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TERESINA
2020
SUMÁRIO
Sumário
Introdução...................................................................................................................................3
Capítulo I – Dos Conceitos Fundamentais..................................................................................4
Capítulo II – A Constituição de 1824........................................................................................15
1. Introdução.........................................................................................................................15
2. Centralização e Descentralização.....................................................................................16
3. Do Município...................................................................................................................20
4. A Capacidade de Auto-organização das Províncias..........................................................22
Capítulo III – A Constituição de 1891......................................................................................24
1. Introdução.........................................................................................................................24
2. Centralização e Descentralização.....................................................................................26
3. Do Município...................................................................................................................30
4. Da Capacidade de Auto-organização dos Estados............................................................32
Capítulo IV – A Constituição de 1934......................................................................................33
2. Centralização de Descentralização...................................................................................35
3. Do Município...................................................................................................................39
Capítulo V – A Constituição de 1937........................................................................................41
2. Centralização e Descentralização.....................................................................................42
3. Do Município...................................................................................................................43
Capítulo VI – A Constituição de 1946......................................................................................44
2. Da Organização do Estado...............................................................................................45
3. Do Município...................................................................................................................47
Capítulo VII – A Constituição de 1967.....................................................................................49
REFERÊNCIAS........................................................................................................................52
Introdução
A identidade de um povo é definida pela sua história. As tradições, a cultura, a forma
que suas instituições adquirem, tudo isto depende de um sem número de condições e
acontecimentos, imprevistos e imprevisíveis, que só com o passar do tempo podem ser
agrupados e analisados. Qualquer esforço histórico é, portanto, um esforço de reconstrução de
um passado artificial, ou, pelo menos, artificioso, mas não menos importante – talvez por isso
mesmo importante.
Empreender este esforço histórico, procurando nos quadros do passado seus modos e
motivos, é empreender um esforço para compreender a realidade do homem, enquanto ente e
gênero. É um empreendimento que busca não somente as causas e motivos de fatos e atos, da
ação de certos indivíduos enquanto tai, mas também a criação de uma história das instituições,
poderíamos dizer: uma história da “pessoa jurídica” (entre muitas aspas). As instituições, lato
sensu, governam, é verdade, através da ação de indivíduos, o grosso da vida social humana e
elas possuem origem, forma, modos de ação, documentos e moral, que nos dão suas
possibilidades de ação e fornecem a chave para compreendê-las. Para isto é preciso entender
sua história.
O presente trabalho se assenta nestes pressupostos e propõe uma pequena investigação
sobre as formas de organização do Estado nas constituições brasileiras. É um estudo que
combina duas áreas do conhecimento, concatenando as categorias jurídicas e políticas,
expostas na forma de textos legais, com a história constitucional. Desta forma procuramos
auxiliar aqueles que pretendem entender o Estado brasileiro e seus contornos institucionais,
no presente e no passado.
Isto é especialmente relevante em um país que conta com sete constituições em sua
história. Cada um destes textos abordou os fatos e anseios da população, dos governos e
governantes e dos diversos grupos que compõe a vida política e social. Cada uma trouxe, em
conjunto com as teorias que lhe serviram de base, uma série de alterações e cores locais, seja
para melhor se adequarem a realidade nacional, seja para suprir os anseios e desejos de um
certo indivíduo ou classe.
Essa diversidade, tão comum ao Brasil, é um dos entraves para aqueles que buscam
traçar um panorama da política e da evolução do Estado, em sua dimensão histórica, mesmo
que a análise se atenha ao lano puramente dogmático da questão.
5 Ibdem, p. 186.
6 Mas apenas por meio de exercício virtual que o mundo imaginativo da política – o mundo da lei pública – é
criado. Apenas ai pode a soberania ser reconhecida como a representação do poder e da autoridade criada
pela formação deste mundo. Soberania não revestida nem no governante, nem no cargo, nem no povo: a
soberania reveste a relação mesmo. Tradução nossa.
7 A primeira afirmação trata do estabelecimento da autoridade governamental através da atuação do direito
político (droit politique), e a segunda sugere que por meio da operação do direito político, uma competência
ilimitada para governar pelo caminho da lei positiva (potestas), que ira garanti-lo. Tradução própria.
este princípio de liberdade8. Ele reconhece também o titular da soberania não precisa coincidir
com aqueles que a exercem9.
De posse do conceito de soberania passamos agora a tratar brevemente sobre território,
o último dos conceitos preliminares a ser tratado. Território tem sido reconhecido, em
conjunto com o povo e com a soberania, ou governo, como sendo um dos principais
elementos integrantes do Estado. Assim, território é a “[…] porção do globo por ele ocupada,
que serve de limite à sua jurisdição e lhe fornece recursos materiais.” (AZAMBUJA,2000, p.
37). De forma sintética, Pedro Lenza nos apresenta a seguinte correlação entre os elementos
integrantes do Estado: “A politicidade do Estado é afirmada na referência expressa ao bem
comum, com a vinculação deste a certo povo e, finalmente, a territorialidade, limitadora da
ação jurídica e política do Estado, está presente na menção a determinado território”(LENZA,
2017, p. 497). A tradição da Staatslehre identifica o Estado como um território independente e
claramente definido, território que é ocupado pelos membros do Estado, seus cidadãos10.
