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constitui a fonte de todo poder na Igreja.

Já encorajada por Inocêncio Hl, encon tra-se


uma clara expressão sua no liturgista Guilherme Durand (t 1296): o papa "dirige, dispõe
e julga todas as coisas"; ele pode "suprimir todo direito e governar acima do direito 1...]
ele próprio está acima de tudo e tem, na terra, a plenitude do poder". Estamos longe do
modelo legado por Gelásio i (492-96), que estabelecia urna partilha equilibrada entre a
autoridade dos clérigos, que se sobrepõe em matéria espiritual, e o poder dos laicas, que
se impõe na esfera temporal. Mas isso quer dizer que, agora, todos os poderes temporais
concernem, ao menos indireta- o o Q . mente, ao papa? A questão continuou a ser
debatida, sendo objeto de diversas for- ta , cl-mutações, moderadas ou radicais. É
verdade que Gregório vil afirma que "os cci
= • c,
sacerdotes de Cristo devem ser considerados os pais e senhores dos reis, prínci- - E pes g
e de todos os fiéis", e é provável que ele sonhasse em restabelecer a velha uni- ° dade
,
do poder temporal e do poder espiritual, mas, dessa vez, em proveito do papa < co
enã o.doimperador(GirolamoArnaldi).Eleafirmava,deresto,nos Dietatuspapae, - n 81:1 que"apenasopapatinhaodireitodeusodasinsígniasimperiais»,
. ;

tendência que ‹§ ,-. o ,.o os um texto dos anos 1160 (a Surnma perusina) amplifica ainda mais, 15. O monastério românico de San Pere de Roda, Catalunha, século xt.
Consagrada em 1022, a abside do edifício abacial de San Pere de Roda comporta um dos primeiros deambula-
c v)
enfatizando-a: 'di á` a tórios e sua nave, terminada na segunda metade do mesmo século, não é menos audaciosa. Do exterior, distin -
guem-se a igreja abacial e seu campanário, a muralha do claustro associada ao refeitório e ao dormitório, duas
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"O papa é o verdadeiro imperador". Esta pretensão a um papado imperial, plena --)
oc.f
outras torres e diversos edifícios que serviam às atividades dos monges. O monastério apresenta-se como uma
- , C cidadela fortificada suspensa no flanco da encosta, dominando orgulhosamente a solitude em torno.
realização na terra do poder real de Cristo, nem sempre é apenas teoria. Assim, h z :47,
u j • • e g.i
quando ele proclama a cruzada, em 1095, Urbano ii usurpa manifestamente uma =CO r" eq
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prerrogativa imperial e põe o papa, de modo duradouro, na posição de guia da cris-l< „co
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Mas, ncla de, em um domínio que deveria ser próprio da competência do
imperador. Mas, no geral, a cristandade medieval não tomou exatamente a forma
SÉCULO XIII: UM CRISTIANISMO
do que se tem o hábito de chamar de uma teocracia, na qual a Igreja deteria o
c COM NOVAS ENTONAÇÕES
efetivamente a soberania nos negócios temporais. As afirmações mais combativas, E
sem dúvida, visavam menos a ser inteiramente postas em prática do que a 8 Entre os séculos xt e xm, o Ocidente transforma-se de modo considerável. Se
o
consolidar o essencial: a proeminência da monarquia pontifícia sobre todos os E
co fosse preciso escolher um edifício para simbolizar a Europa do século xi, este
outros poderes do Ocidente e o reconhecimento do papa como guia da cristandade.
• 1.1 seria, sem dúvida, um monastério beneditino, tal como o de San Pere de
Ao término dos processos descritos aqui, o caráter dominante da institui ção
Roda, na Catalunha, com ares de fortaleza suspensa no flanco de uma colina,
eclesial está mais marcado do que nunca. Esta é reformada sob a autorida de
. dominando, a partir de seu soberbo isolamento, os campos circundantes (figu-
absoluta e centralizadora do papado, e a dominação dos clérigos sobre os lai cos é
fortalecida graças a uma separação hierárquica cada vez mais vigorosa entre
R" ra 15, acima).
urna casta sacralizada e o comum dos fiéis. Essa reorganização é acompa nhada por
o Para exprimir as realidades do século XIII, seria necessário pensar, ao con-
numerosas transformações que afastam a cristandade ocidental de suas origens
o trário, em uma catedral gótica, tal como a de Bourges, audacioso edifício no
- c..), coração da cidade (figura 16, na p. 198). De um edifício a outro, passa-se de um
(por exemplo, no que concerne à associação de Constantino entre a Igreja e o cu
.a) c universo rural ainda fracamente povoado para um mundo mais densamente
Império) e que não acontecem no Oriente bizantino. O cisma de 1054, 0 ol
a 4
ocupado, onde a cidade tem um papel notável (ilustração \mi, na p. 199). Ao
consumado precisamente durante o pontificado de Leão ix, acompanha muito cii a>
mesmo tempo, a dominação dos monges cede terreno diante da reafirmação do
logicamente o momento em que a forma ocidental da Igreja cristã se desenha
clero secular.
em toda a sua clareza.
196 Jérôme Basclzet A civiLizAçÂo FEIJOAL 197
CATEDRAL DE LEON
PLANTA PC LA ANTIBILAYGLESIA FICNIÁNICA FIELACIONADA CON
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16. No coração da cidade, a


catedral gótica de Bourges,
primeira metade do século xm.
A catedral, enaltecida pela arte gótica,
inscreve-se no coração do tecido
urbano, que ela domina a partir de sua
massa quase esmagadora. Dedicada a VIII. Dimensões comparadas da
e
santo Estevão, a catedral de Bourges catedral gótica de Leão e do
foi iniciada em 1195 e terminada, no
edifício românico que ela substitui.
essencial, em meados do século
seguinte. Ela se caracteriza pelas Em Leão, os trabalhos empreendidos
dimensões particularmente no século 'ex permitiram revelar as
imponentes (125 metros de fundações do edifício românico situa-
comprimento; 50 metros de largura; do sob a construção gótica que o
37,5 metros de altura) e uma notável substituiu (o caso de Salamanca
homogeneidade, sensível em seu permite, ao contrário, observar unia
plano (ilustração x, na p. 202). situação excepcional, pois a catedral
Percebe-se, à direita, a série de gótica é construída ao lado daquela
arcobotantes que sustentam a alta de época românica, sinal bastante
nave central, desde a fachada até a raro de respeito por um edifício
abside, sem que nenhum transepto anterior). O edifício românico
interrompa a regularidade. Projeção (consagrado em 1073) comporta três
de uma embarcação com cinco naves, terminadas cada urna por uma
naves, a ampla fachada é abside semicircular. Urn século mais
inteiramente articulada pelos cinco tarde, a construção de uma nova
portais cujos pés- catedral é iniciada pelo bispo
-direitos se juntam uns aos outros. Manrique de Lara (1181-1205), com o
apoio do rei Alfonso ix.
Interrompidos, os trabalhos são reto-
mados durante o episcopado de
Martín Ferriández (1254-89), que
leva a cabo a edificação dos portais
da fachada ocidental. A nova
catedral multiplica de modo
considerável o espaço interno
utilizável, sinal ao mesmo tempo do
crescimento urbano e da vontade de
poderio da Igreja.
geralmente ornados de capitéis,
corno se vê aqui nas partes altas da
nave principal. A abóbada central
de berço, reforçada por arcos
cruzeiros, prolonga a mesma forma
semicircular. A luz penetra apenas
indiretamente na nave central,
inclusive na parte superior, onde as
tribunas — andar sobreposto às
naves secundárias contrabalançam
o repuxo exercido pela abóbada
central. Do mesmo modo, a abside,
onde aparece o altar principal, é
vazada apenas por janelas estreitas
(somente o cruzeiro do transepto,
encimado por urna torre ortogonal
que data do século xiv, é mais
vivamente iluminado). lm uma
nave românica, os contrastes de
sombra e luz são fortemente
marcados.

