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JORGE LUIZ DE FREITAS

A PRÁTICA PEDAGÓGICA DA DISCIPLINA DE CAPOEIRA NA EDUCAÇÃO


SUPERIOR E A SUA CONTRIBUIÇÃO PARA A FORMAÇÃO DO FUTURO
DOCENTE

MESTRADO EM EDUCAÇÃO
PUCPR

CURITIBA
2006
2

JORGE LUIZ DE FREITAS

A PRÁTICA PEDAGÓGICA DA DISCIPLINA DE CAPOEIRA NA EDUCAÇÃO


SUPERIOR E A SUA CONTRIBUIÇÃO PARA A FORMAÇÃO DO FUTURO
DOCENTE

Dissertação apresentada como


exigência parcial para obtenção do
grau de Mestre, pelo Programa de
Mestrado em Educação da Pontifícia
Universidade Católica do Paraná.
Orientadora: Profª. Drª. Evelise Maria
Labatut Portilho.

CURITIBA
2006
3

AGRADECIMENTOS

Aos meus pais Anadir e Yvone por nunca terem poupado esforços para que eu
me tornasse o homem que sou.
À minha esposa Sandra, eterna parceira, por entender que toda ausência
sempre é recompensada.
Ao grande colega e companheiro de ideologia, professor Cláudio Miyagima,
pelo incentivo e pela confiança, que muitas vezes foram motivo para não
desistir.
À professora Doutora Marilda A. Behrens pelo amor contagiante com que
leciona, fazendo-nos perceber que “ainda vale a pena”.
À professora Doutora Araci Asinelli da Luz pelo apoio, pelo carinho, pela
amizade, pelo incentivo... por tudo.
À minha orientadora, professora Doutora Evelise M. L. Portilho, pelo nosso
começo turbulento, pelos nossos momentos de mútuo aprendizado, pela
paciência que tanto exercitou comigo.
À toda a minha família e amigos de hoje e sempre, que sonharam este sonho
junto comigo.
4

SUMÁRIO

CAPÍTULO I .......................................................................................................... 01
1.1 INTRODUÇÃO.......................................................................................... 01
1.2 Histórico da minha prática pedagógica: paixão justificada................ 07
1.3 Apresentação da pesquisa..................................................................... 14
1.4 Definição e delimitação do problema.................................................... 15
1.5 Objetivos ................................................................................................. 16
1.5.1 Objetivo Geral....................................................................................... 16
1.5.2 Objetivos Específicos.......................................................................... 16
1.6 Metodologia............................................................................................. 16

CAPÍTULO II.......................................................................................................... 19
2.1 A CAMINHADA HISTÓRICA DA CAPOEIRA........................................... 19
2.2 As “duas Capoeira”.................................................................................. 31

CAPITULO III......................................................................................................... 36
3.1 A EDUCAÇÃO FÍSICA FRENTE A EVOLUÇÃO PARADIGMÁTICA DA
EDUCAÇÃO............................................................................................................ 36
3.1.1 A Educação Física e os Paradigmas Conservadores da Educação 36
3.1.2 A Educação Física e os Paradigmas Inovadores da Educação........ 40
3.1.3 A Educação Física e o Paradigma Emergente ou da Complexidade. 46

CAPITULO IV.......................................................................................................... 58
4.1 A DOCÊNCIA NO ENSINO SUPERIOR DE EDUCAÇÃO FÍSICA............ 58
4.2 O professor formador de professores..................................................... 64
4.3 A difícil arte de ensinar e aprender.......................................................... 67
4.4 A Capoeira na Educação Física............................................................... 70

CAPITULO V........................................................................................................... 75
5.1 O CAMINHO METODOLÓGICO DA PESQUISA....................................... 75
5.1.1 A opção pela pesquisa qualitativa do tipo participante................. 75
5

5.1.2 População / amostra da Pesquisa......................................................... 77


5.1.3 Instrumentos da Pesquisa.................................................................... 79
5.1.4 Descrição da Pesquisa.......................................................................... 80
5.2 Contribuições dos (das) professores (as).............................................. 81
Importância da Capoeira no Currículo do Curso de Educação Física ..... 81
Expectativas dos Acadêmicos na Visão do Docente.................................. 83
5.3 Depoimentos dos acadêmicos................................................................ 85
Expectativa sobre a Disciplina de Capoeira ................................................ 85

CAPÍTULO VI......................................................................................................... 111


CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................................... 111

REFERÊNCIAS.................................................................................................... 119
APÊNDICES.......................................................................................................... 133
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RESUMO

A presente dissertação é resultado da pesquisa realizada com alunos e professores


da disciplina de Capoeira, no curso de Educação Física de quatro instituições de
ensino superior. O objetivo central foi analisar como a disciplina de Capoeira, no
curso de Educação Física pode subsidiar a prática pedagógica desta atividade, em
ambiente escolar, do futuro docente e apresentando como questão norteadora: O
que caracteriza a prática pedagógica do professor de Capoeira no curso de
Educação Física e quais as contribuições dessa prática para a formação e
aprendizagem do profissional desta área? Para tanto foi realizada uma pesquisa
com abordagem qualitativa tipo participante. O estudo demandou a inclusão de uma
investigação bibliográfica acerca do histórico de surgimento e evolução da Capoeira
até sua chegada aos meios universitários. Foram pesquisados também os
fenômenos da evolução paradigmática da Educação frente à Educação Física, a fim
de respaldar possíveis considerações sobre o processo metodológico da disciplina
de Capoeira nas universidades. Ainda como referencial teórico, focamos o
professor de Educação Física, seu papel enquanto formador de professores e seu
compromisso com a aprendizagem do aluno. Participaram da pesquisa um total de
135 acadêmicos (as) e 2 professores dos cursos de Educação Física que
responderam a um questionário contendo perguntas abertas. Os dados da prática
docente no Ensino Superior foram relacionados à posição dos diferentes autores
consultados. Na análise dos dados foi possível observar que a Capoeira apresenta-
se como uma atividade viável de educação em ambiente escolar e ainda, que há
forte influência da postura do docente universitário na formação do futuro professor
de Educação Física. O estudo enfatiza a necessidade urgente de uma profunda
reflexão crítica da ação dos docentes formadores de professores, visando a
elaboração de novas metodologias que possam formar profissionais
transformadores e críticos, conscientes de seu papel, conforme as exigências da
sociedade.

Palavras-Chave: Prática Pedagógica Universitária; Capoeira; Aprendizagem;


Educação Física; Formação de Professores.
7

ABSTRACT

The present dissertation is resulted of the research carried through with pupils and
teachers of discipline of Capoeira, in the course of Physical Education of four
institutions of superior education. The central objective was to analyze as it
disciplines it of Capoeira, in the course of Physical Education can subsidize practical
the pedagogical one of this activity, in pertaining to school environment, of the
teaching future and presenting as main question: What it characterizes
practical pedagogical of the teachers of Capoeira in the course of Physical
Education and which the contributions of this practical for the formation and
learning of the professional of this area? For in such a way participant type
was carried through a research with qualitative boarding. The study it
demanded the inclusion of a bibliographical inquiry concerning the description
of sprouting and evolution of the Capoeira until its arrival to the half colleges
student. The phenomena of the paradigms evolution of the Education had been
searched also front to the Physical Education, in order to endorse possible resulted
on the of educational practices discipline of Capoeira in the universities. Still as
reference theory, we have the teacher of Physical Education, its paper while
teacher of teachers and its commitment with the learning of the pupil. They
had participated of the research a total of 135 academics () and 2 teachers of the
courses of Physical Education that they had answered to a questionnaire I
contend open questions. The data of the practical teacher in Education
Superior had been related to the position of the different consulted authors. In
the analysis of the data it was possible to observe that the Capoeira is
presented as a viable activity of education in pertaining to school environment
and still, that has fort influence of the position of the university professor in the
formation of the future professor of Physical Education. The study it emphasizes
the urgent necessity of a deep critical reflection of the action of the teacher
training aiming at the elaboration of new methodologies that can form transforming
and critical professionals, conscientious of its paper, as the requirements of the
society.

Key Words: Practical Pedagogical College Student; Capoeira; Learning;


Physical Education; Formation of Teachers.

CAPITULO I
8

1.1 INTRODUÇÃO

A pesquisa sobre a temática que envolve a Capoeira enquanto prática


pedagógica e ainda conteúdo da Educação Física sempre pautou meus estudos e
nunca esperei que esta fosse uma tarefa tranqüila a ser executada. Porém, ao dar
início a este trabalho, logo percebi que seriam muitas as noites sem dormir a
procura de soluções para as enormes dúvidas surgidas em função dos choques de
teorias e, até mesmo, em função das minhas próprias concepções e conceitos que
já há tanto tempo acompanham minha prática docente e que agora estariam sendo
também passíveis de questionamentos.
Talvez, por ser este mesmo o objetivo da pesquisa científica: provocar
a chamada entropia1, a qual abala as ordens pré-estabelecidas (e aceitas) gerando
desordens para privilegiar o estabelecimento de uma “nova” ordem, agora re-
significada, refletida, re-interpretada, não estagnada.
Nessa perspectiva os estudos foram encaminhados.
Sobre a Capoeira, logo de início observei que se tratava de algo mais
além de simplesmente um conjunto de movimentos corporais de ataque e defesa;
ela evidencia na sua história, nos seus cânticos, nos seus rituais, importantes
contradições que marcam uma sociedade. Conhecida historicamente também como
arma de escravos em busca de liberdade, a Capoeira traçou um longo percurso até
chegar às universidades e ser pautada como conteúdo da Educação Física.
Com o intuito de transpor ainda mais os limites da Capoeira, optei
então pela verificação de sua importância na formação de futuros docentes da área
da Educação Física.
A escassa bibliografia referente a este assunto foi compensada pelo
conhecimento do autor sobre a Capoeira, pois esta temática faz parte da vida deste

1
Originalmente, "entropia" surgiu como uma palavra cunhada do grego de em (en - em, sobre, perto de...) e
sqopg (tropêe - mudança, o voltar-se, alternativa, troca, evolução...). O termo foi primeiramente usado em 1850
pelo físico alemão Rudolf Julius Emmanuel Clausius (1822-1888). O conceito de entropia foi introduzido na
Ciência há mais de 150 anos, mas somente a partir de meados do Século XX é que se difundiram suas
aplicações por diversas áreas do conhecimento. Numa visão mecanicista, a ênfase está unicamente no que se
ordena e se desconsidera a desordem causada pela ordenação. É como se ignorássemos, por exemplo, o
problema do lixo ao arrumarmos nossa casa.
9

pesquisador. Justifico essa escolha na medida em que pretendo contribuir para a


melhoria na formação de profissionais que possam apresentar essa atividade como
mais um meio para a educação nas escolas.
Campos (1990) afirma que a Capoeira na escola pode ser ministrada
de várias formas: Capoeira luta, Capoeira dança e arte, Capoeira folclore, Capoeira
educação, Capoeira como lazer e Capoeira como filosofia de vida. Para Falcão
(1995), a inclusão da Capoeira nas instituições de ensino superior representa uma
situação inusitada; o que causa admiração é que a sua prática há algumas décadas
atrás era uma ação marginal, passiva de penalidades previstas no Código Penal
Brasileiro. E hoje, fazendo parte da Educação Física, a Capoeira desenvolve
inúmeros valores positivos, como o respeito à pessoa humana.
O professor Boaventura (apud CAMPOS, 1990) cita que a
aproximação entre o currículo e a cultura há de ser sempre uma preocupação
dominante para os educadores. E a educação, para que seja realmente nacional,
há de refletir valores, condicionamentos e ingredientes culturais.
Barbieri (apud CAMPOS, 1990, p.43) apresenta a importância da
Capoeira como educação e chama atenção para a relação entre a unidade e a
totalidade:

Essa relação é um caminho para se observar a Capoeira diacronicamente e


nele se dá o encontro entre vários elementos, tais como o exercício físico, a
música, a poesia, o canto, o ritmo, a criatividade, a determinação, a
coragem, a liderança, o diálogo, a comunicação e outros elementos não
menos importantes, contribuindo principalmente para o desenvolvimento do
auto-conhecimento.

Portanto, acredito que a Capoeira na escola serve de alicerce para a


busca da cultura e de um maior conhecimento do ser humano e sua relação com a
sociedade. A inclusão da disciplina de Capoeira na Universidade serviu para que o
futuro professor pudesse conhecer essa arte e pudesse perceber que toda
mensagem corporal, se traduzida e interpretada por profissionais conscientes de
seu papel, torna-se sinal evidente da importância desta na formação de cidadãos
críticos e responsáveis.
10

Nesse sentido, cabe a citação de Evelise Portilho (apud FREITAS,


2005, p.6): “quando o professor ama e conhece o que faz, seu ensino se torna a
marca da competência; do compromisso com o outro e consigo mesmo”.
Na década de 1970, no momento do término da graduação, o
profissional estaria pronto para atuar junto ao mundo do trabalho. Essa afirmação
passa a ser superada na década de 1980 quando a graduação não carrega mais a
visão de terminalidade. Assim, todos os profissionais, inclusive os que escolheram a
área da docência, devem estar conscientes de que a formação, a qualificação e a
capacitação são processos contínuos. Nesse sentido, Nóvoa (2002, p.23)
acrescenta que “o aprender contínuo é essencial e se concentra em dois pilares: a
própria pessoa, como agente e a escola, como lugar de crescimento profissional
permanente”.
O docente deve estar o tempo todo a procura de propostas que visem
a melhoria de sua prática, articulando sua formação à realidade na qual vive e atua.
Segundo Behrens (1998, p.63), a construção de uma formação
contínua com base na ação docente junto ao ensino superior, aponta para um
“saber por que fazer”. Pensar em formação contínua nesse contexto implica saber
que a formação profissional não termina na Universidade. Esta lhe aponta
caminhos, fornece conceitos e idéias, a matéria-prima de sua especialidade. Cabe
ao profissional, buscar aprender com sua prática, estudando, pesquisando,
observando e, muitas vezes, errando para obter contribuições que lhe permitam
(re)pensar e (re)formular práticas e metodologias de intervenção que, por
conseqüência, venham a contribuir para a articulação teórico-prática da formação
inicial.
Nesse contexto, cabe a contribuição de Freire (1991) quando afirma:
"Ninguém nasce educador ou marcado para ser educador. A gente se faz educador,
a gente se forma, como educador, permanentemente, na prática e na reflexão da
prática" (p.58). Por isso, a formação de professores deve incluir a permissão para a
reflexão e a produção de saberes e valores. A opção
pela especificidade da formação do professor em Educação Física levou-me a
investigar as relações entre a teoria e a prática. Talvez, essa relação seja um dos
maiores problemas da área, pois em geral, a expectativa dos alunos, candidatos a
docentes, focaliza-se na docência com aulas extremamente voltadas à prática e
11

recheadas de momentos de lazer. Outro fator relevante na investigação trata da


urgência desses jovens em se tornar professores para ministrar aulas em
academias de grande porte, numa demonstração de que talvez ainda não consigam
distinguir as propostas de formação de Licenciados e Bacharéis.
Por serem considerados conteúdos relativamente novos na Educação
Física, quando falamos em dança, jogos cooperativos e na própria Capoeira a
situação se agrava, pois como acima comentado, o aluno do curso superior chega à
faculdade com seus objetivos muito interiorizados. Esse aluno, que muitas vezes é
ex-atleta de alguma modalidade esportiva, limita-se a tal atividade e negligencia
outras, esquecendo-se do “todo” de sua formação. Muitas vezes, não consegue
perceber a importância de outras disciplinas ou da articulação entre elas.
Existem ainda aqueles que, mesmo tendo como meta profissional o
exercício da docência escolar, acabam refletindo em sua prática os modelos aos
quais foram submetidos em sua vida escolar, num eterno repetir de discursos e
técnicas.
O grande desafio na entrada do século XXI focaliza-se na formação de
profissionais que superem o acúmulo de saberes para transformá-los,
contextualizá-los e adaptá-los à realidade do hoje.
Esse processo desafiador envolve a necessidade de provocar os
alunos para que re-pensem sua condição de ouvintes e para que se estabeleça
uma nova condição: a de participantes do seu processo de formação. Assim,
pensar a formação profissional do futuro docente de Educação Física esbarra num
aspecto importante que é a postura do professor/formador.
No que tange à Capoeira enquanto conteúdo da Educação Física,
pesa ainda a questão da novidade. A especificidade do tema e principalmente, do
medo que isso acarreta, já que toda inovação gera certa exposição e nem sempre
estamos preparados para isso.
Ramal (1997, p. 11) comenta que numa possível troca de experiências
entre professor e aluno, duas posturas são impensáveis:

Aquele velho medo de errar. O erro deve ganhar novo valor. Aquele que
nunca erra nunca é, porque não teve coragem de experimentar uma prática
nova, está parado no velho paradigma que já não atende nossos objetivos
educacionais. O erro, apesar de frustrante, acena para a possibilidade de um
futuro acerto e, portanto, de uma futura melhora na ação pedagógica.
12

*Aquele velho medo de dizer não sei. A prática da troca de saberes pede do
professor que ele se livre daquela armação de ‘senhor dos conteúdos’. É
importante que o profissional esteja bem preparado, sim, pois ele será
sempre um referencial para o aluno. Mas não é mais necessário saber tudo,
ter as respostas na ponta da língua – até porque, na Era da informação, isso
é praticamente impossível. Bom mesmo é que o professor também se
fascine, junto com o aluno, pela pesquisa e pelo novo. Uma postura nesse
estilo, desarmada e aberta, nos aproxima muito mais daqueles que orientam
e possibilita que sejam construídas relações afetivas mais verdadeiras.

Para tanto, a partir de vinte de dezembro de 1996, com a aprovação


da nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação (2006) – Lei n. 9394/96, a
Educação brasileira sofreu novas e significativas mudanças, com destaque para a
liberdade atribuída aos Conselhos de Educação, às escolas e aos professores, a
fim de que pudessem organizar e estruturar o ensino. Acredita-se que a nova LDB
surgiu, nesse momento, como ponto de referência às mudanças necessárias à
Educação brasileira com possibilidade de novos projetos, mais ousados e com
característica participante.
A autonomia proporcionada pela LDB para que novos conteúdos
fossem incluídos na proposta pedagógica, possibilitou a opção pela Capoeira como
um dos conteúdos a serem abordados pela Educação Física.
Os Parâmetros Curriculares Nacionais (1997), em relação à Educação
Física também apontam a Capoeira como proposta de conteúdo, uma vez que ela
se encontra no bloco dos esportes, jogos, lutas e ginásticas. Assim, pude observar
a preocupação de algumas instituições de ensino superior em se adaptar a esta
nova realidade. Em Curitiba, espaço delimitado para esta investigação, das seis
Universidades que oferecem o curso de Educação Física apenas uma delas não
tem em sua grade curricular a disciplina de Metodologia do Ensino das Lutas na
qual a Capoeira também é abordada ou trabalhada juntamente com outros estilos
de lutas.
Outro problema que a inclusão da Capoeira enfrenta enquanto
conteúdo da Educação Física, é que por ser um fenômeno recente faz com que
surjam algumas limitações quanto ao docente universitário dessa disciplina. Há, no
momento, dificuldades em se encontrar profissionais que detenham o domínio do
saber empírico da Capoeira, com titulação e aptidão exigidas para a docência
universitária.
13

Esses enfrentamentos levaram à concepção de ensino aplicada e à


forma como estão sendo formados os futuros profissionais da Educação Física
quanto ao ensino das Lutas e, mais especificamente, da Capoeira. Nesse contexto,
mostram-se pertinentes as colocações de Campos (2001, p. 87):

O ensino/aprendizagem da Capoeira não deve ser voltado apenas para o


aspecto técnico de aprender determinada forma de luta e de esporte. O
ensino dos golpes deve ser acompanhado da transmissão de todos os
elementos que envolvem a sua cultura, história, origem e evolução, ao
tempo em que se estimulará a pesquisa, debate e discussão, para que o
educando tenha uma participação efetiva na Capoeira como um todo. O
professor deve estimular constantemente esta prática, oportunizando aos
alunos vivenciarem todos os momentos da aula/prática.

O desenvolvimento da Capoeira acompanhou a evolução e


conseqüente mudança paradigmática da Educação, que também são objetos de
análise neste trabalho haja vista a necessidade de uma definição por parte do
docente universitário, de suas ferramentas teóricas.
Como afirma Ferreira (2001, p.16)

É preciso que o professor estabeleça pontos de referência com os quais


poderá exercer sua dimensão hermenêutica: atribuir sentidos, produzir
interpretações do que vive nas ações pedagógicas desenvolvidas, inserindo-
se em uma vertente teórica e tendo condições de propor a continuidade de
uma reflexão-ação sobre o seu projeto educativo.

Nesse sentido, os paradigmas da educação são orientadores das


práticas educativas, tais como são lidas na realidade. Constituem-se em estruturas
determinantes não só da forma de conceber a educação, mas de agir
educacionalmente; mesmo que saibamos, e já tenhamos comentado que o aluno
do ensino superior voltado à docência possui o que Carvalho (1992) chama de
“formação docente anterior”, a qual traz à tona, junto à prática do futuro docente, a
reprodução do conhecimento adquirido quando estudante.
De acordo, Campos (1985, p.84) diz que:

Desde cedo se toma contato com as atividades desenvolvidas numa escola,


e o indivíduo, ao entrar no curso de formação especializada, já criou uma
opinião sobre o que significa ensinar efetivamente, de tal forma que apesar
de entrar em contato com as teorias e metodologias mais recentes, emprega
14

mais tarde, quando já em exercícios, técnicas aprendidas quando era


estudante.

Daí a importância de conhecer e refletir sobre os paradigmas


educacionais sob pena de haver sérias restrições na efetivação de uma prática
educacional transformadora.
A reflexão sobre as questões aqui apresentadas permite compreender
também que quando se promove a educação, o professor deixa de ser estático
frente a mecanismos de manipulações impostas pela falta de leitura e pelo
comodismo aliados à falta de criatividade durante a prática docente.

1.2 Histórico da minha prática pedagógica: paixão justificada.

Como muitas vezes acontece, a prática da Capoeira foi o motivo que


me levou a cursar Educação Física. Lembro-me de, ainda adolescente, ter sido
encantado pela propaganda de uma companhia aérea na qual duas pessoas, sob a
luz do sol (baiano), realizavam movimentos ágeis e de muita beleza plástica: a
Capoeira. Matriculei-me em uma academia e dediquei-me quase que
exclusivamente ao aprendizado de tal arte. Fui atleta dedicado e conquistei alguns
títulos em campeonatos específicos (bi-campeão brasileiro e pentacampeão
paranaense). Nessa trajetória, fui professor de Capoeira antes de entender o que
era ser professor.
Conheci, nessa época (início da década de 1980), muitas pessoas
ligadas à Educação Física e, entre elas, Gladson de Oliveira Silva, Professor que
até hoje ministra aulas de Capoeira no Centro de Práticas Esportivas-CEPEUSP da
Universidade de São Paulo-USP. Mestre Gladson, como é conhecido no meio
capoeirístico, foi um dos primeiros e importantes incentivadores que tive para cursar
Educação Física - o que veio a ocorrer em 1984, quando dei início ao primeiro ano
do curso de Educação Física na Pontifícia Universidade Católica do Paraná-
PUC/PR.
Foi um período de muitos conflitos, pois eu era atleta, professor de
Capoeira que realizava eventos de grande porte social e formava seguidores. O
choque foi inevitável. Na faculdade voltei a ser “apenas” mais um aluno. Comecei a
15

perceber, em meio a muitos embates, minha própria imaturidade e despreparo e me


dei conta de que havia ainda muito mais a aprender.
A faculdade propiciou a percepção da falta de didatismo no ensino da
Capoeira e fez com que minha visão se ampliasse extremamente nesse sentido.
Vale lembrar que na década de 1980, a Educação Física passava por um período
de reformulação “que lhe identificava um caráter pedagógico, orientado por um
movimento de reflexão numa perspectiva social” (BARROS, 2006, p.12).
Nesse sentido, cabe a contribuição de Figueiredo (1997, p.1) que
acrescenta:

(...)a rigor, percebe-se que a produção do conhecimento na Educação Física


alcançou a discussão da Educação acerca da democratização da escola e
das pedagogias que a permeiam. Esta nova produção visou à orientação
que buscasse a superação de uma nova prática baseada em pressupostos
eminentemente biológicos e esportivos, até então quadro efetivo na
realidade da Educação Física brasileira.

O autor focaliza a preocupação com a dimensão pedagógica,


dimensão esta que até hoje move minhas pesquisas e meus ideais. Sempre
acreditei que a busca pelo aperfeiçoamento técnico, em qualquer esporte, deve
estar articulada a valores educacionais que compreendam o significado da
existência do movimento então realizado e a faculdade de Educação Física acabou
por subsidiar e respaldar cientificamente essa questão.
Como acadêmico, desde os anos iniciais, fui estagiário da Prefeitura
Municipal de Curitiba trabalhando em praças, parques, entre outros locais da
cidade. No bairro de Vilas Oficinas, onde trabalhei junto ao Centro Social Urbano
por 11 anos, mais de 300 alunos por ano puderam vivenciar a Capoeira, incluindo
crianças, jovens e idosos. A comunidade, sensibilizada pelo trabalho realizado,
organizou um abaixo-assinado pedindo minha contratação como funcionário
municipal efetivo. O prefeito da cidade de Curitiba em 1987, Sr. Roberto Requião,
em ação solene durante a inauguração do Projeto Irmão Menor2 aceitou o pedido e
fui nomeado coordenador das atividades com Capoeira no Projeto recém
inaugurado.

2
Projeto Social da Prefeitura Municipal de Curitiba que acontecia em vários locais da cidade visando incentivar
a prática de esportes de crianças carentes até 12 anos de idade.
16

A caminhada como docente se intensificou e em 1988, juntamente


com a colega e ex-atleta Elenice Berno, entrei em contato com a professora Araci
Asinelli da Luz (então professora do Departamento de Métodos e Técnicas da
UFPR) tentando apoio para a elaboração da proposta que pedia a inclusão da
Capoeira no currículo da graduação de Educação Física da Universidade Federal
do Paraná-UFPR.
A proposta foi apresentada e aceita, não sem “luta” é claro, pelo
colegiado da instituição. Neste momento, valem as palavras do Professor Cláudio
Miyagima (apud FREITAS, 2003, p.7) que em 1988 era Coordenador do Curso de
Educação Física da UFPR:

Para se ter uma idéia daquele momento, inserir a Capoeira no currículo de


um curso de Educação Física, especialmente numa universidade do sul do
país, significava ouvir dos profissionais da área da Educação Física algumas
indagações, como: isto é coisa para o Nordeste! Temos que considerar a
cultura corporal da nossa região! Portanto, pensar em Capoeira no sul do
país, que tem raízes étnicas basicamente européias, era algo muito distante.
Inseri-la numa formação acadêmica mais ainda, principalmente na UFPR,
onde muitos professores tinham vínculos fortíssimos com suas disciplinas,
conteúdos, equipamentos e instalações. O clima de reformulação curricular
era de muita resistência, mas, por outro lado, favorecidas pela busca da
democracia no país, as discussões foram amplas e abertas. Suportes de
investigação, como dados coletados junto aos egressos da UFPR e PUC-
PR, nos ajudaram nessa mudança. Alguns quadros demonstravam a
rejeição quanto ao caráter de obrigatoriedade das disciplinas de Judô e
Esgrima, especialmente esta última, pois a Esgrima não havia se
consolidado nas escolas e o judô encontrava dificuldades de permanência
pela sua ênfase na técnica e não pelo aspecto pedagógico. (...) após muitos
debates, conseguimos inserir a Capoeira no contexto destas disciplinas, com
o forte argumento de ser uma modalidade culturalmente muito mais
enraizada e marcante na história do povo brasileiro do que qualquer outro
tipo de luta.

Mais tarde, a Capoeira foi incorporada a outras faculdades que


sentiram a necessidade de enaltecer o currículo de Educação Física com uma arte,
que também é luta, dança, esporte, além de genuinamente brasileira.
Em 1990, fui à Brasília-DF como Técnico da Delegação Paranaense
de Capoeira acompanhando jovens atletas para a participação nos Jogos Escolares
Brasileiros (JEB’s), que já tinha a Capoeira como uma das modalidades incluídas
desde o ano de 1985. Rendendo do então Ministro do Estado da Educação e do
Desporto, Sr. Murilo de Avellar Hingel, o seguinte comentário:
17

Pela concepção, estrutura e desenvolvimento da competição de Capoeira


nos JEB’s durante esses anos, podemos notar que não se trata apenas da
prática do esporte pelo esporte, mas sim de ser Esporte, a Capoeira, uma
forma, uma estratégia, um motivo para realizarmos o processo educativo
fundamentado em nossas raízes culturais, um jeito de brasileiro para uma
educação também brasileira (apud BARBIERI, 1995,p. 03)

Sobre a inclusão da Capoeira nos JEB’s, Falcão (1996) também


contribui afirmando que a presença desta atividade nos Jogos Escolares Brasileiros
a partir de 1985, foi também um dos grandes motivos para que a Capoeira se
tornasse mais discutida nos contextos educacional e desportivo.
Ainda em 1990, por ter conquistado uma autonomia sobre minhas
ações docentes e acreditar em meus ideais, desliguei-me do grupo de Capoeira ao
qual pertenci durante 14 anos e criei o grupo “Oficina Beija-Flor” no qual, por dois
anos, desenvolvi um trabalho com um maior direcionamento pedagógico.
No início de 1993, encontrei apoio para esse trabalho, que agora
poderia ser alinhado no sentido de auxiliar a prática de um maior número de
colegas e professores de Capoeira que, como eu, tinham o sonho de vê-la
formando crianças e adultos em cidadãos, na Associação Brasileira de Apoio e
Desenvolvimento da Arte Capoeira – ABADÁ-CAPOEIRA, instituição com sede na
cidade do Rio de Janeiro e que tem até hoje como Presidente, o renomado Mestre
Camisa. Homem visionário incentivou-me ainda mais a continuar acreditando no
potencial da Capoeira e no meu próprio potencial enquanto articulador de
pressupostos educacionais até então quase inexistentes na área. Segundo Mestre
Camisa (apud FREITAS, 1997), a Capoeira necessita e merece trabalhos que
dignifiquem sua condição de meio para uma educação infantil que entrelace o
mundo mágico e imaginário da criança à realidade do seu dia-a-dia - o que vinha de
encontro aos meus ideais.
Hoje, sou responsável por todo o trabalho da Capoeira vinculado ao
ensino de crianças na Associação, prestando acessoria aos mais de oito mil
professores de Capoeira infantil dessa instituição.
Paralelamente, mantive o vínculo com as atividades acadêmicas e em
1990 participei como docente do Curso de Extensão Universitária da Universidade
Federal do Paraná intitulado “Importa o que se importa?”, ministrando aula sobre a
18

Capoeira como proposta para o ensino de 1° Grau (ho je Ensino Fundamental).