Com os conceitos preliminares exposto podemos agora tratar dos conceitos próprios a
presente análise. Primeiramente, para mantermos o bom entendimento, devemos estabelecer o
conceito de centralização e, inevitavelmente, o de descentralização. Para Kelsen, dado que o
Estado é compreendido como sendo uma ordem jurídica11 e que o território é uma das esferas
de validade desta ordem, centralização e o de descentralização são tipos de ordens jurídica
(KELSEN, 2016, p. 433).
Para realmente compreendermos este conceito precisamos entrar na distinção seguinte
que o autor propõe. A perspectiva estática do conceito de centralização é associada
essencialmente ao território, poderíamos dizer, portanto, que uma ordem é centralizada ou não
quando perscrutamos o escopo de validade de suas normas perante o território geral do
Estado, o mesmo vale para a descentralização estática, nas palavras do próprio Hans Kelsen:
O enunciado de que o Estado é descentralizado ou de que o território do Estado é
dividido em subdivisões territoriais significa que a ordem jurídica nacional contém
não apenas normas centrais, mas também normas locais. As diferentes esferas
2016, p. 434)
Dai retiramos as duas espécies de normas: as locais e as centrais. As normas centrais valem
em todo o território nacional, em contrapartida, as normas locais valem apenas em uma
determinada subdivisão territorial. É importante acrescentarmos que este é um conceito que
varia em graus, exitem locais mais ou menos centralizados e mais ou menos descentralizados,
portanto “Quando nem a centralização, nem a descentralização são totais, falamos de
descentralização parcial e centralização parcial, que, deste modo, são iguais. A centralização e
descentralização totais são apenas polos ideais.” (KELSEN, 2016, p. 437). Reforço aqui que
este é um conceito estritamente geográfico, é necessário a subdivisão do território, não se
transmite este conceito a qualquer outro critério de criação de ordens jurídicas parciais, como
os que afetam indivíduos baseados em características pessoais12
Ainda tratando dos conceitos de centralização e descentralização em sua forma
estática, temos que, para os fins da presente pesquisa, saber quais os critérios determinantes
para avaliar o grau de descentralização ou centralização. Kelsen resolve este problema
elencando dois critérios:
O grau quantitativo de centralização e descentralização depende, em primeiro lugar,
do número de estágio de hierarquia da ordem jurídica aos quais se estende a
centralização ou a descentralização; em segundo lugar, do número e da
importância das matérias regulamentadas por normas centrais ou locais.
14 Lijphart, 2012, p.174: … in this chapter I deal with the first variable of the federal-unitary (divided-power)
dimension: federalism and decentralization versus unitary and centralized government. It is appropriate to
give this fi rst-place honor to the subject of federalism because it can be considered the most typical and
drastic method of dividing power: it divides power between entire levels of government. In fact, as a term in
political science, “division of power” is normally used as a synonym for federalism.”
15 Kelsen, 2016 p.452.
o Estado federal se encontra no grau máximo de descentralização possível dentro da
concepção de Estado (uma ordem jurídica nacional).
A manualistica nacional pode nos ajudar a compreender de forma simples e sintética o
tema. Pedro Lenza apresenta o Estado unitário como contendo três espécies: estado unitário
puro, estado unitário descentralizado administrativamente e Estado unitário descentralizado
administrativa e politicamente. A primeira espécie não teria exemplos concreto na história
mas se caracterizaria pela absoluta concentração do poder e de sua execução 16. O
descentralizado administrativamente tem sua decisões políticas tomadas de forma centralizada
e a execução feita, longa manus, por entes administrativos17. A última das espécies, uma das
formas de Estado mais comuns no mundo, as decisões políticas e administrativas são
descentralizadas, a população local escolhe o procedimento para aplicar no caso concreto as
decisões centrais18. Classificação semelhante nos é dada por Azambuja19.
Existem muitas maneiras de abordar, e portanto, de conceituar a forma federal do
Estado. Um de seus principais aspectos é a oposição, através de uma estrutura política e
administrativa mais descentralizada, ao unitarismo, nas palavras de Lijphart: “… there is
broad agreement on its most basic characteristic: a guaranteed division of power between
central and regional governments.”20 (LIJPHART, 2012, p. 175). A divisão do poder entre
estas duas instâncias se da de forma geográfica, o que nos remete ao próprio conceito de
descentralização apresentado por Kelsen, novamente nas palavras de Lijphart:“federalism is
usually described as a spatial or territorial division of power in which the component units are
geographically defined”21.
Kelsen, a partir de seus critérios de centralização, descentralização e de sua concepção
de Estado como ordem jurídica, nos fornece a seguinte caracterização de federação:
O Estado federal caracteriza-se pelo fato de que o Estado componente
possui certa medida de autonomia constitucional, ou seja, de que o
órgão legislativo de cada Estado componente tem competência em
matérias referentes à constituição dessa comunidade, de modo que
modificações nas constituições dos Estados componentes podem ser
16 LENZA, 2017, p. 498
17 Ibidem
18 Ibidem
19 Azambuja, p. 365, 2000.
20 Mas existe um consenso em ssua mais básica característica: a garantida divisão de poderes entre governo
central e regional. (tradução nossa)
21 Federalismo é usualmente descrito como uma divisão espacial ou territorial do poder na qual as unidades
são geograficamente definidas. (tradução nossa)
efetuadas por estatutos dos próprios Estados. Essa autonomia
constitucional dos Estados componentes é limitada. Os Estados
componentes são obrigados por certos princípios constitucionais da
constituição federal. (KELSEN, 2016, p. 451)
Ingo Sarlet aborda o conceito a partir do problema das ordens jurídicas, semelhante a
Kelsen, e nos entrega a seguinte conceituação:
Assim, há que sublinhar que o Estado Federal é caracterizado, pelo menos na sua
versão clássica e que ainda hoje corresponde à regra geral, pela superposição de
duas ordens jurídicas, designadamente, a federal, representada pela União, e a
federada, representada pelos Estados-membros,cujas respectivas esferas de
atribuição são determinadas pelos critérios de repartição de competência
constitucionalmente estabelecidos. O Estado Federal, portanto, é formado por duas
ordens jurídicas parciais, a da União e a dos Estados-membros, que, articuladas e
conjugadas, constituem a ordem jurídica total, ou seja, o próprio Estado Federal …
Cuida-se, neste sentido, de um pluralismo do tipo territorial levado a efeito
mediante um sistema de distribuição do exercício de poder entre as unidade
1. Introdução
A Constituição Política do Império do Brasil, de 1824, também conhecida como
constituição imperial ou constituição outorgada, foi o primeiro texto constitucional nacional.
Outorgada pelo imperador Dom Pedro I em 1824, dois anos após a proclamação da
independência junto as margens do Ipiranga, foi a mais longeva constituição brasileira, tendo
sido vigente por todo o período imperial (até o ano de 1889). Sua história é um tanto
conturbada, houve a convocação da Assembleia Constituinte, que iniciou seus trabalhos em 3
de maio de 1823 e foi encerrada em novembro do mesmo ano 22, contudo a visão mais liberal
da assembleia se opunha ao governo forte que propunha o Imperador23.
A situação conflituosa, marcada inclusive pelas edições de dois jornais de combate
pelos Andradas: o Tamoio e a Sentinela da Liberdade à Beira Mar, teve seu estopim com o
espancamento de um boticário brasileiro por dois militares portugueses no dia 5 de novembro.
Um tumulto se espalhou pelas ruas da capital, encabeçado pelos Andradas e pelos dois
22 “Em 3 de maio de 1823 iniciaram-se os trabalhos da Assembleia Constituinte, que havia sido convocada em
junho do ano anterior (meses antes da declaração formas de Independência). Dom Pedro I jurou defender a
Constituição que seria escrita, se fosse a mesma digna dele e do Brasil. Isto é, o monarca não aceitaria uma
carta que lhe reduzisse demasiadamente a esfera de poder. Entretanto, foi exatamente esse o rumo escolhido
pela Assembleia. Havia pressão dos liberais por uma soberania absoluta do Parlamento (como havia na
Inglaterra), e discutia-se acaloradamente se o Imperador teria ou não poder de sanção e veto de leis, além do
poder de dissolver a Câmara.” NEIVA, 2020, n.p.
23 “Desde a sessão inaugural foi visível a incompatibilidade entre o govêrno forte e essa Câmara desconfiada.
Pode-se dizer que começou a trabalhar sob a forte ameaça da dissolução, que acabou com ela seis meses
depois”. CALMON, 1958, p. 1520.
jornais, de forma que o D. Pedro temia o rompimento das forças armadas (que continham uma
grande proporção de portugueses) e optou por dissolver a Assembleia 24. No dia 12 de
novembro de 1823 soldados e canhões se encontravam às portas do paço da cadeia, atual
Palácio Tiradentes, para concretizar a dissolução, episódio que ficou conhecido como “noite
das agonias”.
No dia seguinte o Imperador decretou a formação do Conselho de Estado, que liderado
pelo próprio apresentou já em dezembro daquele ano o projeto que viria a se tornar a
constituição. O projeto foi enviado para aprovação das municipalidades que seguiram a
iniciativa da Câmara do Rio de Janeiro e adotaram o projeto 25, houve também a convocação
de cidadãos por edital para que se manifestassem contra ou a favor do projeto26. No dia 25 de
março de 1824 D. Pedro I outorgou a constituição e prestou seu juramento a carta que
limitava seus próprios poderes.
Devemos lembrar que existia um grande receio de que o Brasil, aos moldes da
América espanhola, após a independência se separasse em diversos países independentes. Este
receio, fundado em diversas causas históricas, como a desunião linguística e o contato direto
das províncias com Portugal27, teve grande influência na forma de organizar o Estado na
constituição de 1824, onde se optou pelo unitarismo.
2. Centralização e Descentralização
Nenhuma constituição é construída num vácuo, nela estão sempre presentes as
diversas opções e debates que inflamam a sociedade de sua época, de certa forma ela
representa o “espírito do século” e a cultura de sua nação. A Constituição Imperial não foi
diferente, João Camilo de Oliveira Torres nos diz que:
Ao longo de toda a história do Império duas grandes correntes se digladiam sem
cessar: uma lutando pela descentralização e a outra, contra. De um lado o ideal da
Revolução Francesa, da República una e indivisível: mais liberdade para os
indivíduos e maior concentração da autoridade; do nutro, o estilo americano: maior
28 Conforme o art. 101 da Constituição de 1824, que indica as prerrogativas do poder moderador do Imperador.
Para mais considerações sobre o poder moderador ver CARVALHO, David. A ORIGEM DO CONCEITO
