, ao invés de se unirem para tentar encon-
1' Diagnóstico da Área Cultural de Belo Horizonte, realizado em 1996 pela antiga
trar soluções que beneficiem a todos, os produtores tendem a sa isolar nos
Secretaria Municipal de Cultura de Belo Horizonte (atual Fundação Municipal de seus próprios projetos. Essa classe tem, assim, pouca representatividade, tem
Cultura) e executado pela Vox Mercado Pesquisa e Projetos. O universo pesquisado pouco poder de mobilização. ( 1° Diagnóstico..., p. 97-98)
foi composto por públicos diversos como consumidores, patrocinadores, agências
de propaganda, assessorias de imprensa e os próprios produtores culturais. Ressalte-se, entretanto, que tais pesquisas não espelham as grandes transformações
ocorridas no campo da pffldução e da gestão cultural nos últimos anos, por terem
O conceito da categoria junto às agências de propaganda e às ~orlas de sido realizadas em mead~ da década de 1990. De lá para cá, ampliaram-se os
comunicação, tidas como poderosas formadoras de opirüão sobre o mercado cultural, debates ém tomo do tema e multiplicaram-se as oporturúdades de formação e
também não era animador naquele tempo. Os produtores foram avaliados por esses aperfeiçoamento dos emp~dedores culturais, em vários estados brasileiros. O
profissionais com muitas ressalvas, tendo sido também destacados alguns aspectos
próprio amadurecimento do setor permite intuir que a imagem dos profissionais
negatjyos sobre sua imagem: da área esteja se depurando com o tempo. Esta é uma questão que demanda novos
estudos similares, para que tal impressão, baseada unicamente na observação do
• Falta de profissionalismo.
( mercado, ganhe bases científicas e confiáveis.
• Falta de preparo para a elaboração de projetos convincentes e sua negocia-
ção, para transformar idéias em projetos organizados.
1
Despreparo
1 • Falta de preocupação com a adequação e pertinência dos projetos apresen-
' tado• ao negócio da ag6ncia/auessoria e aos seus clientes.
Se a classe dos produtores ainda enfrenta restrições em função de seu próprio despre-
• Falta de uma visio mercadológica a respeito do próprio negócio: evento paro, o problema se estende também aos gestores de boa parte dos espaços culturais
cultural tem que representar uma oportunidade para o patrocinador, uma públicos do país. Mesmo grandes instituições, muitas vezes, são admirüstradas de
oportunidade de divulgar marca.
maneira amadora, por pessoas que possuem apenas o gosto pela arte, ou nem mesmo
• Falta de percepção do mercado de forme segme~tadu, que co~tribua para isso. ~ comum encontrar diretores de centros culturais e até secretários de cultura
apreaentaçio de projetos mais adequados. Ausência de percepçao de que os
sem nenhuma vivência no setor e sem conhecimentos de admirüstração. Isso talvez
•·,eventos devem destinar-se a públicos específicos.
explique boa parte dos fracassos dessas instituições, tanto para a captação e a gestão
• A abordagem excessiva e ·difusa transforma produtores nu.'."a categoria in- de recursos quanto para o próprio desempenho de suas atividades.
desejável: "produtor cultural é igual a vendedor de seguros .
• Demandas muito imediatas. Os projetos oferecidos lio vendido• com_pouco Naturalmente, esse despreparo não é um traço exclusivo dos artistas, produtores e
prazo, em cima da hora. Nio há planejamento por parte dos produtores.
gestores públicos de cultura. Também no lmbito das empresas existe amadorismo no
\ • Inexistência de projetos regulares. São eventos Isolados, ■em continuidade. trato de questões relativas ao patrocínio. Na verdade, poucos são os patrocinadores
,._....p º Diagn6atico..., p. 115) de cultura no Brasil que se encontram suficientemente estruturados e informados
para lidar com o assunto adequadamente. Com freqüência, os empreendedores
Ainda nesse mesmo diagnóstico, vale também apontar alguns problemas levantados culturais se deparam com profissionais de marketing que conduzem suas ações de
pelos próprios produtores: patrocfnio de modo superficial e çlescuidado. Alguns, inclusive, não se constrangem
em mutilar projetos, em tratar artistas e produtores de forma desrespeitosa ou em
Uma idéia na cabeça parece ser suficien;e para que esses produtores deci-
dam bater na porta de empresários, esperando que profissionais atarefados lentar subml)tê-los ao cumprimento de contratos leoninos.

