Você está na página 1de 16

-

9
Transtornos Mentais pelo Uso de
Substâncias Psicoativas

INTRODUÇÃO

Os transtornos mentais induzidos pelo uso de substâncias psicoativas


definem os padrões de comportamento mal-adaptado relacionado à busca,
à ingestão e ao abuso destas substâncias. A 10ª edição da Classificação In-
ternacional de doenças (CID-10) divide esses transtornos em: intoxicação
aguda, uso nocivo, síndrome de dependência, estado de abstinência, trans-
torno psicótico e síndrome amnéstica.
Nos códigos da CID-10, a letra "x" é para ser substituída pelo número
referente à droga associada ao quadro clínico.

Tabela 9.1
Diretrizes Diagnósticas da CID-10 para Intoxicação Aguda (F1x.0)

• É um fenômeno transitório, usual e intimamente relacionado aos níveis de doses.


• Desinibição decorrente do contexto social deve ser também levada em consideração.
• A intensidade da intoxicação diminui com o tempo, e os efeitos finalmente desaparecem na
ausência de uso posterior da substância .
• A recuperação é completa, exceto quando surgirem lesão tecidual ou complicações.

75
Tabela 9.2
Diretrizes Diagnósticas da CID-1 O para Uso Nocivo (F1 x.1)

• O diagnóstico requer que um dano real deva ter sido causado à saúde física e mental do
usuário.
• O padrão de uso é freqüentemente criticado por outras pessoas e está, com freqüência
associado a conseqüências sociais diversas. '
• O fato de que um padrão de uso ou uma substância em particular não seja aprovado por
outra pessoa, pela cultura ou que possa ter levado a conseqüências socialmente negativas
tais como prisão ou brigas conjugais , não é por si mesmo evidência de uso nocivo. '
• A intoxicação aguda ou a "ressaca" não é evidência suficiente para codificar o uso nocivo.
• Não deve ser utilizado se outra forma específica de transtorno por uso de substância psico-
ativa estiver presente.

Tabela 9.3
Diretrizes Diagnósticas da CID-10 para Síndrome de Dependência (F1x.2)

O diagnóstico deve ser feito somente se três ou mais dos seguintes requisitos tiverem ocor-
rido em algum momento durante o ano anterior:
a) forte desejo ou compulsão para consumir a substância;
b) dificuldade em controlar o consumo da substância, em termos de início, término e quan-
tidade;
c) presença de síndrome de abstinência ou uso da substância para evitar o aparecimento da
mesma;
d) presença de tolerância, evidenciada pela necessidade de aumentar a quantidade para
obter o mesmo efeito anterior;
e) abandono progressivo de outros interesses ou prazeres em favor do uso da substância;
f) persistência no uso, apesar das diversas conseqüências negativas.

Tabela 9.4
Diretrizes Diagnósticas da CID-10 para Estado de Abstinência (F1x.3)

• É um dos indicadores da síndrome de dependência.


• Só deve ser utilizado se o quadro apresentar-se grave o suficiente para requerer atenção
médica.
• Pode apresentar sintomas físicos e/ou psicológicos, conforme a droga utilizada.
• O uso da droga reverte inteiramente o quadro.

76
-
Tabela 9.5
Diretrizes Diagnósticas da CID-10 para Transtorno Psicótico
pelo Uso de Substância Psicoativa (F1 x.5)

• Ocorre durante ou imediatamente após o uso de drogas (usualmente dentro de 48 horas).


• O quadro pode apresentar vários padrões psicóticos conforme a droga utilizada, como es-
quizofreniforme, delirante, alucinatório, polimorfo, depressivo e maníaco.

Tabela 9.6
Diretrizes Diagnósticas da CID-10 para Slndrome Amnéstica (F1x.6)

• Comprometimento da memória como exibido em comprometimento de memória recente ;


perturbações no sentido de tempo.
• Ausência de distúrbio da memória imediata, de comprometimento da consciência e de com-
prometimento cognitivo generalizado.
• História ou evidência de uso crônico da substância.

Todas essas síndromes serão abordadas neste capítulo individualmente


na descrição de cada substância ou grupo específico.
O abuso ou uso nocivo se caracteriza pela incapacidade de reduzir ou
interromper a utilização da substância , apesar do prejuízo no funcionamen-
to mental, físico , social ou ocupacional provocado pelo uso da mesma .
Na dependência , além do forte desejo de uso da substância, há o sur-
gimento da síndrome de abstinência ou da tolerância . A abstinência é uma
síndrome específica que se dá após a cessação ou redução da quantidade
da substância utilizada anteriormente de forma regular. A tolerância é a
necessidade de aumentar progressivamente a quantidade a fim de obter o
mesmo efeito.
Diversas substâncias psicoativas podem causar transtornos mentais ou
anormalidades do comportamento. Abordaremos neste capítulo: álcool, opi-
óides, canabinóides, benzodiazepínicos, barbitúricos, cocaína , estimulantes,
alucinógenos, nicotina, cafeína e solventes voláteis.
Muitos usuários utilizam mais de um tipo de droga , entretanto o diag-
nóstico do transtorno deve ser classificado, sempre que possível , de acor-
do com a principal ou principais substâncias utilizadas . Deve-se ressaltar
que por "droga" entende-se uma substância não utilizada como medica-
mento e cujo abuso constitui ilícito penal. Substâncias de uso lícito, como
os sedativos e excitantes do sistema nervoso central, são os "medicamen-
tos" mais comumente abusados.

ÁLCOOL

Os efeitos benéficos sociais do uso moderado do álcool não podem ser


medidos, mas certamente nào podem ser negados. Contudo, 0 grave trans-
torno caracterizado por uso crônico e excessivo, o alcoolismo, resulta em
problemas físicos , psiquiátricos, ocupacionais e familiares .

