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1.

Introdução

Com esse propósito, o trabalho foi estruturado em três partes. A primeira apresenta uma breve
trajectória da ideia de democracia, enfatizando a concepção Metodológica de democracia
realista compartilhada por Joseph Alois Schumpeter e Robert Alan Dahl. A segunda elenca as
semelhanças e dissemelhanças entre as teorias Da democracia desenvolvidas por esses
cientistas sociais. A terceira ressalta as Contribuição desses autores para a teoria democrática
contemporânea. As pretensões deste trabalho se cingem a fomentar o debate científico sobre o
tema, mirando examinar as concepções sobre a democracia formuladas por Joseph Alois
Schumpeter e Robert Alan Dahl, salientando a relevância dos pensamentos desses Autor para
a construção e reflexão acerca da teoria democrática contemporânea.

1.1. Objectivos
1.1.1. Geral: Conhecer a democracia contemporânea.

1.1.2. Específicos

 Definir a democracia contemporânea;


 Identificação a democracia realista: Joseph A. Schumpeter e Robert A. Dahl;
 Identificar a semelhanças e diferenças entre as teorias de democracia em Joseph A.
Schumpeter e Robert A. Dahl.

1.2. Metodologia

Para a realização do presente trabalho de pesquisa de carácter avaliativo, recorreu-se revisões


bibliográficas, e foram feitas varias pesquisas na internet de conteúdos relacionados com o
tema. O trabalho, está relacionado da seguinte maneira: Introdução, Objectivos, metodologia,
Desenvolvimento, Conclusão, e as respectivas Referencias Bibliográficas.
2. Fundamento filosófico do pensamento democrático

Foi por volta do século V a.C. que surgiu, primeiramente em Atenas e depois em diversas
outras cidades gregas, o que se convencionou denominar “democracia clássica”. As primeiras
experiências democráticas da história foram, em certa medida, consequência direta da
superação da filosofia pré-socrática – estudo da natureza e da Física – pelo estudo do homem
e do corpo social que aquele, organicamente, constitui.

A democracia, ao contrário do que se pode supor, não surgiu por meio de imposição
hierárquica, mas por intermédio de graduais e sucessivas reformas políticas instituídas,
principalmente, pelo filósofo Sólon e pelo estratego Péricles. Não consistiu em um sistema
primeiramente idealizado e posteriormente posto em prática. A democracia não foi
racionalmente pensada, mas vivenciada, pois surgiu quase espontaneamente quando os
homens gozaram de liberdade suficiente para tanto (GOYARD-FABRE, 2003).

Por não ter sido propriamente racionalizada antes de sua implantação, a democracia grega
carece de um eixo filosófico principal, a exemplo do que se pode verificar no socialismo-
comunismo, com a obra de Karl Marx, ou no federalismo, com Alexander Hamilton, James
Madison e John Jay, por exemplo (HELD, 2006).

Embora a democracia não tenha surgido por meio de um nodal próprio, é possível identificar,
na filosofia grega, elementos que demonstram a evolução do pensamento político até culminar
no desejo de uma modalidade de governo protagonizada pelo povo. Nesse aspecto, a obra de
Demócrito de Abdera, embora somente tenha sobrevivido até a actualidade por meio de
fragmentos, de certo modo, exprime interessantes fundamentos da essência do regime
democrático.

O valor da democracia como regime político foi identificado pelo filósofo Demócrito de
Abdera, que o explicou com base em sua doutrina atomista. Para essa teoria, o átomo era a
unidade fundamental que formava todas as coisas, era indivisível, invisível, infinito em
quantidade, pleno, uno, eterno e imutável, assim como o ser de Parmênides. Era o ser por si
só. Tudo era formado por átomos (ARAUJO, 2012).

Cada cidadão – apesar das limitações à cidadania – deveria manifestar sua vontade,
plenamente. Com a superposição das vontades individuais, de cada cidadão, formar-se-ia, em
tese, a vontade geral da sociedade. É esta, portanto, a essência da democracia: a superposição
de opiniões convergentes e divergentes para formação de uma vontade única colectiva,
determinada pelo princípio majoritário.

Toda a doutrina da representação política na democracia moderna tem certo fundamento


também nessa mesma doutrina, enquanto as críticas sobre o problema da legitimidade
costumam traçar caminho apartado.

2.1. Concepção inicial sobre a democracia

Embora se careça de uma definição segura do que seria “democracia”, sobretudo em face da
liquidez terminológica que lhe impregnou a modernidade (BAUMAN, 2001), faz-se
necessário delimitar um núcleo semântico seguro ao qual se reportará para desenvolvimento
deste estudo. É verdade que, actualmente, o substantivo “democracia” teve o sentido
esvaziado com a banalização do uso do adjectivo “democrático”. Este se desprendeu do
âmbito político originário para servir a qualificações pessoais positivas, enquanto seu
antônimo “anti-democrático” se transformou em panaceia argumentativa em debates
(MENEZES, 1980).

Para fins unicamente metodológicos, acrescidas as devidas ressalvas, conceitua-se democracia


como uma limitação formal ao exercício do poder político baseada na anuência, directa ou
indirecta, do povo na formação da “vontade geral” do Estado. Nas democracias
contemporâneas, o voto nos representantes é o principal procedimento de exteriorização da
vontade popular.

Esse conceito organicista é suficiente para demonstrar o aspecto formal da expressão da


vontade popular, mas não faz qualquer menção ao seu aspecto material. Quanto a este prisma,
é necessário realizar uma análise mais profunda no âmbito político-teatral em que se funda a
hipotética anuência do povo.