• OAvesso da Cena OPrOdutor a o Gestor Cultural


Reconhecimento X -t .J \u";fi J f claros a serem vencidos, do ponto de vista da formação, estimula o surgi~nto de
inúmeros cursos, debates, encontros, seminários e palestras sobre o tema.
1
Talvez pelo fato de configurarem campos de trabalho em processo de formação
e sistematização, e também por todos os problemas apontados anteriormente, as Para a produtora cultural Ana Luisa Lima, da Sarau Agência de Cultura Brasileira,
profissões de produtor e gestor culturais ainda não são percebidas com clareza pela não é mais suficiente, para a formação de um produtor, o aprendizado na prática.
sociedade brasileira. As atividades desses profissionais são cercadas de dúvidas e
empanadas por relatos quase folclóricos que, vez por outra, circulam de boca em Ele tem que dominar determinadas técnicas. Gosto da comparação com um
aluno de odontologia. Ele tem as matérias teóricas e os princípios, mas tem
boca e afetam sua imagem.
também as disciplinas nas quais aprende a lidar com os equipamentos, usar
as massinhas, o laser... Se ele não tiver a técnica, não pode ser dentista. Com
Fabrício Nobre, sócio da Monstro Discos, de Goiânia, afirma que o trabalho de
1 produção ainda é visto de forma distorcida.
o produtor cultural não é diferente. Ele precisa ter o domínio da técnica. Tem
que saber formatar um projeto, entender as etapas de produção, montar um
cronograma de trabalho e um orçamento, conduzir a produção de material
As pessoas não conseguem entender que produção não é brincadeira. Ima- gráfico. Tudo isso é técnica. Não é prática. Nós já deixamos para trás a fase do
gina como foi falar para o meu sogro qual é a minha profissão. Hoje, ele é o #a prática vai me ensinar~..
cara que mais me incentiva, mas foi difícil. As pessoas acham que produzir
um show é só conseguir um lugar e levar a banda. Que você bebe com eles Andréa Alves, também da Sarau, chama a atenção para outro aspecto interessante
a tarde inteira, depois liga o amplificador e eles tocam. Que é a maior festa,
relacionado à formação dos profissionais da área cultural:
muita alegria e que ainda sobra uma grana para você. E mais: que você só
trabalha sábado. Só que elas não sabem que nós escrevemos projeto de lei
de incentivo, negociamos com fornecedores de discos, de bebidas, de som, Nós sempre sofremos nos departamentos de marketing das empresas, lidan-
de equipamentos, negociamos com hotel, com companhia aérea, temos que do com pessoas sem nenhum conhecimento na área. Até mesmo em secreta-
refazer uni flyerda noita para o dia, porque chegou mal finalizado, contratar o rias.de cultura issàaincta é um problema. Só que, de unrtampos para cá, paio
cara para distribuir... A maioria das pessoas não consegue perceber isso. Acha menos as empresas que tãm uma política cultural apontada e que patrocinam
que nós somos um bando de doidos, doentes, maconheiros e todos aqueles · (egularrnente já começaram a recrutar profissionais com formação na área
estereótipos que conhecemos. O que devamos fazer é lutar para que a profis- cultural. Nós, da Sarau, temos tido essa preocupação. Agora só contratamos
são seja reconhecida. aqueles que queiram realmente ser produtores. Não é mais aquele ator que
está desempregado ou o filho do amigo que é "muito esperto~ Levamos em
conta a formação. o currículo e o perfil do candidato.
Segundo Rubirn (2005, p. 13), a atividade de produção cultural parece agora se tomar
visível para a soàedade brasileira.
Miriam Brum, produtora e gestora cultural, vê com bons olhos o surgimento de
A telenovela Celebridade (2004), veiculada em· horário nobre da grade de'.-pro- escolas na área, mas faz uma ressalva:
gramação da televisão brasileira, colocou em cena como profissão das suas
duas principais personagens, Maria Clara e Laura, que simbolizam o bem e o As escolas já perceberam que é necessário profissionalizar a basa desse
mal na narrativa, a figura do produtor cultural. Profissão recente, pouco reco- • mercado. Mas é preciso descentralizar também. Caso contrário, as capi-
nhecida e ainda em processo da constituição, a produção e o produtor culturais tais logo estarão saturadas de gente dnempregada. É preciso estender essa
foram tomado• visíveis através deste ícone da comunicação de massa brasilei- capacitação para o resto do pais. O Brasil· é um mundo. São muitos •erasis·
ra para a grande maioria da população. A celebridade desta nova prática social, de diferentes perfis e realidades complatamente diversas. É preciso trabalhar a
que se conforma em profi11ão, vem :~mo que consagrar socialmente o traba- diversidade. A formação tem que apontar para essa visão. Cada vez fica mais
lho e, mesmo indiretamente, legitimar a formação nesta área profissional. claro que essas escolas têm que formar profissionais não para a capital, mas
para o Brasil.
De fato, embora de maneira fugaz, o "efeito Maria Clara" trouxe certa visibilidade para
os produtores culturais. Oportunidades como esta são bem-vindas, pois valorizam ':1guns cursos de produção e gestão cultural oferecidos com regularidade no país
uma atividade restrita aos bastidores equase nunca percebida pelo público. Os avanços sao apresentados no Quadro 2.5.
no sentido da profissionalização da categoria são muitos e se fazem notar a partir de
lampejos de reconheámento como o descrito por Rubirn.