77
Em qu:tlquer t\·gi:10, nas mais diversas c:poc:as, <.: enlre quase lo .
- sao
povos - exceçao ~ os mu çu 1manos cJ q101s· e1e Maome- - a pr"s,-•e.1Os Os·
. . ' '-• --nçél d
álcool se foz obrigatória . Seu uso se estend<: dos rituais religiosos, ceri, • ?
as de iniciação, reconciliações, confraterniz:1ções, comemorações pa;?,11 ~-
. , . . , . f-. rrot1-
cas, v1tonas esportivas, nupc1as, en 1111 , a qua 1quer pretexto e mcsn,o .
sern
pretexto algum ...
Ape~as a partir cl~ séc:il~ xvrn,_o a~cool~smo c~meçou a ser conside.
rad? na area ele atuaçao medica , pois ate entao era tido como fraqueza do
cara ter.

EPIDEMIOLOGIA

O álcool é a droga psicoativa mais utilizada e m todo o mundo. A preva-


lência de alcoolismo parece ser marcadamente afetada por fatores sociais e
culturais. Há complexas variações no padrão de uso conforme a classe so-
cial, a cultura, o país e outras.
O al~oo~smo é , ~e longe ,_ a mais_freqüente das toxi~o~anias, sendo que
a Orgamzaçao Mundial de Saude estima que sua prevalenc1a esteja em torno
de 13% da população, o que é alarmante.
O consumo tem crescido assustadoramente nos últimos 30 anos, che-
gando em alguns países a aumentar 500%, principalmente entre as mulhe-
res. Nos EUA é considerado o terceiro maior problema de saúde pública. A
taxa anual americana de consumo é de 11,5 litros por pessoa com mais de
14 anos. Na França e na Rússia o problema do alcoolismo também é grave,
o que já não acontece na Itália . Israel tem a menor taxa de consumo per
capita de álcool.
No Brasil, existem aproximadamente 18 milhões de alcoolistas. O nosso
país é o maior produtor e consumidor de bebidas destiladas 03 litros por
pessoa ao ano). O alcoolismo é o diagnóstico mais freqüente nas interna-
ções psiquiátricas.
Atinge três homens para cada mulher. Nos homens, o início é, em geral,
na segunda ou terceira década de vida, tem início insidioso e o paciente
pode não estar ciente da gravidade de seu quadro até a quarta ou quinta
década. Há uma alta taxa de remissão espontânea. Nas mulheres, o curso é
mais variável, com início tardio, poucas remissões espontâneas e mais fre-
qüentemente associado aos transtornos do humor.
Algumas profissões parecem ser mais vulneráveis, como garçons, músi-
cos, atores e médicos.

DIAGNÓSTICO

A dependência de álcool caracteriza-se por qualquer um destes três pa-


drões principais de utilização patológica: necessidade de uso diário de álco-
ol para o funcionamento adequado; ingestão regular e pesada de ~e~id~s
alcoólicas, limitada aos finais de semana; longos períodos de abstmencia
intercalados com períodos de uso excessivo que duram de semanas a me-
ses. Estes padrões envolvem comportamentos como:
- incapacidade de reduzir a ingestão ou de parar de beber;

78
1
d
- es~o~ç~s repetidos de controlar ou reduzir a ingestão alcoólica;
- ep1~od1os ele intoxicação aguda freqüentes ;
_- penados amnésticos para situações que ocorreram durante a intoxi-
caçao aguda (hlackouts);
. , - ing~stào continuada , apesar de haver um transtorno sério que o in-
chvidu~ saiba_ ser exacerbado pela utilização de álcool;
-=- m?es~ao de álcool não apropriado para consumo, como perfumes ou
substancias industriais.
Os ~lcoolistas apresentam um funcionamento social ou ocupacional com-
prometido por fatores como violência enquanto intoxicado, faltas ao traba-
lho, perda de emprego, dificuldades legais, acidentes de trabalho e de trá-
fego, discussões com a família ou amigos por causa do uso excessivo.
Diversas tentativas de classificações têm surgido. Utilizam dados basea-
dos na quantidade ingerida , no grau de perda de controle, nas conseqüên-
cias sociais, em critérios fisiológicos e bioquímicos, e nos fatores psicológi-
cos. Jellinek, em 1960, classificou os alcoolistas conforme o padrão de uso
da bebida. Embora não seja perfeita , é utilizada porque evoca padrões clí-
nicos, culturais e critérios de in- e exclusão. Inclui os tipos:
- alfa: inicialmente, o indivíduo procura o álcool em situações sociais e
o utiliza em excesso. Após um período indeterminado, as situações são apenas
desculpas para o seu uso. O álcool é necessário para manter a pessoa em
estado de bem-estar psíquico. O uso é sintomático; alivia a ansiedade, a ten-
são, mas com o tempo excede a nonna social. A família e os amigos são os
primeiros a notar. É o tipo de melhor prognóstico e muitas vezes reversível;
- beta: é o alcoolismo típico das regiões grandes produtoras de álcool,
como por exemplo, o vinho na Itália, a vodca na Polônia e a cachaça no Brasil.
O consumo é determinado por fatores culturais; é regular, diário, mas não ex-
cessivo. Em geral, os indivíduos com este tipo de alcoolismo procuram ajuda
médica devido a complicações clínicas, como cirrose, pancreatite e neuropatia;
-gama: caracteriza-se pelo uso patológico e sem controle. A tole rância
e a abstinência estão presentes. Freqüentemente é um agravamento das for-
mas anteriores (alfa ou beta). O indivíduo só pára de beber quando perde
a consciência. Literalmente, é o "beber até cair". Não e controle de quando
começar ou parar de beber. O prognóstico social e familiar é ruim;
- delta: é um tipo d e agravamento da forma be ta. Diferentemente da
forma gama, o indivíduo não perde o controle da quantidade, mas, se inter-
rompe o consumo, apresenta síndrome de abstinência. Como exemplo, o
indivíduo que be be regularme nte meia garrafa de vinho às refeições durante
vários anos, um dia é hospitalizado para cirurgia de hérnia e após três dias
sem b e ber apresenta síndrome d e abstinê ncia;
- épsilon: é a dipsomania ou alcoolismo periódico. O indivíduo é abs-
tê mio grande parte do tempo, mas em determinados períodos (depressã o ,
e pile psia, an sie dade e tc.) bebe exageradamente, sem qualquer controle. Es-
ses períodos são limitados e, assim como começam, terminam.