Desde a Revolução Francesa, e sobretudo após a Segunda Guerra Mundial, o sentimento


democrático que se fez reflectir na modernidade incorporou-se ao Volksgeist de tal modo que,
actualmente, o signo “democracia” é invocado quase que unanimemente pelos mais diversos
regimes, sem maior compromisso com o sentido original do termo (FIELD, 1951).
Faz parte da sapiência geral que a invocação do adjectivo “democrático” goza de absoluto
prestígio social (SARTORI, 1994). Ocorre, entretanto, a seguinte curiosidade: em virtude
dessa paixão geral, o termo “democracia” é invocado indistintamente pelos mais diversos
regimes, ainda que em nada respeitem o mínimo deôntico democrático: A essência da
democracia é um dos temas que mais discussão tem provocado ultimamente, já que regimes
dos mais heterogéneos intitulam-se também democráticos, como nas chamadas ‘democracias
populares. (SANTOS, 1965).

Em verdade, muitos governos se proclamam democráticos com intuito de se beneficiarem do


clamor por esses ideais quase universalmente admirados como mera justificativa para sua
estadia no poder (HOBSBAWM, 2010). Percebe-se, desde logo, que existem outras nuanças
que envolvem o conceito de democracia além da mistificação do termo “democracia”, de
modo a servir de justificativa ideológica a quem dela se trasveste (BONAVIDES, 2011).

Feitas as devidas ressalvas, retoma-se o conceito meramente formal de democracia como o


regime político em que há a anuência da vontade popular para que se possa dispor sobre os
dois principais mecanismos de exteriorização daquela vontade. Essa manifestação pode se dar
directa ou indirectamente a depender da existência (nesta) ou da inexistência (naquela) de um
intermediário que, teoricamente, actue como portador da vontade do povo, conforme
explanação a seguir.

2.2. Dimensão de povo e representatividade por quotas

Na filosofia do homem na Grécia antiga, a ideia de liberdade estava de certo modo


relacionada com a participação do homem na vida política. Livre seria aquele que fosse útil à
sociedade. Havia, pelo menos formalmente, uma cumplicidade entre o cidadão e a cidade.
Aqueles que participavam da vida política gozavam de uma aparência de civilidade superior
aos demais. A participação política – a civilidade – sobretudo em Atenas, continuou a ser
considerada, na democracia, uma tradição de nobreza mesmo após o declínio da aristocracia
(HELD, 2006).

O postulado da participação directa assegurava que todos os “cidadãos” estivessem sob a


égide da isagoria: o igual direito à voz na assembleia do povo. Embora a qualidade de cidadão
na Grécia antiga não fosse tão universal quanto actualmente, fontes históricas apontam que a
quantidade de cidadãos atenienses estava entre 35.000 (trinta e cinco mil) e 45.000 (quarenta
e cinco mil) indivíduos, sendo de 6.000 (seis mil) o quórum para dar início aos debates
(HELD, 2006).

Dentre as restrições à cidadania, apenas os homens atenienses de mais de 20 (vinte) anos


poderiam exercer a vida pública. Escravos, estrangeiros e mulheres estavam excluídos da
condição de cidadãos e da possibilidade de participação na política. Apenas
excepcionalmente, mediante aprovação da assembleia, a cidadania poderia ser estendida a
pessoas que não cumprissem seus requisitos (HELD, 2006).

Percebe-se que a democracia ateniense se revestiu de uma aura idealista que não era
inteiramente merecida. Embora a isagoria, formalmente, assegurasse a cada cidadão igual
direito político, tão poucas pessoas estavam incluídas no conceito de cidadania que, na
prática, o exercício do poder político permaneceu restrito a uma minoria da população.

Essas críticas não devem ser entendidas como direccionadas a partir da análise contextual do
presente, já que seria absolutamente desarrazoado comparar as primeiras democracias, quase
2.500 anos atrás, com supedâneo no pensamento político hoje predominante. Sob esse
cuidado, verifica-se que, apesar das suas limitações internas, a democracia directa grega
permitiu que cada cidadão se tornasse peça importante na formação da vontade política.

A actual formação geopolítica do Estado-nação dificulta bastante a participação directa, pelo


menos como regra geral. Há, todavia, quem considere ser possível a adopção da democracia
directa – a despeito da dimensão geográfica ou populacional – desde que seja instituída
juntamente com o reconhecimento do direito de secessão (SOTO, 2002). Em todo caso, com a
crescente complexidade das sociedades modernas, tornou-se necessário o desenvolvimento de
um método de unificação, em grupos, das vontades unitárias, de modo a permitir a
participação política indirectamente.

À época da Convenção da Filadélfia, em 1787, já se discutia acerca das dificuldades de


implementação de um sistema democrático directo à debutante federação norte-americana
(MADISON, 1984). Anos antes, Montesquieu (1996) atentara para a onerosa operação de
uma democracia directa em um Estado de grande população ou considerável extensão
territorial por ser bastante dificultoso reunir todo o povo, seja ele numeroso ou disposto em
vasto território, regularmente, para tratar de deliberações públicas. Com efeito, a democracia
directa só poderia funcionar em nações pequenas.
À vista da vertiginosa complexidade das sociedades modernas, sobretudo após a Revolução
Industrial, inconcebível se tornou o mecanismo de intervenção directa do povo sobre o poder
político como regra geral. Fora necessário condensar a vontade de um conjunto de cidadãos
na de alguns poucos representantes para viabilizar o exercício democrático em um vasto
território.

