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RESUMO ABSTRACT
The WHO biopsychosocial model of functionality admits a
O modelo biopsicossocial de funcionalidade da OMS admite
complex interaction between its components. Any diagram is
complexa interação completa multidirecionalidade entre seus
incomplete and doomed to misinterpretation due to the
componentes. Admitidamente, qualquer diagrama estará
complexity of multidimensional interactions. The pluralist
incompleto e fadado a interpretações incorretas devido à
approach suggests that the organ or system with deficiency is
complexidade de interações multidimensionais. A abordagem
not the main determinant of a person's disability. This is the
pluralista sugere que o órgão ou sistema com deficiência não é
result of an interaction between biological and non-biological
sozinho o determinante das incapacidades de uma pessoa.
factors. However, a universal model can lose its meaning
Essas seriam resultado de uma interação entre fatores
when we recognize that the process of disability is historically
biológicos e fatores extra-biológicos. No entanto, um modelo
and spatially determined. The subjectivity of this experience is
universal multidimensional pode perder sentido quando
an independent dimension from body functioning and makes it
reconhecemos que os processos de incapacidade são histórica
difficult to understand the incapacitated person. A single
e espacialmente determinados. A subjetividade dessa
starting point could provide a real universal knowledge about
experiência é uma dimensão independente do estado das
functioning. A linear model that starts by studying the
funções e estruturas do corpo e impossibilita entender o
interactions between environmental and personal factors
incapacitado enquanto pessoa. O conhecimento de um ponto
seems to be the best way to diagnose the situation extensively.
de partida único poderia propiciar a real universalidade no
Thus, we suggest a biopsychosocial model linear and the
conhecimento do estado de funcionalidade de cada indivíduo.
following steps: environmental factors > personal factors >
Um modelo linear, que comece pelo estudo das interações
participation > activity > functions / structures >
entre fatores ambientais e pessoais parece ser o melhor meio
disorder/disease.
para diagnosticar amplamente a situação. Dessa forma,
sugere-se um modelo biopsicossocial linear, dividido nas
Keywords: Classification. Functioning. Health.
seguintes etapas, nesta ordem: fatores ambientais > fatores
pessoais > participação > atividade > funções/estruturas >
transtorno/doença.
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Doutor em Saúde Pública pela Universidade de São Paulo - USP
multidirecionalidade abre caminhos que podem incapacidade e as áreas, profissões e objetivos não
levar a conclusões incorretas[6]. fazem.
Além disso, muitas barreiras têm sido A discussão atual, então, nos leva a crer que
encontradas no uso do modelo biopsicossocial uma abordagem biopsicossocial em saúde funcional
proposto com a CIF, já que qualquer diagrama é necessária e que a CIF, mesmo com as
estará incompleto e fadado a interpretações dificuldades que se impõem, pode contribuir para
incorretas devido à complexidade de interações isso. A abordagem plural é dificultada pela própria
num modelo multidirecional e multidimensional. amplitude que a CIF admite quando aceita uma
Em suma, a abordagem pluralista sugere que o multidirecionalidade entre as dimensões da
órgão ou sistema com alteração funcional não é funcionalidade humana. Revela-se, portanto, que é
sozinho o determinante das incapacidades de uma preciso avançar na construção de um “novo
pessoa. Essas seriam resultado de uma interação modelo” que permita o estabelecimento da
entre fatores biológicos e fatores extra-biológicos, abordagem biopsicossocial e da geração de dados
tais como, fatores ambientais e pessoais. sobre funcionalidade em saúde funcional, com
Tal amplitude da CIF também têm sido uma possibilidade de nortear práticas e condutas que
barreira para seu uso. Uma das saídas encontradas atendam às novas e às antigas demandas dessa área.
por alguns autores foi a criação de resumos
conhecidos como “core sets”. Os “core sets” foram Detalhando a CIF
desenvolvidos com um método que inclui, entre
outras etapas, um processo de consenso baseado na
técnica “Delphi”[9]. É um projeto multicêntrico e A CIF é um dicionário de funcionalidade
internacional no qual são desenvolvidas e validadas humana que contém itens relacionados às partes do
essas ferramentas. O uso dos “core sets” tem corpo e seu funcionamento, itens sobre as
facilitado a adoção da CIF, mesmo que em partes[8]. atividades humanas, incluindo a participação social
No entanto, esses instrumentos têm sofrido críticas, e itens que influenciam nessas atividades,
em especial por serem listas baseadas em denominados ‘fatores ambientais’.