AS FASES DA DEPENDÊNCIA AO ÁLCOOL

o diagnóstico precoce do a lcoolismo está diretamente associado ao


progn óstico. Entre tanto, os alcoolistas consultam os médicos apenas quando

79

. . · ·caç-1o sintomas físicos ou obr1· d
forçados devido a sintomas e1e mtoxi .• ' ga os
peb lei. I I' . , , h·. , ·
O modo correto para se diagnosticar O ~1 coo ismo e uma _15 rona com-
.
p ieta e d 1gna d e conf'1ança (nem sempre poss1vel de obter. . do paciente)
, , aliacta
, .
ao exame f1s1Co, ps1qu1
, ·coe a alguns exames laboratona1s. ·
Um metodo gros
1 -
1O
seiro de avaliar o uso excessivo de álcool é pe aparecimet:to e e complica-
- c1,m1c:1s.
çoes • Esse me'todo , entretanto
, , só detecta
.. o alcoolismo em fase i·a,
tardia grave mas difícil de deter, e não identif1Ca uma vaS ta gama de alco-
olista; que ~unca desenvolvem complicaçõe~ clínicas. .
Poderemos observar o alcoolismo em diferentes fases de desenvolvi-
mento da dependência:
1. Fase pré-alcoólica: o indivíduo começa a se_ afaS tar dos ?adrões soci-
ais. O uso ainda é sintomático, para diminuir a ansiedade, tensao ou depres-
são. Essa fase pode durar de seis a 12 anos. .
2. Fase prodrômica: caracteriza-se por um compro;n_e timento orgânico
maior. Podem aparecer os episódios de hlackout (amnes1a lacunar para pe-
ríodos de intoxicação). É fase importante para o diagnóstico e tratamento.
Pode dur:ir ele seis meses a cinco anos.
3. Fase crucial: ocorre a perda do controle. Aparecem também a síndro-
me de abstinência e diversos sintomas físicos . Os problemas sociais e fami-
liares são graves.
4. Fase crônica: o indivíduo permanece embriagado durante todo o dia.
As complicações psicóticas e mnêrnicas estão presentes. Não há qualquer
controle ela quantidade. Pode ocorrer síndrome demencial.

PRINCIPAIS TRANSTORNOS MENTAIS INDUZIDOS PELO ÁLCOOL

Intoxicação Alcoólica

É um quadro agudo devido ao consumo excessivo de álcool em um curto


espaço de tempo. A duração da intoxicação depende da quantidade de ál-
cool ingerida, alimentação concomitante (bebidas gasosas e açúcar aumen-
tam a absorção, e os alimentos em geral retardam) . A concentração máxima
de álcool no plasma é observada em 30 minutos a duas horas após a ingesta.
A eliminação é realizada pelos rins e pulmões, e pode durar até 12 horas. Os
sinais clínicos de intoxicação são mais marcantes durante o período em que
a concentração plasmática está aumentada.
Os sinais de intoxicação podem ser neurológicos (fala pastosa, ataxia,
prejuízo da atenção e da memória), psíquicos (labilidade do humor, desini-
bição, agressividade, irratibilidade, loquacidade) e comportamentais(brigas,
julgamento prejudicado - questão de responsabilidade penal - interferên-
cia no funcionamento social ou profissional). Os traços de personalidade,
como timidez ou desconfiança, podem ser exagerados ou reduzidos.
O tratamento consiste na interrupção do uso de álcool, hidratação ade-
quada e suporte vitamínico (principalmente tiamina). Se necessário, pode-
mos utilizar medicação sedativa, como os benzodiazepínicos por via oral ou
intramuscular, como por exemplo, o clordiazepóxido (l00mg/dia) ou o lo-
razepam (6mg/dia).

80
Intoxicação Alcoólica Idiossincrásica

Caracteriza-se por alterações comportamentais após a ingesta de quan-


tidade de álcool insuficiente para produzir intoxicação na maioria das pes-
soas. O início é súbito, com comportamento hostil e agressivo, o que é atí-
pico para a pessoa . O episódio é de cu1ta duração e há amnésia subseqüente.
Muitas vezes está associado a lesão cerebral ou a outras drogas.
Devido à sua curta duração, o tratamento raramente é necessário. Pode-
mos utilizar medicação sedativa, como referido, apenas para alívio dos sin-
tomas de ansiedade ou depressão subseqüentes.

Síndrome de Abstinência Alcoólica

A cessação do consumo prolongado de álcool é freqüentemente segui-


da por tremores (mãos, língua e pálpebras), náusea, vômitos, mal-estar ou
fraqueza, hiperatividade autonômica (taquicardia, sudorese, aumento de pres-
são arterial), humor deprimido ou irritabidade, insônia, hipotensão ortostá-
tica, hiper-reflexia tendinosa e convulsões do tipo grande-mal.
Essa síndrome inclui um amplo espectro de gravidade. Em geral desapa-
rece após sete a dez dias. A desnutrição do alcoolista, a fadiga e doenças
concomitantes podem agravar o quadro.

