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Muito Mais

que o Balanço
Bete
Estudo de Caso do Filme Bete Balanço
Rodrigo Bouillet
Muito Mais que o Balanço Bete

Estudo de Caso do Filme Bete Balanço

Universidade Federal Fluminense


Centro de Estudos Gerais
Instituto de Artes e Comunicação Social
Monografia de Conclusão do Curso de Publicidade e Propaganda
Professor Orientador: Hernani Heffner
Aluno: Rodrigo Fagundes Bouillet
Matrícula: 296.30.108-6

2
Sinopse

3
A todos os cineastas
– sejam eles autores, realizadores ou artesões –
excluídos da filmografia brasileira tradicional

4
Agradecimentos

5
O cinema brasileiro normalmente tem uma preocupação cultural e política muito grande,
mas é dirigido a maiores de vinte anos. E assim os heróis da nossa juventude são os que o
John Travolta encarna.

Antonio Calmon
Press-book do filme Menino do Rio (1981)

O país respira os ares da abertura política, mas o mercado de cinema está saturado de
pornochanchadas, de filmes de violência e de comédias de 5ª. categoria. Nas salas de
exibição o público bate os pés, impaciente, à espera de algo que lhes devolva o entusiasmo.
E a quase totalidade desse público é constituída de jovens. Mais da metade da população
brasileira tem menos de 30 anos. Só o cinema ainda não percebeu o óbvio ululante e
transformador. Afinal, quem está falando com a juventude no cinema brasileiro?

Sérgio Rezende
Sem autor. SQS 109. Primeiro longa-metragem de Brasília.
Jornal de Brasília. Brasília, 18 jun 1981

Acusada de alienada, de não se interessar pela coisa mais ampla da sociedade, da política.
Para mim esta é uma visão de má fé, que transfere às pessoas erradas responsabilidades que
elas não têm. Quem tem 18 anos em 1982 nasceu em 1964. É gente que não criou seu
tempo, que não moldou sua imagem. Um pessoal que não conhecia democracia nem
liberdade.

Sérgio Rezende
Pereira, Edmar. Elogiado, criticado. O filme estréia hoje em São Paulo.
Jornal da Tarde. São Paulo, 6 ago 1982.

Um filme para um segmento do público jovem que nunca foi visto, sequer ouvido e jamais
viu sua imagem em cinema (...) com a maneira natural dos jovens de encarar coisas como o
sexo, o homossexualismo e as drogas. A possibilidade de gostar do que se faz e ter prazer,
sem precisar sentir culpa. Pessoas que transformaram a batalha da vida numa coisa boa,
sem amarguras, rica em experiências.

Lael Rodrigues
Press-book do filme Bete Balanço (1984)

6
Bete Balanço incorporou a linguagem do videoclipe e do rock, em especial, como
expressão própria do jovem, de uma geração que pouco teve acesso à formação política e
cultural mais ampla e se apegou à música. O rock é o elemento de maior identidade com o
público que eu queria me comunicar.

Lael Rodrigues
Press-book do filme Bete Balanço (1984)

Estou surpreso com a boa acolhida da crítica e só posso atribuí-la a uma nova visão.
Talvez se tenha percebido que a postura conservadora da esquerda brasileira, que
não perdoava um filme que não fosse político, era tão ou mais elitista que a postura
das classes dominantes.

Lael Rodrigues
Sem autor. ‘Bete Balanço’, falando a linguagem dos jovens.
Estado de São Paulo. São Paulo, 06 set 1984

O cineasta Lael Rodrigues morreu no ano passado e deixou um posto vago no cinema
nacional. O quarteto Os Trapalhões e a rainha dos baixinhos, a Xuxa, dedicam-se ao
público infantil, diretores como Cacá Diegues, Hector Babenco e Arnaldo Jabor, e outros,
abastecem o mercado voltado para o público adulto, mas a faixa adolescente dos
cinematófilos fica desassistida.

Ana Teresa Baptista


Um musical sobre o sonho de ser estrela. A Tarde. Salvador, 19 mai 1990

O que se vinha fazendo em termos de cinema para jovem era uma coisa colocada a nível da
experiência do diretor, da juventude dele colocada no cinema, quando você tem que ver a
juventude do momento, o que que você está vivendo, o que que você está pensando. (...) Eu
parti muito do que eu queria fazer da necessidade que via de um público jovem ter um
produto cultural, principalmente dentro do cinema, filmes com a sua linguagem, a sua
identidade. (...) Traduzir isso para o filme não foi uma coisa ligada a qualquer influência
em torno de outros filmes. Não havia referência.

Lael Rodrigues
Comunicação com o público jovem. In: Filme e Cultura n° 48 – Diretores estreantes.
Fundação do Cinema Brasileiro, Novembro, 1988,

7
Sumário

Introdução: Rumo ao Desconhecido.......................................................................................9

Vem Comigo, No Caminho Eu Explico....................................................................12

Capítulo 1: Não Ligue Pra Essas Caras Tristes, Fingindo Que a Gente Não Existe –
O Equivocado Desprezo Pelos Cinemas Brasileiros da Década de 1980
e Comercial..............................................................................................................15

Capítulo 2: Bete Balanço, de Lael Rodrigues. Lael, Quem?................................................27

2.1 A História Que Ficou..........................................................................................28

2.2 O Que Ficou Pela História...................................................................................35

Capítulo 3: Por Que um Filme Como Bete Balanço?...........................................................47

3.1 Quem Vem Com Tudo Não Cansa, Bete Balança Meu Amor – O Filme..........48

3.2 Mais uma Estória Para Lembrar, Um Outro Amor na Longa Estrada –
Panorâmica Sobre a Filmografia de Lael Rodrigues.................................................62

3.3 Me dá Vontade de Saber, Aonde Está Você – Breve Sugestão de Filmografia


Adolescente Nacional................................................................................................73

3.4 Agora Eu Quero é no Grito: A Contemporaneidade de Bete Balanço – O Apelo


Junto ao Público e a Reação da Crítica.....................................................................87

Considerações Finais..........................................................................................................127

Filmografia de Lael Rodrigues...........................................................................................128

Bibliografia.........................................................................................................................132
Internet....................................................................................................................133
Periódicos................................................................................................................135
Press-books.............................................................................................................138
Outras Fontes...........................................................................................................140
Filmografia Consultada...........................................................................................140

8
Introdução

Rumo ao Desconhecido

Olho para trás e recordo do hoje distante ano de 1995, quando me vi confrontado com a

escolha que parecia definir para sempre os rumos de minha vida: para qual curso prestar o

exame vestibular. Criado pela “babá eletrônica”, chego à época interessado pelas imagens

que a televisão reproduz, comerciais e videoclipes (da então recente rede MTV) chamavam

minha atenção.

Querendo me aproximar deste universo, assinalo a opção Publicidade e Propaganda e sou

aprovado, dentre outras, pela Universidade Federal Fluminense. Uma das primeiras

disciplinas que tive a oportunidade de cursar foi a de História da Comunicação, ministrada

pelo Professor Antonio Serra. Dela, não saí ileso.

Certo dia, o Professor propõe que assistamos dois filmes brasileiros para posterior

realização de um trabalho de análise comparativa. Tratavam-se de Terra em transe, de

Glauber Rocha, e Vidas secas, de Nelson Pereira dos Santos.

Até então, minha cultura cinematográfica era pífia – caso se considere o acesso aos livros e

filmes entendidos como imprescindíveis para o entendimento do tema. No que tangia ao

cinema brasileiro, o quadro era pior ainda. Reduzia-se à experiência de filmes do grupo

humorístico Os Trapalhões, na infância, e aos festivais anuais televisivos reservados

9
exclusivamente à cinematografia nacional e às sessões furtivas de alta madrugada, na

adolescência. Em ambos os casos, impossível não notar a influência da televisão.

A experiência de ir ao cinema havia cessado com a infância tanto pela falta de hábito de

meus pais para tal atividade quanto pelo meu progressivo desinteresse pelo que costumava

assistir. Nos anos seguintes, colaborou o fato de residir na Ilha do Governador, Zona Norte

do Rio de Janeiro, distante de locais como a Cinelândia, no Centro, e que chegou ao fim

dos anos de 1980 com apenas um cinema de rua, o drive-in Ilha Auto Cine. Existente até

hoje e de programação dedicada aos chamados filmes comerciais, estrangeiros sobretudo.

Em 1993, por ocasião da construção do primeiro shopping na região, duas novas salas

foram inauguradas. Nada muito alentador, pois vieram para oferecer mais do mesmo.

Considerando que no início da década de 1990 apenas dois ou três longas-metragens

nacionais chegavam (com muita dificuldade) ao circuito comercial por ano compõe-se,

finalmente, o quadro desolador.

Ver os filmes de Glauber e Nelson foi a abertura para um universo completamente novo,

pleno de possibilidades. Estava encantado e estupefato pelas angustiantes alegorias de um e

pelo retrato branco-ardente da seca do outro. A exposição aos filmes me abalara, porém

prossegui meu curso.

Alguns anos depois, tive a oportunidade de estagiar em dois longas-metragens nacionais,

Mauá, o Imperador e o Rei, de Sérgio Rezende, e Chatô, o Rei do Brasil, de Guilherme

Fontes. A proximidade com o fazer cinematográfico reacendeu a chama daquela sessão

10
cinemanovista e, após o período envolvido com as produções, passei a cursar as disciplinas

do curso de Cinema, concomitantemente às poucas que me restavam de meu curso original.

Neste momento, as disciplinas ministradas por Tunico Amâncio, Argumento e Roteiro, e

Hernani Heffner, História do Cinema Brasileiro, foram de importância fundamental. Mais

do que o entusiasmo pelo estudo do cinema, delas veio a predileção pelo cinema nacional e

suas questões. Ao mesmo tempo, os filmes brasileiros tornaram-se, paulatinamente, mais

presentes no circuito exibidor, do qual passei a ser assíduo freqüentador, e o advento do

Canal Brasil possibilitou-me o acesso a uma filmografia completamente desconhecida e,

por muitas vezes, ainda não consagrada em livros. O gosto pelo estudo do cinema rendeu

frutos, a revista eletrônica de cinema Cinestesia. Já a cinefilia, a vontade de dividir com

outros o prazer de ver filmes, concretizado no Cineclube Tela Brasilis. Ambas iniciativas

ao lado de amigos do curso de Cinema da UFF.

No entanto, a sensação de algo por fazer permanece.

A opção pelo filme Bete Balanço como tema desta monografia se explica ao recobrar um

pouco da trajetória que contei. Primeiramente, ao debruçar-me sobre o estudo de um filme

de um “gênero” cinematográfico tão pouco valorizado no Brasil, o do filme adolescente (de

demanda fartamente atendida pelo cinema estadunidense), tento virtualmente preencher

uma lacuna: ver imagens de meu país ambientando histórias destinadas aos jovens. Da

mesma forma, no intuito de conhecer e entender o cinema brasileiro realizado na década de

1980, procuro estudar sobre o que não tive a oportunidade de assistir em sua época original.

Assim como tento investigar o cinema brasileiro de eminentes intenções comerciais, pelo

11
qual tenho grande curiosidade, mas é de bibliografia extremamente carente. Por fim, na

mesma linha de raciocínio, ao prospectar a carreira do diretor Lael Rodrigues, tenho a

intenção de dar visibilidade a um realizador ignorado pelos estudos acadêmicos, assim

como tantos outros.

Em suma, a mim interessa o desconhecido.

* * *

Vem Comigo, No Caminho Eu Explico

O estudo sobre Bete Balanço foi muito difícil. A primeira barreira encontrada foi na fonte

de auxílio mais imediata a um pesquisador, a bibliografia cinematográfica. No primeiro

capítulo, traço hipóteses para o desprezo generalizado que parece tomar a Universidade

pelos filmes nacionais realizados nos anos de 1980 bem como por aqueles de intenções

eminentemente comerciais. Bete Balanço – filme de 1984 e feito para o mercado – e seu

diretor Lael Rodrigues – realizador de três longas-metragens “comerciais” na década de

1980 – foram duplamente preteridos pelos estudos acerca do cinema brasileiro, voltados

para uma tradição que a própria Universidade ajudou a consolidar.

Recorrer às fontes primárias – press-books, reportagens, entrevistas, filmes – passou a ser,

então, uma medida que garantiria a própria viabilidade da pesquisa. Porém, encontrei

grande discordância de dados entre elas. Por muitas vezes, despertaram mais dúvidas do

12
que certezas. No segundo capítulo, proponho a comparação entre o que ficou registrado na

bibliografia do cinema brasileiro e o que pude reunir a respeito de Lael Rodrigues, no

intuito apresentar o entendimento da Universidade sobre diretor e filme, e por acreditar que

o resgate da carreira do cineasta venha a contribuir para o estudo mais apurado de seu

primeiro longa-metragem.

No terceiro capítulo está o estudo propriamente dito sobre Bete Balanço. Inicia-se com a

breve descrição do filme. Depois, investigam-se as resoluções de Lael Rodrigues a respeito

das escolhas de tema, linguagem e estética. Primeiro, através de uma ampla visão sobre sua

filmografia bem como sobre o peculiar momento do cinema brasileiro no qual ela se insere,

pretende-se verificar os elementos e condições que possam tê-lo influenciado. Em seguida,

ao se recobrar uma hipotética filmografia adolescente nacional, averigua-se se Lael

Rodrigues poderia ter buscado respaldo no próprio cinema brasileiro para a realização de

um filme como Bete Balanço. Por último, analisam-se alguns filmes que estavam lidando

com a questão do público jovem na virada da década de 1970 para a de 1980, para a

observação do avanço das discussões cinematográficas sobre o tema e destacar de que

forma Bete Balanço pôde contribuir às mesmas.

Por último, nas considerações finais está uma série de ponderações e apontamentos ao invés

de conclusões fechadas. Nos últimos anos, alguns (poucos) estudos de cinema têm se

voltado para a década de 1980. Porém, ainda de forma incipiente e privilegiando o que já é

consagrado pela Universidade, o “cinema de Vila Madalena”. Da mesma forma, ainda não

surgiu uma obra, provavelmente de natureza antropológica, que viesse a dar conta das

transformações pelas quais passou a juventude brasileira do período. Ou seja, o público de

13
Bete Balanço, que correspondeu tão bem ao filme. Assim, as hipóteses que lanço só se

confirmarão realmente com o advento de mais estudos provenientes de diversas áreas.

Fica aqui a esperança de que o atual revival dos anos de 1980 seja mais do que um

modismo, que ele perdure e gere esforços, nos quais este humildemente se inclui, para que

possamos avaliar com clareza uma década e sua produção cinematográfica que (ainda) não

se encontram perdidas.

14
Capítulo 1

Não Ligue Pra Essas Caras Tristes, Fingindo Que a Gente Não
Existe – O Equivocado Desprezo Pelos Cinemas Brasileiros da
Década de 1980 e Comercial

Se a afirmativa de que “a bibliografia sobre cinema brasileiro possui hoje uma dimensão

considerável”1 é motivo para celebração, a especificidade dos temas que lida, não. De

acordo com a área de interesse, a pessoa que se propuser a buscar apoio nesta bibliografia

encontra-se em apuros. Por exemplo, quem se interessar por estudar o cinema brasileiro

realizado na década de 1980 constatará que o período é vítima de grande omissão. Por um

lado, nenhum livro se dedica a abordar o período como um todo, preferiu-se a fragmentação

regional das experiências2. Por outro, a maior parte dos livros que pretendem cobrir a

história do cinema brasileiro e que abrangem este período foram escritos ao longo do

mesmo, não sendo possível obter uma análise distanciada ou que levasse em conta toda sua

produção3. Como auxílio, existem os verbetes acerca de cineastas – nem sempre completos

–4; e ensaios aqui e acolá – uns sofrendo os mesmos problemas já mencionados de

regionalização e/ou de serem produzidos na própria década ou avançando com timidez

1
Ramos, Fernão Pessoa, e Miranda, Luiz Felipe A. de (org.). Enciclopédia do cinema brasileiro. São Paulo,
Editora SENAC São Paulo, 2000, verbete LIVROS, p. 334.
2
Becker, Tuio. Cinema gaúcho: uma breve história. Porto Alegre, Editora Movimento, 1996; e Becker, Tuio
(org.). Cinema no Rio Grande do Sul – Caderno ponto & vírgula, 8. Porto Alegre, UE/Porto Alegre, 1995
dedicam-se somente ao cinema gaúcho. Já Ab’Sáber, Tales A. M. A imagem fria: cinema e crise do sujeito no
Brasil dos anos 80. São Paulo, Ateliê Editorial, 2003 trata exclusivamente do cinema paulista.
3
Paiva, Salvyano Cavalcanti de. História ilustrada dos filmes brasileiros (1929-1988). Rio de Janeiro,
Francisco Alves, 1988; Paranaguá, Paulo Antonio. Le cinéma bresilien. Paris, Editions du Centre Pompidou,
1987; Ramos, Fernão Pessoa (org.). História do cinema brasileiro. São Paulo, Art Editora, 1987.
4
Bandeira, Roberto. Pequeno dicionário crítico do cinema brasileiro. Porto Alegre, Edições Caravela, 1990;
Miranda, Luiz Felipe A. de. Dicionário de cineastas brasileiros. São Paulo, Art Editora, 1990; Tulard, Jean.
Dicionário de cinema: V.1 Os diretores. Porto Alegre, L&PM, 1996; Ramos, Fernão Pessoa, e Miranda, Luiz
Felipe A. de (orgs.). Enciclopédia do cinema brasileiro. São Paulo, Editora SENAC São Paulo, 2000.

15
sobre o assunto5. Enfim, nenhuma obra que analise o cinema brasileiro da década de 1980

(e até mesmo por isso) ou que avalie com amplitude as mudanças ocorridas no cenário

cinematográfico nacional na virada dos anos de 1970 para os de 1980.

Não bastasse isso, aquele que se envolver na investigação do cinema brasileiro comercial

também irá encontrar problemas. Há obras dedicadas aos períodos do surto industrial

paulista e da chanchada6. Porém, o cinema comercial realizado após estes “ciclos”, ou seja,

Cinema Novo em diante, não foi digno de nota. De forma geral, é possível verificar, sobre

os títulos (recorrentemente) citados nos estudos sobre o cinema brasileiro, uma seleção

academicista – por assim dizer, de “alta cultura”, ou seja, que se debruça apenas sobre o

“melhor que já se pensou e disse” em uma sociedade7 –, privilegiando-se a “tradição

cinematográfica brasileira moderna”8, na figura do Cinema Novo e do Cinema Marginal.

Ismail Xavier e Jean-Claude Bernardet, dois dos mais renomados estudiosos de cinema do

país e responsáveis por obras de destaque sobre o assunto, escreveram textos que

esclareciam ser este o “método de seleção” dos filmes para suas análises e teses9.

Professores da Universidade de São Paulo (USP), sintomaticamente revelam e reforçam a

predileção da Academia.

5
Parente, André. Ensaios sobre o cinema do simulacro: cinema existencial, cinema estrutural e cinema
brasileiro contemporâneo. Rio de Janeiro, Pazulin, 1998; Xavier, Ismail. O cinema moderno brasileiro. São
Paulo, Paz e Terra, 2001; e, Xavier, Ismail; Pereira, Miguel; e Bernardet, Jean-Claude. O desafio do cinema.
Rio de Janeiro, Jorge Zahar Editor, 1985.
6
Galvão, Maria Rita. Burguesia e cinema: o caso Vera Cruz. Civilização Brasileira/Embrafilme, 1981;
Catani, Afrânio e Souza, José Inácio de Melo. A chanchada no cinema brasileiro. Brasiliense, 1983; Augusto,
Sérgio. Este mundo é um pandeiro: a chanchada de Getúlio a JK. São Paulo, Companhia das Letras /
Cinemateca Brasileira, 1989.
7
Hall, Stuart. The work of representation. In: Representation: Cultural Representation and Signifying
Practices. London, Sage Publications, 1997.
8
Xavier, Ismail. O cinema moderno brasileiro. In: O cinema moderno brasileiro. São Paulo, Paz e Terra,
2001.

16
A presente pesquisa, acerca do filme Bete Balanço, sofreu com ambas dificuldades

apontadas: este foi lançado no ano de 1984 – 30 de julho de 198410 – e realizado com

objetivos claros de sucesso financeiro, segundo Lael Rodrigues, seu diretor:

Sob o aspecto da produção, a realização de Bete Balanço se deve à evolução de uma postura
assumida pela CPC (Centro de Produção e Comunicação) de equacionamento do custo do filme
à realidade do mercado, sem prejuízo da qualidade do produto final. Eu acho que a sobrevivência
do cinema num momento de crise como atual está intimamente ligado à esta questão. Não basta ser
sucesso de crítica e até de público, se o retorno do movimento de bilheteria não absorve os
custos de produção do filme. É preciso ampliar e baratear a produção para garantir a
continuidade das realizações.

Eu falo em conquista de mercado porque acho possível manter a integridade ideológica das
realizações e produzir os filmes que o público quer ver. É uma questão de habilidade do realizador e
não de oportunismo cultural, como consideram alguns ortodoxos. Não tenho a pretensão de continuar
fazendo filmes para a juventude, mas a postura que norteou a realização e Bete Balanço, esse
casamento da criação/produção com o mercado, certamente vai me acompanhar no meu segundo
11
longa metragem.

Três das últimas produções do CPC – Rio Babilônia, Bar Esperança e Parahyba – estão na lista de
maiores rendas da Embrafilme (1º os Trapalhões, 2 º : Parahyba; 3º : Babilônia, 4º : Inocência, de
Walter Lima Jr., produção de L. C. Barreto, 5 º : Bar Esperança). Mesmo assim, ainda não
recuperamos nossos investimentos, pois o produtor é o último a ser ressarcido. Frente a esta
12
situação, resolvemos investir num filme barato, de retorno mais rápido.

Desta forma, o filme estaria inserido nos contextos de indústria cultural, de meios de

comunicação de massa e de cultura de massa. A indústria cultural é aquela capaz de

reproduzir bens culturais – como resultado de uma economia de mercado, baseada na

reprodutibilidade técnica do artefato e na possibilidade de um consumo em escala dos

produtos – destinados ao gosto estético e ao lazer. Um destes bens são os filmes. Para a

continuidade de sua produção, eles precisam ser rentáveis, e por isso devem ter

9
Xavier, Ismail. Do golpe militar à abertura: a resposta do cinema de autor. In: O cinema moderno brasileiro.
São Paulo, Paz e Terra, 2001; Bernardet, Jean-Claude. Por uma crítica ficcional. Folha de São Paulo. São
Paulo, ?? set 1983.
10
Hoineff, Nélson. O sonho não acabou. O Dia. Rio de Janeiro, 30 jul 1984.
11
Press-book do filme Bete Balanço. Pasta do filme. Arquivo do Museu de Arte Moderna (MAM), Rio de
Janeiro.

17
características de meios de comunicação de massa. Isto é, necessitam de alto consumo,

conquistar amplo público. Para o cumprimento destes objetivos, fazem uso de linguagens

abrangentes, formas simplificadas e massificadas, e de uma visão de mundo que seja

representativa da maioria das pessoas. Assim, a cultura social como mercadoria configura-

se em cultura de massa.13

No entanto, consolida-se no próprio meio acadêmico o estudo da cultura de mídia (a cultura

de massa via meio de comunicação de massa) na construção da opinião pública. Esta

cultura teria cada vez mais presença em nossas vidas como instrumentos de socialização e

formação de identidade – até mesmo substituindo instituições tradicionais como família e

escola – sendo absorvida pela ampla maioria da população.14

Xavier, ele mesmo, reconhece a importância de se produzir e estudar o cinema

eminentemente comercial, no entanto, condicionado a uma perspectiva autoral.

Não descarto a relevância cultural de gêneros estáveis no comércio (...). É legítimo desejá-los,
discuti-los; ver neles dados que refletem características próprias à sociedade brasileira, tradições
locais ou uma dinâmica do presente. (...) Privilegio o cinema de autor que assume uma relação mais
tensa com as fórmulas muito codificadas ou apelativas. Desde o Cinema Novo, a produção de maior
valor tem (...) a figura do diretor a definir as diretrizes do trabalho e a imprimir um estilo na imagem
e som (...). Uma boa perspectiva autoral se fez valer não só na produção alternativa, mas também no
que há de interesse no chamado cinemão, com alto financiamento estatal, e na esfera do Cinema da
15
Boca.

Nestes termos, esta pesquisa se afasta do ensaísta. Em primeiro lugar, por julgar que todo

filme, independentemente de quaisquer condicionantes, é alvo de interesse por ser um fato

12
Caetano, Maria do Rosário. Censura implica com Bete Balanço. Correio Braziliense. Brasília, 07 jun 1984.
13
Coelho, Teixeira. O que é indústria cultural. São Paulo, Editora Brasiliense, 1980.
14
Kellner, Douglas. Lendo imagens criticamente: em direção a uma pedagogia pós-moderna. In: Alienígenas
na sala de aula: uma introdução aos Estudos Culturais em Educação. Petrópolis, Vozes, 1995.
15
Xavier, Ismail. Do golpe militar à abertura: a resposta do cinema de autor. In: O cinema moderno
brasileiro. São Paulo, Paz e Terra, 2001, pp. 61 e 62.

18
de cultura strictu senso. Segundo, por entender que quanto mais o cinema comercial se

valer de “fórmulas muito codificadas ou apelativas” ou de outros meios para atrair

audiência e, principalmente, se isto corresponder de fato a uma grande aceitação de público,

maior deve ser o debate sobre ele, pois a ideologia da coletividade está, em princípio,

expressa ali. Por último, aqui, afirma-se que todo filme possui um autor e admite-se que o

único critério que diferencia os filmes são os estéticos, resultado de posturas mais críticas

ou não dos autores. Desta forma, pretende-se, sem ambições de se esgotar o assunto,

estudar o caso do filme Bete Balanço justamente através dos termos que o excluem da

filmografia brasileira tradicional: o rompimento absoluto com a tradição cinematográfica

moderna nacional – os projetos atomizados ao invés dos totalizantes, a questão do

indivíduo e não mais a do grupo, a inserção social através do sistema e não da revolução.

Identificado os parâmetros da Academia, pode-se retornar de forma menos ingênua à

questão de sua omissão nos estudos dos filmes da década de 1980. Mais uma vez

recorrendo a Xavier, ele identifica o ano de 1984 como sendo o “ponto limite simbólico” de

hegemonia e vitalidade da realização de filmes filiados à tradição cinematográfica brasileira

moderna com a realização de Memórias do cárcere (Dir.: Nelson Pereira dos Santos) e

Cabra marcado para morrer (Dir.: Eduardo Coutinho)16. Em uma provocativa “oposição

tipo positivo/negativo” dos anos de 1964 e 1984 confronta a vitalidade de propostas do

primeiro e a rarefação das mesmas no outro17 e observa que “o cinema que se adensou em

meados dos anos 80, que se destacou em festivais e debates, afirmou propostas alheias aos

16
Idem. O cinema brasileiro moderno. In: O cinema moderno brasileiro. São Paulo, Paz e Terra, 2001, pp. 36
e 37.
17
Idem. Do golpe militar à abertura: a resposta do cinema de autor. In: O cinema moderno brasileiro. São
Paulo, Paz e Terra, 2001, pp. 51-53.

19
parâmetros do cinema moderno”18. Assim sendo, com a gradativa predominância de obras

na década de 1980 que não mais corresponderiam aos seus anseios, Xavier, como um

sintoma da Academia, virou às costas para década.

O Cinema Novo iniciou suas atividades pretendendo conscientizar o povo (Deus e o diabo

na terra do sol, dir.: Glauber Rocha, 1964); com o golpe de 1964, no intuito de dar

continuidade a seu projeto, viu-se obrigado a se relacionar com o mesmo povo, mas

entendido como público (Macunaíma, dir.: Joaquim Pedro de Andrade, 1969); já sem

propostas, arregimentou nova possibilidade de contato através da noção de popular (O

amuleto de Ogum, dir.: Nelson Pereira dos Santos, 1974); mas chegou a década de 1980

engolido por novos contextos estéticos, políticos, mercadológicos e culturais, tentando

atrair alguma atenção para si através de elementos e estratégias que garantiriam seu

consumo (Eu te amo, dir.: Arnaldo Jabor, 1981)19.

Até um tempo recente a presença do Cinema Novo foi um fator de inibição da criatividade da
geração mais nova. Talvez somente agora, e porque está surgindo no Brasil uma nova geração de
cineastas – lembremos dois deles, o André Klotzel e o Chico de Paula, lembremos também, entre
outros, os do Rio Grande do Sul, como o Giba Assis Brasil. Uma nova geração, cineastas que não
são tributários do Cinema Novo. Eles não têm nenhum problema, nenhuma resposta, nenhum
confronto, nenhum conflito, nenhum diálogo com o Cinema Novo. Um dia o Klotzel me disse:
“Você me desculpe, mas vocês para nós são avôs, e com avô a gente não briga. A gente briga é com
pai”. Entre eles e nós surgiram outras coisas com as quais eles dialogam – o cinema marginal, o
chamado udigrudi, o cinema comercial do final dos anos 1970, a pornochanchada, o cinema
americano, o cinema da televisão, a própria televisão. Hoje, o Cinema Novo inibe menos que em
1978. Houve uma época muito difícil, no início da abertura política, quando surgiram novamente

18
Idem. O cinema brasileiro moderno. In: O cinema moderno brasileiro. São Paulo, Paz e Terra, 2001, p. 40.
19
Jamenson, Fredric. Reificação e utopia na cultura de massa. In: Marcas do visível. Rio de Janeiro, Graal,
1995.
Segundo o autor, a inviabilidade de uma arte política no mundo a partir dos anos de 1980 é conseqüência do
avanço capitalista: “a criação cultural autêntica depende, para sua existência, da vida coletiva autêntica, da
vitalidade do grupo social “orgânico”, qualquer que seja sua forma (...). O capitalismo sistematicamente
dissolve o tecido de todo grupo social coeso, sem exceção, inclusive a sua própria classe dominante e, desse
modo, problematiza a produção estética e a invenção lingüística cuja fonte está na vida grupal.”
Portanto, o processo de modernização pelo qual passou o país na década anterior foi um dos fatores
determinante para o esvaziamento das propostas do Cinema Novo.

20
filmes mais caros. Havia sempre a comparação com o Cinema Novo, e com a comparação uma
20
automática inibição.

Bete Balanço, portanto, seria o passo seguinte na derrocada do Cinema Novo. Atualizado

com seu momento, o filme não apenas trabalha a si como objeto de consumo, mas sim em

uma nova visão de mercado, onde o espectador (jovem) é consumidor e a ele é oferecido

um produto segmentado (com os valores da juventude), sem os receios das gerações

anteriores21. Para isso, vale-se de vários elementos da indústria cultural da época no Brasil

– a linguagem do videoclipe e da publicidade de uma TV hipertrofiada, a ascensão do rock

nacional na música –; sintoniza-se a um certo tipo de cinema americano de mercado

voltado para a juventude que retrata o advento da cultura yuppie22 – individualista e de

realização pessoal através do dinheiro – em um período de aguda crise do projeto de

modernização nacional; e afina-se a manifestações artísticas nacionais no teatro e nas artes

plásticas que não se referiam ao período da ditadura.

20
Viany, Alex; organização: José Carlos Avellar. 1986 – Carlos Diegues. O processo do cinema novo. Rio de
janeiro, Aeroplano, 1999, p. 466.
21
http://www.google.com.br/search?q=cache:zEw1mjHgT88J:www.unb.br/ics/dan/Serie121empdf.pdf+cultur
a+yuppie&hl=pt-BR&lr=lang_pt&ie=UTF-8
Vianna, Letícia C.R. A idade mídia: uma reflexão sobre o mito da juventude na cultura de massa. Série
Antropologia 121. Brasília, 1992.
“Podemos observar que as diferenças pessoais e culturais sobrevivem apesar da internacionalização do capital
e do racionalismo técnico-científico. E as sociedades industriais de massa podem ser percebidas enquanto
totalidades hiper-diferenciadas em classes, ethos e pessoas; onde cada uma é motivada pelos específicos
fatores de seus contextos a construir um sentido para suas existências particulares, através de condutas
orientadas por padrões normativos (éticos) e lúdicos (estéticos) criados e estabelecidos coletivamente.”
22
Idem. “Os yupiies são jovens, urbanos, e profissionais (yup = young urban profissional). São jovens, porque
saudáveis, urbanos porque vivem nas grandes cidades onde exercem cargos importantes, e profissionais por
que ativos e competentes. O movimento reúne os melhores da década de 60 e seus herdeiros... Não combato
mais o Estado, não vale mais a pena, este deixou de ser o combate adequado. Atualmente é preciso que eu
seja o Estado. Não eu pessoalmente, é óbvio. Nós todos... O que você acha que os operários e os pobres
desejam? Ser bem sucedidos. Eles almejam o sucesso, não a revolução. Eles nem sequer pensam na
revolução. O que eles mais desejam é dar certo na vida, assim como os demais. O que temos que fazer é
inventar uma filosofia do sucesso capaz de integrar democracia e idealismo... (...)” (Jerry Rubin in Cohn-
Bendit, 1987:36 e 38).

21
O cinema brasileiro, no entanto, não estava preparado para Bete Balanço. De um lado,

como observa Xavier23, os cineastas cinemanovistas acenavam a despedida de seus projetos

com filmes ainda em diálogo com a tradição cinematográfica brasileira moderna e os anos

de ditadura, como em Memórias do cárcere e Cabra marcado para morrer; e os da nova

geração, que estreavam no longa-metragem em filmes como O sonho não acabou (Dir.:

Sérgio Rezende, 1982), Nunca fomos tão felizes (Dir.: Murilo Salles, 1983), Verdes anos

(Dir.: Carlos Gerbase e Giba Assis Brasil, 1984), ainda sentiam-se obrigados a lidar de

alguma forma com os mesmos estética e tema, apesar do debate já tendo se esvaziado,

como será demonstrado na pesquisa. De outro, a crítica tinha ficado cinemanovista24 e, por

muitas vezes, não soube como interpretar o filme.

Bete Balanço recebeu tanto críticas favoráveis quanto negativas, sem um peso maior para

um dos lados. Na realidade, maior é o número de reportagens que simplesmente limitam-se

a acompanhar a carreira de um filme de características vistas como inusitadas na

filmografia nacional – o que não deixa de ser verdade –, e que acabou se configurando em

um caso ainda mais peculiar por se tratar de uma estréia em longa-metragem de imenso

sucesso.

A abordagem cinemanovista sobre Bete Balanço mostrou-se tanto de uma ineficiência

anacrônica quanto deu margem a más-interpretações. O filme, como se demonstrará, nada

23
Xavier, Ismail. O cinema brasileiro moderno. In: O cinema moderno brasileiro. São Paulo, Paz e Terra,
2001, pp. 36 e 37.
24
Ramos, Fernão. Os novos rumos do cinema brasileiro (1955-1970). In: História do cinema brasileiro. São
Paulo, Art Editora, 1987, p. 308.
Em analogia a defesa que Nelson Pereira dos Santos faz de seu filme Rio, Zona Norte (1957) em Manifesto
por um cinema popular. Nele, o cineasta atribui os comentários negativos acerca do filme ao fato de que

22
tem a ver com as concepções do Cinema Novo nem com a tradição de um cinema moderno,

por isso, não podendo ser analisado por este ponto de vista. As críticas à sub-trama do

linchamento do menor de rua talvez tenham sido as mais equivocadas, por terem atribuído

ao filme pretensões de engajamento social que ele não tem.

Maria do Rosário Caetano, com certeza, foi quem mais se indispôs diretamente com o

filme. Em suas críticas, assim como em algumas outras, encontra-se profundo eco de idéias

do Cinema Novo. Podemos associá-las, sobretudo, aos pensamentos de Glauber Rocha,

principal interlocutor do movimento, registrados em textos como Revisão crítica do cinema

brasileiro (autor revolucionário)25, Torres Miguel (contra o cinema estritamente comercial),

Vidas secas (o autor e seu olhar individual sobre o mundo), Eztetyka da fome (pesquisa de

linguagem), O transe da América Latina (a necessidade do engajamento político)26, e A

passagem das mitologias (a relação entre cineasta e público)27.

O Cinema Novo criou no Brasil o que chamamos de “cinema de autor”. Para muitos, Bete Balanço é
um filme (se não de produtor) de produtora. Lael não se incomoda com esta conceituação, pois acha
que “é preciso ocupar o mercado brasileiro, mesmo que não sejam experimentos ou signifiquem
propostas renovadoras”. Neste sentido, ele difere, profundamente, de outro estreante: Murilo Salles,
33 anos, realizador de Nunca Fomos Tão Felizes. Formado em ambiente cinematográfico,
convivendo diariamente com Luiz Carlos Barreto, Arnaldo Jabor, Rui Guerra e outros
cinemanovistas, Murilo faz questão de ser o fio continuador do Cinema Novo. Nunca Fomos Tão
Felizes é uma produção de L. C. Barreto, que traz todas as marcas autorais de Murilo Salles.
Fotógrafo consagrado (Eu Te Amo, Cabaré Mineiro e Tabu), Salles faz questão de ser respeitado e
discutido, principalmente, como diretor cinematográfico. Esta já não é a preocupação de Lael
Rodrigues: “quero fazer cinema, seja como produtor, montador, co-diretor, roteirista ou diretor.
Considero como meus todos os filmes que contaram com minha participação, desde o surgimento da
idéia. Gaijin, Parahyba, J. S. Brown e Bar Esperança são como se fossem meus filmes. Neles, não
coordenei a equipe mas participei ativamente do processo de realização. É claro que, em Bete
Balanço, fui coordenador e tive a palavra final. Mas confesso que não tenho veleidades autorais
28
muito acentuadas”.

“naquela época a crítica ficou neo-realista” enquanto, na realidade, Rio, Zona Norte “é um filme muito mais
psicológico”.
25
Rocha, Glauber. Revisão crítica do cinema brasileiro. Rio de Janeiro, Editora Civilização Brasileira, 1963,
p. 14.
26
Idem. Revolução do cinema novo. Rio de Janeiro, Alhambra/Embrafilme, 1981, pp. 21, 24, 28 e 138.
27
Idem. O século do cinema. Rio de Janeiro, Editorial Alhambra, 1983, p. 254.
28
Caetano, Maria do Rosário. Censura implica com Bete Balanço. Correio Braziliense. Brasília, 07 jun 1984.

23
Ao contrário de seus companheiros de geração – Murilo Salles, José Antônio e Ícaro Martins, Ivan
Cardoso, etc – Lael parece prestar mais atenção no mercado que no processo de renovação
29
cinematográfica.

O resultado balança entre o comercialismo fácil e um “engajamento” um tanto forçado. (...) Como
perfil do comportamento da juventude atual é, no mínimo, discutível. (...) Está bem longe de revelar
uma marca pessoal como a que Sérgio Rezende imprimiu a O Sonho Não Acabou (a mais
interessante tentativa de cinema brasileiro em se aproximar do público jovem, sem deixar de levar
em conta as imposições mercadológicas). (...) Podia representar uma significativa brecha, mas se
deixou guiar pelas facilidades da fórmula do “entretenimento leve”. O pique de um clip e a eficiência
30
de um anúncio de jeans. Parece até que foi concebido pela Artplan.