Pcr,pcctivas de profission,1liz,1ção .
Gntio de l'nlj1tos Culturais , 011aniuçio d, Eventos (Eiâaio)

O primeiro passo para se mudar uma realidade incômoda é reconhecê-la. Entre Universidade de São Paulo • Centro de Estudos Latino Americanos de Cultura e Comunicaçlo
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produtores e gestores culturais brasileiros é crescente o grau de consciência do quanto
é preóso avançar em relação à capacitação na área. A percepção de que há limites Duração: 1 ano www.1c1.usp.br
lcontinua..,I

OAvesso da Cena OProdutor e o Gestor Cultural


69
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'11 DAvesso da Cena OProdutor e o Gestor Cultural 71
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n
OAvesso da Cena OProdutor é o G1stur Cultural
n
1

Quando um profissional se forma de uma maneira empírica, por melhor que
ele seja, alguma lacuna há de f1car. A faculdade permite que ele tenha uma
formação mais sólida, mais consistente. /.
1
Prog,- Moil!Wi9Cipli11• ole N1....,açh em Cultun, , S1cl1d1d1 - Culbtn, , Sociedade O professor apresenta também os princípios que nortearam a-estruturação do curso:
Universidade Federal da Bahia - UFBA
Salvador- BA
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EntM do que um produtor não é um artista, embora até possa acontecer de um
/:
artista se tornar também produtor. Ele é, basicamente, a pessoa que vai fazer a
Hist6rie, l'llllica ta.. Clltwais interface entre a criação artfstica e o mercado. Existe certo m ito, que nio deixa
de ter um fundo de verdade, de que os artistas que lidam com a criação mui-
Funrlaçlo-Gltúlio Vafllas
Rio de Janeiro - RJ
www.cpdoc.fgv.br ·
tas vezes estão a lguns centímetros ou metros acima do chão. Parece que sua
energia vai toda na criação e, na hora de isso se tornar alguma coisa prática,
eles têm enorme dificuldade. Isso nio é nenhum demérito, mas eu entendo
f1 l
que essa dificuldade é real. Alguns artistas conseguem lidar com isso, outros
11 Existem também rursos sem periodicidade definida no campo da produção e da não. Portanto, é importante que exista um profissional que se responsabilize 1
gestão cultural: pela realização, e que esse profissional seja bem formado. Ele não vai ser um 1
•1
artista, mas vai ter que conhecer as linguagens do artista, dai os Fundamentos 1
dos Meios de Expressão. Ele tem que conhecer um pouco do que seja cinema,
1
' 1 • Cursos gratuitos sobre produção e gestão cultural em cidades do interior de Minas teatro, literatura, dan'if, música._ P« outro lado, como não é um curso técni-
1 Gerais, sob a ·coordenação do prof. José Márcio Barros {www.transversalconsulto- co, temos que dar fen ~mentas para que - pessoa possa refletir criticamente
1
ria.com.br}. sobre seu próprio fazer. Daí oferecermos o conjuntoTeorias da Arte e da Cultura,
no qual ele vai ter noções de antropOlogia, sociologia, fllo■ofia etc. A partir
.1 • Cursos de elaboraçlo de projetos culturais, captação de recursos e leis de incen- dessa instrumentalização, ele vai ter que criar projetos, cuidar de toda a parte
tivo à cultura, oferecidos pelo Movimento Rio Carioca {www.movimentorioca- de planejamento, difusão, organização, paquiaa, marketing, administração e
rioca.org.br). gestão, dai as disciplinas do bloco de Planejamento Cultural.
• Seminário "com:atitude", sobre ação e comunicação de marcas, promovido pela Quando pensamos nesse profissional, não é só naquela vertente do produtor
Significa, empresa do especialista em patroánio Yacoff Sarkovas {www.comatitu- executivo. Ele também pode estar eventualmente em uma secretaria de cultu-
de.com.br}. ra, colaborando para a definição de políticas públicas; pode estar gerenciando
um espaço cultural, pensando desde um perfil adequado para a comunidade
em que se encontra até aspectos práticos como montagem de equipe, cura-
Outras alternativas interessantes de formação são os cursos à distância oferecidos
doria etc. A nossa preocupação é da formar um profissional comprometido
pela Duo Informação e Cultura (www.duo.inf.br). São eles: com a diversidade cultural. Queremos que ele tenha a noção clara de que ,
tão importante como pensar na diversidade, em termos ecológicos, é bus-
• Gestão ContemporAnea da Cultura (4 meses e meio). car também a manutenção da diversidade cultural e procurar nio massacrar
e pasteurizar a cultura, ficando unicamente voltado para a indústrit cultural
• Gestão Ct:ltural rom ~ase em Cooperação Internacional (3 meses).
hegemõnica. Tão grave quanto perder uma planta ou um animal em extinção
• Economia da Cultura {45 horas). é perder uma manifestação cultural, deixando que ela se extinga. A intençio
é de que ele valorize a produção que emerge de todas as claaea e que pro-
O Instituto Cultura em Rede (www.culturaemrede.org) também oferece curso à cure tomar os bens culturais acesslveis ao maior número possível de pessoas.
distância de gestão cultural, com carga horária de 90 horas. Essa é uma questão importante. Queremos formar um profissional ético.
1
O Cuno de Produção Cultural da UFF Gilberto Gouma faz ainda um breve balanço dos resultados obtidos pelo curso desde
sua criação:
O Curso de Graduação em Produção Cultural da Universidade Federal Fluminense
Hoje, passados mais da dez anos da criação do Curso de Produção, observa-
foi criado em 1995. Idealizado pelo prof. Gilberto Gouma e pela prof". Piedade mos que ele está entre os dez mais procurados da Universidade, num• rela-
Carvalho, visa oferecer conhecimentos básicos dos vários meios de expressão ção que, por vezes, chega a vinte candidatos por vaga. O curso foi reconhecido
artística com os quais o produtor cultural irá lidar, além de instrumentalizá-lo em pelo· MEC am 2001 e, num estudo da egressos que realizamos, constatamos
planejamento e administração cultural. Com duração mínima de sete semestres, que mais de noventa por canto dos ex-alunos estio trabalhando n■ ,rea.
estrutura-se em três blocos: Teoria da Arte e da Cultura, Fundamentos dos Meios de
Express4o e Planejamento Cultural. O Curso de Tecnologia em Produção Cultural do Cefet Química de Nil6polis