DE PODER MODERADOR: UMA INVESTIGAÇÃO ACERCA DOS PROJETOS DE
MODERAÇÃO PROPOSTOS POR BENJAMIN CONSTANT E PELOS MONARQUIANOS. 2018
29 O Chefe de Polícia era nomeado pelo executivo central- conforme NEIVA, 2020, n.p.
30 SOUSA ,1867, p. 434, 1867.
31 cf. TORRES, 2017, p. 407
No artigo 10 as exceções se referiam a questões de interesse municipal, e, no artigo
11, assuntos da economia interna da Assembleia, como o seu regimento, ou casos em
que não se justificaria intervenção do presidente – suspensão de magistrados ou o
processo dos próprios presidentes. A sanção se dava pela fórmula: “sanciono”, e
“publique-se como lei”. Exigia-se, como hoje, o prazo de 10 dias para a sanção – se
transcorresse sem manifestação da vontade do presidente, tinha-se a lei como
automaticamente sancionada, promulgando-a o presidente da Assembleia. Gozavam
os presidentes do direito de veto: em caso de julgarem que a lei ou a resolução não
convinha aos interesses da província, cabia-lhes devolver o projeto à Assembleia,
com as razões do veto. A decisão do Legislativo manter-se-ia na hipótese de poder
contar com mais de dois terços da votação. Era, pois, o tipo do veto que hoje vigora.
Se entre as razões do veto estivessem as de inconstitucionalidade, ofensa aos direitos
de outra província ou tratados feitos com nação estrangeira, e a Assembleia
rejeitasse o veto, cabia recurso ao governo geral e ao parlamento nacional. Aliás,
devia o presidente remeter cópias de todos os atos legislativos provinciais ao
3. Do Município
A tradição portuguesa nos legou o município, instituição herdada do direito romano 37,
segundo Iris Tavares: “A instituição das municipalidades portuguesas aparece já nas
Ordenações Afonsinas (anteriores a 1512) e nas Manuelinas (de 1512). Era regulada pelo
33 Nas provincias só compete aos presidentes a execução das leias, a administração, a superintendencia dos ditos
meios no respectivo territorio, e não o governo proriamente dito, pois que a impulsão vem do centro “do
ministerio” e não póde haver mais que uma política, um plano de governo, que no imperio em geral deve ser
fielmente observado e mantido. (SOUSA, 1867, p.437)
34 Vejamos o Ministério da Justiça. Diz Andrade Pinto, que só isto basta: “a independência do Poder Judiciário
não exclui que os presidentes, como supremos administradores, tenham direito de ser informados dos negócios
da administração da justiça”. Aliás, em seus relatórios, apresentados à Assembleia, expunham minuciosamente a
situação relativa à justiça, muito embora fosse matéria da competência nacional. Já a polícia pertencia aos
presidentes: o chefe de polícia da província provinha de nomeação do governo central, mas os delegados cabia
aos presidentes escolher por indicação dos chefes de polícia. (TORRES, 2017, p.411)
35 A importância dos presidentes, como órgãos políticos, nasceu do fenômeno que iria caracterizar a segunda
metade do século – o aparecimento da figura do presidente do Conselho de Ministros, responsável pelo
funcionamento do Poder Executivo, com a redução do Imperador a órgão meramente fiscalizador, com o direito,
correspondente, de negar a confiança ao gabinete, e, mais, o aparecimento da política partidária. Com isto, entre
a magistratura neutra e suprapartidária do Imperador, generalíssimo nato, e o Exército, passara a existir a figura
do presidente do Conselho de Ministros, chefe de partido, com o seu agente, o presidente de província, que ele
podia manobrar à vontade, sem dar atenção às queixas imperiais. (TORRES, 2017, p.412)
36 NOGUEIRA, 1867, p. 20.
37 NOGUEIRA, 1867, p. 23.
Título LXVI do Livro I das Ordenações Filipinas quando foi transplantada para o
Brasil.”(TAVARES, 1997, p. 169). O município foi importante instrumento de organização
durante quase toda a história brasileira.
O instituto foi regulado no segundo capítulo do Título VII, que inicia determinando,
através do artigo 167, que: “Em todas as cidades e vilas ora existentes, e nas mais que para o
futuro se criarem, haverá Câmaras, às quais compete o governo econômico e municipal das
cidades e vilas.”. As Câmaras municipais são compostas por vereadores com mandato eletivo,
sendo o mais votado o presidente (art.168). As funções que cabem a esta câmara são definas
no art. 169:
Art. 169. O exercicio de suas funcções municipaes, formação das suas
Posturas policiaes, applicação das suas rendas, e todas as suas
particulares, e uteis attribuições, serão decretadas por uma Lei
regulamentar.
A lei regulamentar veio através da Lei de 1o de outubro de 1828, que ficou conhecida como o
Regimento das Câmaras Municipais, que poucas modificações sofreu até 1891.
As câmaras exerciam funções puramente administrativa, não ocupavam o papel
executivo e nem judiciário de seus primórdios, segue:
O mais importante de seus dispositivos, porém, é o art. 24: “As Câmaras são
corporações meramente administrativas, e não exercerão jurisdição alguma
contenciosa”. Com esta disposição, pôs-se fim ao regime colonial das Câmaras
Municipais, revogando na prática os Livros 66 e 67 das Ordenações que até então
regiam o seu funcionamento. A prática republicana, na verdade, pouco inovou em
1. Introdução
A constituição de 1891, foi a primeira constituição republicana do Brasil. Em 15 de
novembro de 1889 cai o Império, a família real é deposta e assumem o poder o grupo
republicano em conjunto com o braço revoltoso do exército. Na mesa noite, Rui Barbosa
41 Torres, 2017, p. 437-38.
42 Pimenta Bueno citado em Torres, 2017, p. 438.
43 Cf Torres, 2017, p.438
44 Cf Torres, 2017, p.407: “E, segundo Nelson Werneck Sodré, a coisa saíra-lhe às avessas, pois o Ato
Adicional reformado dera em centralização administrativa, acompanhada da descentralização política. De fato,
possuíam as províncias assembleias deliberantes, mas o chefe da administração vinha de fora. “
prepara o Decreto No1 institucionalizando o governo provisório e tornando o Brasil uma
república federativa. A revolução incruenta, que nascera do descontentamento dos militares
com um ministério, acabara por mudar todo o país num sopro, sem explosões ou tiros.