17. A nave em berço da igreja


abacial de Cangues, segunda metade
do século xt.
Realizada, em grande parte, na época
do abade Odolrico (morto em 1065),
a abadia beneditina de Conques pare-
ce ter sido terminada guando o
abade Begon iii (1087-1107) manda
edificar a clausura. Na arquitetura
românica clássica, os arcos são em
pleno cimbre e repousam sobre
pilares, colunas ou semicolunas,
Do românico ao gótico dade das formas
arquitetônicas e pela
nu um edifício a outro, ausência de módulo
passa-se da arte românica à comum às diferentes
arte gótica, o que é bem partes do edifício, de
mais do que uma simples modo que nave, naves
questão de "estilo". Do secundárias, transepto,
românico ao gótico é o tribunas, coros e cúpulas,
mundo que muda e, com ele, deambulatórios e capelas
a maneira de conceber a laterais parecem mais
função social e ideológica da elementos autônomos
arquitetura. Da arte românica agregados uns aos outros
retêm-se, geralmente, o arco (ilustração Ix, na p. 202).
de pleno cimbre e a 41hóbada De outro lado, a arte
de berço em pedra, ou seja, românica é urna arte da
um avanço notável, pois a parede e da superfície: ela
maior parte das Igrejas sublinha a importância de
anteriores — à imagem das amplas superfícies de
basílicas antigas, muralhas espessas e
construções civis que ser- densas, cuja constituição
Iram de modelo aos
em pedra é diretamente
primeiros edifícios de culto
visível, no exterior, ou
cristão — eram cobertas por
reproduzida por um
um vigamento em madeira,
estuque pintado, no
muito exposta ao risco de
interior. As necessidades
incêndio. Mas a abóbada
técnicas combinam-se, aqui,
berço repousa seu peso
aos móbiles ideológicos,
ao longo dos muros laterais
pois, à imagem da instituição
que a sustentam, de modo
de que ela é símbolo, a igreja
que estes só podem ser
quer ser uma fortaleza que
fendidos por janelas
se defende contra o inundo
estreitas, que destilam uma
exterior e, então, não pode,
itl . parcimoniosa e irregular
simbolicaincute, deixá-lo
(figura 17, na p. 200). Em
penetrar em seu seio, a não
uma igreja românica, as
ser com prudência. É
lonas de sombra e de luz
preciso que ela exalte
contrastam vigorosamente e
esses muros que a
entrecortam o espaço
protegem assim como as
interior. Essa impressão de
torres de campanários, que
fragmentação é ainda
enquadram então
acentuada pela heterogenei-
A ciVILIZAÇÃ❑ FEUDAL 2W
maciçamente a fachada,
para dar exatamente o
sentido da vigilância da
cidadela divina. É assim que
a igreja românica aparece
como uma cidade santa
fortificada, prefiguração
terrestre da Jerusalém
celeste, exibindo suas
muralhas de pedras
preciosas, ilha de pureza
espiritual em meio à
ameaçadora confusão do
mundo.
Para qualificar a
arquitetura gótica,
enumeram-se, geralmente, o
arco ogival, a abóbada sobre
cruzeiro de ogivas e o
arcobotante, mas, dos três,
somente o último talvez seja
uma invenção gótica, urna
vez que o cruzeiro de ogivas
havia se estabelecido desde o
fim do século xt no domínio
anglo-normando (em par-
ticular, na catedral de
Durham). O que revela bem
mais a especificidade d o .

gótico é uma combinação


desses três elementos, a
serviço de um projeto técni-
co-ideológico novo. Mesmo
se, sem dúvida, convém
temperar o papel inaugural
1- buído habitualmente à igreja abacial de Saint-Denis, necrópole dos reis da
Inça (Roland Recht), observa-se nela uma das primeiras formulações, ainda
te parcial, desse projeto, entre 1130 e 1144, quando da reconstrução pelo
bode Suger do coro e da fachada do edifício. Durante as décadas seguintes, o
tico afirma-se, adaptando-se a necessidades diversificadas, quando das obras it.
numerosas catedrais do centro do reino da França (Sens, a partir de 1140; otre-
Dame de Paris, a partir de 1163). Depois, atinge sua maturidade nos anos 220-70,
segundo modalidades em geral contrastantes (Chartres é terminada, ito
essencial, por volta de 1220; Amiens e Reims, por volta de 1240; Bourges, por
volta de 1250). Pouco a pouco, o que se chama de opus francigenum (mar-caindo,
assim, que a Ilha de França é o seu berço) é adotado através de todo o Ocidente,
com variantes múltiplas e cada vez mais refinadas, e torna-se, de ihirgos até
Praga e de Canterbury até Milão, a técnica de construção dominan te até o início
do século xvi.
Para explicitar esse novo sistema construtivo, sem equivalente na história,
p►de-se partir do cruzeiro de ogivas, formado por duas nervuras em pedra que se
cruzam em ângulo reto e capaz de sustentar o restante da abóbada, feita de materiais
mais leves (figura 18, na p. 204). Todo o peso da abóbada é, assim, direcio nado
para as quatro colunas que a sustentam, de modo que, mediante um con trapeso a
essas forças assegurado por contrafortes e arcobotantes, os muros Literais
IX. Planta de um edifício românico, da primeira
X. Planta de um edifício gótico, da primeira meta -
perdem seu papel de sustentação e podem ser substituídos por amplas aberturas.
metade do século xu: Notre-Dame-du-port, em
Dermont-Ferrand.
de do século xtu: a catedral de Santo Estevão, em Assim, têm-se os grandes vitrais que chamam a atenção tanto pela profusão quase
Bourges.
Notre-Darne-du-Port oferece o exemplo típico de um
A catedral de Bourges leva ao extremo a busca gótica
impossível de captar das representações que contêm como pela luminosidade
edifício em cruz latina. Identificam-se a nave central
flanqueada por duas naves secundárias sobrepostas de homogeneização do lugar sagrado e de uniformiza- colorida com a qual eles inundam o edifício. A realização da arquitetura gótica é o
ã) construtiva. A nave central é flanqueada de quatro
por tribunas, o corpo ocidental associado à fachada,
naves secundárias e completada por uni duplo
desaparecimento tão radical quanto possível desses muros que caracterizam o
o transepto, cujo cruzeiro é coberto de uma cúpula,
o coro cercado por um deambulatório com suas absi- deambulatório. As capelas, que se abrem sobre o edifício românico e a invasão do lugar de culto por uma luminosidade que, por
díolas. Nota-se que nenhum desses elementos utili- deambulatório, são tão pouco profundas que se ins-
crevem na largura dos contrafortes, e o transepto Foi certo, é rutilante e cambiante, mas que reduz os contrastes de sombra e claridade
za um módulo de medida em comum: não há nem
mesmo relação numérica entre a largura da nave cen- suprimido (nos lados da nave, as capelas laterais são e tende a fazer do edifício urna unidade de luz. Se o români co era uma arte do
trai e aquela das naves secundárias, como também acréscimos posteriores). Principalmente, o mesmo
não há entre o comprimento do vão da nave e o do módulo de medida é utilizado de uma ponta a outra muro, o gótico é uma arte da linha e da luz, sinal indubitável de uma relação com
transepto. do edifício (um abobadado das naves secundárias o mundo mais aberta, menos inquieta com o contato com as realidades
equivalendo a um quarto do vão da nave central). Do
mesmo modo, todos os elementos, tais como moldu- mundanas, tão presentes nas próprias portas das catedrais.
ras, colunetas e capitéis, tem a mesma dimensão em
todas as partes da igreja. A unidade do projeto argui-
Através ou além da importância da luz, dois princípios estão no coração da
terAnico foi, então, definida desde o início da constru- busca gótica. Em primeiro lugar, a unificação do espaço interior não é apenas a
ção, por volta de 1195, e mantida ao longo da segun-
da campanha, iniciada por volta de 1225, até o seu consequência da luz colorida e contínua difundida pelos vitrais; ela é, de início,
término, em meados do mesmo século. ligada à adoção de plantas que tornam o edifício cada vez mais homogêneo
(supressão das tribunas, atenuação dos transeptos, integração do deambulatório e
das capelas laterais na unidade arquitetônica do coro) e que utilizam para todas as
Os dois planos estão aos escalas muito diferentes e levar-se-ã em conta o fato de que a catedral de Bourges é mais de partes da igreja medidas coordenadas fundadas sobre um módulo único (ilustração x,
duas vezes maior que a de Notre-Dame-du-Port.
na p. 202). Até no detalhe do desenho das colunetas ou molduras, tudo