A mediação de um interlocutor faz recair sobre a democracia indirecta a acusação de que não
seria efectivamente o povo a governar, mas uma classe política alheia aos reais interesses dos
eleitores (SARTORI, 2007).

Compreensíveis até certo ponto, mas essas conclusões não podem ser dispensadas, também,
às democracias directas. Ao contrário do que apregoam alguns nostálgicos defensores da
primeira expressão de exercício da soberania popular – cujo berço na Grécia clássica parece
evocar um ideal de perfeição – não existe fórmula mecanicista para se chegar à mais precisa
expressão da vontade soberana do povo em um órgão colectivo.

Por motivo de conveniência política ou pela complexa estrutura da sociedade actual,


predomina a opção pela democracia indirecta ou semidirecta, caracterizadas pela existência de
um representante eleito por meio do voto (ou por outro instrumento qualquer)
complementada, no caso da semidirecta, por mecanismos de participação directa, como
referendo, plebiscito ou iniciativa popular, por exemplo.

Nas democracias directas, os cidadãos não dependem de delegados na formação da vontade


geral. O representante do povo é figura característica da democracia indirecta (ou semidireta),
e sua função é ser depositário da confiança de seus eleitores, não apenas agir como seu porta-
voz, ao contrário do que se pensa habitualmente. Em discurso proferido aos eleitores de
Bristol, no Reino Unido, em 1774, Edmund Burke (1999) demonstrou que a função do
representante eleito pelo povo é não apenas ser porta-voz das vontades individuais:

Como correctamente percebeu Burke (1999), o representante que caracteriza a democracia


indirecta não atua apenas como porta-voz dos seus eleitores e, portanto, não lhes deve
subserviência absoluta. A equivocada concepção de que o eleito seria mero agente ressonante
da vontade do eleitor predominou como justificativa para a democracia indirecta nos
primórdios de sua implantação (LEONI, 2010).
Eleger não é escolher alguém que decide conforme a estrita vontade do eleitor. Ao contrário,
o voto é demonstração de confiança na opinião e no julgamento do delegado, sem que esse
julgamento esteja plenamente alinhado com o do eleitor. Em síntese, escolhe-se alguém que
decida por outrem (BOBBIO, 2000).

Essa posição do representante faz com que muito se questione se essa actividade pública não
poderia ser apropriada por uma elite que se utilize do sistema político apenas para permanecer
no poder (SANTOS, 1962).

A democracia indirecta, sobretudo no moderno Estado-nação planificador e homogeneizador


da sociedade, quando sustentada por um povo desinteressado na política e que não se vê
devidamente representado ou que já perdeu as esperanças de um dia o vir a ser, pode tornar-se
instrumento de perpetuação de uma mesma classe dominante no poder. Nessa situação,
embora a democracia teoricamente permita a alternância entre os agentes políticos, na prática,
o enquadramento tende a permanecer inerte.

Em decorrência desses problemas de legitimidade nas democracias representativas (indiretas


ou semidiretas), foi necessário o desenvolvimento de mecanismos formais de verificação da
congruência da vontade geral em relação à individual (SARTORI, 2007).

2.3. A verdadeira legitimidade depende de um recuo no objecto da


deliberação democrática

O avanço do intervencionismo estatal por áreas eminentemente privadas retirou do íntimo da


individualidade o poder decisório para entregá-lo ao Estado e, consequentemente, transformá-
lo em objecto da deliberação democrática (SALDANHA, 2005). Se o Estado ou a sociedade
passam a apontar determinado assunto (que originariamente competiria somente à pessoa)
como importante à colectividade, a decisão que lhe for referida deverá ser objecto de
deliberações públicas por meio do sistema democrático (FIELD, 1951).

A crescente “publicização” das relações privadas trouxe para o contexto político e


democrático a necessidade de tomada de decisões que outrora somente caberiam aos
indivíduos. Temas como a união civil entre pessoas do mesmo sexo ou a legalização das
drogas recreativas são temas que se tornaram objecto de debates públicos quando, na verdade,
deveriam dizer respeito unicamente às pessoas envolvidas naquela relação.
Quando o Estado ou uma parcela da sociedade (mesmo que esta seja majoritária) precisa
reconhecer os direitos individuais, o Estado e a sociedade se sub-rogam no poder de decidir
quais regras deveriam ser adoptadas para tanto. Desse modo, aquelas pessoas interessadas em
praticar essas condutas perdem o poder sobre as próprias vidas diante de um grupo dominante
que se intitula detentor de uma razão superior à dos interessados:

Toda vez que a regra da maioria desnecessariamente substituir a escolha individual, a


democracia estará em conflito com a liberdade individual. Esse é o tipo de democracia que
deve ser mantido ao mínimo, a fim de se preservar um máximo de democracia compatível
com a liberdade individual. (LEONI, 2010).

Parece bastante democrático, por exemplo, o fato de que, após uma consulta directa à
população ou depois de deliberação de seus representantes, seja terminantemente proibido
qualquer relacionamento amoroso entre pessoas do mesmo sexo: “a omnipotência da lei,
assentado no primado da vontade maioritária da colectividade, justifica uma legitimidade para
tudo fazer em nome da democracia.” (OTERO, 2015).

Não parece, entretanto, ser justa a decisão democrática mencionada. Referido exemplo
salienta que o adjectivo “democrático” não pode ser entendido como algo necessária e
indubitavelmente bom. A maioria não pode ser utilizada como critério de moralidade.