Delirium de Abstinência Alcoólica (delirium tremensJ

É a forma mais grave de síndrome de abstinência alcoólica. Acredita-se


que fatores predisponentes sejam a presença de outras doenças (pneumo-
nia , fraturas , TCE e doenças hepáticas). Ocorre em torno de cinco a 15 anos
de consumo elevado.
O aspecto fundamental é o rebaixamento do nível de consciência, com
sintomas produtivos visuais (em geral, zoopsias) ou auditivos. Os sinto-
mas são mais freqüentes à noite. Ocorre dentro de uma semana após a
cessação ou redução da ingesta violenta de álcool. Os aspectos físicos da
síndrome de abstinência, inclusive a crise convulsiva, estão presentes. A
febre é freqüente . Cenas fantásticas e atos impulsivos, hetero ou auto-
agressivos , podem ocorrer.
Desaparece após cinco ou sete dias. Se não tratada adequadamente,
apresenta alto risco de mortalidade. O diagnóstico diferencial com outras
causas freqüentes de rebaixamento da consciência em alcoolistas (TCE, in-
fecções, desidratação etc.) deve sempre ser realizado.
o tratamento da síndrome de abstinência alcoólica é a melhor maneira
de se prevenir o aparecimento do delirium tremens. A hidratação, o suporte
vitamínico (principalmente tiamina) e a sedação com benzodiazepínicos de-
vem ser prescritos. Em caso de agitação grave pode-se utilizar o haloperidol
endovenoso (5mg/20ml de água destilada/hora). No caso do delirium tre-
mens devemos evitar a contenção física prolongada, que pode resultar em
fadiga e desidratação. Quando ocorrer crise convulsiva, esta deve ser tratada
com anticonvulsivantes, como o fenobarbital.

81
Alucinose Alcoólica

Síndrome alucinatória. geralmente com alucina\ões auditiva~, sem pre-


juízo do nível de consciência, que aparece em penodo de ~bs!mência ou
após período de grande ingesta alcoólica. Pode oc?rrer re_mi~sao espontâ-
nea após semanas ou meses, mas há relato de_<:asos_lírev~rsi~e~s. O diagnós-
tico diferencial com outras síndromes paranoides e obngatono.
Às vezes O tratamento da abstinência ou do período de intoxicação maio
pode levar ;o desaparecin1ento espontâneo-~ alucines~ al~~-lica. Caso~
remissão espontânea não ocorra podemos utihzar u1n anttps1cottco, como 0
haloperidol.

Ciún1e Patológico

Caracteriza-se por acusações impossíveis de adultério, na maioria das


vezes, à mulher. É uma síndrome paranóide de início insidioso e evolução
lenta que pode ter graves conseqüências para o paciente ou para a cônjuge.
Não há associação do aparecimento do quadro e o tempo ou a quantidade
de álcool ingerida. Talvez os fatores predisponentes estejam relacionados à
personalidade pré-mórbida, dificuldades sexuais do alcoolista (impotência)
e aumento da libido em estados de intoxicação.
O tratamento deve seguir os padrões do tratamento da alucinose alcoólica.

Síndrome Amnéstica Alcoólica (Síndrome de Weniicke-Korsako.ff)

A desnutrição típica do alcoolista pode levá-lo a um quadro de deficiência


vitamínica, principalmente de tiamina , o que pode resultar em uma encefalo-
patia alcoólica aguda (síndrome de Wernicke). Essa síndrome se caracteriza
por ataxia, oftalmoplegia, nistagmo e rebaixamento do nível de consciência. O
quadro é totalmente reversível se tratado adequadamente com tiamina.
Entretanto, caso não seja tratada adequadamente, a síndrome de Werni-
cke pode evoluir para um transtorno amnéstico (síndr01ne de Korsakoff).
Caracteriza-se por grave distúrbio da memória de fixação , com criação de his-
tórias fantasiosas e irreais (confabulações) para preencher lacunas mnêmicas.
Não há prejuízo da consciência. Em autópsias encontram-se lesões degenera-
tivas nos corpos mamilares e no sistema mamilotalâmico. Esse déficit mnêmi-
co é irreversível. Raramente ocorre antes dos 35 anos de idade.

Demência Associada ao Alcoolismo

É uma síndrome demencial que persiste por, no mínimo, três semanas


a pós a cessação do uso prolongado de álcool e para a qual todas as outras
causas de demências foram descartadas. Existe se mpre um grave comprome-
timento do comportamento social ou ocupacional. É rara antes dos 45 anos de
idade. Não se sabe se a demê ncia associada ao alcoolismo é um efeito primá-
rio do álcool, ou de seus metabólitos sobre o cé rebro, ou se é conseqüência
indire ta da desnutrição , le sões fre qüe ntes no crânio e doença hepática.

82
HIPÓTESES ETIOLÓGICAS

Não há explicação cientificamente plausível do porquê de algumas pesso-


as desenvolverem problemas com o uso do álcool e outras não. Certamente o
álcool não é o único responsável pelo alcoolismo nas suas diferentes formas
porque senão todos que o utilizassem desenvolveriam estes problemas e não
apenas uma minoria, em tomo de 20%. As causas precisas do alcoolismo con-
tinuam em debate, mas alguns fatores estão seguramente presentes:

Fatores Genéticos

Cinqüenta por cento dos alcoolistas têm pais com o mesmo problema.
Gêmeos monozigóticos têm duas vezes a taxa de concordância, em contras-
te aos gêmeos dizigóticos. Estudos com filhos de alcoolistas adotados por
famílias abstêmias reforçam o caráter genético.

Doenças Mentais

Há freqüente associação entre algumas doenças mentais e alcoolismo (de-


pressão, transtorno do pânico, fobia social, transtorno de personalidade bor-
derline etc.). Esta associação pode ser mera coincidência, como pode serre-
flexo de uma chance maior de desenvolver estas doenças conjuntamente
devido a anormalidades etiológicas semelhantes, ou pode ainda ser conseqü-
ência do uso inicial do álcool como agente aliviador de sintomas.

Personalidade

Não há evidência de um tipo específico de personalidade para os alco-


olistas, embora o uso patológico do álcool possa ser reflexo da mesma. Al-
guns traços são comuns como dependência, hostilidade, egocentrismo, ten-
dência auto-agressiva.