A CIVILIZAÇÃO FEUDAL 203


faz ainda mais sistemático, recorrendo a formas pouco numerosas, mas asso-lidas
em múltiplas combinações. Diferentemente dos espaços hierarquizados e
versificados do românico, a arquitetura gótica busca a unificação pela articula- o
de elementos tão homogêneos quanto possível. É o que Erwin Panofsky
,Unneava "o princípio de clarificação" em funcionamento na arquitetura gótica,
cuja preocupação de "autoexplicação" visava tornar perceptível o princípio cons!
trutivo do edifício, sintoma, aos seus olhos, de uma comunhão de pensamento
e e hábitos com a escolástica contemporânea: as Sumas teológicas do século mil
não são, também elas, fundadas em um duplo princípio de recorte sistemático e
;,de coerência totalizadora, de divisão em partes constantes, englobadas em um
.

conjunto homogêneo, cuja estrutura é explícita com clareza?


O segundo princípio diz respeito a um desejo de espiritualidade. Um sinal
umnifesto disso é a negação do muro material, em proveito da luz, que a Idade
Média considera espiritual e um símbolo de Deus ("a obra resplandece de uma
nobre luz. Que o seu brilho ilumine os espíritos a fim de que, guiados por ver -
dadeiras claridades, eles cheguem à verdadeira Luz, lá onde o Cristo é a verda -
deira porta", dizem os versos que Suger manda gravar na fachada de Saint-Denis). A
verticalização crescente das linhas arquitetônicas, sublinhada pelas colunetas que
articulam incessantemente os pilares, é uma outra manifestação sua, assim como a
busca de uma altura sempre mais audaciosa para as abóbadas. Essa altu ra atinge
36 metros em Chartres, 38 em Reims, 42 em Amiens, ao passo que a intrepidez dos
arquitetos góticos se eleva em vão até 48 metros em l3eauvais, cujo coro desaba
em 1284. Uma vez atingido esse limite, o apelo do céu se transfere para os
acréscimos exteriores, e a flecha de pedra da catedral de 1.7.,strasburgo, no início
do século xv, ergue-se a 142 metros, altura que não será superada por nenhum
monumento até o século xix. Imagina-se, então, sobretudo se se pensa no
contraste com a fraca elevação das habitações urbanas, quan to os edifícios
"superdimensionados" das catedrais deviam impressionar os contemporâneos
(Roland Recht).
18. Abóbadas sobre cruzeiro de ogivas e amplas vidraçarias: o coro e a nave da catedral de Leão, segun -
da metade do século xill.
É, verdade que as catedrais — associadas aos numerosos edifícios que as
A catedral de Leão mostra a realização da busca do gótico, da qual a abóbada sobre cruzeiro de ogivas é um dos cercam, palácio episcopal, claustro canônico, Hotel-Deus — constituem o cora ção
instrumentos técnicos prisilegiados. Graças a este, formado por duas nervuras, cuja interseção é reforçada por das cidades medievais. Financiadas pelos dons dos fiéis, mas particularmen te
uma chave de abóbada, as forças criadas pelo peso do abobadado concentram-se nos pilares laterais, escorados
no exterior pelos arcobotantes e seus contrafortes. As tribunas podem, assim, ser suprimidas, e os muros late - pelos rendimentos senhoriais e eclesiásticos dos bispos e dos monges — quer
rais, substituídos por imensos vitrais rutilantes de cores e saturados de iconografia. Sob as altas vidraçarias apa -
rece o trifório, série de arcaturas diante de vidraçarias menores e, mais abaixo, os arcos quebrados que dão sobre
dizer, pelo excedente produtivo de seus dependentes rurais —, esta é, com efei to,
as naves secundárias. Poderíamos considerar a arquitetut:a gótica urna audaciosa combinação de pilares de sus- a ocasião de canteiros de obras longos e consideráveis, e até mesmo nunca
tentação e de paredes em vidro (o que a catedral de Leão, com seus 1800 m 2 de vitrais, exprime claramente).
Não causará surpresa, então, que as vanguardas arquitetônicas cio inicio do século xx, começando por Bauhaus, terminados, que estimulam de modo notável a atividade urbana. A catedral e a
tenham podido reivindicar o gótico como uma das prefigurações de suas próprias buscas. cidade entretêm, assim, uma relação, ao mesmo tempo, intima e ambígua: visí vel
de muito longe, emblema da cidade e de sua interação crescente com os

A CIVILIZAÇÃO FEUDAL 205


ampos circundantes, a catedral parece, ao mesmo tempo, dominar a cidade,
quase esmagá-la com suas dimensões, o que talvez seja apenas uma maneira de
tornar sensível o poderio de uma instituição eclesial então triunfante.