Esse evento foi muito significativo, pois além de propiciar a discussão sobre a
Capoeira e sua entrada na escola, dentro de uma instituição de renome como a
UFPR, também contou com a presença de grandes nomes da pesquisa científica
junto à área da Educação Física como João Paulo Medina e Valter Bracht, autores
que deram contribuições para o presente estudo e que, naquela época, de pés
descalços participaram de uma vivência prática de Capoeira por mim ministrada.
No ano seguinte novamente participei do curso “A dimensão
educacional da Capoeira”, Extensão Universitária também realizada pela
Universidade Federal do Paraná, junto ao setor de Educação.
Como docente do Instituto de Educação do Paraná, atuei em todas as
séries, sempre apontando o ensino da Capoeira como fator importantíssimo na
transmissão de conceitos sociais, base para a formação do cidadão. Lembrando
que o Instituto de Educação do Paraná foi a primeira escola a instaurar a Capoeira
no sistema de atividades de contra-turno (escolinha) e que foi ali o lugar onde pude
colocar em prática todo um trabalho de pesquisa e experiências feito durante a
graduação.
Mais uma vez os erros foram muitos. Contudo, acreditar na Capoeira
enquanto meio de educação era o motor de minha vida profissional e, assim, logo
aprendi que os erros são necessários para que possamos identificá-los e são
caminhos para a busca de acertos.
Com o trabalho ali desenvolvido, para o qual pude contar com o
envolvimento de toda a comunidade escolar também contagiada pela magia da
Capoeira, a escola servia como “vitrine” do projeto que demonstrava a validade da
Capoeira-Educação, permitindo assim, que eu fosse convidado por várias
instituições de ensino superior para apresentar a Capoeira nesse contexto.
A partir daí surgiu a necessidade de fundamentar a chamada
“Capoeira Pedagógica” e, em conjunto com um grupo de alunos que também
ministravam aulas, por mim orientados, formamos em 1993 o projeto “A arte de
brincar com o próprio corpo”. Esse projeto visava o ensino da Capoeira para
crianças em idade pré-escolar, hoje Educação Infantil. E, logo no primeiro ano de
sua implantação, desenvolveu-se em cerca de quarenta Escolas atingindo
aproximadamente mil e quinhentas crianças. O maior desafio foi convencer
19

pedagogos, psicólogos, fisioterapeutas de que era possível, neste caso aliando a


Capoeira ao lúdico, evidenciar a auto-descoberta levando em consideração o
desenvolvimento motor e a transmissão de valores. Todos esses elementos
articulados à responsabilidade do profissional docente totalizam o trabalho
educacional a que a Capoeira Infantil se dedica.
Nos anos que se seguiram, ministrei aulas direcionadas a crianças de
três a seis anos de idade. O trabalho, além de inovador, era extremamente
gratificante, pois eu aprendi muito com cada criança.
Devido às experiências vivenciadas e à certeza de que a Capoeira
não podia ficar fora do ambiente escolar lancei, em 1997, o livro “Capoeira Infantil: a
arte de brincar com o próprio corpo”. No mesmo ano, a convite da Prefeitura
Municipal de Curitiba, ministrei um curso de capacitação profissional sobre a
Capoeira Infantil para professores de Educação Física que lecionavam em turmas
de pré a 4ª série do ensino fundamental.
Outros cursos ocorreram, como por exemplo, a “Oficina de Capoeira”
pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná-PUC/PR e o Curso de Extensão
“Capoeira” pela Universidade Federal do Paraná-UFPR - ambos realizados em
1999 e, ainda, uma conferência na “VII Clínica de Capoeira” da Universidade de
São Paulo-USP, com o título: “Capoeira, um instrumento psicomotor para a
cidadania”.
Juntamente aos cursos, palestras e oficinas ministrados no início de
2001, fui convidado para atuar como docente da disciplina de Metodologia do
Ensino das Lutas, do curso de Educação Física do Centro Universitário Positivo –
UnicenP.
À frente, novo desafio e nova busca por aprender. Porém, agora
estaria trabalhando com pessoas que queriam ser professores, mas que, muitas
vezes, não tinham interesse em Capoeira especificamente ou que, devido a sua
bagagem cultural, traziam os pré-conceitos acerca de uma atividade que não lhes
tinha sido abordada quando ainda eram alunos em fase escolar.
Hoje, quando encontro ex-alunos da graduação, já professores
convictos, muitos fazem questão de contar as suas experiências trabalhando a
Capoeira em suas aulas, apresentando-a como mais um conteúdo da Educação
20

Física. Tais encontros constituem para mim motivo de orgulho e, é claro, entendo
sua validade.
No ano de 2003, durante a realização de um curso de capacitação
para mais de 100 professores de Capoeira da cidade do Rio de Janeiro e a pedidos
dos mesmos publiquei meu segundo livro: “Capoeira Infantil – Jogos e
Brincadeiras”. Esse segundo livro tem como objetivo principal trazer informações
básicas para que capoeiristas e profissionais da Educação Física possam ter um
referencial inicial de trabalho, tendo em vista a dificuldade em se encontrar
publicações sobre o assunto.
No final do mesmo ano apareceu o convite para ministrar aulas na
Universidade Tuiuti do Paraná – UTP, junto à disciplina Capoeira, ou seja, mais e
mais profissionais teriam o conhecimento de que a Capoeira era uma atividade
importante em sua formação docente.
Ministrando aulas em cursos de ensino superior, para os quais a
legislação exigia titulação, mas principalmente pelo fato de minha busca por
qualificação nunca ter cessado, matriculei-me e fui selecionado em primeiro lugar
para o Programa de Mestrado em Educação Física da Universidade do Porto –
Portugal. Licenciei-me de minhas atividades profissionais e fui à Portugal, onde
concluí os créditos do referido curso. Em meio aos afazeres acadêmicos, que não
foram poucos, ministrei vários cursos de capacitação à professores de Capoeira
atuantes em toda a Europa. Dentre os locais onde os cursos ocorreram estão
Londres, Bruxelas, Paris, Luxemburgo, Portugal e Espanha, numa demonstração de
que a Capoeira encontrou seu espaço no mundo.
A falta de sensibilidade para a Capoeira como manifestação de
cidadania e espírito de desenvolvimento da cultura brasileira impossibilitou a
organização da dissertação de Mestrado junto à Universidade do Porto em
Portugal. Mas, este fato foi superado quando em passeio de férias ao Brasil,
candidatei-me ao Programa de Mestrado em Educação da Pontifícia Universidade
Católica do Paraná – PUC/PR, onde também fui aprovado e hoje apresento este
estudo.
Mais que nunca, entendo-me ciente da necessidade de fundamentar
teoricamente a prática na qual se possa privilegiar a redescoberta, a busca por
novos meios educacionais, aliando não somente o saber científico desta ou daquela
21

disciplina, mas sim uma interação através da qual seja possível o estabelecimento
de relações entre elas.

1.3 Apresentação da pesquisa

Procurando uma delimitação com contornos claros o presente estudo


tem como campo de trabalho a prática pedagógica do professor de Capoeira no
curso de Educação Física e sua influência na formação do profissional dessa área.
Apresentamos a seguir o problema e os objetivos e, no capítulo seguinte
levantamos uma progressão cronológica da história da Capoeira a fim de que se
possa observar sua condição inicial de marginalidade social até sua inclusão como
disciplina em cursos universitários evidenciando uma elitização da atividade, mas
também, e talvez conseqüentemente, a sua valorização enquanto atividade
pedagógica e meio de Educação.
O terceiro capítulo desta pesquisa se destina a investigar a evolução
dos paradigmas da Educação frente à Educação Física, tratando especificamente
dos modelos Conservadores, os Inovadores, o Emergente e do Paradigma da
Complexidade da Educação, sempre observando e explicitando sua relação com o
contexto da Educação Física.
No quarto capítulo, houve a preocupação com a docência no ensino
superior de Educação Física, uma vez que esta pesquisa trata da formação de
professores e, enquanto sujeitos de nossa própria história, trazemos conosco as
concepções que nos serviram de referências. Daí a dificuldade, muitas vezes, de
aceitação de novas metodologias ou propostas de atividades. Este capítulo aborda
ainda as peculiaridades existentes quando se é professor universitário e a arte de
ensinar e aprender quando se está formando outros professores.
O quinto capítulo apresenta a opção metodológica da pesquisa
qualitativa participante, seus pressupostos e encaminhamentos. Descrevemos os
sujeitos da amostra, o campo de investigação e os instrumentos de coletas de
dados. Este capítulo ainda contempla o tratamento e análise dos dados, a partir das
contribuições dos sujeitos pesquisados. Nele destacamos as colocações mais
importantes a fim de melhor ilustrar os apontamentos generalizantes e que
22

subsidiam os comentários feitos pelo pesquisador durante as considerações finais


desta pesquisa.
Finalmente, incluímos no trabalho as Referências e como apêndices,
os instrumentos de coleta de dados e, o modelo do Termo de Consentimento Livre
e Esclarecido.

1.4 Definição e delimitação do problema

Numa busca por espaço entre as diversas áreas do conhecimento, a


Educação Física nas últimas décadas tem desenvolvido grandes estudos. Contudo,
a sociedade exige, emergencialmente, cada dia mais uma Educação Física que
aponte subsídios para a melhoria na qualidade de vida dos indivíduos. Para atender
às exigências sociais é que a formação dos profissionais em Educação Física tem
se mobilizado.
Nesse sentido, a presença da Capoeira, que até então era marcante
em academias, conquista espaço rapidamente nas escolas, embora muitas vezes
com objetivo plenamente técnico.
Em várias instituições de ensino superior do Brasil e até mesmo do
exterior, a Capoeira já pode ser vista como conteúdo inerente à formação docente.
Ao questionarmos os conceitos que estariam sendo lançados a esses
futuros profissionais sobre a Capoeira, em especial, por ser um saber relativamente
novo quando articulado a valores didático-pedagógicos formais, buscamos
investigar o seguinte problema:
O que caracteriza a prática pedagógica do professor de Capoeira
no curso de Educação Física e quais as contribuições dessa prática para a
formação e a aprendizagem do profissional desta área?
Com a problemática estabelecida, buscamos analisar os referenciais
teóricos e práticos das abordagens pedagógicas na Educação e em especial da
Educação Física. Neste processo de pesquisa objetivamos envolver os estudantes
para ampliar a visão que os alunos têm da Capoeira e sua possível influência na
formação desses acadêmicos.
23

1.5 Objetivos
1.5.1 Objetivo Geral

 Pesquisar como a disciplina Capoeira, no curso de Educação


Física pode subsidiar a prática pedagógica do futuro
profissional nessa atividade em ambiente escolar.

1.5.2 Objetivos Específicos

 Investigar como as abordagens pedagógicas propostas durante


as aulas da disciplina de Capoeira podem influenciar na ação
docente do futuro profissional no ambiente escolar.
 Analisar as expectativas que os acadêmicos têm em relação à
disciplina de Capoeira junto à formação universitária.
 Identificar como os alunos percebem a disciplina de Capoeira
na formação do professor de Educação Física enquanto
atividade viável à prática escolar.
 Buscar aproximações entre as contribuições dos professores e
alunos para a formação do futuro docente e a prática do
professor de Capoeira.

1.6 Metodologia

Ao tentar a ampliação da compreensão desta pesquisa optamos pela


adoção de métodos referentes à pesquisa qualitativa visando uma análise
detalhada dos significados e características situacionais apresentadas pelos
sujeitos participantes, em lugar do levantamento de dados somente quantitativos de
características e comportamentos, numa abordagem participante.
Vale lembrar que os conceitos qualitativos e quantitativos não se
anulam mutuamente, pelo contrário, servem para a confirmação um do outro.
Com relação à pesquisa qualitativa, algumas críticas quanto a seus
critérios de cientificidade são feitas. Segundo Demo (1996, p.17) tais critérios são:
24

Coerência: discurso logicamente construído


Consistência: qualidade argumentativa
Originalidade: contribuição do conhecimento
Objetivação: abordagem teórico-metodológica de aproximação da realidade

Para esse autor a intersubjetividade ou “ingerência da opinião


dominante dos cientistas” também se caracteriza como critério para uma possível
falta de cientificidade nas pesquisas.
Porém, para Chizzotti (1991, p.79), “o conhecimento não se reduz a
um rol de dados isolados, conectados por uma teoria explicativa; o sujeito-
observador é parte integrante do processo de conhecimento e interpreta os
fenômenos, atribuindo-lhes um significado”. O objeto não é um dado inerte e neutro;
está possuído de significados e relações que sujeitos concretos criam em suas
ações.
Triviños (1987, p.120) considera como definição da pesquisa
qualitativa o seguinte:

Por um lado ela compreende atividades de investigação que podem ser


denominadas específicas. E por outro, estas atividades podem ser
caracterizadas por traços comuns, o que a torna uma ‘expressão genérica’.
Esta é uma idéia fundamental que pode ajudar a ter uma visão mais clara do
que pode chegar a realizar um investigador que tem como objetivo atingir
uma interpretação da realidade do ângulo qualitativo.

Já em relação à pesquisa participante Demo (2000, p.21), contribui


afirmando que esta “é ligada à práxis, ou seja, à prática histórica em termos de usar
conhecimento científico para fins explícitos de intervenção”. Há na pesquisa
participante um componente político que possibilita discutir a importância do
processo de investigação tendo por perspectiva a intervenção na realidade social.
Segundo Brandão (1985), a pesquisa participante vislumbra uma
convergência de atitudes favoráveis à perseguição de objetivos comuns. Nessa
caminhada o pesquisador coloca-se como sujeito, juntamente com o grupo
interessado, e a serviço não do grupo, mas da prática política daquele grupo.
Devemos lembrar que ao reduzir depoimentos a dados estatísticos,
pura e simplesmente, perdemos de vista a questão da subjetividade inerente ao
comportamento humano. A melhor compreensão das relações humanas, de sua
evolução não podem ser retratados tendo como base apenas registros numéricos.
25

De acordo com Chizzotti (1991, p.80), "a pesquisa não pode ser o
produto de um observador postado fora das significações que os indivíduos
atribuem aos seus atos; deve, pelo contrário, ser o desvelamento do sentido social
que os indivíduos constroem em suas interações cotidianas". Sendo até necessário
o conhecimento e o envolvimento do pesquisador com os sujeitos da pesquisa, para
que este entenda e possa interpretar suas colocações.

Interpretar e compreender a realidade dos sujeitos participantes surge


como característica fundamental da pesquisa qualitativa. Ainda que se busque, uma
imparcialidade na transcrição dos depoimentos, os significados dados aos mesmos
sempre estarão ligados aos conceitos do próprio investigador.
Assim, após as definições levantadas, o desenvolvimento
metodológico desta pesquisa levou em consideração alguns fatores descritos por
André & Lüdke (1986, p.1):

Para se realizar uma pesquisa é preciso promover o confronto entre os


dados, as evidências, as informações coletadas sobre determinado assunto
e o conhecimento teórico acumulado a respeito dele. Em geral, isso se faz a
partir do estudo de um problema, que ao mesmo tempo desperta o interesse
do pesquisador e limita sua atividade de pesquisa a uma determinada
porção do saber, a qual ele se compromete a construir naquele momento.
(...) Esse conhecimento é, portanto, fruto da curiosidade, da inquietação, da
inteligência e da atividade dos indivíduos, a partir e em continuação do que
já foi elaborado e sistematizado pelos que trabalharam o assunto
anteriormente. Tanto pode ser confirmado ou negado pela pesquisa o que se
acumulou a respeito do assunto, mas o que não pode é ser ignorado.

Partindo deste ponto de vista pretende-se não só reduzir o isolamento


entre a pesquisa, o pesquisador e os sujeitos, como envolvê-los em relações de
caráter mais coletivo propondo, numa ação conjunta trazer contribuições durante o
desenvolvimento da pesquisa e após sua realização.
26

CAPÍTULO II

2.1 A CAMINHADA HISTÓRICA DA CAPOEIRA

Como elemento ativo da dinâmica cultural, a Capoeira hoje em dia


apresenta contornos bem diferentes dos que a originaram. É possível facilmente
observar uma crescente esportização da Capoeira, bem como sua conseqüente
inserção no contexto educacional e isto a tem feito ganhar cada vez mais espaços.
Assim, torna-se salutar que façamos um resgate, ainda que de modo
breve, sobre a história do surgimento e desenvolvimento da Capoeira, afim de que
ela seja devidamente situada como elemento central e objetivo desta pesquisa.
Com a análise bibliográfica verificou-se que, historicamente, o termo
Capoeira é citado pela primeira vez em 1712 por Bluteau em livro publicado em
Coimbra – Portugal, com o título Vocabulário Português e Latino. Desde então
muitas foram as tentativas de definição do termo e dentre elas a mais aceita entre
os pesquisadores é de origem Tupi, apresentada por Soares (1880) como: caa –
mato, floresta virgem, mais puêra – o que foi, que não existe mais. O Tupi da
Geografia Nacional propõe Kapuera como roça abandonada, da qual o mato já
tomou conta, mato renascido (REGO, 1968).
Com o passar do tempo, o termo assumiu novos significados. O mais
presente é utilizado para denominar uma luta apresentada por movimentos ágeis
envoltos por música, ritmo e ginga.
Para Marinho (1956) a Capoeira era praticada pelos Angolas3 como
dança religiosa. Já Rego (1968), diz que a Capoeira é uma invenção dos africanos
no Brasil. Areias (1983), afirma que a Capoeira nasce da necessidade do escravo,
trazido da África para o Brasil, sobreviver à escravidão e, por não possuir armas
suficientes descobriu no próprio corpo um meio de defesa, imitando animais e
estruturas das manifestações trazidas da África.
Como se pode perceber, há ainda uma grande controvérsia sobre o
surgimento da Capoeira, contudo, convém observar a complexidade do assunto
uma vez que pesquisadores (PIRES, 2001; CARVALHO,1999; SOARES,2001;

3
Nomenclatura utilizada no período colonial para definir negros trazidos da região de Angola, na África, para
serem escravizados no Brasil.
27

FREYRE, 2003) que defendem que a Capoeira surgiu em terras brasileiras usam o
argumento de que os negros aqui escravizados vieram de diversas regiões da
África e foram trazidos não apenas para o Brasil, mas para outras ex-colônias do
continente americano. Porém, parece não haver registro histórico conhecido do
desenvolvimento da Capoeira nestes locais, somente no Brasil.
Por outro lado, existem aqueles que acreditam na origem africana da
Capoeira (MARINHO, 1956) sendo trazida daquele continente pelos cativos, uma
vez que podem ser encontradas danças e rituais também características de luta. A
partir dessa concepção, a Capoeira seria simplesmente uma variação dessas
danças.
Deve ficar claro, que o objetivo desta análise, não é tomar partido ou
optar por seguir esta ou aquela versão histórica, e sim evidenciar a já comentada
complexidade do tema, entendendo que este já foi abordado por muitos
pesquisadores, dentre eles: Araújo (1997), Capoeira (1998), Carvalho (1999), Pires
(2001), Rego (1968), Areias (1983) e ainda assim não existe consensualidade.
Conta a história que por volta do século XVI, durante o período do
tráfico negreiro, muitos negros foram trazidos de suas pátrias, na maioria províncias
africanas como, Luanda, Congo, Moçambique, Angola, Cabinda, Benguela, entre
outras (REIS, 1988). O caminho era longo e podia se tornar maior ainda se
pensarmos nas condições em que estes negros viajavam, presos aos porões
fétidos e abarrotados dos navios, rumo ao cativeiro e ao sofrimento do trabalho
escravo. Ao chegar em solo brasileiro eram separados de seus parentes e
compatriotas. Justamente com o objetivo de que não se formassem grupos
uniformes capazes de se unirem contra a força opressora (REGO, 1968).
Porém, mesmo pertencendo a grupos com língua, costumes e
tradições diferentes, ainda que oriundas do mesmo continente, no momento em que
eram obrigados a trabalhar e conviver juntos em senzalas pode-se dizer que essa
experiência levou-os a absorver e difundir a cultura uns dos outros.
Há registros em Freyre (2003) que afirmam que os negros
escravizados tinham raramente alguns momentos de descanso e quando gozavam
deste momento aproveitavam para cantar suas canções, cultuar os Deuses
africanos, perpetuando suas raízes. Comenta Sevecenko que (apud
WISSENBACK,1998, p. 85) “o regime escravista determinou a convivência em
28

grupos de trabalhadores escravos e no interior dos quais foram criadas expressões


a eles peculiares”.
A constante vigilância e severa violência empregada contra os negros
foram a marca dos cativeiros brasileiros, que preservaram a cultura de quanto mais
o outro for subjugado, humilhado, castigado, amedrontado, mais controle se tem
sobre ele. De certa forma, esta também foi a mola propulsora para que houvessem
rebeliões nas senzalas. Aos descontentes com este tratamento restava o tronco.
Tronco no sentido literal, onde o escravo rebelde era amarrado e, exposto em
público, era chicoteado quantas vezes fossem necessárias para esquecer idéias
contrárias às de submissão e servidão. Ribeiro (1996) nos reforça estas questões
com as seguintes palavras:

(...) sua rotina era sofrer o castigo diário das chicotadas soltas, para
trabalhar atento e tenso. Semanalmente vinha um castigo preventivo,
pedagógico, para não pensar em fugas e, quando chamava atenção, recaia
sobre ele o castigo exemplar, na forma de mutilação de dedos, do furo de
seios, de queimaduras de tição, de ter todos os dentes quebrados
criteriosamente, ou dos açoites do pelourinho, sobre trezentas chicotadas de
uma vez, para matar, ou cinqüenta chicotadas diárias , para sobreviver
(p.120).

Uma saída encontrada pelo escravo à esta situação foi o chamado


Banzo, um suicídio no qual ingeriam terra até morrerem asfixiados. Para evitar este
tipo de atitude, era colocada uma máscara de ferro na boca do escravo que fosse
suspeito de querer cometer suicídio.
Na ânsia de liberdade, e diante da inconformidade com a situação de
maus tratos e principalmente de clausura, os negros escravos acabaram por
perceber que sua única arma contra toda a opressão que sofriam seria o seu
próprio corpo, como se pode observar no comentário de Santos.

Para poderem adestrar seus corpos à vista dos seus senhores, disfarçavam
os movimentos da luta numa forma de dança, passando assim uma imagem
de simples divertimento, e quando fugiam das senzalas e eram encontrados,
procuravam se defender com seus coices, cabeçadas e rasteiras para não
serem reconduzidos ao cativeiro (1990, p.35)
29

A partir da percepção de que sua agilidade e destreza corporal


poderiam ser eficazes para empreender fugas, os negros escravos passaram a
enfrentar seus opressores em emboscadas e a refugiar-se em bandos, criando
assim o quilombo, entre os quais o mais famoso foi o quilombo dos Palmares. Os
primeiros registros de quilombo segundo Marques (1989) datam de 1580 e são de
pequenos acampamentos formados por escravos fugitivos na Serra da Barriga (hoje
estado de Alagoas), um local de acesso relativamente difícil que era escolhido por
estes como um esconderijo. Mas ainda segundo ao autor, o crescimento começou a
acontecer quando, devido à invasão holandesa (1630), foram montadas tropas para
a defesa da colônia, sendo oferecida a alforria para os escravos que lutassem
contra os holandeses. Entende-se por alforria, a liberdade concedida ao escravo via
documento escrito por seu senhor (FERREIRA, 2004).

Muitos dos negros alforriados aproveitavam a primeira oportunidade


para fugir em direção a Palmares, onde estava o quilombo considerado uma das
maiores organizações de escravos negros foragidos das fazendas, tendo os
escravos organizado um verdadeiro Estado, nos moldes africanos, constituído de
povoações diversas, mocambos, governados por oligarcas sob a chefia suprema de
um rei (FREITAS, 1984).

Segundo Bueno (1997), talvez Palmares tenha sido o mais


significativo e simbólico dos quilombos, onde nenhum outro lugar a resistência dos
escravos fugidos, obteve tanto sucesso em relação à organização.

Sob a liderança de um negro conhecido como Zumbi, o quilombo dos


Palmares serviu, durante décadas, como abrigo a todos aqueles que lutavam contra
a condição de escravidão, fossem negros, índios e até brancos, chegando a uma
população de milhares de habitantes e ampliando cada vez mais sua força.
De acordo com Capoeira (1998), Zumbi era um grande lutador que
usando as pernas, desarmava e vencia facilmente seus adversários. Analisando
esta colocação é possível imaginar que a Capoeira já poderia estar sendo praticada
na época dos quilombos, porém, é claro, com uma conotação diferente da praticada
atualmente.
30

A presença forte de Palmares levou os governantes, pressionados


pelos grandes senhores de engenho, a decidirem pelo seu extermínio. De acordo
com Reis e Gomes (1996, p.52) “as comunidades dos quilombos representavam um
desafio ao poder colonial”, além de serem a prova do surgimento e persistência de
uma consciência escrava que lutava contra uma hegemonia manipuladora e
opressora. Burlamaqui (apud SILVA, 1993) caracteriza o negro escravo como:

(...) evidentemente superior na luta, pela agilidade, coragem sangue frio e


astúcia, aprendidas ali, afrontando os bichos, as feras mais perigosas,
lutando mesmo com elas, saltando valados, trepando em árvores as mais
altas e desgalhadas, para se acomodar nas suas frondes, pulando de umas
ás outras como macacos, onde as nuvens batiam. E tiravam partido disso,
tornando-se assim, extraordinariamente ágeis e muito comumente um
homem desarmava uma escolta, punha-a em desordem, fazendo-a fugir
(p.13).

Os negros refugiados no quilombo de Palmares chegaram a vencer


vinte e quatro expedições chefiadas por capitães do mato (homens contratados
pelos senhores ou pelo governo). Segundo Rego (1968), neste momento já se
ousava afirmar que os negros se utilizavam amplamente do que mais tarde viria a
se chamar de Capoeira, para se defender.
Vários autores (VIEIRA, 1995; REIS, 1996; PINTO, 1995) atribuem a
época dos quilombos, o período de gestação da Capoeira. Mas, em 20 de novembro
de 1697, organizou-se uma expedição com sete mil homens, chefiada por Domingos
Jorge Velho, um bandeirante paulista conhecido por sua astúcia e competência em
capturar e aprisionar escravos, foi convidado pelo governo alagoano para
exterminar por completo os quilombos de todo o país e principalmente o quilombo
de Palmares. E em troca de terras, depois de dez anos de sangrentas batalhas,
assim o fez.
Há quem diga que Zumbi se atirou de um rochedo, que lhe cortaram a
cabeça ou ainda que teria morrido com dois tiros a queima roupa, marcando o fim
do quilombo de Palmares, e eternizando o acontecido como fato importantíssimo na
história da resistência negra contra a escravidão (FREITAS, 1984).
Mais tarde, no início de 1970, a data da destruição do quilombo e
morte de Zumbi, seria definida como Dia Nacional da Consciência Negra, como nos
mostra Vogt (2003, p.44):
31

Em 1971, o poeta gaúcho Oliveira Silveira sugeria ao seu grupo que o 20 de


novembro fosse comemorado como o Dia Nacional da Consciência Negra,
pois era mais significativo para a comunidade negra brasileira do que o 13 de
maio. ‘Treze de maio traição, liberdade sem asas, e fome sem pão’, assim
definia Silveira o Dia da Abolição da Escravatura em um de seus poemas.
Em 1971 o 20 de novembro foi celebrado pela primeira vez. A idéia se
espalhou por outros movimentos sociais de luta contra a discriminação racial
e, no final daquela década, já apareceria como proposta nacional do
Movimento Negro Unificado.

Mas durante a escravidão os negros não fugiam apenas para os


quilombos, iam também para os grandes centros urbanos, como afirma Wissenback
(apud SEVECENKO, 1998, p.99):

Durante todo o período da escravidão brasileira, as cidades exerceram uma


enorme atração sobre os grupos de escravos e forros que continuamente se
deslocaram em direção aos núcleos urbanos. Essa atração, que decorria de
vários fatores, tinha como chamariz e esteio à existência de aglomerações
constituídas por tais segmentos sempre dispostas a abrigar recém-chegados.
Costuma-se dizer que estabeleciam territórios negros, espacialidade
marcada por laços sociais, estruturas de parentesco e expressões culturais
singulares que revelaram fulcros significativos no processo de resistência à
dominação escravista e à discriminação social se seguiu.

A chegada às cidades, embora fosse assustadora haja vista a


novidade do desconhecido mostrou a capacidade de socialização do escravo
fugido. A própria extensão da cidade e sua organização social acabava por
propiciar uma forma independente de viver. Algo que o escravo, de certo modo, já
estava acostumado.
Com este movimento de chegada a espaços mais urbanos, Pires
(2001) afirma que a Capoeira deixa de ser prática exclusiva de escravos e passa a
englobar pessoas de diferentes segmentos sociais, como homens livres, imigrantes
e até estrangeiros.
Comenta Capoeira (1998, p.34) que em 1808, a Capoeira passou a
ser expressamente proibida, quando da vinda da Família Real ao Brasil. Aliás, D.
João VI influenciado tanto pelos nobres quanto pelos intelectuais, acreditava que
era fundamental perseguir a Capoeira e toda a cultura local, já que estas
manifestações davam autoconfiança aos praticantes, formando lutadores ágeis e
32

perigosos, além de solidificar a união dentro do grupo sendo um grande empecilho


para os interesses da corte.
Um ano depois (1809) é criada a Guarda Real da Polícia e sob o
comando do Major Miguel Nunes Vidigal passou a amedrontar todos aqueles que
eram adeptos da Capoeira ou de rodas de samba e candomblés, por exemplo.
Segundo Rego (1968) o Major Miguel Nunes Vidigal ficou conhecido como “o terror
dos Capoeiras” devido ao alto grau de severidade nas punições aos que fossem
presos praticando capoeira.
Até metade do século XIX, segundo Holloway (1997), a Capoeira era
utilizada pelos escravos da cidade do Rio de Janeiro em brigas e discussões,
deixando grande número de feridos e mortos. Em 1850, começaram a ocorrer
sucessivas prisões de capoeiras, os quais aterrorizavam a cidade do Rio de
Janeiro, também com a formação das denominadas Maltas, que de acordo com
Reis (2000) eram grupos organizados que, utilizando-se da Capoeira, promoviam a
violência e a desordem servindo aos mais diversos propósitos.
Várias “Maltas” ficaram famosas na cidade do Rio de Janeiro pela sua
constante atuação na vida pública, dentre elas destacaram-se os Nagoas e os
Guaiamus (SOARES, 1994). No cenário político, os Nagoas eram ligados aos
monarquistas do partido Conservador, e os Guaiamus eram ligados aos
Republicanos do Partido Liberal. Para Reis (2000 p. 50), nessa relação é preciso
demonstrar “que tal papel exercido por essas maltas era fruto de uma opção
política, ou seja, quando interessava, servia como um instrumento nas mãos
políticas”.
Como afirma Vieira (1995) os negros capoeiras (no imaginário da
época, considerados maus elementos), bem com aqueles que compartilhavam de
sua revolta, eram incapazes de pensar com autonomia estando, portanto sujeitos à
manipulação política dos propagandistas abolicionistas, estes sim, dotados de
capacidade de reflexão e decisão. Era o preço pago pra que se mantivesse um
certo grau de impunidade.
A Capoeira não esteve iminente só na política, mas também em
momentos importantes, como participação na Guerra do Paraguai (1860-1865)4,

4
Bibliografia indicada para o assunto: DORATIOTO, F. F. M. O conflito com o Paraguai: a grande guerra do
Brasil. São Paulo: Ática, 1996.
33

onde foram enviadas centenas de escravos para os batalhões de frente, pois o


exército brasileiro não possuía grande crédito e não conseguia dominar os conflitos
gerados pela guerra. Soares (1993, p.63), nos dá um panorama de como isso
aconteceu:

Os aliados uruguaios e argentinos não estavam preparados para um conflito


de grandes proporções em virtude de suas divisões internas. A conseqüência
é que foi nos ombros do Exército Brasileiro que recaiu o maior peso do
conflito. Com seus efetivos dramaticamente reduzidos, foi necessário, antes
de partir para a ofensiva, levar a efeito uma feroz campanha de recrutamento
em todos os cantos do país para formar os batalhões de voluntários da
pátria.