Fatores Metabólicos

Sem dúvida , o álcool participa de mudanças metabólicas nos alcoolis-


tas. É difícil saber se elas já ocorriam antes ou são conseqüências do uso
excessivo do álcool. Talvez os alcoolistas tenham uma sensibilidade maior
ao álcool devido a algum transtorno metabólico, de forma que após o con-
tato maior com o álcool sua presença se torne fundamental para o metabo-
lismo. Indícios de distúrbios ligados ao AMP cíclico e ao tetra-hidroisoqui-
nolone já foram identificados.

Fatores Culturais-Comportamentais

o uso do álcool é muito difundido e estimulado na nossa sociedade. Etn


alguns grupos, o beber pode ser fator decisivo para ser aceito ou não. Algu-

83
mas fanu1i3 s t:1ml~m r~m no :ilc00l J ~p...,, u p.trJ J Ít.":,..'TÜ :- ~.- pni,,,~\'lt,i .
Todas ess..1:- siru:1Ç'ÓQ podem ie,-.H imfü·id uü , .h" Jht~~"'\ ,, 1..\..)1):-'-'•qüt>mt' 1.:~
pendênci:1 .

TRr\ TA.\lE\10 DO .-\LCOOU~\10 CRà\ 10)

o alcoolismo é um tr.ln:-lOml) de dificil tr.H:Hnetfü)_ ..-\JX'~.lr 1,_h;- mu1t1.\,


alcoolist.3s conseguirc.>m episódio:- de :1bstint>nri.L .is rt\.-.11d.1:- :-.h, IR"\l \Í\'nie:-
e desanimadoras. O objctiYo nuior do tr.1umcnl1..1 d(' .tk\x,Jbnh, o, ,nk\) t'
eYitar o impubo irresistíYd p:ir:1 bdx'r. .-\ tl\:ni1..-.1 nuis .h.i..'it:1 1.' :1 dt) ~lr-.u·.t-
mento múltiplo·· .
O "tratamento múltiplo·· enYoln: .1 :1:--.,lxi:11::1<, tk \°\"it't.'l1.' r.1 pi.1 indi,·idu.tl,
de grupo e de famíli:1 (:1poio e oriern:1ç:10 :1n p:1cienk' 1.' .1 familb). h..\.'nk-:i:-
comportamentais de aYers:lo. us0 de medic.1mc1fü\, :insiolitit'n."' .. tntidc.·pt\·~,i-
vos, aversivos (dissulfiram) ou sec.fatin)s. e µn1pos d1.· :1kooli:--us :1m'-ininh\, (1. ,,
"AA''). o AA é uma comunid:1de ,·olunt:íri:1. fonn:1d:1 por ki~l\'-, 1..' l}U(' 1..k:-t'll·
volve apoio e orient:iç:.1o aos akoo\is1:1s e famili:1n.·:-. .-\pc~1r 1.k 1ün 1.'Xi:--til\.'I\\
números concretos. estima-se que st>us re:-uludos - :-tll..'l':-,,,l) l'tll ll )t1H ) d~ 2r,\,
dos indivíduos que se m:1nt~m em rr:11amen10 - s.:in n:-; ml'lhun. ·s l)htidn, 1.·rn
relaçào a qualquer outra pr.ítio isobd:1.

OPIÓIDES

O ópio é obtido da papoula , e dele deriY:un l·erc:1 de 20 :tlc 1lóicks difl'-


rentes. O mais conhecido é a morfin:t . Podem ser sintcti1.:1d:1s :1 lwn ,in;1, .1
codeína e a hidromorfina .
Atualmente , a heroína é o opiáceo m:iis ahus:1<.10. Em gcr:d . SL'U u:-11
inicia-se no final da adolescência ou no início d:1 vid:1 :1dult:1. A propon:;111
é de três dependentes de sexo masculino p:ira um c.k sexo fl'mininu . O
uso intravenoso está associado ao risco de complic:1~·õe:-, co1110 :1hep:11i1c
B e a Aids.
O uso dos opióides resulta em alteraçôes compon:11nent:1is m:d-:1d:1p
tativas , como uma euforia inicial seguida por :1patia , clisfori:1 . r1.·t:trdl> psi-
comotor, comprometimento do julgamento e funcionamento soda!. Ocor-
re sonolência, analgesia, fala arrastada , comprrnnetiml'nto d:1 :1t1.·n~·:io l'
da memória , e constriçào pupilar. Pode também ocorrer hoc1 s1.·c:1. ruh1ll'
facial e coceira nasal.
Há, no cérebro, receptores opióides, originalmente aptos para l rah:dll:1r
com as endorfinas e as encefalinas, que, quando recebem os opiúidl's exó-
genos, exercem seus efeitos de um modo exagerado.
A morfina é um depressor respiratório, e casos ele dose supr:1clínic.1 po-
dem resultar em parada respiratória e morte.
Ocorre tolerância aos efeitos dos opióides, com exce~·ào cio t.:fcito de·
pressor respiratório. A síndrome de abstinência se caracteriza por c.k:st:i 0
irresistível de utilizá-los, ansiedade, insônia , anorexia , agitaç:1o, ft.:hrc, boce-
jos, sudorese, rinorréia , mi<lríase, piloereçào, náusea , vômito, dores museu·
lares, hipertensào, taquicardia , cólicas abdominais , convulsües do tipo gran·
de-mal e morte.

84
r-
O tratamento da dose supraclínica é situação de emergência médica.
Além da manutenção dos sinais vitais, utiliza-se um antagonista opióide, a
naloxona (o,4mg/endovenosa/ quatro a cinco vezes por hora).
O tratamento da abstinência pode ser realizado com a metadona - um
opíóide sintético - na dose de 20 a 80mg/dia para estabilizar o paciente. A
retirada diária e gradual de metadona é mais fácil do que com os outros
opióides e seu uso médico é legal. O uso oral em vez do endovenoso, fa-
cilita a liberação da dependência. entretanto, o indivíduo contínua um usu-
ário de narcótico, necessitando de ajuda médica para livrar-se do problema
e com grave risco de recaída.
O tratamento multidisciplinar, em comunidade terapêutica, com equipe
especializada no tratamento de episódios de superdosagem, abstinência, pro-
blemas sociais e familiares, pode proporcionar nos melhores resultados.