doenças[10], tornando o uso da classificação Didaticamente, ela contém duas partes:
limitado, já que a situação na qual a doença é funcionalidade e contexto. A funcionalidade está
resultado de alterações na funcionalidade não pode dividida em três componentes: Funções do Corpo,
ser apresentada por esse modelo. Já as listas Estruturas do Corpo e Atividade e Participação. O
baseadas em áreas, profissões, especialidades e contexto em dois: Fatores Ambientais e Fatores
objetivos são menos criticadas[11]. Pessoais. Todos esses componentes podem ser
Uma das críticas feitas ao modelo dos “core codificados, exceto os fatores pessoais (sexo, etnia,
sets” para uso em doenças específicas, como idade, cultura, entre outros) que, no entanto, são
aqueles que são estruturados para classificar a considerados influenciadores do desempenho das
situação de indivíduos com determinada condição atividades e da participação social e devem ser
(exemplo: “core set” da CIF para uso em pacientes lembrados, como defende a própria classificação [13].
com Fibromialgia), é que impõem categorias pré- O modelo biopsicossocial (multidimensonal
definidas da CIF, relacionadas a alterações causadas e multidirecional) de funcionalidade e incapacidade
pela doença. Assim, o modelo de funcionalidade da OMS foi publicado juntamente com a CIF
passa a ser linear, com condições resultantes da (Figura 1). Ele rejeita a existência exclusiva de uma
doença, sem que as variações pessoais, culturais e situação de linearidade que indicaria a restrição da
ambientais sejam consideradas[10]. Essa linearidade participação como conseqüência da incapacidade, a
estaria contrapondo a multidirecionalidade do incapacidade como exclusiva conseqüência da
modelo de funcionalidade e incapacidade proposto deficiência e a deficiência como exclusiva
na CIF[12]. Nesse sentido, um “core set” genérico conseqüência da doença.
(como o exemplo de projeto disponível na página A multidirecionalidade permite, por
eletrônica http://www.icf-research-branch.org/icf- exemplo, que se entenda que a doença seja
core-sets-projects/diverse-situations.html), ou por resultado de alterações da funcionalidade e não a
área, por profissão ou por objetivo (como ajudar na causadora dessas alterações. Permite ainda o
definição sobre a concessão de benefícios), parece entendimento da situação diferenciada de
ser mais adequado, já que a condição de saúde faz incapacidade em pessoas com a mesma doença, já
parte desse modelo de funcionalidade e que são influenciadas por contextos diferentes.
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CIF: linearidade no modelo biopsicossocial
O papel do contexto é fundamental no seguinte, deu início a uma revisão do modelo, com
desempenho das atividades e participação social das o intuito de considerar a influência contextual no
pessoas, sendo esse, muitas vezes, o objeto de desempenho humano.
intervenção para melhoria do estado de A ideia do novo modelo, apresentado na
funcionalidade ou para a prevenção da figura 1, é articular as possibilidades e compreender
incapacidade. as conexões existentes. Sem dúvida, o foco da
O modelo também apresenta diferentes análise da funcionalidade e incapacidade é a
dimensões: multidimensionalidade do fenômeno, sem
- A dimensão biológica, representada pelo permissão para uma única rede de direcionamento
componente de FUNÇÕES E ESTRUTURAS DO possível entre as dimensões da CIF e com
CORPO; realidades produzidas por situações
- A dimensão patológica, representada pelo individualizadas e autônomas[10].
componente CONDIÇÃO DE SAÚDE Entretanto, é importante ressaltar que a
(TRANSTORNO OU DOENÇA); execução do modelo de funcionalidade e
- A dimensão do contexto no qual o indivíduo vive, incapacidade da OMS na prática profissional em
representada pelos componentes FATORES saúde funcional implica na codificação pela CID e
AMBIENTAIS e FATORES PESSOAIS; pela CIF. O modelo é um guia de como se pensar
- A dimensão da capacidade e do desempenho, sobre a funcionalidade humana, dentro de um
representada pelos componentes ATIVIDADES e panorama de múltiplas possibilidades.
