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TEORIAS SOCIAIS
SÃO LUÍS/MA
2019
A película audiovisual Vênus Negra aborda a história da sul-
africana Saartjie Baartman, ambientada na Europa do século XIX. Saartjie foi uma
mulher negra que trabalhava como doméstica na fazenda de Hendrick Cezar, seu então
dono. Saartjie foi levada à Europa com o intuito de ser uma grande atração em
espetáculos circenses, por conta do seu físico "exótico" e, obviamente, diferente do que
era habitual na Europa (mulheres magras, esbeltas, etc), além disso, ela acreditava que
seria muito bem paga por isso, mas, no entanto, não foi. A personagem tinha formas
corporais bastante robustas, e as nádegas muito proeminentes, o que era bastante
explorado nas apresentações, e bastante reforçado, pois seu dono a obrigava a comer
muito para engordar e compor a personagem que representava.
Causando, por tal atitude, uma objetificação e fetichização do corpo da
mulher negra, que, mesmo hoje, ainda é posto em situações parecidas, como nos
desfiles de escolas de samba e propagandas de cerveja. Saartjie usava roupas coladas ao
corpo com o objetivo de ressaltar suas curvas para atrair e prender a atenção do público,
que estava chocado com o físico “grotesco” da personagem. Nos espetáculos, ela ficava
dentro de uma jaula, não falava o idioma do local, e era exibida como a “Vênus
Hotentote”, fazendo alusão com o seu corpo à antigas esculturas da deusa Vênus em
épocas remotas. Na qual os grupos tribais da época cultuavam uma deusa com formas
físicas parecidas com as da protagonista. Além disso, nesse período, as mulheres com
este físico eram exaltadas por conta dele, justamente por lembrarem a deusa e também
porque no imaginário coletivo, esse físico feminino era atribuído à fertilidade.
Entretanto, no filme, isto não ocorre, muito pelo contrário, o corpo da
personagem é transformado num objeto para entreter o público, como se Saartjie não
tivesse uma vontade própria e domínio de si mesma, mas apenas tivesse a utilidade de
satisfazer os desejos sórdidos do seu dono e de quem assistisse sua "exposição" na jaula
do circo.
A ideia do africano selvagem era usada para legitimar o avanço colonial
europeu sobre o continente africano no século XIX. Os europeus eram os “superiores”
que tinham a missão de levar as luzes da civilização que viviam nas trevas do
paganismo e do obscurantismo. Além de ser exibida como "a selvagem", a personagem
tinha de se jogar em cima do público com atitudes violentas, com a pretensão de atacá-
lo, com o intuito de mostrar que ela não detinha de habilidades de civilização e como se
não fosse um ser humano, mas um animal irracional.
Tratada como escrava nas apresentações, Saartjie chamou não só a atenção
do público que a apreciava, mas também da corte local, que a levou ao tribunal com o
propósito de que esclarecesse a relação estabelecida entre esta e seu dono Hendrick
Cezar, tendo em vista as acusações que este último sofrera por tratá-la como escrava.
O “causo” não foi adiante, pois, treinada e ameaçada pelo seu dono, ela
desmentiu qualquer relação escravista existente. Afirmou apenas que era uma artista e
tinha ido à Inglaterra fazer espetáculos a convite de Hendrick. Outras relações de
sociedade foram estabelecidas e Saartjie foi vendida a outro dono, domador de animais,
que, de modo mais agressivo, a tratava como escrava, e via nela a oportunidade de
enriquecimento fácil e a submetia não só aos espetáculos circenses e grotescos que
fazia, mas também organizava os “shows” fechados para alta sociedade em Paris, onde
os convidados não só a tocavam, como a exploravam quase que sexualmente,
evidenciado novamente o que já foi comentado a respeito da fetichização do corpo da
mulher negra. O francês levou Saartjie a Paris para exibi-la como selvagem na corte
francesa, mas, como ela passou a não mais aceitar isso e não fazer o que se esperava que
ela fizesse nas apresentações, ele a abandonou na rua e ela, sem ter para onde ir,
resolveu prostituir-se para sobreviver.