Ordens religiosas inovadoras: os mendicantes

Entre os séculos xi e mil, não é apenas a igreja de pedra que muda, mas também
Igreja como instituição. A criação das ordens mendicantes é um dos aspectos
mais marcantes dessas transformações. Para começar, evocar-se-á a figura de são
Francisco, personagem ao mesmo tempo singular e revelador das tensões de seu
século. Para isso é preciso recorrer às diferentes Vidas redigidas por seus discípulos
conforme as regras do gênero hagiográfico, com a intenção de atestar a san tidade
de Francisco e de fortalecer o seu culto. Trata-se, então, menos de uma "verdade"
biográfica que deve ser procurada nos textos do que a expressão dos modelos e dos
valores ideais de uma época. Francisco nasceu em 1181 ou 1182, em Assis, uma
das cidades da Itália central em que o comércio floresce precocemente. Ele é o
filho de um rico mercador, do qual lhe incumbe continuar os negócios. Mas o
jovem Francisco põe-se em busca de ideais mais elevados, sinal de que o
desenvolvimento das atividades urbanas não significa, necessariamen te, a
formação de urna "burguesia" dotada de valores próprios bem assentados. 1
nteriorizando inconscientemente as hierarquias de seu tempo, ele sonha, de início,
com as proezas cavaleirescas e se prepara para partir para a guerra no Sul da Itália.
Mas uma visão sobrenatural o dissuade disso. Depois, enquanto ele ora na igreja de
San Damiano, diante da imagem de Cristo na cruz, este dirige-se a ele e o
convida a reconstruir a sua igreja. Como bom laico, que as realidades mate riais
ainda impedem de elevar-se até as verdades espirituais, Francisco acredita dever
tornar-se pedreiro para reconstruir o edifício que ameaça cair em ruínas. Mas,
evidentemente, é para uma missão mais alta que Cristo o chama. Francisco,
cuja conduta o põe em conflito com seus pais, pouco a pouco toma consciência
disso e renuncia à herança paterna. Em uni ato definitivo de conver são, ele se
19. São Francisco renunciando aos bens paternos, e. 1290-1304 (afrescos de Giotto na basílica de Assis). desnuda para restituir a seu pai os tecidas com os quais este faz comércio e põe-
Este é o episódio crucial da conversão: em uni ato teatral, Francisco se desnuda e abandona as vestimentas que se, nu, sob a proteção do bispo (figura 19, na p. 206). Em vez da comodidade
obtivera de seu pai para significar sua renúncia à herança familiar. O bispo o cobre pudicamente com o seu
manto, em um gesto carregado de um simbolismo de adoção, transposto aqui para o plano espiritual. Se a con- material que seu nascimento devia lhe proporcionar, ele abraça a exigência de
versão se apresenta como um jogo têxtil (das vestimentas do pai ao manto do bispo), ela é, sobretudo, uma ques - uma pobreza radical e escolhe "seguir nu o Cristo nu".
tão de parentesco: Francisco rompe com seus pais carnais para fazer prevalecer o parentesco espiritual que une
os membros da Igreja, enquanto seu gesto de prece aponta para a mão abençoadora do Pai divino. Um de seus Sua mensagem, que começa então a pregar pela palavra, e sobretudo pelo
biógrafos lhe atribui, de resto, estas palavras, ditas neste preciso momento: "Em toda a liberdade, daqui por exemplo, surpreende por sua simplicidade: viver com o Evangelho por única
diante, eu poderei dizer: Nosso pai que estás no céu! Pedro Bernadone não é mais meu pai". Quanto a Giotto,
ele dá ao sistema de parentesco medieval a forma de urna perfeita geometria (parentesco carnal, parentesco
espiritual, parentesco divino).
regra, fazer penitência. Francisco a põe em prática através de uma devoção que
associa o imediatismo e uma certa alegria, manifestação de uma comunhão com

A CIVILIZAÇÃO FEUDAL 207


Deus, que, entretanto, só lhe conceder o direito de pregar.
poderia ser atingida pelo rude Mas o desejo de enquadrar essa
caminho da penitência. Essas experiência e de lhe dar formas
características fizeram compatíveis com as estruturas
frequentemente comparar de poder em vigor na Igreja
Francisco e seus companheiros, conduz Honório 111 a exigir a
ao quais ele recomenda ter "o redação de uma regra formal: a
semblante sorridente", ao jogral, de 1221 é recusada (Regula
ofício por muito tempo non bullata), até que novas
condenado pela Igreja. Elas se modificações, atenuando ainda
exprimem também no famoso mais o radicalismo do projeto
Cântico do irmão Sol, em que inicial, permitam, finalmente,
Francisco faz o elogio da sua aprovação em 1223
natureza e do prazer que ela- (Regula bullata). À medida
proporciona ao homem. Aí está que a comunidade cresce,
uma das tensões constitutivas do Francisco afasta-se das
personagem: a conjunção da necessidades impostas pela
penitência e do júbilo, ou, mais direção espiritual e material de
precisamente, a escolha de urna uma ordem. Em breve, renuncia
penitência extrema que não a ser o seu chefe e escolhe
leva à fuga do mundo, mas ao viver corno eremita, no monte
amor a ele. Os habitantes de
La Verna. Penitências e
Assis, que veem Francisco
privações extremas acentuam-se,
andar hirsuto e em trapos,
em um esforço para aproximar-
perguntam se não há nele
se ainda mais de Deus, até o
alguma loucura e é um pouco
ponto em que Francisco,
isso que exprime o seu apelido
doente, parece não ser mais do
"Poverello".'9 Mas este exemplo
que uma ferida viva. É nesse
vivo de pobreza e de penitência
momento, em 1224, que a
lhe vale também um renome
tradição situa o milagre da
cada vez maior, que atrai para
estigmatização, cuja descrição
junto dele discípulos em
toma forma ao longo das suces-
número crescente.
sivas biografias de Francisco,
Logo, Francisco encontra-
como demonstrou Chiara
se à frente de uma pequena
Frugoni. Segundo a Legenda
comunidade, que a instituição
maior, que Boaventura,
eclesial poderia julgar perigosa
superior-gera] da ordem
e incontrolável, como indica a
franciscana, redige em 1263 e
primeira reação de Inocêncio
impõe como a única versão
111. Ela, no entanto, faz a
autorizada (a ponto de ordenar
escolha inversa e, em 1209, o
a destruição das narrativas
papa é convencido, embora com
anteriores, em particular as duas
reservas, a aprovar o modo de
Vidas, redigidas por Tomás de
vida proposto por Francisco e a
Celano), Francisco teria tido
208 jérôme Baschet
uma visão divina, sob a forma 20. A estigmatização de são Francisco:

híbrida de um serafim e de relicário esmaltado contendo relíquias do


Cristo na cruz, cujas cinco
santo, c. 1228 (Museu
chagas da Paixão teriam sido
do Louvre, Paris).
impressas em seu corpo, ainda No reverso deste relicário, lentes de cristal
visíveis quando de sua morte permitem ver as relíquias do santo,
recentemente canonizado- No
(figura 20, na p. 209). Tal mila- lado visível aqui, uma decoração em
gre, totalmente inédito e esmalte campeado (técnica altamente
apreciada para a decoração dos objetos
reconhecido pelo papado litúrgieos) mostra uma das primeiras
somente em 1237, provoca representações da estigmatização de
Francisco. A aparição é a de um serafim,
mais do que a de Cristo na cruz, mas os
19. Em italiano, pobrezinho, coitado. pés e as mãos portando as chagas da
(N. T) Paixão são bem visíveis. A impressão dos
estigmas não está materializada por raios
ligando o corpo do Cristo-serafim e aquele
do santo — como Giotto terá a ideia por
volta de 1290 —, mas Francisco, de
braços afastados e inclinado, como para
se oferecer aos efeitos da aparição, carrega,
no seu próprio corpo, as marcas do
sacrifício de Cristo.
vivas polêmicas. Muitos permanecer um dos seus, apesar
contemporâneos permanecem do sucesso de seu
incrédulos ou mesmo hostis a empreendimento, sempre
urna inovação quase opondo o dever da penitência
escandalosa, que põe Francisco às necessidades institucionais,
excessivamente alto a seus ele evita, entretanto, atacar
olhos, até o momento em que frontalmente a hierarquia: nesse
outros santos, a começar pela sentido, poderíamos defini-lo
dominicana Catarina de Siena, como um rebelde integrado. Ele
imitam seu exemplo e reduzem, é portador de urna mensagem
assim, o seu excessivo privilégio. que, de um lado, corresponde
É. que o alcance da estigmatização às aspirações de seu tempo (a
não deixa dúvidas a ninguém: para insistência sobre a Encarnação e
Boaventura e os franciscanos a Imitação de Cristo), mas cujo
que se constituíram em radicalismo evangélico é, em
promotores do milagre, ele parte, inassimilável pela Igreja.
transformava Francisco em um Era, então, lógico que a história
santo perfeito, quase angélico, e da Ordem Franciscana fosse
era a realização lógica de uma marcada, ao menos durante um
vida devotada à imitação de século, por violentos conflitos
Cristo. Recebendo as marcas entre uma corrente espiritual,
mais eminentes do sacrifício partidária de uma fidelidade
divino, Francisco identificava- rigorosa ao fundador, e os
se, em sua própria carne, com o conventuais, defensores de uma
Salvador. Ele se tornava um acomodação com as regras da
segundo Cristo, vivendo instituição eclesial. A
novamente entre os homens, interpretação da vida de
"um outro Cristo", segundo a Francisco, imposta por
expressão de Boaventura. Em Boaventura, é uma clara vitória
um prazo particularmente dos últimos, antes mesmo que a
breve, dois anos depois de sua disputa se concentre sobre a
morte, ocorrida em 1224, questão da pobreza, exigência
Francisco de Assis era absoluta para os espirituais, que
canonizado. argumentam que Cristo jamais
Durante a sua vida, havia possuído algo. No
Francisco não cessará de tomar entanto, no início do século xlv
as instituições e os costumes de foi-lhes necessário ou aceitar
seu tempo a contrapelo. uma maior moderação para se
Fundador de uma ordem, se manter na comunidade da
bem que ele continue um laico ordem, ou derivar para a heresia,
(um dos raros que a autoridade como fazem os "fraticelles". Ao
eclesial autorizou a pregar), final desse processo tumultuoso,
próximo dos pobres a ponto de a figura de Francisco terá sido,

210 jérôme Baschet


então, integrada à instituição
eclesial e, finalmente, posta a
seu serviço.
Evocar-se-á mais
brevemente Domingo de
Guzmán, nascido por volta de
1170 em Caleruega (Castela),
em urna família da pequena
aristocracia. Ele opta por urna
carreira eclesiástica tradicional e
torna-se cônego da catedral de
Osma. Acompanhando seu bispo
no Sul da França, ele descobre o
impacto do cataris- - mo e decide
consagrar-se à luta contra a
heresia. Ele começa a pregar na
região