Nenhuma marca de um país terceiro-mundista, reprimido. (...) O personagem de Lauro Corona (...) é
um alienadão, que curte seu estúdio de fotografia hiperequipado e descobre modelos de beleza-
padrão. Um dia, assiste a um assassinato brutal e resolve levar o caso adiante. A seqüência passa
como um mea-culpa do diretor Lael Rodrigues: “preciso colocar algum dado social no meu filme,
senão ele fica igualzinho ao Menino do Rio e à Garota Dourada”. (...) Povo? Há povo no Brasil? Há,
há sim! Vocês não viram o povo fazendo pano-de-fundo para os balés/merchandisings de Bete, a que
31
balança?

Não se trata, pois, da história de uma garota mineira que tenta fazer sucesso no Rio como roqueira.
Qualquer intromissão da realidade (o elemento social representado pelo linchamento de um pivete
32
nas ruas) resulta estereotipado – e apenas um signo a mais na coleção.

Lael Rodrigues, antes mesmo de seu filme ser lançado, obviamente (?), já esperava este

tipo de crítica e, em algumas poucas declarações, tentou amenizar a recepção negativa.

Aqui e acolá o diretor tratou, sem muita convicção e elaboração, das mesmas questões

apontadas nos textos de Rocha e cobradas por Caetano. Na realidade, acredito que devemos

interpretar estas falas como formas de “abrandar e contentar os espíritos” ainda fiéis ao

Cinema Novo.

Eu falo em conquista de mercado porque acho possível manter a integridade ideológica das
realizações e produzir os filmes que o público quer ver. É uma questão de habilidade do realizador e
33
não de oportunismo cultural, como consideram alguns ortodoxos.

Lael conclui: “Em termos comerciais, ele é bem objetivo. Mas fiz o filme que eu queria fazer, sem
tirar nada do lado autoral, com total liberdade de linguagem e de conteúdo.”

29
Idem. Bete Balanço, a geração do rock num imenso vídeo-clip. Correio Braziliense. Brasília, 20 set 1984.
30
Bazi, Sérgio. Bete Balanço, um conto de fadas em ritmo de FM. Correio Braziliense. Brasília, 20 set 1984.
31
Caetano, Maria do Rosário. Bete Balanço, gatinha da Escandinávia. Correio Braziliense. Brasília, 26 set
1984.
32
Pereira, José Haroldo. Cinema – No embalo da TV. Sem fonte. Sem local. Sem data. Press-book do filme
Bete Balanço. Pasta do filme. Arquivo do Museu de Arte Moderna (MAM), Rio de Janeiro.
33
Press-book do filme Bete Balanço. Pasta do filme. Arquivo do Museu de Arte Moderna (MAM), Rio de
Janeiro.

24
(...) Tizuka Yamasaki (...): “Se é que o filme tem alguma pretensão, é exatamente de mostrar a
generosidade inerente a essa juventude que esta aí. A nossa geração (Tizuka tem 35 anos) ficou
muito amarga, pelas próprias condições políticas do país, tivemos poucas opções para escolher. Já
essa nova geração pôde desenvolver uma faculdade maior de se dar. E, no fundo, essa forma de vida
é muito subversiva. Ser natural, não ter preconceitos, é uma coisa muito agressiva para a sociedade
34
em que a gente vive hoje. Vimos isso muito bem agora com a censura [imposta ao filme].”

A principal questão que Lael não quis deixar explícita foi a do sucesso de Bete, apenas sugerido, ele
acha que “vitória a nível de sucesso é uma vitória do sistema”.
(...) Lael: “Tive uma entrevista com a Solange Hernandez (...) Ela disse que não podia resolver o
problema do meu filme, que era questão ideológica. (...) e ela apontou problemas: disse que era grave
ela transar com outro cara, posar nua e aceitar o dinheiro pela publicação numa revista, moralmente
terrível isso. Além do mais achou um escândalo uma menina de 17 anos fugir de casa e deixar um
35
reles bilhete. A atitude mais livre e mais natural é subversiva.”

Aos que o criticam, por considerar a trama fraca, Lael rebate: “É porque não trato diretamente da
36
fome e da miséria, mas de problemas sociais a nível do indivíduo.”

Estou surpreso com a boa acolhida da crítica e só posso atribuí-la a uma nova visão. Talvez se tenha
percebido que a postura conservadora da esquerda brasileira, que não perdoava um filme que não
37
fosse político, era tão ou mais elitista que a postura das classes dominantes.

A importância de Bete Balanço, nos termos da (des)continuidade da tradição moderna, não

está em recusá-la ou negá-la, mas sim em ausentá-la de seu corpo. Ela, assumidamente, não

lhe diz respeito. Naquele momento, em que o “cinema de Vida Madalena” encarava com

uma néon noturna melancolia a mercantilização do cinema e a hegemonia do espaço urbano

e o cinema gaúcho celebrava o próprio umbigo em sentimentos ambíguos por estar “longe

demais das capitais”38, Bete Balanço afirma-se como marco diametralmente oposto a

Memórias do cárcere e Cabra marcado para morrer, abraçando e sendo abraçado pela

indústria cultural em uma atualidade jovem urbana oitentista – em contraposição ao

34
Salem, Helena. Bete Balanço, o sonho e a briga da moça mineira que quer ser cantora de rock no Rio. O
Globo. Rio de Janeiro, 25 jun 1984.
35
França, Jamari. Rock em filme jovem – “Bete Balanço” traz a realidade sem ócio para o cinema. Revista de
Domingo, Ano 9, Nº 428, In: Jornal do Brasil. Rio de Janeiro, 15 jul 84.
36
Bisordi, Gisela. “Bete Balanço” chega a São Paulo pelo Anhembi. Folha de São Paulo. São Paulo, 30 ago
1984.
37
Sem autor. ‘Bete Balanço’, falando a linguagem dos jovens. Estado de São Paulo. São Paulo, 06 set 1984.
38
http://www2.uol.com.br/engenheirosdohawaii/index2.html
Título do álbum de estréia e de canção da banda gaúcha Engenheiros do Hawaii, de 1986. “Suave é cidade /
Pra quem gosta da cidade / Pra quem tem necessidade de se esconder / Nossa cidade é tão pequena / E tão
ingênua / Estamos longe demais / Das capitais” (H. Gessinger)

25
setentismo praieiro de Menino do Rio (Dir.: Antonio Calmon, 1981) – de fim das utopias

em um país em profunda crise econômica.

Muitos dos pontos enunciados aqui, que caracterizam o filme, necessitam ser mais bem

trabalhados e a presente pesquisa, sem visar à exaustão dos temas, tenta dar conta deles.

Fica, portanto, a vontade, dentre outras coisas, de se corrigir o equivocado desprezo pelos

cinemas brasileiros da década de 1980 e comercial.

26
Capítulo 2

Bete Balanço, de Lael Rodrigues. Lael, Quem?

Pessoas de minha geração, que à época do lançamento de Bete Balanço (1984) nos cinemas

tinham por volta de sete anos de idade, como eu, não o viram nesta ocasião. Muitos, porém,

reconhecem seu nome e logo associam-no ao rock brasileiro do período – em especial à

música-título, um dos maiores sucessos do grupo Barão Vermelho – e à atriz Débora Bloch.

Poucos, no entanto, são aqueles que o viram com o passar dos anos, mesmo após a

“democratização” do acesso ao cinema nacional através da televisão com o surgimento do

Canal Brasil. Raríssimos são os que viram e lembram de fato do filme, recordam-se apenas

de linhas gerais. Desta forma, não seria surpreendente afirmar que Lael Rodrigues, seu

diretor, é, sem medo de generalizações, completamente desconhecido. Não somente do

público em geral, mas também de um supostamente “especializado” ou “estudioso”, como

o dos alunos que cursam Cinema na Universidade Federal Fluminense (UFF), pessoas com

quem tenho tido estreito contato no decorrer da vida acadêmica. Não bastasse isso, a parca

bibliografia sobre o cinema nacional reforça o ostracismo de diretor e filme. Com uma

ínfima parte dedicada ao estudo dos filmes da década de 1980 (mas curiosamente já se

debruçando com entusiasmo sobre os da década seguinte, da chamada “retomada”), os

livros sobre cinema brasileiro, quando não se esqueceram de citar Lael, dedicaram a ele e

ao seu filme mais conhecido pequenas notas aqui e acolá.

27
Por acreditar que o resgate da carreira do cineasta vem a ser o primeiro passo a contribuir

para o estudo mais apurado de seu primeiro longa-metragem proponho o resgate de sua

trajetória.

A História Que Ficou

Primeiro, dedico-me aqui a citar autores, assinalar exemplificações e transcrever passagens

de livros onde Lael Rodrigues e Bete Balanço tenham figurado no intuito de averiguar qual

história (“o que” e “como”) nos é contada. Friso que não foi estabelecido critério algum

para este levantamento, a não ser, simplesmente, o da procura pelo nome do diretor e de seu

primeiro longa-metragem. Entre obras compreendidas como essenciais ao estudo do cinema

brasileiro e outras não tão celebradas pude reunir apenas nove livros de diferentes autores

que satisfizeram, de alguma forma, as prerrogativas enunciadas. Tal fato não ocorreu por

economia de pesquisa ou pudores em enfileirar autores e respectivos comentários, mas

simplesmente pela pequena quantidade de livros que cobrem o cinema brasileiro realizado

nos anos de 1980 e o desprezo generalizado pela obra do diretor. Acrescenta-se um

agravante: o desestímulo crônico pelo estudo do cinema dito comercial, do qual Bete

Balanço é partidário.

É necessário atenção para diferenças e discordâncias de diversas naturezas que ocorrem

tanto entre as obras publicadas quanto entre elas e a presente pesquisa. No primeiro caso, a

comparação pode ser feita neste sub-capítulo; no segundo, faz-se necessária a leitura deste e

do sub-capítulo seguinte, onde pretendo reconstituir a carreira e vida pessoal de Lael

28
Rodrigues através da utilização de outras fontes – um sem número de reportagens e

entrevistas em periódicos, todos os filmes e seus respectivos press-books dos quais

participou que pude ter acesso, seus próprios filmes e alguns sites da Internet.

* * *

Inicialmente, vamos nos deter sobre as passagens que se referem diretamente a Lael

Rodrigues. Em 1987, ele é citado por Paranaguá como sendo um dos realizadores a ter

assinado a direção de pelo menos um longa-metragem ao longo desta década39.

A freqüência de seu nome em livros deve-se, sobretudo, aos dicionários de cineastas. Está

presente em dois de 1990, em Bandeira:

RODRIGUES, LAEL – autor de curtas-metragens, do média-metragem “Boi Pintadinho” e dos


40
longas: “Bete balanço”, “Rock estrelas” e “Rádio pirata”.

De forma menos econômica, em Miranda:

Rodrigues, Lael (Lael Alves Rodrigues) – São Paulo, SP, 1951-1989. Criado no sul de Minas,
estudou arquitetura na UnB e cinema na UFF, no começo dos anos 70. Dirigiu, na bitola 16mm, os
curtas Bon odori (co-direção Tizuka Yamasaki) e Boi Pintadinho (1977) e, em 35mm, Sufoco (1975),
A fiel (1978), Linhas cruzadas (1978) e Eu prefiro a liberdade (1985). Em 1977, constitui, com José
Frazão, Tizuka Yamasaki e Carlos Alberto Diniz, a produtora CPC (Centro de Produção e
Comunicação). Produtor-executivo de J.S. Brown, o último herói (José Frazão), Gaijin, caminhos da
liberdade (Tizuka Yamasaki) e Rio Babilônia (Neville d’Almeida). Assistente de direção em As
aventuras amorosas de um padeiro (Waldyr Onofre), Crueldade mortal (Luiz Paulino dos Santos) e
Marcados para viver (Maria do Rosário). Montador de Se segura, malandro e Bar Esperança (Hugo
Carvana), Gaijin e Parahyba mulher-macho (Tizuka Yamasaki) e de seus filmes. Em 1986, formou
com José Frazão a Yan Produtores Artísticos, onde produziu o filme de Frazão O mistério no colégio
Brasil. Diretor-roteirista de musicais, inaugurando nova onda de filmes para a juventude.
(Cinemateca Brasileira – São Paulo / Depoimento ao autor)
41
1984 – Bete Balanço, 1985 – Rock Estrela (CPC), 1987 – Rádio Pirata (Yan PA).

39
Paranaguá, Paulo Antonio. Ruptures et continuité: les annés soixante-dix – quatre-vingt. In: Le cinéma
bresilien. Paris, Editions du Centre Pompidou, 1987, p. 130.
40
Bandeira, Roberto. Pequeno dicionário crítico do cinema brasileiro. Porto Alegre, Edições Caravela, 1990,
p. 157.
41
Miranda, Luiz Felipe A. de. Dicionário de cineastas brasileiros. São Paulo, Art Editora, 1990, p.282.

29
Tulard, anos mais tarde, dedica algumas linhas a Lael:

Rodrigues, Lael
Montador e diretor brasileiro, 1951-1989.
Bete Balanço (1984); Rock Estrela (1985); Rádio Pirata (1987).
Montador dos filmes de Hugo Carvana e Tizuka Yamasaki, Lael como realizador buscou o cinema
42
de comunicação jovem, com algum sucesso.

Dez anos depois da publicação de seu dicionário, Miranda junta esforços a Fernão Ramos

para organizarem o que talvez seja a maior empreitada jamais feita sobre o cinema

nacional, a Enciclopédia do cinema brasileiro43, mas não dedicam um verbete exclusivo a

Lael Rodrigues dentre os 706 existentes. No entanto, ele é citado em doze deles, distribuído

entre aqueles com quem trabalhou, alguns mais centrados em sua carreira (a minoria) e

outros sobre seus filmes, mormente Bete Balanço, o de maior repercussão.

ANOS 80:

Outra linha que se desenvolveu com sucesso de público foi aquela voltada para jovens, representada
por Menino do Rio e Garota dourada, ambos dirigidos por Antônio Calmon respectivamente em
44
1981 e 1983, e Bete Balanço, longa dirigido por Lael Rodrigues em 1984.

BLOCH, Débora:

No cinema, ganhou projeção nacional com a personagem-título de Bete Balanço, de Lael Rodrigues,
45
participando inclusive na trilha musical.

CANTORES-ATORES:

42
Tulard, Jean. Dicionário de cinema: V.1 Os diretores. Porto Alegre, L&PM, 1996, p. 540.
43
Ramos, Fernão Pessoa, e Miranda, Luiz Felipe A. de (org.). Enciclopédia do cinema brasileiro. São Paulo,
Editora SENAC São Paulo, 2000.
Ambos assinam a Apresentação, onde assumem os “erros e acertos” pela “seleção dos temas e personalidades
verbetizados”. Nela, esclarecem que “as personalidades foram selecionadas buscando-se uma mistura de
critérios quantitativos e qualitativos”, além de procurar “trabalhar dentro de uma chave que chamamos de
“bom senso”, evitando as idiossincrasias”. Os organizadores ressaltam que o “principal cuidado foi evitar
repetições e sobreposições com os verbetes pessoais, o que serve como justificativa para algumas ausências.”

30
Outro produto dessa safra [filmes dos anos 80 na linha do rock] foi Rock estrela (1985), de Lael
Rodrigues, tendo a participação de Leo Jaime, autor da canção-título, (...). Outra participação como
ator em Rock estrela é a do músico Tim Rescala, (...). Ainda no Rio, Cazuza, apelido de Agenor de
Miranda Araújo (1958-1990), do conjunto Barão Vermelho, faz a música tema e uma participação
46
especial em Bete Balanço (1984), de Lael Rodrigues, (...)

CARVANA, Hugo:
47
É coadjuvante em (...) Bete Balanço, de Lael Rodrigues.

CASTRO, Ewerton de:

(...) trabalha (...) em duas comédias para o público adolescente: Rádio pirata, de Lael Rodrigues,
48
Uma escola atrapalhada, de Antonio Rangel (...).

LOUREIRO, Oswaldo:

Participa de várias comédias voltadas ao público infantil e adolescente, desempenhando em algumas


49
o papel de vilão, como (...) Rádio pirata, de Lael Rodrigues (...).

MONTAGEM:

Produtor e diretor, Lael Rodrigues, após deixar o curso de Cinema da UFF e fazer alguns filmes
como assistente de direção e dirigir curtas, monta J. S. Brown, o último herói, de José Frazão; Se
segura, malandro e Bar Esperança, de Hugo Carvana; Gaijin, caminhos da liberdade e Parahyba,
mulher-macho, de Tizuka Yamasaki. Monta e dirige Bete Balanço (1984); Rock estrela (1985) e
Rádio pirata (1987). Foi também sócio de Tizuka Yamasaki e Carlos Aberto Diniz, no Centro de
50
Produção de (sic) Comunicação (CPC).

MOURA, Edgar:

Abre-se a filmes mais comerciais, desde que possa comandar a fotografia e experimentar algum
elemento, como em Bete Balanço, de Lael Rodrigues, que falseia espacialmente os elementos de
51
composição da imagem.

44
Idem, p. 28.
45
Idem, p. 58.
46
Idem, pp. 85, 86.
47
Idem, p. 100.
48
Idem, p. 102.
49
Idem, p. 342.
50
Idem, p. 384.
51
Idem, p. 391.

31
PRODUÇÃO:

(...) Carlos Alberto Diniz (...), em 1978, fundou com Lael Rodrigues e Tizuka Yamasaki, egressos do
curso de Cinema da UFF, o Centro de Produção e Comunicação (CPC), com uma proposta de filmes
de mercado baseados em temas populares ou na história do país. (...) mais os filmes de Lael
Rodrigues, Bete Balanço (1984) e Rock estrela (1985), estes de linha mais comercial.52

WURCH, Yoya:

Junto com o diretor Lael Rodrigues dá continuidade a um cinema para a juventude, assinando os
roteiros de títulos do gênero nos anos 80. Ligada ao núcleo original da produtora Centro de Produção
e Comunicação (CPC), formada por Lael Rodrigues, José Frazão, Tizuka Yamasaki e Carlos Alberto
Diniz, escreve os três longas-metragens de Lael, delineando e formalizando os elementos de um
novo cinema comercial, em que a atualidade da juventude (música pop, em especial o chamado rock,
culto ao corpo, prática de esportes, etc.) mescla-se à luta pela ascensão social, protagonizada quase
sempre por personagens femininos. Os diversos elementos consubstanciam-se no enorme sucesso de
Bete Balanço, o que abre caminho para a repetição da fórmula em Rock estrela e Rádio pirata, sem a
mesma repercussão anterior.53

YAMASAKI, Tizuka:

Dirigiu o curta em 16mm Bom odôri (sic) com Lael Rodrigues, constituindo com este, Carlos
Alberto Diniz e José Frazão o Centro de Produção e Comunicação (CPC) em 1977. Mais tarde, nos
anos 80, foi produtora executiva dos filmes Bete Balanço e Rock estrela, de Lael Rodrigues.54

YAMASAKI, Yurika:

(...) estabelece um padrão clean e funcional para o conjunto de filmes urbanos rodados pela
produtora CPC, entre eles o grande sucesso Bete Balanço, de Lael Rodrigues.55

Lael não é citado no verbete FREIRE, Vera, com quem dividiu os créditos da montagem do

filme Gaijin, caminhos da liberdade (Dir.: Tizuka Yamasaki)56.

52
Idem, p. 441.
53
Idem, p. 575.
54
Idem, p. 578.
55
Idem, p. 579.
56
Press-book do filme Gaijin, caminhos da liberdade, p. 3. Pasta do filme. Arquivo do Museu de Arte
Moderna (MAM), Rio de Janeiro.

32
Referindo-se ao filme Bete Balanço, especificamente, há as obras da segunda metade da

década de 1980 que avaliaram a produção cinematográfica da primeira. Um dos autores que

se dedicou a isso foi Ortiz Ramos:

No Rio de Janeiro, seguindo a vertente para a juventude aberta pelo talento de Antônio Calmon, um
filme vai entrar com espírito juvenil no campo do rock nacional, retomando uma estrutura clássica
sempre utilizada para narrar a ascensão de uma artista no campo da indústria cultural da música. Em
BETE BALANÇO (direção de Lael Rodrigues, 1984), a adolescente Maria da Glória (Débora Bloch)
deixa os estudos e a pacata Governador Valadares para cavar um espaço entre astros como Lobão e
Barão Vermelho. Sob medida para seduzir a garotada, com ritmo rápido e recheado de músicas
tocadas no rádio continuamente, BETE BALANÇO foi apenas um oportuno modelo visando ocupar o
mercado com rapidez. Mesmo com um cacoete de crítica social, presente no episódio do
trombadinha assassinado, o filme de Lael Rodrigues é um descartável como a maioria das músicas de
sua trilha-sonora. Na sua esteira vieram outros, não tão bem-sucedidos comercialmente, como ROCK
ESTRELA (direção de Lael Rodrigues, 1985) e TROP CLIP (direção de Luís Fernando Goulart,
57
1985).

Outro autor foi, novamente, Paranaguá, que afirma Bete Balanço ser a chegada da

influência do videoclipe no cinema brasileiro58, além de estar associado ao levante do

rock’n’roll nacional. Ambos, estética e ritmo, teriam influenciado a produção de alguns

outros filmes baseados neste filão:

Le film << jeune >> emprunte désormais au vídeo-clip et aux rythmes à la mode (Bete Balanço de
Lael Rodrigues, 1984; Tropclip de Luiz Fernando Goulart, 1985; Rock Estrela de Lael Rodrigues,
59
1986).

Paiva também comenta sobre o filme:

Uma adolescente sexualmente liberada de uma cidade de Minas rica e preconceituosa tenta o sucesso
como cantora no Rio. Ali redescobre velho colega da província, enfrenta a violência urbana, a
oportunidade de ser modelo, o afeto de uma desconhecida, a decepção com o dono de uma gravadora
de discos, namorado novo e a batalha pelo triunfo. Alegre, otimista, moderno, BETE BALANÇO
vivia, principalmente, de uma récita pessoal da talentosa Débora Bloch (esq.), secundada por Lauro
Corona, Diogo Vilela (dir.), Maria Zilda, Hugo Carvana, Arthur Muhlenberg, Jessel Buss, Cazuza,
Marcus Vinícius e vários bandos de roqueiros. Argumento, roteiro e direção de Lael Rodrigues,

57
Ramos, José Mário Ortiz. O Cinema Brasileiro Contemporâneo (1970-1987). In: História do Cinema
Brasileiro. São Paulo, Art Editora, 1987, p. 448.
Em momento algum do filme, a personagem de Débora Bloch anuncia-se como ou é chamada de Maria da
Glória.
58
Paranaguá, Paulo Antonio. Tableau synoptique: cinéma, culture et société au Brésil. In: Le cinéma
bresilien. Paris, Editions du Centre Pompidou, 1987, p. 48.
59
Paranaguá, Paulo Antonio. Ruptures et continuité: les annés soixante-dix – quatre-vingt. In: Le cinéma
bresilien. Paris, Editions du Centre Pompidou, 1987, p. 126.

33
fotografia de Edgar Moura, música de Cazuza, edição de Lael Rodrigues. Um sucesso de crítica e de
60
público. (Centro de Produção e Comunicação, Rio de Janeiro).

Silva Neto, em seu dicionário de filmes brasileiros, após reproduzir a ficha técnica e elenco

do filme passa à seguinte sinopse:

Adolescente sexualmente liberada do interior de Minas Gerais, rica e preconceituosa, vai ao Rio de
Janeiro tentar a sorte como cantora de rock, adotando o nome artístico de Bete Balanço. Acaba
apaixonando-se por um fotógrafo que está tentando denunciar a violência urbana e passa por todas as
desventuras de um artista em início de carreira. Prêmios: Melhor Atriz (Débora Bloch), Prêmio “Air
61
France de Cinema”, RJ, 1984. (fop: f-6)

Na década de 1990, encontra-se apenas uma referência genérica a Lael Rodrigues e seus

filmes, em Parente:

(...) como muito bem diz Sérgio Lerrer, a idéia [dos cineastas gaúchos da década de 1980] era fazer
um cinema “em cima do mercado crescente do cinema, que é o mercado do público jovem, que ainda
naquele momento não havia sido explorado pelo cinema brasileiro”. Entretanto Sérgio Lerrer
esquece as diversas tentativas recentes de exploração desse filão de filmes juvenis, através de
fórmulas mercadológicas fáceis, que misturavam sexo, drogas e rock’n roll, como nos filmes de
Antônio Calmon (Nos Embalos de Ipanema, 79; Menino do Rio, 82 e Garota Dourada, 83).
Posteriormente, Lael Rodrigues (Bete Balanço, 83; Rock Estrela, 85, e Rádio Pirata, 87), Dodô
Brandão (Dedé Mamata, 88) e Carlos Diegues (Um Trem para as Estrelas, 87) tentariam a “sorte
62
grande”.

A leitura dos extratos reunidos compõe um retrato abrangente, porém fragmentado e

incompleto – e, de acordo com a presente pesquisa, algumas vezes pontuado por erros –

sobre Bete Balanço e a carreira de Lael Rodrigues. Mesmo sem uma leitura mais atenta,

observa-se na maioria destas passagens comentários e avaliações corriqueiras e simplistas,

por vezes até preconceituosas, sobre filme e diretor.

60
Paiva, Salvyano Cavalcanti de. História ilustrada dos filmes brasileiros (1929-1988). Rio de Janeiro,
Francisco Alves, 1989, p. 224.
As indicações “esq.” e “dir.” referem-se a uma foto localizada ao lado do texto transcrito, no original, dos
atores Débora Bloch e Lauro Corona, respectivamente, e não da atriz com Diogo Vilela.
61
Silva Neto, Antonio Leão. Dicionário de filmes brasileiros. São Paulo, Edição do Autor, 2002, p. 118.

34
Por ora, dispenso os livros e reconto sua história através de outras fontes.

O Que Ficou Pela História

Pretendo, agora, resgatar a história pessoal e profissional de Lael Rodrigues que, em grande

parte, não ficou registrada em livros. Recobrar o que foi esquecido, omitido ou inexplorado.

Assim, gostaria de salientar que as informações e os dados que se seguem em momento

algum fazem referência aos utilizados no sub-capítulo anterior. Esta opção motiva-se pela

vontade de dar voz ao que não foi registrado pelas fontes já expostas. Apesar de uma

considerável quantidade de material ter sido recolhida para tal tarefa, a utilização de

algumas poucas fontes dão conta de cobrir boa parte de sua trajetória: 6 reportagens63; uma

entrevista64; os press-books dos três filmes de longa-metragem dirigidos por Lael e suas

pastas personalidade65; um CD-ROM catálogo de curtas-metragens da UFF66; e três páginas

da Internet67.

62
Parente, André. A juventude e o cinema existencial/comunicacional. In: Ensaios sobre o cinema do
simulacro: cinema existencial, cinema estrutural e cinema brasileiro contemporâneo. Rio de Janeiro, Pazulin,
1998, p. 124.
63
Caetano, Maria do Rosário. Censura implica com Bete Balanço. Correio Braziliense. Brasília, 7 jun 1984;
Sem autor. Lael Rodrigues, mineiro de coração, fala do sucesso de Bete Balanço. Estado de Minas. Belo
Horizonte, 9 set 1984; Dumar, Deborah. Infecção tira Lael de cena. O Globo, 19 jan 1989; Moura, Roberto M.
coluna: Música Popular, Um show para Lael Rodrigues. O Dia, 31 jan 1989; Sem autor. Lael Rodrigues está
internado em estado grave. Folha de São Paulo. São Paulo, 14 jan 1989; Sem autor. O cineasta da
adolescência. Jornal do Brasil. Rio de Janeiro, 10 fev 1989.
64
Comunicação com o público jovem. In: Filme e Cultura n° 48 – Diretores estreantes. Fundação do Cinema
Brasileiro, Novembro, 1988, p.138.
65
Pasta dos filmes Bete Balanço, Rock estrela, Rádio pirata e personalidade. Arquivos do Museu de Arte
Moderna (MAM), Cinédia e Fundação Nacional de Arte (FUNARTE), todos no Rio de Janeiro.
66
Curtas Uff - curtas-metragens 1972 - 2002. CD-ROM do Laboratório de Investigação Audiovisual da
Universidade Federal Fluminense. Niterói: 2002.
67
Lael Rodrigues consta nas fichas técnicas dos filmes Jorjamado no cinema
(http://www.decine.gov.br/loja/brasilianas/3brasil-18.htm), Praça Tiradentes

35
Antes da leitura, alguns comentários são necessários: (1) assumem-se as fontes acima

referidas como linhas mestras para o estudo; (2) os press-books utilizados são, em sua

maioria, os distribuídos pela Embrafilme, sendo somente discriminados aqueles de

procedência diversa; (3) as datas dos filmes correspondem ao ano de suas produções e não

ao de seus lançamentos, sendo sempre discriminada a fonte em que se baseia; (4) o sistema

de notas de rodapé auxiliará o acesso à qualquer eventual informação que complemente a

história que não faça parte das fontes acima referidas, bem como no esclarecimento de

diferenças e discordâncias com demais fontes levantadas.

* * *

Lael Alves Rodrigues nasce em Campos do Jordão, Estado de São Paulo, em 1951, mas é

criado em Caldas, Estado de Minas Gerais. Ao ter de preencher sua ficha de inscrição para

prestar exame vestibular opta por estudar Arquitetura na FAU-USP e como opções

alternativas assinala a Universidade de Curitiba e a de Brasília, pela qual é aprovado.

Permanece no curso por dois anos sendo que desde o primeiro toma contato com o de

Cinema, passando a freqüentar quase que exclusivamente suas disciplinas68.

Na Faculdade de Arquitetura tinha uma cadeira de Cinema, dada pelo Cecil Thiré, que era uma
brincadeira de você tomar contato com o cinema pelo lado mais primário, que é você bolar uma
história e realizar um filme, a coisa mais simples possível. E a primeira coisa era um tipo de imagem:
você fazia cartelas desenhadas, ou colagens, tinha um tema qualquer. E daí pra a frente o passo é

(http://www.curtaocurta.com.br/assista.asp?video=55) e Alô Tetéia


(http://www.curtaocurta.com.br/assista.asp?video=57)
68
Caetano, Maria do Rosário. Censura implica com Bete Balanço. Correio Braziliense. Brasília, 7 jun 1984.
Comunicação com o público jovem. In: Filme e Cultura n° 48 – Diretores estreantes. Fundação do Cinema
Brasileiro, Novembro, 1988, p.138.
Não há referência acerca do ano de ingresso de Lael na Unb. De acordo com a Filme e Cultura (“fiquei dois
anos em Brasília estudando Arquitetura”) e a reportagem de Caetano (“No segundo semestre de 1971, porém,
o curso de cinema foi fechado”) sua entrada deve ter ocorrido no ano de 1969.

36
rápido, porque a mosca azul morde. (...) [o] contato direto com o fazer cinema – isso é uma coisa
69
apaixonante, muito maior, muito mais empolgante do que a Arquitetura que eu tinha na cabeça.

No segundo semestre de 1971, a escola de Cinema é fechada e Lael, representante dos

estudantes do curso, transferido para a Universidade Federal Fluminense (UFF), Estado do

Rio de Janeiro, junto com outros estudantes, dentre eles Tizuka Yamasaki. A ida para a

UFF, mesmo que o curso reabrisse, era inevitável: como representante estudantil indispôs-

se com o reitor José Carlos Azevedo ficando em “situação bem delicada”, como diria anos

mais tarde.

A primeira experiência cinematográfica de Lael acontece na nova Universidade, com o

professor Nélson Pereira dos Santos, registrando a festa do Divino em Pirenópolis, Goiás,

na bitola 16mm70. À época de seu primeiro longa-metragem, Bete Balanço, de 1984, o

filme ainda permanecia inacabado e Lael, de posse dos negativos, manifestava o interesse

de concluí-lo. Depois, vem a assistência de produção em Escola de Comunicação (Dir.:

Miguel Freire, 1972), curta-metragem documentário em 16mm. Fora do círculo

cinematográfico, torna-se secretário de oficina de O Jornal. Em 1973, co-dirige com Tizuka

o documentário Bon Odori (16mm, cor). Depois, participa do filme coletivo Mouros e

cristãos (16mm, preto e branco) pela UFF71.

69
Comunicação com o público jovem. In: Filme e Cultura n° 48 – Diretores estreantes. Fundação do Cinema
Brasileiro, Novembro, 1988, p.138.
70
Não há registro do ano deste filme tampouco referência à função assumida por Lael. Foi realizado,
certamente, entre o segundo semestre de 1971 – como dito, data de sua chegada a UFF – e algum mês de
1972, quando tem sua segunda experiência, ao ingressar na equipe de Escola de Comunicação.
71
Lael Rodrigues, em Comunicação com o público jovem. In: Filme e Cultura n° 48 – Diretores estreantes.
Fundação do Cinema Brasileiro, Novembro, 1988, p.138, afirma que após ter realizado Bon Odori com
Tizuka, em 1973, “na UFF nós fizemos um documentário que começou em conjunto, mas eu a Tizuka
terminamos juntos, chamava-se Mouros e cristãos. Depois eu fiz Sufoco (75)”. Como Lael não especifica o
ano de produção, de acordo com sua declaração, o filme teria sido feito entre 1973 e 1975.

37
Ainda em 1973, toma contato com o longa-metragem através das filmagens de O amuleto

de Ogum (Dir.: Nelson Pereira dos Santos), colaborando como que classificou de “ajuda

indireta”. Em 1974, é assistente de produção em Ovelha negra, uma despedida de solteiro

(Dir.: Haroldo Marinho Barbosa)72. No ano seguinte, quando termina o curso de Cinema, é

assistente de direção no longa-metragem As aventuras amorosas de um padeiro (Dir.:

Waldyr Onofre)73 e dirige o curta-metragem Sufoco (35mm, cor). Novamente, em 1976,

realiza a função de assistente de direção nos longas-metragens Marcados para viver (Dir.:

Maria do Rosário Nascimento e Silva) e Crueldade mortal (Dir.: Luiz Paulino dos

Santos)74.

A 1º. de novembro de 1976 é fundada a “empresa e administradora de filmes

cinematográficos”75 CPC (Centro de Produção e Comunicação) por Lael Rodrigues, Tizuka

Yamasaki, Carlos Aberto (Cacá) Diniz e Sérgio Otero. Algum tempo depois, Otero sai da

sociedade dando lugar a José Frazão. Anos mais tarde, o produtor Mendel Rabinovitch

associa-se ao grupo por ocasião da preparação do filme de estréia de Tizuka, Gaijin,

caminhos da liberdade (1979), saindo ao término das filmagens. Em 1982, José Frazão

também se desliga da produtora. Importante notar que Yurika Yamasaki, irmã de Tizuka e

esposa de Cacá, por manter estreita relação afetiva e profissional com o grupo, sempre foi

72
Press-book do filme Ovelha negra, uma despedida de solteiro, p. 3. Pasta do filme. Arquivo do Museu de
Arte Moderna (MAM), Rio de Janeiro.
73
Avellar, José Carlos. Rio, Zona Norte. Jornal do Brasil. Rio de Janeiro, 24 jun 1976.
Press-book do filme Marcados para viver. Pasta do filme. Arquivo do Museu de Arte Moderna (MAM), Rio
de Janeiro.
74
Biáfora, Rubem. Sem título. O Estado de São Paulo. São Paulo, 23 set 1978.
75
Press-book do filme J. S. Brown, o último herói organizado pelo CPC. Pasta do filme. Arquivo do Museu
de Arte Moderna (MAM), Rio de Janeiro.

38
considerada parte dos quadros da sociedade apesar de nunca tê-lo sido formalmente 76.

Foram produzidos pelo CPC: Bon Odori (Dir.: Lael Rodrigues e Tizuka Yamasaki, 1977);

Boi Pintadinho (Dir.: Lael Rodrigues, 1977); A fiel (Dir.: Lael Rodrigues, 1977); Linhas

cruzadas (Dir.: Lael Rodrigues,1977/78); Mouros e cristãos (Dir.: Tizuka Yamasaki,

1977/78); A idade da Terra (Dir.: Glauber Rocha, 1977/78); J.S. Brown, o último herói

(Dir.: José Frazão, 1977/78); Ensaio geral (Dir.: José Frazão, 1978); e Viva 24 de maio

(Dir.: Tizuka Yamasaki e Edgar Moura, 1978). Também prestou serviços de administração

e assessoria a Lúcio Flávio, passageiro da agonia (Dir.: Hector Babenco, 1977); Tudo bem

(Dir.: Arnaldo Jabor, 1977); Coronel Delmiro Gouvêia (Dir.: Geraldo Sarno, 1977); O

cortiço (Dir.: Francisco Ramalho, 1977); Se segura, malandro (Dir.: Hugo Carvana,

1977/78)77. Produziu ainda Eles não usam black-tie (Dir.: Leon Hirszman, 1980); Gaijin,

caminhos da liberdade (Dir.: Tizuka Yamasaki, 1980); Eu te amo (Dir.: Arnaldo Jabor,

76
Press-book do filme Parahyba mulher-macho, p. 9. Pasta do filme. Arquivo do Museu de Arte Moderna
(MAM), Rio de Janeiro.
77
Conforme press-book do filme J. S. Brown, o último herói organizado pelo CPC. Pasta do filme. Arquivo
do Museu de Arte Moderna (MAM), Rio de Janeiro.
(1) Atentar para a data de 1977 atribuída à produção do filme Bon Odori que conflita com a entrevista
Comunicação com o público jovem. In: Filme e Cultura n° 48 – Diretores estreantes. Fundação do Cinema
Brasileiro, Novembro, 1988, p.138., que, por sua vez, registra a data de 1973.
(2) Mouros e cristãos é descrito como “curta-metragem, coordenação de Nelson Pereira dos Santos, 16mm,
PxB, para a Universidade Federal Fluminense, 1977/78” no press-book do filme J. S. Brown, o último herói.
No verbete YAMASAKI, Tizuka de Ramos, Fernão Pessoa, e Miranda, Luiz Felipe A. de (org.). Enciclopédia
do cinema brasileiro. São Paulo, Editora SENAC São Paulo, 2000, p. 578, é creditado somente a Tizuka
Yamasaki roteiro, direção e montagem do filme, sem citar o ano de produção do filme, mas ainda atribuindo a
Nelson Pereira a coordenação do projeto.
Lael Rodrigues, em Comunicação com o público jovem. In: Filme e Cultura n° 48 – Diretores estreantes.
Fundação do Cinema Brasileiro, Novembro, 1988, p.138, afirma que após ter realizado Bon Odori com
Tizuka, em 1973, “na UFF nós fizemos um documentário que começou em conjunto mas eu a Tizuka
terminamos juntos, chamava-se Mouros e cristãos. Depois eu fiz Sufoco (75)”. Como Lael não especifica o
ano de produção, de acordo com sua declaração, o filme teria sido feito entre 1973 e 1975.
Mouros e cristãos não consta no catálogo Curtas Uff - curtas-metragens 1972 - 2002. CD-ROM do
Laboratório de Investigação Audiovisual da Universidade Federal Fluminense. Niterói: 2002.
(3) Não é dado crédito ao CPC em nenhuma das produções as quais a firma diz ter prestado “serviços de
administração e assessoria”, nem nos créditos iniciais ou finais destes filmes tampouco em seus press-books.
O que ocorre, comprovadamente, é a presença constante de um ou alguns integrantes da produtora nas
equipes técnicas dos filmes: Lael Rodrigues em Se segura, malandro (som guia e montagem), Cacá Diniz em
Lúcio Flávio, passageiro da agonia (direção de produção) e Tudo bem (produção executiva e direção de

39
1981); Rio Babilônia (Dir.: Neville d’Almeida, 1981); Parahyba mulher-macho (Dir.:

Tizuka Yamasaki, 1982); Bar Esperança (Dir.: Hugo Carvana, 1982); Meia entrada é para

todos (Dir.: ?, 1983)78. Também são de produção do CPC Bete Balanço (Dir.: Lael

Rodrigues, 1984), Patriamada (Dir.: Tizuka Yamasaki, 1985), Rock estrela (Dir.: Lael

Rodrigues, 1985)79.