CANABINÓIDES

A maconha, originária da planta Cannabis (indica ou sativa), contínua


sendo a droga ilícita mais utilizada. Um terço da população norte-americana
a utilizou pelo menos uma vez. Interessantemente, seu uso parece estar em
declínio no Ocidente, e os índices estimados diminuem a cada ano.
Os elementos ativos da resina de canabiol são isômeros de tetraidroca-
nabínol, sendo o mais importante o 11-hidroxi-tetraidrocanabinol. Os graus
de potência podem variar conforme o composto, sendo a maconha o menos
potente, seguido da ganja. O mais potente é o haxixe.
A intoxicação por Cannabis pode resultar em síndrome apato-abúli-
ca, com sensação de lentificação no tempo, julgamento defeituoso, retra-
imento social, leve euforia ou ansiedade. Podem surgir, ainda , conjuntivas
congestas, apetite aumentado, boca seca e taquicardia. Quadros psicóti-
cos, com desconfiança ou ideação paranóide, são muito raros, e talvez
estejam associados a predisposições individuais. Outra reação rara é o jl.ash-
back, que é a ocorrência espontânea dos sintomas quando a droga não
está sendo usada.
Existem algumas indicações de tolerância e abstinência após o uso fre-
qüente e excessivo. Não há, entretanto, evidências clínicas de que os sinto-
mas de abstinência ou de tolerância possam resultar em qualquer problema
aos usuários. O desejo pelo uso da droga se associa a um padrão de uso
patológico e não a sintomas específicos. Há relatos de síndrome de absti-
nência com distúrbios do sono, náuseas, vômitos, tremores e sudorese.
Quando ocorrem, são leves e de remissão espontânea.
Não existe tratamento específico para o usuário de maconha. Os progra-
mas devem ser multidisciplinares, incluindo educação em saúde, psicotera-
pia individual, de família e em grupo.

BENZODIAZEPÍNICOS

Os benzodiazepínicos incluem vários compostos, como o diazepam,


o clorazepato, 0 clordiazepóxido, o alprazolam, o midazolam, o bromaze-
pam, 0 doxazolam, o clonazepam, entre outros. São utilizados no trata-

85
siedade (transtorno do pânico, fobia social, trans
mento d as e\o enças de an d · h' , · -
. d· de genenlizada) como se ativos , 1pnot1cos, relaxante
tomo d e ans1e a. . ' ntes anestes1cos
' , . e no t ra tamento d e abstin . . s
musculares, anttconvu 1siva , en-
cia alcoólica. , . de que ~
enzodiazepínicos e menos iara se supoe. Talvez
O ab uso de b - d f · ·
_ quem inicialmente sensaçao e eu ona, e muitas vezes cau-
porque nao provo , - f' ·1 Q
- A detecção do abuso não e tao ac1 . uase sempre os indiv'1
sem depressao. , . d' , . -
odiazepimcos apresentam outros iagnosticos psi·
duos que ab usam de benz . . .. _
., . transtorno de personalidade ou quadros ansiosos cronicas
qu1atncos, com0 _ . , . .
Os benzodiazepínicos sao fracos depressores do centro re~riratono, e
os casos de intoxicação aguda grave não resultam em consequencias irre-
versíveis.
Todos os compostos benzodiazepínicos podem prov~car síndrome de
abstinência . A gravidade desta síndrome p,a_rece estar associa?ª ~o tempo de
uso do medicamento, sua potência em miligramas e sua meia-vida. Quanto
maior O tempo de uso, maior a potência em miligramas e menor a meia-
vida, mais grave a síndrome de abstinência. Por exemplo, o alprazolam, que
apresenta meia-vida curta (em tomo de cinco horas) e é muito potente em
miligramas (com 3mg já se obtém efeito para o tratamento do transtorno do
pânico), apresenta um sério risco de síndrome de abstinência. Os pacientes
em uso terapêutico de alprazolam devem utilizá-lo em quatro tomadas diá-
rias, devido à meia-vida curta e o conseqüente risco de síndrome de absti-
nência entre tomadas mais distanciadas. Os sintomas mais freqüentes são
ansiedade, insônia, ataques de pânico, irritabilidade, fadiga , tremores, náu-
sea, diminuição do apetite, sudorese excessiva, tontura , dificuldade de con-
centração, cãibras, dores musculares , parestesias, depressão, despersonali-
zação, desrealização, percepção sensorial aumentada , síndrome paranóide,
crises convulsivas do tipo grande-mal etc.
O tratamento ideal é prevenir a síndrome de abstinência. Os benzodia-
zepínicos, como qualquer outra medicação, só devem ser utilizados em in-
dicações específicas, com prescrição médica, e por tempo limitado. Quando
prescrevemos um benzodiazepínico devemos ter em mente o objetivo tera-
pêutico e o tempo de tratamento. Em geral, após três meses , seu uso deve
ser revisto, avaliando-se riscos e benefícios. A retirada deve ser lenta e gra-
dual, podendo durar de dois a seis meses para os de maior risco de síndro-
me de abstinência. Às vezes , é necessária a substituição do benzodiazepíni-
co de meia-vida curta ou potente em miligramas (alprazolam, lorazepam,
clonazepam etc.) por um de meia-vida mais longa e menos potente em
miligramas (clorazepato, clordiazepóxido) facilitando assim sua retirada.
' ' '

