Você está na página 1de 127

A PRODUÇÃO DO

CONHECIMENTO NO
AMBIENTE ESCOLAR

Autoria: Patrícia Cesário Pereira Offial


Kevin Daniel dos Santos Leyser

UNIASSELVI-PÓS
Programa de Pós-Graduação EAD
CENTRO UNIVERSITÁRIO LEONARDO DA VINCI
Rodovia BR 470, Km 71, no 1.040, Bairro Benedito
Cx. P. 191 - 89.130-000 – INDAIAL/SC
Fone Fax: (47) 3281-9000/3281-9090

Reitor: Prof. Hermínio Kloch

Diretor UNIASSELVI-PÓS: Prof. Carlos Fabiano Fistarol

Equipe Multidisciplinar da
Pós-Graduação EAD: Carlos Fabiano Fistarol
Ilana Gunilda Gerber Cavichioli
Cristiane Lisandra Danna
Norberto Siegel
Camila Roczanski
Julia dos Santos
Ariana Monique Dalri
Bárbara Pricila Franz
Marcelo Bucci

Revisão de Conteúdo: Lúcia Cristiane Moratelli Pianezzer


Revisão Gramatical: Equipe Produção de Materiais

Diagramação e Capa:
Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI

Copyright © UNIASSELVI 2018


Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri
UNIASSELVI – Indaial.

OF32a
Offial, Patrícia Cesário Pereira

A produção do conhecimento no ambiente escolar. / Patrí-


cia Cesário Pereira Offial; Kevin Daniel dos Santos Leyser – In-
daial: UNIASSELVI, 2018.

127 p.; il.

ISBN 978-85-53158-46-1

1.Produção de conhecimento – Brasil. I. Leyser, Kevin


Daniel dos Santos. II. Centro Universitário Leonardo Da Vinci.

CDD 370
Patrícia Cesário Pereira Offial

Graduada em Pedagogia pela FURB


Blumenau/SC (1999), especialista em
administração escolar pela FAE, Curitiba/PR (2005),
Mestre em Educação pela UNIVALI, Itajaí/SC (2012)
e professora do curso de Pedagogia da Graduação
(UNIASSELVI), professora da Pós-graduação. Publicou:
Formação Estética e Literatura; Formação Estética e
Artística Saberes Sensíveis; Nas Asas das Gaivotas.

Kevin Daniel dos Santos Leyser

Possui graduação em Psicologia com Licenciatura


Plena, Bacharelado e Formação pela Universidade
Comunitária Regional de Chapecó (2005), em Filosofia
com Licenciatura Plena pela Universidade Comunitária
Regional de Chapecó (2004), em Teologia com Bacharelado
pela Faculdade de Educação Teológica Logos (2002). É
especialista em Psicopedagogia e Práticas Pedagógicas e
Gestão Escolar pela Faculdade de Administração, Ciências,
Educação, Letras (FACEL) (2007). Mestre em Educação pela
Universidade Regional de Blumenau (FURB) (2011). Trabalha
há 11 anos no Ensino Superior, atualmente é professor na
FAMEG/UNIASSELVI em Guaramirim (SC) e no Centro
Universitário Leonardo da Vinci/UNIASSELVI em Indaial (SC).
Faz parte do grupo de pesquisa em Filosofia da Educação
(EDUCOGITANS). Tem experiência na área de Filosofia,
com ênfase em epistemologia, pragmatismo e educação;
na área de Psicologia, com ênfase em psicoterapias
fenomenológico-existenciais, processos cognitivos,
aprendizagem sócio emocional e educação; na área
e Teologia, com ênfase em filosofia e epistemologia
da religião. Na EAD, publicou: Filosofia Geral e da
Religião; Psicologia Geral e da Religião; Filosofia
Política e Ética e Profissão.
Sumário

APRESENTAÇÃO...........................................................................07

CAPÍTULO 1
A Centralidade da Aprendizagem nas Práticas
Educativas Escolares..................................................................09

CAPÍTULO 2
O Conhecimento e a Era das Relações:
Quais as Novas Pautas?...............................................................35

CAPÍTULO 3
A Relação Professor-Aluno na Produção
do Conhecimento..........................................................................65

CAPÍTULO 4
Contextos Atuais e Desafios Sobre
o Conhecimento na Escola..........................................................99
APRESENTAÇÃO
A produção do conhecimento no ambiente escolar vem sendo alvo de
debates que apontam questionamentos e mudanças nos diferentes contextos
educacionais.

Ao entender o processo de aprendizagem e as práticas escolares,


percebemos que ainda há uma grande lacuna que precisa ser ressignificada
quando se refere a currículos, mediação e avaliação. Para tanto, é importante
compreender qual o papel das escolas como mediadoras do processo de ensino e
aprendizagem e construtoras de novos conhecimentos.