Efectivamente, elementos estruturais do Estado, como constitucionalismo, direitos


fundamentais, separação dos poderes e, mais especificamente, a eleição proporcional para o
Legislativo foram todos mecanismos desenvolvidos também com carácter contra majoritário,
para proteger as minorias do abuso que poderia ser cometido por meio de uma apropriação do
mecanismo democrático por uma maioria intervencionista.

Já fora demonstrado por Alexis de Tocqueville (2005) que, ao contrário da sapiência geral,
um Estado grande não é aquele que se preocupa com os altos interesses sociais, com as coisas
mais importantes. Ao contrário, Estado grande é aquele que cuida e intervém nas menores
questões, naquelas menos importantes. Quanto maiores o Estado e a abrangência de sua
intervenção, menos importantes são as coisas das quais se ocupa.

Ao avançar sobre assuntos eminentemente privados, o Ente Estatal toma para si o poder de
agir que outrora pudera ser exercido directamente pelos cidadãos. A revisão do objecto da
democracia estatal poderia levar a uma configuração contemporânea de democracia directa
social (SOTO, 2002), numa visão comunitarista em que cada pessoa decidiria livremente
acerca de assuntos particulares, estes reconhecidos em máxima abrangência, ou
voluntariamente em conjunto com terceiros e sem necessidade do Estado como intermediador.

Se é perceptível um processo gradativo da diferenciação social, aprofundada pela


individualização dentro dos próprios grupos e interesses que fazem a sociedade civil, isso não
pode, nem deve, significar a exclusão de um ou de outro, pela simples imposição de regras
majoritárias.

A ampliação de um sistema de decisões particulares, até de certo modo alheio à democracia


majoritária, por meio da liberdade individual, permite uma fertilização interessante do debate,
ao suscitar uma união complementar das condições ético-políticas para um amplo
reconhecimento dos sujeitos políticos e sociais condizentes com a existência de uma
sociedade pluralista.

Com efeito, uma releitura do objecto da deliberação democrática e uma imediata reversão da
tendência publicista do Direito se fazem necessárias para assegurar a cada pessoa na
sociedade um núcleo privado de protecção perante eventuais abusos do poder decisório da
maioria, que não pode, por si só, ser considerado legítimo.

2.4. Concepção metodológica de democracia realista: Joseph A. Schumpeter e


Robert A. Dahl

A ideia de democracia foi concebida na Grécia antiga há mais de 2.400 anos. Decorre da pólís
grega, mais especificamente de Atenas, que instaurou um regime no Qual participava das
decisões políticas a maioria dos cidadãos atenienses. Tinha Significado de governo do povo
(FELISBINO, 2009), cujo poder central era referendado por uma assembleia popular.

Na democracia grega as decisões eram tomadas de forma colectiva e de maneira

Directa, sem mecanismos de representação política (SOARES, 2011). Logo, não há como
compará-la às democracias contemporâneas, até mesmo porque a cidadania na pólís era
restrita aos homens livres. Ademais, os gregos desconheciam os direitos fundamentais e a
limitação ao poder estatal.
Nada obstantes, os gregos legaram duas importantes contribuições à seara política:
introduziram a distinção entre esfera pública e privada e formularam classificações das formas
de governo. Heródoto (485-425 a.C.), Tucídides (460-404 A.C.), Platão (427/428- 348/347
a.C.) e Aristóteles (384-322 a.C.) reflectiram sobre os regimes políticos inserindo-os em uma
perspectiva histórica e/ou filosófica. Platão, por exemplo, define a democracia como o regime
em que os pobres governam em oposição aos ricos (LAVROFF, 2001). Aristóteles a concebe
como o governo do povo no interesse de todos (ALMEIDA FILHO & SOUSA, 2008).
Refutando a concepção de democracia idealizada pelos gregos, os romanos erigem a noção de
res publica – coisa pertencente a todos os membros do povo (populus romanus) ou alusiva às
questões pertinentes a todos, visando atender ao interesse geral e ao bem comum (SARTORI,
1994).

Na Idade Média, o pensamento político europeu é marcado pela expansão da religião cristã: o
político, circunscrito ao poder temporal (potestas temporalis), perde autonomia, sendo
definido com base no poder espiritual, a potência suprema (plenitudo potestatis). Apesar da
pregação cristã (doutrina da fé), pensadores medievais, pautados no Digesto (também
conhecido pelo nome grego Pandectas), constroem a teoria da soberania popular, segundo a
qual o soberano tem autoridade porque o povo lhe concedeu, devendo albergar-se no direito
costumeiro (ou consuetudinário), criado espontaneamente pelo povo através do uso reiterado,
dando vida às suas tradições. Marsílio de Pádua (1275-1343) compartilha desse entendimento
afirmando que “o direito de fazer leis pertence ao povo” (SELL, 2006).

Entretanto, só a partir dos estudos de Nicolau Maquiavel (1469-1527), o pensamento político


moderno se constitui de forma sistemática, permitindo a elaboração de teorias abalizadas
sobre o Estado e o poder. Vivendo em um período de transformações políticas, económicas e
culturais na Europa Ocidental, como o Renascimento e o advento do Estado moderno,
Maquiavel escreveu O Príncipe (1513), obra que dá origem à ciência política moderna
(PISIER, 2004). Tendo como escopo a reunificação da Itália e a construção de uma instituição
republicana na qual a vontade do povo fosse, de fato, respeitada, Maquiavel desenvolve uma
abordagem realista, buscando entender a sociedade e a política não como uma parte da
filosofia moral ou ética, mas concebidas em termos práticos e realistas, indo directo à verdade
efectiva das coisas (veritá effetuale), a fim de compreender o Estado a partir dos efeitos que
ele produz. Colocando a noção de utilidade acima da moralidade, dando ênfase à eficiência e
à prudência do Príncipe ao invés da simples rectidão moral, Maquiavel pensa o Estado como
um meio de co-optação e coerção que age sobre a sociedade e os indivíduos.