BARBITURATOS

Os bar~it~ratos são usados como sedativos, hipnóticos, anticonvulsiva~-


tes e anestes1cos, embora outras substâncias medicamentosas menos letais
e menos propensas a causar adição tenham reduzido sua prescrição. Seu
uso, tanto legal como ilegal, está declinando.
. A_intoxic:-ção por babituratos, por via oral ou venosa , lembra a int?-
x~cª?º. pelo alcool. Os indivíduos apresentam sedação, fala arrastada, ata~~•
d1sturb10 da marcha , comprometimento da atenção e da memória , desini-

86
bição de impulsos sexuais ou agressivos, instabilidade do humor, julga-
mento precário, funcionamento social e laborativo comprometido. A into-
xicação aguda em associação com o álcool é um método frequente de
suicídio. A morte induzida por barbituratos segue a seqüência de coma
profundo, dificuldade respiratória e insuficiência cardiovascular. O trata-
mento da dose supraclínica começa com a indução do vômito (para paci-
entes lúcidos) e lavagem gástrica com a administração de carvão ativado
para retardar a absorção.
A síndrome de abstinência é similar à do alcoolismo, podendo ocorrer
quadro indistinguível do deliríum tremens alcoólico. O tratamento é sin-
tomático, com a manutenção dos sinais vitais e a utilização de um barbi-
turato de meia-vida longa , como o fenobarbital, por via oral ou muscular.
A retirada deste deve ser progressiva , acompanhada de um atendimento
multidisciplinar, com psicoterapia individual, de família e em grupo.

COCAÍNA

A cocaína é um alcalóide derivado da Erythroxylon coca, planta nativa


da Bolívia e Peru, onde é mascada por seus efeitos estimulantes. Em 1884
tornou-se o primeiro anestésico local eficaz, sendo esta a única finalidade
pela qual ainda é utilizada em medicina.
Embora o abuso de cocaína seja comum entre pessoas de classes privi-
legiadas, o número de usuários parece estar diminuindo na América do Norte.
Observa-se maior freqüência entre desempregados e entre pessoas de 18 e
25 anos de idade.
O principal efeito da cocaína é o bloqueio da recaptação de catecolami-
nas, principalmente dopamina. Seus efeitos sào curtos, mais breves do que
os efeitos da anfetamina, geralmente durando de 30 a 60 minutos.
A cocaína, nos seus diferentes graus de pureza, pode ser ingerida por
via oral, inalada (método mais freqüente de uso), injetada (subcutânea ou
intravenosa), ou ainda fumada , como ocorre com o crack, uma cocaína ex-
tremamente potente.
O uso crônico de cocaína está associado a rinorréia , úlceras nasais e
perfuração de septo.
Seus efeitos sobre o sistema nervoso central sào semelhantes aos da
anfetamina: euforia, excitação, auto-estima aumentada, hipervigilância, agi-
tação psicomotora, incapacidade de julgamento, ideação paranóide e alu-
cinações táteis ou visuais. Podem ainda ocorrer: taquicardia, midríase, pressão
sangüínea elevada, transpiração ou calafrios, náuseas e vômitos.
À medida que os efeitos da droga desaparecem, surgem cansaço, triste-
za, irritação. Pode-se associar anedonia e idéias suicidas. Esse quadro de
abstinência eventualmente dura algumas semanas.
A intoxicação não exige tratamento específico, já que é de curta dura-
ção. Em caso de grave agitação psicomotora sugere-se a utilização de an-
tipsicóticos. A abstinência, em geral, tem evolução benigna, mas se a sín-
drome depressiva se agrava, antidepressivos tricíclicos podem ser eficazes.
O tratamento do uso crônico de cocaína requer medidas sociais (afasta-
mento da fonte e dos estímulos ao uso) , psicológicas (apoio à família e ao
paciente) e biológicas (uso de antidepressores ou neurolépticos).

87
ESTIMULANTES

Os estimulantes do sistema nerYoso central s:1o a anfetamina e os .


~ati~01nimétic?s d~ ação sin:~ar. ·•Simpati:ot~n~éti~-os .. referem-se 3 5 ~ : :
tanc1as que m1mettzam os efettos das catecoL1mma~.
A anfel.3.mina e os seus congêneres compreendem um grande grupo d
drogas es timulantes do sistema nerYoso central. como a dextroanferanlinae
metanfetatnina , metilfenidato etc . ·
A anfetamina é prontamente abs?r.-id3 por Yi:i or.1_1 e ~1presema um ,.í-
pido início de ação. Seu abuso se da . em geral associado :io uso Yenoso
Uma dose de 5mg produz sensaçfto de bem-estar. melhora no desempenh~
de tarefas mentais e físicas. diminuição do cansaço. indução da anorexfa e
elevação do limiar da dor. Esses efeitos explica111 seu uso terapêutico 0
transtorno de hiperatividade por déficit de 3tençào. n ~1 n:ircolepsia . na obe~
sidade na depressão e como potencializador de antidepressiYos e analgési-
cos .
Os sinais e sintomas físicos por seu uso incluem: ondas de calor. pali-
dez , cianose , febre , cefaléia , taquicardia. midríase . pressão sangüínea acen-
tuadamente elevada , náusea , parestesias. vômitos. bruxismo. dificuldades
respiratórias, tremor, ataxia e perda das capacidades sensori:iis. Em casos de
intoxicação, além destes sintomas. podem ocorrer acidente , ·ascular encefá-
lico, convulsões, tetania , parada cardíac3 e morte .
Os efeitos psicológicos do uso de anfetamina incluem: inquietaç,lo. dis-
foria , logorréia , insônia , irritabilidade , hostilidade. ansied:ide. pânico. idea-
çào paranóide e alucinações visuais (psicose anfetamínica ) .
A tolerância se desenvolve rapidamente, e alguns pacientes ::1cabam uti-
lizando doses enormes. Os sintomas de abstinência ~do: ansiedade. tremo-
res , humor depressivo, letargia , fadiga , pesadelos , cefaléia. sudorese ex.ces-
siva , cãibras musculares , cólicas abdominais e fome insaciável.
O tratamento envolve as medidas clássicas de apoio :10 dependente e
sua família . Os antipsicóticos ou os benzodiazepínicos podem ser úteis no
tratamento de quadros de intoxicação ou uso crônico.