PARTICIPAÇÃO. Paralelamente, as classificações oferecem uma
Duas classificações de referência da Família linguagem-padrão e também servem para
de Classificações da OMS estão contempladas neste padronização da nomenclatura sobre doenças (CID)
modelo. Além da CIF, a Classificação Estatística e da nomenclatura sobre funcionalidade (CIF).
Internacional de Doenças e Problemas Relacionados Formas de facilitar o uso da CIF sem
à Saúde (CID) também se faz presente na distanciamento do modelo de funcionalidade e
representação do componente CONDIÇÃO DE incapacidade têm sido discutidas. Uma delas é uma
SAÚDE (TRANSTORNO OU DOENÇA). Já o alternativa de “core set”, como a criação de listas
componente de FATORES PESSOAIS não está resumidas baseadas em áreas de atuação [11], como
contemplado em nenhuma das classificações da por exemplo, para uso em saúde do trabalhador.
OMS. Como em saúde funcional, o uso da CID é Segundo os trabalhos publicados desde o
preponderante, fica impossível aplicar essa forma lançamento da classificação pela OMS, o modelo
de pensamento. multidirecional deve ser absorvido para que a CIF
O modelo é diferente da primeira abordagem seja efetivamente utilizada[14].
linear apresentada na década de 1980, quando a O mais importante na prática clínica é
OMS elaborou, para ser usada em pesquisa, uma considerar a funcionalidade como o ponto central
classificação para as conseqüências das condições para avaliação e determinação de condutas[15]. Com
de saúde, a Classificação Internacional de a utilização da CIF, poderão ser identificadas
Deficiências, Incapacidades e Desvantagens. Tal condições além das relacionadas à saúde, como as
classificação tinha como referencial teórico a do meio ambiente, os recursos a que as pessoas têm
incapacidade em três dimensões, estruturadas como acesso, de forma a permitir uma visão mais ampla
conseqüência de uma doença (ou lesão) numa das circunstâncias que favorecem ou dificultam a
seqüência linear. Assim, as conseqüências das resolução dos quadros apresentados. As ações de
doenças se manifestavam como danos no nível controle devem contemplar os grupos populacionais
corporal, traduzidos como deficiências. Por sua vez, priorizando os mais vulneráveis, como aqueles em
a incapacidade era definida como a falta de situação de precariedade, sob alguma forma de
habilidade pessoal para realizar tarefas básicas, discriminação, inseridos em atividades de maior
causada pela deficiência. Já a desvantagem risco para a saúde, entre outros, na perspectiva de
experimentada ao desempenhar um papel social era superar desigualdades. Grupos vulneráveis, tanto
o resultado final da sequência lógica de eventos. em relação à saúde quanto em relação às condições
Dentre os questionamentos a este modelo, de trabalho ou da participação social como um todo,
estava a progressão fixa de uma sequência de poderão ser definidos a partir da análise da situação
eventos baseadas em acometimentos biológicos e de saúde local e das condições de funcionalidade de
clínicos. A partir de então, a OMS, na década cada indivíduo.
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CIF: linearidade no modelo biopsicossocial
Figura 5. Desempenho e Capacidade segundo a interpretação Figura 6. Ponto do modelo extinto nos “core sets” por
dos conceitos da CIF. condição de saúde.