Retornando à filmografia de Lael Rodrigues, em 1977 faz, segundo ele, “uma série de

coisas juntas no filme A força de Xangô, do Iberê Cavalcanti; fiquei meses e não fiz

exatamente nada, mas fiz still, som-guia, continuidade etc”80 e monta Se segura, malandro,

de Hugo Carvana, filme que tinha iniciado na função de som guia81. Entre a montagem do

filme de Carvana e 1979, monta o documentário em longa-metragem Jallalla (Viva!, em

dialeto aimarachua), do cineasta boliviano Jorge Sanjinés, quando este estava de passagem

pelo Brasil em seu exílio82. Lael, porém, jamais viu o filme nas telas, pois o cineasta foi

produção) e José Frazão em Lúcio Flávio, passageiro da agonia, Coronel Delmiro Gouvêia e O cortiço
(assistente de direção).
78
Conforme press-book do filme Parahyba mulher-macho. Pasta do filme. Arquivo do Museu de Arte
Moderna (MAM), Rio de Janeiro.
A leitura de toda filmografia do CPC presente neste documento faz destacar alguns momentos: (1) novamente
a referência à data de 1977 como o ano de produção de Bon Odori, acrescido ao fato de creditar a direção
somente a Tizuka Yamasaki; (2) a ausência do filme Mouros e cristãos; (3) não é dado crédito ao CPC nas
produções Eles não usam black-tie e Eu te amo, nem nos créditos iniciais ou finais destes filmes tampouco em
seus press-books. O que ocorre, comprovadamente, é a presença de Cacá Diniz na equipe técnica de Eles não
usam black-tie (produção executiva e direção de produção), mas não há referência a qualquer um dos sócios
da produtora em Eu te amo.
79
Conforme créditos iniciais e finais e press-books dos respectivos filmes.
80
Ramos, Fernão Pessoa, e Miranda, Luiz Felipe A. de (org.). Enciclopédia do cinema brasileiro. São Paulo,
Editora SENAC São Paulo, 2000, verbete MOTTA, Zezé p. 390.
81
Santos, Daniel dos. Carvana – A malandragem volta às telas. Folha de São Paulo. São Paulo, 3 fev 1977.
A função de Lael Rodrigues captando som guia do filme foi conhecida por um acaso, através da leitura dos
créditos do mesmo. Press-books de seus filmes ou reportagens citam somente sua participação como
montador.
82
Não há informações adicionais sobre a passagem de Sanjinés pelo Brasil durante seu exílio tampouco dados
sobre Jallalla. A suposição que a data da montagem tenha se dado entre 1977 e 1979 vem da consulta a
reportagem Caetano, Maria do Rosário. Censura implica com Bete Balanço. Correio Braziliense. Brasília, 7
jun 1984 e às filmografias abaixo:
Avellar, José Carlos. A ponte clandestina: Birri, Glauber, Solanas, Getino, García Espinosa, Alea – Teorias
de cinema na América Latina. Rio de Janeiro / São Paulo, Editora 34 / Edusp, 1995, pp. 256, 257.

40
para a Alemanha ampliá-lo. Situação imprecisa se repete com Isto é problema seu (Dir.:

Edgar Moura [Demo], Nani e Reinaldo), curta-metragem em 35mm que Lael monta (ao

lado de Eunice Guttman) em algum momento entre 1977 e 198383. Ainda no ano de 1977,

volta à direção de curtas-metragens com o documentário A fiel (16mm, cor), que também

monta, a ficção Linhas cruzadas (16mm, cor) e o documentário em média-metragem Boi

Pintadinho (16mm, cor)84. Além disso, sobra fôlego para a captação de som no curta-

metragem Praça Tiradentes (Dir.: José Joffily) e assumir a mesma função no média-

metragem Jorjamado no cinema (Dir.: Glauber Rocha).

1966 – Ukamau (¡Asi es!); 1969 – Yawar Mallku (Sangre de Condor); 1971 – El Coraje del Pueblo; 1974 –
Jatun Auka (El Enemigo Principal); 1977 – Lloksy Kaymata (¡Fuera de Aqui!); 1983 – Banderas del
Amanecer; 1989 – La Nación Clandestina; 1995 – Para Recibir el Canto de los Pájaros.
http://www.imdb.com/name/nm0762805 : Filmografia como diretor – Para recibir el canto de los pájaros
(1995); La Nación clandestina (1989); Las Banderas del amanecer (1984); Lluschi Caymanta, fuera de aquí
(1977); El Enemigo principal (1973); El Coraje del pueblo (1971); Yawar mallku (1969); Ukamau (1966);
Revolución (1963).
http://www.fncl.cult.cu/fundadores/sanjines.html: “Entre 1971 y 1979 [Sanjinés] permanece en exilio por
razones políticas rodando El enemigo principal en Perú, Fuera de aquí en Ecuador, La Patria clandestina en
España.”
http://www.estado.estadao.com.br/edicao/pano/99/11/07/ca2940.html: “Com a nova ordem política, parte do
grupo [Ukamau] foi para o exílio e parte ficou na Bolívia. “Nós [Sanjinés e outros cineastas], que fomos para
o exílio, continuamos realizando nossos filmes.” No Peru fizeram O Inimigo Principal (1974) e no Equador,
Fuera de Aqui! (1977).”
http://web.comunidadesweb.com/cineboliviano/biografia/sanjines.html: “1975 En el exilio reorganiza el
Grupo Ukamau; 1976 En el Ecuador realiza la película “Fuera de Aquí”; 1978 De regreso a Bolivia,
comienza a filmar, junto a Beatriz Palacios, el documental largo “Las Banderas del Amanecer”.”
83
Press-book do filme Se segura, malandro, p. 7. Pasta do filme. Arquivo do Museu de Arte Moderna
(MAM), Rio de Janeiro; press-book do filme Parahyba mulher-macho. Pasta do filme. Arquivo do Museu de
Arte Moderna (MAM), Rio de Janeiro.
A suposição que a data de realização e montagem de Isto é problema seu tenha se dado em algum ano entre
1977 e 1983 provém do ano do (suposto) primeiro encontro de Lael Rodrigues com Edgar Moura, na
produção do filme Se segura, malandro (1977), e da referência encontrada sobre este filme, no press-book do
filme Parahyba mulher-macho (1983), como filme montado por Lael.
Curiosamente, em Santos, Joaquim Ferreira dos. Gente Boa: Problema nosso. O Globo. Rio de Janeiro, 17 de
fev 2004, Isto é problema seu é datado de 1974. Porém, conforme os créditos do filme, trata-se de uma
produção do CPC, no entanto, a empresa só viria a ser constituída em 1976 e Isto é problema seu não consta
em filmografia alguma da empresa como tal.
84
Press-book do filme J. S. Brown, o último herói organizado pelo CPC. Pasta do filme. Arquivo do Museu
de Arte Moderna (MAM), Rio de Janeiro.

41
Em 197885, faz uma rápida aparição no curta-metragem Alô, Tetéia (Dir.: José Joffily) e

acumula as funções de produtor executivo, diretor de produção e montador no longa-

metragem J. S. Brown, o último herói,

(...) inteiramente filmado em Salvador sob a direção de José Frazão. No momento, estamos
preparando duas novas produções: “O Duelo”, de Lael Rodrigues e “Gaijin”, de Tizuka Yamasaki, o
primeiro dos quais terá sua produção incrementada a partir dos recursos levantados com a
86
comercialização do supra-citado filme.

Segundo Lael,

quase comecei um filme em 77/78, mais ou menos, que era Duelo de Exu. Cheguei a chamar os
atores, tinha a produção, o Frazão, que hoje é meu sócio, e que era sócio da CPC na época, mas não
87
deu certo.

Lael reassume as mesmas funções de J. S. Brown, o último herói em Gaijin, caminhos da

liberdade (Dir.: Tizuka Yamasaki), em 197988. Monta Bar Esperança (Dir.: Hugo

Carvana), do qual também é diretor-assistente, e trabalha como produtor executivo e diretor

de produção de Rio Babilônia (Dir.: Neville d’Almeida), ambos de 198289.

Antes de dirigir “Beth”, seu primeiro longa, um sonho: uma história quixotesca passada numa cidade
do interior. Acreditando, ele vendeu o carro, vendeu tudo. Levou Hugo Carvana para Caldas, no sul
de Minas. Filmou uma seqüência inteira.
90
Mas apenas uma seqüência. Um filme que não acabou.

Sobre mais este projeto abortado, o cineasta comenta:

comecei um longa-metragem antes [de Bete Balanço] e parei (Cada Louco Com a sua Mania). Levei
o Hugo Carvana e a Marlene França para o interior de Minas, filmei uma seqüência complicadíssima,
três câmeras, grua. Aí o filme parou na metade (isso foi em 82).91

85
Idem.
86
Idem.
87
Comunicação com o público jovem. In: Filme e Cultura n° 48 – Diretores estreantes. Fundação do Cinema
Brasileiro, Novembro, 1988, p.138.
88
Passos, José Meirelles. Gaijin – A imigração vista por olhos puxados. Isto É. 2 abr 1980.
89
Ramos, Fernão Pessoa, e Miranda, Luiz Felipe A. de (org.). Enciclopédia do cinema brasileiro. São Paulo,
Editora SENAC São Paulo, 2000, verbete ALMEIDA, Neville d’, p. 18.
Ramos, Fernão Pessoa, e Miranda, Luiz Felipe A. de (org.). Enciclopédia do cinema brasileiro. São Paulo,
Editora SENAC São Paulo, 2000, verbete CARVANA, Hugo, p. 100.
90
Gomes, Edmundo de Novaes. A história de Lael Rodrigues. Estado de Minas. Minas Gerais, 15 fev 1989.
91
Comunicação com o público jovem. In: Filme e Cultura n° 48 – Diretores estreantes. Fundação do Cinema
Brasileiro, Novembro, 1988, p.143.

42
A produção foi interrompida por dificuldades na co-produção com a Embrafilme e com

produtores privados. Monta Parahyba mulher-macho (Dir.: Tizuka Yamasaki) em 198392.

Lael Rodrigues assina argumento, roteiro, direção e montagem dos longas-metragens Bete

Balanço (1984), Rock estrela (1985) e Rádio pirata (1987), sendo o último pela produtora

que monta com Frazão, a Yan Arte e Comunicação. Todos os roteiros contam com a

parceria de Yoya Wurch, ressaltando a presença de Luís Carlos Góes no de Rock estrela.

Além disso, Lael também acumulou a função de produtor, junto a José Frazão, em Rádio

pirata.

No ano de 1985, produz com Cacá Diniz o longa-metragem Patriamada (Dir.: Tizuka

Yamasaki)93 e ainda dirige, fotografa e monta o curta-metragem Eu prefiro a liberdade 94,

“baseado na música de mesmo nome, gravada em 1965 por Ari Toledo, conforme contexto

da época”95.

Dois anos depois, é produtor executivo de Super Xuxa contra Baixo Astral (Dir.: Anna

Penido) e de Mistério no colégio Brasil (Dir.: José Frazão)96, período em que se casa com a

92
Press-book do filme Parahyba mulher-macho, p. 4. Pasta do filme. Arquivo do Museu de Arte Moderna
(MAM), Rio de Janeiro.
93
Press-book do filme Patriamada. Pasta do filme. Arquivo do Museu de Arte Moderna (MAM), Rio de
Janeiro.
94
Miranda, Luiz Felipe A. de. Dicionário de cineastas brasileiros. São Paulo, Art Editora, 1990, p. 282.
Miranda, em seu dicionário, credita Lael apenas como diretor do filme, porém nos créditos finais do mesmo
consta sua participação como fotógrafo e montador, também.
95
Conforme créditos iniciais do filme.
96
Miranda, Luiz Felipe A. de. Dicionário de cineastas brasileiros. São Paulo, Art Editora, 1990, p. 282.
Miranda, em seu dicionário, é a única fonte que indica Lael Rodrigues como produtor executivo de Mistério
no colégio Brasil. Nem nos créditos iniciais ou finais do filme tampouco em seu press-book consta qualquer
forma de participação de Lael. As funções mais recorrentes em sua carreira, exceto a de direção, são ocupadas

43
produtora Ana Sílvia Lopes Soares, sua sócia na firma Movie Rio. Com ela tem um filho,

Luan, no segundo semestre de 1988, época em que reencontra o pai que não via há 33 anos.

Em 1988, Lael Rodrigues passa a trabalhar no filme Alice no país das maravilhas97 quando,

no dia três de dezembro, é levado para a clínica particular São Miguel, em Botafogo, vítima

de pancreatite aguda. É transferido dias depois, em estado grave, para o Centro de

Tratamento Intenso (CTI) do Hospital Universitário Pedro Ernesto (HUPE), da

Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), em Vila Isabel, acometido de

septicemia. Morre no final da tarde de quarta-feira, dia oito de fevereiro de 1989, sepultado

no dia seguinte no cemitério de Campos do Jordão, cidade onde nasceu, aos 37 anos de

idade.

Na quarta-feira anterior, dia 1º de fevereiro, houve um show em solidariedade a Lael,

organizado por seus amigos, para o pagamento de exames e cirurgias não arcadas pelo

INPS, em espaço cedido pelo Canecão, em Botafogo, sob a direção de Aloysio Legey.

Batizado de Rock e Estrelas, o espetáculo contou com a presença de Cazuza, Celso Blues

Boy, Léo Jaime, Léo Gandelman, Lobão e Nico Rezende – todos participantes das trilhas

sonoras de seus filmes – na parte musical; de gravações em off (textos de Oswaldo

Montenegro) de Felipe Camargo, Maria Zilda e Hugo Carvana; além da exibição de dois

videoclipes utilizando material dos três longas-metragens dirigidos por Lael98.

por outras pessoas: Ana Maria Diniz, montagem; Jussara Precioso, diretora de produção; Maria da Salete,
produção.
97
Única referência a tal produção encontra-se em Stycer, Mauricio. Morre o cineasta Lael Rodrigues. Folha
da Tarde. Salvador, 10 fev 1989.
98
Abirached, Milton. Lael e suas estrelas leais. O Globo. Rio de Janeiro, 01 fev 1989.

44
Deixa em argumento Som do Sertão99 e mais

três projetos de longa-metragens: “Bebê export”, abordando o tráfico de bebês; “Os garotos do
futuro”, sobre o adolescente do ano 2000, e, “Rock 89”, sobre as eleições presidenciais com
depoimentos de artistas como Lobão e Renato Russo. Os argumentos estão prontos e Lael se
100
preparava para sair em busca de financiamento.

* * *

O trabalho de pesquisa esbarrou em diversos problemas dos quais destaco dois. O primeiro,

concerne aos documentos que deveriam ser as fontes de informação mais seguras na

primeira hora de levantamento de material para estudo, os press-books. Apesar de ter tido

acesso a todos àqueles que julguei necessário, isto não me isentou de encontrar grande

discordância de dados entre eles. Por muitas vezes, despertaram mais dúvidas do que

certezas, exigindo comentários e ressalvas nas notas de rodapé com certas recorrência e

extensão inicialmente não imaginadas. A maioria absoluta dos press-books é proveniente da

Embrafilme, no entanto, é impossível avaliar se tamanhas imprecisões existem devido a um

trabalho mal realizado por parte da distribuidora ou por uma falta de cuidado maior da

empresa produtora. Seja a resposta qual for, fica para os dias de hoje a dificuldade em lidar

com as fontes primárias. O outro problema refere-se às “fontes únicas”, isto é, as

referências solitárias e sem possibilidade de averiguação, muito comuns em periódicos, que

Curiosamente, em anúncio veiculado no mesmo dia e jornal, além de afirmar-se a presença no local dos três
atores citados, são ainda anunciados os nomes de Guilherme Karam e Miguel Falabella, os quais a reportagem
ignora. Reportagens sobre o desempenho do show não foram encontradas.
99
Pasta Lael Rodrigues, personalidade. Arquivo do Museu de Arte Moderna (MAM), Rio de Janeiro.
Argumento de seis páginas, provavelmente de um longa-metragem, a ser estrelado pela dupla de música
sertaneja Chitãozinho & Xororó. Lael reedita neste argumento várias questões colocadas em seus longa-
metragens anteriores: a exploração de um gênero musical popular na sua primeira fase de expansão, assim
como sua valorização; o movimento dos personagens do campo para a cidade e suas conseqüências; uma forte
presença da mídia e da indústria cultural; o videoclipe; o sonho de ascensão social, e a satisfação em inserir-se
ou conquistar espaços dentro da sociedade capitalista.

45
podem ser, de alguma forma, imprecisas, enganosas ou errôneas. O espantoso da situação

vem quando se atenta para o fato de que se trata de um material relativamente novo, de 30 a

20 anos atrás.

De qualquer modo, não é de se ignorar a discrepância entre o resultado do que ficou

registrado na bibliografia cinematográfica brasileira e do material levantado pela pesquisa.

Também se pode atribuir a isto a desvalorização e conseqüente desconhecimento sobre Lael

Rodrigues. A rede em que ele se insere é muito mais vasta e complexa do que a literatura

oficial nos faz crer e, com certeza, a análise do novo material apresentado facilitará em

muito a compreensão de Bete Balanço.

100
Dumar, Deborah. Infecção tira Lael de cena. O Globo. Rio de Janeiro, 19 jan 1989.

46
Capítulo 3

Por Que um Filme Como Bete Balanço?

Aos olhos de hoje em dia, deve parecer ordinária a idéia de se realizar um filme como Bete

Balanço, de intenções estritamente comerciais e voltado para o público jovem, em meados

dos anos de 1980. À primeira vista, a afirmativa procede. Na própria década, alguns filmes

com estas características foram lançados antes de Bete Balanço.

No entanto, nenhum outro filme havia sido como ele.

* * *

Tento aqui investigar as resoluções de Lael Rodrigues a respeito das escolhas de tema,

linguagem e estética do filme Bete Balanço. Para o cumprimento de tal tarefa, julguei

necessário certos procedimentos. Primeiro, em breves palavras, a descrição do filme

acompanhada, sempre que necessário, de comentários que serão aprofundados nos sub-

capítulos posteriores. Em seguida, como em uma panorâmica, pretendo obter uma ampla

visão sobre a filmografia de Lael bem como sobre o peculiar momento do cinema brasileiro

no qual ela se insere, no intuito de verificar os elementos e condições que possam tê-lo

influenciado. Da mesma forma, ao recobrar uma suposta filmografia adolescente nacional,

tento averiguar se Lael Rodrigues poderia ter buscado respaldo no próprio cinema brasileiro

para a realização de um filme como Bete Balanço. Por último, ao analisar alguns filmes que

47
estavam lidando com a questão do público jovem na virada da década de 1970 para a de

1980, desejo examinar o avanço das discussões cinematográficas sobre o tema e destacar de

que forma Bete Balanço pôde contribuir à discussão.

Quem Vem Com Tudo Não Cansa, Bete Balança Meu Amor –

O Filme

Bete Balanço tem uma história bastante simples e, com certeza, nem um pouco original ao

grande público: a do personagem do interior que tenta a sorte na cidade grande.

O filme inicia com créditos em letras brancas e vermelhas sobre fundo preto. Na trilha-

sonora, a música Amor, amor101, de Cazuza e Frejat, do grupo Barão Vermelho na voz de

Débora Bloch, intérprete da personagem principal que dá nome ao filme. Ela canta em voz

suave sobre uma tímida base de teclados.

Madrugada, azul sem luz


Dia de brinquedo

101
Press-book do filme Bete Balanço. Pasta do filme. Arquivo do Museu de Arte Moderna (MAM), Rio de
Janeiro.
Todas as letras das músicas do filme foram retirados de seu press-book, exceto a letra de Sempre juntos, de
Cristina Conrado, e Carente profissional, do Barão Vermelho, anotadas a partir do filme.
Conforme o mesmo, participam da trilha-sonora do filme: Barão Vermelho (Amor, amor; Bete Balanço; Vem
comigo); Lobão e Os Ronaldos (Me chama); Brylho (Meditando); Celso Blues Boy (Blues Motel);
Metralhatxeka (Mecenas de maizena) e Sangue da Cidade (Video-game). Titãs, Azul 29, Cristina Conrado e
Ricardo Bomba são citados como “músicas adicionais”.
De acordo com os créditos finais do filme, cedem suas músicas: Barão Vermelho (Amor, amor; Bete Balanço;
Vem comigo; Carente profissional); Lobão e Os Ronaldos (Me chama); Brylho (Meditando); Celso Blues Boy
(Blues Motel); Metralhatxeka (Mecenas de maizena); Sangue da Cidade (Video-game); Azul 29 (Video-
game); Cristina Conrado (Sempre juntos); e Ricardo Bomba (Nosso caso de amor). Os Titãs não são citados.
Em Bahiana, Ana Maria. Mesmo sem apoio do filme, o disco se mantém de pé. O Globo. Rio de Janeiro, 25
jun 1984 podemos verificar a escalação de artistas e respectivas músicas que entraram no LP da trilha-sonora
do filme: Cristina Conrado (Sempre juntos); Ricardo Bomba (Nosso caso de amor); Metralhatxeka (Mecenas
de maizena); Barão Vermelho (Amor, amor; Bete Balanço); Celso Blues Boy (Blues Motel); Titãs (Toda cor);
Lobão e Os Ronaldos (Me chama); Brylho (Meditando); e Azul 29 (Video-game). Sangue da Cidade não é
citado.

48
Linda assim me veio
E eu me entreguei
Inocentemente como um selvagem
Como um brilho esperto
Dos olhos de um cão

Após uma virada de bateria sobem guitarras e baixo e a música adquire uma levada mais

animada.

Amor, amor
Diz que pode e depois morde pelas costas sem querer
Amor, amor
Assim feito de um leão caçando medo

Meu caminho neste mundo eu sei vai ter


Um brilho incerto e louco
Dos que nunca perdem pouco
E nunca levam troco
E se um dia eu me der bem
Vai ser sem jogo, é...
Amor

A letra, mais do que falar sobre um relacionamento amoroso entre pessoas, discorre sobre a

paixão de Bete pela música. Amor, amor, assim como a canção-tema Bete Balanço, pode

ser lida como metáfora de trajetória e idéias da personagem. A primeira parte da música,

mais lenta e cadenciada, seria a vida rotineira de Bete revelada a um novo horizonte e sua

disposição de encará-lo (“E eu me entreguei / Inocentemente como um selvagem”).

Iniciada por uma virada de bateria e de ritmo mais dinâmico, a segunda parte reafirma a

anterior (“Meu caminho neste mundo eu sei vai ter / Um brilho incerto e louco”) e ressalta

as convicções de integridade de Bete sobre sua arte e individualidade (“Dos que nunca

perdem pouco / E nunca levam troco / E se um dia eu me der bem / Vai ser sem jogo, é...”).

Em tática comumente observada em filmes clássicos narrativos, diversas outras seqüências

reafirmarão o destino inexorável de Bete apesar dos obstáculos que irão se colocar à sua

49
frente, estabelecendo um permanente jogo de tensões entre as dificuldades da personagem

em obter sucesso e o final feliz que a todo momento se anuncia.

Música e créditos são cortados pelo som do motor da moto de Deca (Arthur Muhlenberg),

namorado de Bete, e pela imagem da pequena cidade mineira de Governador Valadares.

Um único e breve plano de uma igreja com uma praça sem movimentação é utilizado para

reforçar o imaginário comum às cidades do interior, de monótono cotidiano e de forte

tradição familiar e religiosa. Já o barulho do veículo cortando a música pode ser

interpretado como a primeira referência aos obstáculos que Bete terá de enfrentar.

Bete é aprovada no vestibular, mas a euforia do resultado logo é transforma-se em profunda

melancolia. Mais tarde, em um pequeno bar, ela canta.

Toque qualquer coisa


No meio da noite
Um amor, hora marcada
Um bugre, uma estrada

Uma estrela decadente


Um tropeço no espaço
Guarde esse braço
No coração do Blues, no coração do Blues

Mais uma estória para lembrar


Um outro amor na longa estrada

Blues Motel
Blues Motel
É sempre certo encontrar

Marca de batom
Whisky na cama
E a emoção de homem
No coração do Blue
No coração do Blues

50
Blues Motel, de Celso Blues Boy, é lento, denso, carregado. Lida com os clichês de dor e

tristeza mais característicos do gênero blues. Apesar da emoção que emprega ao interpretar

a música, Bete é tratada com indiferença pelos freqüentadores do estabelecimento, a não ser

por Deca. O clima de desânimo e a música perduram até o motel onde Bete e Deca acabam

de ter relações. Enquanto ele se veste, ela lamenta consigo por seu futuro sem grandes

perspectivas: “Eu não devia ter passado neste maldito vestibular… agora vem o noivado

com o Deca, a faculdade… ai…”.

Bete liga a televisão. É a apresentação de uma banda brasileira de rock, interpretada pelos

integrantes do conjunto Barão Vermelho. O local (Circo Voador102) está lotado por uma

massa eufórica tomada pela música contagiante, Vem comigo, de Cazuza e Frejat.

Bebe a saideira
Que agora é brincadeira
E ninguém vai reparar
Já que é festa
Que tal uma em particular
Há dias que eu planejo
Impressionar você
Mas eu fiquei sem assunto
Vem comigo, no caminho eu explico
Vem comigo, vai ser divertido
Vem comigo
Vem junto comigo
Eu quero te contaminar
De loucura
Até a febre acabar
Há dias que eu sonho beijos ao luar
Em ilhas de fantasia
Há dias com azia
O remédio é o teu mel
Sinto tanto frio
No calor do Rio
Já mandei olhares
Prometendo o céu
Agora eu quero é no grito
Vem comigo

51
Bete anima-se. “Vem comigo”, diz a letra. Da imagem da banda na tela de televisão “pula-

se” para o local do próprio show, após uma série de cortes secos frenéticos entre os dois

“ambientes”. O pedido do cantor repete-se outras vezes. Alternam-se as imagens do show

com a de Bete na cama. Um salto para imaginação. Bete canta a mesma música usando

vestes de couro e maquiagem pesada, que remetem as do vocalista, em um cenário de beco

abandonado – uma alusão aos estereótipos de rebeldia e delinqüência associados ao

rock´n´roll – e propositadamente fake, revelando tratar-se de uma filmagem – opta-se por

mostrar os elementos que possibilitam sua realização, como o grid de refletores no teto e a

máquina de fumaça. Esta passagem é a primeira inserida em uma estética comumente

entendida como sendo a do videoclipe103. Trabalha-se, por exemplo, com a imagem

superexposta em áreas localizadas – destacando a cena como espetáculo e sonho e, ao

mesmo tempo, remetendo ao local original do show – ; ângulos “inusitados” para o registro

da cena; e montagem “picotada” e de ritmo acelerado, acompanhando o da música.

Completa o número musical a coreografia descontraída de Bete com alguns bailarinos de

figurino despojado e colorido.

Em sua casa, Bete arruma a mochila enquanto sobe o off da carta que deixa para os pais:

“Mãe, não adianta explicar porque vocês não vão entender nunca, mas eu preciso ir à luta

da minha vida sem a ajuda de ninguém. Não se preocupem que eu mando notícias. Muitos

beijos em vocês. Bete.”

102
Salem, Helena. ‘Bete Balanço’, a roqueira que vem das Gerais, começa a nascer no Voador. O Globo. Rio
de Janeiro, 22 dez 1983.
103
Acredito que o entendimento vulgar acerca do videoclipe apóia-se sobre idéias específicas de linguagem e
de estética, por exemplo: montagem “picotada” e frenética, ângulos “inusitados”, grafismo, contraluz,

52
Na rodoviária, Bete embarca para o Rio de Janeiro. Antes, porém, um pequeno

contratempo: o fiscal desconfia de sua maioridade. E, de fato, Bete está a um mês de

completar 18 anos. Com simpatia e jeito maroto, um largo sorriso e uma picada de olho, ela

convence o fiscal a deixá-la seguir viagem.

Pode seguir a tua estrela


O teu brinquedo de star
Fantasiando o segredo
Do ponto onde quer chegar
O teu futuro é duvidoso
Eu vejo grana, eu vejo dor
No paraíso perigoso que
A palma da sua mão mostrou
Quem vem com tudo não cansa
Bete balança meu amor
Me avise quando for a hora
Não ligue pra essas caras tristes
Fingindo que a gente não existe
Sentadas são tão engraçadas
Donas das suas salas
Quem tem um sonho não dança
Bete balança por favor
Me avise quando for embora

Ao som de Bete Balanço (Cazuza e Frejat), do Barão Vermelho, sucedem-se tomadas áreas

do Cristo Redentor e da Praia de Copacabana, imagens do Aterro do Flamengo, das

avenidas Brasil e Presidente Vargas em intenso movimento. São utilizados planos

extremamente abertos para ressaltar o gigantismo da cidade. Em certa ocasião, também

conjugados a contra-plongés de edifícios, imprimindo a noção de serem maiores do que

realmente são. Nesta apresentação da cidade ainda há um breve plano da casa de shows

Canecão, um dos espaços mais almejados pelos novos artistas musicais da época. A

canção-tema Bete Balanço retorna à metáfora da trajetória e às idéias da personagem

apresentadas em Amor, amor.

maneirismos no movimento de câmara, áreas localizadas da imagem em superexposição, afastamento dos tons

53
A possibilidade do insucesso sempre espreita Bete. Sua bolsa prende ao sair do ônibus e

Paulo César demora a atender a porta de seu o apartamento, dando a impressão de não

estar. Paulo César, ou melhor, Paulinho (Diogo Vilela), é amigo de Governador Valadares

que fora para a cidade grande também em busca oportunidades. Mesmo sem nada avisar,

Bete é bem recebida por Paulinho e acolhida por ele. Conta-lhe seus planos: deixar para trás

um futuro sem grandes perspectivas em Valadares e encontrar no Rio de Janeiro um

empresário do meio musical que conhecera em um festival na cidade natal que havia lhe

prometido ajuda em sua carreira. Paulinho alerta-a sobre as dificuldades de sua empreitada

e de sua ingenuidade de “menininha do interior”. O desafio da personagem em analogia a

sua fase de amadurecimento.

Bete inicia suas tentativas de encontrar o empresário através de ligações de orelhão, nas

quais sempre é atendida por uma secretária. Suas investidas duram semanas. Neste ínterim

é assaltada por trombadinhas; entrega panfletos em sinais de trânsito, emprego que desiste

após ser assediada por taxista; e consegue invadir a gravação de um número do conjunto

Lobão e Os Ronaldos em um estúdio de televisão. Eles tocam Me chama, anunciando o

encontro de Bete com seu par romântico.

Chove lá fora
E aqui faz tanto frio
Me dá vontade de saber
Aonde está você
Me telefona
Me chama
Nem sempre se vê
Lágrimas no escuro
Lágrimas
Tá tudo cinza sem você
Tá tão vazio
E a noite fica sem porque
Aonde está você

“naturais” da cena na fotografia, toda sorte de efeitos especiais e de edição.

54
Me telefona
Me chama
Nem sempre se vê
Mágica no absurdo
Mágica
Nem sempre se vê
Lágrima no escuro
Lágrima

Em certo momento, Paulinho joga videogame, novidade eletrônica de entretenimento na

época. Para ilustrar a atividade, na trilha-sonora Video-game, do grupo Sangue da Cidade.

Mais de cinco horas


Ligado na TV
Não consigo mais viver
Sem a televisão

E quando ela pára


Também fico desligado
Na televisão
Me tornei um viciado
Video-game...

Paulinho e Bete encontram-se em uma pracinha. Conversam sobre o progresso, ou melhor,

sobre a falta dele, nas atividades da moça. Os próximos acontecimentos do filme são

anunciados no diálogo. Bete conta de sua dificuldade em arranjar emprego e que, por

dinheiro, concordaria até mesmo em posar nua, respondendo a comentário de Paulinho que

lera a oferta em classificado. Mais uma vez volta à tona a questão do relacionamento

amoroso (antecipado na música Me chama) quando Paulinho pergunta se nem mesmo um

namorado lhe apareceu para apaziguar o desânimo, ao que ela responde negativamente.

Paulinho vai embora e, logo depois, Bete presencia o espancamento de um menino de rua

por homens de terno e gravata. Rodrigo (Lauro Corona), fotógrafo que passa pelo local,

registra tudo. Uma das fotos ganha a primeira página no Jornal do Brasil: “Populares

matam a chutes menor em Copacabana”.

55
À noite, Bete chega ao apartamento de Paulinho. Uma placa de trânsito que indica “Pare”

está pendurada na porta. Significa que o amigo está acompanhado. Bete passa a noite

vagando pela cidade e seus letreiros néons. É meia-noite, o novo dia é seu aniversário, sobe

na trilha Parabéns pra você em um solo de guitarra distorcido, lento e pesaroso.

Rodrigo, ao revelar as fotos do incidente, decide encontrar suas testemunhas. Retorna à

praça, porém sua tarefa mostra-se infrutífera. As pessoas a que aborda mentem ou negam

terem presenciado o espancamento.

Bete encontra o empresário. Aos poucos ele se lembra dela e, ao contrário do que

prometera, não cuidou dos preparativos de sua carreira. Bete desanima, mas não desiste e

consegue marcar um almoço com ele para o dia seguinte. O empresário, no entanto, não

comparece. Sobe na trilha-sonora Blues Motel, agora na voz de Celso Blues Boy. A mesma

música que ilustrava sua decepção em continuar em Valadares, retrato da melancolia de

Bete. A canção permanece nas próximas cenas. Lá mesmo, no restaurante, Bete conhece

Bia (Maria Zilda). Elas almoçam juntas a convite da nova amiga. Bete conta sua história,

tudo que se passou no filme até então. Bia, simpatizada, convida-a a ir à sua casa. Assim

como as músicas Amor, amor e Bete Balanço em ocasiões anteriores, Bia prediz o futuro de

sucesso de Bete. Após um corte súbito, Bia e Bete estão deitadas na cama. Bete veste sua

calça. A sugestão da relação sexual encerra com Bia pedindo a Bete que permaneça em sua

casa, o que ela docemente nega, mas é seguida da promessa de um novo encontro. Blues

Motel baixa na trilha. Interessante notar que a música, comentário da situação emocional de

Bete, ao longo da seqüência passa a se referir a Bia. Inicialmente, ela se refere à decepção

de Bete pela ausência do empresário ao encontro. Com o passar das cenas, Bete ganha novo

56
ânimo com as palavras de Bia, mas esta finaliza sua participação de forma melancólica.

Rica, bem-sucedida e mais velha, Bia não consegue conquistar amorosamente Bete.

Continua solitária. Alguns versos parecem ecoar: “Mais uma estória para lembrar / Um

outro amor na longa estrada”.

Rodrigo encontra Bete caminhando pela calçada. A pedido dele, vai ao seu apartamento ver

as fotos do linchamento, acompanhada de Paulinho. Lá chegando, a jovem surpreendem-se

com o local, um misto de moradia e estúdio fotográfico, com luzes, cores e objetos

cenográficos que remetem ao universo da moda e da publicidade mais estilizada e

artificialista. Rodrigo mostra as fotos do incidente e explica seus planos: pelo fato do

agressor do menor ser um “figurão” a polícia “abafara” o caso, mas com a ajuda das outras

testemunhas, ele pretende denunciar o caso a toda sociedade com grande alarde. Bete

concorda “se não for fria”. A conversa logo muda de foco quando Paulinho descobre sobre

a mesa diversas fotos de modelos. Rodrigo, para ajudar algumas amigas, fizera as fotos

para distribuir em agências de publicidade. Bete pede para ele “arranjar um bico desse” e o

fotógrafo prontamente se dispõe a auxiliá-la. Inicia-se a sessão de fotos na forma de um

videoclipe, ao som de Bete Balanço. Muito apropriada a escolha da música, aliás. Como

veremos mais adiante, esse é o primeiro passo na carreira artística de Bete. Quase a

totalidade das cenas do videoclipe consiste na filmagem disfarçada das imagens que passam

na tela de um monitor de televisão. Esta opção barateia consideravelmente os custos de

produção do filme, pois os recursos de gravação e edição utilizados são os de suporte

magnético, e não os de película, muito mais caros. Ao mesmo tempo, serve muito de bem

de elemento estético, pois o filme entra em diálogo direto com o universo do qual se

apropria (o da televisão). A primeira parte do videoclipe conta com fortes focos de luz para

57
superexposição de determinadas áreas e contraluzes aliados a formas geométricas coloridas

inseridas na edição do filme conferindo maior dinamismo aos planos. Depois, a célebre foto

de Marilyn Monroe deitada nua sobre uma cama vermelha é reproduzida. Segue um

pequeno videoclipe de Bete em coreografia com frentistas de um posto de gasolina – um

dos momentos de merchandising do filme. Por último, a tela é dividida em quatro partes

iguais, cada uma apresentando os estágios da trajetória de Bete até o fim do filme.

Antecipa-se, assim, alguns planos.

Bete é apresentada por Rodrigo a Tininho (Cazuza) e banda. Muito bem recebida pelo

grupo sentindo-se à vontade, ela logo pergunta se em seus ensaios “rola uma bacaninha”,

referindo-se ao cigarro de maconha. Alguns dias depois, ao chegar ao apartamento de

Paulinho, Bete é surpreendida pelo amigo que lhe mostra uma revista com as fotos do

ensaio feito por Rodrigo. Transtornada por não ter sido avisada, Bete ainda é pega de

surpresa pela presença de Deca. Ele relata o abalo da família dela pelas fotos e apela para

que ela volte à vida ao seu lado em Valadares. Bete recusa e pede que não revele a seus pais

onde está. Deca se vai.

Rodrigo encontra Bete chateada no Arpoador. Ela reclama por não ter sido avisada da

publicação das fotos, mas quando Rodrigo lhe dá o dinheiro referente ao trabalho e avisa-

lhe da possibilidade de um próximo, Bete recupera seu bom-humor. Dias depois, Bete é

fotografada por Rodrigo para um anúncio de jeans. Já no apartamento de Paulinho, o casal

faz amor. A trilha sobe com Amor, amor. Paulinho chega e encontra a placa de “Pare”.

Arma, então, uma grande confusão para poder entrar. A trilha passa a ser de Meditando, da

banda Brylho. A música tem uma levada bem animada e dinâmica. Costura bem as cenas

58
em paralelo, o prazer zombeteiro de Paulinho em mobilizar os moradores do prédio, e o

corporal de Rodrigo e Bete no ato sexual.