Como a Guarda Nacional não conseguia manter os conflitos externos,


e era especificamente usada para problemas políticos, os “voluntários” (negros
escravos) eram caçados para servir como praça nas Forças Armadas.“A promessa
de alforria dos escravos engajados na guerra transformou os quartéis militares em
pontos finais das rotas dos cativos que fugiam das fazendas do interior” (id. p.63).
Assim os negros foram mandados em massa para a Guerra do Paraguai e “lá se
fizeram heróis, portadores que eram de sangue frio, audácia e coragem, tendo-se
em conta que as condições da guerra de então exigia muitos combates corpo a
corpo” (MARINHO, 1956, p.16).
Outro fator histórico marcante em relação à Capoeira, segundo
Carvalho (1999), foi a criação da Guarda Negra, sob a inspiração de José do
Patrocínio. Esta guarda se constituía em uma tropa brasileira que era composta de
uma esquadra de negros capoeiristas, prontos para defender a monarquia, além de
lutar a todo custo para honrar e zelar pela Princesa Isabel em demonstração de
agradecimento a 13 de maio de 1888 (dia da abolição da escravidão).
Os capoeiras da Guarda Negra continuaram sendo úteis aos
princípios monárquicos: não houve um comício dos republicanos que não fosse
dissolvido, segundo Areias (1983).
Com a libertação dos escravos o governo baixou o comando para o
extermínio total dos capoeiristas. Os escravos recém-libertos não possuíam
condições de se integrar na comunidade preconceituosa da época, “muitos ex-
escravos não tiveram como ganhar o pão de forma honesta. Inaptos para o trabalho
34

rendoso, eles tiveram que optar entre a insolvência física e moral (...) daí,
degenerar-se a capoeiragem em práticas turbulentas de agressão inopinada e
desforra covarde” (LISANTI FILHO, 1973, p.337).
Na marginalidade e sem trabalho os negros organizavam-se em
grupos poderosos dos quais também faziam parte pessoas da classe média que se
uniam para proteger negócios escusos e fins políticos. Assim, a formação das
maltas, sua utilização em tumultos contribui para que a Capoeira fosse
marginalizada.
Com a instalação do governo republicano provisório, os capoeiras
foram novamente perseguidos de forma severa, sendo um dos principais alvos de
repressão policial no início da república, recebendo, na revisão do Código de 1890,
por meio do Decreto n° 847, sob o título “Dos Vadio s e Capoeira”, a seguinte
sanção:

Art. 402. Fazer nas ruas e praças públicas, exercícios de agilidade e destreza
corporal conhecidos pela denominação de capoeiragem; andar em correrias
com armas ou instrumentos capazes de produzir lesão corporal, provocando
tumultuo ou desordens, ameaçando pessoa certa ou incerta, ou incutindo
temor de algum mal:
Pena – De prisão celular de dois a seis meses.
Parágrafo Único. É considerada circunstância agravante, pertencer o
capoeira de algum bando ou malta. Aos chefes ou cabeças se imporá a pena
em dobro. (...) (CÓDIGO PENAL BRASILEIRO apud VIEIRA,1995, p.93)

Esta situação se arrasta até o início do século XX e neste espaço de


tempo a Capoeira passa a ser praticada “às escondidas”. Aos poucos vai ganhando
adeptos ilustres e embora ainda fosse vista como atividade marginal, despertava
algum encantamento, iniciando uma nova fase no seu desenvolvimento histórico.
De acordo com Rego (1968, p.03) a Capoeira antes pautada pela
criminalidade e obscuridade social adentra um novo mundo, o da cultura, “por mais
que tentemos não pensar, estes dois mundos como separados, o dualismo, que
tem caracterizado o pensamento cientifico e também o senso comum, possibilita
arquitetarmos essa transição”.
Nesta medida o significado social da Capoeira transforma-se conforme
muda o significado do negro e, sendo assim, em 1930, com o advento do Estado
35

Novo a Capoeira é liberada no Brasil. Foram séculos de perseguição até as


modificações ocorridas na década de 1930.
Em 1937, comenta Araújo (2000), mais precisamente em uma Quarta-
feira, {dez de novembro} é implantado o chamado Estado Novo, regime criado sob
a presidência de Getulio Vargas (1937 – 1945). Ainda de acordo com Araújo, o
regime fora inspirado em doutrinas políticas de todo mundo. A política em vigor
tinha como um de seus ideais, o principio de que o Estado deveria ser superior à
sociedade e ao individuo.
Segundo Carvalho (1999) Getúlio Vargas necessitava de apoio
popular e objetivando a integração do país acabou por liberar várias manifestações,
entre elas a Capoeira. Como a violência estava ficando incontrolável nos centros
urbanos, a permissão da prática da Capoeira restringiu-se ao ambiente fechado das
academias.
Neste momento histórico a Capoeira passou a ser vista também pelos
seus aspectos positivos, ou seja, esta era fruto da mestiçagem ocorrida no Brasil e,
portanto, algo genuinamente brasileiro. Este discurso em favor da mestiçagem foi
ganhando força na medida em que as autoridades notaram a inviabilidade de negar
o grande contingente negro que o Brasil possuía (MELLO, 2000).
Pode-se dizer que a descriminalização da Capoeira ocorreu também
através de sua esportização. Era necessário colocá-la dentro dos valores aceits
pela classe branca e assim ampliar sua aceitação.
Na ânsia de afastar a visão de atividade marginalizada e delinqüente
imposta pela sociedade, surge Manoel dos Reis Machado, Mestre Bimba, com uma
proposta inovadora para a Capoeira. Ele teria incorporado à Capoeira denominada
posteriormente de Regional, elementos de outras lutas como “a luta greco-romana,
jiu-jitsu, judô, além de golpes do chamado batuque (luta nordestina, que seu pai foi
lutador), perfazendo assim um total de 52 golpes” (REGO,1968, p.33).
A Capoeira Regional segundo Falcão (1996, p.68), teria sido
influenciada, pela Educação Física e pelo militarismo que estavam em ascensão na
década de 30 (como veremos no capítulo 3). A prova da influência militarista é
percebida em uma das etapas do “curso” de Mestre Bimba, o treinamento de
guerrilha (emboscadas) realizado nas matas.
E assim, como nos conta Vieira (1995):
36

A primeira academia de capoeira foi fundada por Mestre Bimba em 1932, em


Salvador no Engenho Velho de Brotas, com o nome de ‘Centro de Cultura
Física e Capoeira Regional da Bahia’. Essa academia foi a primeira a receber
a autorização oficial para o ensino da capoeira, em 1937, ano da decretação
do Estado Novo. O mesmo documento, expedido pela Secretaria de
Educação, Saúde e Assistência Pública do Estado da Bahia reconhecia
Mestre Bimba como o professor de educação física (p.138).

A Capoeira sai, então, de seu cenário natural a caminho de ambientes


fechados. Essa passagem reflete mudanças que podem ser observadas na
descrição de Rego (1968):

(...) como o advento de Mestre Bimba, que tira a capoeira dos terreiros e a
põe em recintos fechados, com o nome e caráter de academia, onde os
ensinamentos passaram a ter um cunho didático, (...) a capoeira passou por
modificações profundas. A classe média e a burguesia para lá acorreram, a
princípio para assistirem as exibições e depois para apresentarem e se
exibirem a título de prática de educação física, daí a 9 de julho de 1937 o
governo oficializar a capoeira, dando a Mestre Bimba um registro para sua
academia. Um status social superior ao dos capoeiras invade as academias
e os afugenta. Os que resistem, por minoria, se esforçam para se
enquadrarem no modo de vida invasor, porém sendo tragados por ele,
começando assim a sua alienação e decadência como capoeira. Forçando
uma compostura de rapaz-família, exibem-se somente em recintos fechados,
salões burgueses, palácios governamentais e jamais onde primitivamente se
exibiam, como nas festas do largo (p.361).

Após diversas inovações e o contato com diferentes meios, foram


geradas inúmeras discussões sobre as mudanças ou a perda das raízes da
Capoeira. Preocupados com a legitimação da Capoeira alguns mestres
tradicionalistas, discutiram quanto ao modo de praticá-la. A partir daí, dividiu-se em
duas vertentes: Capoeira Regional e Capoeira Angola. Sobre este fato, Falcão
(1995) comenta:

Mestre Bimba pode ser considerado um divisor de águas na história da


capoeira. Para muitos mestres angoleiros, Bimba foi o grande deturpador da
capoeira. No entanto, para os seus seguidores, um dos herdeiros diretos de
Zumbi” (p.20).
37

Enquanto outras figuras conhecidas da Capoeira como Vicente


Ferreira Pastinha, o mestres Pastinha, defensor da capoeira tradicional (Angola),
insistia na origem africana da Capoeira e na impropriedade de sua fusão como
outras lutas, mestre Bimba (Capoeira Regional), reivindicava a origem baiana da
luta e defendia a incorporação de movimentos corporais provenientes de outras
modalidades esportivas, Reis (2000, p.96,97).
Mestre Bimba, por meio da Capoeira Regional, sofreu influências da
cultura popular baiana no seu desenvolvimento, havendo assim uma mudança dos
objetivos e de conceitos. Já mestre Pastinha não deixou que a Capoeira Angola
sofresse alterações, pois ela foi criada por intermédio da união de conceitos de
vários povos africanos e sendo assim, deveria continuar com a sua própria
identidade, que fosse voltada a cultura negra e suas raízes na antiga África.
Momento que, explica Vieira (1995, p.87), para alguns praticantes tornou-se
confusa, havendo divergências quanto sua classificação. Na mesma visão, Pires
(2001, p. 250) cita que a criação da regional, sem dúvida, produziu conflitos internos
e fissuras na comunidade da capoeira. Ademais, houve um conflito de concepções,
de espaço entre “as ruas” e “as academias”, o que acabou acarretando uma ruptura
entre os grupos, demonstrando interesses contraditórios, como a manutenção das
raízes e a carência da circularidade.
Podemos levantar pontos interessantes sobre o comparativo das
distintas “linhagens” da Capoeira. Primeiramente, percebe-se a solidificação de
frentes distintas, não ao que se refere quanto seu modo de movimentação física
(ginga) ou quanto seu objeto no ritual do jogo, mas sim quanto ao respeito, das
concepções políticas, da identidade cultural.
Verificando a disposição da Capoeira Angola, evidenciam-se pontos
que chamam nossa atenção, como o envolvimento do misticismo e da religião e da
religião, a preocupação com ritual da roda, o predomínio da dança, a presença da
malícia. O que demonstra a direta ligação com as tradições, o enraizamento a
cultura negra, sem oferecer espaço para novas influências ou tendências como as
técnicas marcializantes mais agressivas, a ênfase na competição, na luta.
Processos no qual, os tradicionalistas encaram como uma descaracterização, o que
na verdade se trata apenas de um ciclo de transformação, onde a participação de
38

diversas classes sociais absorve diferentes experiências, o que resulta na


consolidação de uma única cultura.

2.2 As “duas Capoeiras”

A Capoeira Angola apresenta características e estética própria, onde


os capoeiristas se expandem em gestos e movimentos, traduzindo uma mistura de
dança e luta com golpes, rasteiras, com beleza de movimentos.
Mas ainda há uma grande controvérsia em torno da Capoeira Angola,
o que faz com que este seja um dos mais difíceis, senão o mais difícil para se
discutir na Capoeira. Muitos capoeiristas ainda acreditam que a Angola é
simplesmente uma Capoeira jogada mais lentamente, menos agressiva e com
golpes mais baixos, com maior utilização do apoio das mãos no chão. Outros
explicam que ela contém o que há de essencial da filosofia da Capoeira. Há ainda
aqueles que, mais radicais, chegam a afirmar que a Capoeira Angola foi
completamente superada na história dessa arte-luta pelas técnicas mais modernas,
que seriam mais eficientes e adequadas aos tempos atuais.
Mestre Pastinha, em seu livro Capoeira Angola, (apud VIEIRA, 1995)
afirma que “sem dúvida, a Capoeira Angola se assemelha a uma graciosa dança
onde a ‘ginga’ maliciosa mostra a extraordinária flexibilidade dos capoeiristas. mas,
Capoeira Angola é, antes de tudo, luta e luta violenta” (p.32).
É importante observar que, tradicionalmente, o ensino da antiga
Capoeira Angola ocorria de maneira vivencial, isto é, de forma espontânea, sem
qualquer preocupação metodológica. Os mais novos aprendiam com os
capoeiristas mais experimentados diretamente, com a participação na roda.
Atualmente, a maior parte dos capoeiristas refere-se à Capoeira
Angola com uma das formas de se jogar Capoeira, não propriamente como um
estilo metodizado de Capoeira. Para os não iniciados nesta luta, é importante
lembrar que a velocidade e outras características do jogo da Capoeira estão
diretamente relacionados com o tipo de “toque” executado pelo berimbau
(instrumento rústico composto por uma verga de madeira, um fio de aço e uma
cabaça). Entre vários outros, existe aquele denominado toque de Angola, que tem a
39

característica de ser lento e compassado. Dessa forma, “jogar Angola” consiste, na


maioria dos casos, em jogar Capoeira ao som do toque de Angola. Este cenário, no
entanto, vem mudando, com a enorme proliferação dos fundamentos dessa
modalidade (VIEIRA, 1995).
Dessa forma, a maior parte das academias e associações de Capoeira
do Brasil, ao realizarem suas rodas têm o hábito de dedicar algum tempo ao jogo de
Angola, que nem sempre corresponde àquilo que os antigos capoeiristas
denominavam Capoeira Angola.
Portanto, afirma Vieira (1995), o jogo de Angola caracteriza-se por
uma grande utilização das mãos como apoio no chão, e pela execução de golpes
de pouca eficiência combativa, mas baixos e mais lentos, realizados com um maior
efeito estético pela exploração do equilíbrio e da flexibilidade do capoeirista, como
também afirma Couto (1999):

A ginga é a base dos movimentos da capoeira Angola; o corpo dança e luta


ao mesmo tempo, ela impede o confronto direto entre os capoeiristas. É a
partir dela que sairão os golpes e contragolpes, o alvo do ataque é a cabeça
do outro, os corpos não se tocam, apenas as mãos e os pés devem tocar o
chão (p.18).

Por sua vez, a Capoeira Regional é caracterizada pela agilidade de


seus movimentos, bem como a variedade bem maior do que os da Capoeira
Angola. Mestre Bimba colocou mais agilidade nos movimentos da Capoeira Angola,
pois queira ver um jogo alegre, festivo, acrobático e, principalmente, ágil. Colocou,
também, algumas influências do batuque, dando ainda mais agilidade à luta. Tudo
isto aconteceu por volta do ano de 1928 (ALMEIDA, 1994) e, esta modalidade de
Capoeira ganhou, primeiramente, o nome de Capoeira Regional Baiana por ser, na
época, praticada somente em Salvador e, a partir da década de 1930, quando foi
instituído o Estado Novo e Mestre Bimba levou o seu estilo de Capoeira para as
classes mais privilegiadas da sociedade e quando fez, como já comentado, a
primeira apresentação no Palácio do Governo, onde estavam presentes várias
autoridades importantes e muitos convidados da ‘alta sociedade’. Após este evento,
a Capoeira Regional foi reconhecida como esporte nacional e Mestre Bimba foi
reconhecido pela Secretaria de Educação e Assistência Social da Bahia como
professor de Educação Física e a sua academia/escola passou a ser conhecida por
40

lei, em 1932 como a primeira do Brasil. Sendo assim, “a Capoeira Regional é


esporte, porque é um conjunto de exercícios físicos praticados com métodos, em
todos os estados da Federação” (COUTO, 1999, p 24).
O estilo Regional de jogar Capoeira é marcado pela rapidez de seus
golpes e contra-golpes e pelo ritmo acelerado dos toques do berimbau
acompanhado do atabaque e do pandeiro. Na roda de Capoeira Regional,
atualmente, são utilizados três berimbaus (Gunga, Médio e Viola), acompanhado do
atabaque, de dois pandeiros; e as palmas do povo da roda são batidas em três
compassos. E é somente na Regional que existe o “toque de Iúna”, que foi criado
por Mestre Bimba para o jogo dos discípulos graduados e do Mestre. A Capoeira
Regional de Bimba passou a ser ensinada até mesmo em quartéis, universidades,
clubes sociais, e outras instituições públicas sem interferência dos “moralistas” da
época.
Os movimentos da Capoeira Regional são diferenciados e mais
variados do que os da Angola e alguns dos mais rápidos e perigosos são: armada,
queixada, meia lua de compasso, meia lua solta, bênção, martelo, arrastão, meia
lua de frente, aú, pisão rodado, joelhada, giro de costas entre outros.
Para melhor compreensão desse embate de concepções, apresenta-
se nas obras de Vieira (1995 p.87/88) e Reis (2000, p.192-194) esquemas que
facilitam o entendimento das principais diferenças ente a capoeira angola e a
capoeira regional (quadros 1 e 2).

QUADRO 1. Comparativo capoeira angola e regional.

Capoeira Angola (tradicional) Capoeira Regional


Original Descaracterizada
Tradicional Moderna
Jogo baixo Jogo alto
Jogo lento Jogo rápido
Recreativa e maliciosa Agressiva e sem malícia
Envolta de religiosidade e misticismo Secularizada e isenta de simbolismos
religiosos
Integração à cultura negra Expressão da dominação branca
41

Praticada pelas camadas sociais Praticadas pelos estratos sociais


marginalizadas médios e superiores
Fonte: (VIEIRA, 1995)

QUADRO 2. Comparativo entre capoeira angola e regional.

Capoeira Angola (tradicional) Capoeira Regional


Movimentação constante pela ginga Movimentação constante pela ginga
baixa alta
Os jogadores mantêm-se Jogo centrado no ataque.
aparentemente na defesa e atacam
quando o oponente menos espera.
Alvo é a cabeça do outro Alvo é a cabeça do outro
Os corpos não se tocam Quando não há espaço suficiente o
capoeirista deve usar os golpes
atingindo o corpo do outro
A intenção deve ser sempre A intenção deve ser sempre de
desequilibrar o outro, o que acontece derrubar o outro, em geral com golpes
menos pela forca muscular e mais pela desequilibrantes.
malícia.
Há uma ênfase na dança Ênfase na luta, pois os movimentos
são traumatizantes
Fonte: (REIS, 2000).

De fato, Vieira (1995) afirma que delimitar a separação entre essa


duas escolas da Capoeira é algo muito difícil hoje em dia, e há muitos anos sabe-se
que a tendência é que a Capoeira incorpore as características dessas duas escolas.
No entanto, é fundamental que os capoeiristas conheçam a sua história, para que
possam desenvolver sua luta de maneira consciente. A Capoeira Angola e a
Capoeira Regional estão fortemente impregnadas de conteúdo histórico, e não se
excluem, ao contrário, completam-se e fazem parte de um mesmo universo cultural.
Devemos entender as diferenças entre a Capoeira Angola e a
Regional como conseqüência de um período histórico em que o contexto e as
influências sociais foram sendo determinantes para que elas ocorressem, uma
42

vertente não anula a outra nem tampouco a ela se sobrepõe, ambas se


complementam, “formando o universo simbólico e motor da Capoeira” (MELLO,
2000, p.05).
A partir dos anos de 1960, em decorrência da migração de
capoeiristas baianos para vários estados brasileiros, (principalmente São Paulo e
Rio de Janeiro) começaram a surgir os grupos de Capoeira. Esses grupos são
organizações existentes até os dias de hoje, que congregam seus participantes sob
princípios filosóficos e técnicos, princípios estes que não são hegemônicos. Isto
explica a grande quantidade de grupos existentes.
Segundo Santos (1990), em 1972 a Capoeira é registrada como
prática desportiva regulamentada pela Confederação Brasileira de Pugilismos, a
partir daí a modalidade vem sendo valorizada progressivamente, conquistando
espaço no cenário artístico, esportivo, cultural e educacional do Brasil.
Após os períodos aqui explicitados, a Capoeira perpetuou-se
alcançando outras esferas, conquistou lugar na promoção da saúde, em debates e
encontros acadêmicos, e principalmente na sua inserção como meio pedagógico,
chegado a ser ministrada como disciplina curricular de Cursos de Educação Física.
Fato este que será melhor argumentado no capítulo três deste trabalho.
43

CAPÍTULO III

3.1 A EDUCAÇÃO FÍSICA FRENTE A EVOLUÇÃO PARADIGMÁTICA DA


EDUCAÇÃO

3.1.1 A Educação Física e os Paradigmas Conservadores da Educação

Para o entendimento do processo que deu crédito à Capoeira


enquanto disciplina dos currículos de cursos de Educação Física é necessário que,
inicialmente, verifiquemos todo o processo de desenvolvimento da própria
Educação Física como curso superior e sua articulação às abordagens
educacionais.
No período histórico brasileiro entendido como Primeira República
(1889-1930) a Educação Física surge como disciplina curricular. Sua função era
higienista, ou seja, era necessária para a saúde e assepsia social e saneamento
público, na busca de uma sociedade livre de doenças, através da disciplina escolar
(Tolkmitt, 1996).
De acordo com Costa (apud CASTELLANI,1991, p.42), o objetivo da
Educação Física era “assegurar a saúde e o vigor dos corpos, aumentando a
reprodução e longe dos indivíduos, incrementar a população do país e melhorar os
costumes privados e a moral pública”.
Crespo (1990) também afirma que o exercício desempenhava um
papel fundamental na conservação da saúde. Esta importância resultava,
especialmente, da sua capacidade para dinamizar o calor natural, fator decisivo no
aumento da transição que facilitava a eliminação da matéria prejudicial ao corpo.
A Educação Física neste contexto era militarista, além de que
higienista, ou seja, objetivava também a preparação militar, a disciplina cívica, o
endurecimento do corpo e o aumento da energia física: homens fortes para a
defesa do país e adestrados para o combate. A Educação Física era a instrução
física militar.
De acordo com Tolkmitt (1996, p. 176), na Educação Física militarista
o professor:
44

(...) era o modelo que o aluno reproduzia passivamente, pois este era
adestrado e apenas executava as prescrições do professor (...) Os
exercícios eram repetitivos, mecânicos, extraídos de um rol de receitas. A
avaliação se dava pela reprodução de um modelo atleticamente bem
configurado e/ou através de uma bateria de testes pré-determinados pelos
poderes públicos.

A educação como um todo estava pautada num paradigma


conservador tradicional, onde a apropriação e transmissão do conhecimento são
compromissos que devem ser transmitidos pelos professores através de conteúdos
e de modelos pré-determinados.
Nesta perspectiva, é possível perceber a escola como um ambiente
disciplinado, sem muito estímulo, onde o aluno não poderia ser distraído sob pena
de prejudicar sua aprendizagem estabelecendo-se assim, uma relação de
dependência com o professor pela forma de transmissão e repetição das
instruções. O professor, nesta concepção, é o centro do processo de ensino,
atuando com severa autoridade, para garantir que todos os alunos aprendam em
condições iguais.
Behrens (2005, p.43) afirma que a abordagem tradicional “é
referendada por uma visão cartesiana, onde a metodologia fundamenta-se em
quatro pilares: escute, leia, decore e repita”.
Com relação à Educação Física, os pressupostos higienistas
determinavam um novo modelo de homem também fundamentado numa visão
cartesiana mecanicista onde corpo e mente são vistos como duas coisas distintas.
A partir da década de 1930, com a chegada de Getúlio Vargas ao
poder, surgem novas concepções de como deveria ser o novo homem brasileiro, a
chamada “retórica do corpo”, ou seja, corpos adestrados em defesa da Pátria. Para
Araújo (2000, p.13) a filosofia de Vargas dizia que o patriotismo constituiria a nação.
Assim como a política, nesta época a educação também sofreu
transformações e a abordagem em voga era a Escola Nova.
A pedagogia da Escola Nova parte das relações entre o sujeito e o
seu meio tendo como preocupação principal as diferenças individuais.
O ensino deixa de centralizar-se no professor para focar-se no aluno,
entendendo que é preciso levar em consideração seus anseios e necessidades.
45

Sobre estas considerações Ferreira (1999, p, 7) trás sua contribuição afirmando que
a escola, no contexto escolanovista “deve ser ativa e basear-se no princípio da
necessidade constituindo-se num ambiente estimulador, capaz de mobilizar a
atividade do aluno e catalisar as energias necessárias ao seu auto-
desenvolvimento”.
A Educação Física, por sua vez, demora a se desvencilhar dos antigos
conceitos militarizantes de educação, voltados ao físico, à formação do homem
obediente e adestrado, desprivilegiando a reflexão teórica (BETTI, 1991). Mas vai
gradativamente atendendo as mudanças políticas e econômicas do período,
enfocando o esporte com mais precisão, tornando-o meio para a construção de
“máquinas humanas” a serviço da Pátria.
A Escola Nova propunha o oferecimento de condições que
facilitassem o aprendizado do aluno, tornando-o responsável por sua própria
aprendizagem. Como comenta Mizukami (1986, p.45):

Tudo o que estiver a serviço do crescimento pessoal, interpessoal ou


intergrupal é educação. O objetivo da educação será uma aprendizagem que
abranja conceitos e experiências, tendo como pressupostos um processo de
aprendizagem pessoal. Nesse processo, os motivos de aprender deverão ser
do próprio aluno.

Na teoria, esta visão focada nos interesses do aluno era muito bem
aceita e podia ser perfeitamente adaptável em aulas de Educação Física. Assim,
este passou a ser objetivo descrito em planos de ensino da época da disciplina,
porém não era o que acontecia na prática pedagógica dos docentes, ministrada
quase que somente sob a forma de atividades esportivas (BARROS, 2006, p.20).
Já na década de 1960, muitas foram as mudanças políticas ocorridas
no Brasil e com o forte impulso na industrialização, a educação brasileira sofre
grande interferência de educadores americanos. Estes educadores juntamente com
o governo brasileiro implementaram a Lei 5692/71 e divulgaram os pressupostos da
chamada abordagem Tecnicista.
Tal abordagem baseia-se em princípios como a racionalidade, a
eficiência e a produtividade em contraposição aos ideais então propostos pela
Escola Nova.
46

Para Libâneo (1986, p.31) “a pedagogia Tecnicista foi introduzida


efetivamente no final dos anos 60, como o objetivo de adequar o sistema
educacional à orientação político-econômica do regime militar: inserir a escola nos
modelos de racionalização do sistema de produção capitalista”.
Assim, a escola passou a ser utilizada como meio de preparação de
mão-de-obra. O objetivo maior do aluno era sair da escola com uma profissão nas
mãos, tendo a exata noção do quão estaria sendo útil para a sociedade. O ensino
era funcional.
A Educação Física logo foi contagiada pelos ideais tecnicistas. Neste
período a competitividade é elevada. A Educação Física é colocada como apêndice
de um projeto que privilegia o treinamento desportivo para o esporte de alto nível,
onde marcada pela ditadura militar acaba se tornando propagandista do governo,
onde o professor é o técnico e o aluno o atleta (BRACHT, 1992).
Na escola, as aulas de Educação Física enfatizam a busca de talentos
esportivos, a performance, a quebra de recordes, a vitória sempre, ao mesmo
tempo em que preparava indivíduos para a manutenção da força de trabalho.
Bracht (apud MOREIRA,1991, p.175) fala da Educação Física
tecnicista enquanto servidora das idéias políticas vigentes no período:

(...) essa forma de transmitir onde o esporte educa, se educação aqui


significa levar o aluno a internalizar valores, normas de comportamentos, que
lhe possibilitará se adaptar à sociedade vigente. É uma educação que leva
ao acomodamento, ao fatalismo e não ao questionamento; uma educação
que ofusca ou lança uma cortina de fumaça sobre as contradições da nossa
sociedade. Uma educação que não leva à formação de um aluno crítico,
consciente e sensível a realidade que o envolve.

Até o final da década de 1970 estes foram os ideais de educação


propostos para a Educação Física. Pode-se perceber que urgia a necessidade de
mudanças e estas aconteceram já no início de 1980 como veremos a diante.
47

3.1.2 A Educação Física e os Paradigmas Inovadores da Educação

No início da década de 1980 a Educação Física atravessa um período


de reformulação e redirecionamento metodológico. Surgiram questionamentos
sobre o pensamento dominante (conservador) o que favoreceu o surgimento de
novas propostas.
De acordo com Falcão (1996, p.57) nesta época (1980) começaram a
aparecer indícios de medidas que promoveriam significativas mudanças nos
currículos dos cursos superiores de Educação Física. O processo de
desmilitarização da Educação Física amenizou o comportamento autoritário e
hierarquizado dos professores da área.
No final do século XX, houve a necessidade de uma educação para o
progresso da humanidade e o desenvolvimento do ser humano total.
Giraldelli Júnior (1988) acredita que a Educação Física necessitava de
um novo enfoque: o enfoque progressista; embasado em pressupostos da
Pedagogia Crítico-Social dos conteúdos, onde é preciso engajar-se crítica e
intelectualmente na sociedade e comprometer-se com o seu objeto de estudo.
Neste sentido, Freire (1992, p.135-136) nos fala sobre as indagações
decorrentes de uma ação docente ideal:

(...) que conteúdos ensina, a favor de que ensiná-los, a favor de quem,


contra que, contra quem? Que escolhe os conteúdos e como são
ensinados. Que é ensinar? Que é aprender? Como se dão as relações
entre ensinar e aprender? Que é o saber de experiência de feito?
Podemos descartá-lo como impreciso, desarticulado? Como superá-lo?
Que é o professor? Qual o seu papel? E o aluno, que é? E o seu papel
não ser igual ao aluno significa dever ser o professor autoritário? É
possível ser democrático e dialógico sem deixar de ser professor,
diferente do aluno? Significa o diálogo um bate-papo inconseqüente
cuja atmosfera ideal seria a do “deixa como está pra ver como é que
fica”? Pode haver uma séria tentativa de escrita e leitura da palavra sem
a leitura do mundo? Dignifica a crítica necessária à educação bancária
que o educador que a faz não tem o que ensinar e não deve fazê-lo?
Será possível um professor que não ensina? Que é a codificação, qual o
seu papel no quadro de uma teoria do conhecimento? Como entender a
relação teoria-prática sem que a frase vire a frase feita? (Grifo nosso)
48

Ou seja, do ponto de vista da abordagem progressista o professor


precisa tornar-se reflexivo sobre sua própria ação docente. Afinal, não são raros os
dias em que nós, professores, entramos em uma sala de aula, dia de “prova” e ao
encontrarmos uma turma quieta, com sinais claros e visíveis de medo sentimo-nos
como seres super-poderosos. Também não são raras as situações onde nós,
professores elogiamos o aluno calado, anônimo, que não expressa opiniões, mas
que diz sim senhor à todas as nossas questões.
Como afirma Freire (1997, p.100) já fomos um tipo de professor que
“em função do passado autoritário, nem sempre com segurança por uma
modernidade ambígua, oscila-se entre formas autoritárias e silenciosas. Entre uma
certa tirania da liberdade e o exacerbamento da autoridade ou ainda, na
combinação das duas hipóteses”. E ainda pela falta pura e simples do diálogo
deixamos de ser “professores progressistas”.
Numa abordagem progressista, o professor encoraja o aluno a buscar
o pensamento divergente entendendo isto como parte do processo de ensino.
O “aluno progressista” é um sujeito autônomo que organiza sua
própria experiência e constrói conhecimento em interação com o mundo e com o
outro. É crítico e ativo, auto-confiante, reflexivo, como aponta Misukami (1986).
Há que se ressalvar, quanto às aulas de Educação Física, no
momento em que as ditas “aulas livres” são tão comuns. Fazer com que o aluno
aprenda por ele mesmo não significa deixá-lo descobrir o mundo sozinho. A auto-
descoberta deve ser buscada sim, mas com responsabilidade como fala Freire
(apud DANKE, 1995, p.88):

O papel do professor adquire relevância nessa concepção de educação. Sua


tarefa principal é problematizar. À medida que dialoga cabe ir chamando a
atenção para pontos obscuros ou ainda ingênuos, bom como para as
descobertas que estão sendo feitas pelos sujeitos envolvidos na situação.