Para o prof. Gilberto Gouma, a existência de um curso de graduação em produção O Curso SÚperior de Tecnologia em Produção Cultural do Cefet Química de
cultural é importante para sistematizar o conhecimento existente na área. Nilópolis, criado em 2003, é o pioneiro no Brasil na formação de tecnólogos na

14 OProdutor e o Gestor Cultural 1S


OAvesso da Cana
área. Essa modalidade de ensino visa preparar profissionais para atender campos -/ ~. o mercado de trabalho para produtores e gestores encontra-se, dessa
específicos do mercado de trabalho e tem formato mais compacto, com duração , ~ bastante aquecido.
média menor que a graduação tradicioi:i,al. O objetivo do curso de Nilópolis, 1
cumprido no período de três anos, ou seit ~~mestres, é de formar profissionais de -ülà :[)ehei.nzelin expõe a existência de perspectivas bastante favoráveis para o
nível superior, aptos a pensar, planejar e executar programas, projetos e eventos .' tra.balho de gestores e produtores culturais:
sociais, culturáis e de lazer nas áreas de artes,;ciências e esportes. O corpo discente
Eu acho que esta não é "uma• das profissões mais promissoras, mas • a7 Hoje
é composto, em parte, por moradores de municípios da Baixada Fluminense, mas
existe no mundo uma falta enorme de modems, de conectores, porque o tra-
também por alunos provenientes de outras cidades e até mesmo do Centro e da balho acontece cada vez mais em rede. A função do produtor e do gestor
Zona Sul do Rio de Janeiro. cultural é de ser conector, é de ser modem, de fazer a interface entre mundos
diferentes, entre linguagens diferentes. E se vemos a evolução da informática
e das comunicações, por exemplo, percebemos que elas avan.yaram porque
Ângela Coutinho, coordenadora, apresenta o perfil do profissional que o curso
foi inventado o modem. Se não existisse essa pecinha que traduz uma coisa
pretende formar:
na outra, que faz a conexão, não haveria tanta evolução. Não dá para querer
que o artista fale a linguagem do empresário ou o empresário fale a lingua-
Eu sinto grande responsabilidade quando vou apresehtar o curso e digo que gem do artist~. Cada um é um. É preciso existir uma pessoa cuja função seja
o aluno está entrando num mercado em expansão, que ele vai possibilitar que colocar esses universos em contato.
mais pessoas tenham acesso aos bens culturais e poder até mesmo mudar a
face de uma cidade. Eu fico preocupada quando digo isso, porque o povo· bra- E ela vai ser ainda mais necessária porque, sob o ponto de vista da globali-
sileiro tem uma cultura muito rica, mas que não é difundida de maneira ho- zação, a territorialidade mudou completamente. Não há mais essa idéia de
nesta. Existe muita glamourização midiática, e eu gostaria de ver essa cultura nações, territórios e espaços. As coisas vão acontecer, cada vez mais, fora
apresentada do jeito que ela é e as pessoas aceitarem, sem maquiagem. O dos espaços geográficos e aí, novamente, essa conexão será nece&sária.
desafio do produtor é conseguir trazer essa diversidade para o conhecimento As negociações internacionais vão ocorrer cada vez mais. Provavelmente,
da juventude, que hoje prefere o produto maquiado, com uma cor pastel, com numa visão de futuro, as nações deixarão de existir. Então, a função de
rostos conhecidos da mídia televisiva. É esse produtor, com esse olhar espe- gestor v.ai ser cada vez mais necessária. Dentro dos acordos internacio-
cial para as manifestações culturais brasileiras, que queremos formar. nais, temos um problema muito sério, porque nio há quem saiba fazer
isso. Você tem as pessoas da área de relações exteriores, por exemplo,
