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Capítulo 2 – Galvanômetros – Prof.

Fábio Bertequini Leão / Sérgio Kurokawa

Capítulo 2 – Galvanômetros

2.1. Introdução
O galvanômetro é um instrumento eletromecânico que é, basicamente, um medidor de
corrente elétrica de pequena intensidade. Existem basicamente dois tipos de galvanômetros, que
são os galvanômetros do tipo bobina móvel e do tipo ferro móvel. De modo geral ambos os tipos
de instrumentos baseiam-se na interação entre a corrente elétrica que circula em um condutor
que está imerso em um campo magnético. O resultado desta interação é um torque que atua no
condutor. Na Figura 2.1 é ilustrado um galvanômetro de ferro móvel.

Figura 2.1 – Galvanômetro de ferro móvel.

O galvanômetro de ferro móvel da Figura 2.1 é composto de: mola fixa (1), parte móvel
conectada ao ponteiro (2), elemento de ferro magnético móvel (3) e bobina fixa que recebe a
corrente a ser medida (4). O funcionamento do galvanômetro de ferro móvel é como segue: na
bobina de excitação (4) é aplicada a corrente a ser medida; o material ferroso, sobre o qual a
bobina é enrolada é fixo; quando uma corrente circula na bobina, o material ferroso transforma-
se num eletro imã gerando um campo magnético, que aparece ao redor e por dentro do tubo. Este
campo magnético provoca o movimento da parte móvel (3) que é inserida dentro da parte fixa,
tendo liberdade de girar em seu interior. A parte de ferro móvel (3) é acoplada a um ponteiro que
gira na frente de uma escala graduada e a estrutura deste ponteiro é preso a uma mola fixa (1)
para amortecimento. Desta forma, quando a corrente é aplicada à bobina de excitação, provocará
o giro do ponteiro até o ponto em que a força aplicada ao ferro móvel for equilibrada pela reação
da mola. Neste ponto o ponteiro para e a leitura poderá ser feita. Quando a corrente é retirada da
bobina de excitação, a mola exercerá uma força no ponteiro, trazendo-o de volta à origem. O
galvanômetro de ferro móvel é pouco usado, por ser menos sensível e possuir baixa classe de
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exatidão quando comparado com o de bobina móvel, mas possui as vantagens de ser mais barato,
mais robusto, e funcionar tanto com corrente contínua como com corrente alternada. É comum
encontrá-los nos painéis de geradores elétricos.

Na Figura 2.2 é ilustrado um galvanômetro de bobina móvel de d’Arsonval1. Este


instrumento é constituído de um imã permanente (que gera um campo magnético radial), de uma
bobina móvel que pode girar em torno de um eixo e de uma mola cuja função é se opor ao
movimento da bobina (movimento resultante da interação entre a corrente e o campo magnético).

Figura 2.2 – Galvanômetro de bobina móvel.

O funcionamento do galvanômetro de bobina móvel da Figura 2.2 é como segue: uma


bobina de fio muito fino é enrolada em um núcleo de ferro e presa em um eixo que permite esta
bobina se movimentar livremente. O conjunto é fixado no entreferro de um imã fixo de campo
magnético permanente. Quando circula corrente elétrica pela bobina, se forma um campo
magnético que interage com o campo do ímã, ou em outras palavras, aparece uma força
magnética na bobina causada pela interação da corrente elétrica e o campo magnético externo.
Nesta situação a força causa um giro ou torque na bobina, movendo o ponteiro, ou agulha, sobre
uma escala graduada. O ponteiro deve deslocar-se até um ponto em que a força aplicada a bobina
seja equilibrada pela reação da mola. Neste ponto o ponteiro para e a leitura poderá ser feita.

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Jacques-Arsène d'Arsonval (1851-1940): foi um médico, físico e inventor francês. Foi o inventor do galvanômetro
de bobina móvel e do amperímetro termopar. Junto com Nikola Tesla, d'Arsonval foi um colaborador importante no
campo da eletrofisiologia, o estudo dos efeitos da eletricidade nos organismos biológicos, no século XIX.
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Quando a corrente é retirada da bobina móvel, a mola exercerá uma força no ponteiro, trazendo-
o de volta à origem. Conhecendo a função que relaciona a posição angular do ponteiro com a
intensidade da corrente que circula na bobina, é possível calibrar a escala do instrumento de
modo a transformá-lo em um medidor de corrente. Através de circuitos apropriados, o
galvanômetro pode ler outras grandezas elétricas, como tensão contínua, tensão alternada e
resistência. Devido a sua exatidão, versatilidade e aplicabilidade em diversos equipamentos
analógicos de medidas elétricas será dado enfoque, nas próximas seções, no desenvolvimento da
expressão matemática que relaciona a corrente e o deslocamento angular em instrumentos de
bobina móvel.