Logo, a abordagem progressista mostra novas propostas para a


prática pedagógica do professor de Educação Física, transpondo velhos padrões
impregnados na prática diária, transformando a aula “num ambiente crítico, onde a
riqueza cultural se estabelece com trampolim para a crítica” (GHIRARDELLI
49

JÚNIOR, 1998, p.58). Assim, na Educação Física o conflito foi crucial para a
mudança e neste sentido, Gusdorf (1997) comenta que sempre que o ser humano
entra em conflito com o Ocidente, ele procura o Oriente. A esse respeito afirma
Buarque (1994, p.37):

Com a redescoberta do pensamento oriental, com a aceitação de formas


alternativas de pensar, o Ocidente começa a contestar seu materialismo
como objetivo e como método de pensar. Surge uma valorização do uso da
intuição, do sentimento, da globalidade. Ressurge uma prática de
espiritualidade sem complexo de inferioridade. O holismo se afirma como
uma prática intelectual... a universidade ensina todos os nomes de todos os
rios, mas anula nos alunos a capacidade de emocionar-se ao ver um deles.
Ensina por que a economia se desequilibra, mas leva cada aluno a ignorar
que há nomes por trás do desemprego criado.

Na busca deste ensino que privilegie uma totalização do indivíduo,


surge a visão holística da educação. O paradigma holístico estaria, na visão de
Capra (1995, p.14) substituindo “os conceitos de uma visão de mundo obsoleta – a
visão de mundo mecanicista da ciência cartesiana-newtoniana”. O autor elabora em
seu livro "O ponto de mutação", uma descrição detalhada de como o mecanicismo
cartesiano foi incorporado por todas as ciências tradicionais, levando à crise
individual, social e ambiental de caráter global que vivemos hoje.

A visão holística pretendida estimula não apenas o bom desempenho


social ou a criticidade pertinente a um ser transformador de estruturas, mas sim
uma visão que estimule o educando a “aprender a aprender” para desenvolver suas
potencialidades.

Aprender a aprender na concepção da Educação Física, segundo


Barros (1996) pode significar que o aluno deve ser levado pelo professor a entender
o mundo, ter prazer no conhecimento, desenvolver a criatividade, curiosidade, o
senso crítico e a aquisição de autonomia, isto tudo através do movimento.
De acordo com Capra (1993, p.14):

Para descrever esse mundo apropriadamente, necessitamos de uma


perspectiva ecológica que a visão de mundo cartesiana não nos oferece.
Precisamos, pois de um novo “paradigma”... uma nova visão da realidade,
uma mudança fundamental em nossos pensamentos, percepções e valores...
50

da concepção mecanicista para a holística da realidade, já são visíveis em


todos os campos e suscetíveis de dominar a década atual.

Podemos facilmente encarar a abordagem holística, como uma


abordagem mais humana, pois inovadoramente, considera a intuição e o
sentimento como meios de construção do real e não somente a razão como vinha
sendo feito sob o aspecto de paradigmas mais conservadores.
Segundo Crema (1995), só somos seres inteiros quando
desenvolvemos as faculdades cerebrais tanto do hemisfério esquerdo
(racionalidade crítica, lógica, memorização), quanto do hemisfério direito
(criatividade, sensibilidade estética, paixão, sentimento).
Corroboramos com Paulo Freire quando fala da incompletude do ser,
estando este em formação e constante desenvolvimento, porém a concepção de
seres inteiros acompanha o novo paradigma.
Baseada na concepção holística, conforme defendida por Capra
(1988, p.207-208), Costa (1997) apresenta a educação como elemento chave
nesse contexto. A autora propõe o resgate da totalidade como contraponto à visão
fragmentada de homem. Nesse aspecto, defende uma Educação Física liberta do
caráter instrumental para ser meio da ou meio de uma Educação Física que,
independente da atividade empregada (dança, ginástica ou esporte), seja uma ação
política com as seguintes características: dialógica, democrática, socialmente
produtiva e libertadora. Ao fazer a crítica ao processo de formação profissional, a
autora assim se expressa:

(...) parece não ter havido uma preocupação dominante com a formação
completa do profissional de Educação Física. Se a maioria dos cursos está
voltada para a formação de profissionais do ensino, quase sempre em
completa desarticulação entre os departamentos de Educação Física e as
faculdades de educação, isso implica uma formação limitada e deficiente,
deixando campos de ação profissional sem formação específica (p. 217).

Face a estas questões é possível imaginar o quanto pode ser sofrível


para a Educação Física redimensionar toda a sua visão compartimentada de
educação, sustentada até pouco tempo atrás por uma cultura dominante. As ações
da Educação Física sempre giraram em torno da competência, da eficácia e da
51

produtividade. Behrens (2005, p.59) fala sobre este desafio que não é só da
Educação Física:

O grande desafio da visão holística será a superação do saber fragmentado


que foi dividido nas escolas em disciplinas isoladas, assemelhando-se ao
trabalho na indústria que se tornou especializado e repartido em setores, e,
por conseqüência, os homens passaram, na escola e no trabalho, a se
restringir a tarefas estanques sem a consciência global do processo e do
produto a ser produzido.

Valores como a educação dicotômica de corpo e mente, ainda tão


presentes na Educação Física precisam ser quebrados para que uma educação
holística junto a ela se efetive, já que seus conteúdos buscam um equilíbrio do
desenvolvimento harmonioso do aluno em todas as suas dimensões: corpo,
intelecto, sentimento e espírito.
Como acredita Crema (1995, p.64):

Nem o educador e nem o educando são, isoladamente, o centro energético


que impulsiona o processo de aprendizagem. Este centro está no encontro
ente eles, como numa dança em que os passos marcados acabam por fluir
livremente, tornando quase imperceptível quem conduz ou quem é
conduzido.

A recente abertura para a análise de novas epistemologias na prática


da pesquisa em Educação Física indica novos caminhos para a área permitindo a
integração dessa com outras áreas do conhecimento.
Feitosa (1986) destaca que os professores de Educação Física ainda
não conseguiram vislumbrar, em suas ações teórico-práticas, a dimensão social da
Educação Física que justifique sua própria existência. Para este autor a Educação
Física deveria comprometer-se com a “tomada de consciência”, como fator decisivo
para que o ser humano reconheça o seu direito à liberdade.
Com o início da década de 1990, a educação novamente ruma em
direção às mudanças sociais. A informação e o conhecimento agora estão
disponíveis em redes de informática e comunicação.
Behrens (2005, p.81) nos afirma que:
52

Os meios informatizados atravessaram fronteiras e disponibilizaram o


conhecimento causando uma revolução nos meios de comunicação e,
especialmente, da aprendizagem em geral. O desafio que se impõe nessa
sociedade é o de como acessar a informação recebida, como interpretá-la e,
acima de tudo, como produzir novas informações com criatividade, ética e
visão global.

O desafio comentado pela autora é visto sob a ótica de uma outra


abordagem chamada de Ensino com Pesquisa. Neste contexto, interpretar as
informações recebidas, transformá-las, primando pela ética e por uma visão global
torna-se desafio ainda maior, pois a base matriz da abordagem do Ensino com
Pesquisa coloca o aluno na situação de co-responsável pela aprendizagem e o
professor só pode ensinar aquilo que pesquisa. Caso contrário, apenas ensinara o
aluno a fazer cópias.
Para Demo (1991, p.14) “quem ensina carece pesquisar; quem
pesquisa carece ensinar. Professor que apenas ensina, jamais o foi”.
A pesquisa deve subsidiar o aluno para que ele leia, reflita e produza
conhecimento. Daí a importância do professor, neste momento, portar-se de forma
dinâmica e criativa, mediando a reflexão do aluno e auxiliando na construção de
seu conhecimento através de um ambiente inovador e extremamente participativo.
Como propõe Demo (1996, p.47):

A competência que a escola deve consolidar e sempre renovar é aquela


fundada a propriedade do conhecimento como instrumento mais eficaz de
emancipação das pessoas e da sociedade. Neste contesto, mera
transmissão é pouco, embora como insumo seja indispensável. Em termos
emancipatórios, competências jamais coincidiria como cópia, reprodução,
imitação. Torna-se essencial construir atitude positiva, construtiva, crítica e
criativa, típica do “aprender a aprender”.

Com relação à Educação Física, pode-se pensar que a execução de


um movimento corporal não tenha significado social ou que possa ser refletido,
pensado, passível apenas de repetições por parte dos alunos, porém esta é uma das
posturas que se pretende estinguir com trabalhos como este.
A linguagem corporal quando vivenciada na educação, pode abrir
perspectivas de construção e produção de equilíbrio nos processos de
aprendizagem, nos quais “a discussão sobre o conhecimento abarca hoje todos os
processos naturais e sociais onde se geram, e a partir daí são levadas em conta,
53

formas de aprendizagem. Tudo aquilo que vive cumpre processos cognitivos”


(ASSMANN,1996, p. 26-27).
Ainda de acordo com Assmann:

Vejo a ponte fundamental entre motricidade e educação no papel


fundamental da participação corporal nos processos de aprendizagem. Todo
conhecimento se instaura como um aprender mediado por movimentos
internos e externos da corporeidade viva. Toda aprendizagem tem uma
inscrição corporal. Não existe mentalização sem corporalização. Por isso, o
corpo aprendente é a referência fundante de toda aprendizagem. A
morfogênese do conhecimento acontece no interior da motricidade corporal
do ser humano. E a unidade dos processos cognitivos com os processos
vitais obedece normalmente a uma dinâmica de prazerosidade (1996, p. 47).

A Educação Física, enquanto ramo pedagógico na educação básica,


entendida como uma área responsável pelo ensino de conhecimentos deve
proporcionar aos alunos, pelos conteúdos que lhes são específicos, situações que
envolvam análise, reflexão e abstração sobre sua motricidade, não se limitando
apenas a um simples “fazer” no qual o aluno é “configurado” como executor de
movimentos padronizados, estereotipados, mecânico (PALMA, 2001).
O Ensino com Pesquisa, então, enquanto proposta para a Educação
Física pode operacionalizar os conteúdos curriculares de maneira integrada,
sistêmica, proporcionando, como resultado, uma educação interdisciplinar e uma
visão de mundo integrada e não mais fragmentada como ocorre no ensino
tradicional. Despertando o interesse dos alunos, pois os mesmos aprendem fazendo,
resolvendo um dos maiores problemas em escolas dos dias de hoje - garantir a
motivação dos alunos e sua atenção para o aprendizado.

3.1.3 A Educação Física e o Paradigma Emergente ou da Complexidade

A constante busca por referenciais educacionais inovadores que


transformem a educação visando a produção do conhecimento em detrimento da
sua pura e simples reprodução, delineou a formação de um novo paradigma. A
denominação: Paradigma Educacional Emergente é uma proposta de Boaventura
Santos (1989) e referendado por Moraes (1997), Pimentel (1993). Neste caso,
Behrens (2006) propõe o paradigma emergente ou da complexidade com uma
54

aliança entre a abordagem holística, a abordagem progressista e a abordagem do


ensino com pesquisa que juntas fazem parte das propostas do paradigma
emergente podendo assim contribuir para uma aprendizagem compatível com as
exigências deste novo milênio.
Se como afirma Moraes (1997,p.199-201) uma das metas da
educação é levar o aluno a produzir conhecimento, o processo de renovação
paradigmática aqui referido, deve levá-lo a desenvolver uma atitude construtiva
para a produção deste conhecimento.
Hoje, a visão newtoniana ou cartesiana do mundo, está sendo muito
criticada, uma vez que focaliza o conhecimento por partes e retalha a visão de
totalidade. Porém, o que não se pode esquecer é que esta mesma visão, também
foi responsável pela própria democratização do conhecimento e pela formulação de
um espírito científico de investigação aberta e validação pública do conhecimento
(MORAES,1997 p. 42).
Talvez este tenha sido o principal motivo pelo qual a educação se
deixou levar por tanto tempo, devido ao grande arraigamento desta idéia em toda
sociedade, que por conseqüência, se instala com mais propriedade na educação
Isto pode ser percebido quando observarmos que a própria escola
atual, por exemplo, caracteriza-se como uma instituição fechada, que obedece a
normas pré-estabelecidas por estruturas “enlatadas”, longe da realidade social.
Esse fenômeno se reflete facilmente em sala de aula, revelando um
descompromisso com a tão sonhada postura crítica e reflexiva de docentes e
discentes.
Na maioria das vezes, até nos consideramos educadores condizentes
com o modelo do paradigma emergente ou da complexidade, porém nossa prática
continua conservadora. Sabemos dos encantos e da adequação do novo
paradigma ao nosso tempo, mas a tal práxis, ou prática reflexiva, ainda acontece
pouco.
Aliás, observar e compreender o contexto social regente se torna
fundamental durante a mudança paradigmática. É cruel perceber a aceleração na
transmissão do conhecimento, gerado pelo intensivo uso da tecnologia, milhares e
milhares de crianças no mundo todo não têm acesso sequer ao ensino fundamental
enquanto cresce absurdamente o número de analfabetos.
55

O Informe Mundial de Educação para todos, publicado pela Unesco,


corrobora esses dados e também mostra que:

(...) continua existindo uma grande defasagem no nível de conhecimento


entre os países do Norte e do Sul, especialmente no que se refere à
capacidade de assimilar e aplicar ciência e a tecnologia de um maior acervo
de informações científicas e melhores condições de realizar suas próprias
aspirações de desenvolvimento, bem como de intervir no processo de
interdependência mundial. Os dados mundiais sobre educação colocam-nos
diante de uma dura realidade, demonstrando que os países, pelo menos
parcialmente, não deram a devida prioridade à dimensão humana do
desenvolvimento, deixando de oferecer uma educação básica adequada e
necessária à população (UNESCO,1993)

O que significa que a sociedade do conhecimento já existe, mas para


poucos. Os excluídos economicamente são também os excluídos da sociedade do
conhecimento.
No entanto, Behrens (2005, p.103) afirma que “nesse momento
histórico, em decorrência das dificuldades de acesso aos recursos de ensino de
última geração, o docente precisa investigar o uso de tais instrumentos, mas
salvaguardar as possibilidades de realizar um bom projeto com recursos disponíveis
na escola e na comunidade”.
Por outro lado, Templenton (apud MORAES 1997, p.114) reconhece
que estamos vivendo uma era maravilhosa, um período sem precedentes na
história da humanidade, muito embora, este também seja um mundo de dramáticas
mudanças políticas, econômicas, culturais e espirituais.
Enfrentando obstáculos, na grande maioria sócio-econômicos a
globalização de informações através de grandes redes digitais continua sua
marcha.
Moraes (1997, p. 125-126) nos mostra alguns exemplos:

O desenvolvimento de automação bancária melhorou muito a qualidade dos


serviços que os bancos prestam a seus clientes, fazendo com que as filas
diminuam de tamanho ou mesmo se extingam, possibilitando ao cliente a
resolução de seus problemas sem precisar sair de casa ou do escritório.
Graças ao sistema de código de barras, agilizam-se as compras nos
supermercados, e o indivíduo pode fazer sua caminhada sem sair de casa,
utilizando aparelhos que incorporam os últimos avanços da medicina
esportiva e que permitem a realização de exercícios mecânicos com a
56

mesma precisão de quem tivesse caminhado alguns quilômetros. Há


computadores nos aviões, nos carros, nos aparelhos de som e de televisão,
nas geladeiras e nos fornos de microondas, que estão revolucionando a
maneira de morar, trabalhar, fazer compras e se comunicar. Depois do
papel-moeda, do cheque e do cartão de crédito, temos hoje o cartão
inteligente, que memoriza dados do cliente e pode ser carregado e
recarregado a serem realizados (...) é um mundo que fica cada vez mais
digital.

Talvez o professor, dia-a-dia em sala de aula, não esteja preparado


para ter o conteúdo por ele exposto confrontado com informações captadas pelo
aluno na Internet. Ou ainda não esteja capacitado para articular tal informação à
aula previamente planejada. Mas é preciso levar em consideração que o aluno
esteve em busca de conhecimento quando se utilizou da Internet.
Vale ressaltar a importância da utilização dos recursos tecnológicos,
valorizando a autonomia e a liberdade do aluno quando esta busca “contribui como
elemento responsável pela sua aprendizagem, pela qualidade do seu processo e do
seu grupo na metodologia do aprender a aprender” (BEHRENS, 2005 p, 103)
A verdade é que se nos identificarmos com este novo cenário mundial,
estaremos nos inserindo nele e caminhando juntos. Disso trata especificamente o
paradigma emergente, do entrosamento entre indivíduo e sociedade, interconexos,
interdependentes e interativos.
O mundo não é algo externo ao indivíduo. Cabe à escola e mais
especificamente ao professor ser responsável pela formação de indivíduos
conscientes de seu papel social. Papel não estanque, contínuo carente de educar-
se permanentemente.
Cabe ao professor identificar, numa sala de aula imposta, diferentes
perfis cognitivos, bem como ritmos diferentes de aprendizagem em indivíduos que
ao mesmo tempo em que constroem sua própria história também são sujeitos dela.
Cada pessoa tem uma forma diferente de compreender a realidade e é este sistema
individual que transforma a realidade.
E depois de identificadas estas diferenças não se pode acreditar tão
ingenuamente que a solução para o “problema” foi encontrada, pois um problema
bem formulado não é solucionado simplesmente, ele abre possibilidades para
novas estratégias que visam o encontro de novos paradigmas.
57

Para Adorno (apud MORIN, 2001,p.100) a complicação é um


elemento constituinte da complexidade, ou seja, é a confusão extrema das inter-
retroações, ou seja, “a totalidade não é a verdade”. Assim, “o conhecimento é, com
efeito, uma navegação que se efetiva num oceano de incerteza salpicado de
arquipélagos de certeza (MORIN, 2002, p.61).
Na tentativa de encontrar respostas aos nossos anseios enquanto
docente universitário, atuante na formação de futuros profissionais da Educação
Física, acreditamos que o paradigma da complexidade tornou possível uma prática
pedagógica significativa.
Sobre o Paradigma Emergente ou da Complexidade recorremos a
Morin (1986, p.127) quando afirma que “o verdadeiro problema do conhecimento
(entendido como teoria e prática, discurso e postura/atitudes) é saber distinguir e
relacionar, evitando separar e confundir”. Nessa perspectiva, toda interpretação de
fatos históricos, ou sociais, ou políticos, ou econômicos, que se pretenda correta, só
pode ser complexa, dialógica. Não existe uma única verdade, afirmada como
dogma, como doutrina, mas múltiplas possibilidades, a partir das várias
perspectivas adotadas.
Morin (1997,p.30) fala ainda em exercitar um estilo de pensamento
ecocêntrico e cosmológico que privilegie a síntese, a cooperação e cumplicidade
entre homens e coisas, a sabedoria intuitiva, o imaginário, o poético, enfim, o
intercâmbio entre vida e idéias, a transdisciplinaridade, a migração de conceitos e
categorias.
Assim, Moraes (2004, p.20) apresenta as idéias de Edgar Morin
quando defende a complexidade, afirmando:

Se queremos formar indivíduos intelectual e humanamente competentes e


bem formados, capazes de aceitar desafios, construir e reconstruir teorias,
discutir hipóteses, confrontá-las com o real, formar seres em condições de
influenciar na construção de uma ciência no futuro ou participar dela, então
necessariamente, o paradigma educacional precisa ser revisto. Isso porque
o modelo convencional de ensino adotado pela maioria das escolas, não
estimula o pensamento divergente, a criatividade, a criticidade, não gera
ambientes para descobertas científicas, para o desenvolvimento de um
trabalho cooperativo, além de uma série de outros valores que necessitam
ser resgatados nos novos ambientes de aprendizagem.
58

No entanto, vale lembrar que a revisão paradigmática necessita


também sair do papel, ou seja, ser transportada das prateleiras das bibliotecas para
a prática profissional do docente. Deixar de ser simplesmente teoria, para articular-
se a realidade das salas de aula, à realidade da educação.
O Paradigma Emergente empreende uma aliança entre os
pressupostos “inovadores” das abordagens sistêmica, progressista e ensino com
pesquisa, (BEHRENS, 2005). Porém, Capra (2002) no prefácio de sua obra As
conexões ocultas – Ciências para a vida sustentável, passa da denominação de
paradigma emergente para paradigma da complexidade. Defendendo uma
integração entre as chamadas dimensões biológica, cognitiva e social da vida, da
mente e da sociedade.
Segundo Behrens (2006, p.19):

O paradigma da complexidade reforça os princípios e referenciais teóricos e


práticos que foram propostos para o paradigma emergente. Os paradigmas
inovadores são fortemente enfocados na visão de totalidade, de
interconexão, de inter-relacionamento, na superação da visão fragmentada
do universo e na busca da reaproximação das partes para reconstituir o todo
nas variadas áreas do conhecimento.

Vemos que numa abordagem conservadora em todas as áreas


educacionais, o conhecimento ficou fragmentado de tal forma que nas suas
aplicações práticas, as modalidades e os exercícios físicos passaram a ser tão
específicos a ponto de fugirem ao caráter de complexidade. Complexidade essa
que não podemos pensar só em termos de unidades de todas as vertentes
possíveis (afetivo-social, intelectual, física, etc.), mas que também devemos pensar
no interior de cada vertente.
É comum na Educação Física a preparação ou o trabalho com braços,
gastrocnêmios, quadríceps, abdominais, lombares, músculos da cintura escapular e
demais, sem que se perceba a interdependência segmentar existente entre eles,
pois a unidade existe também no corpo.
No paradigma da complexidade, se defende fundamentalmente a
análise do todo. A tendência é considerar a unidade do homem levando em
59

consideração sua relação com os demais e a combinação bio-psico-social


distinguindo uma das outras sem separá-las da visão global do indivíduo.
É preciso aqui, no entanto, que não se reduzam ou simplifiquem os
pressupostos da complexidade propostos por Morin (2001) já que isto incorreria
num ato inibidor que limita o processo de conhecimento. No mesmo sentido, Morin
(apud MARTINELLI, 2003, p.35) acredita que temos obsessão pelo simples e que a
pesquisa obstinada pelo simples desembocou no complexo. Contudo, enquanto
seres humanos não poderíamos deixar de sermos mais complexos, e Morin (2002,
p. 59-60) define de forma belíssima a complexidade humana:

O ser humano é um ser racional e irracional, capaz de medida e desmedida;


sujeito de afetividade intensa e insustentável. Sorri, ri, chora, mas sabe
também conhece com objetividade; é sério e calculista, ms também ansioso,
angustiado, gozador, ébrio, extático; é um ser de violência e de ternura, de
amor e de ódio; é um ser invadido pelo imaginário e pode reconhecer real,
que é consciente da morte, mas não pode crer nela; que secreta o mito e a
magia, mas também a ciência e a filosofia; que é possuído pelos deuses e
pelas idéias, mas que duvida dos deuses e critica as idéias; nutre-se dos
conhecimentos comprovados, mas também ilusões e de quimeras. E
quando, na ruptura de controles racionais, culturais, materiais, há confusão
entre o objetivo e o subjetivo, entre o real e o imaginário, quanto há
hegemonia de ilusões, excesso desencadeado, então o Homo demens
submete o Homo sapiens e subordina a inteligência racional a serviço de
seus monstros.

Assim, quando falamos em educação a complexidade fica pertinente,


pois seu propósito não é encontrar todas as explicações ou informações, mas
buscar, religar e respeitar todas as dimensões de um ser ou de um fato.
Partindo destes princípios podemos pensar em uma educação para o
futuro, pautada em questões que Morin (2002, p.36) chama de condição humana,
aprendizagem cidadã, enfrentamento de incertezas, compreensão humana e
identidade terrena, e acrescenta:

Trata-se de um trabalho que deve ser empreendido pelo universo docente, o


que comporta evidentemente a formação de formadores e a auto-educação
dos educadores. Com efeito, apenas a auto-educação dos educadores se
efetiva com ajuda dos educandos será capaz de responder à grande
questão deixada por Karl Marx: “quem educa os educadores?”. Por meio
dela, creio ser possível operar a ressurreição de uma missão que
freqüentemente acabava por se dissolver na profissão (...). No fundo, essa
60

missão é uma missão das luzes, portadoras de um saber que ajuda a


compreender e abraçar a complexidade do real (...) este saber que abraça
deve ressuscitar uma cultura que não é pura e simplesmente a cópia da
antiga cultura, mas sim a sua integração em conexão com a cultura das
Humanidades e das Ciências (p.36) (grifo nosso).

Daí a importância em tratar o professor como um “eterno aprendiz”.


Aprendizado que não está presente apenas em pilhas de livros, mas na vida, no
cotidiano, na relação professor/aluno, entre outras. Quando tratamos então da
formação de professores, em especial do docente de Educação Física questão que
tange o objetivo deste trabalho, vemos novamente a necessidade da não promoção
da fragmentação e nem tampouco a redução do conhecimento.
O professor é o alicerce das reflexões sobre o conhecimento. Estas
reflexões provocam reformas e quando o professor privilegia a busca pela reforma
de seu pensamento, também estará promovendo reformas no seu modo de ensino
e fazendo proliferar ao seu redor o “gérmen da reflexividade” (MARTINELLI, 2003,
p. 107).
A reflexão não compartimentada não deve ser confundida com olhar
tudo de forma superficial, mas sim descobrir e realçar as interações resultantes da
união dos conhecimentos separados.
O conhecimento historicamente acumulado pode apoiar a construção
de sua formação quando unido ao apoio de seus mestres orientadores e
companheiros de aprendizado (MARTINELLI, 2003).
Morin (2000) sugere que a formação de professores tenha em vista
um educador que consiga concebe o ser humano em sua grandeza e em sua
pequenez. Entendendo-se também como este ser humano, imperfeito,
multidimensional. Um ser humano que vive num grande sistema dependente da
responsabilidade individual e coletiva sobre ele.
De acordo com Behrens (2006, p.21) “o professor necessita
reconhecer que a complexidade não é apenas um ato intelectual, mas também o
desenvolvimento de novas ações individuais e coletivas que permitam desafiar os
preconceitos, que lacem novas atitudes para encarar a vida, que gere situações de
enfrentamento dos medos e das conquistas”.
A Universidade precisa se livrar das amarras do tradicionalismo
cartesiano, o que muitas vezes, acontece apenas teoricamente. O objetivo de uma
61

Universidade que atende a visão educacional complexa deve ser a transformação


social, através de uma aprendizagem sociocrítica.
Freire&Freire (apud BEHRENS, 2006, p.24) afirmam que a prática
educacional não é o único caminho para a transformação social, mas sem ela esta
transformação jamais aconteceria. Para Fergusson (1992, p. 265), “só se pode ter
uma nova visão da sociedade, dizem os visionários, se for modificada a educação
da geração mais jovem”.
Por fim, com o advento do século XXI, ao que Moraes (1997, p.209)
chama de Era das Relações, é preciso aceitar os desafios como compreender que
a evolução humana encaminha-se para a comunicação com o eu, com o outro, com
a natureza e com o mundo.
Behrens (2006, p. 69) nos sugere um quadro muito pertinente, sobre
as visões que demandam um “repensar” em relação à prática pedagógica de
professores do Ensino Superior para o século XXI:

Quadro 3: As visões para uma aprendizagem significativa

• Visão da totalidade – considera-se que a prática pedagógica deve superar a visão


fragmentada, retomando as partes num todo significativo.

• Visão de rede, de teia, de conexão – considera-se que os fenômenos estão


interconectados havendo uma relação direta de interdependência entre os seres
humanos

• Visão de sistemas integrados – considera-se que todos os seres humanos devem


ter acesso ao mundo globalizado, aumentando assim as oportunidades para
construir uma sociedade mais justa, igualitária e integrada.

• Visão de realidade e movimento – considera-se que é essencial ter uma percepção


de que os conhecimentos são relativos, não existindo uma verdade absoluta, e que
esses conhecimentos estão em constante movimento, qualquer esforço em
solidificar a verdade poderá ser redimensionado em movimentos subseqüentes por
novas descobertas.

• Visão de cidadania e ética – considera-se que a formação dos seres humanos deve
estar alicerçada na construção da cidadania com uma postura ética, onde exista o
respeito aos valores pessoais e sociais, espírito de solidariedade, justiça e paz.

Neste sentido, Morin (2001, p.11) comenta sobre a importância de se


“transmitir não o mero saber, mas uma cultura que permita compreender nossa
62

condição e nos ajude a viver, e que favoreça, ao mesmo tempo um modo de pensar
aberto e livre”.
Concordando com as idéias apresentadas sobre o paradigma da
complexidade, esta dissertação propõe a Capoeira como meio de educação e
pretende confirmar que a utilização do paradigma da complexidade favorece e
subsidia um Ensino Superior (voltado à formação de professores de Educação
Física) significativo e relevante.
Baseando-se nas propostas do paradigma da complexidade, espera-
se formar não só professores como seres humanos mais críticos, capazes de
desenvolver um pensamento mais reflexivo, não fragmentado, mas apaixonado pelo
ensinar, afinal ensinar é aprender eternamente.
Neste momento marcante da pesquisa cabe destacar as palavras que
Morin (2002, p. 36) traz como condição primeira para ser educador:

A ressurreição de uma missão inclui igualmente a ressurreição de uma fé, de


uma fé na cultura, de uma fé no espírito humano, e é justamente isto que
restitui o que Platão declarava ser fundamental para o educador: para ser
educador é preciso ter eros, isto é, ter amor (...) é preciso ter amor para com
a matéria que ensina, para com as pessoas a quem ensina. É preciso
despertar esse eros. Creio que é na ressurreição trinitária do amor, da
missão e da fé que se poderá tentar formar os cidadãos do terceiro milênio.