que são diplomatas~ que não conhecem absolutamente nada do mundo
Ângela relata também a preocupação em aliar a teoria e a prática, para que a formação
real da produção:você tem pessoas do Direito que c~ ~hecem as leis, mas
oferecida tenha consistência e aplicabilidade no mundo real: t;imbém não conhecem nada do mundo real . Você tem ainda as pessoas
do comércio, que conhecem muito do mundo real e nada do simbólico.
Já no primeiro período, o aluno tem uma disciplina que se chama Atividades Então, você precisa ter alguém que conheça um pouco de cada uma des-
Culturais, um momento em que vai conhecer os ambientes culturais para se sas coisas, e esse é o gestor cultural.
informar e conversar com as pessoas responsáveis pela produção e pela ges-
tão. Depois, em algumas disciplinas seguintes, ele se envolve com projetos
Deheinzelin busca na natureza e na ecologia uma imagem interessante para a
e com o estudo da pré-produção, produção e pós-produção. O trabalho de
conclusão de curso tem duas vertentes: uma prática, em que ele faz um pro-
visualização do lugar que a cultura ocupa na soàedade contemporinea e também
jeto, trabalha sua inserção nas leis de incentivo e leva pelo menos uma parte para a definição do papel doo gestores culturais nesses novos tempos.
ao público; e outra teórica, em que ele deve apresentar II pesquisa acadêmica
feita para a realização desse projeto. É como se fossem a·s duas faces de uma Uma coisa que é melo base no meu trabalho é a percepção de que a cultura
mesma moeda. ; é a interseção entre a natureza e a história. Eu venho da biologia e, por isso,
sempre tive essa visão sistémica. O que eu percebo é que, assim como na
primeira metade do século XX nós precisamos começar a lidar com I ecologia
O mercado de trabalho para produtores e gestores culturais porque a natureza estava em risco, agora os desafios principais que enfrenta-
mos, assim como as principais soluções, são de caráter cultural. Hoje, o que
.
O surgunen to d e uma gran de vane e·tursos d e p roei ução e gestão cultural
. d ade d,(::\ vale mais é o intangível, e não o tangível. As disputas de território e as coisas
por todo o país ~ uma resposta natural ao aumento da demanda por serviços nesse da colonização se dão no campo do intangível. Para podermos lidar com essas
dificuldades, que vão desde as coisas étnicas até as éticas, teremos que atuar
campo. Cada mecanismo de financiamento lançado pelo Poder Público faz girar a
de forma sistémica. Não haverá como separar a cultura da polltica, da econo-
roda da economia da cultura e estimula a abertura de novos postos de trabalho no mia e da antropologia. Essas coisas vão ter que se articular em uma única esfe-
setor. Cada empresa ou organização não-governamental que se toma patrocinadora ra, am um único campo. Então, provavelmente, nós veremos o nascer de uma
contribui ativamente para o fortalecimento da cadeia produtiva da cultura. Cada nova disciplina, que é a ecologia cultural. Aí, quem serão os ecólogos desse
teatro, casa de shows ou centro cultural que abre as portas para o público recruta ecossistema? Aqueles que conseguirem fazer as conexões. O gestor cuhural é

profissionais habilitados para sua gestão e, obviamente, oferece espaço para novas
justamente quem tem essa visão sistêmica, integrada. É aquele:que entende
um pouco ~e cada coisa.

OAvesso da Cena OProdutor e o Gestor Cuhu~~I n


Ruy César, gestor cultural, tem uma visão bastante peculiar sobre o mercado de Andréa Alves e Ana Luisa Lima, da Sarau Agênáa de Cultura Brasileira, também
trabalho para produtores e gestores culturais no Brasil.