ALUCINÓGENOS

Os alucinógenos formam um grupo heterogêneo e maldefinido. S3o


exemplos: a psilocibina (substância de algumas espécies de cogumelos). a
mescalina , a fenilciclidina e a dietilamida do ácido lisérgico (LSD).
Os alucinógenos produzem efeitos simpaticomiméticos, como tremores.
taquicardia , hipertensão , sudorese excessiva , visão turva e midríase.
A tolerância se desenvolve rapidamente , após três ou quatro dias ele uso.
Um rápido período de abstinência (três a cinco dias) é suficiente para o rt.>-
torno dos efeitos anteriores.
O LSD, alucinógeno padrão, produz alterações na percepç:10, humor
e pensamento. As percepções tornam-se mais brilhantes e intensas; :1s corc::s
e texturas parecem mais ricas, os contornos mais vividos , a músic:1 m:u_s
profunda e emocionante , e os odores e sabores são intensificados. A_~1~
n:ste_sia ~ode ocorrer: cor~s são ou:idas e sons ~sã? visto~ . As :1!_u ~!n:içiJ;
sao v1sua1s, geralmente ele f-ormas e figuras gcometncas . A 111toxic.tç,w P

88
ser tratada com antipsicóticos e proteção ao paciente . Não há relato de
uma síndrome de abstinência específica. Como a tolerância se desenvolve
rápidamente , é raro o abuso crônico. Episódios de flash-back, tal como a
maconha, podem ocorrer.

NICOTINA

O hábito de fumar cigarros tem sido associado a diversas doenças car-


diopulmonares e a alguns tipos de câncer. Apesar de seu uso estar diminu-
indo na população geral, os pacientes psiquiátricos continuam apresentan-
do índices de uso maiores do que o restante da população.
A dependência à nicotina desenvolve-se rapidamente. O quadro de abs-
tinência , que pode surgir 24 horas após a interrupção do uso, se caracteriza
por ânsia por nicotina, irritabilidade, ansiedade, dificuldade de concentra- ·
ção, inquietação, bradicardia, aumento do apetite e do peso. O número de
recaídas é grande quase: 80% das pessoas que tentam parar de fumar retor-
nam ao uso da nicotina. O tratamento com técnicas aversivas e educação em
saúde tem se mostrado opção promissora.

CAFEÍNA

A cafeína, na forma de café, chá, refrigerantes, cacau, chocolate e pre-


parações antigripais, é consumida por quase toda a população.
Os efeitos clínicos de uma dose de 100 a 150mg de cafeína (uma xícara
de café forte) incluem um estado de vigília intensificada, sensação de bem-
estar, desempenho verbal e motor melhorados. Pode produzir também: diu-
rese, estimulação do músculo cardíaco, peristaltismo aumentado, secreção
de ácido gástrico e elevação da pressão sangüínea.
A intoxicação por cafeína se caracteriza por ansiedade, agitação psico-
motora , irritabilidade, cãibras, rubor facial , náusea , diurese, insônia, acelera-
ção do curso do pensamento, diarréia, taquicardia e resistência à exaustão.
O uso crônico estimula a hiperacidez gástrica, que pode agravar úlceras e
provocar o desenvolvimento de arritmias cardíacas.
O tratamento consiste na abstinência e uso de benzodiazepínicos. Téc-
nicas de terapia comportamental também podem ser úteis.

SOLVENTES VOLÁTEIS

Há abuso de gasolina, removedor de verniz, fluido para isqueiro, cola


de sapateiro, cimentador de borracha, aerossóis etc. Os ingredientes ativos
incluem: tolueno, acetona, benzeno, tricloroetano, hidrocarbonos haloge-
nados etc.
Jovens, principalmente de classe baixa, utilizam solventes voláteis por-
que são legais, de fácil acesso e baratos. A intoxicação surge em cinco mi-
nutos e dura de 15 a 30 minutos. Após breve efeito de desinibição, produ-
zem depressão do sistema nervoso central, com excitação, sensação de flutuar,
tontura , fala arrastada, ataxia e sensação de poder aumentada. Ocorre apa-

89
tia. funcionamento social e ocupacional diminuído, prejuízo no julgamento
at~s impulsivos e agressivos, e amnésia pa~a ~ ?eríodo de i~toxicaçào. A
morte pode ser causada por depressão resp1ratona central, arritmias cardía-
cas asfixia ou acidentes.
'Não é certo que haja síndrome de abstinência típica , embora exista to-
lerância substancial após a inalação repetida.
o tratamento envolve medidas sociais, psicológicas e farmacoterápicas
(conforme os sintomas apresentados) .

BIBLIOGRAFIA

1. American Psychiatric Association-Task Force Report. Benzodiazepine. Dependen-


ce, Toxicity, and Abuse. American Psychiatric Press, Washington, 1990.
2. American Psychiatric Association. Practice Guideline for the Treatment of Patients
with Substance Use Disorders: Alcohol, Cocaine, Opioids. Americanjournal ofPsychi-
atry, 152(11): 5-59, 1995.
3. Engel JV. Alcoolismo e hábito de beber. Tese de Mestrado . Instituto de Psiquiatria_
UFRJ , 1977.
4. Mayer-Gross W. , Slater E., Roth M. Psiquiatria clínica. Tomo II . Ed. Mestre Jou, São
Paulo, 1972.
5. Schuckit MA. Alcohol Related Disorders. ln: Kaplan HI & Saddock BJ (ed.). Textbook
of Psychiatry/VI . 6th ed . Willians & Wilkins, Baltimore, 1995.
6. World Health Organization. Classificação de Transtornos Mentais e de Comporta-
mento da CJD-10. Artes médicas, Porto Alegre , 1993.

90

Você também pode gostar