É necessário que se estabeleça a abordagem sets” por área poderiam resolver melhor a questão,
biopsicossocial na saúde do trabalhador, nos seus o que já está em andamento e pode ser visualizado
diversos aspectos, incluindo a avaliação e em www.cihiconferences.ca/icfconference/20.pdf.
classificação dos casos. Estudos publicados A divulgação da classificação e o ensino do
apontam a CIF como uma ferramenta adequada para modelo de funcionalidade proposto pela OMS
coletar dados sobre funcionalidade humana[17]. configurariam, então, o primeiro passo para que a
Mostram também que uma das buscas é facilitar seu CIF se tornasse uma ferramenta estatística para
uso, de forma a torná-la operacional[18]. Ainda que o geração de informações sobre funcionalidade e
ideal seja usá-la integralmente, em uma equipe incapacidade.
multidisciplinar, isso nem sempre é possível. A Por outro lado, considerando que o uso da
literatura aponta formas de uso da CIF por meio de CIF na integralidade não é exequível, no lugar de
listas simplificadas[8]. encontrarmos formas de adequar o uso ao modelo
O uso dessas listas, por sua vez, conflita conceitual, propomos alterar o modelo conceitual
com a multidirecionalidade do modelo para facilitar o uso. Uma abordagem biopsicossocial
biopsicossocial proposto com a própria CIF[10]. A considera que todas as doenças têm origens
situação que se mostra dificulta, portanto, o uso da simultaneamente biológicas, psicológicas e sociais,
CIF e também a implementação de uma abordagem sendo necessária uma atuação multiprofissional
biopsicossocial na Saúde do Trabalhador. para efetivamente combater a doença, dando
A CIF se mostrou como uma ferramenta preferência para a prevenção primária[21]. Sendo
completa, capaz, inclusive, de servir como um assim, a doença é o resultado das interações dos
parâmetro na criação de inquéritos de saúde[19]. O outros componentes do modelo e não o ponto de
uso do sistema de códigos da classificação tornaria partida. O estabelecimento do “ponto de partida”
mais tangível a visualização da situação de nos fatores ambientais, perpassando por todos os
funcionalidade e incapacidade. componentes até resultar na doença pode ser um
A CIF tem, como um dos seus principais modelo facilitador e organizador do pensamento
objetivos, dar visibilidade ao estado de para uma abordagem mais ampla.
funcionalidade e incapacidade de populações, A ideia de usar a linearidade para tornar o
quando aplicada como uma ferramenta estatística. O pensamento menos complexo pode facilitar o
conhecimento dessa situação pode ser capaz de entendimento da abordagem biopsicossocial e a
embasar políticas de saúde. No entanto, para que aplicação dos conceitos da CIF em saúde funcional.
isso seja possível, é necessário que os profissionais
estejam aptos a utilizá-la com segurança e de forma REFERÊNCIAS
assertiva, levando-se em consideração que, para
isso existem etapas a serem vencidas. A primeira
1. Chaimowiscz F. A saúde dos idosos brasileiros às vésperas
etapa a ser transposta é a inserção do modelo do século 21: problemas, projeções e alternativas. Revista de
conceitual de funcionalidade e incapacidade da Saúde Pública 1997; 31(2):184-200.
OMS na prática profissional, na prática política e na
prática acadêmica[20]. O modelo multidimensional 2. Omram AR. The epidemiologic transition: a theory of
não nega a existência pontual e limitada de um epidemiology population change. Milbank Memorial Fund
modelo linear, mas o inverso é verdadeiro. Se Quartely. 1971; 29(1):509-38.
assumirmos a linearidade com ponto de partida na
3. Schamm JMA, Oliveira AF, Leite IC et al. Transição
doença, dificilmente executaremos a epidemiológica e o estudo de carga de doença no Brasil.
multidirecionalidade. Atualmente, as instituições Ciência Saúde Coletiva. 2007; 9(4):897-908.
formadoras dos profissionais de saúde ainda
ensinam a execução do modelo linear para a prática 4. Swanson G, Carrothers L, Mulhorn KA. Comparing
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sociais. to guide compariosons. Informa Healthcare, Disability and
rehabilitation. 2003; 11:665-75.
Esse tipo de limitação existe em menor grau
nas listas (ou “core sets”) por áreas, justamente 5. Costa JLA. Metodologias e indicadores para avaliação da
porque elas conseguirão abranger um grande capacidade funcional: análise preliminar do Suplemento Saúde
número de condições de saúde. Apenas um “core da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – PNAD,
set” genérico, como apresentado da introdução do Brasil, 2003. Ciênc Saúde Coletiva 2006; 11:927-40.
presente trabalho, ou uma intersecção entre os “core
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CIF: linearidade no modelo biopsicossocial
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