21.O Triunfo da Igreja e dos dorninichnos,


1366-68 (afrescos de Andrea di Bonaiuto,
capela dos Espanhóis,
Santa Maria Novela, Florença).
Fazendo face à representação do Triunfo de São
Tomás (adequadamente localizado na sala
capitular de um con-
vento dominicano), esta vasta alegoria da
Igreja põe o acento sobre práticas que se
tornaram essenciais durante os últimos
séculos da Idade Média, especialmente a
pregação e a confissão. Embaixo, à
esquerda, um imponente edifício eclesial é
associado à hierarquia clerical, reunida em
torno do papa. À direita, os dominicanos
têm o papel principal: eles pregam e
combatem os heréticos, enquanto cães
devoradores lembram que sua missão está
inscrita em seu nome *mini canes. Acima,
quase no centro do afresco, um sacerdote
recebe a confissão de uni fiel ajoelhado
diante dele (o confessionário não existe
durante a Idade Média). A confissão está
no cruzamento dos caminhos: aqueles que
recorrem a ela são convidados por são
Domingo a avançarem para o paraíso. Tais
como almas puras vestidas com túnicas
imaculadas, eles são ali acolhidos por são
Pedro, símbolo da instituição eclesial e
guardião da porta do céu. Uma vez
transposto esse limiar, os eleitos gozam da
visão beatífica, quer dizer, da contemplação salvadores. Assim, o afresco sobrepõe
da essência divina, que aparece ern meio a notavelmente os três sentidos da palavra
uma corte de anjos. Tal é a recompensa "igreja": o edifício, a instituição clerical e a
suprema, à qual os cristãos chegam comunidade dos fiéis, chamada a se reunir
seguindo os ensinamentos da Igreja e na glória celeste.
recebendo, graças a ela, os sacramentos
de Fanjeaux, logo acompanhado destinados à formação de seus
por alguns discípulos que levam membros, enquanto os primeiros
uma vida evangélica, depois franciscanos procuram formas
funda um primeiro convento em mais simples e mais imediatas
Toulouse. Em 1217 o papa apro- de contato com Deus. Entre-
va a nova ordem, posta sob a tanto, a despeito dessas
regra de santo Agostinho. diferenças iniciais, a evolução
Domingo vê na pregação, das duas ordens as aproxima, e
apoiada pelo estudo e pela muito em breve estarão, ao
penitência, uma arma mesmo tempo, unidas por
indispensável contra os inimigos objetivos e práticas bastante
da Igreja. Os novos conventos semelhantes e opostas por uma
daqueles que são chamados, intensa rivalidade.
justamente, de frades O sucesso das duas ordens
pregadores multiplicam-se que são chamadas de
rapidamente, e Domingo morre mendicantes, pois elas querem,
à frente de uma ordem poderosa, em seus inícios, nada possuir e
era 1221 (sua canonização viver apenas de dons de
ocorre em 1234). O percurso do caridade, estende-se logo a toda
fundador castelhano não se a cristandade. Os frades
parece nada com o do santo de pregadores, caracterizados pela
Assis: ele é, logo de início, sua vestimenta branca
estreitamente ligado à recoberta por um manto negro,
instituição eclesiástica e, em são cerca de 7 mil por volta de
particular, à luta contra a 1250 e dispõem de setecentos
heresia. De resto, os conventos no fim do século min
dominicanos tornar-se-ão enquanto os franciscanos
especialistas nas tarefas (também chamados frades
inquisitoriais e assumirão com menores, em razão de sua
orgulho essa função, humildade), vestidos com um
considerando-se os "cães do hábito de lã crua ou bege (nem
Senhor" (domini cones, de pintado, nem embranquecido) e
acordo com um jogo de palavras reconhecidos, como Francisco,
que o seu nome permite em pela simples corda com um nó
latim; figura 21, na p. 211). Os atada à sua cintura, são talvez
dominicanos também orientam 2.500 por volta de 1250 e se
imediatamente suas atividades repartem em cerca de 1.600
para o estudo e o esforço estabelecimentos meio século
intelectual indispensável para mais tarde. Outras ordens
argumentar ao serviço da Igreja. mendicantes de menor
Eles multiplicam, então, os studia importância também surgem,
mas o Concílio de Lyon a deixam de denunciar como uma
(1274? limita seu número a ficção hipócrita.
quatro: além dos franciscanos e A contribuição das ordens
dos dominicanos, trata-se dos mendicantes tem a ver ainda
carmelitas, ordem fundada em mais com uma concepção
1247, e dos eremitas de santo original do papel do clero
Agostinho, ordem criada em regular. Mesmo aceitando uma
1256. Cada ordem, sob direção regra de vida comunitária e
de um superior-geral e de ascética, os mendicantes não
responsáveis provinciais, é optam por uma fuga do
dotada de urna coesão muito mundo. Mesmo quando se
mais forte que as redes referem idealmente ao exemplo
monásticas anteriores. Cada dos eremitas do deserto (Alain
uma delas conta, além de seu I3oureau), assumem, na prática,
ramo masculino, com um com- viver em meio aos fiéis para
ponente feminino — corno a pregar pela palavra e pelo
Ordem das Clarissas, fundada exemplo (na verdade, essa
por santa Clara de Assis, vocação pastoral caracteriza
associada aos franciscanos — e somente os ramos masculinos
uma ordem terceira, na qual são das ordens; as mulheres
acolhidos os laicos que desejam permanecem confinadas em
viver devotadamente. O ideal uma clausura tradicional, o que,
de pobreza, associado à sem dúvida, favorece o
humildade e à penitência, é a desabrochar, particularmente
característica primeira das entre as dominicanas, de uma
ordens mendicantes. Mas, como intensa devoção mística, que
todas as outras aventuras vem compensar a sua exclusão
monásticas anteriores, esbarra das tarefas assumidas pelos
no paradoxo do sucesso, que frades). O século xii já havia
leva à multiplicação dos dons e visto certa aproximação entre
à acumulação dos bens. Se as regulares e seculares, mas os
ordens tradicionais impunham mendicantes dão o passo
que cada monge não possuísse suplementar instalando-se no
nada a título individual, mas coração das cidades (estes
aceitavam as doações feitas à estranhos regulares, urbanos e
instituição, as ordens mendican- pregadores, são, de resto,
tes, preocupadas em dar sentido chamados de frades, não de
ao ideal de pobreza, recusam monges). As ordens
essa opção. Mas, logo, precisam mendicantes aportam, assim,
forjar a teoria segundo a qual os uma contribuição decisiva à
bens recebidos por elas são pro- Igreja de seu tempo, assumindo
priedades do papa e que a ordem um enquadramento e uma
tem apenas o seu uso, o que os atividade pastoral adaptados aos
franciscanos espirituais não meios urbanos. Agindo assim,
intervêm em um terreno que é,
normalmente, do clero secular, e (Jacques Le Goff). Em todas as
os conflitos entre mendicantes e cidades da Europa, sua
seculares não faltam, por implantação se faz segundo uma
exemplo, no seio da mesma lógica: tendo necessi-
Universidade de Paris e, mais dade de um amplo terreno, os
amplamente, nas cidades, onde conventos mendicantes se
os bispos veern com estabelecem nos limites da
desconfiança esses pregadores zona construída e,
extremamente bem preparados, considerando a concorrência
cujos sermões têm mais sucesso existente entre eles, o mais
que aqueles dos seculares e que longe possível uns dos outros,
captam para suas vastas igrejas segundo uma geometria
os dons dos fiéis. O laço entre bastante regular. Se uma cidade
ordens mendicantes e fenômeno abriga dois conventos
urbano é, de resto, tão claro que mendicantes, o meio da linha
se pôde estabelecer urna que os liga é ocupado pelos
correlação entre a importância edifícios principais da cidade; se
das cidades medievais e o eles são três, o centro urbano
número de conventos ocupa aproximadamente o ponto
mendicantes que elas abrigam central do triângulo formado
por eles.
A Igreja, a cidade e a educacional em vigor desde a
universidade Alta Idade Média. Enquanto as
escolas monásticas declinam,
Seria imprudente, como já se as escolas de catedrais, ainda
disse, pensar a cidade medieval sob a responsabilidade dos
sem a Igreja: a catedral gótica é bispos, conhecem rápido cres-
o sinal bastante visível da cimento. Anteriormente dotadas
presença da instituição eclesial; de um recrutamento
as ordens mendicantes são os estritamente local e oferecendo
agentes de uma atividade uma formação elementar aos
pastoral com destinação futuros clérigos da diocese,
essencialmente urbana; a algumas dentre elas começam a
"religião cívica" oferece à exercer grande atração em
cidade seus principais rituais e decorrência da reputação de
seus mais preciosos símbolos. seus mestres. O número de
Mas esta evocação seria estudantes aumenta e a ambição
excessivamente incompleta se não dos ensinamentos cresce, tanto
se mencionasse o em direito e medicina como
desenvolvimento das escolas também em teologia, termo cujo
urbanas e das universidades, uma uso Abelardo é um dos
das mais notáveis criações da primeiros a promover. Mestres
Idade Média. Ao longo do e alunos, pouco a pouco,
século xu, importantes tomam consciência de que
evoluções conturbam o quadro formam um meio específico,
cuja atividade intelectual intelectual de Paris,
constitui a tarefa característica. incontestada durante certo
Mesmo se esta permanece tempo, enfrenta a
intimamente ligada à. Igreja, é concorrência de Oxford que,
sem dúvida essa emergência dos orientada de início para o
"intelectuais" medievais, direito, impõe sua competência
segundo a expressão de Jacques em matéria de teologia a partir
Le Goff, que permite dos anos 1220. Os estatutos de
compreender a formação das que se dotam então essas
universidades. Estas universidades consagram suas
correspondem a um desejo de
auto-organização da
comunidade de mestres e
estudantes, do mesmo modo que
todo outro ofício urbano, e a
uma vontade de autonomia em
relação ao bispo, que mantinha
até então seu controle sobre as
escolas e reafirmava seu direito
exclusivo de conferir a
licenciatura (autorização para
ensinar).
Bolonha, que domina o
ensino do direito civil e
canônico na cristandade, é, sem
dúvida, a primeira universidade,
formada desde o fim do século
xli, mas seus mais antigos
estatutos conservados, que a
definem como a comunidade
apenas dos estudantes, datam
somente de 1252. A
"universidade de mestres e
escolares de Paris" é um
agrupamento voluntário
formado nos primeiros anos do
século xiii, ao qual o legado do
papa confere seus estatutos e
privilégios em 1215. Em
seguida, eles são solenemente
confirmados por Gregório ix ,