Meditando
Estou transcendental
A hora passa
A hora passa
O trem passou
Tá liso
Não vou te enganar
Quantas canções
O teu sorriso
Faz lembrar

Bete consegue um teste em uma gravadora a partir de uma indicação de Tininho. Tony

(Hugo Carvana) é o produtor musical que montou a banda, visando altas vendagens mais

do que reconhecimento artístico. No estúdio, Bete canta Mecenas de maizena, da banda

Metralhatxeka.

Curtia uma bobeira num bar de Ipanema


Quando lá na área pintou um Mecenas
Me disse que através de um simples telefonema
Resolvia meu problema

Que ia me abrir as portas da fama


Trazer todos os gatinhos para minha cama
Me descolava pra ser atriz de novela
Pegava meus poemas e fazia um bestseller

Em troca disso tudo ele pedia só


Um pouco de leite em pó
Para fazer uma papa
Então lhe dei um tapa
Ele se dissolveu

Pois esse mecenas multinacional


Era um maizena viciado em mingau
Que pena, que pena
O mecenas de Ipanema
Era um mecenas de maizena

Enquanto a música é tocada, sucedem-se imagens da trajetória de Bete, uma retrospectiva

dos fatos até aquele momento do filme em um videoclipe. No entanto, a canção é

interrompida por Tony. Ele pede mais suavidade de todos, em suas palavras, “música para a

59
garotada”. O pedido de Tony demonstra sua falta de sintonia com o público (consumidor)

que deseja atingir. A música, de ritmo contagiante, é interrompida e reiniciada de forma

morna e sem apelo. O avesso da “música para a garotada”. Bete, “representante” desta

“garotada”, puxa novamente a música para a levada rock. Reinicia-se o videoclipe que,

literalmente, ilustra a bem-humorada letra da música. Não por acaso, esta fala de um

empresário do meio musical e suas falsas promessas. Enquanto isso, um policial vai à casa

de Rodrigo para impedi-lo de expor as fotos e os nomes dos linchadores dos meninos de

rua. No entanto, o rapaz não cede. De volta ao estúdio, Bete vê uma garota, amante de

Tony, gravar a mesma música que ela. Sua voz serve de fundo para os novos vocais. Não

tolerando isso, Bete inicia grande discussão com o produtor e vai embora.

Bete, enraivecida, conta a Rodrigo o que houve. Fazem sexo em cena que tem em sua

trilha-sonora a música Sempre juntos, de Cristina Conrado. Seus versos retratam bem o

momento da relação:

Quando a gente transa


Pinta um lance a mais
Não é só o sexo
Que nos satisfaz, meu bem
Rola um papo amigo
Que me faz pensar
Quando estou contigo, baby
Quero mais estar
Vamos
Sempre juntos
Juntos
Nós seremos muito mais
Vamos
Sempre juntos
Juntos
Nós seremos sempre um lance a mais

Depois, conversam deitados na cama. A fala de Rodrigo é extremamente importante:

“Engraçado como é essa vida. Toda vez que você acha que tá chegando lá vem uma pessoa

60
que te puxa o tapete. Mas essa pessoa não sabe o quanto tá te ajudando, porque é só dessa

maneira que você cresce. É só dessa maneira que a gente cresce”. Ambos ganham forças

para continuar em suas empreitadas.

No apartamento de Rodrigo, Bete e Tininho fumam um cigarro de maconha e cantam

Amor, amor, música na qual ele aposta o sucesso. Rodrigo resolve finalmente reunir toda a

imprensa e expõe as fotos na praça em que houve o linchamento. Justifica sua atitude

dizendo-se contra a inércia, o individualismo e o medo de se envolver que caracterizam as

pessoas e a sociedade atuais.

Tininho e banda tocam sob as câmeras de estúdio de televisão. A música é Carente

profissional, de Cazuza e Frejat. A canção fala de perseverança.

Tudo azul
No céu desbotado
E a alma lavada
Sem ter onde secar
Eu corro, eu berro
Nem dopante me dopa
A vida me endoida

Eu mereço um lugar ao sol


Ganhar pra ser
Carente profissional

Se eu vou pra casa


Vai faltando um pedaço
Se eu fico, eu venço
Eu ganho pelo cansaço
Dois olhos verdes
Da cor da fumaça
E o veneno da raça

Bete, ansiosa, aguarda sua vez. No entanto, ela é vetada por um atraso na programação.

Vem à sua cabeça uma série de imagens rápidas e confusas, um breve pesadelo, uma

metáfora de sua angústia por ser dispensada. Ela se encontra com Bia e depois com

61
Paulinho. A ambos conta suas angústias e decepções, e sempre recebe em troca frases de

apoio e incentivo. Bete, no entanto, resolve voltar para Valadares, “dar um tempo”. À noite,

informa a Rodrigo sua decisão. Novamente, ouve incentivos para que não desista de seu

sonho. Mesmo assim, não volta atrás, mas deixa uma fita K7 com ele, como recordação.

Pela manhã, enquanto Bete vai à rodoviária embarcar para Governador Valadares, Rodrigo

vai ao estúdio de Tony mostrar a ele a fita K7 deixada por Bete. Paralelamente a estas duas

cenas, começa-se a intercalar uma outra, de Bete desembarcando em um porto. Elegante,

mas um tanto cafona e desengonçada. Tony encanta-se pela música Amor, amor e

comemora a descoberta do hit musical que tanto procurava. Ela permanece na trilha-sonora

até o fim do filme. Rodrigo vai de moto atrás de Bete e consegue interceptar seu ônibus na

Avenida Brasil. A partir daí, o filme se fixa no desembarque de Bete. Ela inicia um número

musical muito movimentado com os trabalhadores do porto. O último videoclipe do filme,

com vários planos de diferentes pontos e uma montagem “picotada”. Finaliza-se com

Rodrigo em traje de gala completamente branco (por que não pensar que remete a um

anjo?) esperando por Bete ao lado de uma limusine. Eles entram e o carro parte. Em uma

galhofa à vida de sucesso levada de maneira esnobe, eles comem galeto em uma quentinha

com as mãos.

Mais uma Estória Para Lembrar, Um Outro Amor na Longa


Estrada – Panorâmica Sobre a Filmografia de Lael Rodrigues

Entre curtas, médias e longas-metragens, filmes bem e mal recebidos pela crítica ou pelo

público, filiados ou não a movimentos da cinematografia nacional, Lael Rodrigues

62
participou de mais de 20 produções até realizar Bete Balanço. Versátil, trabalhou em quase

todas as funções. Como em uma panorâmica, pretendo obter uma ampla visão sobre a

filmografia de Lael bem como sobre o peculiar momento do cinema brasileiro no qual ela

se insere, no intuito de averiguar os elementos e condições que possam ter influenciado a

confecção de seu primeiro longa-metragem.

No ano de 1973, Lael Rodrigues colabora com o que classificou de “ajuda indireta” nas

filmagens de O amuleto de Ogum, de Nelson Pereira dos Santos, que, ao lidar com os

rituais de umbanda, lança a proposta de um de um Novo Cinema Popular.

A idéia central é respeitar as referências culturais e os valores do povo, aproximar-se delas sem
intenção crítica, sem inseri-las numa explicação dos caminhos da história, sem tachá-las de
104
alienadas. Ou seja, não falar sobre elas, dar-lhes expressão.

Outras produções que Lael participa pelo mesmo período podem guardar semelhanças com

o projeto de Nelson Pereira. O registro da festa do Divino105 em Pirenópolis, Goiás (1971

104
Idem. Do golpe militar à abertura: a resposta do cinema de autor. In: O cinema moderno brasileiro. São
Paulo, Paz e Terra, 2001, p. 99
105
Amaral, Rita. Festa à Brasileira: sentidos do festejar no país que "não é sério". Disponível em publicação
eletrônica na Internet, via www. url: http://www.aguaforte.com/antropologia/festaabrasileira/festa.html
“A festa do Divino Espírito Santo realiza-se no Domingo de Pentecostes, festa móvel católica, que acontece
sempre cinqüenta dias depois da Páscoa, em comemoração à vinda do Espírito Santo sobre os apóstolos de
Jesus Cristo. Ela se realiza em inúmeras localidades do país. No Brasil central, contudo, parece ser a mais
relevante e mobilizante das festas. Se nas demais regiões temos outras festas aglutinadoras da população
(como o Carnaval no sudeste, as festas juninas no norte e nordeste, as FESTS no sul), a festa do Divino
Espírito Santo cumpre este papel no Brasil central, embora não seja oficialmente reconhecido como santo
padroeiro da maioria das cidades em que acontece. Existe um culto pessoal do Espírito Santo em toda a região
central. Segundo Brandão, as pessoas recorrem ao Divino em busca dos mesmos milagres esperados dos
santos da igreja católica fazendo, inclusive, promessas. Ele não tem atributos específicos, ou seja, não tem um
dom específico de cura ou proteção, como é o caso de São Brás que protege a garganta, ou Santo Antônio,
que protege os namorados. Por esta razão, ao Divino tudo se pede, embora ele perca em quantidade de
promessas e votos para São Benedito. Finalmente, o Divino Espírito Santo não tem culto institucionalizado
por parte de algum segmento social, seja classe, profissão ou etnia. (...) A crença no Espírito Santo explica a
festa. Ela é compreendida como um modo próprio da cidade expressar sua crença, promovendo uma situação
de múltiplos rituais de louvor e homenagem ao Espírito Santo. Aqueles que se comprometem com os festejos
do Divino redefinem-se, uns para com os outros, ao se integrarem a um sistema de posições e relações que
apesar de algumas vezes derivarem de relações que acontecem em outras áreas da sociedade local, somente
possuem valor dentro da situação da festa e de seus vários rituais. Isto significa que empregado e patrão, por
exemplo, podem ter seus papéis invertidos, reforçados ou anulados no sistema religioso da festa.”

63
ou 1972), de coordenação do próprio Nelson Pereira, pela UFF, e a co-direção com Tizuka

Yamasaki do documentário Bon Odori (1973), realizado em Atibaia, Estado de São

Paulo106. Mesmo que a hipótese de que estes dois filmes sigam os preceitos do Novo

Cinema Popular não se comprove, o advento do próprio marcava um importante momento

do cinema brasileiro. A mudança de postura do Cinema Novo, do qual Nelson Pereira era

representante, para com a cultura popular “constituía na verdade mais um indicador da crise

e esfacelamento do projeto cultural nacionalista dos anos 50-60”107 do movimento. O

cineasta não era mais um agente conscientizador da sociedade, “privilegiava-se os fatos

culturais atomizados (...) expressando a falta de um projeto globalizante,e a sua inevitável

despolitização”108.

Lael Rodrigues, portanto, inicia suas atividades cinematográficas em momento de aguda

crise do Cinema Novo. Ele ainda participaria de filmes que, com maiores ou menores

afinidades, relacionavam-se com as propostas de O amuleto de Ogum. Em 1975, é

assistente de direção em As aventuras amorosas de um padeiro (Dir.: Waldyr Onofre) e

desenvolve uma série de atividades em A força de Xangô (Dir.: Iberê Cavalcanti), dois anos

depois. Ambos flertam com as tradições afro-brasileiras. No caso de As aventuras

amorosas de um padeiro, a filiação ao Novo Cinema Popular é total109: seu diretor, Waldyr

106
Ramos, Fernão Pessoa, e Miranda, Luiz Felipe A. de (org.). Enciclopédia do cinema brasileiro. São Paulo,
Editora SENAC São Paulo, 2000, verbete YAMASAKI, Tizuka, p. 578.
http://www.atibaia.com.br/cidade/folclore06.asp
“O Bon-Odori teve origem no Japão, entre os lavradores da zona rural. É uma festa que encerra gratidão e
reconhecimento pela safra abundante e é realizada em memória de ancestrais japoneses que lutaram no
campo. Ela foi trazida ao Brasil pelos imigrantes”.
107
Ramos, José Mário Ortiz. Cinema, estado e lutas culturais: anos 50, 60, 70. Rio de Janeiro, Paz e Terra,
1983, p. 128.
108
Idem, p. 129.
109
Bernardet, Jean Claude. Cinema: Subúrbio, povo & padaria – Entrevista de Waldyr Onofre a Jean Claude
Bernardet. Movimento. 21 jun 1976.

64
Onofre, atuara em O amuleto de Ogum110; Nelson Pereira dos Santos agora faz as vezes de

produtor; e Hélio Silva é responsável pela fotografia de ambas as fitas.

Como exercício especulativo, podemos levantar a hipótese de que Lael, também flertou

com as idéias de Nelson Pereira. Por volta dos anos de 1977-78, ele esteve a frente de três

projetos: A fiel, Duelo de Exu e Boi Pintadinho. O primeiro é o registro da final do

Campeonato Estadual paulista de futebol conquistado pelo Corinthians por 1 X 0 sob a

Ponte Preta, encerrando seu “jejum” desde 1954 sem títulos da competição111. Segundo

consta, A fiel foi o filme mais visto enquanto imperou a obrigatoriedade de exibição do

filme curto112.

Outro bom curta é “A Fiel” de Lael Rodrigues, um documentário sobre o [time de futebol] Coríntians
paulista durante seus dois últimos jogos decisivos para vencer o campeonato. Uma montagem
incisiva cheia de momentos de grande emoção e com som direto, o que exclui necessidade de
113
narrador.

Lael conseguiu ganhar dinheiro com o filme A FIEL, um curta sobre a torcida do Coríntians que em
menos de um mês atingiu uma faixa inédita de bilheteria, atraindo mais público do que o longa
114
metragem em cartaz.

Duelo de Exu, a julgar por seu título, poderia seguir pelo campo das tradições afro-

brasileiras. Porém, como nem chegou a ser rodado tampouco se conseguiu maiores

informações sobre o filme, fica-se apenas a especular sobre seu conteúdo. Boi Pintadinho

“Movimento – Sua proposta se aproxima da de Nelson Pereira dos Santos em O amuleto de Ogum: um
cinema que retrata o povo com simpatia.
Waldyr Onofre – (...) Quando mostrei o argumento do Padeiro a Nelson, ele achou que estava na trilha de um
cinema popular, por isso produziu, é mais um trabalho de continuação do Nelson.”
110
Ramos, Fernão Pessoa, e Miranda, Luiz Felipe A. de (org.). Enciclopédia do cinema brasileiro. São Paulo,
Editora SENAC São Paulo, 2000, verbete ONOFRE, Waldyr, p. 406.
111
Conforme http://www.poderosotimao.hpg.ig.br/Esportes/5/interna_hpg4.html.
112
Sem autor. Lael Rodrigues, mineiro de coração, fala do sucesso de Bete Balanço. Estado de Minas. Minas
Gerais, 9 set 1984.
113
R. E. F. O diretor pode errar. E erra, quase sempre. O Estado de São Paulo. São Paulo, 26 mai 1979.
114
Press-book do filme Rádio pirata, p. 6. Pasta do filme. Arquivo do Museu de Arte Moderna (MAM), Rio
de Janeiro.

65
foi realizado para a Secretaria Estadual de Educação e Cultura do Rio de Janeiro e, por lidar

com uma tradição folclórica, talvez se assemelhe aos trabalhos desenvolvidos no registro da

festa do Divino e em Bon Odori.

Até aqui, é difícil esclarecer a relação de Lael Rodrigues com o Novo Cinema Popular.

Primeiro não foi possível ter acesso aos seus filmes, depois, desde 1975 ele trabalha em

filmes de fisionomia mais urbana, sem contar com o registro de expressões populares. De

qualquer forma, Lael testemunharia com o passar dos anos o enfraquecimento do projeto,
115
“perdendo-se na diversidade da produção” . Em Marcados para viver (Dir.: Maria do

Rosário Nascimento e Silva) ele assume a função de assistente de direção. O filme

ambienta-se na Zona Sul do Rio de Janeiro. Acompanha a trajetória de Jojô, uma pivete que

se veste com roupas masculinas, Rosa, prostituta e dançarina, e Eduardo, um marginal que

vive de pequenos assaltos. Eles, solitários e carentes, passam a morar juntos. À margem do

sistema, cultivam o prazer no amor livre, mas a liberdade, acreditam, só pode ser

conquistada através do dinheiro, proveniente de assaltos cada vez mais ousados, colocando

em risco suas próprias vidas. Apesar da trama ligada à delinqüência juvenil e à miséria, o

filme parece ter agradado os espectadores mais jovens116, sobretudo devido à atuação

espontânea117. Outro mérito do filme parece ser a trilha-sonora, utilizada de forma mais

115
Ramos, José Mário Ortiz. Cinema, estado e lutas culturais: anos 50, 60, 70. Rio de Janeiro, Paz e Terra,
1983, p. 132.
116
Press-book do filme Marcados para viver, p. 10. Pasta do filme. Arquivo do Museu de Arte Moderna
(MAM), Rio de Janeiro.
Sérgio Otero, ator do filme: “Assim que ele foi visto pelas primeiras pessoas, notei que os caras entre 16 e 20
anos acham o filme o barato, o podes crer ou qualquer outra manifestação de agrado como o próprio linguajar
do filme.”
117
Costa, Mauro José. Mito de juventude. Sem fonte. Sem data.
“Mas o que segura o desprevenido [espectador] é uma certa eletricidade, presente o tempo todo. (...) [os
personagens] trazem uma carga de vida, de risco, de novo que segura quem estiver aberto para ela (...). A
identificação que eles mantêm com os personagens permite uma espontaneidade, uma despreocupação que faz
com que todas as coisas fiquem à flor da pele. Dá uma sensualidade, um negócio de experiência viva que

66
inventiva, a impulsionar a narrativa ao invés de apenas comentá-la118. Em Marcados para

viver, Lael Rodrigues poderia observar aspectos de uma juventude contemporânea, a

despeito de sua condição desfavorável no filme. Aliás, este fato até favorecia a percepção

de certos aspectos resultantes da marginalização dos personagens, como a ausência de

questionamentos políticos119, que em Bete Balanço aparecerão como ação afirmativa. A

utilização da música como elemento de ação narrativa seria outro fato a ser usado no futuro.

Em 1976, Lael também é assistente de direção em Crueldade mortal (Dir.: Luiz Paulino

dos Santos), ambientado, contudo, no espaço da periferia. O filme é a livre adaptação de

fato real acontecido anos antes. Um velho só, tido como louco, sofre a omissão do Estado e

das pessoas alienadas em seus cotidianos de samba, religião, futebol. Vivendo em um

bairro pobre da periferia do Rio de Janeiro, certo dia o velho vê, involuntariamente, uma

mulher tomando banho e é linchado por causa disso, até mesmo por pessoas que não

sabiam o real motivo do ato, em uma espécie de catarse.

Vale lembrar sua participação como assistente de produção em Ovelha negra, uma

despedida de solteiro (Dir.: Haroldo Marinho Barbosa, 1974). O filme conta de forma

introspectiva a história das últimas 24 horas de solteiro de um playboy de família

tradicional no hotel Quitandinha, Petrópolis, em meados da década de 1940. Este foi o

percorre todo o filme. Uma disposição jovial. E eu acho que é essa sub-história jovial do filme que nos faz
sair do cinema lavados. Está no modo de interpretar e mesmo no que está sendo contado. Por trás ou através
[da história], com tudo isso, é um mito de juventude, um rito de passagem.”
118
Avellar, José Carlos. “Marcados para Viver”: a ação dos “B movies”. Jornal do Brasil. Rio de Janeiro, 27
e 28 nov 1976.
“A história se define não só pelas coisas que os personagens fazem e dizem (...), mas também pelos trechos de
música jogados sobre a imagem. (...), para substituir um diálogo, um comentário.”
119
Lopes, Oscar Guilherme. Opinião: Marcados para viver. Sem fonte. Sem data.
“A condição marginal das personagens exime-as de responsabilidade política, de qualquer “culpa” social –
afinal, eles sofrem os problemas sociais. Mas não tem consciência deles, nem vontade de agir sobre eles.
Preferem escapar da degradação pela violência (...). Como não há análise do grupo social, toda reação

67
primeiro filme em que Lael teve o contato com o adolescente e suas questões, no entanto,

em perspectiva bem melancólica. Como o casamento é relacionado ao término da

adolescência, o personagem principal, ao final, foge do evento para não se tornar adulto. No

entanto, morre em um acidente de carro. Um misto de condenação da sociedade por não

assumir a “vida adulta” e de redenção dada pelo diretor que o conserva adolescente para

sempre. A narrativa, por sua vez, é uma sucessão de seqüências estanques que encontram

tênue ou nenhuma ligação entre si, muito afeita ao Cinema Marginal. O filme de Marinho

Barbosa é a experiência em longa-metragem de características autorais que Lael mais se

envolve diretamente.

Em 1977, ao montar Se segura, malandro, de Hugo Carvana, toma contato com a comédia

urbana. O filme que carrega orgulhoso “o emblema do carnaval”120, dilui todos os conflitos

que dele poderiam advir. Talvez por isso este universo tenha seduzido Lael Rodrigues tão

rapidamente. Ele filma sua comédia urbana, Linhas cruzadas, ainda no mesmo ano. Ao que

parece, despido do elemento carnavalesco e de verve mais humorística. Hugo Carvana,

Denise Bandeira, Louise Cardoso e Anselmo Vasconcellos, do elenco de Se segura,

malandro, estão no filme121. Louise Cardoso faz o papel de uma atriz ipanemense que

conversa ao telefone com as tais linhas cruzadas122.

violenta das personagens é vista de uma perspectiva “fechada”, individualista, de atendimento a necessidades
imediatas, sem qualquer conotação política.”
120
Xavier, Ismail. Do golpe militar à abertura: a resposta do cinema de autor. In: O cinema moderno
brasileiro. São Paulo, Paz e Terra, 2001, p.107 e 109.
“A emergência do carnaval, a partir dos anos 70, é multiforme e se dá nas várias esferas de produção. (...) o
cineasta abandona a equação que une festa e alienação. Coroando uma constelação que inclui a mulata
sensual, o malandro, práticas religiosas populares e o futebol, o carnaval é revalorizado como emblema de
identidade nacional. (...) Via de regra, entretanto, na tela que nos devolve a festa, Brasil é amor, carnaval e
samba.”

68
Por esta época operavam-se mudanças estruturais no cinema brasileiros. Em 1974, iniciava-

se a gestão Roberto Faria (74/79) na Embrafilme. Segundo Amancio,

o setor cinematográfico conhece, a partir dos primeiros anos da década de 70, a fase áurea de sua
relação industrial intermediada pelo Estado e só sofrerá os primeiros revezes no início dos anos 80.
Neste período verá consolidar-se um mercado de amplas proporções, ainda que majoritariamente
123
ocupado pelo produto estrangeiro.

De fato, a reserva de mercado para o longa-metragem nacional no circuito exibidor passa

de 84 dias em 1974 para 140 em 1979; e o número de espectadores de filmes brasileiros

sobe de pouco mais de 30 milhões para quase 56 milhões, no mesmo período.124

Provavelmente devido à conjuntura aparentemente propícia, em 1976 é fundado o Centro

de Produção e Comunicação (CPC).

Voltadas diretamente para o nosso mercado, as produções do CPC têm sempre a preocupação de se
adequarem ao seu público. Vindos de uma informação eminentemente técnica – assistência de
direção, direção de produção, cenografia e montagem – Frazão, Cacá, Tizuka e Lael procuram
125
sempre realizar um trabalho de equipe, o que valoriza ainda mais a tarefa do diretor.

Até realizar Bete Balanço, Lael Rodrigues desenvolve uma série de atividades nos filmes

da produtora, onde recorrentemente encontra-se creditado como produtor executivo, diretor

de produção e montador. Os filmes do CPC, buscando aproximação com o público, flertam

com o filme de gênero: J. S. Brown, o último herói (Dir.: José Frazão, 1978) é uma

comédia, Gaijin, caminhos da liberdade (Dir.: Tizuka Yamasaki, 1979), um drama

histórico. O início da década de 1980 traz consigo uma debilidade política

(enfraquecimento do regime militar), cultural (ausência de planos para o setor) e econômica

121
Caetano, Maria do Rosário. Censura implica com Bete Balanço. Correio Braziliense. Brasília, 7 jun 1984.
122
R. E. F. O diretor pode errar. E erra, quase sempre. O Estado de São Paulo. São Paulo, 26 mai 1979.
123
Amâncio, Tunico. Artes e manhas da Embrafilme: cinema estatal brasileiro em sua época de ouro (1977-
1981). Niterói, EdUFF, 2000, p. 56.
124
Idem, pp. 57 e 61.
125
Press-book do filme J.S. Brown, o último herói, p. 2. Pasta do filme. Arquivo do Museu de Arte Moderna
(MAM), Rio de Janeiro.

69
(crescimento estagnado, inflação) ao país, abalando o setor cinematográfico. Contudo, a

empresa continua suas atividades através de Bar Esperança (Dir.: Hugo Carvana, 1982),

comédia que flerta com a linguagem da novela televisiva, e Rio Babilônia (Dir.: Neville

d’Almeida, 1982) que, na ausência de gênero melhor delineado, investe no impacto das

cenas de nudez e sexo como estratégia de apelo. Parahyba mulher-macho (Dir.: Tizuka

Yamasaki), no ano seguinte, retorna ao receituário do drama histórico.

No biênio 1977-78 o CPC participa da primeira fase de realização de A idade da Terra

(Dir.: Glauber Rocha). Estavam lidando diretamente com a produção do filme Tizuka

Yamasaki (assistente de direção e diretora de produção) e Cacá Diniz (produtor

executivo)126. Ela havia sido assistente de direção de Nelson Pereira em duas ocasiões (O

amuleto de Ogum, 1974, e Tenda dos milagres, 1977) e do próprio Glauber Rocha em outra

(Jorjamado no cinema, 1977)127. Ele, como diretor de produção, havia trabalhado em quase

dez produções cinemanovistas128. Lael Rodrigues, neste mesmo espaço de tempo,

provavelmente estava produzindo o filme de Frazão. Arriscaria dizer que a divisão de

tarefas do grupo talvez diga mais dos sócios da própria produtora do que das preferências

de Glauber em se trabalhar com esta ou aquela pessoa. Se o CPC produz um filme como A

idade da Terra, mesmo tendo a proposta clara e objetiva de se fazer filmes para o mercado,

é porque visava obter algum tipo de reconhecimento artístico de peso. Isto, parece-me, só

126
Conforme press-book do filme A idade da Terra, pp. 1-2. Pasta do filme. Arquivo do Museu de Arte
Moderna (MAM), Rio de Janeiro.
127
Ramos, Fernão Pessoa, e Miranda, Luiz Felipe A. de (org.). Enciclopédia do cinema brasileiro. São Paulo,
Editora SENAC São Paulo, 2000, verbete YAMASAKI, Tizuka, p. 578.
128
Press-book do filme Parahyba mulher-macho. Pasta do filme. Arquivo do Museu de Arte Moderna
(MAM), Rio de Janeiro.
Até então, havia trabalhado como diretor de produção em filmes de Nelson Pereira dos Santos (Como era
gostoso o meu francês, Quem é Beta?, Projeto Aripuana, O amuleto de Ogum, Tenda dos milagres), Paulo

70
poderia vir de Tizuka e Cacá. A trajetória de Lael direcionou-se para um cinema que se

distanciava gradativamente de projetos que guardassem resquícios de comprometimento

com uma continuidade do cinema moderno brasileiro e suas questões de identidade

nacional. A cada projeto Lael parece aproximar-se do tipo de relação que teria com o

público em Bete Balanço.

* * *

Acompanhar de forma panorâmica a trajetória cinematográfica de Lael Rodrigues não deve

consistir apenas em levantar hipóteses ou suposições de que ele tenha arregimentado

experiência e conhecimento somente nos filmes que ele tenha participado. Deste modo,

estaríamos subestimando e atrofiando sua capacidade crítica e analítica de perceber quais as

melhores estratégias para confeccionar seu primeiro filme.

Melhor entender sua trajetória dentro de um contexto mais amplo onde ele perceberia a

derrocada das estratégias de comunicação do Cinema Novo e via condições de ter uma

produção continuada através da “época de ouro” da Embrafilme. A indústria cultural se

solidificava no país e os cineastas cinemanovistas buscavam linguagens que garantissem

sua sobrevivência no mercado. Na década de 1970, observamos estratégias de comunicação

entre cineasta e público como o Novo Cinema Popular e o “emblema do carnaval” que,

com o tempo, não se sustentaram. Nos anos de 1980, toda esperança de uma concepção

industrial de cinema se vê ameaçada.

César Saraceni (Amor, carnaval e sonhos), Rui Guerra (A queda), Hector Babenco (Lúcio Flávio), Arnaldo
Jabor (Tudo bem).

71
Sob o aspecto da produção, a realização de Bete Balanço se deve à evolução de uma postura
assumida pela CPC (Centro de Produção e Comunicação) de equacionamento do custo do filme à
realidade do mercado, sem prejuízo da qualidade do produto final. Eu acho que a sobrevivência do
cinema num momento de crise como atual está intimamente ligado à esta questão. Não basta ser
sucesso de crítica e até de público, se o retorno do movimento de bilheteria não absorve os custos de
produção do filme. É preciso ampliar e baratear a produção para garantir a continuidade das
129
realizações.

Lael (...) procurou uma produção barata, capaz de dar retorno financeiro rápido. Ele explica por quê:
“Três das últimas produções do CPC – Rio Babilônia, Bar Esperança e Parahyba – estão na lista de
maiores rendas da Embrafilme (1º os Trapalhões, 2 º : Parahyba; 3º : Babilônia, 4º : Inocência, de
Walter Lima Jr., produção de L. C. Barreto, 5º : Bar Esperança). Mesmo assim, ainda não
recuperamos nossos investimentos, pois o produtor é o último a ser ressarcido. Frente a esta situação,
130
resolvemos investir num filme barato, de retorno mais rápido.”

O que foi decisivo para Lael Rodrigues conseguir uma efetiva aproximação com o público

foi uma radical mudança de perspectiva de abordagem. Em última instância, ele não tinha o

que falar ao espectador adolescente, um ponto de vista a defender, uma mensagem a

transmitir. Sendo assim, ele não estaria fazendo “concessões” de forma ou conteúdo de seu

cinema – o que parece ter sido um dos fantasmas do Cinema Novo.

Voltadas diretamente para o nosso mercado, as produções do CPC têm sempre a preocupação de se
adequarem ao seu público.

Com a crise que se abatia no início da década de 1980, era importante que Lael seguisse à

risca a premissa do grupo.

Tem dois pontos, que devem ficar bem claros. Um, é o que eu pensava em termos de com quem eu
quero me comunicar, que tipo de filme eu quero fazer. Esse público jovem é o público que
sempre me atraiu. (...) E a história nasceu dessa minha vontade de me comunicar com esse público,
somado um pouco ao que a gente discutia na CPC, que era a necessidade da gente ter um filme que
fosse um filme de comunicação maior do que o que a gente vinha fazendo, apesar de que os
131
nossos filmes anteriores foram de certa forma sucesso.

Eu parti muito do que eu queria fazer da necessidade que via de um público jovem ter um
produto cultural, principalmente dentro do cinema, filmes com a sua linguagem, a sua
identidade. E aí você vai somando toda a sua experiência dentro do que já foi feito no cinema,

129
Press-book do filme Bete Balanço. Pasta do filme. Arquivo do Museu de Arte Moderna (MAM), Rio de
Janeiro.
130
Caetano, Maria do Rosário. Censura implica com Bete Balanço. Correio Braziliense. Brasília, 7 jun 1984.
131
Comunicação com o público jovem. In: Filme e Cultura n° 48 – Diretores estreantes. Fundação do
Cinema Brasileiro, Novembro, 1988, p.139

72
dentro do que está sendo feito em outros veículos. Traduzir isso para o filme não foi uma coisa
132
ligada a qualquer influência em torno de outros filmes. Não havia referência.

Naquela época o rock ainda estava numa faixa de retomada. Eu acho que esse negócio de linguagem
é muito acompanhamento da vida. O que se vinha fazendo em termos de cinema para jovem era
uma coisa colocada a nível da (sic) experiência do diretor, da juventude dele colocada no
cinema, quando você tem que ver a juventude do momento, o que que você está vivendo, o que
que você está pensando, e como ela muda muito rapidamente você tem que acompanhar muito
rapidamente essas mudanças, as características e as tendências (...). O videogame, o computador, a
informática, são coisas presentes e que não se estava utilizando numa linguagem de cinema, e a gente
foi descobrindo tudo isso. Não foi uma coisa também preconcebida, mas que a gente foi intuindo na
133
medida em que foi realizando.

A proposta de Lael para a boa receptividade de Bete Balanço consistiria, então, em se

perceber as atualidades de uma certa juventude (urbana e pequeno-burguesa) para

reproduzi-las no cinema, ao mesmo tempo, refletindo-as e reforçando-as. Seria preciso

reconhecer suas práticas para que elas mesmas legitimassem o filme em sua intenção de

comunicabilidade. Assim, a idéia-chave para o sucesso de um filme passava a ser

segmentar-se no mercado. Não bastava imaginar que a produção de filmes geraria sua

própria demanda (como na Vera Cruz), que ao se lançar um filme este se comunicaria com

o povo (Cinema Novo) ou que por registrá-lo ele se reconheceria (Novo Cinema Popular).

Era preciso, na realidade, escolher um grupo social, estar sintonizado a seus gostos

estéticos, valores e temores, isto é, apreender sua mentalidade, trabalhá-la

cinematograficamente (“traduzir isso para o filme”) e devolvê-la ao próprio grupo.

Me dá Vontade de Saber, Aonde Está Você – Breve Sugestão de


Filmografia Adolescente Nacional

132
Idem, pp. 142 e 143.
133
Idem, p.140.

73
Não pretendo aqui fixar datas, definir pontos de inflexão, caracterizar tendências ou

delimitar períodos de uma genealogia do filme nacional voltado para o público adolescente

(se é que ela existe). Tento, isto sim, tão somente investigar, através do levantamento de

alguns títulos aos quais tive acesso, se Lael Rodrigues poderia ter buscado respaldo no

próprio cinema brasileiro para a realização de um filme como Bete Balanço.

O critério para a escolha destes títulos foi bastante simples, a presença de protagonistas

adolescentes ou histórias destinadas a este segmento em filmes lançados até 1984, ano de

estréia de Bete Balanço nos cinemas. No entanto, tal simplicidade não deixou de trazer

consigo diversos problemas.

Primeiro, a presença de protagonistas adolescentes não significa, necessariamente, que as

histórias sejam destinadas ao público de mesma faixa etária. Preferi, mesmo assim, citar os

filmes censurados ou que considerei sem apelo ao espectador juvenil por entender que eles

refletem e constroem um imaginário sobre o adolescente com o qual Lael pode ter se visto

obrigado a dialogar. Vice-versa, a ausência de protagonistas adolescentes não corresponde,

necessariamente, a idéia de que os filmes não têm apelo junto ao público jovem. Fato

bastante interessante que pode ter servido de medida ao diretor do que é mais

especificamente atrativo a este tipo de espectador.

Depois, houve dificuldades no que se refere a que fase da vida de uma pessoa corresponde

a adolescência. Mais do que comprimida entre idades, a adolescência – de acordo com um

senso comum muito encontrado nos próprios filmes – parece se definir por limites de

esferas distintas. Se, por um lado, seu início é muito associado às mudanças físicas e

74
psíquicas relativas ao corpo do indivíduo – mudanças morfofisiológicas, a descoberta da

sexualidade – e ao amadurecimento social – descoberta do amor ou perda de um ente


134
querido – , por outro, seu término parece corresponder com maior facilidade ao assumir

de responsabilidades entendidas como “inerentes” à “vida adulta” mais tradicional –

constituição de família, inserção no mercado de trabalho135.

Outro problema, decorrente do anterior, é o alargamento da faixa etária da adolescência,

que resulta no bizarro agrupamento de indivíduos de idade entre 12 e 25 anos (!). Isto

obriga relacionar filmes díspares, no que se refere a quais dos conflitos apontados acima

passa o personagem adolescente. Mesmo assim, a filmografia nacional, a julgar pela

quantidade de filmes selecionados, pouco contemplou o período da adolescência. O que,

por sua vez, influiu na opção em manter a flexibilização da escolha de títulos.

De qualquer forma, fica aqui uma humilde e breve sugestão de filmografia adolescente

nacional136 – se ela for possível de ser constituída. Um dos vários capítulos que a literatura

cinematográfica brasileira ainda não escreveu.

134
Enquanto Viagem aos seios de Duília (Dir.: Carlos Hugo Christensen, 1964) pode exemplificar ambos os
casos apontados, Menino de engenho (Dir.: Walter Lima Jr, 1965) detém-se mais especificamente sobre o
processo de amadurecimento, e Lição de amor (Dir.: Eduardo Escorel, 1976), Pecado horizontal (Dir.: José
Miziara, 1982), Amor estranho amor (Dir.: Walter Hugo Khouri, 1982), A menina do lado (Dir.: Alberto
Salvá, 1987) e A ostra e o vento (Dir.: Walter Lima Jr, 1997) fazem o mesmo abordando a descoberta da
sexualidade.
135
A expectativa e a pressão da sociedade tradicional pela “tomada de consciência” e de “responsabilidade”
do indivíduo que adentra a “vida adulta” é trabalhada (e criticada) em Ovelha negra, uma despedida de
solteiro (Dir.: Haroldo Marinho Barbosa, 1974). O personagem interpretado por Joel Barcelos está na véspera
de seu casamento. Em dado momento, quando repreendido pela velha empregada por querer drogar-se com
lança-perfume, assim declara: “E você? Se esqueceu que só amanhã que eu vou tomar juízo? Que só amanhã
que eu vou ser adulto? Que hoje eu ainda sou adolescente?”
136
Dada a escassa quantidade de filmes coletados bem como uma total ausência de estudos sobre o tema,
entenda-se por filmografia adolescente nacional – com todos os problemas que desta definição possam advir
– o conjunto de filmes brasileiros (direta ou indiretamente) voltado para o público adolescente e/ou de
protagonistas adolescentes.

75
* * *

Para não se voltar tanto assim no tempo, talvez se possa começar pelos filmes cariocas de

comédia popular urbana da década de 1960. Títulos como Toda donzela tem um pai que é

uma fera (Dir.: Roberto Farias, 1966), de forma geral, têm como protagonistas principais

jovens bon vivants ou playboys do sexo masculino. De classe-média, não estudam

tampouco trabalham e tem idade entorno dos 18 anos. Comumente, o enredo deste tipo de

filme trata do envolvimento dos personagens em qüiproquós amorosos. Apesar de

trabalharem com o apelo de “liberação de costumes” da época junto ao público, são

conservadores em relação ao namoro, sexo, casamento, família e trabalho. Estes filmes

visavam a grande bilheteria e, caso não tenham esbarrado na censura por um incipiente

erotismo, devem ter tido plena aceitação do público adolescente por suas tramas leves,

cheias de correria e humor. Assim, de forma imediata e sem levantar maiores questões,

pode-se associar a Toda donzela... filmes como Todas as mulheres do mundo (Dir.:

Domingos de Oliveira, 1966), Edu coração de ouro (Dir.: Domingos de Oliveira, 1968), Os

paqueras (Dir.: Reginaldo Faria, 1969) e Prá quem fica, tchau (Dir.: Reginaldo Faria,

1970). Com alguma variação sobre as características apontadas, alinham-se a eles A

penúltima donzela (Dir.: Fernando Amaral, 1969) – de protagonista principal feminina – e

Copacabana me engana (Dir.: Antônio Carlos da Fontoura, 1969) – de carga mais

dramática.