Eu poderia abordar essa questão por duas vertentes completamente diferen-


consideram promissoras as perspectivas de trabalho para os profissionais da área:

O mercado cultural já cresceu multo, mas temos ainda um mundo para ser
l [i
tes. Uma primeira pela visão tradicional da crise de emprego . Ai, eu diria que explorado, que não sabemos nem bem o que é. t uma questão de maturidade
é um mercado muito difícil e saturado. Há muita gente produzindo dentro dos do setor. Ainda é preciso investir bastante na formação de produtores, mas 0
mecanismos tradicionais. Por outro lado, se você é uma pessoa que entende mercado que temos pela frente é muito bom . (An<kMAl-1
que a cultura permeia todos os aspectos da vida humana.:que cultura é nossa
forma de viver, de nos comunicar, de nos vestir, e que a educação, o turismo e A profissão de produtor cultural é antiga, mas a profiulonalização do setor é
o movimento econômico estão vinculados à questão da cultura, percebe que
há.muito espaço para a gestão e pa~a a produção cultural. Se você não vai na
direção do que já está saturado e busca o caminho daquilo que está faltando,
muito recente. O mercado vem crescendo e se organizando. Vou falar de uma
coisa que é concreta. Eu coordenava na UFF a área de estágios do curso de
Produção Cultural e ficava com as fichas dos alunos. Muitos produtores me
I
as oportunidades são muitas. O que falta no meu bairro 7 O que falta na minha ligavam para pedir indicações de estagiários. Eu percebo que quase todos
rua? O que falta na minha comunidade? os indicados daquela época continuam trabalhando na área e que os produ-
tores continuam procurando pessoal. IÊ impressionante. Um dia desses nós

No cenário brasileiro, a distribuição da produção cultural é muito precária. também precisamos e tivemos dificuldade de encontrar estagiários. Isso para 1
Todo mundo tem que passar pelo Sudeste para ser aprovado e distribuido,
porque lá estão as grandes emissoras de televisão e os grandes formadores
mim é um sintoma da expansão do mercado cultural . (Ana LulN Lim•I
1.
de opinião. Quando se distribui, isso ocorre, no máximo, pelas capitais. As As perspectivas de trabalho para produtores e gestores culturais tornam-se ainda
cidades médias e pequenas têm um público ávido por se comunicar e por \
mais interessantes quando se observa a enorme carênáa de mão-de-obra especiali-
se conectar, mas não existe oferta. Há um estrangulamento da distribuição 1
zada nas comunidades periféricas e nas centenas de cidades do interior que começam
da produção. Nós temos no Nordeste, por exemplo, uma produção cultural 1
extremamente rica, uma tradição popular IT)_aravilhosa e também uma tradição
a perceber os benefícios do investimento em cultura. Entretanto, para que esses \.-
inventiva, a,ntemporãnea, especialmente na música. Só que essa produção
não circula na própria região. Nenhum estado do Nordeste consome o que é
espaços seja,m preenchidos adequadamente, é imprescindível que as iniáativas de
capaàtação.se proponham a preparar empreendedores aptos a atuar como modarts,
!
produzido no outro. Todo mundo quer ser aprovado no Sul. A Bahia, com a conforme proposto por Laia Deheinttlin, e partir na direção daquilo que falta,
r
i
indústria do carnaval, rompeu uma barreira. Pernambuco tem um trahalho como defende Ruy César. ~ necessário formar profissionais capazes de reconhecer a
extremamente criativo de releitura das artes populares, a partir do mangue riqueza cultural a sua volta, valorizá-la e colocá-la em contato com o mundo.
bea(, que tem alcançado grandes mercados fora do Brasil. No entanto, não há
mecanismos de circulação no próprio Nordeste.
Remuneração do lrab,1lho de prndu,~n
Ruy César afirma que há muito espaço para a criação de novos mecanismos de gestão, 1.
organização, sistematização, oferta e distribuição da produção. Chama a atenção O cálculo da remuneraçãé de trabalhos de produção é algo que suscita muitas
para a existência de muitas oportunidades para produtores e gestores culturais na dúvidas e controvérsias. Ainda são poucos os partm~ existentes para a valo- \
área de educação e na área de desenvolvimento soáal. ,lf
ração da rnão-d~ra de ,preendedores culturais. Na maioria das vezes, o i
valor do trabalho é detenniNdo de forma subjetiva ou balizado por parlmetros e
A cultura •• na atualidade, o grande suporte, em nlvel mundial, para a ques- convenções emprestados de outros setores, como a publicidade e a administração.
tão do deaenvolvimento, inclusive econômico. Sabe-se, hoje, que as técnl~as Pesam também, na definição da remuneração; fatores como:
e métodos de ajuda humanitária vindos dos palses ricos ,aplicados na África
e na Amirlca Latina foram totalmente falidos. Destruirem formas culturais
seculares II métodos muito mala eficazes de harmonização, de convlvlo, de • o grau de responsabilidade que o profissional terá em relação ao projeto;
troca II de lntercãmblo, empobr-ndo maia as comunidades. Existem, no • os ganhos de outros profissionais previstos na ficha téaüca;
Brasil remlnlactnciaa de todas 1111•• práticas, que aio extremamente vallo- • a existênàa de perspectivas de risco financeiro para o contratado;
881, •• que nio estio 1iatem1tlzada1 e organizadas. Existe um tipo de turista • o currículo e o conceito do p restador dos serviços;
de altfaalma qualidade intelectual, econõmlca e afetiva, que tem Interesse em • o tempo que será dedicado ao trabalho;
oonvlver, em aentlr-H pertencendo a uma comunidade. Ea11 oferta nio existe
• o fato de ser u m trabalho pontual ou regular;
no Breall. OferKe-H uma colaa pasteurizada, de norte a, sul. Um turismo de
• a realidade do mercado no local da contratação.
lazer II entretenimento que é bem precário. Fala-se que ,-iamoa combatendo
o turismo aexual m■1 é 1890 que n61 estamos ofer-ndo. A praia, as mo·
rena,, 01corpoa.'.. Nóa nlio oferecemo• 01 no8801 musaus, a no11B música. Em função da existência de tantas variáveis, o estabelecimento dos ganhos dos
Noa no1101 hotéis, nio existem alusões às manlfeateç.ões ·culturala. Produtores acaba sendo feito caso a caso.