Não era que o movimento republicano fosse maioria, eles eram opinião minoritária e
nem sequer apresentavam uma unidade coerente – eram compostos por republicanos à moda
americana e pelos positivistas. Sem uma figura carismática para servir, tomando o poder de
supetão pela cavalgada do Marechal Deodoro da Fonseca, valeram-se da figura de Rui
Barbosa, respeitado jurista e ferrenho defensor da Federação, que contudo era um cético
quanto as formas de governo45. O movimento ganhou aderência popular posterior, os
chamados “adesistas”, membros advindos após o golpe, se mesclavam aos “históricos”
(membros dos primórdios do “partido”). O governo provisório foi estruturado sobre a
liderança de Deodoro da Fonseca com o auxílio de Rui Barbosa (como vice-chefe) e outros
grandes nomes das diversas alas pol´ticas como Aristides Lobo, Manoel Campos Sales e
Quintino Bocaiuva, pelo movimento republicano, com Benjamin Constant, representando a
juventude militar, Vandenvolk, pela armada e Demétrio Ribeiro, que representava a militância
positivista.
Ao fim dos decretos iniciais do governo provisório:
… foi nomeada a Comissão dos 5 para elaborar o projeto de Constituição
Republicana, integrada por Saldanha Marinho, presidente, o velho estadista que
servira altos cargos do Império e inscrevera-se entre os primeiros “históricos”;
Américo Brasileiense de Almeida Melo, outro histórico como vice-presidente; e
ainda Antônio Luís dos Santos Werneck, Francisco Rangel Pestana e José Antônio
45 BALEEIRO, 2012, p. 13
tumulto, contava a República com a disciplina das armas que a tinham fundado,
2. Centralização e Descentralização
A República dos Estados Unidos do Brasil, nome oficial do país sobre o nome regime,
seguia o modelo presidencialista do federalismo norte-americano e tirara inspiração de
federações como Argentina e Suíça. Não tinha como ser diferente, Rui Barbosa, figura-chave
tanto no estabelecimento do governo provisório quanto na constituinte 50, sendo um dos
principais responsáveis pela lapidação do texto final da constituinte, era ferrenho defensor do
federalismo, a república já nasceu federal. O primeiro artigo da carta, no título primeiro: da
organização federal, assim define o regime:
Art. 1o A Nação Brasileira adopta como fórma de governo, sob o
regimen representativo, a Republica Federativa proclamada a 15 de
46 ROURE, 1920, p. 6
47 BALEEIRO, 2012, p. 25
48 Ibidem
49 Oliveira Viana (1937, p. 81, apud CALMON,1959 p.1895
50 Cf BARBOSA, 1946, p. XI -XIII
novembro de 1889, e constitue-se, por união perpetua e indissoluvel
das suas antigas provincias, em Estados Unidos do Brasil.
O artigo segundo proclama a transformação das antigas províncias em estados-
membros. A federação brasileira não nasceu, portanto, de um pacto entre Estados soberanos
que abdicam de sua soberania, mas não de sua autonomia, a fim de formarem não somente um
a confederação mas uma federação, cujo ente central, a União, detêm toda a soberania do
Estado. Uma federação, conforme já expomos, é um estado com duplo grau de jurisdição, a
local e a central (ou nacional), o processo de formação centrípeto, ou seja, o pacto federativo
criado a partir da concessão do status de Estado as antigas províncias (entes de caráter
administrativo), da federação brasileira não é diferente.
O caráter indissolúvel do pacto é definido também no artigo primeiro, como no caso
americano e de praxe comum às federações. A união indissolúvel, ou seja, a ausência de uma
cláusula de direito interno que permita aos estados-membros romperem o pacto que os liga a
União é uma das principais diferenças entre um Estado federal e uma confederação, é o que
torna os membros do pacto pertencentes a uma ordem jurídica nacional. Esta cláusula é
devida ao paradigma clássico da formação jurídica das federações: se parte da soberania dos
estados-membros para a união destes em uma forma combinada, detentora única da soberania,
conquanto os estados mantêm sua autonomia. Foi uma opção pela ortodoxia51.
As províncias, agora estados, não participaram da revolução republicana, esta lhes foi
imposta da mesma forma que a federação. Não houve momento para que estes recém-
nascidos estados decidissem pela sua adesão a federação. Pode-se argumentar a ficção do
pacto, contudo isto é de menor importância os efeitos jurídicos pretendidos com a
implantação de uma forma federada se concretizaram, pelo menos textualmente.