No capítulo 1 deste livro, apresentamos reflexões que tratam da centralidade


da aprendizagem nas práticas educativas escolares, instigando você pós
graduando à análise de práticas escolares na relação com a produção de
conhecimento.

Abordaremos o conhecimento e a Era das Relações, questionando quais


as novas pautas da educação, conduzindo você a comparar a perspectiva do
conhecimento de acordo com os modelos de ciência em cada época, e suas
implicações na educação atual, compondo o capítulo 2 deste livro.

No capítulo 3 debateremos a relação professor-aluno apresentando as


diferentes teorias e ambientes de aprendizagem apontando dados de pesquisas
atuais sobre a relação professor-aluno e seus efeitos no seu desempenho.

Por fim, compondo o capítulo 4 discutiremos os contextos atuais e os desafios


sobre o conhecimento na escola, apresentamos algumas das reflexões sobre o
conhecimento, as disciplinas, o papel e o conteúdo escolar em todos os níveis,
que estão formando um contexto para as práticas atuais.

Bons estudos!
C APÍTULO 1
A Centralidade da Aprendizagem
nas Práticas Educativas Escolares

A partir da perspectiva do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes


objetivos de aprendizagem:

� Analisar as práticas escolares e a relação com a produção de conhecimento

� Discutir sobre as práticas inovadoras e a contribuição para os avanços


cognitivos.

� Conhecer práticas que estimulem o desenvolvimento integral do aluno.


A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NO AMBIENTE ESCOLAR

10
Capítulo 1 A Centralidade da Aprendizagem nas
Práticas Educativas Escolares

1 Contextualização
Discutir o tema da centralidade das aprendizagens na ação educativa requer
entender o contexto histórico e atual da escola e sua forma de lidar com o conhe-
cimento. As transformações sociais, culturais, políticas e econômicas afetam dire-
tamente a perspectiva do conhecimento no ambiente escolar, além da articulação
entre currículos e práticas pedagógicas. Deste modo, este capítulo propõe um
estudo que orientará o entendimento sobre a escola e o conhecimento no decorrer
da história e seus avanços, bem como o conhecimento em rede e o conhecimento
em processo.

Boa leitura!

2 Escola e Conhecimento no Tempo:


Quais os Avanços?
Para compreendermos a escola atual, teremos que inseri-la num contexto
histórico recente, pois não foi construída a partir de uma necessidade lógica e
científica, e sim por uma condição histórica, o que a torna fruto de necessidades
sociais. Diante disso, entender a instituição de hoje, só fará sentido se inserida
nas atuais condições, ou seja, no movimento social em torno da economia,
valores, educação e paradigma científico vigente. O mesmo ocorre quando
discutimos a história da educação de outras épocas em que, se desconsiderado
seu contexto social, muito possivelmente levará a conclusões, julgamentos e
críticas equivocadas. Por isso, ao pesquisar, estudar ou entender qualquer esfera,
seja ela política, educacional, religiosa ou econômica, temos que nos reportar à
época em que o referente objeto de pesquisa ou estudo está inserido. Entender
uma época isolando-a de seu contexto histórico e social, é olhar e compreender
através de um ponto de vista apenas, limitando assim cada parte que o constituiu.

É preciso apreender o movimento dos fatos através do


desenvolvimento histórico, as formas de estruturação, as
conexões internas, as relações de causalidade, as distinções
entre o permanente e o transitório. É preciso compreendê-
los como parte de um momento de todo, revelador de sua
especificidade ao mesmo tempo em que sinaliza suas
implicações para a compreensão da totalidade, já que existem
as relações de interdependência e um dinamismo recíproco
entre ambos. Acumular fatos e memorizar dados estatísticos
sobre determinada realidade educacional não implicam o
conhecimento da realidade (MORAES, 2010, p. 87).

11
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NO AMBIENTE ESCOLAR

Neste aspecto, antes de qualquer debate sobre a escola e o conhecimento,


é importante esclarecermos que a instituição escolar é recente se comparada
ao surgimento do homem no planeta. As formas de ensinar e conceber o
conhecimento têm raízes num passado não muito distante. Vamos entender
resumidamente a história da educação:

QUADRO 1 – EDUCAÇÃO NA HISTÓRIA

Educação na antiguidade Educação na Idade Média Educação moderna

Reconhecida por seu poder Podemos reconhecer Foi esse modelo de


militar e caráter guerreiro, traços da tradição educação escolar centrado
o modelo de educação espartana na educação na figura do professor
espartano baseava-se medieval. Os estudantes como transmissor do
na disciplina rígida, no eram formados de acordo conhecimento que se
autoritarismo, no ensino com o pensamento expandiu ao longo
de artes militares e códigos conservador da época e a dos séculos XVIII e
de conduta, no estímulo educação desenvolvida em XIX, impulsionado pela
da competitividade entre consonância com os rígidos Revolução Industrial e a
os alunos e nas exigências dogmas da Igreja Católica. consequente urbanização e
extremas de desempenho. aumento demográfico.
Cabe ressaltar que até o
Por outro lado, século XVII os valores Além disso, o
Atenas tinha no logos morais e até mesmo os fortalecimento e
(conhecimento) seu ideal ofícios responsáveis pela expansão de regimes
educativo mais importante. garantia da subsistência democráticos influenciou
O exercício da palavra, eram transmitidos em a reivindicação pelo
assim como a retórica e a grande parte dentro dos acesso à escola enquanto
polêmica, era valorizado próprios círculos familiares, direito do cidadão e à
em função da prática da sendo que esses valores educação passa a ser
democracia entre iguais. e códigos de conduta atribuída a tarefa de
eram profundamente formar cidadãos, cientes
influenciados pelo de direitos e deveres e
pensamento religioso. capazes de exercê-los
perante a sociedade.

12
Capítulo 1 A Centralidade da Aprendizagem nas
Práticas Educativas Escolares

Como herança da educação Em contrapartida, com A partir de meados do século


ateniense surgiram as Reformas Religiosas XIX, portanto, o modelo
os sofistas, considerados e o Renascimento, inicia- hierarquizado e autoritário de
mestres da retórica e da se uma nova era para o educação que caracterizou
oratória, eles ensinavam a Ocidente e é marcada pelo as instituições escolares
arte das palavras para que ressurgimento dos ideais até então passou a ser
seus alunos fossem capazes atenienses nos discursos questionado por educadores
de construir argumentos sobre os objetivos da como Maria Montessori, na
vitoriosos na arena política. educação. Europa, e John Dewey, nos
Fruto da mesma matriz Estados Unidos.
intelectual, porém em O conhecimento era tido
oposição ao pensamento como um corpo sagrado, Impulsionados pelo
sofista, o filósofo Sócrates essa matriz de pensamento desenvolvimento dos
propunha ensinar a permaneceu dominante estudos de psicologia
pensar – mais do que e foi grande responsável sobre aprendizagem e
ensinar a falar - através de pela concepção do papel desenvolvimento humano,
perguntas cujas respostas da educação desde o e com críticas à pedagogia
dependiam de uma análise desaparecimento do Antigo tradicional e à forma como
lógica e não simplesmente Regime até a constituição os conteúdos curriculares
da mera retórica. dos Estados Nacionais: o eram impostos aos alunos,
conhecimento passa a esses e outros educadores
Apesar de concepções ser organizado para ser passaram a reivindicar
opostas, tanto o transmitido pela escola, a participação ativa dos
pensamento sofista como através da autoridade alunos no processo de
o pensamento socrático do professor enquanto aprendizagem.
contribuíram para a sujeito detentor do saber
educação contemporânea e mantenedor da ordem e Desta forma e como
através da valorização da disciplina. mencionado anteriormente,
da experiência e do essas propostas
conhecimento prévio do resgataram princípios
aluno enquanto estratégias atenienses de educação
que se tornaram muito ao valorizar a experiência
relevantes para o sucesso anterior do aluno e seus
na aprendizagem do aluno conhecimentos prévios à
na contemporaneidade. aprendizagem escolar.

FONTE: Pereira (2017, s.p.).

Entender a educação na história traz uma compreensão mais lúcida sobre os


métodos, concepções e teorias educacionais, considerando que as práticas educativas
atuais remetem à herança de modelos educativos. E se tratando de conhecimento,
podemos dizer que esse foi e sempre será o maior objetivo da instituição escolar,
embora em tempos passados, a disciplina e a obediência se sobrepusessem ao
conhecimento. Naquela época, os saberes eram centrados no professor que os
transmitia com autoritarismo, exigindo mais disciplina e pouco diálogo.

13
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NO AMBIENTE ESCOLAR

Hoje, temos uma visão bem diferenciada, em que o conhecimento vem sendo
ressignificado por meios tecnológicos. Dá-se mais atenção às aprendizagens e
as formas diferenciadas do sujeito aprender. O professor passa a ser mediador e
propulsor dos saberes compartilhados, tendo os recursos tecnológicos, como fontes
de informações que percorrem caminhos que estão dentro e fora de sala de aula.