Aaim, 111 qulaenno. entrar pelo caminho que ainda está fechado, Ir em direção Fernanda Vidigal, Juliana Sevaybridce.r e Karla Guerra, da Agentz Produções, de
ao que está faltando, teremos muitas oportunidades para gestores e produtores. Belo Horizonte, ~ que não existe uma base fixa no mercado.

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OAvesso da Cena OProdut11r e o Gestor Cultural 19
O mercado de prestação de serviços é "um samba do crioulo doido". Mesmo executiva, na qual simplesmente se viabiliza • idéia de outras pessoas. Via de
os profissionais liberais nio têm muito teto. Na nossa área também é assim, regra, o trabalho de produção executiva é remunerado em até 20% da recei-
e o valor vai depender da produção. IK•rl• Guernl ta total obtida com o projeto ou do seu custo total. Esta é uma espécie de
convenção do mercado, que funciona tanto para empresariamento artísti-
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Atualmente estabelecemos uma porcentagem em cima do valor global da co quanto para a realização de eventos culturais. O percentual, entretanto,
produçio, pois esse valor indica o seu tamanho e a quantidade de trabalho nunca deve ser inferior a 10%, para que o profissional não seja desvalo-
que vamos ter. (Fernanda Vidlg•II rizado. Tecnicamente, é praticamente inviável manter-se no mercado com
percentuais inferiores a este.
Essa porcentagem é de mais ou menos dez ou quinze por cento, embora Isso
não seja uma coisa fixa. Analisamos o grau de dificuldade do projeto e tam- Alufzer Malab, gestor cultural e empresário do Pato Fu, tem a seguinte opinião
bém nosso interesse em fazer o trabalho. Levamos também em conta nosso sobre o assunto:
desejo de fazer a produção, pelo que será oferecido à cidade e pela admiração
que temos por aquele artista ou grupo. Há uma série de fatores que nos levam
Existe uma praxe de se remunerar o trabalho de produção em 20%, mas isso
a "pegar• um serviço. Não é só o dinheiro. (Juliana SevaybridcerJ pode variar. Hoje em dia, não me guio mais por esse tipo de referência. Cada
caso é um caso. Há exemplos de projetos especiais que têm vida longa e exi-
Tentamos separar o projeto em fases. Produção é uma coisa meio amorfa e gem investimentos do produtor. Esse é o caso do Pato Fu. Apostei no trabalho
pode envolver a elaboração do projeto, o seu acompanhamento, a gestão admi- desde o início e assumi o risco, junto com os artistas. Quando a banda se fir-
nistrativa, a montagem, a estréia, a temporada, uma série de coisas. Fazemos mou, passei a ter um percentual dos ganhos, tal como os músicos.
uma proposta em cima disso. Listamos quais atividades serão desenvol.vidas.
Será somente a elaboração do projeto ou haverá também acompanhamento?
Para Ana Luisa Lima e Andréa Alves, da Sarau Agênóa de Cultura Brasileira, o
Organizamos o orçamento por etapas e coloçamos preços separado·s . Ainda
mais quando é um cliente que não connecemos, é bom para percebermôs se parâmetro para a cobrança dos serviços de produção deve ser o bom senso.
vai dar certo ou não. Se na elaboração do projeto já começam a surgir muitos
problemas e na pré-produção esses problemas aumentam, tendemos a não Se você tem o diretor ganhando tanto, você vai ganhar muito mais do que
continuar no projeto. (Karl• Guam,) ele1 Ou muito menos? Eu acho que o orçamento deve ter um equilíbrio quase
emocional. Os pares têm que se remunerar de maneira equilibrada, para que
Para Mauríóo Pessoa, da MP Produções e Eventos Culturais, de Salvador, a remu- não surjam problemas no dia-a-dia da produção. Eu sei que isso envolve cer-
neração dos trabalhos de produção ainda é1feita caso a caso. ta subjetividade, mas a nossa remuneração deve se pautar pelo bom senso.
(Ana Luisa limai

