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Vinícius Reccanello de Almeida

AVALIAÇÃO MEDIADORA
Jussara Hoffman
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Esta obra discute a avaliação numa perspectiva construtivista que se contraponha à prática de
avaliação tradicional, buscando o sentido em direção a uma escola igualitária e libertadora desde a
educação infantil, o ensino fundamental, médio, até a universidade.
O livro inicia com a discussão da escola de qualidade e sobre o compromisso de manter na esco-
la o aluno favorecendo-lhe de fato o acesso ao saber (não simplesmente por promovê-lo), a outros
graus de ensino, de permanência e continuidade nos estudos. Melhoria da qualidade do ensino re-
quer: escolaridade para todas as crianças e escolas que compreendam essas crianças a ponto de auxi-
liá-las a usufruir seu direito ao ensino fundamental no sentido de sua promoção como cidadãos parti-
cipantes nesta sociedade; que perceba a educação como direito da criança consciente desse direito.
Numa perspectiva construtivista da avaliação, a questão da qualidade do ensino deve ser anali-
sada em termos dos objetivos efetivamente perseguidos no sentido do desenvolvimento máximo pos-
sível dos alunos, à aprendizagem, no seu sentido amplo, alcançada pela criança a partir das oportuni-
dades que o meio lhe oferece.
A qualidade do ensino na concepção classificatória, a qualidade se refere a padrões preestabele-
cidos, em bases comparativas: critérios de promoção, gabaritos de respostas, padrões de comporta-
mento ideal. Uma qualidade que se confunde com quantidade.
Qualidade, na perspectiva mediadora da avaliação, significa desenvolvimento máximo possível,
um permanente “vir a ser”, sem limites preestabelecidos, embora com objetivos delineados e aceita-
ção das pré-condições socioculturais do educando.
A avaliação apresenta uma importância social e política fundamental no fazer educativo vincu-
lando-a a idéia de qualidade. Avaliar qualitativamente significa um julgamento mais global e intenso,
no qual o aluno é observado como um ser integral, colocado em determinada situação relacionada às
expectativas do professor e também deles mesmos.
A autora pesquisou as causas do fracasso escolar junto aos professores (30) de escolas estaduais
de educação infantil, ensino fundamental e médio, os quais responderam:

1. o aluno não se interessa pelo conteúdo da escola. (10)


2. o aluno apresenta problemas de relacionamento com professores e colegas. (10)
3. o aluno não apresenta maturidade. (06)
4. o aluno não tem oportunidade de expressar suas idéias ao professor. (03)
5. o professor apresenta falta de conhecimento quanto a questões de aprendizagem. (1)

Percebe-se que alguns professores atribuem a responsabilidade a si próprios, porém a maioria


atribui a culpa aos alunos, os quais passam a ser um misto de réu e vítima.
Quem são os responsáveis pelo fracasso escolar: professores, alunos ou sociedade? O compro-
misso do professor diante da criança e do jovem deve proceder diante das diferenças individuais dos
alunos em relação a todos os níveis socioculturais. Um dos princípios da teoria construtivista é funda-
mental para avaliação: o indivíduo se dá por estágios evolutivos do pensamento a partir de sua matu-
ração e suas vivências.
Neste sentido, deve-se ter uma visão construtivista do erro em termos da correção das tarefas
feitas pelos alunos em todas as situações de aprendizagem. Os erros e as dúvidas dos alunos são com-
ponentes significativos ao desenvolvimento da ação educacional, pois permitirá ao docente a observa-
ção e investigação de como o aluno se coloca diante da realidade ao construir seu conhecimento.
A autora distingue o diálogo entre professor e aluno como indicador de aprendizagem, necessá-
rio, à reformulação de alternativas de solução para que a construção do saber aconteça. A reflexão do

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professor sobre seus próprios posicionamentos metodológicos, na elaboração de questões e na análise


de respostas dos alunos deve ter sempre um caráter dinâmico.
Na avaliação mediadora o professor deve interpretar a prova não para saber o que o aluno não
sabe, mas para pensar nas estratégias pedagógicas que ele deverá utilizar para interagir com esse alu-
no. Para que isso aconteça, o desenvolvimento dessa prática avaliativa deverá desvelar a trajetória de
vida do aluno durante a qual ocorrem mudanças em múltiplas dimensões.
Em relação ao processo de aprendizagem toda resposta do aluno é ponto de partida para novas
interrogações ou desafios do professor. Devem-se oportunizar aos discentes emitir idéias sobre um
assunto, para ressaltar as hipóteses em construção, ou as que já foram elaboradas. São estas atitudes
que idealizam, de fato, um processo de avaliação contínua e mediadora.
A objetividade e a subjetividade em geral refere-se a forma de elaboração das questões, mas é
pela correção que as questões se caracterizam em “objetivas” ou “subjetivas”.