Na segunda metade da década de 1960, tangenciando as chanchadas carnavalescas em seu

oportunismo mercadológico musical, realizaram-se filmes que apostavam na popularidade

76
de artistas musicais em evidência. Assim, os ídolos adolescentes da Jovem Guarda foram

transformados protagonistas de filmes.

Os anos 60 marcaram a produção brasileira com os filmes do Cinema Novo, mas musicalmente a
Jovem Guarda deixou uma série de filmes de cunho comercial, em que se sucediam as participações
musicais (...). Mais intensas foram as aparições de Jerry Adriani, nascido Jair Alves de Sousa, que
atuou em Essa gatinha é minha (1966), de Jece Valadão; Jerry – a grande parada (1967) e Em busca
do ouro (1967), ambos de Carlos Alberto de Souza Barros. No primeiro, ele fez dupla com Pery
Ribeiro (...). A Jovem Guarda também teve os seus conjuntos musicais, e, no cinema, Os Incríveis
protagonizaram um filme rodado em vários países intitulado Os Incríveis neste mundo louco (1966),
137
dirigido por Paulino Brancato Jr., empresário do grupo.

Outros artistas deram continuidade ao filão, como Wanderléia em Juventude e ternura

(Dir.: Aurélio Teixeira, 1968), Wanderley Cardoso em Pobre príncipe encantado (Dir.:

Daniel Filho, 1969) e a trilogia estrelada por Roberto Carlos e dirigida por Roberto Farias –

Roberto Carlos em ritmo de aventura (1968), Roberto Carlos e o diamante cor de rosa

(1970) e Roberto Carlos a 300 km/h (1971). Vale lembrar que Teixeira, em 1966, dirigira

Na onda do iê-iê-iê, sem cantores de sucesso como protagonistas, mas recheado de

números musicais destes. Por outro lado, Janaína, a virgem proibida (Dir.: Olivier Perroy,

1972), apesar de protagonizado por Ronnie Von e deste interpretar um ídolo rock, está

distante de qualquer apelo juvenil – uma equivocada mistura de conflito familiar, complexo

de Édipo, trama policial, amor impossível e candomblé, além de degradar o show business

musical, que tanto parece fascinar o público.

A referência à chanchada abre espaço para citar Rio, verão e amor (1966). Embora não

conte com ídolo musical algum, o filme dirigido por Watson Macedo – considerado o

realizador do filme que definiu o gênero, Carnaval no fogo (1949)138 – não ignora a

137
Ramos, Fernão Pessoa, e Miranda, Luiz Felipe A. de (org.). Enciclopédia do cinema brasileiro. São Paulo,
Editora SENAC São Paulo, 2000, verbete CANTORES-ATORES, p. 84.
138
Augusto, Sérgio. Este mundo é um pandeiro: a chanchada de Getúlio a JK. São Paulo, Companhia das
Letras / Cinemateca Brasileira, 1989, p.117.

77
ascensão do rock’n’roll na predileção musical da juventude. Pelo contrário, a trama

consiste na disputa de dois rapazes, um bossanovista e outro roqueiro, pelo amor de uma

bela garota. Praia, músicas, qüiproquós amorosos e até mesmo proto-videoclipes dão a

tônica da narrativa. Note-se que Macedo, em oportunidade anterior, abrira espaço ao

rock’n’roll em Alegria de viver (1957) – mesmo ano em que Carlos Manga dirige De vento

em popa, também com números musicais do estilo – , e Agüenta o rojão (1958).

O Cinema Novo, que “pretende agora ampliar seu campo de ação e seu mercado interno,

numa dupla ofensiva em que se confundem interesses culturais e comerciais.”139, faz uso do

mesmo receituário de Rio, verão e amor. Em 1967, Leon Hirszman adapta para as telas de

cinema a bossa-nova Garota de Ipanema, de Tom Jobim e Vinícius de Moraes. O filme, de

título homônimo à canção, explora a beleza do litoral carioca e da protagonista Márcia

Rodrigues. “A participação de astros da música popular e de suas canções permeia todo o

filme em ritmo parecido ao que hoje seria um videoclipe. Aparecem, além de Vinicius de

Moraes, Chico Buarque, Nara Leão, Ronnie Von, o MPB-4, acompanhados de uma trilha-

sonora que vai da bossa-nova ao iê-iê-iê, passando pelas melosas canções norte-americanas

de sucesso na época.”140 No entanto, a aparente confraternização de ritmos, imagens e

questões cinematográficas parece ter tido um resultado um tanto melancólico no que se

refere à abordagem sobre o tema da adolescente em maturidade141.

139
Viany, Alex; organização: José Carlos Avellar. Cinema no Brasil: o velho e o novo. In: O processo do
cinema novo. Rio de janeiro, Aeroplano, 1999, p. 183.
140
Ramos, Fernão. Os Novos Rumos do Cinema Brasileiro (1955-1970). In: História do Cinema Brasileiro.
São Paulo, Art Editora, 1987, p. 372.
141
Viany, Alex; organização: José Carlos Avellar. Leon Hirszman. In: O processo do cinema novo. Rio de
janeiro, Aeroplano, 1999, p. 297.
Nesta entrevista à Alex Viany, Leon Hirszman define Garota de Ipanema “um pouco como a “Cinderela
frustrada de Ipanema””. Afirma ter como intuito “a antimistificação daquela garota que não era feliz” e voltar-

78
Ao longo dos anos, produziram-se filmes que, não obstante a presença de adolescentes

como protagonistas, em pouco ou em nada buscaram apelo junto ao público desta faixa

etária. Pode-se citar os filmes que exploraram o tema da delinqüência juvenil. São dramas

ou policiais ou ainda, se possível, dramas policiais protagonizados por jovens que lidam

com promiscuidade sexual, violência e vício em drogas. Temas que permeiam filmes como

Lance maior (Dir.: Sylvio Back, 1968), Anjos e demônios (Dir.: Carlos Hugo Christensen,

1970), A morte transparente (Dir.: Carlos Hugo Christensen, 1978), Amor bandido (Dir.:

Bruno Barreto, 1978) e Beijo na boca (Dir.: Paulo Sérgio de Almeida, 1982). Retratam uma

“juventude perdida”, de distante convivência com os pais e (por isso) sem valores morais, o

que (inexoravelmente) a leva a um fim desafortunado. Outros filmes preferiram abordar a

realidade sócio-político-econômica do país através dos jovens ao invés do movimento

contrário, como Cléo e Daniel (Dir.: Roberto Freire, 1970), André, a cara e a coragem

(Dir.: Xavier de Oliveira, 1971) e Nunca fomos tão felizes (Dir.: Murilo Salles, 1983).

Acredito que, ao usarem o personagem adolescente como suporte para a exposição de suas

teses, mas não como fim das mesmas, estes filmes perdem apelo junto ao espectador mais

jovem. Em lugar de traçarem um “diagnóstico” do que é ser adolescente brasileiro nas

determinantes sócio-politico-ecômicas de sua época, os filmes são concebidos, antes de

tudo, como crítica ao establishment e, de modo geral, pouco importa à narrativa se o

personagem é adolescente ou não. Da mesma forma, os filmes de protagonistas jovens do

Cinema Marginal observariam este mesmo raciocínio. Por fim, a década de 1970 trouxe

consigo a estabilização da pornochanchada e esta a erotização de filmes com alguma

se contra a falta de valores da juventude alienada, no que identifica como “uma fossa nisso [na falta de
valores], uma tristeza, uma dor, que é a não-realização das pessoas e Garota tentou refletir sobre isso”.

79
pretensão artística, mas que não queriam baixos resultados de bilheteria. Apesar de

direcionados ao público adulto, utilizaram o jovem como personagem de certa recorrência.

Talvez explique-se o fato se considerarmos que os filmes – por mais que se discriminem

características, temas ou intenções de cada um – não abdicam da exposição de corpos,

sobretudo femininos, nus e/ou de cenas de sexo. Confere maior atrativo ao público a beleza

estética tanto quanto possível desses corpos, justificando o recrutamento de jovens atores.

Assim, por exemplo, reedita-se o personagem do jovem bon vivant ou playboy, só que em

aventuras eróticas mais ousadas, como em Cassy Jones, o magnífico sedutor (Dir.: Luís

Sérgio Person, 1972) e Quando as mulheres querem provas (Dir.: Cláudio MacDowell,

1975). Filmam-se ainda “folclóricos” fetiches adolescentes – Como é boa a nossa

empregada (Dir.: Victor Di Mello, 1976) – ; jovens em dramas familiares – As moças

daquela hora (Dir.: Paulo Porto, 1974) e Giselle (Dir.: Victor Di Mello, 1980) – ; dramas

existenciais devido a eminência da “vida adulta” – Uma mulher para sábado (Dir.:

Maurício Rittner, 1970) e Filhos e amantes (Dir.: Francisco Ramalho Jr., 1981) – e; farras

anárquicas – tanto o elenco de apoio de Uma pantera em minha cama (Dir.: Carlos Hugo

Christensen, 1971) quanto o principal de Essa gostosa brincadeira a dois (Dir.: Victor Di

Mello, 1974). A profusão de títulos de conteúdo erótico dá margem a casos curiosos, como

os de O bem dotado - o homem de Itu (Dir.: José Miziara, 1977), Emmanuelo, o belo (Dir.:

Nilo Machado, 1978) e O erótico virgem (Dir.: Mozael Silveira, 1978). Nestes filmes, os

atores de personagens adolescentes não têm o physique du role condizente ao papel, são

nitidamente (muito) mais velhos. No entanto, isto é usado a favor de seus enredos,

procurando ressaltar um efeito cômico. Em Shock (Dir.: Jair Correia, 1983) jovens são

mortos por violento assassino em uma pasteurização dos slasher movies estadunidenses,

sobretudo os da série Sexta-feira 13 (Friday the 13th), adicionada de maiores doses de

80
erotismo. Já em O olho mágico do amor (Dir.: Ícaro Martins e José Antonio Garcia, 1982)

pesquisas cinematográficas de estética e linguagem, metacinema e psicanálise caminham

harmoniosamente ao lado de cenas de nudez e sexo sob medida para um público menos

exigente.

Minha namorada (Dir.: Zelito Viana e Armando Costa, 1970) e Marcelo Zona Sul (Dir.:

Xavier de Oliveira, 1970) fazem parte dos escassos exemplos de filmes que se preocuparam

em retratar o cotidiano dos adolescentes para o espectador de mesma faixa etária. O

relacionamento com pais, amigos e namorados são abordados sem restrições de qualquer

espécie. É possível perceber em ambos os filmes, no entanto, uma falta de ânimo ou

vitalidade, qualidades normalmente associadas a esta fase da vida. O primeiro, possui

protagonistas insossos, quase indiferentes ao que se passa com eles mesmos. O outro,

apesar de toda energia apresentada pelo personagem de Stepan Nercessian, encerra sua

projeção em uma perspectiva bastante melancólica. Mais de uma década depois, Asa

Branca, um sonho brasileiro (Dir.: Djalma Limongi Batista, 1981) e Inocência (Dir.:

Walter Lima Jr., 1983), apesar de cinematograficamente mais instigantes, pouco

acresceram à questão. Poéticos, líricos e interessados em uma narrativa que cativasse o

espectador, preocuparam-se mais em garantir a aceitação de um público amplo do que se

direcionar ao adolescente.

Cainguange - na pontaria do diabo (Dir.: Carlos Hugo Christensen, 1974) aborda o

público, adolescente inclusive, de outra forma. Sem personagens juvenis, mas com bastante

ação. Trata-se de um filme de aventura, mais especificamente, um faroeste passado na

81
fronteira do Mato Grosso com o Paraguai. Mocinho, bandidos, socos, pontapés e tiros

parecem garantir um entretenimento sem maiores compromissos.

O fascínio da ação e da aventura atrelado, agora, à figura de um ídolo esportivo ganha as

telas em filmes como Garrincha, alegria do povo (Dir.: Joaquim Pedro de Andrade, 1963)

e O fabuloso Fittipaldi (Dir.: Hector Babenco, 1975). São documentários que acompanham

as proezas dos atletas que dão título aos filmes. No entanto, acredito que o jovem

espectador seja apenas parte de um público mais amplo a prestigiá-los.

* * *

A análise dos filmes mencionados refletiria um suposto diálogo de Lael Rodrigues com a

filmografia adolescente nacional. Se, em algum momento, ele buscou um solo seguro a ser

trabalhado, encontrou experiências escassas, mas de certa variedade.

O primeiro fato para o qual atentaria seria a já citada escassez de filmes nacionais voltados

para o público adolescente. Em seguida, que grande parcela destes filmes tinham o público

adolescente com uma das faixas de público mais amplo que visavam conquistar. Por

conseguinte, ficavam de fora das histórias as questões mais cotidianas da adolescência e, no

lugar delas, investia-se mais sobre outros aspectos, tais como o humor (nas comédias

populares cariocas urbanas da década de 1960) e a ação (nos filmes de aventura). O que,

por sua vez, permite perceber o porquê dos atores escalados para interpretar adolescente há

muito já não o serem. Duas declarações de Lael Rodrigues reportam-se a estas demandas.

Segundo ele, Bete Balanço visa

82
desenvolver em cinema um retrato mais vivo do que é a manifestação jovem atual, em temática e
linguagem. Um filme para um segmento do público jovem que nunca foi visto, sequer ouvido e
jamais viu sua imagem em cinema. Como autor, me defini pela comunicação com essa faixa de
espectadores, tentando oferecer mais do que pura diversão e botar na tela personagens vivos, com a
maneira natural dos jovens de encarar coisas como o sexo, o homossexualismo e as drogas. A
possibilidade de gostar do que se faz e ter prazer, sem precisar sentir culpa. Pessoas que
transformaram a batalha da vida numa coisa boa, sem amarguras, rica em experiências. Assim são os
personagens de Bete Balanço, porque eu acho que assim se expressa uma parcela considerável de
142
jovens brasileiros.

É mais voltado para a juventude, mas com toques maiores de vida do que o que tem sido feito. Diz
mais das barras, das relações dos jovens, fazendo uma reflexão sobre isso. Mas não uma reflexão de
cima para baixo, e sim linear, que todo mundo faz no dia a dia. Apresenta uma perspectiva positiva
de vida, com a personagem enfrentando as dificuldades, os contratempos, sempre como parte da
143
vida, sempre com vontade que tudo dê certo.

Lael deixa clara sua intenção em contemplar objetivamente o público adolescente e as

atuais problemáticas que o envolvem. Desta forma, o diretor, além de promover este

público à rara condição de público-alvo, escala como protagonista uma atriz de idade

próxima da personagem adolescente que interpreta144 e elege a experiência cotidiana

juvenil como prioritária145. Soma-se a estas decisões, a resolução de Lael em enfatizar uma

perspectiva positiva de abordagem. Pretendia ele debruçar-se sobre o tema da adolescência

com vitalidade de conteúdo e narrativa nem sempre exercitadas por filmes de mesmo

assunto146.

142
Press-book do filme Bete Balanço. Pasta do filme. Arquivo do Museu de Arte Moderna (MAM), Rio de
Janeiro.
143
Salem, Helena. ‘Bete Balanço’, a roqueira que vem das Gerais, começa a nascer no Voador. O Globo. Rio
de Janeiro, 22 dez 1983.
144
Reginaldo Faria e Paulo José interpretaram adolescentes bon vivants em Toda donzela tem um pai que é
uma fera e Cassy Jones, o magnífico sedutor, respectivamente. Por ocasião destes filmes, tinham as idades de
28 e 35 anos, nesta ordem. Seus personagens, na realidade, vivem em uma “adolescência tardia”, um limbo
entre o término dos estudos e a longínqua decisão de trabalhar. É verdade que os personagens não têm a idade
de seus intérpretes, mas eles também estão longe dos 18 anos nos próprios filmes. Débora Bloch, aos 21 anos,
interpretou uma adolescente de 17 em Bete Balanço.
145
Assim, Bete Balanço move-se em direção oposta a dos filmes que usaram do personagem adolescente
como simples suporte para a exposição de suas teses, que em pouco ou em nada discutiam este período da
vida.
146
Machado Jr, Roberto. Sem título. Jornal do Brasil. Rio de Janeiro, 01 jul 1985.
Yoya Würch, co-roteirista do filme, reafirma a posição de Lael Rodrigues ao comentar sobre Bete Balanço:
“Eu não queria escrever uma história triste. Quando você faz um filme nesse gênero, a mensagem deve ser
para cima.”

83
Acredito que a articulação de todos estes fatores – adolescente como público-alvo,

exploração de sua experiência cotidiana e abordagem positiva – encontre expressão

máxima no tratamento dado às questões de sexo, homossexualismo e drogas em Bete

Balanço. O filme tenta reproduzir o que Lael entende como sendo a “maneira natural dos

jovens de encarar” estes assuntos à época. Atentemos, um tipo específico de jovem. Aquele

imerso na sociedade capitalista, morador de grandes centros urbanos e produto de sua

história. Esta última nos recorda que, se há muito tempo a diferença existente entre os

papéis sociais masculinos e femininos já estava esfacelando-se pela obsolescência da

divisão sexual do trabalho – liberando homens e mulheres de uma dependência mútua (o

casamento) decorrente dessas áreas de atuação social –, a revolução sexual das décadas de

1960/70 desvinculou o ato sexual da reprodução (advento de novos métodos contraceptivos

mais eficazes), passando as relações entre indivíduos a serem reguladas apenas pelo

prazer147. Os fatos conjugados acabam por retirar ou aliviar estigmas sobre o sexo sem

compromisso e o homossexualismo. As drogas, neste ínterim, passam a ser toleradas em

uso recreativo. Assim, o jovem de Bete Balanço tem “a possibilidade de gostar do que se

faz e ter prazer, sem precisar sentir culpa”, distante do estereótipo do delinqüente juvenil.

Outro clichê (negativo) com o qual Lael teve de lidar foi com o dos jovens bon vivants ou

playboys. Em certa entrevista,

(...) Lael atribui o sucesso à linguagem ágil, às formas muito gráficas e ao próprio conteúdo do filme,
148
onde o jovem não é colocado como alienado e ocioso (...).

147
Durham, Eunice R.. Família e reprodução humana. In: Perspectivas antropológicas da mulher 3. Rio de
Janeiro, Zahar Editores, 1983.

84
Mais uma prova de sua vontade em retratar o jovem positivamente, participativo em sua

sociedade, ao invés de apenas entretido em aventuras amorosas. No entanto, esta nova

abordagem não corresponde a mostrar o jovem “socialmente participativo”, isto é,

imputando às suas atividades um sentido de engajamento social – como entendido pelo

Cinema Novo. Significa, isto sim, abordar sua inserção na sociedade por aquilo que a

caracteriza, o capitalismo, através dos sonhos e tentativas de ascensão social.

Um dos poucos pontos característicos a filmes anteriores a Bete Balanço com o qual Lael

não teve atrito foi o da estratégia de veiculá-lo ao ritmo musical de sucesso no momento.

Fórmula de grande empatia, facilita o consumo imediato.

Bete Balanço incorporou a linguagem do vídeo clip e do rock, em especial, como expressão própria
do jovem, de uma geração que pouco teve acesso à formação política e cultural mais ampla e se
apegou à música. O rock é o elemento de maior identidade com o público que eu queria me
149
comunicar.

O fascínio do público pelo sucesso dos artistas musicais – que parece ser tão peculiar a este

tipo de filme – foi plenamente utilizado: nele está baseado o argumento de Bete Balanço, a

história da menina que quer ser roqueira famosa. O filme ainda se vale da presença de

músicos em papéis secundários (Cazuza) e em breve aparições (Lobão), cantando. No

entanto, ao contrário dos filmes estrelados pelos ídolos da Jovem Guarda, estes artistas,

como os outros de sua geração, ainda não eram consagrados pelo público150.

148
Bisordi, Gisela. “Bete Balanço” chega a São Paulo pelo Anhembi. Folha de São Paulo. São Paulo, 30 ago
1984.
149
Press-book do filme Bete Balanço. Pasta do filme. Arquivo do Museu de Arte Moderna (MAM), Rio de
Janeiro.
150
Dapieve, Arthur. BRock: o rock brasileiro dos anos 80. Rio de Janeiro, Editora 34, 1995, pp. 50 e 69.

85
Acredito que outros pontos pacíficos localizam-se, paradoxalmente, na (imprópria para

menores) pornochanchada. As gags imaginosas151 e a liberdade narrativa semelhante ao de

“causos”, comuns ao gênero, podem ser aproximadas às cenas cômicas do personagem

Paulinho (Diogo Vilela). Se a pornochanchada usufrui os novos pontos de vista em relação

ao corpo – advindos da liberação de costumes das décadas de 1960/70 –, Bete Balanço,

além de relacionar-se diretamente com o apelo erótico das cenas de nudez e de sexo do

gênero, atualiza-o. Na exploração das imagens de nudez de Bete (Débora Bloch) e do torso

atlético de Rodrigo (Lauro Corona), apreende o surgimento do culto ao corpo, uma nova

perspectiva que se estabelece no início dos anos de 1980.

Bete Balanço deixa de explorar apenas dois temas dos quais considerei de algum apelo ao

público adolescente também, a ação do filme de aventura e a prática esportiva.

A suposição de um diálogo de Lael Rodrigues com a filmografia adolescente nacional

atestaria, sobretudo, seu interesse em trabalhar o público adolescente de forma diferenciada.

A maior parte das investidas cinematográficas anteriores não tratou o adolescente e suas

problemáticas como primárias e, mesmo havendo uma certa variedade de abordagens, essas

escassas tentativas trouxeram consigo a formação de alguns poucos, mas sólidos

estereótipos. Ou melhor, estigmas sobre o jovem e a juventude. Assim, a partir de duas

frentes de ação – privilegiar o enfoque no adolescente e em suas problemáticas, e desfazer

os estigmas sobre o jovem e a juventude –, Lael tenta reformular a aparição do jovem na

tela para que, de fato, o público adolescente se reconheça e compareça às bilheterias.

151
Ramos, Fernão Pessoa, e Miranda, Luiz Felipe A. de (org.). Enciclopédia do cinema brasileiro. São Paulo,
Editora SENAC São Paulo, 2000, verbete PORNOCHANCHADA, p. 432.

86
Agora Eu Quero é no Grito: A Contemporaneidade de Bete Balanço
– O Apelo Junto ao Público e a Reação da Crítica

Deve-se atentar, sobretudo, às experiências cinematográficas que lidaram com a

adolescência na virada da década 1970 para a de 1980. Se uma sugestão de filmografia

adolescente nacional coloca em perspectiva como o cinema brasileiro trabalhou o

adolescente – permitindo reconhecer formas e fórmulas de ver e abordar –, a análise deste

novo conjunto de filmes colabora na observação de como os cineastas contemporâneos a

Lael dialogaram com as mesmas questões que ele. Cabe, aqui, examinar de que forma eles

o fizeram, investigar suas perspectivas, e confrontá-los com o filme de Lael no intuito de

verificarmos o avanço das discussões sobre o jovem à época e nelas localizarmos o papel

de Bete Balanço.

* * *

Dois filmes de 1978 devem ser lembrados, Nas ondas do surf (Dir.: Lívio Bruni Júnior)152 e

Nos embalos de Ipanema (Dir.: Antônio Calmon)153. O primeiro, é um documentário sobre

152
“O primeiro documentário brasileiro sobre surf”, conforme material publicitário do filme reproduzido no
site http://www.cineclubediablo.blogger.com.br
153
Press-book do filme Nos embalos de Ipanema. Pasta do filme. Arquivo do Museu de Arte Moderna
(MAM), Rio de Janeiro.
Press-book do filme Menino do Rio. Pasta do filme. Arquivo do Museu de Arte Moderna (MAM), Rio de
Janeiro.
Nos embalos de Ipanema pode ser encarado como uma espécie de ensaio para a trilogia adolescente
inconclusa da dupla Antonio Calmon (direção) e André de Biase (ator) – iniciada com Menino do Rio,
seguido de Garota dourada e Menina veneno (não realizado). Em Nos embalos de Ipanema, o diretor adianta
alguns aspectos que seriam aprofundados ou revisados nos próximos, como a prática do surfe e o estereótipo
do jovem surfista, respectivamente. Calmon e de Biase, dentre outros filmes, também foram parceiros em
Terror e êxtase (1979), realizado entre Nos embalos de Ipanema e os filmes da trilogia. Apesar disso, Terror e

87
surfe, um dos chamados “esportes radicais”. Quase a totalidade do filme resume-se a

imagens de sua prática, enaltecidas pela voz do narrador. Nas ondas do surf tem aí sua

importância, ao direcionar os filmes sobre esporte ao público adolescente, identifica e

difunde hábitos e práticas da juventude da época. Em resumo, o público adolescente tem a

oportunidade de reconhecer-se.

Narrando a história de um grupo de rapazes da Zona Norte do Rio de Janeiro que atravessa o túnel
Rebouças em direção as badaladas praias cariocas como surfistas, Embalos de Ipanema (sic) pretende
ser uma crônica de costumes dos hábitos de uma juventude que se desenvolveu de modo acelerado
nos últimos anos. Uma geração que, por falta de alternativas, acaba tendo até que se prostituir para
154
sobreviver num universo consumista.

A passagem acima, retirada de uma crítica, descreve muito bem o enredo de Nos embalos

de Ipanema, mas falha ao avaliar a temática do filme. Toquinho (André de Biase) é um

adolescente de origem humilde, morador do subúrbio que vive com a mãe e a irmã mais

nova e adora surfar. De fato, ele participa de uma geração “menos ingênua”, de maior

acesso à informação, que encara aspectos da “vida adulta” mais cedo. No entanto, não é a

falta de perspectivas que o leva à prostituição. Sintomaticamente, a primeira imagem do

filme é uma cartela com os consagrados versos de Sossego, de Tim Maia. Na banda sonora

apenas silêncio.

Ora bolas
Não me amole
Com esse papo
De emprego
Já falei
Não estou nessa
O que eu quero
É sossego

êxtase investe sobremaneira em certos temas associados à delinqüência juvenil, como drogas e violência
Desta forma, direcionando-o para o público.
154
Sem autor. Pornochanchada: fruto de uma fase repressiva?. Sem fonte. Sem local. 12 mai 1979.

88
Segue a imagem congelada de Toquinho. Sobre ela sucedem-se os créditos iniciais

acompanhados, agora sim, pela referida música. Calmon, com esta apresentação, reedita a

figura do jovem indolente e ocioso (reforçado pelos clichês negativos acerca dos surfistas).

Seu personagem não é um bon vivant ou playboy, mas é atraído pela órbita de consumos e

prazeres em que vivem estas figuras. Para nela se inserir admite se prostituir para mulheres

e homens. Apesar das visões estereotipadas a respeito da juventude (apática), da sociedade

capitalista (falsa promessa de felicidade) e do dinheiro (corruptor), o filme apresenta um

dado novo.

NOS EMBALOS DE IPANEMA é inteiramente feito em cima de Toquinho (André de Biase). A


câmera encanta-se com ele e o mostra sério, sorridente, vestido, nu, seco, molhado, em pé, deitado,
por cima, por baixo, dentro dos limites autorizados. Raramente o charme adolescente tem aparecido
de modo tão envolvente no cinema brasileiro. Esse charme é ofertado tanto aos outros personagens
155
do filme, como aos espectadores (...).

Explorando as formas do corpo de Toquinho, bem exercitadas pelo surfe, o diretor mostra-

se atualizado com a ainda incipiente filosofia do culto ao corpo.

No intuito de ter um filme mais palatável e de diálogo direto com o público adolescente,

Calmon realiza Menino do Rio (1981). Podemos observar diversas mudanças de perspectiva

ao compará-lo com Nos embalos de Ipanema. Primeiro, o diretor teve de abandonar a figura

do surfista ocioso. Assim como Nas ondas do surf enaltecera o surfe, Calmon passa ao

elogio do jovem que o pratica. De Toquinho, adolescente suburbano desocupado com

aspirações de “fácil” ascensão social através da prostituição, chega a Valente (também de

Biase), jovem de classe-média e hábil construtor de pranchas, seu ofício. Junto ao exemplo

de Valente, pode-se citar o de Pepeu (Guto Graça Mello), amigo dele. Vindo de

155
Bernardet, Jean-Claude. Crítica: Afinal, que moral defende Calmon?. Última Hora. São Paulo, 17 mai
1979.

89
Florianópolis, Pepeu perde todos membros de sua família e escolhe o Rio de Janeiro,

segundo ele, “por causa de um filme que eu vi, a história de um surfista. Eu quero ser

surfista. Trabalhar em cinema e na televisão. (...) Eu vou arrumar um emprego e um lugar

pra morar”156. Valente lhe promete abrigo contanto que trabalhe em seu galpão. Ele aceita,

prontamente. A figura do jovem deixa de ser apática, mas permanecem os sonhos de

prosperidade, agora difundidos pela mídia. Segundo, ambientando seus personagens em um

universo pequeno-burguês, Calmon elimina qualquer sombra de arrivismo social. O

dinheiro já não corrompe mais, pois ele não é mais um problema. De forma a manter esta

resolução, o diretor opta por sair da delinqüência juvenil de Nos embalos de Ipanema para o

drama praieiro de Menino do Rio. Concentram-se, tão somente, nos qüiproquós amorosos e

as intempéries emocionais de seus jovens personagens, através de um enredo rocambolesco

e de narrativa muito próxima a das novelas televisivas. Por fim, importante não deixar de

notar que Calmon, em Menino do Rio, abre uma pequena brecha para o embrionário

BRock157 com a música De repente Califórnia158; continua atento ao culto do corpo; e dá

verdadeiro destaque às cenas de “esportes radicais”, enaltecendo a prática do vôo livre, do

surfe e do windsurf, realizando inclusive tomadas aéreas e subaquáticas.

156
Conforme diálogo do filme Menino do Rio (Dir.: Antônio Calmon, 1981).
157
Dapieve, Arthur. BRock: o rock brasileiro dos anos 80. Rio de Janeiro, Editora 34, 1995.
Cf. http://www.cliquemusic.uol.com.br/artistas/lobao.asp; http://www.cliquemusic.uol.com.br/artistas/lulu-
santos.asp; http://www.cliquemusic.uol.com.br/artistas/ritchie.asp
Termo consagrado por Arthur Dapieve para designar a música do gênero rock’n’roll feita no Brasil a partir do
início da década de 1980, até então entendido como ritmo alienígena e (por isso) sem forças para garantir sua
estabilidade comercial.
“Era um novo rock brasileiro, curado da purple-haze psicodélica-progressiva dos anos 70, livre de letras
metafóricas e do instrumental state-of-art, falado em português claro de coisas comuns ao pessoal de sua
própria geração (...)” e que “com o tempo, (...) [teve suas bandas] assimiladas pela e como música brasileira.
Eis aí outra conquista do BRock: ter tirado o gênero americano mulatinho do gueto e obtido sua
naturalização”. (pp. 195 e 196)
No entanto, Lulu Santos (1953), Lobão (1957) e Ritchie (1952), segundo o autor, ainda não seriam porta-
vozes do BRock (apesar de pertencerem ao “movimento”), pois eram de uma geração anterior à de seus
públicos. (pp. 35-52 e 68)

90
Em O sonho não acabou (1982), Sérgio Rezende acompanha o cotidiano de uma certa

juventude, representada por um grupo de amigos à época de prestar vestibular. Narrativa e

cinematograficamente mais dinâmico e instigante do que Menino do Rio, o filme substitui a

natureza e a contemplatividade do Rio de Janeiro pelo concreto e a ação de Brasília. O

sonho não acabou faz disto um de seus maiores méritos. Além de dissociar definitivamente

o jovem da ociosidade, como Menino do Rio esboçara, o filme também diverge do ideário

“conto de fadas”, ingênuo, estanque da “vida adulta” no qual o jovem é usualmente

apresentado. Na construção de seu mosaico sobre uma geração, Rezende insere o jovem em

um contexto urbano muito mais amplo que o da recorrente delinqüência. Aos sonhos e

esperanças da realização amorosa soma-se, agora, o sucesso profissional. O diretor

incorpora à sua história o processo de rápida industrialização do Milagre Econômico pelo

qual o país havia passado e aborda a inserção da juventude nesta sociedade de novas

feições de consumo e produtividade. O trabalho (artístico, inclusive) é necessário, mas

também é prazeroso e (só) através dele se pode e deve tornar reais os sonhos. A despeito de

ter retratado o jovem por este novo prisma, o filme se ressente desse seu testemunho.

Críticas ao sistema político-social brasileiro permeiam toda a narrativa, por vezes,

relegando ela e os personagens à segundo plano, por outras, influenciando decisivamente os

destinos destes mesmos personagens, segundo suas convicções e atitudes. Somando-se isto

ao título do próprio filme, O sonho não acabou, deixa-se transparecer anseios por novos

158
Conforme http://www.lulusantos.com.br, a música De repente Califórnia, composta por Lulu Santos e
Nelson Motta, foi lançada no álbum de estréia de Lulu, Tempos Modernos, de 1982. No entanto, em Menino
do Rio a música aparece somente interpretada por Pepeu, personagem de Guto Graça Mello.

91
projetos de país a substituírem os da geração do Cinema Novo159. É exigido do novo jovem

urbano o engajamento social característico das gerações anteriores sob pena de destinos

marcados por descaminhos e incertezas. Rezende, ambiguamente, reconhece que estas

cobranças não se justificam, mas “sacrifica” certos personagens que não possuem esse

compromisso160. Com grande esforço, O sonho não acabou tenta negar, ou pelo menos

escamotear, o fim das grandes utopias que ele mesmo flagra. Os jovens e os novos tempos

devem ser entendidos e abordados de outras formas, mas parece ser doloroso reconhecer

isto. O anacronismo em propostas repete-se na trilha-sonora. O BRock, além de ignorado, é

preterido por músicas engajadas e de levada rock mais associadas à década anterior.

Garota dourada (Dir.: Antônio Calmon, 1983), continuação de Menino do Rio, representa

dois passos para atrás no avanço das discussões sobre o jovem. Além de desprezar as

159
Pereira, Edmar. Elogiado, criticado. O filme estréia hoje em São Paulo. Jornal da Tarde. São Paulo, 6 ago
1982; press-book do filme O sonho não acabou. Pasta do filme. Arquivo do Museu de Arte Moderna (MAM),
Rio de Janeiro.
Na reportagem, Sérgio Rezende observa: “acho que o sonho acabou sim. Mas o que acabou foi o sonho
restrito de uma época. Certos sonhos acabaram, mas o sonho não acabou. É preciso retomar essa questão,
levantar de novo essa expressão. Os projetos não acabaram, as pessoas tentam reformular projetos. A parada é
a morte. Meu filme mostra um sonho novo (...). Um sonho que ainda nem se sabe qual é. Eu não me sinto na
obrigação de estipular o projeto. É a aventura dos erros e acertos, como diria Oswald de Andrade.”
No press-book do filme, o diretor afirma: “o sonho é a expressão poética de um projeto. O Sonho Não
Acabou. Porque o projeto não é a realidade acabada, assim como o roteiro não é o filme.”
160
Pereira, Edmar. Elogiado, criticado. O filme estréia hoje em São Paulo. Jornal da Tarde. São Paulo, 6 ago
1982; press-book do filme O sonho não acabou. Pasta do filme. Arquivo do Museu de Arte Moderna (MAM),
Rio de Janeiro.
No press-book do filme, Rezende escreve: “fiz este filme para falar do meu tempo. Um tempo sombrio – a
década de 70 – que muitos viveram querendo esquecer, querendo fazer do presente o passado.”
Na reportagem, o diretor afirma que O sonho não acabou trata-se de “um filme sobre a geração dos anos 70, a
única que viveu esse tempo como presente. (...) [a juventude atual é] acusada de alienada, de não se interessar
pela coisa mais ampla da sociedade, da política. Para mim esta é uma visão de má fé, que transfere às pessoas
erradas responsabilidades que elas não têm. Quem tem 18 anos em 1982 nasceu em 1964. É gente que não
criou seu tempo, que não moldou sua imagem. Um pessoal que não conhecia democracia nem liberdade.”
Sérgio Rezende, em cada uma das fontes, apresenta perspectivas diferentes sobre seu filme. Na primeira, diz
tratar-se dos questionamentos de sua geração (ainda marcada pelo engajamento, cf. nota anterior). Vale
lembrar que o diretor tinha 31 anos por ocasião do filme. Na segunda, de um retrato da juventude que à época
do filme tinha 18 anos (já desmobilizada). A contradição do cineasta é levada ao filme. Apesar de isentar o
jovem do compromisso político ou social na reportagem, a personagem de Lucélia Santos no filme, uma

92
conquistas de O sonho não acabou, dilui a fórmula de Menino do Rio. Isto é feito de forma

deliberada por Calmon, que visa a censura livre ao filme 161. Para concretizar seu intuito

toma certas providências: ignora qualquer discussão política ou social em detrimento,

exclusivamente, de qüiproquós amorosos; realoca os personagens de suas realidades

pequeno-burguesas para um lugar (ainda praieiro) místico, mágico e fantástico de sugestivo

nome de Encantado – onde a narrativa, esfacelada em várias tramas pouco ou nada afins,

(literalmente) a tudo se permite –; e torna pudico o trato do culto ao corpo. O diretor

continua a investir nos “esportes radicais”, porém como forma de duelo de “mocinho contra

vilão”, ao invés do prazer da prática dos mesmos. Por fim, Calmon equivoca-se por

completo em sua abordagem sobre o BRock162: convoca Guilherme Arantes para a

composição da trilha-sonora; convida Marina Lima e Ritchie para pequenos números

musicais; e insere, novamente, baladas praianas da dupla Lulu Santos e Nelson Motta,

interpretadas no filme pelo ator Guto Graça Mello163. Ademais, transforma o personagem

adolescente mística e alienada de seu país em processo de mudanças, é “condenada” por seu alheamento e
termina morta.
161
Press-book do filme Garota dourada. Pasta do filme. Arquivo do Museu de Arte Moderna (MAM), Rio de
Janeiro.
162
Idem.
Calmon afirma que “nos últimos anos, o público brasileiro, principalmente os jovens, aprendeu a ouvir rock
em português e a prestigiar o cinema nacional” e que Garota dourada sela “a fusão do “rock brasileiro” com
o cinema”, iniciada, segundo ele, por ele mesmo em Menino do Rio.
163
Press-book do filme Garota dourada. Pasta do filme. Arquivo do Museu de Arte Moderna (MAM), Rio de
Janeiro.
Dapieve, Arthur. BRock: o rock brasileiro dos anos 80. Rio de Janeiro, Editora 34, 1995.
Calmon, segundo Dapieve, estaria completamente defasado em relação a seu tempo. Primeiro, Arantes e
Marina seriam concessionários da MPB e não do BRock (pp. 24 e 181). Segue a opção do diretor em ceder
espaço a dois representantes do BRock, Lulu Santos e Ritchie, que, por serem de uma geração anterior à de
seus públicos, ainda não eram seus porta-vozes. O Barão Vermelho, com sua estréia no ano anterior ao filme,
já ocupava este posto (pp. 35-52 e 68). Por fim, Calmon, assim como em Menino do Rio, prefere que a nova
música de Lulu Santos e Nelson Motta, Como uma onda (zen-surfismo), seja interpretada no filme pelo ator
Guto Graça Mello. Conforme http://www.lulusantos.com.br, a música, foi gravada por Lulu em O ritmo do
momento, de 1983.
Fábio Barreto, produtor do filme, compartilha o descompasso de Calmon. Ele declara que “Garota dourada é,
também, um retrato áudio-visual deste momento em que surge a Nova Jovem Guarda, com sua música urbana
e roqueira.” No entanto, as músicas do filme nada têm de urbanas tão pouco de “roqueiras”. Guto Graça
Mello, curiosamente, foi responsável pela mixagem do primeiro disco do Barão Vermelho, homônimo, de
1982, cujo trabalho se assemelha muito mais ao descrito por Fábio Barreto.