após uma greve dos mestres,


provocada pelos afrontamentos
entre estudantes e guardas
reais. Depois, a proeminência
características essenciais: o graus conferidos (bacharelado,
ensino não é mais submetido à licenciatura, mestrado ou
autoridade do bispo e diz respeito doutorado). Mas o exercício da
unicamente à corporação de autonomia não se dá sem
mestres, os quais definem suas conflitos. Assim, o lugar prepon-
normas. A partir dali, a derante que os frades
universidade é "um corpo mendicantes começam a ocupar
profissional incorporado na nas universidades a partir dos
Igreja a titulo de instituição anos 1230 suscita a hostilidade
autônoma que, subtraída da dos mestres seculares, que se
jurisdição dos bispos e dos queixam notadamente da
senhores, é submetida unicamente concorrência desleal daqueles
ao poder pontifício e a seu que, pelo fato de pertencerem a
controle doutrinal" (Franco urna ordem, podem ensinar
Alessio). Entre as primeiras gratuitamente. Mas a posição
universidades europeias, dotadas dos mestres mendicantes, que
de estatutos no primeiro quartel logo monopolizam as cátedras de
do século Km, é preciso citar teologia mais renomadas, é siste-
ainda Cambridge para a teologia, maticamente confirmada pelo
Montpellier para a medicina, papado, especialmente por
Salamanca, Nápoles, l'ídua e, Alexandre IV em 1225. É bem
apenas pouco mais tarde, o sinal de que as ordens
Toulouse (1234). Passada esta mendicantes exercem papel
data, as numerosas universidades central na instituição eclesial de
criadas têm, em geral, apenas seu tempo. Por decorrência, só
uma importância limitada e um pode ser dominante seu lugar no
recrutamento regional. seio das universidades, cuja
Em cada universidade, a função principal é fornecer à
autonomia permite à assembleia Igreja seus fundamentos
dos mestres, sob a condução de ideológicos mais firmes, ao
seu reitor, decidir sobre sua mesmo tempo que a parte mais
organização interna (distingue- instruída de seus prelados
se, em geral, a faculdade de artes, (muitos dos quais entram para o
propedêutica em que são serviço das administrações
ensinadas as artes liberais do principescas ou reais).
trivium — retórica, gramática e O exercício de autonomia é
combinado com a relativa
dialética — e do quadrivium —
homogeneidade dos ensinamentos
aritmét ica, geometria, astronomia
e das formas de organização, o
e música — e as "grandes"
que manifesta a universalidade do
faculdades, de teologia, direito ou
poder pontifício, do qual
medicina), bem como sobre o
dependem as universidades. A
recrutamento de alunos e a
escolástica é seu método por
cooptação de professores, sobre os
excelência. Suas raízes remontam
programas e autores ensinados,
ao século xll: Anselmo de
sobre os métodos utilir,ados e os
Canterbury (1033-1109) esforça-se, intellectunn e convencer tanto por
notadamente em seu Por que Deus raciocínios demonstrativos como
se fez homem, para associar a fé e pelo recurso aos argumentos de
o intelecto Cfides quaerens autoridade (as
Escrituras e os Padres da autoridades contrárias; tese do
Igreja); Abelardo (1079-1142) autor; resposta às abjeções).
desenvolve, especialmente em A conjunção de um vasto
seu Sic et non, os princípios da conjunto de quaestiones, que
argumentação dialética e os formam um tratamento
métodos visando resolver as completo do respectivo campo,
contradições entre as
leva às grandes Sumas
diferentes autoridades bíblicas
teológicas que marcam o
e patrísticas. Mas a escolástica
apogeu da escolástica
das universidades do século xixi
universitária do século mu. Os
amplifica e aperfeiçoa os
franciscanos Alexandre de Halès
métodos de raciocínio e de
(a Suma que leva seu nome,
argumentação, codificados
segundo regras admitidas pela terminada por seus alunos, é a
comunidade de mestres. A primeira do gênero) e
leitura comentada dos textos Boaventura (1221-74), os
bíblicos e de obras servindo de dominicanos Alberto, o Grande
manuais, como o Livro das (1193-1280) e Tomás de
Aquino (1225-74), ilustram-se
sentenças de Pedro Lombardo,
particularmente neste gênero
mestre e bispo de Paris entre
1135 e 1160, continua sendo a totalizador, cujas ambições são
base do trabalho escolástico. nada menos que sintetizar e
Trata-se de estabelecer seu esclarecer, pela força do
sentido autêntico, por um raciocínio, o conjunto dos
exame metódico tão impessoal problemas relativos a Deus, ao
quanto possível. A quaestio homem, ao universo e à
organização da sociedade. Além
(alternativa do tipo será isto...
da teologia, os métodos escolás-
ou então. ..?) é a outra forma
ticos clo mundo universitário
dominante da atividade
estendem-se ao estudo do
intelectual: ela pode dar lugar a
direito e a certas disciplinas
um debate oral (disputatio)
baseadas, em parte, na
sobre um tema determinado pelo
demonstração e na verificação, e
mestre (a menos que se trate de
cujos nomes aparentam-se aos
questões "quadlíbetas", 2 ° as
mais imprevisíveis), ou então das ciências modernas
ser objeto de uma redação (sobretudo a matemática, o
escrita, segundo uma estudo da natureza e a
organização quadripartida astronomia). Estas florescem
constante (autoridades a favor sobretudo em Oxford, onde se
da primeira solução; objeções e ilustra Roberto Grosseteste
(1175-1253). Apesar dos
afrontamentos que a dividem, aos clérigos, ao passo que os
particularmente quanto à laicos têm acesso somente à
recepção das obras de primeira). Convém, então,
Aristóteles e de seus comenta- relembrar aos laicos, tornados
dores árabes (eles levam à talvez hesitantes pela
condenação, em 1277, por sacralidade esmagadora do
Estevão Tempier, bispo de Paris, rito, a necessidade de comungar
de 219 teses atribuídas aos regularmente. É por isso que, na
averroístas parisienses e, em sequência de várias assembleias
certos casos, a Tomás de diocesanas, mas dessa vez por
Aquino), a escolástica do século intenção de toda a cristandade,
mu aparece como um o Concílio de Latrão iv (1215)
monumento coletivamente torna obrigatório a todos os
erigido à glória da Igreja fiéis receber a comunhão ao
triunfante e como a expressão menos uma vez por ano, na
mais acabada da ideologia Páscoa (cânone Omnis
consubstancia! à ordem da utriusque sexos). Exigência
sociedade cristã. mínima, que diz muito sobre
os limites da participação
20. Do latim quolibet, "não importa sacramental dos laicas
para onde"; proposição sustentada
aleatoriamente, ao bel-prazer do autor ordinários, essa regra enseja
ou orador. (N. T.) uma consequência
considerável, pois ninguém
Pregação, confissão,
poderia, sob pena de graves
comunhão: unta nova tríade riscos espirituais, receber a
eucaristia sem estar
A partir do fim do século XII, previamente purificado de seus
uma insistência nova sobre pecados. A obrigação da
certas práticas reformuladas comunhão anual impõe, então,
leva a uma configuração o dever de uma confissão
inédita, cujo centro é ocupado igualmente anual.
pelo tríptico pregação- Na Antiguidade tardia e
confissão-comunhão. Como se nos primeiros séculos da Alta