A partir das considerações, apontamos alguns princípios coerentes à ação avaliativa mediadora:

- oportunizar aos alunos muitos momentos de expressar suas idéias – as tarefas são elementos
essenciais para a observação das hipóteses construída pelos alunos ao longo do processo;

- oportunizar discussões entre os alunos a partir de situações desencadeadoras - os trabalhos


em grupo são “gatilhos” para a reflexão de cada aluno, para o desenvolvimento do conhecimento em
sua perspectiva de compreensão;

- realizar várias tarefas individuais, menores e sucessivas, investigando teoricamente, procuran-


do entender razões para as respostas apresentadas pelos estudantes – a avaliação mediadora exige a
observação individual, ou seja, uma relação direta com o aluno a partir de muitas tarefas (orais ou
escritas), interpretando-as (respeito a subjetividade), refletindo e investigando teoricamente razões
para soluções apresentadas de acordo com os estágios e as experiências do aluno;

- em vez do certo/errado e da atribuição de pontos, fazer comentários sobre as tarefas dos alu-
nos, auxiliando-os a localizar as dificuldades, oferecendo-lhes oportunidades de descobrirem melhores
soluções – é preciso ultrapassar a sistemática tradicional de buscar certos e errados em relação às
respostas do aluno e atribuir significado ao que se observa em sua tarefa, valorizando idéia e dando
importância a suas dificuldades. O respeito e a valorização de cada tarefa favorecem a expressão de
crenças verdadeiramente espontâneas.

- transformar os registros de avaliação em anotações significativas sobre o acompanhamento


dos alunos em seu processo de construção de conhecimento – os registros do professor devem res-
ponder às questões: O aluno aprendeu? Ainda não aprendeu? Por que não aprendeu? Quais os enca-
minhamentos feitos ou por fazer nesse sentido?

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Em relação à correção há duas posturas que se opõem naturalmente:

Avaliação Classificatória Avaliação Mediadora

Analisar Teoricamente as várias manifesta-


ções dos alunos em situações de aprendizagem
(verbais ou escritas, outra produções), para a-
companhar as hipóteses que vem formulando a
Corrigir tarefas e provas do aluno para veri- respeito de determinados assuntos, em diferen-
ficar respostas certas e erradas e, com base nesta tes áreas de conhecimento, de forma a exercer
verificação periódica, tomar decisões quanto ao uma ação educativa que lhes favoreça a desco-
seu aproveitamento escolar, sua aprovação em berta de melhores soluções ou reformulação de
cada série ou grau de ensino (prática Avaliativa). hipóteses preliminarmente formuladas. Acompa-
nhamento esse que visa ao acesso gradativo do
aluno a um saber competente na escola e, por-
tanto, sua promoção a outras séries e graus de
ensino.

As diferentes posturas também se revelam nas expectativas dos alunos (pedindo para professor
dar nota em toda atividade; não aceitando que sua tarefa tenha erro), dos pais (não aceitando que não
se corrija o caderno de seu filho), dos professores (corrijo tudo, não corrijo, o que fazer?).
Na concepção mediadora a correção se faz presente pensando na evolução do conhecimento de
forma dinâmica, de descoberta por ensaio e erro, de tomada de consciência sobre o fazer, muito mais
que a preocupação com resultados imediatos ou fórmulas definitivas de solução apresentadas pelo
professor.
Não significa aceitar tudo o que a criança faz. Considerar, valorizar, não significa observar e dei-
xar como está. Ao contrário exige do professor a reflexão teórica necessária para o planejamento de
situações provocativas ao aluno que favoreçam a sua descoberta. As tarefas de aprendizagem são
pontos de partida do professor no sentido de gerar conflitos entre as crianças pela confrontação entre
elas a respeito de diferentes soluções pensadas em evolução.
A ação mediadora do professor, a sua intervenção pedagógica, desafiadora, não pode ser uni-
forme em todas as situações de tarefas dos alunos. Os erros que a criança apresenta podem ser de
natureza diversa. Nenhum extremo é válido: considerar que sempre devemos dizer a resposta certa ou
no outro extremo, considerar que todo e qualquer erro que o aluno cometa tenha o caráter construti-
vo e que ele poderá descobrir todas as respostas.
A tarefa do aluno está presente entre uma tarefa do aluno e a posterior. A tarefa do professor
consiste em favorecer a este aluno o alcance de um saber competente e a aproximação com a verdade
científica.
O tema correção envolve essencialmente o respeito à criança em suas etapas de desenvolvi-
mento e, por isso é urgente incluir o termo “ainda” no seu vocabulário. Ao invés de analisar os exercí-
cios dos alunos para responder quem errou ou quem acertou, analisá-los para observar quem apren-
deu e quem “ainda” não aprendeu.
Os registros de avaliação refletem a concepção de educação do professor. Relatórios de avalia-
ção devem expressar avanços, conquistas, descobertas, bem como relatar o processo vivido em sua
evolução, em seu desenvolvimento, dirigindo-se aos encaminhamentos, às sugestões de cooperação
entre todos que participam do processo. Ao relatarmos um processo efetivamente vivido, encontra-
remos as representações que lhes dêem verdadeiro sentido.