93
de Sérgio Mallandro em um ídolo do rock’n’roll, porém interpretando composições que

remetem às da década de 1960 – como, inclusive, vestes suas e de suas fãs. Um universo

visto, nos dias de hoje, como ingênuo e puro, tal como a infância que Calmon visa

incorporar a seu público.

Três filmes de perspectivas completamente diversas estrearam em 1984. Para viver um

grande amor (Dir.: Miguel Faria Jr.) é a sôfrega e extemporânea tentativa de se fazer um

filme para o público jovem embalado pela MPB. Trata-se de uma adaptação da peça Pobre

menina rica, de Vinícius de Moraes e Carlos Lyra. De forma lânguida, o filme conta a

história de um jovem casal de classes sociais distintas em meio a um conflito social que

toma conta do país. Em uma narrativa pouco inventiva e burocrática, apresenta visões

maniqueístas e estereotipadas sobre as classes média e baixa. Em resumo, o filme é um

anacrônico pastiche das orientações cinemanovistas em embalagem ultra-romântica. A

trilha-sonora conta com diversas composições da dupla de autores da peça, além de Chico

Buarque, Tom Jobim e Djavan, que também é ator principal. Observa-se, portanto, da

escolha do texto a ser adaptado à seleção do elenco musical, passando pela escalação de

Djavan como protagonista, um grande investimento de Faria Jr. sobre a “legítima” música

brasileira. No entanto, já havia tempo que “a MPB se aburguesara, autocomplacente e

autofágica – estéril. (...) e (...) nem vendia muito”164. O filme ignora o BRock e, em certa

medida, pode ser encarado como uma resposta à sua ascensão.

O segundo filme a estrear em 1984 foi Verdes anos (Dir.: Carlos Gerbase e Giba Assis

Brasil), primeiro longa-metragem gaúcho em 35mm dos anos de 1980 a dialogar com o

94
público adolescente. Seus realizadores provinham de um grupo que já estava

experimentando essa aproximação desde meados da década de 1970, só que na bitola

Super-8. Por exemplo, Gerbase filmara Inverno, 12 dias de frio em Porto Alegre (1982) e

Assis Brasil Deu pra ti, anos 70 (1981), com Nelson Nadotti165. As histórias, de modo

geral, tratavam dos pequenos fatos cotidianos da juventude de uma provinciana Porto

Alegre166. Segundo o autor do conto homônimo que deu origem ao filme, Luis Fernando

Emediato, Verdes anos

é uma crônica adolescente sobre os anos 70, época do milagre brasileiro, da Transamazônica, da luta
armada, da censura à imprensa e da repressão à liberdade sexual. Em Verdes Anos, um grupo de
adolescentes se diverte, pratica suas ingênuas loucuras ao som de muita música – rock
principalmente – sem perceber o que acontece no país. Verdes Anos é a crônica da alienação, da
história de uma geração que cresceu à sombra da desinformação e do AI-5. Nele, o personagem
central, Nando, vaga perdidamente num mundo que não compreende, até a cena final, quando é preso
167
por atentado ao pudor e à moral pública, no exato momento em que descobre o amor e a ternura.

Tal como O sonho não acabou, Verdes anos também constrói um mosaico sobre uma

geração a partir do ambiente da escola. As semelhanças, no entanto, encerram-se aqui. O

filme, mais introspectivo, acompanha o encerramento, por vezes doloroso, de um ciclo da

vida de uma juventude interiorana e pequeno-burguesa. Seus personagens, um pouco mais

ingênuos do que os de O sonho não acabou, estão em amadurecimento, divididos entre

brincadeiras pueris, o despertar do desejo sexual e uma longínqua percepção do então

infeliz panorama político-social que encerrava-se no país. As críticas ao período da ditadura

são localizadas, exclusivamente adultas e raramente adentram o cotidiano adolescente.

Verdes anos possui a grande virtude de mostrar jovens alheios à situação de seu país sem

lhes exigir engajamento ou novos projetos de país, ou condená-los por isso – como O sonho

164
Dapieve, Arthur. BRock: o rock brasileiro dos anos 80. Rio de Janeiro, Editora 34, 1995, p.23.
165
Seligman, Flávia. Verdes anos do cinema gaúcho. In: Cinema no Rio grande do Sul – Caderno ponto &
vírgula, 8. Porto Alegre, UE/Porto Alegre, 1995.
166
Becker, Tuio. Cinema gaúcho: uma breve história. Porto Alegre, Editora Movimento, 1996, p.54.
167
Caetano, Maria do Rosário. Sem título. Correio Braziliense. Brasília. Sem data.

95
não acabou – e sem enclausurá-los em um mundo de “contos-de-fada” – como Menino do

Rio e Garota dourada. A ausência de maiores planos (até mesmo individuais) que os

caracteriza advém da realidade que os cerca: a falta de perspectivas de se viver em uma

cidade do interior do Rio Grande do Sul, por sua vez, distante do moderno (em bens e

serviços) e avançado (em costumes) eixo Rio-São Paulo. Como resultado, uma conformada

e melancólica errância dos personagens pela tela. A trilha-sonora ainda não era partidária

do BRock, apesar de um de seus responsáveis, o guitarrista Augusto Licks, vir a ser

integrante do grupo Engenheiros do Hawaii, banda do “movimento”. As composições

investiam mais sobre uma concepção setentista e local, provavelmente pela presença de Nei

Lisboa, o outro responsável trilha, de carreira iniciada na década de 1970 e um dos

expoentes da MPG, a Música Popular Gaúcha168.

Finalmente, temos Bete Balanço (Dir.: Lael Rodrigues, 1984).

* * *

Para a análise da abordagem de Lael Rodrigues sobre o jovem e sua problemática,

reproduzo algumas das poucas declarações do diretor encontradas acerca do assunto. Além

servirem como guia para tal estudo, permitirão verificar de que forma Bete Balanço

distingue-se das produções nacionais de mesmos objetivos contemporâneas a ele.

[Bete Balanço] é a história de todo mundo que tem o bicho de ser artista dentro de si. Um filme de
muita emoção e pouca explicação. É mais voltado para a juventude, mas com toques maiores de vida
do que o que tem sido feito. Diz mais das barras, das relações dos jovens, fazendo uma reflexão
sobre isso. Mas não uma reflexão de cima para baixo, e sim linear, que todo mundo faz no dia a dia.

168
Dapieve, Arthur. BRock: o rock brasileiro dos anos 80. Rio de Janeiro, Editora 34, 1995, pp. 141-144.

96
Apresenta uma perspectiva positiva de vida, com a personagem enfrentando as dificuldades, os
169
contratempos, sempre como parte da vida, sempre com vontade que tudo dê certo.

A proposta de Bete Balanço surgiu pela oportunidade de experimentarmos um esquema de produção


racional e realista, para desenvolver em cinema um retrato mais vivo do que é a manifestação jovem
atual, em temática e linguagem. Um filme para um segmento do público jovem que nunca foi visto,
sequer ouvido e jamais viu sua imagem em cinema. Como autor, me defini pela comunicação com
essa faixa de espectadores, tentando oferecer mais do que pura diversão e botar na tela personagens
vivos, com a maneira natural dos jovens de encarar coisas como o sexo, o homossexualismo e as
drogas. A possibilidade de gostar do que se faz e ter prazer, sem precisar sentir culpa. Pessoas que
transformaram a batalha da vida numa coisa boa, sem amarguras, rica em experiências. Assim são os
personagens de Bete Balanço, porque eu acho que assim se expressa uma parcela considerável de
jovens brasileiros.

Bete Balanço incorporou a linguagem do vídeo clip (sic) e do rock, em especial, como expressão
própria do jovem, de uma geração que pouco teve acesso à formação política e cultural mais ampla e
se apegou à música. O rock é o elemento de maior identidade com o público que eu queria me
comunicar. Não busquei uma unidade musical, mas sim algo em comum entre as músicas: a visão
crítica além da melodia, o conteúdo próprio das letras.

Num esquema de produção como o de Bete Balanço, o merchandising é uma fonte de recursos
fundamental e inevitável. Resolvi assumir essa idéia sem nenhum problema e usar a criatividade
artística em cima de elementos de merchandising, logicamente favorecido pela própria temática do
filme. Sempre fiquei cabreiro com diretores que tinham vergonha de incorporar o merchandising ao
170
seu filme. Eu transei isso sem o menor grilo, até com algum prazer.

Tive uma entrevista com a Solange Hernandez [juíza que censurou o filme]. (...) Ela disse que não
podia resolver o problema do meu filme, que era questão ideológica. (...) e ela apontou problemas:
disse que era grave ela transar com outro cara, posar nua e aceitar o dinheiro pela publicação numa
revista, moralmente terrível isso. Além do mais achou um escândalo uma menina de 17 anos fugir de
171
casa e deixar um reles bilhete. A atitude mais livre e mais natural é subversiva.

O grosso do público que tem assistido (...) é composto por jovens de 14 a 17 anos, segundo constatou
Lael. “Para mim, isso é muito bom, significa que encontrei uma linguagem apropriada para o
jovem”, diz ele. (...) Lael atribui o sucesso à linguagem ágil, às formas muito gráficas e ao próprio
conteúdo do filme, onde o jovem não é colocado como alienado e ocioso (...). Aos que o criticam,
por considerar a trama fraca, Lael rebate: “É porque não trato diretamente da fome e da miséria, mas
172
de problemas sociais a nível do indivíduo.”

169
Salem, Helena. ‘Bete Balanço’, a roqueira que vem das Gerais, começa a nascer no Voador. O Globo. Rio
de Janeiro, 22 dez 1983.
170
Press-book do filme Bete Balanço. Pasta do filme. Arquivo do Museu de Arte Moderna (MAM), Rio de
Janeiro.
171
França, Jamari. Rock em filme jovem – “Bete balanço” traz a realidade sem ócio para o cinema. Revista de
domingo, ano 9, nº 428, Jornal do Brasil. Rio de janeiro, 15 jul 1984.
172
Bisordi, Gisela. “Bete Balanço” chega a São Paulo pelo Anhembi. Folha de São Paulo. São Paulo, 30 ago
1984.

97
173
Assumi também a barra de toda a máquina, a linguagem da tevê, do vídeo, do comercial.

Yoya Würch, co-roteirista do filme, colabora com algumas palavras.

O Lael (Rodrigues) me apresentou um roteiro que ele tinha escrito há anos atrás, uma coisa do
mesmo tipo de Bete Balanço e já com esse título. Ele queria fazer um filme sobre a juventude, mas o
argumento não se adequava às coisas de hoje. Tive que transformá-lo, mas a idéia central persistiu:
menina do interior vem para o Rio e vai à luta para vencer. (...) A Bete deu certo porque é um
personagem que se identifica com as pessoas da idade dela (17 anos). Em O Menino do Rio todos
tinham dinheiro. Em Garota Dourada a fórmula se repetiu e já não tinha mais a ver com os jovens.
Era uma fantasia fora de hora. (...) Quando Bete (Débora Bloch) tem um caso com Bia (Maria Zilda)
é uma questão de solidão das duas, tem muito pouco de uma relação homossexual. Acontece quando
duas pessoas se encontram. A Bia seria a grande amiga de Bete, mas o papel foi muito cortado no
filme. Eu não queria escrever uma história triste. Quando você faz um filme nesse gênero, a
174
mensagem deve ser para cima.

Primeiramente, vamos nos deter sobre a trama de Bete Balanço: personagem do interior

tenta a sorte na cidade grande. Com certeza, nem um pouco original ao grande público,

mas, curiosamente, sintonizada a certas produções estadunidenses do período. Mais

especificamente, a filmes que tratavam de jovens sem maiores perspectivas que um dia

resolvem obter realização pessoal e ascensão social por meio da música e da dança – na

realidade, os únicos modos de serem bem-sucedidos em suas vidas. Em um mundo onde os

meios de comunicação já colaboravam no imediatismo da exportação de valores e o Brasil

experimentava um período de aguda crise do projeto de modernização nacional,

testemunhava-se o advento da cultura yuppie – individualista e materialista – em

substituição a hippie – grupal e espiritual. É a época onde vemos em vários estadunidenses

o movimento de personagens dos subúrbios ou periferias para os grandes centros urbanos

em busca de realização pessoal através da ascensão social. É o caso, por exemplo, de Os

embalos de sábado à noite (Saturday night fever, Dir.: John Badham, 1977), sobre um

jovem morador do Brooklyn que almeja conquistar um campeonato de dança promovido

173
Pereira, Edmar. Bete Balanço: sucesso. – O Rio confirmou. Agora o filme vem a São Paulo, onde seus
artistas falaram deste trabalho. Com prazer. Jornal da Tarde. São Paulo, 31 ago 1984.

98
por boate local para ter acesso a mais e melhores oportunidades; de Fama (Fame, Dir.:

Alan Parker, 1980), que acompanha o dia a dia de uma exigente escola de artes que

preparara seus alunos, muitos deles com problemas financeiras, para a “vida”, ou seja, para

o mercado de trabalho; e de Flashdance (Dir.: Adrian Lyne, 1983), que narra a história de

uma soldadora e dançarina de club noturno que deseja passar em difícil teste de admissão

para grande companhia de balé. Abrindo-se mais o espectro sobre Bete Balanço, torna-se

possível relacioná-lo a Os embalos de sábado continuam (Staying alive, Dir.: Sylvester

Stallone, 1983) que envolve, além da música e da dança, a superação pessoal. Isto é, o

protagonista do filme já vive no meio artístico, mas agora procura chegar a Broadway.

Como já visto, não se trata do caso de Bete Balanço. Mas, pelo fato do filme utilizar

ingredientes direta (jovens, música e da dança) e indiretamente (superação pessoal)

empregados por ele, torna-se importante citá-lo. Acredito que os quatro filmes estrangeiros,

mesmo que de forma tênue, ajudaram a confeccionar um cenário propício para a boa

recepção de Bete Balanço e, por quê não imaginar, criaram expectativas por um similar

nacional.

De modo geral, a crítica, para o bem ou para o mal, percebeu a relação de Bete Balaço com

estes filmes. Identificou, também, com clareza, as propostas do filme – enunciadas por Lael

e reproduzidas acima –, porém nem as avaliações artísticas tampouco as técnicas foram

unânimes.

O diretor Leal Rodrigues (...) procurou fazer um filme sobre adolescentes amarrado nas situações
comumente vividas por uma certa faixa de adolescentes brasileiros. Tais filmes requerem uma
cuidadosa elaboração do roteiro, sob o risco de se construir uma obra sobre situações falsas, diálogos
absurdos e personagens que pareçam saídos de outro planeta. Em Bete Balanço, todos parecem sair
da esquina mais próxima. (...) É muito difícil, sobretudo a um jovem, deixar de gostar de “Bete
Balanço”. Alguns se fascinarão com os videoclips. Pessoalmente não me sinto atraído por essa

174
Machado Jr., Roberto. Sem título. Jornal do Brasil. Rio de Janeiro, 01 jul 1985.

99
fórmula, mas os videoclips produzidos para o filme não são de modo algum inferiores aos que nos
acostumamos a ver mandados pelas grandes gravadoras americanas ou européias. A música
conduzida por grupos como o “Barão Vermelho” e o “Lobão e os Ronaldos” é contudo um elemento
de força vital dentro do filme. Trata-se de rock, evidentemente, e não vejo porque deveria ser samba,
chorinho ou xaxado, quando um segmento tão grande e real da juventude brasileira sonha hoje em
ser roqueira. A um artista é dado o poder de criar, não de alterar os mitos de uma sociedade. (...)
“Bete Balanço” deve cumprir plenamente sua proposta de mercado, porque fala de um segmento da
sociedade sem abordá-lo como uma assombração, mas, ao contrário, identificando seus valores e
175
manifestando-se dentro de sua cultura no que ela tem de melhor.

“Bete Balanço” (...) dirige-se à faixa jovem como opção de mercado, mas não fecha questões, não
dita regras. É um filme bastante aberto, sem visíveis pretensões de “fazer a cabeça” dos espectadores.
Há motivos para crer, conforme a convicção do realizador, que o “alto astral” da personagem-título
integre a substância do filme e passe tranqüilamente ao seu público. Um desafio: fazer filmes para a
geração que nasceu entre os traumas e fraturas de meados dos anos 60 e que sai da adolescência
numa indefinida atualidade em que são tantos os acenos de ceticismo. Corre-se o risco de produzir
(como no caso de “Bete Balanço”) para uma faixa do público jovem que – nas palavras de Lael
Rodrigues – “nunca foi visto, sequer ouvido, e jamais viu sua imagem em cinema”. Muitos dessa
faixa se distanciaram do cinema brasileiro pelo hermetismo em que os cineastas caíram, no confronto
com os censores, à época do Cinema Novo. Uma geração cresceu na idade ‘mídia’, na linguagem do
clip. (...) O rock quebrava os padrões vigentes e expressava toda uma insatisfação, uma rebeldia”.
Essa identificação com o rock transborda da trilha sonora para as imagens e a montagem de “Bete
Balanço”, dando ao filme sua nítida impressão digital. Não tem pretensão a “Hair”, mas pode ser
visto com prazer e sem sentimento de alienação que costuma acompanhar os chamados “filmes
jovens”. Nada de novo, a rigor, na história de Bete, mineira de quase 18 anos, que se despede da
família com um bilhete fugitivo, deixa para trás o noivo, o sucesso no vestibular, e vai tentar a sorte
(como roqueira) no Rio. Mas roteiro, direção e atores capricham no comportamento, no diálogo
veraz, natural (sem a praga do naturalismo de interpretação), e transmitem uma vivência que se
176
assimila com prazer e que é rara no musical.

Mas será que Bete é um bom filme? Se você tem mais de 18 anos, precavenha-se, este não é um
filme para você. Bete foi concebido para cabeça jovem, gente que curte esses conjuntinhos de rock
sem perceber que eles apenas estão refazendo os tempos da Jovem Guarda. Mas como é o jovem que
177
vai ao cinema, o filme deverá ser sucesso.

Bete Balanço é um trabalho sem grandes pretensões. (...) Seu filme possui a correção técnica, o
encanto e simultaneamente a pouca profundidade desse gênero. O frágil enredo não escapa do lugar-
comum de produções como Flashdance, onde após inúmeros contratempos, seus personagens
conseguem vencer uma acirrada competitividade (...). Seu trabalho é discreto e coerente. (...) Para os
espectadores que procuram apenas o entretenimento, Bete Balanço resulta numa opção digna e
gratificante. Para aqueles que pleiteiam análises mais profundas da geração jovem, o filme de Lael
deixa a desejar. Uma opção que o realizador assume com dignidade e clareza, não prometendo nada
além daquilo que consegue cumprir. O melhor e o pior de Bete Balanço é seu caráter despretensioso.
Lael não vende gato por lebre, mas simultaneamente não realiza o filme necessário que a
cinematografia brasileira ainda não ousou apresentar, ou seja, um retrato fidedigno da juventude,

175
Hoineff, Nélson. O sonho não acabou. O Dia. Rio de Janeiro, 30 jul 1984.
176
Azeredo, Eli. O Bonequinho Viu – cotação: bonequinho sentado. O Globo. Rio de Janeiro, 31 jul 1984.
177
Ewald Filho, Rubens. Pré-Estréia, O jovem ‘Bete Balanço’ e o esforço de La Vitti. Tribuna. Sem local. 09
set 1984.

100
com suas contradições, traumas, sonhos e aspirações. Por enquanto o sonho e a idealização ainda se
178
sobrepõem à amarga realidade de uma sociedade autoritária.

Um filme que se contenta em agradar ao público que se contenta com bobagens do tipo Os Embalos
de Sábado à Noite, Foot-loose, Garota Dourada, Grease... Nada mais suspeito. De olho numa lacuna
do mercado preenchida quase exclusivamente por caça-níqueis americanos – ou por seus raros
similares nacionais: os filmes-de-praia de Antônio Calmon – a dupla Lael/Tizuka até que tentaram
falar de coisas mais próximas da juventude anos 80: a atração pela metrópole, drogas, sexo e
rock’n’roll, além dos temas correlatos: a violência urbana e a engrenagem do show-biz. O resultado
balança entre o comercialismo fácil e um “engajamento” um tanto forçado. (...) Mas o que se vê na
tela é apenas um pálido reflexo, cheio de concessões, de uma juventude vazia. Descamba num
escapismo audiovisual que não evita a mais ingênua mitificação do sucesso. É na verdade um conto-
de-fadas embalado para o consumo da geração FM. A crítica ávida por competência técnica e
supostas novidades temáticas adorou (“um dos mais joviais e inovadores filmes brasileiros dos
últimos anos”, sentenciou um comentarista), sem lembrar, por exemplo, a inexplicável timidez com
que enfoca o homossexualismo e as drogas; ou ainda a inequívoca diluição em meio a um verdadeiro
desfile de merchandising. Como perfil do comportamento da juventude atual é, no mínimo,
discutível. Não chega perto do anacronismo dos cartões-postais de Calmon (Embalos de Ipanema,
Menino do Rio, Garota Dourada), mas também está bem longe de revelar uma marca pessoal como a
que Sérgio Rezende imprimiu a O Sonho Não Acabou (a mais interessante tentativa de cinema
brasileiro em se aproximar do público jovem, sem deixar de levar em conta as imposições
mercadológicas). Só fica mesmo na competência técnica e de marketing. Podia representar uma
significativa brecha, mas se deixou guiar pelas facilidades da fórmula do “entretenimento leve”. O
179
pique de um clip e a eficiência de um anúncio de jeans. Parece até que foi concebido pela Artplan.

Um argumento que podia ir mais fundo nos problemas juvenis, no entanto, acabou virando conto-de-
180
fadas.

Qual o segredo desse filme que, embora dirigido ao público juvenil da geração videoclip, acaba
agradando também aos adultos? É verdade que “Bete Balanço” tem em sua trilha sonora músicas dos
conjuntos Barão Vermelho, Lobão e os Ronaldos, Brylho, Celso Blues Boy, Metralhatxeka e Titãs.
Mas é óbvio que a reunião desses ingredientes não basta, por si só, para fazer um filme comercial
bem-sucedido. Boa parte do êxito de “Bete Balanço” se deve ao diretor Lael Rodrigues que, embora
estreando no longa-metragem, tem o dom de saber conduzir com fluência, leveza e bom humor uma
história banal e destiuída de lances dramáticos – a da garota do interior de Minas que foge de casa
181
para tentar vencer no Rio de Janeiro como cantora de rock.

As explicações para o sucesso de Bete Balanço são simples: o filme não tem nada de transgressor.
Ao contrário: repete, como aluno comportado, os macetes da moda do momento: o vídeo-clip. (...)
Nenhuma marca de uma país terceiro-mundista, reprimido. É uma libertária de butique. Estimula, na
maior, a sua relação homossexual com a personagem interpretada por Maria Zilda. Abandona o ex-
namoradinho de Valadares e segue adiante, muito prafrentex. A intérprete de Bete (Débora Bloch)
faz caras e bocas para a competente câmera de Edgard Moura, e, amiúde, abre espaço para
merchandising de tinta, jeans, tênis, distribuidora de petróleo (...). Diogo Vilela interpreta um débil

178
Capuzzo, Heitor. Cinema / Crítica, Bete Balanço, o rock brasileiro nas telas. Diário do Grande ABC. São
Paulo,11 set 1984.
179
Bazi, Sérgio. Bete Balanço, um conto de fadas em ritmo de FM. Correio Braziliense. Brasília, 20 set 1984.
180
Caetano, Maria do Rosário. Bete Balanço, A geração do rock num imenso vídeo-clip. Correio Braziliense.
Brasília, 20 set 1984.
181
Vartuck, Pola. “Bete Balanço” não inova, mas é fluente. Estado de ????. Sem local. 20 set 1984.

101
mental, que fica jogando video-game e não passa disso. (...) Para agravar a inconsistência (...) Vilela,
com caras e gestos de débil televisivo, comanda o arrombamento da porta de seu apartamento. (...) O
personagem de Lauro Corona tem a consistência de uma folha de papel de seda molhada. Ele é um
alienadão, que curte seu estúdio de fotografia hiperequipado e descobre modelos de beleza-padrão.
Um dia, assiste a um assassinato brutal e resolve levar o caso adiante. A seqüência passa como um
mea-culpa do diretor Lael Rodrigues (...). Só que não adiantou: Bete Balanço é um filme que em
nada difere das estripulias de praia do ex-criador do Dr. Moura Brasil. No melhor estilo roliudiano, o
filme é simplória versão ip-anêmica da busca do sucesso, a qualquer preço. (...) Tolice buscar
seriedade neste filme. (...) Se hoje quem ocupa as paradas de sucesso é a turma do Barão Vermelho e
similares, vamos arrumar uma historinha superficial, uns atores bonitos, uma boa lista de
merchandising, bons técnicos e deixar correr. Povo? Há povo no Brasil? Há, há sim! Vocês não
182
viram o povo fazendo pano-de-fundo para os balés/merchandisings de Bete, a que balança?

Simples, simpático, sem pretensões. E bem-sucedido, apesar da pobreza da produção, apesar da


pressa da confecção. Bete Balanço é um filme de alto astral, retrato possível de certa faixa da
juventude urbana brasileira (...), sem o pedantismo das intenções sociológicas e também distante das
delirantes fantasias de celebração do novo consumo e da velha moral, tipo Garota Dourada ou
Footloose – para lembrar apenas dois filmes igualmente repulsivos. (...) Novo é o tom de
desrepressão, o desapego do filme aos padrões vigentes de moral e comportamento, aos clichês
forjados pelo sistema, desde os da competição entre os indivíduos até os relativos aos
relacionamentos entre as pessoas. (...) O baixo orçamento atropela Bete Balanço, especialmente na
encenação dos números musicais, mas esse custo mínimo é certamente responsável pela libertária
aragem que percorre o filme, pelo à vontade com que seu diretor usa, e abusa, os signos vigentes de
linguagem, indo da televisão à publicidade e ao videoclip. Nem tudo dá certo o tempo todo, mas o
saldo é agradável. Nesta celebração do sonho, neste inesperado triunfo do coração sobre a asa delta,
da inteligência sobre os roncos dos motores, abre-se um caminho que a produção nacional ainda não
conseguira apresentar ao público médio jovem, não empenhado politicamente e a caminho acelerado
da estupidificação total. Pode ser que esteja aí um positivo sinal de reversão. Pelo menos Bete
Balanço ao contrário da quase totalidade do cinema supostamente endereçado a essa faixa de
183
público, em inglês ou em português, fez uma opção contra a corrente.

O filme – Não exatamente um filme, mas uma espécie de film-clip. E o fato de ser brasileiro tem
pouca importância, ou nenhuma. Bete Balanço é uma hábil montagem audiovisual de signos ditos
jovens: rock, liberdade, desinibição, afirmação feminina, modelo fotográfico, comerciais, video-
clips, video-games, sexo, amor, palavrão, nó na cabeça. Englobando todos, e acima de todos, está o
grande signo moderno da televisão, que dita a moda, o comportamento, os costumes e agora também
a linguagem cinematográfica. Chegamos ao cinema patrocinado, com anunciante nos letreiros e no
enredo. Ao cinema reduzido à constrangedora condição de subproduto, encarregado principalmente
de mostrar o que (ainda) não se pode ver no doméstico veículo, ou seja, a nudez dos astros e estrelas
das telenovelas. Não se trata, pois, da história de uma garota mineira que tenta fazer sucesso no Rio
como roqueira. Qualquer intromissão da realidade (o elemento social representado pelo linchamento
de um pivete nas ruas) resulta estereotipado – e apenas um signo a mais na coleção. Em
compensação, fantasia-se à vontade, que fantasia também é marca da juventude, e imagina-se por
exemplo que Débora Bloch, uma boa atriz, seja também uma boa dançarina e uma boa cantora. O
objetivo é atrair o público adolescente, envolvê-lo de sons e imagens, satisfazê-lo sensorialmente, e
isso a equipe produtora e técnica – à frente o diretor Lael Rodrigues – consegue com inegável
184
competência profissional.

182
Caetano, Maria do Rosário. Bete Balanço, gatinha da Escandinávia. Correio Braziliense. Brasília, 26 set
1984.
183
Pereira, Edmar. Bete Balanço, o coração vencendo a asa delta. Sem fonte. Sem local. Sem data.

102
De certo, as conexões entre Bete Balanço e Nas ondas do surf são mínimas. No entanto, há

uma de suma importância para o sucesso comercial do filme em estudo. Hoineff atribui a

Bete Balanço a virtude de falar sobre “um segmento da sociedade [o jovem] sem abordá-lo

como uma assombração, mas, ao contrário, identificando seus valores e manifestando-se

dentro de sua cultura no que ela tem de melhor”. Acredito que esta forma de lidar com a

juventude tenha sido “resgatada” por Nas ondas do surf, pois, desde os filmes estrelados

pelos astros da Jovem Guarda, algo minimamente semelhante não ocorria. Provavelmente,

Nas ondas do surf não deve ter influenciado Bete Balanço, mas com certeza o filme foi

importante por anunciar, mesmo que de forma tênue, um movimento da cinematografia

nacional em reconhecer, registrar e difundir os novos hábitos e práticas da juventude que se

estabeleciam na sociedade – o surfe brasileiro iniciava sua profissionalização.

Seguindo este raciocínio, para aproximar-se do público adolescente, Lael Rodrigues

investiu sobre “um retrato mais vivo do que é a manifestação jovem atual, em temática e

linguagem”. Falamos, portanto, em uma ação talvez pioneira de investigação e reprodução

mais à sério da mentalidade da juventude. Bete Balanço, assim, refletiria o que ele

considerava a “maneira natural dos jovens de encarar” alguns assuntos que afloram neste

período da vida, como o sexo, o homossexualismo e as drogas. É possível verificar que a

abordagem do diretor sobre estas questões foi a mais moderna (à época alguns diriam

“liberada”) possível quando confrontada aos demais filmes brasileiros dedicados aos

jovens, naquele momento.

184
Pereira, José Haroldo. Cinema – No embalo da TV. Sem fonte. Sem local. Sem data.

103
Bete, ainda na conservadora Governador Valadares, já tinha relações sexuais com Deca,

seu namorado, porém às escondidas. Encontros furtivos em quartos de motel, com hora

marcada para terminarem. O casal, extrapolando os tradicionais valores morais de suas

famílias, evita despertar qualquer suspeita sobre sua atividade. Apesar de ser dado como

certo o fato de se casarem. Já na cidade do Rio de Janeiro, entendida como de costumes

mais liberais, Bete tem relações descompromissadas e às claras com quem quer. Sem

denotar “amarras” futuras, o sexo aparece como celebração do prazer. Mas, um prazer

distante de gozos individualistas ou que coisifiquem o parceiro. Celebra-se também o prazer

de estar, interagir com o outro. Há o afeto mas não há o apego. O sonho não acabou, ele é

outro – a realidade de se querer inserir no mercado que, por sua vez, obriga ao adiamento

de projetos amorosos. Do mesmo modo se dá a abordagem sobre o homossexualismo.

Apesar não praticá-lo em sua cidade natal, Bete não vê problema algum em experimentá-lo

quando chega à “cidade grande”. Tem apenas uma relação em todo o filme, com Bia. Mas

Bete deixa as portas abertas para novos encontros, uma amizade que se inicia. A questão

das drogas recebe tratamento semelhante. Em Bete Balanço, há somente o consumo de

maconha e a ele é dada uma característica de recreação em grupo. A “curtição” está

presente tanto em ensaios da banda de Tininho quanto em uma roda de violão no

apartamento de Rodrigo.

Os demais filmes do período direcionados aos jovens apresentam visões reacionárias ou

preconceituosas sobre os três temas em discussão. Nos embalos de Ipanema, por exemplo,

retrata as aventuras sexuais dos jovens sempre às escondidas de seus pais ou da sociedade –

apesar do filme ambientar-se no “liberal” Rio de Janeiro de Bete Balanço. Quando de

conhecimento público há o escândalo e a perplexidade. Já o sexo descompromissado,

104
voltado para o prazer, é identificado principalmente com a prostituição. Aliás, é apenas

através dela que o filme permite que um personagem homossexual tenha relações. A droga

usada também é a maconha, todavia apresentada como “curtição” em si, desassociada de

qualquer outra atividade. Além disso, o consumo da erva traz grandes efeitos colaterais a

um dos personagens, comprometendo até sua performance sexual. Menino do Rio, do

mesmo diretor, de certa forma, segue os mesmos caminhos. O sexo descompromissado não

é objeto de ressalvas por parte do filme. No entanto, compreende um sentido de que o casal

terminará o filme junto, “inexoravelmente”. Se possível, casando-se, como de fato ocorre

com Valente e Patrícia. Pepeu e Soninha, outro casal, tem destino “curioso” se observada

uma causalidade entre fatos. Mais novos que Valente e Patrícia, têm relações sexuais e

fumam maconha, porém terminam o filme separados pela morte do rapaz. Por outro lado,

Aninha (Cissa Guimarães), mais velha, remanescente da geração hippie, não fuma, é

casada, tem um filho, e passa o filme inteiro sem conflitos de qualquer ordem. O sonho não

acabou e Para viver um grande amor aproximam-se da primeira descrição sobre Menino

do Rio. Os jovens, uma vez juntos e consumando relações, denotam a intenção de constituir

família. Mas enquanto Para viver um grande amor passa ao largo de qualquer discussão

sobre drogas, O sonho não acabou trata do tráfico de cocaína e do vício destrutivo que ela

traz. Convenientemente, opta-se pela relação menos problemática, o personagem de caráter

mais duvidoso é quem lida com a droga. Verdes anos, por se passar em uma cidade

interiorana, tem em seus personagens os mesmos conflitos de Bete em Valadares. Choca a

cidade, por exemplo, a adolescente feminista que quer perder a virgindade à qualquer custo.

Garota dourada, em sua obstinação por censura livre, não fala sobre sexo nem

homossexualismo tampouco drogas.

105
Alguns críticos, como Bazi, desacreditaram Bete Balanço pela “inexplicável timidez com

que enfoca o homossexualismo e as drogas”. Acredito que, se estes assuntos não são

abordados de forma mais aprofundada pelo filme, isto se deve a sua coerência narrativa.

Isto é, estas questões simplesmente não são de grande relevância para o filme porque não

são para a personagem principal, que as vive. Por isso, não há impasses éticos, morais ou

existenciais – se é que era isto que o crítico desejava. Há, no filme, algo como que uma

mensagem tácita de que sexo e drogas estão aí para serem usufruídos, porém com

ponderação. Tanto que Bete não é promíscua tampouco viciada.

De forma mais ampla, Capuzzo critica a superficialidade de Bete Balanço por não realizar

“um retrato fidedigno da juventude, com suas contradições, traumas, sonhos e aspirações”.

A pesquisa e a análise sobre o filme bem como sobre as demais produções do período

demonstram o contrário. Além de ter uma visão contemporânea sobre sexo,

homossexualismo e drogas, Bete Balanço assimila uma grande lição de O sonho não

acabou: a tentativa do jovem em se inserir no mercado de trabalho. No seu caso, o universo

da moda, da publicidade e da música, ramos que começavam a se destacar na indústria

cultural brasileira, alterando os costumes da sociedade. Até mesmo o culto ao corpo

explorado pelo filme segue estas novas orientações. Bete Balanço não o associa mais à

prática de esportes, como nos filmes de Calmon. Ou seja, como sendo um dos resultados

decorrentes de uma finalidade (surfar). Agora, a beleza plástica do corpo passa a ser um fim

em si mesma. Torna-se mais um valor, um produto a ser vendido, como na sessão de fotos

106
de nu artístico. É tempo dos primeiros vídeos (1982) da notória série Work out, em que Jane

Fonda dissemina a prática da ginástica e da musculação185.

Acredito que uma certa incompreensão generalizada sobre este momento de transição toma

conta das pessoas que não a aceitam. Capuzzo, em sua resenha, por exemplo, ignora

categoricamente qualquer aspecto sobre o meio com o qual Bete deseja trabalhar, seja por

menosprezo ou desconhecimento pelo caráter incipiente das atividades; já a juíza Solange

Hernandez censura o filme por “questões ideológicas”, mais precisamente, por não aceitar

que uma jovem de 18 anos aceite dinheiro para posar nua. Talvez, não por acaso,

Hernandez tem reação semelhante a dos pais de Bete, no filme. As novas práticas e os

novos costumes requeriam novos parâmetros de avaliação. É esta defasagem que leva

Caetano a observar atitudes de “libertária de butique” em Bete. Quando, na realidade, a

personagem reproduz em seu comportamento a revisão pelo qual os valores morais

patriarcais e familiares mais arraigados estavam passando.

Retratar a juventude não significa apenas discutir sobre questões “cruciais”, mas também

saber apreciar suas futilidades. Neste sentido, Bete Balanço pode ter sido influenciado por

temas e linguagens do novo teatro brasileiro surgido em 1974 com a criação do grupo

carioca Asdrúbal Trouxe o Trambone186. Lael realizaria Bete Balanço somente em 1984,

ano que a companhia se desfez, mas a transposição para a tela grande das concepções da

trupe estava assegurada. Importava ao diretor que seu filme falasse das “barras, das

relações dos jovens, fazendo uma reflexão sobre isso. Mas não uma reflexão de cima para

185
Conforme http://www.imdb.com/name/nm0000404
186
Ventura, Mauro, e Oliveira, Roberta. De volta àquela farra toda. O Globo. Rio de Janeiro, 15 fev 2004.

107
baixo, e sim linear, que todo mundo faz no dia a dia” para aproximar-se de seu público,

assim como ao Asdrúbal interessavam

as inquietações, os grilos – para usar um termo da época – as delícias e os anseios da geração de


classe média carioca em torno dos 20 anos. Os “asdrúbals”recolhiam inspiração no dia-a-dia e
traziam dúvidas no lugar de certezas, problemas cotidianos em vez de questionamentos políticos,
187
intimidade com o espectador em substituição ao tradicional distanciamento entre palco e platéia.