Para fundamentar suas concepções, analisando a constituição republicana sob o ponto de vista
das forças que a ameaçam, Maquiavel rompe com as teorias de viés idealista, como a da
sociabilidade natural. Desmascarando as ilusões teóricas formuladas pelo humanismo
aristotélico e cristão, desvelando suas contradições internas, demonstra que os valores morais
não são absolutos e que o valor da acção Política deve ser definido a partir da perquirição do
contexto em que ela é efectivada e Não apenas firmado segundo as intenções dos agentes.
Assim, rejeita a tradição idealista de Platão, Aristóteles e São Tomás de Aquino, preferindo
seguir o caminho trilhado por Historiadores antigos, como Tácito, Políbio, Tucídides e Tito
Lívio, substituindo o Âmbito do dever ser pelo ser, pela realidade concreta (SADEK, 2006).

Afasta-se também dos ensinamentos da revelação e os da teologia, já que, para Maquiavel, o


Estado é visto como uma organização de dominação, dispondo de meios

De gestão e coacção, detendo o poder central soberano sem qualquer compartilhamento Com
outras instâncias, posto que laicizado e supremo em relação ao pontífice (auctoritaspapal).
Maquiavel foi o primeiro pensador a secularizar a política; ou melhor, separar religião e
política, desconectando a ética e a moral da política, utilizando o método da Observação para
criar, vez que sua teoria advém da investigação da prática. Em suma, Maquiavel dá realce à
verdade efectiva das coisas (veritá effetuale): no exame da realidade concreta encontra-se sua
principal regra metodológica, buscando descobrir como pode ser resolvido o implacável ciclo
de estabilidade e caos. Apartando-se da preocupação com a ética e com os ídolos, Maquiavel
pretende a construção de uma teoria objectiva e científica para a política, visando afastar os
homens do caos e da barbárie. Por isso, separa a moralidade e a ideologia da política, dando
especial atenção à natureza e às relações humanas, compartilhando a ideia de que as pessoas
que dirigem o Estado são motivadas pelo desejo de poder e segurança, instaurando assim uma
concepção realista e moderna do pensamento político (NAY, 2007).

No período contemporâneo, a democracia tem sido tema de análise de filósofos e cientistas


sociais que se ocupam em formular modelos ideais desse regime político ou se

Atêm ao exame da formação, existência e funcionamento dos regimes democráticos


Existentes. Nessa toada, podemos classificar os estudos sobre a democracia em duas
vertentes: aquela voltada à construção de modelos amparados essencialmente em teorizações
abstratas, concentrando-se na formulação de uma democracia ideal; e outra direccionada à
análise empírica e realística, investigando os problemas, as reformas institucionais, as
transformações e o funcionamento da democracia. Esse último viés é chamado de democracia
real (PASQUINO, 2010) ou concepção metodológica de democracia realista (FELISBINO,
2009).

Entre os teóricos que acolheram essa última acepção encontram-se Joseph Alois Schumpeter
(1883-1950) e Robert Alan Dahl (1915-2014), que compartilharam dessa concepção
metodológica de democracia realista, marcadamente caracterizada pela índole descritiva,
mirando, consoante Maquiavel, a veritá effetuale (FELISBINO, 2009).

De fato, o economista austríaco Joseph Alois Schumpeter, autor da obra Capitalismo,


socialismo e democracia (1984) e expoente da teoria minimalista da democracia, opõe-se à
doutrina clássica da democracia, censurando a pretensa ideia de se chegar ao bem comum,
conforme imaginada por Rousseau. Para o autor, o que de fato existiria seria o bem comum da
maioria, posto que cada indivíduo tem sua pretensão, sua visão de mundo, um valor e uma
medida para aquilo que considera bom ou ruim.

Demais disso, Schumpeter critica a suposta racionalidade dos atores sociais e a chamada
soberania ou vontade popular, porquanto não genuínas, visto que delineadas e influenciadas
por outros indivíduos, além de que “o povo, como povo, não pode jamais governar ou dirigir
realmente” (SCHUMPETER, 1984). Por fim, afirma que muitas das decisões consideradas
não democráticas podem ter um apoio popular muito maior do que aquelas avaliadas como
democráticas, até mesmo porque essas demandam muitos membros para deliberarem acerca
de um tema, distanciando-se assim do intentado bem comum; podendo, ao revés, um pequeno
grupo decidir e manter o sistema eleitoral, devendo, por isso, serem eleitos representantes
aptos que possam tomar decisões certas em nome dos cidadãos.