A forma federal procura realizar uma administração e uma política mais
descentralizada. O Império tinha consagrado, antes do ato adicional, um elevado centralismo
– as províncias e municípios executavam decisões centrais, tendo gerência sobre questões
locais menores e não possuindo acesso a um legislativo local – o que se torna depois um
sistema semi-federal. O objetivo da República e criar um sistema federal, politicamente
descentralizado, verdadeiro, sem as confusas combinações entre elementos
descentralizadores, como a adoção das Assembleias provinciais eletivas, com elementos
altamente centralizado, como o presidente da província advir do poder executivo central. O
3. Do Município
O município sempre esteve presente na organização política e administrativa do Brasil,
desde de sua concepção colonial e por todo o império. O grau de independência e os assuntos
de responsabilidade das vilas e cidades, contudo, variaram muito, bem como a importância
dada a este tema. O município é “… cellula embryonaria, a essência, o elemento fundamental
de todos os regimes livres e descentralizados, o casúlo donde a democracia sahiu, pujante e
formosa.” (MILTON, 1898, p. 346)
A constituição de 189154 trata do tema no art. 68, componente solitário do título III, in
verbis:
Art. 68. Os Estados organizar-se-hão de fórma que fique assegurada a
autonomia dos municipios, em tudo quanto respeite ao seu peculiar
interesse.
O dever dos Estados é oferecer autonomia para o município, tendo o dever de
organizar estas estruturas tendo em vista o respeito aos seus interesses, mas sempre
respeitando as esferas e limites institucionais, assim “Em geral, a Constituição de cada Estado
determinou que os Municípios seriam regulados por uma “lei orgânica”, aplicável a todos.”
(BALEEIRO, 2012, p. 33). O respeito ao município é uma das fronteiras ao direito de livre
organização dos entes federados55 e um importante componente na organização
descentralizada, agora também em nível político dado que em geral possuíam capacidade
legislativa – vide a elaboração de lei orgânica. Nas palavras de Avila:
A presença do Município no texto constitucional não corresponde, no
entanto, à garantia de manutenção da instituição municipal nos
mesmos moldes anteriores. Autores como Bastos (1985, p. 29-30)
criticam a redução do poder local, quando da opção pelo modelo
federal, e o fato de, na vigência da Constituição de 1891, a entidade
local não poder ser considerada propriamente detentora de autonomia
política, com fundamento na seguinte razão: não dispor de poder para
decidir sobre sua organização e sobre a eleição dos responsáveis por
exercer função executiva. (AVILA, p. 511, 2018)
54 Exceto a disposição sobre rendas que lhe deviam ser atribuídas e tiradas dos impostos estaduais, havia
apenas o art. 68 que mandava ao Estado assegurar aos Municípios a autonomia em tudo quanto respeitasse
ao seu “peculiar interesse”. BALEEIRO, 2012, p.33.
55 MILTON, 1898, p. 347.
4. Da Capacidade de Auto-organização dos Estados
A República dos Estados Unidos do Brasil se organizava através da federação. Isto
implica que os Estados-membros deveriam se organizar livremente, contanto que
obedecessem uma série de restrições constitucionais. É precisamente neste contexto que
podemos falar de capacidade de autogoverno, auto-organização e autolegislação.
O artigo 63, no título II, é o primeiro a abordar o assunto: “Art. 63. Cada Estado reger-
se-ha pela Constituição e pelas leis que adoptar, respeitados os principios constitucionaes da
União”. Os estados-membros são dotados de poder constituinte derivado, esta espécie de
poder constituinte originário é a que permite que eles se auto-organizarem através de um
documento que merece o nome de constituição. É justamente este artigo, ao estabelecer o
duplo grau de jurisdição que impera nos territórios dos Estados (Estados-membros e da
Federação), que garante sua autonomia56. Resume bem a questão Milton:
Nos Estados, ha dous Governos independentes entre si, tendo cada um delles
distincta da do outro, equilibrando-se ambos pela combinação das forças e mutuo
respeito das attribuições respectivas. Ha no entanto, uma diferença a notar: O
Governo federal tem poderes definidos, ao passo que o estadoal os tem indefinidos.
Assim reputa-se bastante para a felicidade dos Estados a autonomia de que
todos, entre nós, gozam; pois a liberdade de cada um delles está sufficientemente
56 Constituições 1891, p.32, XXXX. “Cada Estado se regeria pela Constituição e leis que adotasse, respeitados
os princípios constitucionais da União”.
57 MILTON, p.332, 1898.
1o Recusar fé aos documentos publicos, de natureza legislativa,
administrativa, ou judiciaria, da União, ou de qualquer dos Estados;
2o Rejeitar a moeda, ou a emissão bancaria em circulação por acto do
Governo Federal;
3o Fazer, ou declarar guerra entre si e usar de represalias;
4o Denegar a extradicção de criminosos, reclamados pelas justiças de
outros Estados, ou do Districto Federal, segundo as leis da União, por
que esta materia se reger. (Art. 34, n. 32.)
Como percebe-se os Estados tem grande liberdade e capacidade para se auto-
organizarem, seguindo a fórmula federal e seguindo os preceitos constitucionais (em especial
evitando os casos do art.6o). As eventuais incursões da União dos estados, que ocorreram
neste período foram muita mais decorrentes da política e da irascível ganância do que de
alguma falha na técnica constitucional.