2.2. Expressão para o deslocamento angular do ponteiro do galvanômetro


de bobina móvel de campo uniforme não radial
r
Considere um condutor de comprimento infinitesimal dL onde circula uma corrente i.
Nestas condições este condutor é denominado elemento diferencial de corrente. Se este elemento
r r
é imerso em um campo magnético uniforme B , o condutor estará submetido a uma força dF
dada por:
r r r
dF = i ⋅ dL × B (2.1)
r
Na Figura 2.3 é mostrada a força dF que atua no elemento diferencial de corrente
r
i ⋅ dL .
r r
i ⋅ dL i ⋅ dL
α
r r
B B
r r
dF dF
r r
Figura 2.3 – Força dF atuando no elemento diferencial i ⋅ dL .
r r
Observe que a força dF possui direção perpendicular ao plano formado entre i ⋅ dL e
r
B . Sua intensidade é dada pelo módulo do produto vetorial da equação (2.1) e seu sentido é
dado pela regra da mão direita considerando o produto vetorial, ou pela regra da mão esquerda,
ambas as regras ilustradas na Figura 2.4.

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b)
a)

Figura 2.4 – Regra da mão direita e esquerda. a) regra da mão direita - produto vetorial; b) regra da mão
esquerda.

Para obtermos a força que atua na bobina do galvanômetro, considere uma bobina
r
retangular de largura W e comprimento L imersa em um campo uniforme B produzido por um
imã permanente não radial, conforme mostrado na Figura 2.5.

i i
Bobina de N
espiras

B i B
F F
i

Eixo de Vista de
rotação Frente
a)
b)

Figura 2.5 – Bobina imersa em um campo magnético uniforme criado por um imã permanente não radial.
a) vista de cima; b) vista de frente.

A força aplicada em uma única espira da bobina mostrada na Figura 2.5 é dada por:
r r r
F1 = ∫ i ⋅ dL × B (2.2)

r r
No conjunto mostrado na Figura 2.5 o produto vetorial i ⋅ dL × B somente é diferente do
vetor nulo ao longo do comprimento L da bobina. Deste modo a equação (2.2) torna-se:
r L r r
F1 = ∫ i ⋅ dL × B (2.3)
0

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r
O módulo da força F1 é dado por:

( B ⋅ i ⋅ senα ) ⋅ dL
L L
F1 = ∫ i ⋅ dL ⋅ B ⋅ senα ⇒ F1 = ∫ (2.4)
0 0

r r
Na expressão (2.4) temos que senα=1, pois B e dL são perpendiculares conforme
Figura 2.5. Deste modo a equação (2.4) resulta em:
L
F1 = ∫ B ⋅ i ⋅ dL ⇒ F1 = B ⋅ i ⋅ L (2.5)
0

Para o caso de N espiras, a equação (2.5) fica:

F = N ⋅ B ⋅i ⋅ L (2.6)

Na equação (2.6) F é o módulo da força que atua na bobina de N espiras. Para calcular o
torque na bobina considere a Figura 2.6.

TF r ⊕
F
TR r
Fy θ r
Fx r
i B
x
θ θ
θ + x = 90
r
r
Fx r
B
θ Fy
r
F
Figura 2.6 – Vista de cima da bobina do conjunto da Figura 2.5(a).
r
Decompondo a força F nas direções x e y conforme Figura 2.6 teremos:

Fx = F ⋅ senθ (2.7a)

Fy = F ⋅ cos θ (2.7b)

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r
A partir da Figura 2.6 observamos que somente a força na componente y, ou seja, Fy ,

contribui para o deslocamento angular da bobina no sentido de aumento de θ. Deste modo, o


r
torque devido á força F será dado por:

W W
TF = Fy ⋅ + Fy ⋅ = Fy ⋅ W = F ⋅ cos θ ⋅ W ⇒ TF = N ⋅ B ⋅ i ⋅ L ⋅ W ⋅ cos θ (2.8)
2 2

Considerando que para uma corrente I a bobina alcance uma posição de equilíbrio cujo
r
ângulo é θ, têm-se, conforme a Figura 2.6, o torque TF devido à força F causada pela corrente I
e o torque resistivo TR devido à ação da mola do instrumento. O torque TR é equacionado como
sendo:

TR = S ⋅ θ (2.9)

Sendo: S a constante da mola.