Na Bahia, hoje, nós não temos uma tabela. Nós sentamos, dimensionamos o
Mesmo quando foi você quem elaborou o projeto, ficou dois anos pesqui-
serviço e estabelecemos as condições· de pagamento. Discutimos o assunto,
sando, convidou todo mundo, viabilizou o negócio e vai realizar, ainda existe
dentro de uma realidade de mercado que conhecemos, mas nada é preestabe-
um pudor de ganhar adequadamente. Geralmente o artista convidado ganha
lecido. Talvez ainda falte uma associação de produtores que possa criar tabelas,
mais do que o produtor. Isso acontece. (Andréa Alv•I
definir condições mínimas de trabalho. Esse é um problema da nossa área.
Nós ainda vamos precisar, como muitas outras carreiras têm, de conselhos
Segundo Kuru Lima, da Cria! Cultura, de Belo Horizonte, os ganhos da produção ou órgãos reguladores da profissão. Aí, sim, teremos parâmetros. Inclusive,
dependem da natureza do trabalho. porque há produtores com atitudes inadequadas que queimam o mercado
inteiro. Nós ainda sofremos com isso. (AN Luiu Um•I
É necessário refletir sobre alguns pontos para se chegar ao valor a ser cobrado.
Em primeiro lugar, é preciso pensar sobre qual é o nível de risco envolvido. Paula de Renor, produtora cultural, atriz e diretora do Teatro Armazém, de Reófe,
Não apenas o risco físico, econômico, mas também o de imagem. É im-
portante avaliar o impacto que a realização de um determinado projeto ou também fala, com bom humor, sobre a existência de certo pudor do produtor em se
evento possa ter na imagem do produtor ou de sua empresa. Uma pergunta remunerar dignamente.
que sempre deve ser feita é se é prudente produzir um evento que traga
conflitos com a própria marca. Talvez nem por uma boa remuneração valha Eu comecei sofrendo muito na minha primeira produção. Depois, com o
a pena realizá-lo. tempo, achei que fazer produção era sofrer. Aí eu entrei num estado maio
masoquista de achar que aquilo que eu ia merecer dependeria do meu grau
Outro ponto que deve ser analisado é se o projeto proposto é correto, do de sofrimento. Quanto mais eu sofresse, mais eu poderia ganhar. Se eu não
ponto de vista ético. O produtor deve ter visão critica e comportamento éti- tivesse sofrido nada, tudo tinha sido muito fácil e então eu não era mere-
co, sempre. Além disso, também deve evitar a concorrência desleal. Fazer cedora daquele dinheiro. Tenho trabalhado muito isso na análise e, aos
um trabalho por um preço baixlssimb apenas para conseguir um cliente é poucos, vou mudando minha ideologia. Sempre estou procurando alguma
uma atitude nada profissional. coisa para a cidade. Eu. quero abrir espaço para todO.JTIUndo, que meu tea-
tro seja da cidade, mas repensei meu modo de atuar. Náo posso dar muito
Outro aspecto a ser levado em conta é se o projeto proposto inclui trabalho mais do que recebo como produtora. Amo teatro, tenho uma grande paixão,
criativo. Realizar algo que envolva criação é diferente de fazer uma produção mas eu preciso viver disso. Hoje em dia mudei muito e comecei a melhorar

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tamt>.m como produtora. Percebi que só vou miltir e continuar nl110 •• eu
conseguir ganhar dinheiro. Se voct nio tem tranqOllldede financeira, vocA · \ -1.
nào cria, nào produz. Dessa forma, tenho valorizado mais meu trabalho de
produção. Tenho, inclusive, p111ado isso para outras penoaa que estão
começando. Aquela história de tirar o dinheiro do bolso para produzir não é
legal. As coisas nlio podem ser assim.

Com esses depoimentos, fica evidente a calfncia de parlmetros comuns para a


remuneração do trabalho de produção. Cada profissional_ estabelece os ganhos
a partir de sua viv~nàa no mercado e de seu ~ling. Um produtor em início
de carreira muitas vezes encontra dificuldades para determinar o p ~ de seu
trabalho, restando, nesses casos, a alternativa de aconselhamento com profissionais
mais experientes.

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