De acordo com Schumpeter, “O método democrático é um sistema institucional, para a


tomada de decisões políticas, no qual o indivíduo adquire o poder de decisão mediante uma
luta competitiva pelos votos do eleitor” (SCHUMPETER, 1984). Para Schumpeter, o governo
não deve ser regido ou conduzido pelo povo, mas apenas assentido e aprovado pelo povo,
visto que as pessoas comuns, além de não terem interesses por assuntos políticos, não agem
de forma racional. Para tanto, se faz necessário que as elites políticas liderem e administrem
as democracias, formando governos e tomando as decisões políticas, restando ao povo um
papel passivo (SELL, 2006), cuja função se restringiria a eleger ou não um político. Segundo
Schumpeter, cada cidadão equivaleria a um voto, caracterizando, assim, para ele, a igualdade
política. De notar que o autor compreende a democracia não só como um regime político-
institucional de onde emanam as decisões de âmbito político, mas também como aquele no
qual o político (líder) adquire o poder de definir as políticas públicas mediante a
competitividade dos votos dos eleitores com o intento de se manter no poder. Portanto,
Schumpeter – reputado como autor da transição entre o pensamento clássico e moderno sobre
a democracia (FELISBINO, 2009) – transmutou a visão idealista de democracia para uma
perspectiva mais pragmática e realista, propondo, com base na teoria weberiana, um método
político (que almejava estar desvinculado de qualquer pressuposição ético-normativa) capaz
de organizar o funcionamento e exercício da democracia, através da utilização de mecanismos
eleitorais, como o voto, cabendo aos cidadãos o controle da gestão pública por meio do
assentimento ou não de um político através da reeleição, oferecendo ou retirando o apoio
popular. Por isso, a concepção schumpeteriana é considerada procedimentalista (PASQUINO,
2010), já que focada no método de escolha de governantes, propiciando assim uma prática
democrática em um mundo por demais complexo. Demais disso, Schumpeter elabora uma
teoria esteada no modelo de democracia concorrencial, de liderança competitiva, na qual a
democracia é singularizada em razão da existência de elites políticas que competem pela
adesão e condução dos cidadãos. Contrariamente à percepção de Schumpeter que prioriza o
método político, o cientista político americano Robert Alan Dahl considera o pluralismo
societal como o principal determinante do destino da democracia, devendo o poder encontrar-
se descentralizado (FELISBINO, 2009). Como registra Limongi no prefácio do livro Segundo
Dahl, o processo de democratização repousa na ampliação da competição e no direito à
participação política, resultando, desse modo, em duas categorias de análise das democracias:
contestação e participação.

A primeira diz respeito à existência de disputa pelo poder no seio de uma determinada
sociedade, bem como à permissão do exercício da oposição e contestação pública. A segunda
se refere à extensão da participação política da população em um Estado. Demais disso, Dahl
utiliza três dimensões como parâmetro para analisar o grau de democratização em uma
sociedade: liberalização, que diz respeito ao processo de ampliação das oportunidades de
contestação; inclusão, referente ao processo de ampliação das actividades de participação;
democratização, que é a conjugação desses dois processos – liberalização e inclusão. Medindo
o nível de competitividade, oposição e contestação pública, Dahl infere que um regime
político pode ser considerado democrático quando “seus principais formuladores de decisões
sejam seleccionados através de eleições periódicas, honestas e imparciais” (SELL, 2006).
Para o autor, quanto mais se verificam organizações competindo com liberdade para alçar ao
poder, mais avançada politicamente estará a sociedade, já que há um pluralismo societal na
qual os cidadãos se associam em grupos de acordo com suas pretensões, objectivando
escolher e/ou manifestar suas preferências (FELISBINO, 2009). Trabalhando com variáveis
institucionais, Dahl deduz a existência de quatro formas de governo: hegemonias fechadas
(regimes sem disputa de poder e participação política limitada); hegemonias inclusivas
(regimes sem disputas de poder, mas que oferece um pouco mais de participação política);
oligarquias competitivas (regimes com disputas de poder e participação política limitada); e
poliarquias (regimes com disputas de poder e participação política ampliada). De ressaltar que
Dahl utiliza o termo de origem grega poliarquia para aludir ao actual estágio do regime
político democrático, aproximando-se assim da realidade, deixando para utilizar a expressão
democracia para designar um sistema ideal, uma fase de desenvolvimento político ainda não
concretizada.

Nesse passo, Dahl procura evidenciar a ação dos atores, considerando-a como principal
variável da democracia, visto que, para ele, a competição por meio do voto tende a gerar uma
maior tolerância em relação à oposição política, acarretando, desse modo, um equilíbrio de
forças na qual um adversário político não poderia eliminar o concorrente. Ou seja, na
poliarquia “nenhum grupo está em condições de exercer qualquer hegemonia sobre o poder
político, já que este se encontra distribuído por toda uma série de detentores” (PASQUINO,
2010).

2.5. Semelhanças e diferenças entre as teorias de democracia em Joseph A.


Schumpeter e Robert A. Dahl

As principais semelhanças e dessemelhanças entre as teorias de democracia em Joseph Alois


Schumpeter (1883-1950) e Robert Alan Dahl (1915-2014) podem ser assim listadas: Quanto
às semelhanças, é necessário, de logo, consignar que as concepções de democracia em
Schumpeter e Dahl têm suas raízes político-científicas nas teorias das elites formuladas por
Gaetano Mosca (1858-1941), Vilfredo Pareto (1848-1923) e Robert Michels (1876-1936), que
identificaram a existência em todas as sociedades de dois estratos: governantes e governados.
Por isso, tais concepções são denominadas de elitismo democrático. Ademais, ambas as
concepções de democracia são consideradas minimalistas, visto que apontam “para a
impossibilidade de realização dos ideais de participação política directa diante da
complexidade do mundo moderno” (SELL, 2006). Conforme já acentuamos linhas atrás, as
teorias elaboradas por Schumpeter e Dahl são concepções realistas, voltadas ao estudo das
democracias reais, recaindo suas análises especialmente em questões alusivas ao modo de
funcionamento dos regimes democráticos. Além de descritivas, essas concepções de
democracia são também tidas como procedimentais, já que, segundo eles, impossível, na
actual quadra histórica, que todos os cidadãos possam, de fato, participar activamente das
acções políticas. Podem ainda serem consideradas como institucionalistas3, visto que, para
eles, o método democrático é um arranjo institucional no qual as decisões políticas são
tomadas por líderes alçados ao poder mediante competição eleitoral moldada pelo sistema
político. Além disso, tanto Schumpeter quanto Dahl compreendem a democracia como
método político, concebendo as eleições como ponto fulcral da democracia e como
mecanismo de controle, não só entre cidadãos e governantes, mas também entre os líderes
políticos.