Na posição de equilíbrio temos que o torque resultante é nulo, assim podemos fazer:

TF − TR = 0 ⇒ N ⋅ B ⋅ I ⋅ L ⋅ W ⋅ cos θ − S ⋅ θ = 0 ⇒ N ⋅ B ⋅ I ⋅ L ⋅ W ⋅ cos θ = S ⋅ θ ⇒

S θ θ
⇒I= ⋅ ⇒ I =k⋅ (2.10)
N ⋅ B ⋅ L ⋅ W cos θ cos θ

Na equação (2.10) verifica-se que a relação entre a corrente I e o deslocamento angular


θ é uma função não linear. Portanto um galvanômetro de campo uniforme não radial, como o
apresentado na Figura 2.5, terá uma escala não linear ou heterogênea, conforme pode ser visto
na Figura 2.7.

Figura 2.7 – Escala do galvanômetro de campo uniforme não radial.

Na equação (2.10) a constante k depende dos parâmetros do instrumento que são


definidos pelo fabricante. A Figura 2.8 apresenta a equação (2.10) considerando três valores para
a constante k. Observa-se que quanto maior a constante k maior é o valor medido pelo
instrumento para um mesmo deslocamento angular, ou seja, maior será o fundo de escala do
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instrumento. Também se observa que entre 0o e 40o o gráfico pode ser aproximado para uma
reta, ou seja, apresenta característica linear. Este fato pode ser visto na escala da Figura 2.7, onde
a mesma é linear ou homogênea até aproximadamente 0,3 que equivale a um descolamento de
aproximadamente 40o.

Função Não-Linear para Deslocamento do Ponteiro de Galvanômetro de Campo Magnético Uniforme-Não Radial
8000
k1=1
k2=2
k3=3
7000

6000

5000
k*Teta/Cos(teta)

4000

3000

2000

1000

0
0 10 20 30 40 50 60 70 80 90
Teta

Figura 2.8 – Gráfico de I versus θ da função não linear dada pela equação (2.10).

2.3. Expressão para o deslocamento angular do ponteiro do galvanômetro


de bobina móvel de campo uniforme radial
Para eliminar a não linearidade da escala do galvanômetro, geralmente o mesmo é
construído com um imã de campo magnético uniforme radial, conforme ilustrado na Figura 2.9.

Figura 2.9 – Esquema do galvanômetro de campo uniforme radial.


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r
Neste tipo de galvanômetro a força F é sempre perpendicular à bobina devido ao
r
campo magnético B ser sempre paralelo ao eixo x da bobina. Observe na Figura 2.6 que se o
r r
campo magnético B for paralelo ao eixo x então o ângulo θ entre a força F e o eixo y é nulo.
r
Portanto podemos obter a equação do torque devido à força F a partir da equação (2.8) como
sendo:

TF = N ⋅ B ⋅ I ⋅ L ⋅ W (2.11)

Para uma posição angular θ de equilíbrio temos:

TF − TR = 0 ⇒ N ⋅ B ⋅ I ⋅ L ⋅ W − S ⋅ θ = 0 ⇒ N ⋅ B ⋅ I ⋅ L ⋅ W = S ⋅ θ ⇒

S
⇒I= ⋅θ ⇒ I = k ⋅θ (2.12)
N ⋅ B ⋅ L ⋅W

A equação (2.12) mostra que a função que relaciona a posição angular do ponteiro com
a corrente na bobina do galvanômetro é uma função linear. Portanto a escala do galvanômetro
de campo uniforme radial será homogênea conforme pode ser visto na escala do instrumento da
Figura 2.2. A Figura 2.10 apresenta a equação (2.12) considerando três valores para a constante
k. Observa-se que quanto maior a constante k maior é o valor medido pelo instrumento para um
mesmo deslocamento angular, ou seja, maior será o fundo de escala do instrumento.

Função Linear para Deslocamento do Ponteiro de Galvanômetro de Campo Magnético Radial


600

k4=4
k5=5
k6=6

500

400
k*Teta

300

200

100

0
0 10 20 30 40 50 60 70 80 90
Teta

Figura 2.10 - Gráfico de I versus θ da função linear dada pela equação (2.12).

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