58 Este decreto, regulando em todo o país o alistamento e as eleições federais, estaduais e municipais,
apresentava uma série de inovações. A maior delas era, sem dúvida, o estabelecimento do sufrágio universal
direto e secreto. O voto secreto constituíra um dos pontos-chave de toda a campanha da Aliança Liberal,
consistindo numa das medidas consideradas básicas para a “moralização” da prática eleitoral no Brasil. Em
torno deste expediente político, reuniam-se em críticas às “eleições a bico de pena” da República Velha tanto
setores das oligarquias dissidentes que participaram da Revolução de 1930, quanto setores revolucionários
da corrente tenentista. A conquista do voto secreto representava uma aspiração antiga de todos aqueles que,
vendo-se excluídos do poder, lutavam para alcançá-lo ainda na década de 1920. Neste sentido, a consagração
do voto secreto representava o cumprimento de uma primeira grande promessa da revolução, no sentido do
saneamento dos costumes políticos da nação e também um passo essencial para sua reintegração no futuro
regime constitucional.
Além disso, o novo código ampliava o corpo político da nação concedendo o direito de voto a todos os
brasileiros maiores de 21 anos, alfabetizados, sem distinção de sexo. Pela primeira vez, por conseguinte, as
mulheres conquistavam o exercício da cidadania, o que além de ter um significado político muito
importante, implicava um acréscimo numérico substancial ao corpo de votantes. Permaneciam, entretanto,
excluídos do direito de voto, além dos mendigos e analfabetos, os praças de pré e os clérigos regulares. Em:
http://www.fgv.br/cpdoc/acervo/dicionarios/verbete-tematico/assembleia-nacional-constituinte-de-1934
59 POLETTI, 2012, p. 15.
60 CALMON, 1959, p. 2232-33.
61 Ibidem, p. 2231, 1959.
novembro de 1891, a confirmação do Marechal Deodoro na presidência da
2. Centralização de Descentralização
3. Do Município
Ao revés da constituição de 1891, que deixava a cargo dos Estados a organização do
município cuja a única restrição era que eles tivessem gerencia sobre seus assuntos locais, a
nova carta magna trouxe mais robusta legislação. O município é tratado no título IV, que
inicia-se com o art. 87:
Art. 87. Os Estados organizarão seus Municípios, assegurando-lhes
por lei, e de acôrdo com o desenvolvimento econômico-social dos
mesmos, um regime de autonomia em tudo quanto lhes disser respeito
ao privativo interesse.
§ 1o Os Municipios de mais de dois mil contos de renda e cujas sédes
tiverem mais de cincoenta mil habitantes, e os que forem capitais de
Estado, terão carta municipal própria, de acôrdo com os principios
gerais estabelecidos pelas Assembléias Legislativas, e submetida ao
seu referendum.
§ 2o Os Estados poderão constituir em Região, com a autonômia, as
rendas e as funções que a lei lhe atribuir – um grupo de municípios
contiguos, unidos pelos mesmos interesses econômicos. O Prefeito da
Região será eleito pelos Conselheiros dos Municipios regionais e o
Conselho Regional compor-se-á dos Prefeitos destes Municípios.
§ 3o Nenhum Município poderá ser constituido ou mantido sem renda
suficiente para o custeio de um serviço regular de instrução primária,
saúde pública e conservação de estradas e ruas.
§ 4o Os Municípios só perderão a autonomia, podendo então ser
supressos, nos seguintes casos:
a) incapacidade para prover ás necessidades normais de sua vida, de
acôrdo com as regras estabelecidas pela Constituição de cada Estado;
b) deficit orçamentário de um terço ou mais de sua receita, durante
três anos consecutivos; c) falta de pagamento de sua dívida fundada
por mais de dois anos consecutivos.
§ 5o A fusão, ou o desmembramentos municipal por lei do Estado,
dependerá do referendum popular dos Municipios interessados.
71 Cf ibidem, p.14.
potencial grande de interferência do Estado na autonomia territorial, como não se via desde a
constituição de 1824. Nos demais aspectos segue mais ou menos o padrão das constituições
federais: estabelece as competências exclusivas da União (com o acréscimo do art. 17
possibilitando a competência suplementar em caso de delegação expressa em lei) e dos
Estados, define o território, estabelece as matérias que não serão alvo de legislação, entre
outras coisas.
Um dos fatores de centralização é a possibilidade de intervenção federal mais ampla:
O centralismo pode ser igualmente observado nas relações entre a União e os
Estados. Nestes, a chefia do Poder Executivo caberia ao Interventor Federal, de livre
nomeação pelo Presidente da República. Ao contrário das demais constituições
brasileiras, que afirmaram a não intervenção da União nos Estados, salvo em casos
excepcionais, a Constituição de 1937 é clara ao indicar, no artigo 9o, que “o Governo
Federal intervirá nos estados”, tanto nas hipóteses de emergência das alíneas do
3. Do Município
A situação dos municípios, em princípio, parece ter permanecido idêntica. O artigo 26
assim prescreve:
2. Da Organização do Estado
Pouco podemos falar de inovador quanto ao tema da organização do Estado nesta
constituição. Advinda de uma nação abalada pela instabilidade política buscou-se restaurar as
bases de uma república federativa, nos moldes liberais clássicos, acrescida as inovações
3. Do Município
O município sofreu duros golpes em relação sua autonomia e participação, tanto
efetiva quanto jurídica, da vida política da nação. O Estado Novo foi um golpe especialmente
duro. No processo da constituinte aperceberam-se da precariedade deste importante instituto,
que em 1934 tinha alçado papel mais ativo na composição do Estado, inclusive tendo
prerrogativa legislativa exclusiva, e tentaram restaurar sua antiga posição. Avila nos informa:
De acordo com Villa (1952, p. 26-27), a Constituição de 1946 avançou na concessão
de poder à entidade municipal, já que alargou as competências legislativas e “[...]