Além do amor pelo educar é necessário pensar em que tipo de


educação daremos aos futuros cidadãos do século XXI. Para tanto, reuniram-se em
Paris, no ano de 1997, educadores de todo o mundo tentando responder a este
questionamento. Jacques Delors (2003) propôs um relatório em que destacou
quatro pilares como base da educação para o século que já se iniciou.
A chamada globalização, que não é apenas econômica, mas política,
social e cultural preconiza a preocupação com a formação dos indivíduos, bem
como sua preparação para uma melhor convivência neste mundo globalizado.
O homem necessita ser solidário, democrático e aberto à relação com
novas culturas. Neste caso, “a competitividade em educação subordina-se aos fins
maiores de solidariedade e de justiça, pois não contempla apenas o indivíduo, mas
também orienta para projetos coletivos” (BARROS, 2006, p.36).
63

O Relatório de Jacques Delors (2003) apresentado após reflexões


sobre os pontos que norteariam a educação no século XXI, lembra que é dever da
educação trilhar o caminho para o bem viver em um mundo cada vez mais
complexo e agitado. Assim, foram formulados os quatro pilares da educação:
 1°- Aprender a conhecer: que trata de uma relação com o
domínio dos instrumentos do conhecimento. Há também a preocupação com o
desenvolvimento de um processo de aprendizagem através da descoberta, do
vivenciar com prazer. Desenvolver o prazer e o gosto pelo estudo significa
despertar a curiosidade intelectual transmitindo as bases para que o aluno continue
a aprender ao longo de toda a sua vida.
De acordo com Santos (apud LIBÂNEO, 2002, p.67):

Um dos grandes desafios que se põe ao desenvolvimento do currículo é o


de contemplar experiências de aprendizagem que permitam construir
estratégias que ajudem o aluno a utilizar de forma consciente, produtiva e
racional o seu potencial de pensamento e que permitam torná-lo consciente
das estratégias de aprendizagem a que recorre para construir (reconstruir)
os seus conceitos, atitudes e valores.

Aprendendo a conhecer podemos aprender a aprender, nos


beneficiando com as oportunidades que a educação nos oferece, a fim de re-
inventar o pensar. Um pensar consciente e emancipatório.
 2°- Aprender a fazer: Aprender a conhecer e aprender a fazer
são indissociáveis, embora esta segunda aprendizagem esteja mais ligada à
educação profissional. Contudo, aprender a fazer também significa uma ampliação
de competências no âmbito das experiências sociais e não só do trabalho,
possibilitando o enfrentamento de novas situações e privilegiando a aplicação da
teoria na prática.
Aprender a fazer se define como ter capacidade de fazer escolhas,
pensar criticamente e não confiar ou depender apenas de modelos existentes
(DELORS, 2003).
 3°- Aprender a viver juntos: Nesta abordagem, observamos o
desenvolvimento da compreensão do outro ao mesmo tempo em que há uma
preparação para gerir conflitos.
64

Aprender a viver juntos é um dos grandes desafios do século XXI.


É o desafio da convivência que apresenta o respeito à todos e o exercício da
fraternidade como caminho para o entendimento. Então este pilar da educação se
mostra fundamental no mundo atual, haja vista a competitividade cega e as
injustiças a que estamos sujeitos.
Por isso, é preciso promover a descoberta do outro, descobrindo-
se a si mesmo, para sentir-se na situação do outro e compreender suas reações.
Estas necessitam ser ações permanentes visando uma formação mais cidadã.
 4°- Aprender a ser: Esta aprendizagem sugere uma autonomia
intelectual e uma visão crítica da vida, para desenvolver a capacidade de ação em
diferentes circunstâncias.
Aprender a ser significa contribuir para o desenvolvimento mental,
corporal e espiritual. Neste sentido, a aprendizagem precisa ser integral, sem
negligenciar nenhuma potencialidade inerente a cada indivíduo.
Segundo o Relatório de Delors (2003, p.99):

A educação deve contribuir para o desenvolvimento total da pessoa,


espírito e corpo, inteligência, sensibilidade, sentido estético,
responsabilidade pessoal, espiritualidade. Todo ser humano deve ser
preparado, essencialmente graças à educação que recebe na juventude,
para elaborar pensamentos autônomos e críticos e para formar os seus
próprios juízos de valor, de modo a poder decidir, por si mesmo, como
agir nas diferentes circunstâncias da vida.

Assim, cabe à educação preparar pessoas, criar um referencial de


valores e de meios para que estas se compreendam e atuem em sociedade.
No capítulo seguinte, trataremos das questões que envolvem
especificamente a docência no ensino superior de Educação Física, querendo crer
que a formação profissional nesta área seja dotada de mecanismos que levem o
aluno ao encontro do “eros” comentado por Morin e que este contagie tanto
docentes quanto discentes efetivando o aprendizado mútuo, cooperativo, integral,
em todos os sentidos, como pede o Relatório de Jacques Delors (2003) pautado
nos quatro pilares da educação.
65

CAPÍTULO IV

4.1 A DOCÊNCIA NO ENSINO SUPERIOR DE EDUCAÇÃO FÍSICA

Hoje em dia é possível observarmos uma constante preocupação por


uma linha de pensamento e ação junto à Educação Física. Acredita-se que fazendo
parte de um conjunto educacional, esta área também seja regida pelos progressos
alcançados no tocante aos paradigmas da educação.
Assim espera-se obviamente, que a Educação Física supere a ordem
tradicional e mecanicista que objetivava dotar cidadãos de corpos fortes e sadios,
perfeitos para o trabalho e para a defesa do país, bem como se distancie cada vez
mais, das correntes positivistas (Escola tradicional, Escola nova e Escola tecnicista)
que tratavam o corpo como uma máquina, aplicando movimentos repetitivos e
mecânicos acríticos.
A Educação Física, atualmente, parece ter conseguido sair do rol das
atividades paralelas ao processo educativo para integrar-se a ele, que tem como
principal papel, segundo Barbosa (1997, p.21) “formar cidadãos críticos, autônomos
e conscientes de seus atos, visando a transformação social”. A Educação Física
mostrou-se também como meio de educação.
De acordo com Tubino (2002, p.61) “o sentimento de
indispensabilidade da Educação Física foi crescendo até chegar a um consenso
mundial de que essa área pode contribuir para a formação integral das pessoas”.
Muitas foram as tendências surgidas afim de re-significar a Educação
Física, e hoje é possível perceber que algumas foram incorporadas ao sistema
educacional e têm dado bons resultados, como por exemplo a abordagem feita por
João Batista Freire, compreendida dentro do paradigma inovador. Sua proposta
visa o desenvolvimento motor, afetivo e cognitivo do aluno “com vertentes em uma
pedagogia humanista e que faz uma crítica a cientificização da Educação e da
Educação Física” (DAÓLIO, 2004, p. 23).
Porém, os avanços propostos nas diferentes abordagens da Educação
Física parecem ainda não terem sido suficientes para a transformação da prática
pedagógica de professores universitários, como apontam os estudos de Miranda
66

(1998), uma vez que a referida prática de muitos docentes continua desarticulada
das novas teorias da educação.
Com relação à formação de professores, Behrens (1995, p. 152)
afirma que os docentes precisam “estar com vontade de mudar, sensibilizados pela
necessidade de transformar a ação docente em busca de um ensino de melhor
qualidade”.
Entendendo que não haverá transformação no comportamento do
aluno sem a participação coletiva de todos aqueles envolvidos no processo
educacional, cabe ressaltar, neste contexto, a transformação também dos currículos
até hoje utilizados. É pena identificar que os currículos de muitos cursos da área da
Educação Física ainda estão alicerçados em modelos tradicionais ou tecnicistas,
que limitam o ensino à transmissão pura e simples de técnicas esportivas. É
necessário entendermos que a Educação Física é capaz de viabilizar o processo
ensino-aprendizagem. Mas é preciso, como já comentado, vontade e envolvimento
na busca de um processo crítico, criativo e transformador que inutilize para sempre
a visão reducionista de que educar é transmitir conteúdos e que aluno bom é
aquele que mais os acumula.
Em documento elaborado por ocasião do II Congresso Brasileiro de
Esporte para Todos, no ano de 1984, uma comissão de pesquisadores já tratava de
questões que ainda hoje, mais de vinte anos depois, continuam fazendo parte dos
problemas que atordoam professores e estudantes de Educação Física.
Neste documento os autores consideraram:

- a proliferação indiscriminada de cursos de Educação e uma


mercantilização do seu ensino, o que compromete a qualidade profissional.
- a existência, na legislação, de dispositivos que permitem uma formação
inadequada à realidade atual, deturpando-se assim, o exercício da profissão
de professor de Educação Física.
- a exigência de um currículo mínimo, fruto do autoritarismo e
intervencionismo do Estado na Educação tem-se revelado inibidor da
qualidade de cursos de formação, estimulando a fraude e a simulação.
- que os atuais currículos das escolas superiores de Educação Física estão
defasados em relação às novas exigências da sociedade, que determinam
um novo perfil para o professor de Educação Física.
- que esse novo professor de Educação Física deve apresentar condições
de atuar nas novas demandas do mercado de trabalho, em empresas
privadas, organismos públicos e entidades comunitárias, utilizando
metodologias adequadas, que atendam à especialidade dos diversos
67

campos de atuação, como a recreação, a dança, o desporto, a ginástica, as


lutas e outros.
- que a necessidade de permanente atualização e aperfeiçoamento de
professores, após sua formação escolar, é imperativa (TUBINO, et all,1984,
p. 06).

Todos os pontos apresentados em 1984 são passíveis de reflexão


ainda hoje, principalmente quando aponta a defasagem curricular nos cursos de
Educação Física, onde desarticulados da realidade social vigente, acabam
formando profissionais sem as condições necessárias ao enfrentamento desta
realidade. O profissional, ao sair da universidade, formado, ficava desorientado em
relação à sua prática profissional.
O Conselho Federal de Educação consegue alguns avanços quando
propõe o Parecer 215/87 que teve como decorrência a Resolução 03/87, mediante
a que, houve novas definições para os cursos de licenciatura e viabilizou-se a oferta
de cursos superiores de Bacharelado em Educação Física, como comenta Menezes
(1991, p.92):

O descompasso entre o que a Universidade formava e a sociedade exigia do


profissional de Educação Física, culminou, após inúmeras discussões entre
os intelectuais da área, como Parecer 215/87 do Conselho Federal de
Educação, que tratou da reestruturação dos cursos de graduação em
Educação Física e Desportos, facilitando á Universidade pensar seu próprio
currículo e o perfil do profissional necessário a sua região, propiciando-lhe
assim, no exercício da autonomia universitária, pensar sobre duas
graduações para a área sendo uma licenciatura e/ou bacharelado em
Educação Física.

A partir da Resolução 03/87, uma das principais considerações era


para que fossem contempladas, desde então, disciplinas que ainda não se faziam
presentes nos currículos de Educação Física, mas que deveriam estar contidas na
proposta destes cursos tentando buscar uma formação profissional de qualidade.
No sentido da citada formação profissional de qualidade, cabe lembrar
o que Perrenoud (2000) chama de “10 novas competências para ensinar”, listando o
que considera ser imprescindível saber para ensinar bem, numa sociedade em que
o conhecimento está cada vez mais acessível:

1) Organizar e dirigir situações de aprendizagem;


68

2) Administrar a progressão das aprendizagens;


3) Conceber e fazer evoluir os dispositivos de diferenciação;
4) Envolver os alunos em suas aprendizagens e em seu trabalho;
5) Trabalhar em equipe;
6) Participar da administração escolar;
7) Informar e envolver os pais;
8) Utilizar novas tecnologias;
9) Enfrentar os deveres e os dilemas éticos da profissão;
10) Administrar a própria formação;

O autor nos remete a pensar numa proposta de agregação de saberes


onde tudo é importante para a atuação profissional, tudo é importante e pode ser
utilizado para solucionar problemas e conseqüentemente para a vida em sociedade.
Coelho (1996, p. 35) afirma que a formação universitária não pode
jamais se referir a apenas um ângulo específico e parcial do mundo, da sociedade,
mas sim “referir-se ao todo, ao homem como capaz de pensar, compreender e
recriar a natureza, a sociedade e o próprio homem, isto é, a totalidade daquilo que
é. Ainda com relação a Resolução 03/87, ficou estabelecido que os
currículos dos cursos de graduação, num primeiro momento deveriam tratar da
Formação Geral-Específica, com 80% do total de horas do curso, para
posteriormente, utilizar 20% das horas para o chamado Aprofundamento de
Conhecimentos.

Barros (1993, p. 15-16), caracteriza a formação geral e específica da


seguinte forma:

(...) delineia o caráter inter e intra-indisciplinar da Educação Física,


abordando conhecimentos na área de interesse no estudo da motricidade
humana. Entende-se que tanto o bacharel quanto o licenciado, do ponto de
vista profissional, utilizam o movimento como instrumento de atuação,
necessitando ambos dominar o conjunto de conhecimentos básicos
necessários à ação profissional.
(...) tanto o bacharelado quanto a licenciatura têm uma preocupação
permanente com a formação de atitude científica. Ambos os profissionais
devem ser capazes de, nos seus campos profissionais, analisar criticamente
os conhecimentos no sentido de compreender as condições e os processos
pelos quais o conhecimento foi produzido.

Porém, constatou-se que mesmo depois de algumas mudanças na


grade curricular dos cursos de Educação Física, a nova proposta para uma
69

Educação Global não aconteceu, assim como também não houve incorporação
desses ideais na prática pedagógica de alguns professores. Por conseqüência,
“esta situação ocasionou desencontros na proposta curricular e na prática
pedagógica exercida pelos professores, resultando na falta de unidade no trabalho,
onde cada professor exercia sua docência sem se deter e refletir sobre a proposta
do curso como um todo” (MIRANDA, 1998, p.60).
Mas aos poucos é possível observar que a Educação Física vai
voltando-se lentamente para o lado psico-físico do indivíduo e que o que acaba
impedindo que essa área se desenvolva é justamente a falta de uma visão mais
ampla de alguns professores, que restringe o corpo a um objeto, móvel apenas
quando dado oportunidade e mesmo assim com severas repressões (ROCHA,
1994, p. 40).
Neste sentido, as palavras de Freire (1989, p.138) nos são válidas:

O que está faltando, numa concepção de Educação Física que privilegie,


acima de tudo, o humano, é ver além do percebido: é enxergar o movimento
carregado de intenções, de sentimentos, de inteligência, de erotismo. É ver o
rumo do movimento, sempre na direção de buscar, no mundo, as partes que
faltam ao homem para ser humano.

Não se pode negar que em aspectos humanos, pedagógicos,


antropológicos, filosóficos e psicológicos, muitos cursos de Educação Física ainda
sejam deficientes, ou que apesar de explorá-los, o façam com muita restrição.
Na maioria das vezes é dada grande ênfase ao esporte, à competição,
à vitória, privilegiando-se o alto rendimento e tornando o futuro profissional um
caça-talentos esportivos.
Muitos professores recém-formados saem do curso ainda
desorientados, pois não sabem que postura tomar ou onde aplicarão o
conhecimento recebido, já que a realidade fora da universidade é outra.
Estes profissionais, só então, perceberão o estrago causado em suas
carreiras, pela falta de criticidade, de reflexão, de estímulos e pela absorção
passiva dos conteúdos durante as aulas na graduação.
De acordo com Medina (1985, p.86):
70

Os profissionais de Educação Física, quaisquer que sejam as suas áreas de


atuação, só se realizam na medida que assumem plenamente o seu papel
como agente renovador e transformador. Procuram atingir os seus objetivos
específicos, mas ao mesmo tempo, são capazes de auxiliar e abrir novas
perspectivas para que cada um e todos sejam donos de seus destinos.
Devem agir como sujeitos de sua história, e não como peças de uma
engrenagem, determinados a realizar funções específicas em face de uma
educação domesticadora e autoritária que chega a anestesiar os anseios de
conquista da liberdade.

Mas a tal educação domesticadora prevalece. Os alunos da


graduação ao receberem seus diplomas (supostamente) estão prontos para atuar.
Pena que muitos estejam prontos mais para seguir “modismos” que para atuar
como agentes da educação. Muitos profissionais recém saídos das instituições
formadoras ainda não perceberam o valor educativo da Educação Física.
Mais uma vez esbarra-se na questão curricular, onde as chamadas
disciplinas pedagógicas e específicas deveriam compor um único espaço, com o
objetivo de integrar um projeto coletivo de formação profissional.
Segundo Lawson (apud BETTI, 1980, p.258) “Ensinar os estudantes a
aprender deve ser uma das principais preocupações do currículo. Isso inclui a
aprendizagem de avaliar e corrigir a sua própria ação profissional e a capacidade
de acompanhar minimamente a produção de conhecimento na área”. É a difícil
tarefa de articular na prática os conteúdos teóricos estudados.
Medina (1985, p.88) também contribui quando diz que:

O currículo de uma Faculdade de Educação Física deveria servir como


referencial básico para a formação do futuro profissional, incluindo as
disciplinas fundamentais consideradas de forma dinâmica e flexível. Isto
significaria um currículo aberto às constantes transformações e á evolução
do conhecimento científico e pedagógico voltado para a arte e a ciência do
movimento.

E Fazenda (1991, p.84) completa afirmando que “toda prática tem a


sua sustentação na teoria e toda teoria revela ou confirma uma prática”.
Mas além de toda a dificuldade da transmissão articulada de teoria e
prática, sem que se consiga esclarecer a sua importância no cotidiano do futuro
profissional, os jovens, ansiosos em cursar disciplinas práticas, desprezam a
formação teórica como a Sociologia, a Psicologia, a Didática, a Psicomotricidade e
71

áreas afins. Fazendo vir à tona questões que traduzem um dos graves problemas
que envolve o processo ensino aprendizagem nos cursos de Educação Física: a
formação essencialmente técnica que gera despreparo.
Betti (apud OLIVEIRA 1998, p.41) afirma que o profissional de
Educação Física ao chegar à escola acaba frustrando-se ao perceber que o aluno
não está preparado para todo aquele conteúdo técnico trazido em sua bagagem ou
simplesmente não precisa dele e o ignora. Assim, a participação dos alunos,
principalmente dos menos habilitados, sofre profundo declínio e gera insatisfação
de todas as partes envolvidas no processo de ensino.
Segundo Oliveira (1998, p.54) muitas vezes, o fracasso do curso de
Educação Física se deve a inversão do processo seqüencial de evolução dos
sistemas de ensino, já que começam com grande quantidade de conteúdos
técnicos, quando deveriam partir do “processo de ensino humanístico”.
Entende-se disto, que o aluno do curso de Educação Física devesse
inicialmente ser formado enquanto educador. Consciente e comprometido com a
“escolarização” para só então especializar-se, se possível, tornar-se especialista em
educação (ROCHA, 1994, p.47).
Caberia então ao docente universitário transformar as necessidades
do futuro profissional de Educação Física em objetivos educacionais, organizando o
ambiente de aprendizagem (articulando teoria e prática) visando a resolução de
problemas com responsabilidade? Sobre esta questão discorreremos a seguir.

4.2 O professor formador de professores

O professor tem sido apontado como um dos culpados pela má


qualidade na formação de futuros docentes. Porém, se é verdade que somos
sujeitos de nossa própria história, também é verdade que o professor é sujeito de
seu próprio desenvolvimento profissional, onde segundo Almeida (2001,p.3)
vislumbra-se, neste contexto, um processo em que a reflexão sobre a experiência
prática é fundamental, pois o que ocorre normalmente é a implementação, por parte
dos professores, de descobertas feitas por outros.
Apple (apud ALMEIDA, 2001) diz que os professores são profissionais
capazes de julgarem e entenderem suas próprias ações. Porém, muitas vezes já
72

nos apegamos de forma muito intensa ao comodismo ratificado por rótulos ou


jargões que parecem eternos como: “Professor de Educação Física só sabe jogar
bola” ou ainda “Teoria da Educação? Não, ele é professor de Educação Física,
discutamos nós professores teóricos”.
Mas, repetir discursos é fácil demais. Vasconcelos (1997) nos diz que
é preciso que o professor entenda que tem voz e que será ouvido, uma vez que
surja a tentativa de transformação, de “libertação do discurso dos outros”.
Para Gadotti (2004, p19):

O novo profissional da educação precisa saber porque aprender, para quê,


contra quem. O processo de aprendizagem não é neutro. O importante é
aprender a pensar, a pensar a realidade e não pensar pensamentos já
pensados. Mas a função do educador não acaba aí: é preciso pronunciar-se
sobre essa realidade que não dever ser apenas pensada, mas transformada.

O professor atual está numa época de transformação. Tem como


dever não se furtar da curiosidade científica estando, portanto, consciente da
importância do seu papel e das conseqüências de suas ações junto ao processo
educativo.
O professor deve ser capaz de refletir sobre sua prática e direcioná-la
segundo a realidade em que atua, voltada aos interesses e às necessidades de
seus alunos.
Giroux (1997, p.158) defende a idéia de que o trabalho docente é um
trabalho intelectual e não puramente instrumental ou técnico e que no momento em
que dignificamos a capacidade humana de integrar pensamento e prática
acabamos por valorizar “a essência do que significa entender os professores como
profissionais reflexivos”. Encarando, então, os professores como intelectuais
transformadores.
Não se trata aqui, no caso da Educação Física, de abandonar a
utilização da técnica na prática docente, mas haverá momentos em que o professor
estará em situações conflitantes e ele não terá como guiar-se somente por critérios
técnicos pré-estabelecidos.
Para Nóvoa (1997, p.27) “as situações conflitantes que os professores
são obrigados a enfrentar (e resolver) apresentam características únicas exigindo,
73

portanto características únicas: o profissional competente possui capacidades de


auto-desenvolvimento reflexivo. A lógica da racionalidade técnica opõe-se sempre
ao desenvolvimento de uma prática reflexiva”
O que estes autores sugerem é que o professor deixe de ser um
técnico, um executor, para tornar-se um “investigador na sala de aula”, um prático
autônomo ou um “artista capaz de criar suas próprias ações, de manejar a
complexidade do real e de resolver situações problemáticas por meio da integração
inteligente e artístico-criativa do conhecimento da técnica com os saberes práticos
adquiridos na prática docente” (GÓMEZ, 1991,p. 38).
Contudo, vale lembrar que a formação do professor não acontece em
momentos distintos, onde ocorra primeiro a formação teórica e depois a experiência
prática, mas no diálogo entre ambas. É neste diálogo que o professor aprende e
aperfeiçoa seus conhecimentos.
Deve-se apenas tomar cuidado para que não haja má interpretação do
que aqui se pretende, uma vez que entendemos que a relação entre a teoria e a
prática vem sendo cada vez mais valorizada como um espaço de construção de
saberes na formação de professores e jamais proporíamos que a teoria seja banida
do mundo acadêmico.
Para tanto recorremos a Cunha (1994):

É importante que encontremos formas de contracenar com a teoria. O


pensamento teórico, fruto de inúmeras formulações, só se adquire quando o
presente e o passado são estímulos para o diálogo de significados entre o
que o texto expressa e o que o leitor percebe. A teoria, como contribuição
para a pesquisa e a reflexão, é sempre potencialmente útil quando não é
entendida como fonte direta da prática, como queria a perspectiva
positivista, mas sim como possibilidade de iluminar o leitor, desde que este
tenha possibilidade de fazer um jogo com sua própria luz. A relação entre a
teoria acumulada e o aprendiz é atravessada por um elemento fundamental,
nem sempre facilmente percebido pelo professor, que é a cultura.

Então, o trabalho docente necessita ter por alicerce não somente a tão
almejada prática aliada á teoria, mas uma teoria inovadora, transformadora, onde
se admita o envolvimento do acadêmico na sua construção, sendo ele um agente
ativo da construção do processo ensino-aprendizagem.
74

Ao relacionar estas questões à Educação Física Tani (1988) cita como


um dos pontos problemáticos o fato de que a concepção de ciência que predomina
no âmbito da produção do conhecimento ainda é o das ciências naturais de matriz
positivista. Sendo que uma das principais características desta concepção de
ciência é justamente a separação entre a teoria e a prática. Uma das
conseqüências desta fragmentação é evidenciada na dissociação entre o que é
aprendido e o que a realidade escolar permite. O trabalho continua sendo
convencional, com ênfase nos aspectos físicos e no rendimento motor, onde a base
é a competição esportiva, conforme indicam os estudos de Souza (1990).
Neste caso é visível o despreparo dos docentes de Educação Física
recém-formados para enfrentar a realidade do cotidiano, evidenciando também a
falta de sustentabilidade na relação teoria e prática.

4.3 A difícil arte de ensinar e aprender

Inúmeras razões levam o docente e o discente do curso de Educação


Física a sentirem-se desmotivados. Uma delas, certamente é a percepção por parte
do docente, da falta de interesse do aluno pelas questões teórico pedagógicas junto
ao curso.
Muitos jovens adentram o curso imaginando que suas aulas serão
todas no campo de futebol ou à beira da piscina, por exemplo. Quando percebem o
quão sério e teórico é, e deve ser o curso, acabam desistindo do mesmo ou
criticando esta situação severamente.
Como já citado, somos todos sujeitos da história e este é o referencial
de Educação Física que o aluno que pleiteia a profissão possui. Cabe a nós
professores, informar ao aluno das responsabilidades pedagógicas a profissão de
professor, para que este futuro profissional não repita as mesmas aulas que teve
quando ainda era aluno. E que o levaram a crer que o curso superior de Educação
Física seria um festival de bolas, jogos e competições, sem alicerce teórico.
O que há de mais grave, neste sentido, é que o “professor que não
aprende com prazer não ensinará com prazer” (SNYDERS, 1990, p.47), e cada vez
mais estarão sendo jogados no mercado de trabalho, professores sem a noção da
75

importância do saber ensinar. Professores capazes, quando muito, apenas de


transmitir o conhecimento adquirido em quatro anos de uma angustiante graduação.
Drucker (1995,p.156) nos salienta que é preciso aprender como se
aprender:

Na verdade, na sociedade do conhecimento as matérias podem ser menos


importantes que a capacidade dos estudantes para continuar aprendendo e
que a sua motivação para fazê-lo. A sociedade pós-capitalista exige
aprendizado vitalício. Mas aprendizado vitalício exige também que ele seja
atraente, que traga em si uma satisfação.

Neste contexto, podemos observar que é importante que o aluno


entenda o significado do que lhe está sendo proposto, a utilização prática dos
conceitos e da teoria aplicada, para assim se manter motivado e envolvido cada vez
mais com o seu processo de aprendizagem.
Lucci (1998, p. 3) nos chama atenção para o fato de que sabemos dos
problemas enfrentados pelo professor em sala de aula, mas mesmo sem métodos
adequados, com salas abarrotadas de alunos, muitas vezes sem os recursos e
estrutura necessários, “o processo pedagógico não chega a estar comprometido se
existir o fundamental: a vontade de ensinar e o gosto pela atividade docente”.
Cláudio Moura e Castro, em agosto de 1998, num artigo publicado na
Revista Veja5, dizia que “a essência do aprendizado tem que ver com o professor,
aquele que ministra, que testemunha, enriquece e dá vida a uma série de
processos que levam o aluno a aprender”.
Cabe evocar as palavras de Platão (apud BARROS, 2002, p. 19) onde
um dos interlocutores diz ao mestre: “parece-me que receias entrar nessas
questões por causa da nossa ignorância. E responde o mestre: Muito mais recearia
tratar com pessoas que tivessem estudado tais coisas, porém mal. No caso, não é a
ignorância das multidões a mais perigosa, nem a mais temível, nem o maior dos

5
CASTRO, Cláudio de Moura. Modelo de educação. Revista Veja. São Paulo: Abril. 19 de agosto de 1998. P.
110-115.
76

males. Ter estudado muito e muito, haver aprendido, mas com métodos viciosos, é
mal muito maior”.
Ou seja, aprender mal é pior que não aprender. Assim, deixemos
nossos alunos livres de nossa ignorância, se não for para dá-los formas de
aprender a ensinar, subsidiá-los na reflexão de sua própria prática e torná-los
educadores e não meros executores.
Na busca de uma educação universitária contextualizada, é
necessário que sejam respeitadas todas as individualidades. O professor também é
ser humano, com necessidades, carências e passível de erro, precisa ser tratado na
amplitude de sua dignidade de cidadão.
Mas, nesta difícil arte de ensinar, é preciso estar disposto a “repensar
o vivido, ousando criar novas possibilidades para redescobrir outras formas de
ensinar, capazes de despertar o apetite dos estudantes para o processo a ser
travado com o conhecimento” (DESORDI, apud VEIGA &CASTANHO, 2000, p.232).
Neste caso, poderíamos pensar a Capoeira enquanto nova prática de
ensino, enquanto meio para despertar o tal apetite pelo aprender, pelo
conhecimento.
Por fim, valem-nos as colocações de Gadotti (2003, p 48):

Nós educadores, precisamos ter clareza do que é aprender, do que é


aprender a aprender, para entendermos melhor o ato de ensinar. Para nós,
educadores, não basta saber como se constrói o conhecimento. Nós
precisamos dominar outros saberes da nossa difícil tarefa de ensinar.
Precisamos saber o que é ensinar, o que é aprender e, sobretudo, como
aprender.

A Capoeira pode surgir então, como um novo saber a ser dominado


pelos futuros docentes de Educação Física, como nova proposta de educação tão
viável quanto outras tantas já preconizadas como conteúdos, ainda assim,
trataremos a seguir da sua importância eminente junto à disciplina de Educação
Física.
77

4.4 A Capoeira na Educação Física

A Capoeira pode ser considerada uma das atividades humanas


culturalmente construídas que mais atende as vertentes curriculares atuais da
Educação Física, seja em relação à ginástica, à dança, aos jogos ou aos esportes e
no quadro elaborado por Monteiro (2000, p. 22-24) encontra-se várias formas de
analisar a Capoeira sob a ótica da Educação Física que justificam esta afirmação:

Quadro 4: A Capoeira enquanto Educação Física

Atividade ginástica Devido a sua diversidade gestual facultar movimentações


riquíssimas o que toca à originalidade, variabilidade e exigência
neuromotora.

Segmentos Trabalhados de diversas formas (sentido, intensidade, direção,


corporais contração, etc. como estimuladores de valências físicas).

Dança Seu exercício é comandado pelo ritmo dos instrumentos a ela


afetos, ritmo esse que deverá ser respeitado para uma correta
organização do jogo.

Atividade rítmica O fato de todos terem de tocar os diversos instrumentos de


percussão faz com que todos se beneficiem de uma percepção
rítmica. E ainda, as seqüências de movimentos aprendidas,
inseridas no compasso rítmico, tem efeito similar ao das
seqüências coreográficas da dança, em termos de controle neural.