Ao planejar se comunicar com um espectador eminentemente jovem, Lael Rodrigues

preocupava-se em dar credibilidade à sua história. Segundo ele, era necessário “botar na

tela personagens vivos”. Desta forma, pode-se imaginar que “a interpretação despojada, o

uso de gírias e palavrões”188 que marcaram os espetáculos do Asdrúbal e ajudaram-no a se

comunicar com a juventude da época foram deliberadamente incorporados pelo elenco de

Bete Balanço. Destaca-se as gags visuais de Diogo Vilela e a cena em que seu personagem

Paulinho, no clima do besteirol teatral, tem o prazer zombeteiro de mobilizar os moradores

do prédio para arrombar a porta de seu apartamento para flagrar Bete fazendo sexo com

Rodrigo. Agora, tanto no teatro quanto no cinema, falava-se do cotidiano da juventude

brasileira através de sua própria linguagem. Sob esta perspectiva, nada mais natural do que

abrir espaço para o entretenimento proporcionado por um videogame e reconhecer que

certas questões não se colocam mais, estão ultrapassadas. Apesar de Bete Balanço, assim

como o Asdrúbal, apresentar conscientemente jovens sem engajamento político ou social,

algumas críticas quiseram-lhe imputar estes valores erroneamente. Isto ocorreu devido à

sub-trama do fotógrafo Rodrigo, que registra e expõe as fotos do linchamento de um menor

para denunciar os agressores. No entanto, avalio esta passagem como uma das formas do

filme exemplificar como Lael observa a juventude – com “uma perspectiva positiva de

vida, com a personagem enfrentando as dificuldades, os contratempos, sempre como parte

108
da vida, sempre com vontade que tudo dê certo”. Assim, como Bete supera todos os

obstáculos para ser cantora, Rodrigo faz o mesmo para que haja justiça. Para que se

compreenda melhor a postura do fotógrafo é preciso lembrar que o país atravessava um

processo de abertura política. A ditadura brasileira, ao longo dos anos, desengajara política

e socialmente a geração de Rodrigo (através de seu aparelho coercitivo e de vigilância), e

fizera a sociedade incorporar novos hábitos e valores de consumo e produtividade (com o

processo de rápida industrialização do Milagre Econômico). Assim sendo, acredito que o

episódio contra o qual o fotógrafo se revolta está mais ligado à crítica dos sintomas de uma

sociedade entregue ao capitalismo mais voraz – em suas palavras, “a inércia, o

individualismo e o medo de se envolver” – do que à manifestação de engajamentos

políticos ou sociais. Desnecessário lembrar que Bete e Rodrigo, com muito prazer, buscam

participar desta sociedade (capitalista) e usufruir suas benesses, mas nem por isso perdem a

perspectiva de um certo horizonte ético. Coincidentemente, por esta época começam a

surgir os primeiros movimentos de representação da sociedade civil e de cidadania189,

novas formas de mobilização social.

A capacidade do teatro em atualizar sua linguagem à atomizada experiência cotidiana

descolada do político da nova juventude urbana brasileira não foi um privilégio exclusivo.

Todas as expressões artísticas passavam pelas mesmas modificações: as artes plásticas, o

audiovisual, e a música rock nacionais.

187
Idem.
188
Idem.
189
Bertol, Rachel. Veredas do Brasil futuro. O Globo. Rio de Janeiro, 15 de fev 2003.

109
Morais190, no “manifesto” da exposição Como Vai Você Geração 80? (Escola de Artes

Visuais do Parque Lage, RJ), em 1984, logo em seu início, fala em rock-pintura e que

“pintura é emoção”, “é fruto de uma experiência, não nasce da teoria”, destacando a

vivência do artista, marca da tal Geração 80. O autor segue contrapondo as artes plásticas

dos anos de 1970, “hermética, purista e excessivamente intelectual”, à nova, subjetiva e

individualizada e, por isso, mais comunicativa. Longe dos projetos totalizantes que

marcaram as gerações anteriores, “os jovens de hoje descrêem da política e do futuro. Mas

não são exatamente pessimistas, ou melhor, preferem deixar as grandes questões de lado. E

na medida em que não estão preocupados com o futuro, investem no presente, no prazer,

nos matérias precários, realizam obras que não querem a eternidade dos museus nem a

glória póstuma”. Por último, cita, dentre outras, como fontes de inspiração cotidiana dos

artistas os produtos das lojas de departamentos, os videoclipes e videogames. Guinle191, em

outro escrito sobre a geração, destaca que “estão ausentes nos trabalhos brasileiros a busca

de identidade nacional (...), [que] preferem o cosmopolitismo barato dos shopping centers;

a representação da sexualidade amiúde amorfa e anônima das grandes cidades”.

É surpreendente constatar como os dois textos corroboram em todas as análises feitas pela

pesquisa acerca do filme em estudo. As considerações acerca de uma arte vivencial

aproximam-se à afirmativa de Lael de que Bete Balanço é “um filme de muita emoção e

pouca explicação”. No campo cinematográfico, Cinema Novo e Bete Balanço são as duas

extremidades de impasses que parecem ter se reproduzido em todas as artes.. Os

190
Morais, Frederico. Gute Nacht herr Baselitz ou Hélio Oiticica onde está você. In: Arte contemporânea
brasileira: texturas, dicções, ficções, estratégias. Rio de Janeiro, Rios Ambiciosos, 2001, p. 224.
191
Guinle, Jorge. Papai era surfista profissional, mamãe fazia mapa astral legal. “Geração 80” ou como matei
uma aula de arte num shopping center. In: Arte contemporânea brasileira: texturas, dicções, ficções,
estratégias. Rio de Janeiro, Rios Ambiciosos, 2001, p. 231.

110
referenciais de inspiração dos artistas e de Lael Rodrigues encontram plena consonância na

indústria cultural globalizada, engolindo a questão do nacional.

O cinema, por sua vez, era “invadido” pela estética televisiva. Nestes termos, difícil não

associar Bete Balanço a Flashdance. Fora as coincidências temáticas já comentadas, há

outras referentes à linguagem e estética . Dirigido por Adrian Lyne, Flashdance parece ter

muito a dever às suas experiências anteriores em comerciais para a televisão192. O filme

utiliza-se com propriedade, assim como Bete Balanço, de contraluzes, alta profundidade de

campo, grafismos, ângulos “inusitados” para registrar as cenas, áreas localizadas da

imagem em superexposição, afastamento dos tons “naturais” da cena na fotografia, e

montagem “picotada” e frenética por ocasião dos números musicais. Mas o que para Lyne

era mero exercício de estilo, para Lael tratava-se de uma questão de credibilidade à sua

narrativa, isto é, ter forma e conteúdo em consonância – afinal, seu filme ambienta-se no

universo da publicidade, do comercial, do videoclipe e o de Lyne, não. Logo, Bete Balanço

pôde avançar mais alguns passos do que Flashdance sobre a questão. Como, por exemplo,

nas cenas de “making of’s” de programas de televisão com bandas tocando ao vivo; e de

ensaios fotográficos de nu artístico e de marca de jeans. No entanto, a coroação do diálogo

do cinema com a nova linguagem televisiva vem com a incorporação do aparato

tecnológico que se vulgarizava naquele momento, o videoteipe, do qual Lael extrairia

texturas e toda sorte de efeitos de edição para a realização de alguns dos videoclipes do

filme.

192
Conforme http://www.imdb.com/name/nm0001490/bio

111
A crítica, de forma geral, menosprezou ou ignorou estas relações. Por esta época, a

tecnologia do videoteipe vinha proporcionando a substituição das transmissões ao vivo de

certos programas de televisão (afastando os problemas decorrentes do improviso e do acaso

bem como possibilitava a elaboração prévia destes programas) e o barateamento dos custos

de produção (substituindo a película), reconfigurando a face da televisão brasileira193. No

entanto, tal tecnologia não era nova em terras estrangeiras e desde o início da década de

1970 já era utilizada para a realização de videoclipes194. O preconceito da crítica para com

o formato videoclipe torna-se evidente quando esta brada por “purismos”, lamentando sua

incorporação ao cinema. Esquecem-se, porém, do status “cinematográfico” que o

videoclipe já adquirira em 1982, com o notório Thriller, sob música homônima de Michael

Jackson. Inteiramente filmado em película e originalmente contanto com 13 minutos de

duração, o filmete é um musical, com direito a metacinema, em curta-metragem195. Conta

uma pequena história de terror protagonizada pelo próprio Jackson, que dança e canta nas

passagens musicais que se espalham pelo videoclipe. Além disso, sua direção ficou a cargo

de um profissional de carreira eminentemente cinematográfica, John Landis – que realizara

o musical Os irmãos cara-de-pau (The blues brothers, 1980) e o terror Um lobisomem

americano em Londres (An american werewolf in London, 1981)196.

Concebendo Bete Balanço em diálogo com uma constelação de expressões midiáticas, Lael

Rodrigues emulou em sua narrativa a fruição que as caracterizam. Da reprodução da

193
Lima, Thayse Leal. A arte do videoclipe. Cinemais – Revista de cinema e outras questões audiovisuais n°
30, Rio de Janeiro, Editorial Cinemais, 2001, p. 121.
Bertol, Rachel. Veredas do Brasil futuro. O Globo. Rio de Janeiro, 15 de fev 2003.
194
Lima, Thayse Leal. A arte do videoclipe. Cinemais – Revista de cinema e outras questões audiovisuais n°
30, Rio de Janeiro, Editorial Cinemais, 2001, p. 122.
195
Conforme http://www.imdb.com/title/tt0088263
196
Conforme http://www.imdb.com/name/nm0000484

112
célebre foto de Marilyn Monroe deitada nua sobre uma cama vermelha ao ritmo ágil do

videoclipe. A fotografia tem participação fundamental ao construir planos de grande beleza

plástica, que instigam o olhar e a atenção do espectador em explorá-los. A montagem,

trabalho do próprio Lael, por sua vez, preocupa-se em não deixar o espectador dispersar do

filme. As elipses são muitas, mas não são de grandes espaços temporais; os cortes, precisos,

o filme está onde as ações se dão, sem tempo para a contemplatividade; e prefere-se,

sobretudo, o corte seco – tudo para imprimir um sentido de urgência, muito associado ao

jovem. É nesta montanha-russa de estímulos que o diretor trabalha mais uma das

expressões, o merchandising. A despeito de qualquer crítica (e não foram poucas) sobre a

veiculação de marcas de patrocinadores ou a falta de “bom gosto” na forma de inserção das

mesmas em determinadas cenas, não se pode tirar o mérito de Lael. Segundo ele, tentou-se

conjugar interesses sobre “uma fonte de recursos fundamental e inevitável” para a produção

de um filme que já era “favorecido pela própria temática”. Destaca-se, então, um cuidado

na concepção das cenas com inserção de merchandising. Mais do que isso, há a tentativa de

incorporá-lo de forma a colaborar com a narrativa, sendo muito feliz nos anúncios de jeans.

Ainda a contribuir com a fruição do filme, investiu-se sobre procedimentos narrativos sem

sobressaltos, de fácil reconhecimento e que engajassem o público. Assim, estabelece-se

simples, mas eficientes “jogos” de tensão e distensão como, por exemplo, nas seqüências

que a todo momento reafirmam o inexorável final feliz da protagonista apesar dos

obstáculos que não cessam de se colocar à sua frente, desta forma, investindo-se na

psicologia da personagem Bete. As músicas da trilha-sonora colaboram neste sentido

também, antecipando acontecimentos, e ainda são utilizadas como “ilustração” ou

“comentário” de cenas. Por último, trabalha-se como mais um dos pontos de tensão, os

clichês da oposição entre “campo” e cidade.

113
Outro aspecto essencial ao filme que pouco despertou atenção da crítica foi o BRock. A

consagração do rock brasileiro dá-se entre os anos de 1982 e 1986. Bete Balanço, que

estréia em 1984, participa desta fase em uma espécie de via de mão dupla com o

“movimento”: ao mesmo tempo em que dá destaque a ele, este se utiliza do filme como

mais uma das formas a colaborar em sua materialização. Para o melhor entendimento das

bases gerais em que Lael Rodrigues investia seu filme, faz-se necessário acompanhar parte

deste período, de forma breve, até 1984, ano de estréia de Bete Balanço. Depois, cabe

analisar como se deu o diálogo entre Lael e o BRock para a realização do filme e a

contribuição deste ao “movimento”.

Muito espirituosamente, o ensaísta e jornalista Arthur Dapieve criou o termo BRock para

designar a atribuição de uma linguagem nacional ao ritmo estadunidense rock´n´roll. A

leitura de seu livro BRock: o rock brasileiro dos anos 80 nos faz compreender porque

foram necessários quase trinta anos – o registro da primeira música data da segunda metade

da década de 1950 – até sua plena consolidação como “ritmo brasileiro”, nos anos de 1980.

Para que isto ocorresse, segundo o autor foram necessárias condições particulares no

quadro musical brasileiro corrente: a estagnação estética (das músicas) e financeira (das

vendagens) da MPB; o advento de novos subgêneros do rock’n’roll, conferindo novas

concepções estéticas ao gênero que, por sua vez, influenciaram os artistas nacionais; a

conquista de espaço na mídia, fazendo expor e circular informações afins; a formação de

público, constituindo um mercado consumidor; o interesse da indústria musical em um

novo e forte nicho econômico; e a esfera político-social do país em transição, com a

abertura promovida pelo regime militar. Compete, aqui, sintetizar os acontecimentos mais

114
importantes apontados por Dapieve no intuito de reconstruir o cenário musical brasileiro da

época que tanto influenciou Lael Rodrigues.

Em 1978, o Vímana, banda carioca influenciada pela fase mais progressiva dos Mutantes e,

conseqüentemente, distante de uma proposta de rock´n´roll nacional, encerra suas

atividades. Libera Lulu Santos, Lobão e o inglês Ritchie para suas carreiras solo,

completamente distintas entre si e do Vímana. Lulu Santos, em 1981, grava três bem-

sucedidos compactos, mas tem participação decepcionante no festival MPB-Shell 81.

Igualmente fracassada é a performance da banda paulista Gang 90 & As Absurdettes, que

também lança um compacto. No ano seguinte, o circuito carioca e paulista de bares onde

bandas rock se apresentam ganha mais expressividade. No Rio de Janeiro, por exemplo,

inaugura-se o emblemático Circo Voador. Por sua vez, as rádios FM – então uma novidade

– dedicadas exclusivamente ao gênero abrem espaço a estas bandas. Tocar rock’n’roll,

naquela ocasião, era uma atividade marginal, não havia sentido algum na idéia de se

prosperar com o estilo no país uma vez que não havia um cenário a ser explorado. Até

então o rock’n’roll “sobrevivera” acima (por influência cultural estadunidense), ao lado

(por depender de brechas ocasionais na música brasileira, como na Jovem Guarda), abaixo

(por ser compreendido como um artigo importado e supérfluo, sem prestígio da crítica) ou

de fora (por encontrar os mais diversos movimentos de resistência) da música popular

brasileira, mas nunca dentro dela.

Você, olhando pra trás não tinha... a gente só tocava... ninguém pensava que poderia dar em alguma
197
coisa. (Philippe Seabra, Plebe Rude)

No meu tempo, quando eu comecei a tocar, era uma utopia assim você gravar um disco. Era uma
coisa impossível. Você tocava de brincadeira, mas não tinha a menor ambição de... porque não

197
Transcrição do depoimento dado ao programa Clipe Brasil – Especial Rock Brasília, Canal Brasil, 2002.

115
existia isso. Hoje em dia é diferente. É até uma profissão. Muita gente quer já... já estuda para ser
198
músico. (Bi Ribeiro, Paralamas do Sucesso)

Um compacto da Blitz, banda carioca que já vinha se destacando no circuito alternativo, faz

imenso sucesso. Formada, dentro outros, por atores do grupo teatral Asdrúbal Trouxe o

Trambone, reproduzia em suas músicas as lições aprendidas com a companhia:

era tudo aquilo que as rádios não tocavam na época: linguagem coloquial, urbana, um pop muito-
bem feito, mais falado que cantado. (Dapieve, 54)

Assim como a trupe trabalhava em seus espetáculos o cotidiano de uma juventude pequeno-

burguesa dos centros urbanos, BRock, como um todo, “era música feita por jovens homens

brancos de classe média alta para seus pares. (...) A elite sofisticada. Bem-informada sobre

os rumos do rock lá fora” que falava “coisas comuns ao pessoal de sua própria geração”199.

O rock vai ganhando maiores espaços na mídia com a Blitz e com o movimento punk

paulista. Ambos atraem a atenção da grande imprensa e ganham entrevistas e capas em

vários jornais e revistas200. Logo há a estréia em LP de alguns artistas: Lulu Santos, Barão

Vermelho e Lobão.

Em 1983, há o lançamento dos novos LPs de Lulu Santos e Barão Vermelho, e as estréias

de Camisa de Vênus, João Penca & Seus Miquinhos Amestrados, Léo Jaime e Paralamas

do Sucesso. Dois artistas destacam-se este ano: Ritchie, que tem vendas surpreendentes

(seu compacto vende 500 mil cópias e seu LP, outras 700 mil; e a música Casanova entra

na trilha da novela Champagne, da Rede Globo), e a Blitz, que

198
Idem.
199
Dapieve, Arthur. BRock: o rock brasileiro dos anos 80. Rio de Janeiro, Editora 34, 1995, p. 195.
200
Bivar, Antonio. O que é punk. São Paulo, Ed. Brasiliense, 1988, pp. 93-115.

116
por essa época, (...) conhecia o Brasil de cabo a rabo, era um fenômeno de mídia como o país ainda
não havia conhecido. (Dapieve, 59)

Mídia que garante a presença dos artistas nas rádios, nos jornais, e na TV, através dos

chamados “programas de calouros”.

Eles conseguiram chegar à televisão rápido. O Paralamas [do Sucesso] tava no Chacrinha um mês
depois que lançou o disco. Foi bem rápido todo o processo. Em dois anos já tinha... todo mundo já
201
tava no ar, nas revistas e nas tvs. (Tom Leão, jornalista)

Mudou tudo depois dessa geração que eu faço parte, dos anos 80, a quantidade de música que é feita
e tocada e produzida no Brasil é muito maior hoje do que... tem até uma lei... que obriga a tocar na
rádio não sei quantos por cento de música nacional. Hoje em dia, toca-se muito mais, passa essa
porcentagem, nem precisava ter mais a lei. E, acho, que aconteceu muito, depois da... dessa geração
202
minha. (Bi Ribeiro, Paralamas do Sucesso)

A essa altura, praticamente toda gravadora possui em seu cast pelo menos um artista do

rock nacional. O BRock foi benéfico à industria musical ao injetar capital nas gravadoras

através de seus recordes de venda e ao aquecer mercados paralelos, como o da imprensa

especializada (que com a diversidade da cena fez com que suas publicações se

segmentassem), das casas de show, da indústria de instrumentos musicais e das mídias.

Rock brasileiro, pop, música pop desde o início foi uma ponte pra trazer tecnologia de show business
203
pra este país. (Lulu Santos)

No ano de 1984 novos artistas estréiam (Gang 90 & As Absurdettes, Kid Abelha & Os

Abóboras Selvagens, Titãs) e outros seguem com seus segundo ou terceiro LPs (Blitz,

Paralamas do Sucesso, Lulu Santos, Barão Vermelho, Ritchie, Lobão e Os Ronaldos). Em

setembro, vai ao ar, pela Rede Globo, um especial com o grupo Blitz tocando no

Sambódromo para 30 mil pessoas e; logo depois, a banda apresenta-se na Praça da

Apoteose com o Barão Vermelho e as orquestras sinfônicas Brasileira e do Teatro

201
Transcrição do depoimento dado ao programa Clipe Brasil – Especial Rock Brasília, Canal Brasil, 2002.
202
Idem.

117
Municipal pelo Projeto Aquarius. O rock brasileiro vai tomando proporções cada vez

maiores, mas o ápice só é conhecido nos dois anos seguintes, através de dois eventos sem

precedentes no país: as gigantescas proporções do festival Rock In Rio, em 1985, e a

colossal marca de 2,2 milhões de cópias vendidas do LP Rádio Pirata – Ao Vivo, do RPM,

em 1986.

Como se pode observar, se o investimento de Lael Rodrigues sobre o BRock não

significava um negócio de risco, estava, aparentemente, longe de garantir um estouro de

bilheteria. Bete Balanço começou a ser rodado em dezembro de 1983204 e, até então, o rock

brasileiro havia conseguido apenas uma certa recorrência na mídia e a criação de um

pequeno circuito alternativo próprio. Ambos ainda enfrentavam uma situação instável.

Havia uma impressão de que poderiam desaparecer de forma tão breve quanto surgiram.

(...) é provável que estejamos testemunhando apenas mais um modismo musical, mais uma rebelião
romântica da Jovem Guarda, em outro momento histórico. (...) Normalmente, eles [os grupos] têm
205
vida curta e desaparecem com o modismo.

A carreira de nenhum dos participantes da trilha-sonora do filme206 estava garantida. Para

termos uma idéia, o Barão Vermelho, banda com maior destaque no filme – colaborando

203
Transcrição do depoimento dado ao programa Em Foco – Retratos Brasileiros – Anos 80, Canal Brasil,
2002.
204
Salem, Helena. ‘Bete Balanço’, a roqueira que vem das Gerais, começa a nascer no Voador. O Globo. Rio
de Janeiro, 22 dez 1983.
205
Caldas, Waldenyr. Iniciação à música popular brasileira. São Paulo, Ed. Ática, 1985, pp. 72 e 73.
206
De acordo com o press-book do filme Bete Balanço. Pasta do filme. Arquivo do Museu de Arte Moderna
(MAM), Rio de Janeiro, participam da trilha-sonora do filme: Barão Vermelho (Amor, amor; Bete Balanço;
Vem comigo); Lobão e Os Ronaldos (Me chama); Brylho (Meditando); Celso Blues Boy (Blues Motel);
Metralhatxeka (Mecenas de maizena) e Sangue da Cidade (Video-game). Titãs, Azul 29, Cristina Conrado e
Ricardo Bomba são citados como “músicas adicionais”.
De acordo com os créditos finais do filme, cedem suas músicas: Barão Vermelho (Amor, amor; Bete Balanço;
Vem comigo; Carente profissional); Lobão e Os Ronaldos (Me chama); Brylho (Meditando); Celso Blues Boy
(Blues Motel); Metralhatxeka (Mecenas de maizena); Sangue da Cidade (Video-game); Azul 29 (Video-
game); Cristina Conrado (Sempre juntos); e Ricardo Bomba (Nosso caso de amor). Os Titãs não são citados.
Em Bahiana, Ana Maria. Mesmo sem apoio do filme, o disco se mantém de pé. O Globo. Rio de Janeiro, 25
jun 1984 podemos verificar a escalação de artistas e respectivas músicas que entraram no LP da trilha-sonora

118
com 4 músicas, sendo uma delas a canção-título; com participação especial do grupo

tocando suas músicas em algumas cenas; e Cazuza, seu vocalista, atuando em papel

secundário –, poderia vir a encerrar suas atividades ao longo do processo de realização Bete

Balanço.

Lorena Calábria: Outro nome de destaque no cenário rock-pop dos anos 80 que também demorou
um pouquinho para acontecer foi o Barão Vermelho. O primeiro disco da banda [homônimo, de
1982], passou quase batido, aí depois o Ney Matogrosso gravou Pro dia nascer feliz [do segundo
álbum da banda, Barão Vermelho 2, de 1983], mas o grande sucesso mesmo veio com Bete Balanço,
música tema do filme.

Roberto Frejat: Eu sentia o Cazuza muito em dúvida em relação ao futuro dele como músico antes
do Pro dia nascer feliz estourar. Eu me lembro de... a gente saindo um dia... da dublagem é... do Bete
Balanço, do filme. E a gente tava assim no portão do lugar onde a gente foi gravar. E aí ele falou
assim: “pô cara, é... eu acho que não vai dar certo isso, cara... não tá rolando, sabe. Pô, a gente já
lançou dois discos e... não tá acontecendo, pô, sabe. Nêgo (sic) fala até “legal”, mas não tá tocando
na rádio. O que que vai ser?” Eu falei: “cara, calma. Tenha um pouco mais de calma. O trabalho é
legal, você gosta, não gosta? Eu também gosto. Eu acho que a gente acredita no negócio. A gente
tem que ter um pouco mais de paciência. As coisas não acontecem fácil assim”. E aí ele falou: “é,
mas, pô, eu fico às vezes meio desesperançoso. Falei: “cara, vamos acreditar. Vai rolar”. E aí
207
estourou a coisa do Pro dia nascer feliz.

Ney Matogrosso regrava Pro dia nascer feliz, que logo ganha as rádios. Rapidamente, a

gravadora do Barão Vermelho, que já cogitava dispensá-lo, investe na mesma música. A

versão do grupo é ainda mais executada e, finalmente, sua carreira começa a decolar.208

Portanto, as acusações de oportunismo feitas a Lael Rodrigues, por abraçar o incipiente

fenômeno do BRock, não se mostram tão procedentes assim. Mesmo o rock brasileiro

estando em evidência, aparentemente, tanto ele quanto o Barão Vermelho tinham muito

pouco a contribuir com o sucesso do filme, e a recíproca era verdadeira. Tanto para Cazuza,

que poderia desistir da banda antes mesmo de Bete Balanço chegar aos cinemas, quanto

do filme: Cristina Conrado (Sempre juntos); Ricardo Bomba (Nosso caso de amor); Metralhatxeka (Mecenas
de maizena); Barão Vermelho (Amor, amor; Bete Balanço); Celso Blues Boy (Blues Motel); Titãs (Toda cor);
Lobão e Os Ronaldos (Me chama); Brylho (Meditando); e Azul 29 (Video-game). Sangue da Cidade não é
citado.
207
Transcrição do programa Ensaio Geral – Especial Rock Brasil – Parte 1, Multi Show, 2002.

119
para Lael, que colocara a banda Barão Vermelho executando suas próprias músicas no

filme, mas fazendo-se passar por uma outra qualquer, meramente ficcional. Acredito que,

originalmente, o BRock tratava-se de uma aposta de Lael em mais uma das atualidades

(assim como videoclipe, publicidade, moda, culto ao corpo) da juventude da época para

atraí-la ao filme – “o rock é o elemento de maior identidade com o público que eu queria

me comunicar”, escreveria ele meses depois no press-book de Bete Balanço, com o Barão

Vermelho já famoso em todo o país. Cazuza, em declaração que deve coincidir com o

sucesso de Pro dia nascer feliz na voz de Ney, parece concordar com a hipótese levantada,

ao destacar mais a forma de abordagem do filme do que os elementos que o compõe:

Logo que li o roteiro, comprei a idéia no ato. É um filme jovem para jovem. Não é água com açúcar.
209
É a história de todo jovem que batalha, mostra o dia a dia, a realidade dos jovens.

Não era por acaso que o vocalista pouco acreditava na parceria entre o BRock e o cinema.

As mais recentes experiências eram Menino do Rio (1981) e Garota dourada (1983),

ambos de Antonio Calmon. O primeiro, mais feliz nesta proposta, acompanhou de perto o

início do “movimento”, a transição do ““som jovem” possível na época”210 do Rádio Táxi

para o incipiente BRock de Gang 90 & As Absurdettes e Lulu Santos. O filme obteve 2,2

milhões de espectadores211, mas as músicas haviam sido inseridas apenas como fundo de

ambientes como bares e discotecas, sem participar mais organicamente do filme. À exceção

de De repente Califórnia, de Lulu Santos, veiculada no filme somente através da

interpretação de Pepeu, personagem de Guto Graça Mello. Se o espaço sonoro do BRock

208
Dapieve, Arthur. BRock: o rock brasileiro dos anos 80. Rio de Janeiro, Editora 34, 1995, p. 69.
209
Salem, Helena. ‘Bete Balanço’, a roqueira que vem das Gerais, começa a nascer no Voador. O Globo. Rio
de Janeiro, 22 dez 1983.
210
Essinger, Sílvio. Rock Brasil 1 – 1955-1984, A revolução, de Nora Ney a Bete Balanço.
www.cliquemusic.com.br/br/Generos/Generos.asp?Nu_Materia=6 . Sem data.
211
Press-book do filme Garota dourada. Pasta do filme. Arquivo do Museu de Arte Moderna (MAM), Rio de
Janeiro.

120
no cinema engatinhava como seu próprio progresso, o visual ainda estava para ser

conquistado. Calmon, em Garota dourada, apesar de investir pesado na imagem de

músicos, estaciona em sua concepção musical. Convoca Guilherme Arantes, da MPB, para

a compor a trilha-sonora e Marina Lima, outro artista MPB, para pequena participação212.

Ritchie, em pequeno número musical, e Lulu Santos, novamente cedendo uma música sua

para um personagem de Guto Graça Mello, apesar de pertencerem ao BRock ainda não

eram seus porta-vozes por serem de uma geração anterior à de seus públicos213. Por último,

faz do personagem de Sérgio Mallandro em um ídolo do rock’n’roll – tal como convinha a

época, com o BRock em ascensão –, porém interpretando composições que remetem às da

década de 1960.

Somente com Bete Balanço, os legítimos representantes do BRock viriam a interpretar

personagens, cantar (eles mesmos) seus sucessos em um filme e participar da trilha-sonora.

Em uma grande ironia, o próprio Barão Vermelho, “primeiro porta-voz de sua geração e,

nesse sentido, a primeira banda do BRock, o rock brasileiro”214.

Outras distinções entre o filme de Lael Rodrigues e os de Calmon podem ser destacadas.

Menino do Rio e Garota dourada são dramas praieiros e estão muito ligados a conceitos

setentistas de respeito e harmonia para com a natureza. Bete Balanço, por outro lado, tem

como ambiente a cidade e sua dinâmica, o que facilita a inserção do BRock, fenômeno

musical eminentemente urbano, na trama. Em seus filmes, Calmon faz, fundamentalmente,

o uso diegético do rock´n´roll nacional, sendo executado por personagens ou de fundo em

212
Dapieve, Arthur. BRock: o rock brasileiro dos anos 80. Rio de Janeiro, Editora 34, 1995, pp. 24 e 181.
213
Idem, pp. 35-52 e 68.

121
discotecas, por exemplo. Já Lael trabalha as músicas tanto de forma diegética – através de

personagens e dos próprios intérpretes originais em cena – quanto extra-diegética. Por

último, em Menino do Rio e Garota dourada as músicas tem a função de sublinhar a ação

das cenas, o que corrobora à dispensa de um trabalho mais elaborado sobre elas. Em Bete

Balanço, as músicas têm papel importantíssimo, pois sublinham, antecipam ou incitam as

ações dos personagens, contribuindo narrativamente. Além disso, estas músicas, resumidas

na figura do BRock, não têm somente um caráter de lazer ou recreativa, mas também

comercial. A realização pessoal da personagem-título está na sua entrada no esquema da

indústria musical.

Até chegar a escalação final da trilha-sonora de Bete Balanço, Lael Rodrigues passou por

várias bandas, músicas, e até mesmo por troca de gravadoras.

Cazuza e Roberto Frejat (guitarrista) são os responsáveis pela música-tema do filme, “Bete Balanço”
(...) O Barão Vermelho também interpretará o rock “Vem Comigo” (...) e uma balada, talvez “Conto
de Fadas”, música inédita do grupo. A trilha sonora do filme deverá sair em disco, pela Som Livre.
215

Na realidade, foram utilizadas as músicas Carente profissional e Vem comigo, do LP Barão

Vermelho 2, de 1983216, somente no filme. Já Conto de Fadas, do LP Barão Vermelho, de

1982217, foi descartada. No entanto, foram compostas duas especialmente para a trilha,

Amor, Amor e Bete Balanço218. Juntas, foram lançadas em compacto antes da estréia do

filme assim como o videoclipe da música-título na televisão, em uma estratégia

214
Idem, p. 68.
215
Salem, Helena. ‘Bete Balanço’, a roqueira que vem das Gerais, começa a nascer no Voador. O Globo. Rio
de Janeiro, 22 dez 1983.
216
Conforme http://www.barao.com.br
217
Conforme http://www.barao.com.br, o ineditismo atribuído à música na reportagem é errôneo.
218
Conforme http://www.cazuza.com.br

122
promocional inédita219. O sucesso da música Bete Balanço foi tanto220 que o grupo a incluiu

em seu terceiro álbum, Maior Abandonado, de 1984221. Amor, Amor, apesar de ser

executada mais vezes no filme e ser o passaporte de Bete para o estrelato, jamais foi

adotada por LP algum do Barão Vermelho.

A trilha-sonora, que no final de 1983 era de responsabilidade da gravadora Som Livre222, é

lançada na época da estréia do filme – 30 de julho de 1984223 – pela WEA224. Da mesma

forma, Ultraje a Rigor, Ritchie e Leo Jaime, inicialmente cogitados para integrar a trilha225,

não se mantêm ligados ao projeto. Talvez a perda do mega-sucesso Ritchie tenha sido a

mais lamentável, sob um ponto de vista estritamente comercial, como forma de apelo ao

filme. No entanto, sua ausência passa a ser importante se levarmos em conta a diferença de

geração entre o cantor e o público de Bete Balanço – que já contava com Celso Blues Boy e

Lobão, também mais velhos como ele. De qualquer forma, o LP da trilha-sonora já atingia

30 mil cópias vendidas226 um mês após seu lançamento, uma marca respeitável.

A bem-sucedida estratégia promocional do filme de lançar compacto e videoclipe com o

Barão Vermelho antes da estréia colaborou, obviamente, em sua boa recepção. No meio

219
Sem autor. Bete Balanço agora em videocassete. Jornal da Tarde. São Paulo, 4 out 1984.
220
Bisordi, Gisela. “Bete Balanço” chega a São Paulo pelo Anhembi. Folha de São Paulo. São Paulo, 30 ago
1984.
221
Conforme http://www.mpbnet.com.br/musicos/cazuza
222
Salem, Helena. ‘Bete Balanço’, a roqueira que vem das Gerais, começa a nascer no Voador. O Globo. Rio
de Janeiro, 22 dez 1983.
223
Hoineff, Nélson. O sonho não acabou. O Dia. Rio de Janeiro, 30 jul 1984.
224
Caetano, Maria do Rosário. Censura implica com Bete Balanço. Correio Braziliense. Brasília, 7 jun 1984.
225
Salem, Helena. ‘Bete Balanço’, a roqueira que vem das Gerais, começa a nascer no Voador. O Globo. Rio
de Janeiro, 22 dez 1983.
226
Bisordi, Gisela. “Bete Balanço” chega a São Paulo pelo Anhembi. Folha de São Paulo. São Paulo, 30 ago
1984.

123
musical, não só garantiu a existência da própria banda como lhe imprimiu uma marca

indelével.

Roberto Frejat: A produtora musical do filme era a Liane Muhlenberg, que era amiga do Cazuza e
tudo. E ela deu um toque na gente que tava pintando esse filme. Que era um filme sobre jovens, que
era um filme sobre uma pessoa que vinha batalhar o seu lugar e tal. Aí ele fez a letra com a sinopse e
tal.

Lorena Calábria: É a música mais tocada, mais executada do Barão?

227
Roberto Frejat: É, o maior sucesso da história do Barão com certeza, é Bete Balanço.

O público correspondeu entusiasticamente ao filme, que obteve a marca de 1.327.900

espectadores228, a segunda maior bilheteria nacional de 1984, atrás apenas d’Os

Trapalhões229. Bete Balanço e BRock, assim, ajudaram-se mutuamente intra e extra-filme:

as músicas incentivavam o comparecimento ao filme e este, ao fazer uso destas mesmas

músicas e da imagem de seus intérpretes, animava os espectadores a envolverem-se ainda

mais com o novo “movimento”. A parceria não se encerrava por aí. Ambos mobilizaram

massas em ações conjuntas de divulgação. Reuniam-se nos eventos, de uma só vez, atores,

equipe técnica e os grupos tocando, além da exibição de trechos do filme. No Rio de

Janeiro, realizou-se a estréia nacional do filme e um show comemorativo no Noites

Cariocas, no Morro da Urca, que reuniu mais de 4 mil pessoas230. Já em São Paulo, houve

dois shows antes da estréia do filme, um deles mobilizando 3,5 mil pessoas231.

227
Transcrição do programa Ensaio Geral – Especial Rock Brasil – Parte 1, Multi Show, 2002.
228
Sem autor. Quadro CINEMA / As maiores bilheterias. O Globo. Rio de Janeiro, 4 dez 1987.
229
Dumar, Deborah. Infecção tira Lael de cena. O Globo, 19 jan 1989.
230
Departamento de Promoção e Propaganda – Embrafilme. “Bete Balanço” festa do filme ao ritmo da
música. Sem data; Sem autor. Filme. Última Hora. Rio de Janeiro, 2 ago 1984; Portes, Rosane. Badalação –
Bete Balanço agita no cinema e no Morro da Urca. Sem fonte. Sem local. Sem data.
231
Assessoria de Imprensa – Embrafilme. Sucesso no Rio, “Bete Balanço” chega a outras capitais. 22 ago
1984; Sem autor. Festival de rock para o filme “Bete Balanço”. Estado de São Paulo. São Paulo, 30 ago 1984;

124
Atentos ao sucesso de Bete Balanço, outros filmes entraram em cartaz estabelecendo, de

alguma forma, diálogo com o BRock. Em 1985, vieram:

Areias escaldantes (Dir.: Francisco de Paula): com músicas de Capital Inicial,

Ultraje a Rigor, Metrô, Ira!, Lulu Santos, May East, Gang 90 & As Absurdettes,

Titãs, e Lobão e os Ronaldos. Os dois últimos atuam e têm videoclipes no filme.

Lobão assina a direção musical do filme.232

As sete vampiras (Dir.: Ivan Cardoso): com Léo Jaime, cantando e atuando.233

Rock estrela (Dir.: Lael Rodrigues): com músicas, dentre outros, de Metro, RPM,

Tokyo, Celso Blues Boy, Fito Páez, e Léo Jaime, que também canta e atua.234

Rockmania (Dir.: Adnor Pitanga): com trilha de Kiko Zambianki, Zero, Plebe Rude,

Dulce Quental e outros.235

TropClip (Dir.: Luiz Fernando Goulart): trilha-sonora de Roupa Nova, Barão

Vermelho etc.236

Fúria, Malu Mendes. Bete Balanço: Sucesso. – A turma de Bete Balanço, sacudindo o Anhembi. Jornal da
Tarde. São Paulo, 31 ago 1984.
232
Conforme créditos inicias e finais do filme Areias escaldantes (Dir.: Francisco de Paula).
233
Conforme créditos inicias e finais do filme As sete vampiras (Dir.: Ivan Cardoso).
234
Conforme créditos inicias e finais e press-book do filme Rock estrela. Pasta do filme. Arquivo do Museu
de Arte Moderna (MAM), Rio de Janeiro.
235
Conforme press-book do filme Rockmania. Pasta do filme. Arquivo da Fundação Nacional de Arte
(FUNARTE), Rio de Janeiro.
236
Conforme créditos inicias e finais do filme TropClip (Dir.: Luiz Fernando Goulart).

125
No ano seguinte, A cor do seu destino (Dir.: Jorge Durán) tem a participação de Biquíni

Cavadão.237

De acordo com o material coletado, o ano de 1987 parece encerrar um ciclo, são realizados:

Rádio pirata (Dir.: Lael Rodrigues): Cazuza, Marina, Lobão, Ritchie, Nico

Rezende, Uns e Outros, Celso Blues Boy, Léo Gandelman dentre outros na trilha.238

Um trem para as estrelas (Dir.: Cacá Diegues): com participação especial de

Cazuza.239

Mistério no colégio Brasil (Dir.: José Frazão): alguns personagens tem uma banda

de rock.240

237
Conforme créditos inicias e finais do filme A cor do seu destino (Dir.: Jorge Durán).
238
Conforme créditos inicias e finais e press-book do filme Rock estrela. Pasta do filme. Arquivo do Museu
de Arte Moderna (MAM), Rio de Janeiro.
239
Conforme créditos inicias e finais do filme Um trem para as estrelas (Dir.: Cacá Diegues).
240
Conforme o filme Mistério no colégio Brasil (Dir.: José Frazão).