Entretanto, Schumpeter – e aqui passamos arrolar as principais diferenças entre os autores –


dá mais ênfase ao método político, enquanto Dahl dá destaque ao pluralismo societal.
Schumpeter compreende a democracia como uma resultante do poder conferido aos cidadãos
de decidir no processo eleitoral. Para ele, o processo democrático produz legislação e gestão
estatal somente como subprodutos da luta competitiva pelos cargos públicos através dos votos
do eleitor.

De acordo com Schumpeter, a democracia deve possuir as seguintes características:


concorrência pelo apoio político do cidadão; concorrência livre por meio do voto livre; luta
competitiva pela liderança política; escolha da liderança política pelos cidadãos; governo
administrado por políticos; política como profissão. Segundo Schumpeter, a democracia exige
a obediência das seguintes regras: arranjo institucional para se tomarem decisões políticas,
seja na esfera legislativa seja no âmbito administrativo; acordo institucional para se chegar a
essas decisões políticas mediante uma luta eleitoral competitiva com voto livre; governo
aprovado pelos cidadãos. Em suma, para o economista austríaco a participação direta dos
cidadãos é desfavorável para a consolidação da democracia, sendo mais vantajoso
institucionalizar regras e procedimentos visando a seleção de líderes políticos hábeis.
SegundoSchumpeter, o cidadão é um mero produtor desses líderes políticos (FELISBINO,
2009).

Já para Dahl, a democracia pode ser compreendida como um processo de alargamento da


competividade e da participação política em sociedades pluralistas. Para ele, a representação
política é a solução para se efetivar plenamente a democracia, visto que possibilita a prática
democrática de uma forma ampliada.

Para Dahl, a democracia pressupõe a coexistência de três quesitos: um governo responsivo


relativamente a seus cidadãos; cidadãos detentores de oportunidades plenas quanto à
exteriorização e formulação de preferências, devendo ser beneficiados em suas preferências
institucionalmente, fornecendo essas instituições garantias à sociedade a fim de que tais
oportunidades contemplem o maior número possível de indivíduos; notória conexão entre
garantias e oportunidades. Além disso, segundo o autor, as sociedades devem ter um baixo
índice de desigualdade, já que a situação de desigualdade extrema torna vulnerável o sistema
político, provocando um descomprometimento dos grupos com o regime.

Dahl ainda aponta outros pontos para testar o regime político: sequências históricas; ordem
socioeconômica; nível de desenvolvimento socioeconômica; igualdade e desigualdade;
pluralismo subcultural; crença de ativistas políticos e dominação por um poder econômico.
Diferentemente de Schumpeter, Dahl enumera alguns requisitos para a formação e
funcionamento das democracias, quais sejam: a) formular preferências: liberdade de formar e
aderir a organizações; liberdade de expressão; direito de voto; direito de líderes políticos
disputarem apoio; fontes alternativas de informação; b) exprimir preferências: liberdade de
formar e aderir a organizações; liberdade de expressão; direito de voto; elegibilidade para
cargos políticos; direito de líderes políticos disputarem apoio; fontes alternativas de
informação; eleições livres e idôneas; c) ter preferências igualmente consideradas na conduta
do governo: liberdade de formar e aderir a organizações; liberdade de expressão; direito de
voto; elegibilidade para cargos públicos; direito de líderes políticos disputarem apoio e direito
de líderes políticos disputarem votos; fontes alternativas de informação; eleições livres e
idôneas; instituições para fazer com que as políticas governamentais dependam de eleições e
de outras manifestações de preferência. Portanto, Dahl entende a democracia como um
processo em que se verifica progressiva competitividade política e direito dos cidadãos
participarem da vida política por meio de eleição.
Demais disso, consoante leciona Felisbino (2009), a concepção de democracia elaborada por
Schumpeter encontra-se ancorada em acontecimentos práticos do jogo político de um país,
além de afastar-se das questões axiológicas, analisando a democracia sob um prisma realístico
e não meramente idealista, onde os cidadãos têm uma participação apenas passiva. Já Dahl
compreende que, além de eleger seus representantes, os cidadãos exercem outra função
importante na vida política: organizar-se em grupos de interesses objectivando formular e
expressar suas preferências. Para Dahl, os recursos que concorrem para o poder encontram-se
distribuídos entre grupos díspares. Logo, sua abordagem oferece uma descrição
pormenorizada dos processos de decisão política e de análise dos influxos de grupos e
organizações sobre os jogos políticos. Por fim, a concepção de democracia ofertada por
Schumpeter escora-se na teoria weberiana e a formulada por Dalh apoia-se, dentre outros, nos
ensinamentos expostos pelo sociólogo britânico Thomas Humprey Marshall (1893-1981), que
discerniu as três espécies de direitos (civis, sociais e políticos), estando o último dos direitos
os políticos atrelados às dimensões dalhsianas contestação e participação (FELISBINO,
2009).