Jogo A constituição própria da Capoeira (o jogo da Capoeira)

Brincadeira O caráter lúdico se evidencia favorecendo a integração do sujeito


no todo comunitário (social), onde ele terá que se afirmar como
único e como parte do todo.

Esporte Haja vista a mercantilização já ter atingido todos os setores sociais.


Apesar de incipiente o fator esportivo já se faz presente em
competições de Capoeira

Fonte: (MONTEIRO 2000, p. 22-24)

Tendo em vista as considerações apresentadas no quadro acima


podemos nos referir à Capoeira como meio de Educação Física, idéia reforçada por
Lussac (1996, p.37):
78

Da parte psicomotora, pode-se falar que a Capoeira desenvolve a


coordenação motora, explorando a sua lateralidade, a percepção do próprio
corpo e o seu relacionamento com outros corpos (pessoas); desenvolve
também o equilíbrio estático e dinâmico e a percepção espaço-temporal,
conjugando como o ritmo (instrumental e canto), que também cadencia a
velocidade e intensidade dos movimentos a serem desenvolvidos. Junto com
a respiração diafragmática que é aperfeiçoada pelo canto, pro exemplo, o
perfeito controle da respiração (educando-a inconscientemente) entre
harmonia através da motivação contínua, com movimentos diferentes e
alternados. A resistência muscular, força, capacidade aeróbica e anaeróbica,
agilidade, equilíbrio, impulsão e flexibilidade são amplamente trabalhados
com um grande número variações, através dos movimentos, tanto que nesta
arte a criatividade e expressão corporal são fundamentais.

Outro fator no qual a Capoeira interfere é em relação ao


desenvolvimento afetivo-social, na medida em que sua prática leva inevitavelmente
ao estabelecimento de relações sociais com o grupo no qual se está inserido.
O aluno, ao praticar a Capoeira, o faz em sua amplitude, se
movimentando, criando, pensando em como se sair melhor, inovando situações e
estimulando seu companheiro a fazer o mesmo e ainda se expressam juntos,
brincam juntos, jogam, se comunicam, se interagem, ensinam e aprendem um com
o outro.
Por intermédio da roda de Capoeira é possível que haja a relação com
o companheiro, estabelecendo um conhecimento de suas possibilidades, vantagens
e limitações, numa quase negociação. O que é fundamental para o
desenvolvimento do respeito mútuo e da humildade, atributos essenciais par uma
vida social saudável.
As interações sociais desenvolvem, ainda, o senso de cooperação, de
liderança, de responsabilidade e participação, fatores que contribuem para alargar o
diálogo inter-social entre agentes sociais que talvez não tivessem esta oportunidade
em outra ocasião de suas vidas. Afinal, na roda de Capoeira, todos são brancos e
todos são pretos, todos são ricos e todos são pobres: são todos iguais.
Neste sentido, cabe a contribuição de Rocha (1994, p, 58): “ainda
podemos destacar aquele misterioso e inexplicável sentido que cada indivíduo
carrega dentro de si no memento de entrar na roda e que não há pesquisa que se
concentre neste detalhe que possa nos trazer tantas revelações”.
Acredita-se que a Capoeira, então, se solidifica cada dia mais e
justifica sua existência como conteúdo da Educação Física, seja ela aplicada nas
79

escolas ou em centros que visam o puro desenvolvimento esportivo, como


apresenta Santos, (1983, p. 119):

Numa concepção didática consideramos a Capoeira uma atividade física


completa, pois atua de maneira direta e indireta sobre os aspectos
cognitivos, afetivo e motor. Sendo encarada como lúdica e instrucional,
articula atividades de desenvolvimento visomotor com desenvolvimento
artístico e social levando a criança a estabelecer relações a partir dela
própria, fato que torna a Capoeira multidirecional, uma vez que permitirá,
desde que adequadamente conduzida, desenvolver na criança noções de
equilíbrio e disciplina.

Porém, alguns aspectos ainda travam ou tencionam a chegada da


Capoeira no meio acadêmico e dentre eles citamos os seguintes:
- a visão técnica da Capoeira, percebida apenas como uma luta de
academia e não como possível ação educativa e cultural;
- o preconceito em relação a Capoeira, devido à sua trajetória
histórica;
- o não conhecimento das contribuições da Capoeira para o
desenvolvimento motor, cognitivo e afetivo-social do praticante;
- a noção superficial de que é preciso ser “Mestre” em Capoeira para
poder ensiná-la com propriedade.
Reconhecer, perceber a Capoeira como uma atividade
essencialmente rica em aspectos educativos e culturais não é, realmente, tarefa
fácil para o acadêmico de Educação Física, pois o mesmo traz a sua própria
experiência enquanto aluno da fase escolar, onde seus professores ousavam pouco
e não desafiavam a ordem já estabelecida.
Segundo Rocha (1994), o preconceito em relação a algumas práticas
pode levar o estudante que está em uma universidade cursando Educação Física a
desvalorizar atividades que, sem ele perceber, dizem muito de seu dia a dia e do
seu passado. Atividades folclóricas, rítmicas, culturais, musicais, etc, são pouco
valorizadas pelas universidades e pelos estudantes.
Ensinar a Capoeira na Universidade, para que ela seja ensinada na
escola acaba sendo um grande desafio. Incluí-la ao processo educativo, da mesma
forma que outras modalidades esportivas, já tão conhecidas é trabalho complicado.
80

Pois somos acomodados, logo nos vem à cabeça questões como: Mudar para quê
se ninguém reclamou até agora?
O professor luta contra o fenômeno da mídia televisiva, que mostra a
toda hora, corpos bem definidos, esportes sendo praticados visando a competição,
dando abertura, ainda, à manifestações estrangeiras que são lançadas nestes
países, com tecnologias avançadas e com a “marca cultural” de origem bem
definida, as quais engolimos a seco, muitas vezes em detrimento de nossa própria
cultura.
Se pensarmos também, no fator receptividade do aluno, que é sempre
imprevisível, a parte histórica, a estrutura da aula diferente, a utilização de
instrumentos musicais, tudo isso tornaria a aula de Educação Física diferente
demais, chamaria atenção, revelaria outros valores. Acreditamos que seria um bom
começo no processo de transformação da prática pedagógica tradicional ainda
enraizada em nosso cotidiano profissional.
Uma das grandes preocupações de professores recém-formados em
Educação Física sobre como dar aulas de Capoeira na escola decorre do fato de
acharem não terem sido bem preparados tecnicamente para tal. Então, talvez isto
signifique que também não tenham sido bem preparados para dar aulas de
basquete, futebol, vôlei, natação, etc, já que o princípio do ensino da Capoeira na
Educação Física é o mesmo que para tais atividades.
Em entrevista concedida à Jaqueira (2006), o Professor Doutor Paulo
Coelho Araújo responde a duas questões importantíssimas quando tratamos da
validade do ensino da Capoeira na Universidade, junto à formação docente:

Revista Estação Científica- É possível aprender a Capoeira em um semestre


letivo?
Paulo Coelho Araújo – Depende do que se quer dizer com “aprender a
Capoeira”. É possível aprender alguns dos movimentos da Capoeira, é
possível aprender a utilizar conscientemente esses movimentos básicos, não
só com a perspectiva de desenvolvimento físico, mas também como
elemento rítmico, como elemento de dança de cariz coreográfico,
considerando fundamentalmente o nível de desenvolvimento psicomotor dos
indivíduos, ou a característica da clientela a ser atendida.

A resposta do referido professor vem ao encontro ao que tratamos


nesta pesquisa, pois todas as quatro Instituições de Ensino Superior aqui
81

envolvidas destinam à disciplina Capoeira, um semestre letivo. Neste sentido,


concordamos com o Professor Paulo Coelho Araújo, acreditando que a Capoeira
não pode ser vista como meio de desenvolvimento ou aprimoramento técnico
durante as aulas na universidade, mas apenas como uma iniciação à prática da
atividade a fim de despertar o interesse tanto do acadêmico em trabalhá-la durante
sua ação docente, como de seus futuros alunos em aprender Capoeira e através
dela desenvolver uma série de valores e valências já comentados no decorrer desta
pesquisa.

Revista Estação Científica – Qual é a função de se ensinar a Capoeira aos


futuros profissionais da Educação Física?
Paulo Coelho Araújo – Entendo que, assim como o Vôlei, o Basquete, o
Futebol, o Karatê, o Judô e tantas outras modalidades desportivas, possuem
um potencial educativo, a Capoeira, é igualmente mais um recurso de
natureza educativa, riquíssima em elementos de cariz rítmico-melódicos e
corporais da nacionalidade brasileira, riquíssima ainda em componentes
histórico-culturais, recheadas de movimentos muito particulares e possuidora
de formas multifacetadas que nos permitem trabalhar os seus aspectos de
luta de defesa pessoal, lúdico, coreográfico, folclórico e desportivo. Sendo
assim, nossos alunos em Educação Física precisam aprender como
desenvolver essas várias facetas e não se manterem presos e estáticos
perante a somente uma forma de expressão da Capoeira que é o da luta ou
do que é chamado jogo, conseguindo assim compreender as várias
dimensões que esta expressão corporal tem para aplicá-las nos ambientes
adequados: seja na Escola, seja na Comunidade em algum centro
comunitário, de forma a levar essas pessoas a aprenderem um pouco da
cultura brasileira e um pouco da corporeidade brasileira, pois que esta
expressão é um exemplo típico e acabado da expressividade corporal do
indivíduo brasileiro.

Fica claro, assim, que a Capoeira ao fazer parte da capacitação


profissional do docente de Educação Física tanto como outras modalidades os
torna aptos a ensinar a Capoeira como iniciação na escola e principalmente como
meio de socialização, de auto-descoberta, de educação.
82

CAPÍTULO V

5.1 O CAMINHO METODOLÓGICO DA PESQUISA


5.1.1 A opção pela pesquisa qualitativa do tipo participante

Com o objetivo de investigar como a disciplina Capoeira, no curso de


Educação Física pode subsidiar a prática pedagógica desta atividade, em ambiente
escolar do futuro profissional, utilizamos como metodologia de pesquisa a
abordagem qualitativa tipo participante.
A abordagem da metodologia qualitativa torna-se importante no
momento em que concebe os sujeitos envolvidos como atores, ou seja, àqueles que
possuem a capacidade de “retratar e refratar” a realidade, sendo “um movimento
totalizador que reúne a condição original, o movimento significativo do presente e a
intencionalidade em direção ao projeto futuro” (MINAYO, 1999, p.252).
Minayo (1999) em seus estudos sobre a aplicação da metodologia
qualitativa procura mostrar que:

É a partir dos indivíduos, dos grupos ou das classes que a totalidade


fundamental se expressa no perene conúbio entre mente e corpo, matéria e
espírito: que na aparente simplicidade de uma manifestação verbal, os
sujeitos individuais projetam sua visão de sociedade e de natureza, a
historicidade das relações e condições de produção inscritas no seu corpo,
seu espaço, sua temporalidade social, seus infinitos culturais, seus fetiches,
seus fantasmas e seus anseios de transcendência (p.252).

Além disso, a autora assinala que a metodologia qualitativa requer


referenciais teóricos, instrumentos de coleta de dados que possibilitem a apreensão
da realidade, tudo isso somado ao potencial criativo do pesquisador.
O fato de o pesquisador ser docente da disciplina de Capoeira em
duas das Instituições de Ensino Superior participantes deste trabalho, já o torna um
inter-agente da pesquisa. Mas sua relação com o objeto de estudo é ainda mais
intensa e porque desde antes de sua graduação já estava envolvido com a
Capoeira.
Neste sentido, a pesquisa participante também se constitui uma
metodologia apropriada. Uma investigação desse caráter rejeita a distância
83

tradicional entre o sujeito, o pesquisador e o objeto, buscando a participação ativa e


conjunta.
Um dos problemas que se coloca para reflexão refere-se à relação
entre o quanto se observa e o quanto se participa quando o pesquisador se
encontra no campo. Brandão (1984), com a perspectiva de superar tal
questionamento, aponta uma certa orientação para a abordagem das relações que
ali se estabelecem. Assim ele observa: "É necessário que o cientista e sua ciência
sejam, primeiro, um momento de compromisso e participação com o trabalho
histórico e os projetos de luta do outro, a quem, mais do que conhecer para
explicar, a pesquisa pretende compreender para servir". (BRANDÃO, 1984, p. 12).
O autor retrata ainda que a pesquisa participante não é uma simples
pesquisa e sim, uma estreita vinculação a uma visão de mundo: “Pesquisa
participante é a explicitação de uma intencionalidade” (BRANDÃO, 2000, p.16).
Os objetivos da pesquisa participante dão suporte à intencionalidade
afirmada anteriormente e que neste estudo basicamente resumem-se em dois: visa
à compreensão e transformação da realidade; questiona a monopolização do saber
e do conhecimento provocando reconstruções, afirmando o papel do docente como
mediador e problematizador.
A prática da pesquisa participante favorece a criação de um ambiente
de indagações, questionamentos, discussões, debates, trocas de informações e
proposições. A pessoa é reconhecida como sujeito, pois há a valorização do seu
pensar através de sua linguagem de senso comum. E, a partir disso, “é possibilitada
a construção do conhecimento, numa ótica menos fragmentada, linear,
descontextualizada e impositora, numa perspectiva dialética” (ROSSETTO,
GAUER, CASTOLDI, 2005, p. 4)
No entanto, André (1992), avaliando a produção científica que se
desenvolveu sob a metodologia da pesquisa participante nos últimos dez anos
avalia:

O que se verifica, é que a grande maioria envolve dados de campo,


sistematizados em forma de descrições que acrescentam muito pouco ao
que se sabe ou conhece ao nível do senso comum. É a empiria pela empiria.
O autor parece satisfazer-se com o fato de coletar uma grande quantidade
de dados e parece esperar que esses dados por si produzam alguma teoria.
Mas é evidente que sem um referencial de apoio que oriente o processo de
84

reconstrução desses dados não há avanço teórico, fica-se na constatação


do óbvio, na mesmice, na reprodução do senso comum (p. 31/32).

A proposta que se coloca aqui vai na direção de superar tais


limitações. Trata-se de ir para além do senso comum. Trata-se, segundo
Ezpeleta&Rockwell (1986). de "documentar a realidade não-documentada" uma vez
que:

A heterogeneidade e a individualidade do cotidiano impõem o


reconhecimento de sujeitos que incorporam e objetivam, a seu modo,
práticas e saberes dos quais apropriaram em diferentes momentos e
contextos de vida, depositários que são de uma história acumulada durante
séculos (p. 28).

Assim, seguiu-se esta pesquisa com a elaboração um questionário


para professores e acadêmicos que desencadeou relatos dos acadêmicos sobre as
expectativas dos mesmos em relação à disciplina de Capoeira, e se estas foram
correspondidas; os conteúdos abordados; as possibilidades de relação entre os
conteúdos da disciplina de Capoeira com outras disciplinas ou atividades da
Educação Física; a contribuição da disciplina de Capoeira para a formação e
atuação para a futura prática docente. Dos professores, objetivamos observar suas
considerações sobre a importância da Capoeira no Currículo do Curso de Educação
Física; se a carga horária dispensada à disciplina de Capoeira é suficiente para a
capacitação profissional do futuro docente.

5.1. 2 População / amostra da Pesquisa

Como critérios de inclusão para professores foram observados os


seguintes: Ser professor de Educação Física de uma das quatro Instituições de
Ensino Superior envolvidas na pesquisa e ser professor da disciplina de Capoeira
ou equivalente (Lutas).
E como critérios de inclusão para alunos: Estar matriculado em uma
das quatro Instituições de Ensino Superior envolvidas na pesquisa; ser aluno do
85

curso de Educação Física; estar cursando ou ter cursado a disciplina de Capoeira


ou equivalente.
As quatro Instituições de Ensino Superior envolvidas na pesquisa
foram: uma Universidade particular de grande porte; uma Universidade confessional
de grande porte, um Centro Universitário de grande porte e uma Universidade
Federal de grande porte, devido a estas instituições apresentarem em seu currículo
acadêmico a disciplina de Capoeira ou alguma disciplina onde a Capoeira também
é abordada.
No entanto, algumas considerações foram observadas de acordo com
cada instituição, que agora passarão a ser chamadas de Instituições de Ensino
Superior ou IES e que serão listadas como A, B, C e D aleatoriamente afim de que
sua identificação seja preservada, cabendo ainda comentar o nome das disciplinas
em cada Instituição: “Metodologia do Ensino das Lutas”, “Capoeira”, “Teoria e
Prática das Artes Marciais” e “Lutas”.
A seguir apresentaremos a carga horária dispensada à disciplina em
cada IES, bem como o nível de formação; o ano de inclusão da disciplina em
questão e o número de alunos e professores:
IES A:
* carga horária: 40 horas/ Semestre
* nível do curso: Licenciatura Plena
* ano de inclusão da disciplina: 2001.
* 26 alunos participantes

IES B:
* carga horária: 54 horas/ Semestre
* nível do curso: Licenciatura Plena
* ano de inclusão da disciplina: 2005
* 49 alunos participantes

IES C:
* carga horária: 40 horas/ Semestre
* nível do curso: Bacharelado e Licenciatura (distintamente)
* ano de inclusão: 2003
86

* 36 alunos participantes
IES D:
* carga horária: 60 horas/ Semestre
* nível do curso: Bacharelado e Licenciatura (distintamente)
* ano de inclusão:1988
* 24 alunos participantes
Foram observados um total de 135 alunos 2 professores

5.1.3 Instrumentos da Pesquisa

O universo investigado envolveu um total de 135 de alunos


distribuídos em: 26 da IES A; 49 da IES B; 36 da IES C; 24 da IES D, e também 2
professores, tendo em vista que o professor da disciplina em duas das quatro
instituições é o próprio pesquisador.
Como instrumento de pesquisa foram utilizados dois questionários
com perguntas abertas. Segundo Deshaies (2002) o questionário é um instrumento
de investigação que visa recolher informações baseando-se, geralmente, na
inquisição de um grupo representativo da população e estudo. Para tal, coloca-se
uma série de questões que abrangem um tema de interesse para os investigadores
tornando-o um instrumento de recolha e avaliação de dados muito importante na
pesquisa científica.
Assim, o primeiro questionário (Apêndice A), foi destinado aos
acadêmicos dos Cursos de Educação Física, onde o objetivo é investigar como este
aluno entende a disciplina de Capoeira no ensino superior, ou seja, na visão do
acadêmico, quais as contribuições especificamente da Capoeira para a sua
formação, a partir do subsídio fornecido pelo docente da área.
O segundo questionário (Apêndice B), destinamos a professores da
disciplina de Capoeira e teve como objetivo principal observar e analisar a prática
pedagógica destes durante suas aulas para também perceber a influência desta
postura na formação do futuro docente.
87

5.1.4 Descrição da Pesquisa

Partindo da disposição de reconhecer e encontrar possíveis respostas


ao problema levantado neste estudo, algumas etapas foram desenvolvidas:
• 1ª Etapa – Inicialmente buscamos uma revisão bibliográfica sobre a
história da Capoeira; sobre a evolução cronológica dos Paradigmas da Educação
relacionando-a ao desenvolvimento das concepções de Educação Física; e ainda,
sobre a docência no ensino superior.
• 2ª Etapa – Delimitação da amostra da pesquisa (população e
instrumentos).
• 3ª Etapa – Apresentação do Projeto de Pesquisa para o Comitê de
Ética da Pontifícia Universidade Católica do Paraná, para aprovação (Apêndice C)
• 4ª Etapa – Após a aprovação do Projeto de Pesquisa pelo Comitê de
Ética da Pontifícia Universidade Católica do Paraná e a devolução dos Termos de
Consentimento Livre e Esclarecido (Apêndice D), teve início a coleta dos dados.
• 5ª Etapa – Logo após a coleta e análise dos dados foi elaborada a
conclusão preliminar, com o objetivo de responder a pergunta de pesquisa e aos
objetivos propostos.

Neste momento da pesquisa pretendemos evitar qualquer tipo de


reducionismo, procurando antes construir um conhecimento que releve da
dimensão qualitativa dos fenómenos estudados tendo como perspectiva a descrição
apresentada dos mesmos, e que ainda assim nos possa permitir algum tratamento
estatístico julgado pertinente.

Para Kerlinger (1980, p. 335) a metodologia utilizada quando da


análise dos dados de uma pesquisa significa "maneiras diferentes de fazer coisas
com propósitos diferentes", ou seja, maneiras de formular problemas, hipóteses,
métodos de observação e recolha de dados, medida de variáveis e técnicas de
análise de dados. No entanto, como o mesmo autor refere, a "metodologia inclui
também aspectos da filosofia da ciência", pressupondo uma constante atitude de
análise crítica, sobretudo quando tal análise assume a forma de uma crítica
epistemológica dos conceitos utilizados, no quadro de uma investigação.
88

Assim, conscientes da forte influência da metodologia no processo de


investigação é este o sentido mais genuíno da nossa opção metodológica, com
conceitos simultaneamente instrumental e conceitual.
Os dados para reflexão aqui apresentados, como já citado, foram
extraídos de questionários propostos a dois grupos de indivíduos (professores e
acadêmicos), com objetivos exploratórios e serão tratados distintamente a seguir
explicitando as questões por eles respondidas.

5.2 Contribuições dos (das) professores (as)

A Importância da Capoeira no Currículo do Curso de Educação Física

O currículo padrão, o currículo de


transferência é uma forma mecânica e
autoritária de pensar sobre como
organizar um programa, que implica,
acima de tudo, numa tremenda falta
de confiança na criatividade dos
estudantes e na capacidade dos
professores.

Paulo Freire

Várias são as vertentes curriculares da Educação Física e de modo


geral nelas sempre estão preconizadas conteúdos como a ginástica, a dança, os
jogos e os desportos. A Capoeira é passível de adequação para qualquer destas
vertentes e eventualmente os currículos de Educação Física se propõem a oferecer
experiências que visam oportunizar a aquisição de um acervo motor amplo, que
permita maior independência de quem a vivenciar, pensando que assim, não
haveria limitações de ordem motora para experimentar qualquer modalidade ou
atividade.
A consideração da situação de estímulo ao acervo motor em muitos
currículos acaba propondo uma série de atividades que, embora importantes,
exigem maior conhecimento técnico e até mesmo obtenção de materiais que a
maioria das instituições de ensino não consegue adquirir.
Ao pensarmos em atividades capazes de reunir uma variedade de
padrões motores com o desenvolvimento de um grande número de capacidades
89

físicas, a Capoeira se mostra como instrumento útil no cumprimento dos objetivos


curriculares. Neste sentido, ao perguntarmos aos docentes da disciplina de
Capoeira sobre a importância da Capoeira no currículo do curso de Educação
Física obtivemos as seguintes respostas:

Sim, por fazer parte da cultura brasileira. Por trabalhar com música. Por
poder ser caracterizada como dança, luta e folclore desenvolvendo
competências do conhecer, do fazer e quando o professor é capaz, pode
transmitir virtudes, valores, edificando o ser (Prof. 1).

Sim, a riqueza de conteúdos pedagógicos rítmicos e a bagagem cultural


propiciadas pela Capoeira são inestimáveis no contexto da formação de
profissionais de Educação Física (Prof. 2).

Como implícita nas contribuições feitas pelos professores, a Capoeira


em função de toda a sua ritmicidade, musicalidade, ainda pode dar conta dos
aspectos motor, cognitivo e afetivo do desenvolvimento humano. Podemos ainda
perceber que ambos os professores acreditam na importância da Capoeira
enquanto conteúdo a ser trabalhado junto à formação de professores de Educação
Física.
Neste sentido, a Capoeira pode e deve ser incentivada e promovida
nas instituições de ensino. Com a grande vantagem de não exigir para o seu
aprendizado, materiais sofisticados e caros, mas simplesmente o corpo e a vontade
de praticar dos indivíduos envolvidos.
Muitas vezes, de nada adianta o aluno do curso de Educação Física
aprender as técnicas ou regras da esgrima, por exemplo, ou ser subsidiado
didaticamente sobre os fundamentos do Voleibol, onde todos os alunos têm uma
bola cada um e espaço oficial de treino, quando a realidade encontrada na maioria
das escolas estatais e até mesmo de algumas escolas particulares, é bem diferente.
São estes, locais onde a criatividade do educador não pode jamais ter fim, tendo
que driblar a falta de estrutura física, material e também cultural para o rompimento
de padrões educacionais.
A realidade dos alunos, onde a escola está inserida, deve ter papel
preponderante e deve ser respeitada no momento da oferta de atividades pelos
professores de Educação Física. Assim, arriscamos dizer que se o que sonhamos é
90

uma Educação Física não mecanicista e voltada para a formação de um ser integral
(holístico), a Capoeira pode ser um meio para o alcance de tal conceito.

Expectativas dos Acadêmicos na Visão do Docente

Ao indagarmos os participantes sobre qual a sua percepção a respeito


das expectativas dos acadêmicos de Educação Física sobre a disciplina de
Capoeira, foi possível destacar:

Identificar as lutas quanto suas características de arremesso ou projeção,


corpo a corpo (imobilizações, estrangulamentos e chaves de articulações)
e percussão (batidas, pancadas através de golpes com membros
articulações). Identificar as capacidades físicas predominantes em cada
grupo. Perceber a filosofia das lutas, uma introdução ao menos. Entender
a origem e a história das lutas. E no caso do Bacharelado como periodizar
um treinamento e para a Licenciatura com adequar uma iniciação com boa
progressão pedagógica (Prof. 1).

Muito desconhecimento sobre os conteúdos das lutas e precariedade de


material didático pedagógico para a disciplina (Prol. 2).

Constatamos nestes discursos duas situações: na primeira que o


aluno chega à faculdade esperando encontrar um conteúdo extremamente voltado
ao aprendizado técnico da modalidade. Aprender a lutar ou a jogar Capoeira
suplanta a idéia de aprender a ensinar a lutar ou aprender a ensinar como se joga
Capoeira. Na segunda situação a diferenciação da disciplina nos níveis do
Bacharelado e Licenciatura.
Nas falas dos professores percebemos que o (jovem) acadêmico não
conhece profundamente (tecnicamente) a atividade e busca este aprofundamento
no próprio curso. Contudo, o aluno precisa estar ciente de que o aprimoramento
técnico de qualquer atividade, seja Voleibol, Futebol, Natação ou mesmo a
Capoeira, se obtém em centros de treinamento específico que visam a
especialização, fora do ambiente universitário.
Estão presentes também nos depoimentos, referências ao caso da
Licenciatura, afirmando que a expectativa do aluno é com relação a adequação da
iniciação da atividade a uma boa progressão pedagógica. O que seria um grande
91

avanço para uma melhor formação profissional, haja visto que muitas vezes, os
acadêmicos começam a freqüentar as aulas (exceto os ex-atletas) sem a noção de
tais elementos, ou da sua importância para o aprendizado.
Muitos acadêmicos não conseguem distinguir a real intenção da
diferenciação entre Bacharelado e Licenciatura, o que fez com que sigam uma ou
outra linha sem um aprofundamento de suas características.
O que podemos obervar também é que a distinção feita pelo Professor
1, entre o conteúdo proposto ao Bacharelado e à Licenciatura de Educação Física,
gera a conseqüente distinção na docência da disciplina Capoeira nos dois níveis,
nos fazendo entender que o saber transmitido junto ao Licenciado é pedagógico e
didaticamente preparado para a atuação no meio escolar, enquanto que o Bacharel
o conteúdo é voltado ao alto rendimento, à formação de atletas.
Sob este prisma, deixamos de ver o Bacharel como professor e
passamos a percebê-lo como treinador e ainda tiramos deste profissional
qualidades inerentes à educação, como a valorização de fenômenos sociais,
cognitivos e afetivos do atleta/aluno. Assim, o professor/treinador estaria capacitado
a treinar atletas, sem vinculação com a relação ensino-aprendizagem.
Nós, docentes de curso superior em Educação Física por força de
sermos sujeitos da evolução histórica do curso, também nos vemos perdidos sobre
como transmitir os mesmos conteúdos à Bacharéis e à Licenciados e continuamos
perpetuando e investindo numa formação docente fragmentada.
Quando há tempos atrás questionávamos fechamentos dos currículos,
não pensávamos que a maleabilidade posteriormente ocorrida teria uma
manutenção tão trabalhosa. Abriu-se um leque de grandes possibilidades, resta-nos
conseguir articulá-las à Educação Física para que num movimento cíclico não
sejam novamente compartimentadas, ou então fiquem soltas em demasia.
Tornando os saberes da Educação Física, em função da quantidade, saberes muito
superficiais aparecendo em vários segmentos sociais sem que realmente se tenha
sido formado para isto.
Como questionamento sobre a carga horária dispensada à Capoeira
durante as aulas e se o docente acredita que estas foram suficientes para capacitar
seu aluno a dar aulas de Capoeira na escola, pudemos colher os seguintes
depoimentos:
92

A carga horária é de 8 horas mensais. Não acho suficiente para a


capacitação do aluno, em virtude do pouco tempo e pela proposta da
ementa direcionada a apresentar as lutas superficialmente (Prof. 1).

A carga horária da disciplina de lutas é pequena, e da Capoeira menor


ainda, pois é ministrada em forma de seminário. Não sendo suficiente para
informar aos alunos, imagine formar (Prof. 2).

Ambos os professores acreditam que a carga horária dispensada a


disciplina que ministram é curta para que seja possível capacitar o aluno a uma
ação docente de qualidade.
Porém, ao encarar a carga horária como pequena, os professores
deixam de acreditar que é viável o tempo destinado à disciplina para a formação
profissional, o que aparentemente é contraditório se pensarmos que o aluno não
necessita ser um exímio lutador para que possa ensinar os elementos necessários
desta modalidade. aprendeu na faculdade aos seus alunos.
Mais uma vez, devemos lembrar que a Educação Física na escola não
objetiva a formação de atletas, e sim poder dar ao aluno uma maior variedade de
atividades que possam fazê-lo vivenciar e trabalhar uma maior quantidade de
valências físicas, bem como questionar sua condição de cidadão crítico e reflexivo.

5.3 Depoimentos dos acadêmicos

Expectativa sobre a Disciplina de Capoeira

Lembrando que para que fossem salvaguardadas as identidades dos


acadêmicos dos cursos de Educação Física envolvidos nesta pesquisa, bem como
suas respectivas instituições, estes foram denominados como: Sujeitos, e
receberam um número (exemplo: Suj. 1, Suj. 2 e assim por diante) e as instituições
serão IES A, IES B, IES C e IES D.
As contribuições apresentadas pelos acadêmicos dos cursos de
Educação Física permitiram coletar dados significativos para esta pesquisa. Ao
serem indagados sobre qual era sua expectativa ao saber que teriam a Capoeira
como disciplina curricular, foi possível destacar o seguinte:
93

 IES A:

Curiosidade em saber qual a relação da Capoeira com a Educação Física


(Suj. 26).