126
Considerações Finais

Já não me recordo quando optei realmente por analisar o filme Bete Balanço para a

confecção de minha monografia de fim de curso. Tem a ver, com certeza, com algumas

sombras que parecem ser projetadas sobre a história do cinema brasileiro, pela qual tanto

me interesso. Acho muito curioso as pessoas não se interessarem pelo cinema comercial;

perderem de vista os filmes da década de 1980; não se questionarem a respeito da

filmografia paralela ao Cinema Novo; ou ainda ignorarem se os adolescentes brasileiros

estão presentes nas telas ou se se reconhecem quando isto acontece.

Na verdade, quando externo estas questões, passo eu a ser objeto de curiosidade e o debate

se esvazia em máximas que falsamente tudo justificam: “há cinemas e cinemas”. A meu

ver, como já dito em outra ocasião, mas com outras palavras, “cinema é cinema” aqui e em

qualquer lugar, sob qualquer condição. Afinal, por mais que se variem os temas, se

diversifiquem as abordagens, se (re)inventem projetos estéticos, se proponham novas

linguagens, ou que a tecnologia ofereça cada vez mais formas de registro, manipulação e

exibição do material, tudo se reduz ao fato de que sempre haverá um sujeito detrás da

câmara.

Contudo, lembro do dia em que vi Bete Balanço pela primeira vez. Vitalidade, força, bom

humor, “alto astral” explodiam na tela. Tudo isso embalado ao som rock do momento e a

passagens que flertavam com o videoclipe. Um filme para jovens, de 1984, um ano de

127
grande depressão econômica, mas repleto de esperanças pela proximidade do advento da

Nova República.

* * *

Tentei reproduzir no desenvolvimento deste estudo as fases de sua pesquisa. Primeiro, era

necessário saber algo sobre o filme e seu diretor. Como raras (e por muitas vezes

preconceituosas) indicações foram encontradas a respeito de ambos, optei por levantar

hipóteses para este fato e confrontar o que constava na bibliografia cinematográfica

nacional com o que pude recolher nas fontes primárias. Qual não foi a surpresa da

comparação, tamanha a discrepância entre resultados! Como em uma equação matemática,

intuía que, por alterarem-se os fatores, a continuidade da pesquisa geraria produto bem

diverso do que é amplamente publicado. Era preciso entender o porquê de um projeto como

Bete Balanço naquele ano de 1984. Então, foram feitas três perguntas: se e como a

filmografia de Lael Rodrigues influenciou o projeto?; teria o diretor buscado respaldo na

cinematografia brasileira para realizar um filme para jovens e o que ele poderia ter

encontrado na mesma?; e qual o dado de contemporaneidade do filme e o que o diferenciou

dos outros de mesmos tema e estética?

É certo que a rede em que Lael Rodrigues e Bete Balanço se inserem é muito mais vasta e

complexa do que a literatura oficial nos faz crer, porém o que se pode apresentar por agora

é uma série de ponderações e apontamentos ao invés de conclusões fechadas, pela natureza

pioneira que acredito que o projeto tenha.

128
O que se apreende da trajetória cinematográfica de Lael Rodrigues é sua paixão pelo ofício.

Quero fazer cinema, seja como produtor, montador, co-diretor, roteirista ou diretor. Considero como
meus todos os filmes que contaram com minha participação, desde o surgimento da idéia. Gaijin,
Parahyba, J. S. Brown e Bar Esperança são como se fossem meus filmes. Neles, não coordenei a
241
equipe mas participei ativamente do processo de realização.

Da mesma forma que se pode falar em uma preocupação com o fazer cinematográfico,

idéia muito associada ao diretor Walter Lima Jr., no caso de Lael acredito que se poderia

pensar em uma vontade permanente de fazer cinema. Talvez isso possa explicar sua

desenvoltura em transitar por filmes de propostas tão diferentes – do Novo Cinema Popular

aos filmes de gênero do CPC, passando por projetos tão dispares quanto o introspectivo e

marginal Ovelha negra, uma despedida de solteiro e a comédia urbana Se segura,

malandro, em um espaço reduzido de três anos – assumindo as mais diversas funções. Seria

necessário, então, estar sempre fazendo filmes. O que não significaria, propriamente, fazer

qualquer filme.

Bete Balanço era o titulo de um outro roteiro que eu tinha. Era a história de uma chacrete. O
nome era bem próprio porque tinha Rita Cadilac, Lia Hollywood, Índia Amazonense e Bete Balanço
era um nome assim. Era uma história levada para o dramático mas com um tom erótico forte. Tudo o
que a gente fazia naquela época a gente discutia muito, eu, Cacá, Tizuka, Edgar Moura, Yurika
Yamasaki. Discutindo, a gente ficou com um certo receio de que, para um filme de diretor estreante,
uma temática próxima ao erótico fosse meio difícil de você levar e não ser taxado como um
pornô ou um pornochique, uma coisa assim. Eu não tinha nenhum grilo quanto a isso, mas as
pessoas decidiram em conjunto que a gente ia fazer outra coisa. Aí eu propus essa história. No final
de 83 foi que a gente decidiu isso e eu propus, através de uma sinopse, fazer esse outro roteiro.

O fato de você conseguir fazer bons filmes com uma grande receptividade era uma tese da CPC, da
qual Bete Balanço foi o representante maior – custo baixo, qualidade legal e boa receptividade é
242
um triangulo difícil de você conseguir juntar com bom resultado.

Podem-se extrair diversas considerações destas falas de Lael Rodrigues. Primeiro,

prosseguindo o assunto do parágrafo anterior, seria necessário fazer filmes com a idéia de

“qualidade legal” atrelada a de “boa receptividade”. O bom acabamento do filme

241
Caetano, Maria do Rosário. Censura implica com Bete Balanço. Correio Braziliense. Brasília, 07 jun 1984.

129
encontraria ressonância na bilheteria, provavelmente, pela crença de uma melhor fruição

por parte do espectador bem como pela apreciação estética do filme propriamente dito.

Segundo, a declaração de Lael de que não via problemas em ser taxado como diretor de

filme pornô corrobora a hipótese do fazer cinema em detrimento do projeto estético ou

tema que concerne a um filme. Obviamente, mais interessante será o projeto a se realizar na

medida em que sua estética e tema “facilitem” a receptividade do público, não perdendo de

vista àquela idéia de qualidade final do filme. Pois, somente assim seria possível continuar

a fazer cinema.

Sob o aspecto da produção, a realização de Bete Balanço se deve à evolução de uma postura
assumida pela CPC (Centro de Produção e Comunicação) de equacionamento do custo do filme à
realidade do mercado, sem prejuízo da qualidade do produto final. 243

Dando continuidade à análise das duas falas iniciais, por último temos a questão do

primeiro roteiro de Bete Balanço, que consistia na “história de uma chacrete”. Infelizmente,

não foi possível identificar o ano em que se deu esta proposta. Pode-se especular, contudo,

dada a premissa do filme, que Lael ainda poderia estar influenciado por um projeto de

Novo Cinema Popular. O que, se for verdade, torna ainda muito mais interessante sua

segunda proposta de roteiro, que é efetivamente filmada.

De 1974 a 1984, Lael Rodrigues testemunharia tanto a diluição do Novo Cinema Popular

de Nelson Pereira em seus próprios filmes – “se O amuleto foi polêmico e Tenda [dos

milgres, 1977] furou n’água, Estrada da vida [1980] nada mais vai ser que um solitário

242
Comunicação com o público jovem. In: Filme e Cultura n° 48 – Diretores estreantes. Fundação do
Cinema Brasileiro, Novembro, 1988, p. 138 e 144.
243
Press-book do filme Bete Balanço. Pasta do filme. Arquivo do Museu de Arte Moderna (MAM), Rio de
Janeiro.

130
representante de um movimento que não conseguiu se desdobrar com a força pretendida” 244

– quanto a impossibilidade de produção e o anacronismo estético do Cinema Novo em um

filme daquele que parecia ser seu primeiro e último porta-voz, Glauber Rocha e seu A idade

da Terra (1981). Não proponho este testemunho de forma leviana ou simplista. Lael,

naquele momento, poderia ser um espectador atento dessas mudanças, pois, assim como

iniciou suas atividades cinematográficas sob influencia do Novo Cinema Popular, sua

produtora, o CPC, foi responsável pela primeira fase de A idade da Terra.

Conseqüentemente, Lael poderia acompanhar e avaliar de forma muito próxima e imediata

as transformações do cinema brasileiro. Ao retomar a proposta de Bete Balanço, seria

evidente que esta deveria se dar por outros caminhos.

Quando se chega a 1983, ano do inicio da produção do filme, o quadro é de crise

econômica profunda, com crescimento estagnado e inflação descontrolada245. O mercado se

retrai sensivelmente e o fazer cinema está ameaçado.

Eu acho que a sobrevivência do cinema num momento de crise como atual está intimamente ligado à
esta questão. Não basta ser sucesso de crítica e até de público, se o retorno do movimento de
bilheteria não absorve os custos de produção do filme. É preciso ampliar e baratear a produção
246
para garantir a continuidade das realizações.

Lael (...) procurou uma produção barata, capaz de dar retorno financeiro rápido. Ele explica
por quê: “Três das últimas produções do CPC – Rio Babilônia, Bar Esperança e Parahyba – estão na
lista de maiores rendas da Embrafilme (1º os Trapalhões, 2º : Parahyba; 3 º : Babilônia, 4º : Inocência,
de Walter Lima Jr., produção de L. C. Barreto, 5º : Bar Esperança). Mesmo assim, ainda não
recuperamos nossos investimentos, pois o produtor é o último a ser ressarcido. Frente a esta
247
situação, resolvemos investir num filme barato, de retorno mais rápido”.

Apesar de barato se comparado com produções estrangeiras, para um filme como Bete se pagar são
precisos uns 450 mil espectadores, o produtor só recebe 30% da renda, o resto fica pelo caminho.

244
Ramos, José Mário Ortiz. Cinema, estado e lutas culturais: anos 50, 60, 70. Rio de Janeiro, Paz e Terra,
1983, p. 132.
245
Silva, Francisco Carlos Teixeira. Brasil em direção ao século XXI. In: História geral do Brasil. Rio de
Janeiro, Editora Campos, 1996, p. 335-346.
246
Press-book do filme Bete Balanço. Pasta do filme. Arquivo do Museu de Arte Moderna (MAM), Rio de
Janeiro.
247
Caetano, Maria do Rosário. Censura implica com Bete Balanço. Correio Braziliense. Brasília, 7 jun 1984.

131
Lael conta que o cinema também sentiu a recessão do país. Em três anos houve uma redução
de 50% na freqüência de cinema. São Paulo tinha uma média de renda que era o dobro do Rio,
agora se fizer metade já é muito. O preço do ingresso de cinema no Brasil é insuficiente para
sustentar a indústria mas não há saída diante do quatro recessivo: os cinemas começaram com
aquela história de cobrar inteira, menos quarta e domingo, e já recuaram. Cobram agora um preço
único intermediário entre a meia e a inteira. Isso e mais os eternos percalços de ocupação do circuito
248
exibidor por produções estrangeiras.

Ainda havia mais duas questões a resolver: o aumento do consumo doméstico da TV e a

“força renovada do cinema americano após sua revolução high tech feita a partir de Guerra

nas estrelas [Star wars, dir.: George Lucas]”, de 1977.249

Lael, em todas as reportagens reunidas, sempre manifestou surpresa em relação ao imenso

sucesso de Bete Balanço, o que não coloco em dúvida. Porém, a certeza de que o filme teria

bilheteria suficiente para se pagar e ainda gerar lucros é patente em diversas matérias

realizadas antes do filme entrar em cartaz, apesar de todas as adversidades expostas. É esta

previsão que me arrisco a explicar agora.

Seja impressionado pelo número de 2,2 milhões de espectadores de Menino do Rio250, em

1981; quem sabe entusiasmado com a onda de filmes estadunidenses para jovens, que

reuniam canto, dança e ascensão social; ou ainda percebendo uma adolescentificação do

cinema hegemônico, Lael estava interessado em se comunicar com o jovem, e seus sócios

do CPC também perceberam o potencial deste público.

Tem dois pontos, que devem ficar bem claros. Um, é o que eu pensava em termos de com quem eu
quero me comunicar, que tipo de filme eu quero fazer. Esse público jovem é o público que
sempre me atraiu. (...) E a história nasceu dessa minha vontade de me comunicar com esse público,

248
França, Jamari. Rock em filme jovem – “Bete balanço” traz a realidade sem ócio para o cinema. Revista de
domingo, ano 9, nº 428, Jornal do Brasil. Rio de janeiro, 15 jul 1984.
249
Xavier, Ismail. O cinema moderno brasileiro. In: O cinema moderno brasileiro. São Paulo, Paz e Terra,
2001, p. 48.
250
Press-book do filme Garota dourada. Pasta do filme. Arquivo do Museu de Arte Moderna (MAM), Rio de
Janeiro.

132
somado um pouco ao que a gente discutia na CPC, que era a necessidade da gente ter um filme
que fosse um filme de comunicação maior do que o que a gente vinha fazendo, apesar de que os
251
nossos filmes anteriores foram de certa forma sucesso.

Era necessário, contudo, saber quem era este jovem e como abordá-lo. As manifestações

estavam aqui e acolá, no teatro (Asdrúbal Trouxe o Trambone), na música (BRock), na TV

(videoclipe), nas artes plásticas (Cadê você, Geração 80?), e pareciam se direcionar a um

jovem urbano, pequeno-burguês, alheio aos anos de ditadura e que, talvez o dado mais

importante, tinha algum dinheiro para gastar em sessões de cinema apesar da crise

econômica252. Não por acaso, a pré-estréia do filme ocorreu no cinema Roxy, em

Copacabana, Rio de Janeiro253. Lael Rodrigues, que parece ter sempre buscado uma melhor

forma de se comunicar com o público ao longo de sua carreira, lançou mão de uma

provável inédita estratégia de marketing (lançar música-tema nas rádios e videoclipe na TV

antes do filme entrar em cartaz) visando atingir um segmento de mercado (o jovem) para

que se gerasse expectativa em torno do próprio filme. Bete Balanço tinha de ser uma jovem

contemporânea, que expusesse as atualidades da juventude. Pode parecer um tanto

redundante esta colocação, mas ela é perfeitamente cabível ao se perceber que os filmes

brasileiros sobre a juventude, até então, tratavam deste período da vida tendo como

referência a juventude dos cineastas e não a do presente dos filmes.

251
Comunicação com o público jovem. In: Filme e Cultura n° 48 – Diretores estreantes. Fundação do
Cinema Brasileiro, Novembro, 1988, p.139
252
Sader, Emir. A transição no Brasil: da ditadura à democracia?. São Paulo, Atual, 1990, p. 70.
“O mercado interno voltado para as camadas de mais alto poder aquisitivo continuou se ampliando, pela
sofisticação do consumo – do qual o setor eletro eletrônico e de informática são apenas alguns exemplos.”
253
Departamento de Promoção e Propaganda – Embrafilme – Segunda-feira é Noite de “Bete Balanço”
“Na sessão especial do filme para convidados, às 21h30m de segunda-feira no cinema Roxy, Débora Bloch,
Lauro Corona, Diogo Vilela e Arthur Muhlenberg estarão no centro de todas a pompas que os antigos
lançamentos hollywoodianos exigiam: limusines com batedores, tapete vermelho na entrada, holofotes e o
aplauso dos fãs, numa festa que reunirá atores, músicos, gente de cinema, teatro e televisão.”

133
[Bete Balanço] participa de uma evolução que o jovem brasileiro estava vivendo numa época. A
linguagem dele, as propostas que o Bete tem, inclusive de conteúdo social, dizem muito de uma
mudança de mentalidade de uma faixa de pessoas num determinado momento.254

A declaração acima, de Lael Rodrigues, apesar de atualmente ser de difícil comprovação, é

plenamente compartilhada por esta pesquisa. Seriam necessários obras, provavelmente de

natureza antropológica, que viessem a dar conta das transformações pela qual passou a

juventude brasileira do período para se confirmarem estas hipóteses.

Enquanto tais publicações não são produzidas, podemos tecer várias relações que justificam

este ponto de vista Lael. Bete Balanço participaria do processo de advento do sujeito jovem

urbano através de sua capacidade aglutinadora, somando 1.327.900 espectadores255, a

segunda maior bilheteria nacional de 1984, atrás apenas d’Os Trapalhões256. Observaria-se,

portanto, o impacto do filme sobre toda uma geração. Nele, a juventude teria se visto

reproduzida, legitimando seus novos hábitos, costumes e (por que, não?) consumos.

“Bete Balanço”, primeiro filme longo de Lael Rodrigues, estreou segunda-feira no Rio, balançando o
mercado cinematográfico carioca: no primeiro dia, 12 mil espectadores, ou seja, cerca de 70% da
média de freqüentadores de cinema em uma semana. Um fato muito raro no cinema nacional,
257
principalmente em se tratando de um trabalho de diretor estreante em longa-metragem.

Na simples trama do filme estavam reveladas as mudanças de mentalidade pela qual

passavam a juventude e a postura do filme diante da tradição cinematográfica moderna

nacional, o rompimento absoluto com as concepções político-sociais que os precediam.

Predominariam agora os projetos atomizados ao invés dos totalizantes, a questão do

indivíduo suplantaria a do grupo, a inserção social se daria através do sistema e não da

254
Comunicação com o público jovem. In: Filme e Cultura n° 48 – Diretores estreantes. Fundação do
Cinema Brasileiro, Novembro, 1988, p.140.
255
Sem autor. Quadro CINEMA / As maiores bilheterias. O Globo. Rio de Janeiro, 4 dez 1987.
256
Dumar, Deborah. Infecção tira Lael de cena. O Globo, 19 jan 1989.
257
Cambará, Isa. Um cinema com a voz dos jovens. Folha de São Paulo. São Paulo, 2 ago 1984.

134
revolução. Aos que bradavam a alienação dos jovens e do filme, não estava clara a nova

ideologia que eles apresentavam – baseada nos projetos pessoais, cotidianos e de inserção

no capitalismo, sem lhes tirar a brasilidade – que, hoje em dia, acabou-se provando ser o

rumo tomado. Foi esta nova postura que permitiu Bete Balanço propor-se a rivalizar com

seus congêneres do cinema comercial estadunidense que lhe era contemporâneo,

disputando o mesmo público, fazendo-se exemplo de resistência à hegemonia de mercado

que voltava a espreitar. A resistência estava na inserção.

[Bete Balanço] bateu em proporção de público o monstro sagrado de temporada, “Indiana Jones”,
que roubara para os importados a liderança de faturamento das férias, tradicionalmente em poder de
Renato Aragão. Por “proporção de público” entenda-se que “Beth Balanço”, com apenas seis
cinemas a seu serviço, foi visto por 97 mil pessoas na primeira semana de exibição, enquanto
“Indiana Jones”, com 12 salas e forte publicidade, foi visto em sua primeira semana por 106 mil
258
espectadores.

“Bete Balanço”, filme do diretor estreante Lael Rodrigues, uma pequena produção de Cr$ 82
milhões, conseguiu em sua primeira semana de exibição no Rio equiparar-se ao sucesso de “Indiana
Jones”, a superprodução norte-americana de Steven Spielberg, de Cr$ 54 bilhões (US$ 27 milhões).
“Bete”, em seis cinemas, teve o público de 93.600 pessoas, enquanto “Indiana”, na sua primeira
semana (no mês passado), foi visto por 98 mil espectadores, mas em 11 salas. Jorge Correia, gerente
de vendas da Embrafilme, fala entusiasmado dos resultados obtidos: “O filme é um sucesso absoluto.
Excetuando-se “Os Trapalhões”, que são hors-concours, sem dúvida nenhuma é o maior sucesso
deste ano dos filmes distribuídos pela Embrafilme. E na segunda semana ele continua indo muito
bem, mesmo considerando as Olimpíadas e o fim das férias. Está muito melhor, por exemplo, do que
“Break”, outro filme para a juventude. Vai tão bem que aumentamos o número de cópias, lançando o
259
filme em outros quatro cinemas: em Madureira, zona da Leopoldina, Olaria e Caxias.”

Talvez falte comentar um último aspecto: os tempos de abertura política teriam

influenciado Bete Balanço? Talvez essa resposta seja a de mais difícil precisão por não

lidar com fatos concretos. Nenhum personagem menciona a situação brasileira daquele

momento, expressa alguma opinião a respeito dos anos anteriores ou cogita o panorama dos

próximos anos. Absolutamente nada. No entanto, ao compararmos Bete Balanço aos filmes

paulistas e gaúchos da mesma época, podemos admitir uma referência onipresente à

abertura política no filme.

258
Sem autor. Salvação. O Globo. Rio de Janeiro, 7 ago 1984.

135
Bernardet localiza a questão do jovem e da política nestes cinemas:

O personagem de Diversões solitárias (...) é típico do atual cinema paulista, que é


predominantemente povoado por adolescentes. (...) Alguns desses adolescentes são, como o de
Diversões, sem perspectiva: fechados sobre si mesmos, vivem a ressaca da utopia frustrada. É o
tema do melancólico curta-metragem de Chico Botelho, A longa viagem. (...) Os adolescentes do
atual cinema paulista não vivem grandes revoltas, nem grandes sonhos, nem utopias. As
expectativas de Asa Branca são modestas (...). A imagem que Rita e ReinaldoVolpato dão da vida
adolescente interiorana em Abrasasas é bastante semelhante a de Asa Branca, mas aqui nem sonho
há. Num tom naturalista, que lembra crônicas adolescentes produzidas em Porto Alegre (...)
focalizam as alegrias (...) e angústias (...) de jovens que vão levando a vida sem grandes
perspectivas nem grandes catástrofes à vista (...). Tampouco as adolescentes de Onda nova (...)
colocam-se grandes problemas ou têm grandes ambições e expectativas. 260

Da mesma forma que se pode afirmar que ambos cinemas, paulista e gaúcho, encontram-se

órfãos dos grandes projetos de país das décadas anteriores, pelo estado de ânimo de seus

personagens revelarem profunda melancolia ou por não enunciarem grandes sonhos e

perspectivas, acredito que a vitalidade de Bete, seu objetivo de “se dar bem na vida” sendo

cantora, sua garra em contornar obstáculos, sua disposição em “ir à luta” são marcas

evidentes dos ares de esperança que se respiravam as vésperas do advento da Nova

República.

Com tantas ricas hipóteses a serem trabalhadas por outros estudos, talvez um dia se possa

comprovar, realmente, que em Bete Balanço há “muito mais que o balanço de Bete”.

259
Sem autor. “Bete Balanço”: êxito supera as expectativas. O Globo. Rio de Janeiro, 11 ago 1984.
260
Bernardet, Jean-Claude. Os jovens paulistas. In: O desafio do cinema. Rio de Janeiro, Jorge Zahar Editor,
1985.

136
Filmografia de Lael Rodrigues

1971 e/ou 1972 – registro da festa do Divino, em Pirenópolis, Goiás, função desconhecida

(Dir.: ?, documentário, coordenação Nelson Pereira dos Santos, 16mm)

1972 – Escola de Comunicação, assistente de produção (Dir.: Miguel Freire, documentário,

curta-metragem, 16mm, preto e branco)

1973 – Bon Odori, co-diretor (Dir.: Lael Rodrigues e Tizuka Yamasaki, documentário,

16mm, cor) – também creditado com ano de produção de 1977 e/ou com direção de Tizuka

Yamasaki, somente.

Mouros e cristãos, “na UFF nós fizemos um documentário que começou em

conjunto, mas eu e a Tizuka [Yamasaki] terminamos juntos” (curta-metragem, 16mm, preto

e branco) – filme realizado em algum espaço de tempo entre 1973 e 1975 ou ainda no

biênio 1977/78. Por vezes creditado como de direção de Tizuka Yamasaki, apenas.

1974 – O amuleto de Ogum, “ajuda indireta” (Dir.: Nelson Pereira dos Santos, ficção,

longa-metragem)

Ovelha negra, uma despedida de solteiro, 1º. assistente de produção (Dir.: Haroldo

Marinho Barbosa, ficção, longa-metragem, cor)

1975 – As aventuras amorosas de um padeiro, assistente de direção (Dir.: Waldyr Onofre,

ficção, longa-metragem, cor)

Sufoco, diretor (Dir.: Lael Rodrigues, ficção, 35mm, cor)

137
1976 – Marcados para viver, assistente de direção (Dir.: Maria do Rosário Nascimento e

Silva, ficção, longa-metragem, cor)

Crueldade mortal, assistente de direção (Dir.: Luiz Paulino dos Santos, ficção,

longa-metragem, cor)

1977 – Se segura, malandro, som guia e montador (Dir.: Hugo Carvana, ficção, longa-

metragem, cor)

A força de Xangô, “uma série de coisas juntas no filme; fiquei meses e não fiz

exatamente nada, mas fiz still, som-guia, continuidade etc”. (Dir.: Iberê Cavalcanti, ficção,

longa-metragem, cor)

Jallalla, montador (Dir.: Jorge Sanjinés, documentário, longa-metragem) – o filme

foi realizado em algum espaço de tempo entre 1977 e 1979.

Isto é problema seu, montador (Dir.: Edgar Moura [Demo], Nani e Reinaldo, curta-

metragem, 35mm) – filme realizado em algum espaço de tempo entre 1977 e 1983.

A fiel, diretor e montador (Dir.: Lael Rodrigues, documentário, curta-metragem,

16mm, cor)

Linhas cruzadas, diretor (Dir.: Lael Rodrigues, ficção, curta-metragem, 16mm, cor)

Boi Pintadinho, diretor (Dir.: Lael Rodrigues, documentário, média-metragem,

16mm, cor)

Praça Tiradentes, captação de som (Dir.: José Joffily, documentário, curta-

metragem)

Jorjamado no cinema, captação de som (Dir.: Glauber Rocha, documentário, média-

metragem)

138
1977/78 – projeto Duelo de Exu, não realizado (Dir.: Lael Rodrigues)

1978 – Alô, Tetéia, participação especial (Dir.: José Joffily, ficção, curta-metragem)

J.S. Brown, o último herói, produtor executivo, diretor de produção e montador

(Dir.: José Frazão, ficção, longa-metragem, cor)

1979 – Gaijin, caminhos da liberdade, produtor executivo, diretor de produção e montador

(Dir.: Tizuka Yamasaki, ficção, longa-metragem, cor)

1982 – Bar Esperança, diretor-assistente e montador (Dir.: Hugo Carvana, ficção, longa-

metragem, cor)

Rio Babilônia, produtor executivo e diretor de produção (Dir.: Neville d’Almeida,

ficção, longa-metragem, cor)

Cada louco com a sua mania, interrompido (Dir.: Lael Rodrigues)

1983 – Parahyba mulher-macho, montador (Dir.: Tizuka Yamasaki, ficção, longa-

metragem, cor)

1984 – Bete Balanço, argumentista, roteirista, diretor e montador (Dir.: Lael Rodrigues,

ficção, longa-metragem, cor)

1985 – Patriamada, produtor (Dir.: Tizuka Yamasaki, ficção, longa-metragem, cor)

139
Rock estrela, argumentista, roteirista, diretor e montador (Dir.: Lael Rodrigues,

ficção, longa-metragem, cor)

Eu prefiro a liberdade, diretor, fotógrafo e montador (Dir.: Lael Rodrigues, ficção,

curta-metragem, cor)

1987 – Rádio pirata, argumentista, roteirista, produtor, diretor e montador (Dir.: Lael

Rodrigues, ficção, longa-metragem, cor)

Super Xuxa contra Baixo Astral, produtor executivo (Dir.: Anna Penido, ficção,

longa-metragem, cor)

Mistério no colégio Brasil, produtor executivo (Dir.: José Frazão, ficção, longa-

metragem, cor)

140
Bibliografia

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Paulo, Ateliê Editorial, 2003.

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Press-book do filme A idade da Terra. Pasta do filme. Arquivo do Museu de Arte Moderna
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Press-book do filme As aventuras amorosas de um padeiro. Pasta do filme. Arquivo do


Museu de Arte Moderna (MAM), Rio de Janeiro.

Press-book do filme Bete Balanço. Pasta do filme. Arquivo do Museu de Arte Moderna
(MAM), Rio de Janeiro.

Press-book do filme Coronel Delmiro Gouveia. Pasta do filme. Arquivo do Museu de Arte
Moderna (MAM), Rio de Janeiro.

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Press-book do filme Eles não usam black-tie. Pasta do filme. Arquivo do Museu de Arte
Moderna (MAM), Rio de Janeiro.

Press-book do filme Eu te amo. Pasta do filme. Arquivo do Museu de Arte Moderna


(MAM), Rio de Janeiro.

Press-book do filme Gaijin, caminhos da liberdade. Pasta do filme. Arquivo do Museu de


Arte Moderna (MAM), Rio de Janeiro.

Press-book do filme Garota dourada. Pasta do filme. Arquivo do Museu de Arte Moderna
(MAM), Rio de Janeiro.

Press-book do filme J. S. Brown, o último herói. Pasta do filme. Arquivo do Museu de Arte
Moderna (MAM), Rio de Janeiro.

Press-book do filme J. S. Brown, o último herói organizado pelo CPC. Pasta do filme.
Arquivo do Museu de Arte Moderna (MAM), Rio de Janeiro.

Press-book do filme Lúcio Flávio, passageiro da agonia. Pasta do filme. Arquivo do


Museu de Arte Moderna (MAM), Rio de Janeiro.

Press-book do filme Marcados para viver. Pasta do filme. Arquivo do Museu de Arte
Moderna (MAM), Rio de Janeiro.

Press-book do filme Menino do Rio. Pasta do filme. Arquivo do Museu de Arte Moderna
(MAM), Rio de Janeiro.

Press-book do filme Mistério no colégio Brasil. Pasta do filme. Arquivo do Museu de Arte
Moderna (MAM), Rio de Janeiro.

Press-book do filme Nos embalos de Ipanema. Pasta do filme. Arquivo do Museu de Arte
Moderna (MAM), Rio de Janeiro.

Press-book do filme Nunca fomos tão felizes. Pasta do filme. Arquivo do Museu de Arte
Moderna (MAM), Rio de Janeiro.

Press-book do filme O cortiço. Pasta do filme. Arquivo do Museu de Arte Moderna


(MAM), Rio de Janeiro.

Press-book do filme O sonho não acabou. Pasta do filme. Arquivo do Museu de Arte
Moderna (MAM), Rio de Janeiro.

Press-book do filme Ovelha negra, uma despedida de solteiro. Pasta do filme. Arquivo do
Museu de Arte Moderna (MAM), Rio de Janeiro.

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Press-book do filme Parahyba mulher-macho. Pasta do filme. Arquivo do Museu de Arte
Moderna (MAM), Rio de Janeiro.

Press-book do filme Patriamada. Pasta do filme. Arquivo do Museu de Arte Moderna


(MAM), Rio de Janeiro.

Press-book do filme Rádio pirata. Pasta do filme. Arquivo do Museu de Arte Moderna
(MAM), Rio de Janeiro.

Press-book do filme Rock estrela. Pasta do filme. Arquivo do Museu de Arte Moderna
(MAM), Rio de Janeiro.

Press-book do filme Rockmania. Pasta do filme. Arquivo da Fundação Nacional de Arte


(FUNARTE), Rio de Janeiro.

Press-book do filme Se segura, malandro. Pasta do filme. Arquivo do Museu de Arte


Moderna (MAM), Rio de Janeiro.

Press-book do filme Tudo bem. Pasta do filme. Arquivo do Museu de Arte Moderna
(MAM), Rio de Janeiro.

Pasta Lael Rodrigues, personalidade. Arquivos do Museu de Arte Moderna (MAM), e


Fundação Nacional de Arte (FUNARTE), ambos no Rio de Janeiro.

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Programa Clipe Brasil – Especial Rock Brasília, Canal Brasil, 2002.

Programa Em Foco – Retratos Brasileiros – Anos 80, Canal Brasil, 2002.

Programa Ensaio Geral – Especial Rock Brasil – Parte 1, Multi Show, 2002.

Filmografia Consultada
Garrincha, alegria do povo (Dir.: Joaquim Pedro de Andrade, 1963)
Viagem aos seios de Duília (Dir.: Carlos Hugo Christensen, 1964)

149
Menino de engenho (Dir.: Walter Lima Jr, 1965)
Toda donzela tem um pai que é uma fera (Dir.: Roberto Farias, 1966)
Todas as mulheres do mundo (Dir.: Domingos de Oliveira, 1966)
Rio, verão e amor (Dir.: Watson Macedo, 1966)
Edu coração de ouro (Dir.: Domingos de Oliveira, 1968)
Roberto Carlos em ritmo de aventura (Dir.: Roberto Farias, 1968 )
A penúltima donzela (Dir.: Fernando Amaral, 1969)
Copacabana me engana (Dir.: Antônio Carlos da Fontoura, 1969)
Os paqueras (Dir.: Reginaldo Faria, 1969)
Pobre príncipe encantado (Dir.: Daniel Filho, 1969)
Anjos e demônios (Dir.: Carlos Hugo Christensen, 1970)
Cléo e Daniel (Dir.: Roberto Freire, 1970)
Marcelo Zona Sul (Dir.: Xavier de Oliveira, 1970)
Minha namorada (Dir.: Zelito Viana e Armando Costa, 1970)
Prá quem fica, tchau (Dir.: Reginaldo Faria, 1970)
Roberto Carlos e o diamante cor de rosa (Dir.: Roberto Farias, 1970)
Uma mulher para sábado (Dir.: Maurício Rittner, 1970)
Uma pantera em minha cama (Dir.: Carlos Hugo Christensen, 1971)
André, a cara e a coragem (Dir.: Xavier de Oliveira, 1971)
Roberto Carlos a 300 km/h (Dir.: Roberto Farias, 1971)
Cassy Jones, o magnífico sedutor (Dir.: Luís Sérgio Person, 1972)
Janaína, a virgem proibida (Dir.: Olivier Perroy, 1972)
As moças daquela hora (Dir.: Paulo Porto, 1974)
Cainguange - na pontaria do diabo (Dir.: Carlos Hugo Christensen, 1974)
Essa gostosa brincadeira a dois (Dir.: Victor Di Mello, 1974)
Ovelha negra, uma despedida de solteiro (Dir.: Haroldo Marinho Barbosa, 1974)
As aventuras amorosas de um padeiro (Dir.: Waldyr Onofre, 1975)
O fabuloso Fittipaldi (Dir.: Hector Babenco, 1975)
Quandos as mulheres querem provas (Dir.: Cláudio MacDowell, 1975)
Sufoco (Dir.: Lael Rodrigues, 1975)
Como é boa a nossa empregada (Dir.: Victor Di Mello, 1976)
Lição de amor (Dir.: Eduardo Escorel, 1976)
A fiel (Dir.: Lael Rodrigues, 1977)
Coronel Delmiro Gouvêia (Dir.: Geraldo Sarno, 1977)
Lúcio Flávio, passageiro da agonia (Dir.: Hector Babenco, 1977)
O bem dotado - o homem de Itu (Dir.: José Miziara, 1977)
O cortiço (Dir.: Francisco Ramalho, 1977)
Os embalos de sábado à noite (Saturday night fever, Dir.: John Badham, 1977)
Se segura, malandro (Dir.: Hugo Carvana, 1977)
Tudo bem (Dir.: Arnaldo Jabor, 1977)
Isto é problema seu (Dir.: Edgar Moura [Demo], Nani e Reinaldo, realizado algum ano
entre 1977 e 1983)
A idade da Terra (Dir.: Glauber Rocha, 1977/78)
A morte transparente (Dir.: Carlos Hugo Christensen, 1978)
Amor bandido (Dir.: Bruno Barreto, 1978)
Emmanuelo, o belo (Dir.: Nilo Machado, 1978)
Nas ondas do surf (Dir.: Lívio Bruni Júnior, 1978)

150
Nos embalos de Ipanema (Dir.: Antônio Calmon, 1978)
O erótico virgem (Dir.: Mozael Silveira, 1978)
Gaijin, caminhos da liberdade (Dir.: Tizuka Yamasaki, 1979)
Terror e êxtase (Dir.: Antônio Calmon, 1979)
Eles não usam black-tie (Dir.: Leon Hirszman, 1980)
Fama (Fame, Dir.: Alan Parker, 1980)
Giselle (Dir.: Victor Di Mello, 1980)
Asa Branca, um sonho brasileiro (Dir.: Djalma Limongi Batista, 1981)
Eu te amo (Dir.: Arnaldo Jabor, 1981)
Filhos e amantes (Dir.: Francisco Ramalho Jr., 1981)
Menino do Rio (Dir.: Antônio Calmon, 1981)
Amor estranho amor (Dir.: Walter Hugo Khouri, 1982)
Bar Esperança (Dir.: Hugo Carvana, 1982)
Beijo na boca (Dir.: Paulo Sergio de Almeida, 1982)
O olho mágico do amor (Dir.: Ícaro Martins e José Antonio Garcia, 1982)
O sonho não acabou (Dir.: Sérgio Rezende, 1982)
Pecado horizontal (Dir.: José Miziara, 1982)
Rio Babilônia (Dir.: Neville d’Almeida, 1982)
Flashdance (Dir.: Adrian Lyne, 1983)
Garota dourada (Dir.: Antônio Calmon, 1983)
Inocência (Dir.: Walter Lima Jr., 1983)
Nunca fomos tão felizes (Dir.: Murilo Salles, 1983)
Os embalos de sábado continuam (Staying alive, Dir.: Sylvester Stallone, 1983)
Parahyba mulher-macho (Dir.: Tizuka Yamasaki, 1983)
Shock (Dir.: Jair Correia, 1983)
Bete Balanço (Dir.: Lael Rodrigues, 1984)
Para viver um grande amor (Dir.: Miguel Faria Jr., 1984)
Verdes anos (Dir.: Carlos Gerbase e Giba Assis Brasil, 1984)
Areias escaldantes (Dir.: Francisco de Paula, 1985)
As sete vampiras (Dir.: Ivan Cardoso, 1985)
Eu prefiro a liberdade (Dir.: Lael Rodrigues, 1985)
Patriamada (Dir.: Tizuka Yamasaki, 1985)
Rock estrela (Dir.: Lael Rodrigues, 1985)
TropClip (Dir.: Luiz Fernando Goulart, 1985)
A cor do seu destino (Dir.: Jorge Duran, 1986)
A menina do lado (Dir.: Alberto Salvá, 1987)
Mistério no colégio Brasil (Dir.: José Frazão, 1987)
Rádio pirata (Dir.: Lael Rodrigues, 1987)
Super Xuxa contra Baixo Astral (Dir.: Anna Penido, 1987)
Um trem para as estrelas (Dir.: Cacá Diegues, 1987)
A ostra e o vento (Dir.: Walter Lima Jr, 1997)

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