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Há muitas crenças que a avaliação mediadora é restrita aos professores das séries iniciais do en-
sino fundamental, mas a autora revela o desenvolvimento desta perspectiva no ensino médio e no
ensino universitário através de pesquisas realizadas.
O modelo que se instala em cursos de formação, é um modelo reprodutivista sendo muito mais
forte que qualquer teoria que o aluno possa adquirir, pois é vivida em seu cotidiano.
Em sua pesquisa no curso universitário a autora aponta algumas concepções apresentadas pelos
professores resistentes à avaliação mediadora e assinala caminhos para reflexão:

1. alunos desinteressados e desatentos – observa-se , nesta visão, um compromisso do educa-


dor alienado de uma relação de aproximação com o pensar do aluno: o professor “dá” a aula e o aluno
“pega” as explicações. Na avaliação mediadora despertaria, então, o educador para a relação dialógica
da avaliação, buscando alternativas para estabelecer sua aproximação e descoberta dos diferentes
modos de pensar.
2. tempos e disponibilidade: entraves do processo – a avaliação mediadora opõe-se ao modelo
“transmitir-verificar-registrar” e evolui no sentido de uma ação reflexiva e desafiadora do educador
em termos de contribuir, elucidar, favorecer a troca de idéias entre e com seus alunos.
3. o diálogo professor/aluno – o diálogo entendido a partir da relação epistemológica, não se
processa obrigatoriamente através da conversa, enquanto comunicação verbal com o estudante.
Refletir em conjunto com o aluno sobre o objeto do conhecimento, para encaminhar-se à supe-
ração, significa desenvolver uma relação dialógica, princípio fundamental da avaliação mediadora.
4. acompanhamento individualizado – o diálogo, compreendido como leitura curiosa e investi-
gativa do professor das tarefas de aprendizagem, poderá se estabelecer mesmo se o educador traba-
lhar com muitos alunos, no sentido de permitir lhe, senão a proximidade corpo a corpo com o estu-
dante, o debruçar-se sobre suas idéias e as do grupo para acompanhar seus argumentos e vir a discuti-
los ou enriquecê-los.

Portanto, o maior desafio é favorecer a descoberta pelos professores do significado da avaliação


mediadora para a formação de um profissional competente.
Confirmando a hipótese da autora que experiências em avaliação mediadora possam provocar
espontaneamente um reestudo do currículo, realizou um trabalho junto a uma universidade e consta-
tou que a prática avaliativa foi sendo reformulada e explicitada em seu desenvolvimento através de
reflexões constantes e ajustes necessários.

Os professores participantes do projeto no Ensino Médio relataram algumas conclusões:

- o processo de transformação inicia de forma lenta com muitas resistências dos alunos. Uma
vez compreendido, o processo alcança bons resultados; · a proposta exige a reflexão permanente do
grupo e ajustes freqüentes;

- a cooperação entre os alunos e destes com a professora é um dos resultados alcançados. Os


alunos passam a mostrar-se mais interessados em vencer suas dificuldades e a refazer seus trabalhos; ·
a não-atribuição de notas à tarefas e situações não-declaradas de “prova” causam menor pressão e
resultados mais favoráveis de aprendizagem;

- o processo provoca naturalmente a revisão do currículo pelos professores e o repensar de sua


metodologia;

- percebe-se com maior clareza a dimensão das dificuldades dos alunos.

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Nesta perspectiva, avaliação mediadora é uma postura de vida e os fundamentos de uma ação
avaliativa mediadora ultrapassam estudos sobre teorias de avaliação e exigem o aprofundamento em
teorias de conhecimento bem como estudos referentes a áreas específicas de trabalho do professor.
A ação avaliativa mediadora se desenvolve em benefício ao educando e dá-se fundamentalmen-
te pela proximidade entre quem educa e quem é educado. Pela curiosidade de conhecer a quem edu-
ca e conhecendo, a descoberta de si próprio. Conhecimento das possibilidades dos educandos de con-
tínuo vir a ser, desde que lhe sejam oferecidas as oportunidades de viver muitas e desafiadoras situa-
ções de vida.

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