Não foram muito boas, eu não gostava de Capoeira, além disso achava
pouco tempo para aprender uma luta tão complexa (Suj. 11).

Fiquei receosa, pois tenho uma certa dificuldade com lutas (...) e também
curiosa para saber de que maneira a Capoeira me acrescentaria algo como
professora futuramente (Suj. 29).

Aprender a fazer golpes de Capoeira (Suj. 27).

Não fiquei entusiasmada, pois é uma atividade que não tenho interesse em
trabalhar depois de formada (Suj. 6).

Gostei, mas tive medo de não conseguir realizar os movimentos


específicos da Capoeira (Suj. 2).

As contribuições aqui expostas foram escolhidas por representarem a


idéia expressa em grande parte das respostas obtidas em cada instituição. A partir
de tais respostas, podemos verificar que os acadêmicos envolvidos na pesquisa
criam expectativas assentadas naquilo que vivenciaram durante a escola, nas
academias e nos clubes, esperando encontrar a mesma realidade na Universidade.
Ao analisarmos os depoimentos dos acadêmicos da IES A,
percebemos que o aluno ainda se assusta com a proposta de novos conteúdos. Ele
ainda está sendo influenciado pela sua vivência quando era aluno da fase escolar,
onde os esportes coletivos eram supervalorizados, fazendo parecer que tudo o que
fosse feito fora do contexto dos esportes coletivos era “menos” Educação Física
que os mesmos.
O fator novidade talvez seja a questão mais difícil de ser suplantada
para a aceitação da Capoeira como conteúdo da Educação Física, por parte de
alguns acadêmicos.
94

 IES B:

Pensei, sinceramente, que não seria importante. Que só seria para cumprir
a grade curricular (Suj. 39).

Que aprenderia uma luta que se mistura com a dança (Suj.38.)

Muito boa, pois teria a oportunidade de vivenciar e conhecer algo que eu


ainda não tinha tido oportunidade (Suj. 33).

A primeira impressão foi que não tinha nem porque ter esta disciplina no
curso (Suj. 36).

Primeiro fiquei receoso, mas com o desenvolver das aulas pude perceber
que é uma boa idéia para trabalhar com crianças (Suj. 26).

Que eu teria que ‘sair’ uma capoeirista por completo (Suj. 37).

Através dos depoimentos dos acadêmicos da IES B podemos ver que


para muitos deles, a implantação de conteúdos novos serve de motivação e
estímulo ao aprendizado. A mesma motivação e estímulo que durante 18 anos
ministrando aulas, o autor desta pesquisa é capaz de observar nos olhos dos
alunos, nas aulas de Educação Física de escolas do Estado.
O (simples) som do Berimbau, a música, um movimento básico de
Capoeira e a perspectiva de uma aula diferente são suficientes para transformar tal
aula em um ambiente de aproximação entre professor e aluno, provocando um
efeito mágico de troca de experiências onde se torna impossível não pensar em
aprendizado mútuo.
Segundo os depoimentos, percebemos também que a Capoeira é
outra opção de atividade, para que possamos não mais repetir o ensino que
tivemos, buscando “reciclar” boas posturas e mesclá-las às novas atividades,
valorizando a realidade do aluno em questão. Aluno que anda tão carente de uma
chance para se expressar corporalmente e à espera da criatividade do professor de
Educação Física permitindo que dentro da aula isto se efetive.
Contudo, ao observarmos os depoimentos destacamos também, uma
expectativa de aprendizagem meramente técnica. O acadêmico de Educação Física
continua entendendo que é preciso ter um domínio técnico exacerbado de uma
95

atividade para poder aplicá-la na escola. Quando na verdade, não é necessário ser
atleta ou técnico de Vôlei nem de Futebol, por exemplo, e mesmo assim estas
atividades são muito oferecidas nas aulas de Educação Física. Então também não
seria necessário se tornar “capoeirista” para lecionar Capoeira na escola.
A escola serve de base inicial para as vivências esportivas e não para
a especialização dos alunos em alguma modalidade específica.
Ainda sobre a expectativa do aluno em formação para lecionar
Educação Física saber que cursaria a disciplina de Capoeira, um depoimento
simboliza a carga de preconceitos ainda existentes para a inclusão desta atividade
como prática pedagógica dos futuros docentes:

Me surpreendi, pois vi que a Capoeira está evoluindo (Suj. 10).

Resta-nos questionarmos sobre quem realmente estaria evoluindo. Se


a Capoeira ou a própria Educação Física, quando permite que uma atividade tão
rica em valores bio-psico-sociais se aproxime de um meio antes tão fechado como
a Universidade que parece ter se rendido à realidade social que bate à sua porta,
mostrada em todos os meios de mídia provando que a Capoeira já é praticada por
muitas pessoas no nosso país e fora dele. Talvez devêssemos ficar mais surpresos
devido a demora em se ofertar a Capoeira como disciplina do curso de Educação
Física.
O que necessita ser ressaltado é que pré-conceitos podem ser
quebrados quando conhecemos minimamente o objeto da crítica e é neste sentido
que a evolução da Capoeira é mais pertinente.

 IES C:

Achei interessante, porque afinal é mais um campo de atuação (Suj. 3).

Fiquei ansiosa, pois nunca tinha vivenciado nenhuma atividade como artes
marciais antes, então agora, que estou fazendo vejo que é um campo muito
amplo para trabalhar (Suj.27).
96

Adquirir conhecimentos básicos para trabalhar esta disciplina em sala de


aula e se despertar interesse buscarei aperfeiçoamento no assunto, digo na
luta específica (Suj. 32).

Normal porque no meu conceito, todas as disciplinas são interessantes e


importantes para a minha formação (Suj. 36).

Os acadêmicos se manifestaram de forma positiva, entendendo que


toda e qualquer atividade proposta durante os anos de sua formação docente são
importantes para a sua futura atuação.
Um ponto relevante foi observado no momento em que um dos
sujeitos envolvidos se refere à busca por aperfeiçoamento. Numa demonstração de
compreender que na graduação as várias modalidades esportivas são expostas
como iniciação e que a especialização deve acontecer em centros especificamente
voltados a este fim.
Alguns depoimentos tratam ainda da abertura junto ao campo de
atuação profissional, sendo que hoje, muitos dos profissionais que atuam como
professores de Capoeira não possuem curso superior em Educação Física,
podendo ser este um diferencial.

 IES D:

Nada demais, pois não é uma área que me atraia (Suj. 1).

Ter apenas uma noção da modalidade assim como outras tantas: Karatê,
Judô, etc (Suj. 6).

Expectativa para ver qual seria a forma da aula e sua aplicação na prática
(Suj. 3).

Era que aprenderíamos, não como lutar, mas sim aprender a como
condicionar um atleta para uma boa performance (Suj.8).

Aprender a técnica básica e ter vivência prática e é lógico, dar aqueles


saltos mortais (Suj. 9).

Sinceramente nenhuma, porque não era este o meu foco ao ingressar na


Educação Física (Suj. 22)
97

As colocações dos acadêmicos da IES D nos evidenciam que alguns


deles tinham, em relação às aulas da disciplina de Capoeira, uma expectativa inicial
de que aprenderiam os golpes acrobáticos que tanto chamam atenção quando a
Capoeira é apresentada em forma de exibição, ou ainda que as aulas seriam
voltadas à performance e condicionamento físico de atletas.
Outros acadêmicos, no entanto, afirmam não nutrirem grandes
expectativas sobre a referida disciplina, uma vez que não têm interesse na
modalidade nem como praticantes e muito menos como docentes.
Com o objetivo de observar se as expectativas dos acadêmicos em
relação à disciplina de Capoeira foram correspondidas após a participação nas
aulas, alguns dados tornaram-se significativos para a investigação.
A questão apresentada aos acadêmicos previa uma investigação
sobre a relação entre o que o aluno esperava encontrar e o que realmente
encontrou quando participou da atividade.
O que se percebeu, no entanto, é que a partir desta pergunta já foi
possível começar a traçar o perfil metodológico utilizado pelo docente da Capoeira
no ensino superior.
Para melhor visualização dos resultados optamos ainda pela
apresentação via gráfico:

50

40

30

20

10

0
IES D IES C IES B IES A
SIM 9 16 46 24
NÃO 7 11 3 2
Não Responderam 8 9 0 0

GRÁFICO 1: ACADÊMICOS QUE TIVERAM AS EXPECTATIVAS CORRESPONDIDAS EM RELAÇÃO


À DISCIPLINA DE CAPOEIRA
98

Dos 135 acadêmicos que participaram da pesquisa (sem distinção por


IES), 95 deram resposta positiva e 23 deram resposta negativa. Foi possível
identificar ainda que 17 acadêmicos não responderam a esta pergunta.
Dentre os depoimentos dos participantes da pesquisa destacamos:

 IES A:

Sim, percebi que consigo superar minhas dificuldades e limitações com


relação às lutas e também que me foi acrescentado uma boa quantidade
de conteúdos que poderão ser aplicados em aulas (Suj. 29).

Sim, mas vi que não é só golpe que envolve a Capoeira, mas muitas
outras coisas, além de ser uma cultura brasileira (Suj. 27).

Sim, porque estamos aqui para aprender a ensinar o básico, dar noções
do esporte, e não para sermos mestres de Capoeira. Além de ser uma
aula muito divertida (Suj 24).

Sim, ao contrário do que eu pensava foi fácil aprender os golpes, as aulas


foram interessantes e divertidas (Suj. 13).

Não, queria aprender a dar aqueles mortais e ninguém ensina isso (Suj 18)

Até o momento sim, a adaptação foi fácil e as aulas prazerosas (Suj. 8).

Constatamos, através das contribuições dos acadêmicos da IES A que


as aulas da disciplina de Capoeira deram suporte que vai além da técnica, da
execução correta dos golpes de Capoeira.
Os acadêmicos parecem ter mudado o conceito que tinham
anteriormente da Capoeira e demonstram com seus depoimentos que têm prazer e
se divertem durante as aulas. A partir disto podemos concluir que durante as aulas
existe uma forte presença lúdica e neste sentido Barros (2006, p. 80) afirma que “a
busca do saber torna-se importante e prazerosa quando se aprende brincando. É
possível, com o brincar, formar indivíduos com autonomia, motivados para muitos
interesses e capazes de aprender rapidamente.”

 IES B:
99

Sim, além do esperado, brincadeiras, jogos e conhecimento cultural da


Capoeira, o aprendizado de forma lúdica, se aproveitando ao máximo esse
processo de aprendizado diferente (Suj. 20).

Sim, me diverti e aprendi muito (Suj. 23)

Com a Capoeira aprendemos muito. Teve até colegas que utilizaram as


aulas de Capoeira nas suas escolas (Suj.36).

Sim, porque aprendi a gostar de um esporte que não me fascinava (Suj.


37).
Sim, com certeza e criei novas expectativas e a cada aula é uma surpresa,
uma novidade (Suj. 39).

Minhas expectativas foram superadas. Consegui ver o outro lado da


Capoeira (Suj. 43).

Não. Pois não tenho interesse em Capoeira, nem em praticar, nem em


ensinar (Suj. 12).

Mais uma vez, podemos observar o quanto os alunos se sentem


atraídos por aulas nas quais o conteúdo é proposto de forma dinâmica e lúdica.
Os acadêmicos, de forma geral tiveram suas expectativas em relação
a disciplina de Capoeira superadas e mesmo aqueles que no início não
demonstravam interesse pela atividade, parecem ter gostado das aulas e entendido
o potencial da Capoeira como meio de Educação, assim como sua importância para
a formação do profissional da Educação Física.

 IES C:

Sim. As aulas práticas são muito produtivas (Suj. 33).

Sim, porque aprendi na prática e com certeza posso ensinar a base e me


abriu portas para me especializar (Suj. 12).

Sim, aprendi muitas posições, movimentos e golpes (Suj. 5).


100

Não, porque na faculdade aprendi o básico não indo muito a fundo (Suj. 6).

Sim, mas a Capoeira para mim ainda é algo muito complexo e os golpes são
de difícil execução (Suj. 36).

Não, a Capoeira é legal de ser vista. Mas, é preciso muito tempo de treino
pra poder ensinar (Suj. 9).

Os depoimentos da IES C se dividem: alguns dos universitários


acreditam que o aprendizado dos golpes, movimentos, peculiares da Capoeira são
de fácil execução ou que serviram de base para que possam ministrar aulas; outros
ao contrário, criticam esta situação afirmando que as aulas não foram aprofundadas
o necessário para possibilitar uma capacitação de qualidade. O que, segundo os
acadêmicos torna a Capoeira algo complexo e por conseqüência não tendo como
ser proposta na futura ação docente.

 IES D:

Não, pois minha expectativa era sabe dar os saltos e fazer as manobras já
que para ensinar os alunos você tem que saber ao menos mostrar o
movimento, se não souber fica precário o ensinamento (Suj. 9).

Sim, pois aprendi a respeito do treinamento para lutadores e como


prosseguir e analisá-lo e quais valências devemos analisar de acordo com
cada tipo de luta (Suj. 8).

Sim, adquiri os conhecimentos básicos da luta (Suj. 6).

Não, o professor não consegui mostrar que conhecia a Capoeira (Suj. 17)

No curso de Educação Física se aprende a ser professor, a trabalhar a Capoeira


em sala de aula, levando em conta o ambiente de aprendizagem onde ela estaria
sendo proposta.
A Educação Física escolar deve ser entendida pelo acadêmico e
futuro docente de forma diferenciada porque efetivamente é diferente. Não se visa a
101

formação de atletas na escola, e sim proporcionar ao aluno uma série de atividades


que o valorize em todos os sentidos, podendo vir a contribuir para o seu
desenvolvimento geral, ou seja, na escola propriamente dita e também na vida.
A utilização do lúdico, por parte do docente, também é marcante nas
respostas dos acadêmicos reforçando a importância da existência do sorriso nas
aulas de Educação Física. Brincar de Capoeira pode ser uma excelente opção ao
invés de lutar Capoeira.
O prazer e a motivação em participar das aulas de Capoeira
demonstrado por alguns depoimentos pode ser reflexo do prazer que o docente
sentiu em ministrar tal aula. Uma aula empolgante, diversificada, criativa, vale muito
e como comentado neste estudo, não se pode cobrar empolgação do aluno se o
professor se mostra desanimado, ou ainda, como afirma Snyders (1990,p.47)
“professor que não aprende com prazer não ensinará com prazer”.
Consideramos como surpreendentes alguns dos depoimentos da IES
D em função do curso ser em nível de Licenciatura e os conteúdos serem voltados
mais para a área do Bacharelado, como “treinamento de lutadores”. E também
outros sujeitos estarem decepcionados por aprender apenas as noções básicas da
modalidade.
Este dado mostra que o próprio acadêmico talvez não tenha ainda
entendido que o curso que ele escolheu como carreira profissional a percorrer, não
lhe permitirá a formação de atletas ou o trabalho com esta área, pois o suporte
dado aos Licenciados é especificamente voltado para a escola.

Não, porque não tivemos aulas de Capoeira com nosso professor e sim
assistimos a algumas apresentações de grupos de Capoeira. Isso só, não
basta para que possamos dizer que conhecemos o que é a Capoeira (Suj.
24).

A situação comentada no depoimento do sujeito 24 (IES D),


demonstra que o docente, não domina a temática sobre a Capoeira e na tentativa
de ainda assim abordá-la como conteúdo, convida profissionais e grupos ligados a
Capoeira para demonstrações. A idéia não é ruim, já que proporciona ao aluno uma
experiência prática da Capoeira, porém, mais uma vez o acadêmico estará
102

recebendo um conteúdo sem a articulação com questões teórico-pedagógicas


importantes num curso de Licenciatura, evidenciando uma metodologia que
privilegia os movimentos e golpes do que a totalidade proposta na Capoeira.
A indagação sobre o que os acadêmicos aprenderam na disciplina de
Capoeira permitiu eleger alguns depoimentos significativos nas diferentes
instituições:

 IES A:

O principal de tudo a respeitar a individualidade e o temp que cada um leva


para assimilar o exercício. E também formas de conduzir a aula para não
deixá-la monótona, o que eu não havia aprendido em nenhuma outra
disciplina, nem de esportes coletivos (Suj. 5).

Que para se ensinar uma luta na escola eu não preciso de várias repetições
de um movimento para que a aula se torne motivante (Suj.1).

Como aplicar os variados movimentos e golpes de Capoeira de forma


recreativo-pedagógica em aulas de Educação Física Escolar (Suj. 4).

Alguns passos da Capoeira, brincadeiras e jogos que ajudam na elaboração


de uma aula, a parte pedagógica de uma aula de Capoeira, como trabalhar
as diversas faixas etárias (Suj. 2).

Movimentos básicos; formas de motivar a aula, trabalhar com a ludicidade


(Suj.3).

Podemos evidenciar nas explanações destes acadêmicos que a aula


de Capoeira também apresenta uma teoria que envolve noções de didática, como
planejamento e adequação não só de conteúdos como também da linguagem a ser
adotada pelo docente a cada clientela/alvo das aulas.
Ainda assim, são expressos em todos os depoimentos, comentários
sobre o aprendizado da Capoeira em si, dos golpes e movimentos característicos e
necessários para a sua prática.
103

 IES B:

Aprendi a ensinar a Capoeira e como trabalhar os movimentos naturais da


melhor forma que é brincando (Suj. 36).

Aprendi diversas formas de trabalhar a Capoeira na escola com a utilização


de materiais simples e até sem material (Suj. 34).

Muitas coisas, por exemplo a ginga, os golpes e aprendi a respeitar os


valores humanos, aprendi a brincar de Capoeira (Suj. 29).

Os conteúdos da disciplina de Capoeira nas IES A e B visam a


formação básica, sem a intenção de grande aperfeiçoamento técnico.
É interessante a postura dos alunos pesquisados, pois a idéia de
aprender a ensinar fica clara em alguns depoimentos (o que conforta este autor
enquanto pesquisador da formação de docentes de Educação Física). Já que
ensinar e aprender nunca deixam de caminhar juntos e é bom verificar que alguns
futuros professores já sairão da Faculdade com estes conceitos traçados em seus
caminhos podendo se utilizar do conhecimento transmitido na graduação e
transformá-lo de forma subjetiva.
É possível verificar também uma postura do docente do ensino
superior identificada por Freire (1993) ao afirmar que se o educador tem uma opção
democrática, com autocrítica e procura diminuir a distância entre o discurso e a
prática, ele “vive uma difícil, mas possível e prazerosa experiência de falar AOS
educandos e COM eles”.
Os alunos comentam novamente sobre a metodologia com a utilização
do lúdico durante as aulas, dando até mesmo um “tom” de recreação à aula de
Capoeira. Fundamental, no entanto, é que o acadêmico entenda que uma aula mais
brincada se torna motivante tanto no ensino superior quanto na escola e brincar
sempre teve espaço importante dentro das aulas de Educação Física.
Sobre o brincar, Maluf (2003, p.20) comenta o seguinte:

O brincar é importante porque incentiva a utilização de jogos e brincadeiras.


No brincar existe, necessariamente, participação e engajamento com ou sem
brinquedo, sendo uma forma de desenvolver a capacidade de manter-se
104

ativo e participante. É importante o aluno brincar, pois ele irá se desenvolver


permeado por relações cotidianas, e assim vai construindo sua identidade, a
imagem de si e do mundo que o cerca.

Mas as aulas com forte influência lúdica (brincadeiras) não devem


jamais perder o seu objetivo de educar. Afinal, se levarmos em consideração todos
os predicados de um professor de Educação Física sempre estarão entre eles a
capacidade de articulação entre teoria e prática, “criatividade, carisma, percepção,
mas é preciso que o professor tenha consciência de que a questão pedagógica
deve estar sempre presente e ser extremamente valorizada. Caso contrário, de
acordo com Freitas (2003, p.135) ”a criança brinca muito melhor sozinha”.
Para Cunha (1994), brincando o aluno desenvolve seus potenciais. Os
desafios que estão ocultos no brincar fazem com que o aluno pense e alcance
melhores níveis de desempenho.

 IES C:

Regras das lutas, golpes, ataque e defesa (Suj. 5).

Aprendi como melhor aplicar a parte prática e teórica em crianças,


adolescentes ou até adultos (Suj. 11).

Aprendi a importância da disciplina e da concentração (Suj. 12).

A respeitar meus companheiros de turma (Suj. 14).

Os acadêmicos da IES C expressam-se de forma objetiva. Suas


respostas demonstram que as aulas de Capoeira têm como meta principal o
desenvolvimento da técnica da Capoeira e valorizam questões como a disciplina, o
auto-controle e a concentração.

 IES D:

Nada de interessante (Suj. 6).

Aprendi a organizar o treinamento de atletas que se dedicam a lutas (Suj.


14).
105

A importância do condicionamento físico para o bom andamento no


esporte de lutas (Suj. 17).

Aprendi coisas como a história da luta, etc, mas não vou usar isto em
minhas aulas. Não pretendo trabalhar com Capoeira (Suj. 22).

Percebe-se nas respostas dos acadêmicos da IES C e D uma


valorização da técnica por parte dos docentes aliada a alguma transmissão de
valores.
Quando um dos sujeitos envolvidos comenta sobre ter aprendido a
importância da disciplina e da concentração, conseguimos perceber que as aulas
podem estar com uma sobrecarga neste sentido. Mas se este era o objetivo do
docente, foi alcançado, ou seja, é preciso que entendamos os objetivos do docente
ou o conceito que se quer dar a aula.
Nem sempre uma aula mais técnica é dada sem esta intenção. Porém,
devem ser observadas as ementas das disciplinas para que se possa cobrar do
docente uma postura condizente ou a articulação da prática nas aulas com a
proposta do curso como um todo.
Com relação ao sujeito 6 da IES D, que diz não ter aprendido nada de
interessante na disciplina, mesmo não sendo este um caso para generalizações,
observamos ou a falta de comprometimento com a pesquisa científica onde o aluno
não entende a importância desta para a evolução de sua própria área de atuação
profissional, ou realmente não conseguiu aprender nada demonstrando não estar
preparado para articular os saberes a ele transmitidos durante o período de sua
formação universitária.
Com o questionamento: “Você conseguiu relacionar algum conteúdo
da disciplina de Capoeira a outra disciplina ou atividade da Educação Física?”,
visamos observar questões de interdisciplinaridade e a partir das contribuições dos
acadêmicos foi possível construir o seguinte gráfico:
106

0
IES A 1
25

0
IES B 8 NÃO RESPONDERAM
41
NÃO
1
IES C 5 SIM
30

5
IES D 9
10

GRÁFICO 2: ACADÊMICOS QUE CONSEGUIRAM ARTICULAR A DISCIPLINA DE CAPOEIRA


À OUTRAS DISCIPLINAS DO CURSO DE EDUCAÇÃO FÍSICA

Do total de participantes (135 sujeitos) apenas 6 não responderam a


esta questão. Dentre o restante 106 responderam sim e 23 responderam não.
Ao distinguirmos as respostas de acordo com cada IES selecionamos
as seguintes:

 IES A:

Em todas, pois a Capoeira nos ajuda na criatividade, adaptação, socialização


e no respeito a questão individual. Eu mesma já usei alguns elementos de
forma adaptada, que tive a oportunidade de vivenciar na disciplina de
Capoeira, em uma aula de basquete (Suj. 10).

Pedagogia, como trabalhar com as pessoas, a metodologia utilizada para a


aprendizagem da Capoeira (Suj. 13).

Na verdade é a forma que é trabalhado os conteúdos da Capoeira e pode ser


aplicada em todas as disciplinas (Suj. 14).

A pedagogia relacionando a educação ao meio social, a filosofia pela cultura


da Capoeira envolvendo junto a história (Suj. 17).

Não relacionei a Capoeira à nenhuma atividade (Suj. 2)


107

Como questão relevante, as contribuições dos acadêmicos da IES A


nos apresentam a percepção da capacidade de articulação da Capoeira a uma
séria de outras disciplinas ou atividades da Educação Física.
Para estes estudantes a aula de Capoeira ou a “forma como a aula de
Capoeira acontece” (o que acreditamos tratar-se da metodologia utilizada pelo
docente) serve de exemplo a ser seguido em outras disciplinas. Ou seja, o
conteúdo pode ser outro, mas a metodologia é que dever trazer o aluno para a
busca e satisfação pelo aprendizado.

 IES B:

Pedagogia do movimento, som e ritmo (Suj. 28).

Acredito que a Capoeira influencie todos os esportes (Suj.26).

A Capoeira pode ser associada a muitos conteúdos de outras disciplinas,


pedagogia do movimento, sons e ritmos, cinesiologia, fisiologia, entre
outras (Suj. 22).

Com estas contribuições vemos uma preocupação com a totalidade


fenômenos e a relação entre eles. A citação de conceitos como adaptação,
socialização, respeito ao cidadão entre outros nos direciona a pensar que alguns
docentes trabalham mais que “só” Capoeira em suas aulas.
A relação com outras disciplinas é fundamental se partirmos de uma
visão “inovadora” onde se prima pelo ensino não compartimentado que visa a
noção do todo com aprendizagem pautada na relação dialética entre professor e
aluno. Dando lugar a chamada interdisciplinaridade, que de acordo com Fazenda:

(...) nasceu como oposição a todo o conhecimento que privilegiava o


capitalismo epistemológico de certas ciências, como oposição à alienação
da academia às questões da cotidianeidade, às organizações curriculares
que evidenciavam a excessiva especialização e a toda e qualquer proposta
de conhecimento que incitava o olhar do aluno numa única direção, a uma
patologia do sabe (1995, p.19).
108

Até porque o mundo é complexo, não se constitui de atos e


acontecimentos isolados, mas que se complementam num grande circuito de
revelar e solucionar problemas.
Para Gadotti (2000, p.224) “nas ciências da educação, a
interdisciplinaridade é entendida como a coordenação de todas as disciplinas e
interdisciplinas do sistema de ensino inovador sobre a base de uma axiomática
geral, ética, política e antropológica”. O que nos deixa certos de que a articulação
entre disciplinas que têm os mesmos objetivos é necessária e deve ocorrer sempre.
Construir o conhecimento também é, neste caso, uma premissa, pois
o aluno deve se tornar capaz de relacionar conteúdos e contextualizá-los de acordo
com suas próprias concepções e da importância disto frente sua formação.

 IES C:

Desenvolvimento motor e lazer (Suj. 16).

Atletismo, pois você precisa ser determinado e ter disciplina para chegar
onde você quer (Suj. 17).

Na ginástica artística, muitos movimentos são parecidos podendo ser um


auxílio na execução (Suj. 23).

Não. Não aprendi tudo o que precisava para ser um bom professor de
Capoeira. O conteúdo foi passado de forma muito simples e rápida (Suj.
25)

É possível observar que os acadêmicos da IES C conseguem


conectar os conhecimentos adquiridos nas aulas de Capoeira à outras atividades da
Educação Física. Porém, alguns deles informam que não se sentem seguros para a
docência de Capoeira, uma vez que os conteúdos propostos ainda são superficiais
em demasia.

 IES D:

Desenvolvimento motor e esportes complementares (Suj. 12).


109

Em todas as outras lutas que aprendemos (Suj. 16).

Ginástica Olímpica (Suj. 21).

Não. Não vi necessidade de articulação da Capoeira com outras disciplinas


(Suj. 14).

Nos depoimentos das IES C e D observamos que as aulas ainda que


possam ser articuladas a outras atividades ou conteúdos e disciplinas e que os
alunos consigam perceber isto, o fazem articulando à disciplinas que são parte do
mesmo bloco temático. É como unir conhecimentos da Natação ao Pólo Aquático,
simples demais, mas é claro que ainda assim: válido.
A contradição no processo de formação acadêmica está no fato de
que se tenta ampliar ao máximo a oferta de disciplinas (currículo extensivo) para
preparar o profissional para os diversos campos, mas de uma forma que fraciona
cada vez mais o conhecimento.
Como contribuição, apontamos ainda as análises apresentadas por
Betti (1992), que também partem da ação profissional baseada num corpo teórico e
interdisciplinar de conhecimento. Entre as conclusões consolidadas merecedoras
de crítica, apontamos as seguintes:
1) a ação do profissional de Educação Física/Esporte deve basear-se num campo
teórico que tem sido caracterizado como uma disciplina acadêmica ou ciência;
2) a ênfase na atuação profissional está no aspecto intelectual e não físico-motor;
3) saber como ensinar deve ser complementado com o saber por que ensinar, o
que implica no processo intelectual de tomar decisões de natureza filosófica,
sociológica, psicológica e biológica;
4) a profissão aplica seus conhecimentos em serviços sociais úteis;
5) é preciso produzir práticas bem sucedidas, para o maior número de pessoas;
6) processo de formação profissional continua para além da universidade.

A indagação dirigida aos acadêmicos para saber se estes se


consideram aptos a ministrar aulas de Capoeira em escolas foi elaborada da
seguinte forma: “Você acredita que as aulas da disciplina de Capoeira foram
110

suficientes para capacitá-lo a dar aulas e Capoeira na escola?”. Este


questionamento permitiu levantar os seguintes posicionamentos:

26
IES A

0
45
IES B

3
1
29
IES C
6

1
21

IES D
1

0 10 20 2 30 40 50 60

SIM NÃO NÃO RESPONDERAM

GRÁFICO 3: ACADÊMICOS QUE SE CONSIDERAM CAPACITADOS PARA A DOCÊNCIA DE CAPOEIRA


NA ESCOLA

Nesta questão, 4 foram os sujeitos que não a responderam. Outros 53


responderam negativamente e 78 sujeitos responderam afirmativamente.
Deste questionamento elegemos alguns depoimentos:

 IES A:

Sim, porque a partir das aulas de Capoeira eu consegui aprender as


noções básicas e o mais importante, aprendi a sentir a essência da
Capoeira. Através das aulas e é claro da pesquisa e estudos posteriores,
eu me julgo apta para dar aula de Capoeira na escola (Suj. 19).

Sim, mas acredito ter tido uma noção básica, sendo necessário um estudo
maior para desenvolver a técnica (Suj. 21).

Sim, oportunizou uma boa vivência da Capoeira dando suporte para o


acadêmico passar com qualidade aos futuros alunos (Suj. 22).

Sim, porque as aulas são voltadas para que nós ensinemos na escola,
bem pedagógicas e não para nos formarmos mestres (Suj. 29).

A grande parte dos acadêmicos da IES A respondeu afirmativamente


sobre se sentirem aptos a ministrar aulas de Capoeira em escolas.
111

Muitos fizeram menção a não obrigatoriedade de serem “mestres de


Capoeira” para que, na escola, possam ensinar Capoeira e também ao fato de
terem tido apenas uma noção sobre a modalidade, o que requer estudo e
dedicação mesmo após a graduação.
Ainda assim, consideram que o que aprenderam durante as aulas já
os qualifica para serem bons e responsáveis professores com domínio da atividade
Capoeira.

 IES B:

Acho que nós já temos condições de aplicar, com essas aulas, as


atividades de Capoeira para colégios e escolas, mas é sempre bom buscar
aprender mais, pois a Capoeira é rica e movimentos novos e que não
faltam (Suj.. 16).