disse, profundas Idade Média, a Igreja havia
transformações afetaram a admitido a possibilidade de
comunhão, sacramento uma penitência que permitia
"terrível", ato capital que purificar-se dos pecados
assegura, ao mesmo tempo, a cometidos após o batismo.
coesão da comunidade cristã e Tratava-se, então, de um ritual
sua divisão hierárquica entre público que só podia ser
os clérigos e os laicos (assim, realizado uma única vez e era,
no decorrer do século xii, a por consequência, em geral
comunhão sob as duas santas retardado até a aproximação da
espécies, o pão e o vinho, é morte. Depois, a partir do
progressivamente reservada século vil, os monges irlan-
deses introduzem em toda a diversas ou peregrinações
cristandade o sistema de (figura 50, na p. 498). No século
penitência tardada?' em vigor mi, o formalismo rígido de tal
até o século xu. Renovável, ela sistema devia parecer cada vez
dava lugar a um ritual de mais inadaptado, ao passo que
reconciliação pública, com os mestres em teologia, corno
frequência realizado no portal Abelardo, definiam o pecado
norte das igrejas, que os como uma propensão interior e
penitentes deviam atravessar sublinhavam a necessidade de
arrastando-se sobre os joelhos e avaliar os atos humanos levan-
os cotovelos, depois de terem do em conta sua intenção. De
cumprido escrupulosamente as fato, uma prática penitencial
indicações do Livro de renovada surge
penitências, que fixa para cada
falta o nível das penitências 21. Na qual a cada falta corresponde
requeridas, sob forma de uma penitência precisa, como uma
preces, jejuns, mortificações espécie de "taxação" dos pecados. (N.
T.)
Mas, eficaz para quê? A Romans, um outro dominicano
pregação visa, evidentemente, morto em 1277, pôde afirmar:
"fazer crer", quer dizer, inculcar "Semeia-se pela pregação, colhe-
os rudimentos doutrinais e as se pela confissão". A pregação é
normas elementares da moral justamente uma incitação à con-
definida pela Igreja. Nesse fissão; e a tríade pregação-
sentido, é um instrumento confissão-comunhão forma, a
decisivo de aprofundamento da partir do século ui, um conjunto
"aculturação cristã" nos últimos fortemente articulado, no
séculos da Idade Média (Hervé coração das práticas novas da
Martin). Mas o desenvolvimento cristandade.
da pregação é também ligado ao
da confissão: não somente os
sermões vangloriam os méritos Ritualismo e devoção: uma
da confissão (uma só lágrima de mudança de equilíbrio?
contrição tem "a virtude de
apagar todo o fogo do inferno", De tudo isso, decorrem
explica o dominicano Giordano notáveis mudanças de
de Pisa, nos primeiros anos do tonalidade no seio da cristanda-
século xiv), mas, sobretudo, pela de. Não se trata, entretanto, de
evocação das faltas cometidas e rupturas radicais, mas antes de
da salvação que se arrisca inflexões de equilíbrio no seio
perder, eles visam criar um das tensões constitutivas do
choque salutar, propício a pôr os sistema eclesial. Nós nos conten-
fiéis no caminho da confissão. É taremos, aqui, com um exemplo
por isso que Humberto de (veja também a segunda parte,
capítulo iv). Durante a Alta O deslocamento da ênfase
Idade Média, e até o século xii, está vinculado, aqui, a urna
as práticas cristãs parecem evolução dos critérios e dos
caracterizadas por uni ritualismo modelos da santidade. A
generalizado, de que o clamor importância relativa dos
monástico e a humilhação dos milagres, que fazem dos
santos são bastante santos heróis dotados de
ilustrativos. Evocando um poderes excepcionais, tende a
Deus distante com traços diminuir em proveito da
veterotestamentários, o apresentação de
cristianismo parece quase se comportamentos morais que
resumir à prática dos devem servir de exemplo aos
sacramentos essenciais, às fiéis (André Vauchez). É
múltiplas liturgias que ordenam verdade que existem exceções
a vida dos clérigos e ao culto retumbantes, como a
dos santos, que é, antes de estigmatização de Francisco,
tudo, o culto das relíquias. mas, no conjunto, os textos
Seria, é verdade, absurdo hagiográficos dão menos
negar que o culto dos santos lugar aos milagres realizados
conserva um papel central até em vida e há muitos santos
o fím da Idade Média e mesmo recentes cujo poder
bem depois. De resto, é o sobrenatural só se revela após
dominicano genovês Jacopo de a morte, pelas curas realizadas
Varazze (1230-98) que compila em suas tumbas. Durante
um dos best-sellers medievais suas vidas, eles não são
destinado a um durável sucesso, super-homens, mas somente
a Legenda áurea, que é para a cristãos exemplares,
hagiografia o que as Sumas são devotando-se à penitência e
para a teologia. Mais ou menos esforçando-se pela perfeição
no mesmo momento, o rei são moral. Quanto aos simples
Luís desespera-se por causa da fiéis, se a prática dos
perda do Santo Cravo e acolhe sacramentos e a intercessão
como penitente, pés nus e dos clérigos continuam
vestido com uma simples sendo os meios
túnica, uma relíquia, bastante indispensáveis de acesso à
excepcional na verdade, a coroa salvação, o desenvolvimento
de espinhos, para cuja aquisição da confissão e do exame de
ele consagrou muitos esforços e consciência os obriga a
dinheiro e para a qual fez escrutar seus atos e, mais
construir, como um imenso ainda, suas intenções. A
relicário no centro de seu preocupação moral e a
palácio, a Sainte-Chapelle. casuística dos pecados —
sempre articulados à
necessidade sacramental da
confissão — ganham então um sistema eclesial dominado
importância inédita. Decorre pelo clero. No mais,
disso um desenvolvimento do repitamo-lo, trata-se apenas
que se pode chamar a devoção de um deslocamento de
pessoal: a prece e a meditação ênfase: o ritualismo
piedosa, antes reservadas aos absolutamente não
clérigos, são doravante desaparece; os sacramentos
acessíveis a uma elite laica, permanecem sendo a base da
para a qual é copiado um organização social, e uma
número crescente de obras de narrativa alegórica do início do
devoção em língua vernácula, século xn,T, A via do inferno e
especialmente os livros de do paraíso, ainda sugere que,
horas, que permitem a para se salvar, é suficiente
recitação cotidiana das horas recitar cotidianamente a Ave-
monásticas. Maria.
Por vezes, evoca-se, a
propósito desses fenômenos,
uma "promoção dos laicos" no
seio da Igreja. Mas trata-se
antes da adoção pelos laicos de
práticas religiosas
anteriormente reservadas aos
clérigos. A consequência disso
é a sua submissão ainda mais
estrita aos valores e às
normas elaboradas pela
Igreja, sobretudo porque os
clérigos não renunciaram
então a nenhum de seus
privilégios essenciais em
matéria de intercessão
sacramental e a dominação
ideológica da instituição
eclesial parece mais absoluta
220 jérôme Baschet A CIVILIZAÇÃO Ff LDAL 221
do que nunca. Se há
"promoção dos laicos", esta
expressão só pode significar
uma maior difusão, no corpo
social, das normas clericais,
urna melhor interiorização
destas pelos laicos, que os con-
duz a participar mais
ativamente da reprodução de

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