ampliou os recursos financeiros dos Municípios, adotando uma nova política de
distribuição tributária, que embora não satisfaça inteiramente, representa, contudo,
de qualquer forma, uma medida inicial útil às comunas.” (AVILA, p. 517, 2017)
O artigo 28 é o responsável pela a autonomia formal dos municípios, segue:
Art. 28. A autonomia dos Municípios será assegurada:
I – pela eleição do Prefeito e dos vereadores;
II – pela administração própria, no que concerne ao seu peculiar
interêsse e, especialmente:
a) à decretação e arrecadação dos tributos de sua competência e à
aplicação das suas rendas;
b) à organização dos serviços públicos locais.
§ 1o Poderão ser nomeados pelos governadores dos Estados ou dos
Territórios os prefeitos das capitais, bem como os dos Municípios
onde houver estâncias hidrominerais naturais, quando beneficiadas
pelo Estado ou pela União.
§ 2o Serão nomeados pelos governadores dos Estados ou dos
Territórios os prefeitos dos Municípios que a lei federal, mediante
parecer do Conselho de Segurança Nacional, declarar bases ou portos
militares de excepcional importância para a defesa externa do país.
Percebemos que a primeira garantia é a eleição dos membros políticos do município, a
habilidade de escolher os próprios representantes (que exercerão cargos locais e exercerão as
atribuições políticas) é essencial ao conceito de autonomia e de descentralização (em ambas
as modalidades dinâmica e estática). A segunda medida garante a independência
administrativa, decretando quais são os assuntos que essencialmente concernem ao interesse
local (o que por vezes foi matéria sem definição nas outras constituições), está lista poderia
sem ampliada pelo Estado.
Além de garantir a independência administrativa e política era necessário conceder
condições materiais mínimas para que isto fosse relevante, era preciso que o constituinte
tratasse da arrecadação. Para esta missão foi preciso que o constituinte lhe garantisse
benefícios como a exclusividade dos impostos sobre indústria e profissões, além de 10% do
Imposto de Renda (caso não fosse capital)76. Esses dois artigos seguintes são relevantes para a
autonomia fiscal e financeira dos municípios:
Art. 20. Quando a arrecadação estadual de impostos, salvo a do
impôsto de exportação, exceder, em Município que não seja o da
capital, o total das rendas locais de qualquer natureza, o Estado dar-
lhe-á anualmente trinta por cento do excesso arrecadado.
Art. 29. Além da renda que lhes é atribuída por fôrça dos §§ 2 o e 4o do
art. 15, e dos impostos que, no todo ou em parte, lhes forem
transferidos pelo Estado, pertencem aos Municípios os impostos: I –
predial e territorial urbano; II – de licença; III – de indústrias e
profissões; IV – sôbre diversões públicas; V – sôbre atos de sua
economia ou assuntos de sua competência
76 Ibidem, p. 43.
77 Cf FAUSTO, 2006, p. 460-61.
78 Ibidem
Branco encaminhou ao congresso o Projeto de Lei Maior 79, esta nova constituição deveria
institucionalizar os valores dos revolucionários. A constituição de 1967 foi um texto
conservador80 e acabou por preservar a forma federal do Estado.
Apesar do grande interesse histórico deste período, em termos de organização do
Estado as diposições desta Carta maior em muito se assemelha à anterior, basicamente o que
ocorreu foi uma modificação nos processos de escolha das autoridades legislativas e
executivas. Essencialmente se trata de um Estado federal, que inclusive buscava resolver o
problema de sub-representação de alguns Estados.-membros 81, o que contudo não se
concretiza82. A centralização deste texto se dá através do fortalecimento do poder de inciativa
do Presidente na propositura de leis em combinação com a limitação de tempo ao congresso
para aprová-las, houve também restrição no número de emendas aos projetos advindos do
Executivo83. O decreto-lei foi outra importante ferramenta neste processo. Esta prerrogativa
ampliada do presidente, que adquiria agora certa porção do legislativo é uma das
características mais marcantes desta época.
A maior invasão em relação aos poderes dos municípios e Estados é foi de natureza
tributária. Contudo esta sistemática de restrição ao poder dos Estados e municípios em
aprovar impostos, advinha da emenda 18 da constituição de 1946. Sobre o município Cabe a
lição de Avila:
Os textos de 1967 e 1969 não trouxeram inovações de ordem prática, entendidas
como relevantes para a competência municipal. No entanto, o artigo 15 da
Constituição de 196754 e o parágrafo único do artigo 14 da Constituição de 196955
merecem ser referidos, já que possibilitaram a organização variável dos Municípios,
tendo em vista características das instituições locais (peculiaridades locais). Tais
previsões, lamentavelmente, não foram aproveitadas pelo texto constitucional hoje
em vigor.56 Até a Constituição de 1969, inclusive, discutiu-se, na doutrina, que o
Município não integrava formalmente a federação.57 58 No entanto, doutrinadores
como Miranda e Meirelles (1977, p. 148;150) já defendiam o Município como uma
das partes do todo, tal qual União e Estados-membros. A partir da Constituição de
1946, Miranda (1953, p. 131), ao tratar da competência municipal, afirma: “O
Município é entidade intraestatal rígida, como a União e o Estado-membro”,59
Considerações Finais
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