Sim, porque juntando as outras aulas na faculdade com a prática que


vivenciei na Capoeira considero-me apto a isso (Suj. 13).

Sim, porque eu entendi a aula e percebi que podemos fazer várias


atividades trabalhando componentes da Capoeira (Suj. 38).

Os depoimentos permitiram observar que os acadêmicos da IES B se


sentem capazes de ministrar aulas de Capoeira em escolas, mas também
enfatizam a busca pelo aprimoramento, seja técnico ou pedagógico.
Podemos verificar que os acadêmicos em questão, acreditam que a
articulação de outras disciplinas propostas durante a graduação em Educação
Física, com a disciplina de Capoeira também foi fator relevante para que a
segurança enquanto docente se mostrasse de forma mais evidente.

 IES C:

Não, é muito pouco tempo para que possa dar aulas, temos que buscar um
conhecimento maior. A disciplina serve apenas para que nos interessamos
pelo assunto (Suj. 23).

Não, acho que para dar aula em escolas tem que ter uma base muito
maior do que as aulas na faculdade seja de Capoeira, Judô, Karatê ou
qualquer outra luta (Suj. 25).
112

Em relação aos acadêmicos da IES C, os depoimentos demonstram que


estes estudantes não se consideram aptos para ministrar aulas de Capoeira na
escola e apontam como principal motivo o fato de que durante as aulas na
graduação tiveram apenas uma noção sobre a modalidade. Sem desconsiderar a
validade do conteúdo, afirmam que a Capoeira, assim como outras lutas,
necessitam de um aprofundamento maior para que só então possam ser propostas
como atividades da aula de Educação Física.

 IES D:

Sim. Eu já trabalhava com lutas antes de cursar a matéria, então pra mim
ficou mais fácil, mas meus colegas sentem muita dificuldade (Suj. 17).

Não. Não acredito que conseguirei dar aulas de Capoeira depois de


formado, não aprendi o suficiente, acho que a carga horária é pequena
demais (Suj. 20).

Não. Não tive aulas direito. Quando tive foram superficiais. Não posso
dizer que me deram base para aplicar Capoeira na escola (Suj. 21).

Os depoimentos em geral demonstram que muitos acadêmicos das


IES A e B (100% e 92% respectivamente) se acham capazes de ministrar aulas de
Capoeira em escolas.
A busca pela continuidade do aprender, do estudar além do estudado
nas aulas, também foi evidenciada em muitas respostas o que frisa a importância
do aprendizado contínuo obedecendo as transformações que ocorrem não apenas
a níveis sociais, mas de maturidade profissional entre outros.
Entendemos ainda, que se achar capaz é sinônimo de se sentir
seguro e ter domínio do conteúdo a que se propõe, mesmo que os acadêmicos não
façam relação com o fato de também terem respondido que adquiriram durante as
aulas, “apenas” noções básicas da disciplina em questão.
Ora, se os conteúdos que lhes foram transmitidos foram noções
básicas e ainda assim se consideram aptos a ministrar aulas em ambiente escolar é
por que talvez tenham aprendido o necessário.
113

Mais uma vez houve diferenciações quanto as respostas das IES C e


D, cuja grande maioria foi negativa.
Talvez muitos acadêmicos se imaginem inaptos para ministrar aulas
de Capoeira, com já comentado, porque esta ainda é uma atividade relativamente
nova na formação de professores.
Se pensarmos que a disciplina de Capoeira tem a mesma carga
horária de disciplinas como Basquetebol, Voleibol, Futebol, por exemplo, então
entenderíamos que os acadêmicos também não estariam aptos a ministrar aulas de
tais esportes nas escolas. Voltamos a comentar também, sobre a experiência já
vivida do acadêmico, onde ainda na sua fase escolar, conheceu os esportes
coletivos propostos como conteúdos das aulas de Educação Física e isto gera um
conhecer muito maior do tema, que quando abordado na faculdade recebe status
de continuação.
Não é necessário ensinar um acadêmico a se posicionar numa quadra
de Voleibol, assim o início da aula já se dá em como didaticamente aplicar os
fundamentos do Voleibol na escola. Mesmo que, hoje em dia, com minha carga de
cinco anos na docência universitária tenha percebido que a limitação motora e
também sobre a prática até dos esportes coletivos (que sempre foram ícones da
Educação Física Escolar) vem se acentuando nos recém-chegados à Universidade.
O conhecimento prévio da modalidade permite ao acadêmico maior
segurança na hora de sua aplicação e com relação a Capoeira, é preciso aprender
“tudo” desde o início, pois nunca vivenciaram tal atividade apesar de a conhecerem,
saberem de sua influência e presença na mídia, na sociedade.
O que talvez também aconteça com o docente, que quando não
domina o conteúdo o transmite de forma superficial. Pena que voluntariamente
acabe perpetuando velhas posturas de não aposta no novo, no criativo, na
mudança.
A indagação feita aos acadêmicos investigava se eles consideravam
importantes as contribuições que a Capoeira trouxe à sua futura ação docente e
levou-nos a destacar os seguintes dados:
114

25
IES A 1

46
IES B 3 SIM
NÃO
29 NÃO RESPONDERAM
IES C 6
1
14
IES D 6
4

GRÁFICO 4: ACADÊMICOS QUE CONSIDERAM IMPORTANTES AS CONTRIBUIÇÕES DA DISCIPLINA DE


CAPOEIRA PARA A FUTURA AÇÃO DOCENTE

A análise dos gráficos nos permite a seguinte conclusão: 114 sujeitos


responderam sim, 16 responderam não e 5 não responderam a questão, num total
de 135 participantes. Das contribuições destes participantes, destacamos:

 IES A:

Sim. Como eu pretendo dar aulas em escola para crianças, acredito que a
Capoeira será uma excelente contribuição no conteúdo, irá enriquecer
como uma forma diferenciada de utilizar o movimento. É algo novo na
maioria das escolas atualmente. Trabalha o movimento de forma mais
divertida, lúdica e agradável (Suj. 29).

Sim. A Capoeira abre novas idéias e maneiras de pensar que podem ser
aplicadas nas mais diversas áreas, assim como na vida (Suj. 16).

Sim, por ser uma disciplina “incomum”, por não ser muito trabalhada ela é
uma forma de diversificar o trabalho do profissional, e dando mais
possibilidade aos alunos, um conhecimento maior a eles (Suj. 14).

Sim, é um esporte que deveria ser trabalhado nas escolas, pois na


Educação Física Escolar os esportes trabalhados são sempre os mesmos.
É importante que se apresente novos conteúdos para ser uma aula
diferente das outras (Suj. 13).

Sim. Como professor de natação, posso utilizar como diversificação das


atividades em forma de aprimoramento e/ou uma recreação (Suj. 4).
115

Além dos comentários sobre a ludicidade presente na própria


Capoeira e que pode ser transportada também para a aula, os acadêmicos da IES
A também citam em seus depoimentos o fato de a Capoeira ser uma atividade
“incomum” na escola. Acreditam que ainda são poucos os profissionais que têm
interesse em ministrar aulas de Capoeira, sendo mantidos como monopolizantes
nas aulas as modalidades com bola.
Então, evidenciam que a Capoeira pode apresentar-se como uma
novidade ao aluno, um conteúdo diferente e por conseqüência motivá-los e tornar a
aula algo prazeroso tanto para os alunos quanto para o docente.

 IES B:

Sim, é uma maneira de trabalhar diferente a Educação Física. Dando a


possibilidade de integrar as disciplinas como história, geografia, entre
outras, numa forma de educar através do movimento (Suj. 28).

Sim, desenvolvendo valores para passá-los aos futuros alunos, ajudando


a olhar a Capoeira não apenas com os olhos do preconceito, mas
enxergando a parte pedagógica que ela traz, podendo mudar o conceito
das pessoas (Suj. 43).

Sim. Contribui com uma forma de ensinar, um modo diferente sendo mais
dinâmico (Suj. 2).

Sim, Acredito que tudo que aprendemos no curso, por mínimo que seja,
alguma coisa sempre contribui para a nossa prática como futuros
professores (Suj. 44).

Foram levantadas questões quanto a integração da aula de Capoeira


à outras disciplinas do currículo escolar, o que é muito pertinente e nos leva a crer
que os acadêmicos da IES B entendem a necessidade e importância de uma
educação global e não fragmentada.
Observamos ainda comentários sobre a metodologia utilizada pelo
docente e que proporcionou aos acadêmicos a consciência de que as aulas, seja
de qual for o conteúdo, precisam ser dinâmicas, movimentadas, no sentido de
despertar no aluno a vontade participar.
116

 IES C:

Sim. Toda realidade vista dentro da Educação Física traz algo de


importante para nosso crescimento como profissional, com a Capoeira
não é diferente. É mais uma vivência que podemos transmitir para os
nossos alunos (Suj. 27).

Sim. Com essa disciplina aprendemos a abordá-la com as crianças na


escola, talvez não como grandes conhecedores ou mesmo lutadores,
mas teremos pelo menos a base necessária (Suj. 26).

Sim. Aproveitando os movimentos diversificados que são utilizados na


prática da Capoeira para serem aproveitados muitas vezes em outras
modalidades esportivas (Suj. 29).

Sim. Pois se nunca tive contato com a Capoeira, na disciplina terei uma
primeira noção do básico. Com isso contribuindo para uma futura atuação
(Suj. 33).

Embora sintam uma necessidade de aprofundamento técnico, os


acadêmicos da IES C concordam (a maioria) que as aulas da disciplina de Capoeira
puderam apresentar algumas contribuições para a sua futura ação docente. Como
exemplos dessa contribuição foram citados: “é mais uma vivência que pode ser
proposta aos alunos”; “os movimentos da Capoeira podem ser aproveitados em
outras modalidades esportivas”; “a Capoeira pode ser trabalhada com meninos e
meninas sem distinção”; “a valorização da expressão corporal do aluno sem a
necessidade de uma rigidez na execução dos movimentos”; entre outras.

 IES D:

Sim, através das diversas atividades e exercícios utilizados durante a


aula que poderão também ser aplicados em outras aulas que trabalhem
as mesmas valências físicas da modalidade ou para trabalhar com o
desenvolvimento motor, social, etc, de crianças (Suj. 11).

Sim. Por ser um esporte que auxilia no desenvolvimento de vários fatores


além de ser um esporte relativamente barato. Porém deve-se também
preservar outros estilos de luta (Suj. 13).
117

Sim. Já pratiquei Capoeira e utilizo diversos movimentos e atividades


lúdicas relacionadas a mesma quando executo programas de atividade
física para crianças (Suj. 12).

Os depoimentos parecem refletir a necessidade que os acadêmicos


têm em aprender coisas novas, ainda que com medo por não conseguirem executar
a atividade de forma perfeita ou de não se acharem capazes de transmiti-la aos
seus futuros alunos, mesmo assim, querem vivenciar atividades diferentes das que
estão tão acostumados.
A possibilidade de articulação das aulas de Capoeira à outras
disciplinas ou à transmissão de valores sócio-culturais também foi verificada em
grande parte dos depoimentos.
Podemos observar através de todas as contribuições dos acadêmicos
que a Capoeira, além de contribuir para a formação docente, apresenta-se como
opção para Educação Física, com objetivos bem amplos, numa perspectiva de
educação através do movimento e que atinge aspectos culturais, motores, afetivos
e cognitivos de forma lúdica e recreativa. De acordo com Martins (2004, p.12) a
Capoeira “além de ser uma manifestação popular, que acompanha e se mescla à
história do Brasil, pode o professor de Educação Física apropriar-se de sua cultura,
afim de utilizá-la para catalisar e otimizar um processo pedagógico, servindo neste
momento como mais uma alternativa para educação”.
Então, é possível entender que os acadêmicos de Educação Física
envolvidos nesta pesquisa não apresentam a postura de “fazer por fazer” a
disciplina de Capoeira, participando da aula simplesmente por que ela está prevista
na grade curricular, sem a noção de importância desta junto a sua formação. Mas
sim aproveitando ao máximo as horas ali atribuídas, bem como as trocas de
informações e experiências numa perspectiva de intervenção e aprendizagem
contextualizada e significativa.
118

CAPÍTULO VI

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Num mundo caracterizado pela


compartimentação acadêmica, um
intelectual é aquele que consegue
romper esses obstáculos para
construir caminhos que o coloquem
debatendo temas fundamentais de
sua época.
Edgar Morin

A formação de professores de Educação Física não é um assunto que


possa ser considerado de fácil discussão e análise. Mesmo assim, a realização
desta pesquisa foi um desafio que teve a intenção de responder inquietações
profissionais do pesquisador, tentando primar pela transformação e pelo
crescimento da ação pedagógica.
A prática da docência na disciplina de Capoeira nos cursos de
Educação Física foi o motor dos questionamentos. No entanto, realizar este estudo
constituiu para o pesquisador uma experiência extremamente positiva, por algumas
razões como:
• pelo extenso aprendizado;
• pela estimulante visão do futuro do processo de ensino-aprendizagem,
especificamente a nível dos papéis do professor, do aluno, da aprendizagem
e da escola;
• pela possibilidade de propiciar a contributos, esperamos que válido e útil, à
uma área recente no campo da formação de professores de Educação
Física;
• pelas perspectivas de pesquisa futura, já que a Capoeira enquanto disciplina
de cursos de Educação Física ainda dá seus primeiros passos e
conseqüentemente, ainda há muito a ser explorado;
Vale comentar que a experiência de 17 anos como docente em
escolas públicas e privadas da cidade de Curitiba, fez com que este pesquisador
observasse e viabilizasse muitos métodos e técnicas que tentavam tornar a
119

aprendizagem mais significativa e menos autoritária. Durante estes anos muito se


pôde observar em relação à prática dos colegas de profissão. Professores de
Educação Física que mesmo com a evolução histórica, social e científica, se
mantinham com as mesmas posturas profissionais, sem se importar com busca de
melhorias na ação pedagógica. Alguns, recém saídos da graduação, pareciam
ainda mais obsoletos quanto à prática docente do que os profissionais que já
deixavam transparecer um certo descaso pela educação demonstrando falta de
comprometimento.
Foi então, durante a docência no ensino superior que todos os
esforços deste pesquisador rumaram em direção à mudança, à transformação de
antigos conceitos. Neste momento é que se objetivou um estudo científico sobre os
comportamentos ou as diferentes posturas dos profissionais que atuam nos cursos
superiores de formação de professores, no nosso caso, tratamos específicamente
dos professores da disciplina de Capoeira.
A presente pesquisa traz um levantamento sobre as abordagens
educacionais que aliadas à verificação de como os acadêmicos de Educação Física
têm percebido a sua formação profissional com o intuito de subsidiar possíveis
esclarecimentos. Principalmente no tocante a prática docente ou às metodologias
utilizadas junto a disciplina de Capoeira e de que forma estas poderiam influenciar a
prática profissional de quem está sendo formado.
Atualmente, a qualidade do ensino superior oferecido no Brasil tem
sido muito criticada e algumas destas críticas dizem respeito ao docente
universitário. Segundo Cunha (1998), parece fácil entender o professor como ator
especial da prática pedagógica do ensino superior, “ainda que ele não seja o único
elemento significativo do processo, não há como desconhecer que é o agente
principal das decisões no campo” (p.33).
Sabemos que no processo de ensino, seja qual for o nível, a prática
pedagógica é influenciada por inúmeros fatores, mas a condição de docente acaba
sendo determinante para a avaliação da qualidade do ensino.
O que não podemos desconsiderar é a complexidade presente na
atividade docente, sendo esta historicamente determinada e modificada de acordo
com as necessidades sociais, situadas no tempo e no espaço.
120

O cotidiano do docente universitário é hoje um misto de diferenciações


e convergências, repleto de relações formais e informais, internas e externas e
assim mesmo se constroem processos de produção, transmissão e re-significação
do conhecimento, refletidos na prática pedagógica dos docentes.
Ao longo desta pesquisa muito falamos, até para justificativa da
utilização desta ou aquela abordagem consideradas adequadas ou não para a
educação atual, que o docente assim como o aluno é sujeito de sua própria história.
Ou seja, não há como deixar de articular sua atuação à fatores subjetivos como seu
modo de ver o mundo, de pensar e de sentir, que são condicionados pelas
diferentes histórias de vida e pelos contextos onde ensinam e aprendem.
É possível observar atualmente, em função do grande número de pós-
graduações voltadas à Educação em geral, bem como ao aprofundamento das
questões que envolvem a didática, que o docente tem tentado atualizar-se com a
intenção de reverter quadros que demonstram práticas pedagógicas tradicionais.
Na tentativa de romper com o ensino teórico e livresco que permeia a
ação de muitos docentes é necessário que haja uma reflexão onde o próprio
professor compreenda o significado de sua prática para que ele mesmo valorize a
ação de ensinar, de ser educador.
Na concepção do pesquisador deste estudo, quando se é professor se
é também “construtor de mentes”, afinal contribuir para a formação de um ser
implica em influenciá-lo profundamente com palavras e ações. Daí a importância de
não resistir às mudanças, de ser capaz de motivar, animar e incentivar o aluno,
cultivando otimismo e entusiasmo pelo aprender. É preciso que o professor tenha
consciência de que a Educação não se faz num processo individual e sim
escutando a opinião do aluno, questionando-a quando necessário e aceitando-a da
mesma forma, mas sempre dando vez à inter-relação primando por um aprender
mútuo.
No que diz respeito à ação pedagógica no Ensino Superior, foi
possível observar que algumas estruturas carecem de mudanças urgentes, como o
trabalho pedagógico na sala de aula, as relações humanas e com o próprio
conhecimento, que talvez, se fossem refletidas privilegiassem a construção crítica
de novas metodologias.
121

Ao tratarmos mais especificamente da docência na Educação Física,


estudos como os de Castellani, Betti, Bracht, Medina e Moreira, alertam para o fato
de que embora a Educação Física tenha aumentado o seu alcance na sociedade
atual, as transformações pedagógicas não assumiram lugar de destaque e muitas
vezes a tônica dominante ainda é tecnicista-desportiva. Fato que foi confirmado
durante a realização deste estudo tendo como base não somente as proposições
dos autores consultados como as contribuições dos acadêmicos dos cursos de
Educação Física.
Muitas propostas teóricas auxiliam a sustentação de práticas
pedagógicas para a Educação Física e vários são os paradigmas educacionais
existentes capazes de garantir uma ação condizente com as atuais vertentes do
ensino. Podemos afirmar, com base nos estudos aqui propostos, que nenhum
paradigma deixou de existir completamente. O que ocorre é a co-existência, quase
que sobreposta de várias abordagens, demonstrando que cada profissional tende a
re-significar as teorias científicas e associá-las às suas concepções histórica e
socialmente construídas.
Mesmo assim, a dificuldade em se transformar a ação pedagógica foi
muito comentada pelos acadêmicos envolvidos nesta pesquisa. Alguns até de
forma “dura” se posicionaram muito criticamente demonstrando grande insatisfação
pela postura docente por eles percebida.
Ao considerar as contribuições dos acadêmicos de Educação Física,
vimos que a influência exercida pelo docente é muito intensa. Ainda que muitos
alunos critiquem e consigam visualizar o que alguns chamaram de “falta de
didatismo” ou “posturas antiquadas” por parte dos docentes, fica nítida a situação
de repetição destas posturas. Pois, em resposta à questões sobre o que teriam
aprendido em um semestre letivo, um grande número de depoimentos tenderam a
valorizar conceitos do ensino tradicional e fragmentado dos quais alguns haviam
sido severamente questionados. Podendo ser conclusivo o fato de que o acadêmico
muitas vezes entende que a aula de Educação Física deveria ser embasada em
paradigmas modernos e inovadores, sabendo também criticar posturas contrárias,
afinal são objeto das mesmas, mas quando é sua vez de praticar a ação docente o
fazem perpetuando as velhas teorias tão criticadas por eles próprios, refletindo
assim a formação recebida.
122

Com relação às aulas da disciplina de Capoeira, o que se observou


foram as práticas desprovidas de novas metodologias que tanto deterioram a
qualidade da atividade profissional.
Dentre os docentes envolvidos, segundo relato dos acadêmicos,
alguns até são capazes de despertar prazer e satisfação em suas aulas, que
quando aliadas à fenômenos lúdicos envolviam os acadêmicos proporcionando
momentos de “leveza” que viabilizavam a assimilação de conteúdos, talvez
tornando-os mais acessíveis à transformação e re-elaboração. Porém, outros
docentes, devido até mesmo a uma confusão provocada pela não identificação dos
objetivos propostos aos cursos de licenciatura, tendem ao ensino técnico com vistas
a performance, à formação de atletas e com o mínimo de considerações pertinentes
à didática ou a um ensino mais pedagógico.
Por outro lado, quando observamos o depoimento dos próprios
docentes da disciplina de Capoeira, estas situações não foram evidenciadas e
ainda foi possível entender que tais docentes têm consciência da importância de
novas concepções na prática educacional e estão dispostos a isto. O que nos faz
crer numa contradição entre discurso e prática.
Talvez seja muito difícil para alguns docentes mudar a rotina de
trabalho quando o conhecimento adquirido já o acompanha há muito tempo,
tornando-o imutável. Isto implicaria também em se assumir uma condição de
desatualização frente aos avanços das abordagens educacionais, ou seja, um
grande desafio. Mas, refletir sobre a própria prática se faz urgente para a docência
no ensino superior.
O aprendizado constante deve ser levado em conta em seu sentido
mais amplo e não apenas quando objetivamos a obtenção de titulação. Afinal, um
título perde o sentido se nossa prática pedagógica não for condizente e gera ainda
mais desmotivação no acadêmico para que continue estudando, se aperfeiçoando e
se qualificando, além de ser passível de cada vez mais crítica. Neste sentido, a
prática docente deve ser repensada, onde a receptividade de novas idéias percorra
caminhos menos tortuosos e mais diretos possibilitando crescimento.
É pena constatar que os cursos de Educação Física continuam presos
a pressupostos arcaicos Tradicionais e Tecnicistas, muito embora alguns esforços
para o rompimento de tais pressupostos venham acontecendo. É necessária e
123

urgente a superação da prática pedagógica reprodutora por uma prática


progressista e que contemple a competência técnica e a produção do
conhecimento, mas que seja pautada numa ação transformadora.
O docente deve entender que seu papel, antes de tudo, é a formação
de profissionais competentes para a atuação no ensino. Para tanto o profissional da
Educação Física deve ser criativo, crítico, transformador, autônomo e consciente da
importância do Educar afim de que estas condições também sejam valorizadas em
seus alunos.
Apesar da trajetória do autor desta pesquisa como docente
universitário desde 2001, ser ainda bastante curta, estas reflexões sempre se
mostraram presentes e inquietantes. Esperamos conseguir sensibilizar, agora por
meio da pesquisa científica, profissionais e acadêmicos sobre a importância da
mudança e transformação da ação docente, onde a própria ação refletida mereça
ser vivenciada para novamente ser transformada. Afinal, não existem soluções para
a eternidade, mas soluções para determinados momentos, viáveis à determinadas
situações, onde as características essenciais do processo de ensino como o tempo
de aprendizagem individual de cada aluno, a condição social destes, considerações
cotidianas e externas ao ambiente de aprendizagem e a valorização da realidade
entre outras, devem ser respeitadas e levadas em conta.
Como docente de Capoeira, a experiência do autor é um pouco mais
extensa e muito intensa. A publicação de três livros referentes especificamente ao
ensino da Capoeira à crianças sob uma ótica inovadora lhe permite considerações
importantes. Mas, principalmente o torna um mobilizador de pessoas envolvidas
com a docência da Capoeira. Pensando em não limitar a entrada da Capoeira no
meio acadêmico a um modismo passageiro ou que seja “agarrada” apenas por uma
minoria, para que a Capoeira possa ser levada a sério realmente mostre sua
eficácia e, assim ocupar o lugar que lhe compete frente ás ferramentas da
Educação.
Então, uma das pretensões desta pesquisa também foi a necessidade
de “uma fundamentação teórica frente a uma cultura de movimentos reprodutores,
dicotomizados, sem história e sem consciência pedagógica” (MIYAGIMA apud
FREITAS, 2003, p. 09).
124

A Capoeira em momento algum deixou de ser a inspiração principal


desta pesquisa, muito menos a viabilização da educação através dela, visando a
transformação social. Acreditamos que mesmo que alguns docentes não tenham
conseguido evidenciar o valor da Capoeira junto à Educação, como pôde ser
observado, ainda assim os acadêmicos dos cursos de Educação Física aqui
envolvidos já perceberam sua importância. Transformando-se na prova de que
através do comprometimento educacional, a Capoeira pode ser articulada à relação
ensino-aprendizagem que acontece na escola, contribuindo para a aquisição do
saber construído, na formação de cidadãos críticos e responsáveis.
De acordo com Falcão (2004, p. 201):

Entendemos que uma disciplina é legítima ou relevante quando a presença


de seu objeto de estudo é fundamental para a reflexão pedagógica do
estudante, e a sua ausência compromete a perspectiva de totalidade dessa
reflexão. O que se verifica é que, freqüentemente, a capoeira se coloca
como disciplina importante para discutir questões mais amplas, como
preconceito, racismo, discriminação, constituindo possibilidade de ser
tratada como um complexo temático capaz de contribuir no processo de
construção de uma escola revolucionária. Talvez esteja aí a sua maior
contribuição (FALCÃO, 2004, p.201)

Contudo, como um dia afirmou Guimarães Rosa6: “o caminho se faz


ao caminhar” e ao observarmos a evolução histórica da Capoeira podemos
perceber que esta atividade soube conquistar seu valor frente a sociedade.
Por fim, um sentimento dúbio e contraditório contempla o pesquisador,
por um lado, de obra acabada, por outro, de obra incompleta, pois ao mesmo tempo
em que este sente que cumpriu minimamente os objetivos a que o estudo se
propôs, também observa que o estudo não está concluído. Isto porque não pode
estar, porque é um processo em evolução permanente. Como processo, certamente
deixou diversas áreas de interesse a explorar, entre elas a aplicação da Capoeira à
comunidades específicas como à Educação Infantil, à Terceira Idade, aos

6
João Guimarães Rosa (1908-1967) foi médico, escritor e diplomata brasileiro. Autor de contos e
livros marcados pela presença do sertão como palco das ações. Sua obra ficou marcada pela
linguagem inovadora, utilizando elementos de linguagem popular e regional, com fortes traços de
narrativa falada. É considerado por muitos críticos o maior escritor brasileiro da segunda metade do
século XX.
125

portadores de necessidades especiais, aos Projetos Sociais, a Capoeira enquanto


ginástica laboral, qualidade de vida, mantenedora de consciência ecológica e outras
tantas.
Mas a semente foi plantada e não somente em relação à Capoeira e
sim à todas as novas temáticas introduzidas nos meios educacionais, já que somos
conhecedores da importância delas para a formação e evolução do ser.
Assim esperamos que este estudo traga contribuições e instigue aos
que buscam conhecer e transformar sua prática pedagógica servindo de incentivo à
novas pesquisas sobre o tema engrandecendo ainda mais o valor do didatismo e da
aposta em novas metodologias, principalmente e não somente, junto ao ensino da
Capoeira nos curso de Educação Física.
126

REFERÊNCIAS

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140

APÊNDICES
141

APÊNDICE (A)
142

Questionário para alunos do Curso de Educação Física

*Sujeito n°: _________________

Data: ___/___/______
1. Idade:_______(anos)_______(meses)

1. Ao entrar na Universidade, qual foi a sua expectativa ao saber que teria a


disciplina de Lutas com ênfase Capoeira?
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________

2. Após cursar a disciplina de Lutas com ênfase em Capoeira, as expectativas


iniciais foram correspondidas?
( ) sim ( ) não

Justifique:
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________

3. O que você aprendeu nesta disciplina?


___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
143

4. Você conseguiu relacionar algum conteúdo da disciplina de Lutas com ênfase em


Capoeira, a outra disciplina ou atividade da Educação Física?
( ) sim ( ) não

Se assinalou sim, quais conteúdos e em qual (is) disciplina (s) pôde utilizá-los?
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
________________________________________________________________

5. Você acredita que as aulas da disciplina de Lutas com ênfase em Capoeira foram
suficientes para capacitá-lo a dar aulas de Capoeira na escola?
( ) sim ( ) não

Por que?
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________

6. Você considera importante a Capoeira fazer parte do Currículo do Curso de


Educação Física?
( ) sim ( ) não

Por que?
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
144
145

Questionário para Professores da Disciplina de Capoeira

*Sujeito n°: _________________

Data: ___/___/______

• Formação Acadêmica: Graduação: ___________Ano de


conclusão:________
Especialização:_________Ano de
conclusão:________
Mestrado:_____________Ano de conclusão:________
Doutorado:____________Ano de conclusão:________

• Tempo de docência no Ensino Superior:_________________.

1. Você considera importante a Capoeira fazer parte do Currículo do curso de


Educação Física?
( ) sim ( ) não

Por que?
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________

1. Qual a sua percepção a respeito das expectativas dos acadêmicos em


relação à disciplina que você ministra?

___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
146

___________________________________________________________________
___________________________________________________________________

2. Qual a carga horária dispensada à Capoeira durante suas aulas? Você


acredita que as aulas de Capoeira ministradas no decorrer da sua disciplina
foram suficientes para capacitar seu aluno a dar aulas de Capoeira na
escola? Justifique.
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
147

APÊNDICE (C)
148
149
150

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

Eu___________________________________________________________,
RG nº________________, estou sendo convidado a participar de um estudo
denominado: “A prática pedagógica da disciplina de Capoeira na Educação
Superior e sua contribuição para a formação do futuro docente” cujo objetivo é
pesquisar como a disciplina Capoeira, pode contribuir para o curso de Educação
Física subsidiando a prática pedagógica desta atividade em ambiente escolar, do
futuro profissional.
Sei que para o avanço da pesquisa a participação de voluntários é de fundamental
importância. Caso aceite participar desta pesquisa eu responderei a um questionário
elaborado pelo pesquisador, que consta de questões abertas e objetivas, referentes a
participação e conceito sobre as aulas da disciplina de Capoeira no curso de Educação
Física.
Estou ciente de que minha privacidade será respeitada, ou seja, meu nome, ou
qualquer outro dado confidencial, será mantido em sigilo. A elaboração final dos dados será
feita de maneira codificada, respeitando o imperativo ético da confidencialidade.
Estou ciente de que posso me recusar a participar do estudo, ou retirar meu consentimento a
qualquer momento, sem precisar justificar, nem sofrer qualquer dano.
O pesquisador envolvido com o referido projeto é Jorge Luiz de Freitas, com quem poderei
manter contacto pelos telefones: (41) 3362-6966 e (41) 9989-6769
Estão garantidas todas as informações que eu queira saber antes, durante e depois do estudo.
Li, portanto, este termo, fui orientado quanto ao teor da pesquisa acima mencionada e
compreendi a natureza e o objetivo do estudo do qual fui convidado a participar. Concordo,
voluntariamente em participar desta pesquisa, sabendo que não receberei nem pagarei nenhum valor
econômico por minha participação.

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Assinatura do sujeito de pesquisa

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Assinatura do pesquisador

Curitiba_______de _________________________de 2006.

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