2.6. Contribuição de Schumpeter e Dahl para a Teoria Democrática


Contemporânea

A concepção de democracia em Joseph Alois Schumpeter (1883-1950) trouxe contribuições


valiosas à teoria democrática contemporânea, reformulando, a partir dos anos 1940, a ideia
sobre a democracia – até então, majoritariamente, de feição clássica. Schumpeter traz uma
nova visão à democracia: a de luta pelos votos, refutando a valoração atribuída à soberania
popular. Propôs, ademais, alguns pressupostos básicos, que, ainda que não aceitos totalmente,
servem de base para o exame acerca da democracia. São eles: não existe o chamado bem
comum, nem o governo pelo povo, já que esse é exercido por elites políticas que competem
no mercado político pela preferência dos cidadãos; a concorrência nesse mercado político é
imperfeita, sendo de natureza oligopólica, tal qual ocorre na órbita econômica; da mesma
forma, os partidos políticos e eleitores comportam de forma análoga à atuação entre empresas
e consumidores; o voto é a moeda por meio do qual o cidadão obtém os bens políticos
oferecidos pelos partidos.

Cujo objectivo exclusivo é conquistar e manter-se no poder; os 138 controladores são


controlados, visto que a indispensabilidade de maximizar votos obsta os partidos e políticos
de satisfazerem apenas seus interesses de grupos ou de classes sociais. Com seu estudo,
Schumpeter propiciou uma melhor distinção entre regimes democráticos daqueles que não o
são, permitindo ainda avaliar “o aumento ou a redução de democraticidade de um regime”
(PASQUINO, 2010, ps. 356-357).

Robert Alan Dahl (1915-2014), que foi professor de teoria política na Universidade de Yale,
figura como um dos principais pensadores políticos do século XX, tendo contribuído
significativamente para o avanço da teoria democrática contemporânea, sendo a contribuição
mais original a obra Poliarquia: participação e oposição (1997). Nesse texto, Dahl elucida que
a poliarquia pressupõe o funcionamento de um governo descentralizado no qual o cidadão
incluído em um grupo de interesse tem a oportunidade de formular e manifestar suas
preferências no processo político, mediante a garantia e efetivação plena dos princípios
democráticos. De acordo com Dahl, o grau de democracia poliárquica pode ser mensurado por
meio de duas variáveis: o nível de incorporação, ou seja, a participação dos cidadãos no
sistema político competitivo; o nível de institucionalização, isto é, a existência de normas
jurídicas que regulem os conflitos de cunho político. Assim, para Dahl, somente podem ser
consideradas sociedades plurais e poliárquicas aquelas que maximizam tanto o nível de
incorporação quanto o de institucionalização.

Ora, para que ocorram eleições competitivas, livres, idóneas e inclusivas, faz-se necessário
existir regras jurídico-eleitorais claras e justas, condições de liberdade, bem como direitos e
garantias fundamentais positivados, mormente os de cunho político, como contestação,
manifestação de opinião e oposição. Por isso, segundo o autor, as principais liberdades são as
de expressão, de informação e de associação, já que garantem a competitividade eleitoral com
estabilidade e aumento da capacidade de acção governamental.

Desse modo, Dahl apresenta uma teoria democrática realística inovadora, desvinculada das
explicações apoiadas em variáveis socioeconómicas, considerando essencialmente os atores
políticos. Renunciando ao determinismo económico, Dahl oferece uma concepção de índole
eminentemente política, inferindo que os níveis de liberalização e inclusividade de um regime
político são determinados pelos atores políticos e não resultantes do grau de desenvolvimento
económico ou tamanho da classe média.

Nessa trilha, a contribuição de Dahl concerne à formulação de requisitos necessários para a


ampliação da democracia, ante a impossibilidade institucional de efetivação, no mundo pós-
moderno, dos ideários democráticos propugnados pelos pensadores clássicos, contrapondo à
ênfase da dificuldade de incorporação dos cidadãos ao sistema político. Portanto, o contributo
mais importante de Dahl reside na construção de novos conceitos e novos métodos de análise.
3. CONCLUSÃO

A reflexão política contemporânea acerca da democracia transita necessariamente pelas


teorias democráticas desenvolvidas por Joseph Alois Schumpeter (1883-1950) e Robert Alan
Dahl (1915-2014), visto que suas ideias são de grande importância para a expansão e
reconhecimento da ciência política. Tais teorias encontram-se incorporadas à concepção
metodológica de democracia realista.

Nessa mesma arena verificamos duas teorias que não são, de todo, análogas nem rivais, mas
que encontramos algumas semelhanças e dessemelhanças. Sem dúvida, tratam-sede teoria
relevantes para o desenvolvimento e consolidação da política como ciência. Nesse diapasão, o
estudo desenvolvido neste trabalho teve como intuito principal analisar comparativamente as
teorias democráticas em Schumpeter e Dahl. Com a elaboração destetrabalho depreendemos
que as teorias democráticas formuladas por esses autores contribuíram não só para a cognição
acerca das democracias reais, como também para o discernimento de que o conhecimento
científico-político pode ser útil ao avanço e aperfeiçoamento de regimes políticos
democráticos, mirando sua eficiência, estabilidade, durabilidade, e, acima de tudo, a
construção de uma sociedade 140 verdadeiramente livre, justa e solidária, até mesmo porque
não podemos olvidar da advertência posta por Sartori, quando aduz que a democracia como é
na realidade, não é a democracia como deveria ser. A democracia é, antes de tudo e acima de
tudo, um ideal.
4. REFERENCIA BIBLIOGRÁFICA

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Aristóteles: influxos na modernidade. In: ALMEIDA FILHO, Agassiz; BARROS, Vinícius
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DAHL, Robert Alan. (1997). Poliarquia: participação e oposição. São Paulo: Edusp.

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