Contudo, os sistemas educacionais ainda não conseguiram avaliar de


maneira satisfatória o impacto das tecnologias da informação sobre a Educação.
Logo, será preciso trabalhar em dois tempos: o tempo do passado e o tempo do
futuro. Fazendo de tudo para superar as condições de atraso e, ao mesmo tempo,
criando condições para aproveitar as novas possibilidades que surgem através
desses novos espaços de conhecimento (PEREIRA, 2017, s.p.)

Nessa corrente, Moraes (2010) apresenta críticas ao que se refere aos


atuais modelos pedagógicos, que se respaldam em teorias contemporâneas,
práticas inovadoras, com uma estrutura curricular ultrapassada, engessada a
um modelo mecanicista, que divide conhecimento em assuntos e disciplinas. É
dessa disparidade entre práticas e currículos que surgem os grandes equívocos
e discussões no meio escolar. Para esclarecer esta afirmação, a autora cita
como exemplo alguns tipos de softwares que são utilizados nas escolas, e que
trazem em si uma proposta inovadora, porém oferecem métodos de exercícios
tradicionais que fazem com que o aluno repita e memorize, não desenvolvendo o
pensar e o criar. No entanto, salienta que existem bons e maus programas, porém
o problema é que a maioria apresenta um nível baixo de qualidade pedagógica.

Com toda inovação e recursos tecnológicos que poderiam levar nossos


alunos a produzir conhecimentos para atender a um mercado tão inovador, por
que ainda apresentamos baixo nível de escolarização?

Neste momento, vale ressaltar que não teremos uma única resposta, pois
entender pelo viés de apenas um autor poderá limitar seu entendimento, então
o convidamos a acompanhar a crítica de outros autores para depois relatar na
atividade de estudos a sua análise sobre toda leitura.

Libâneo (1994) cita alguns problemas educacionais que podem esclarecer


a nossa questão. Perceba que ele traz a crítica, mas também uma opção de
solução. Acompanhe:

14
Capítulo 1 A Centralidade da Aprendizagem nas
Práticas Educativas Escolares

QUADRO 2 – OS CONTEÚDOS

Crítica Possíveis soluções


O professor passa a matéria, o aluno O ensino deve ser mais que isso. Deve
recebe e reproduz mecanicamente o que compreender ações conjuntas do
absorveu. O elemento ativo é o professor professor e dos alunos pelas quais estes
que fala e interpreta o conteúdo. O aluno, são estimulados a assimilar, consciente
ainda que responda ao interrogatório do e ativamente, os conteúdos e os
professor e faça os exercícios pedidos, métodos, de assimilá-los com suas forças
tem uma atividade muito limitada e um intelectuais próprias, bem como aplicá-
mínimo de participação na elaboração los, de forma independente e criativa,
dos conhecimentos. Subestima-se a nas várias situações escolares e na vida
atividade mental dos alunos privando-os prática.
de desenvolverem suas potencialidades
cognitivas, suas capacidades e
habilidades, de forma a ganharem
independência de pensamento.

FONTE: Adaptado de Libâneo (1994, p. 78).

Nesse contexto, trazemos Piaget (1974) que concebe o conhecimento


como a interação do sujeito com o meio, num movimento que decorre de um
processo de reorganização reflexiva. O autor esclarece que a aprendizagem
não se constrói através do acúmulo das informações, mas sim pelas condições
cognitivas, pensamento e conhecimento, em conjunto com seu meio físico e
social. Portanto, escolas que centralizam os estudos somente nos conteúdos
escolares, não colaboram para o desenvolvimento das competências e
habilidades que geram o conhecimento.

Ainda assim, os conteúdos permanecem o centro de todo o processo


educativo, como se eles tivessem a autonomia de gerar o conhecimento. Se
olharmos para toda estrutura curricular, bem como sua ressignificação na
sala de aula, veremos que muitas das ações escolares giram em torno dos
conteúdos. O mais interessante é que estudos vêm nos alertando há décadas
sobre a desarticulação entre práticas e teorias.

15
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NO AMBIENTE ESCOLAR

QUADRO 3 – RECURSOS DIDÁTICOS

Crítica Possíveis soluções

É dada excessiva importância à matéria Os conteúdos do livro didático somente


que está no livro, sem preocupação de tor- ganham vida quando o professor os toma
ná-la mais significativa e mais viva para os como meio de desenvolvimento intelectual,
alunos. Muitos professores querem, a todo quando os alunos conseguem ligá-los com
custo, terminar o livro até o final do ano le- seus próprios conhecimentos e experiên-
tivo, como se a aprendizagem dependesse cias e quando através deles aprendem a
de “vencer” conteúdos. São ideias falsas. pensar com sua própria cabeça. É mais
O livro didático é necessário, mas por si só importante uma aprendizagem sólida e
não ganha vida. É um recurso auxiliar, cujo duradoura daquilo que se ensina do que
uso depende da iniciativa e imaginação do adquirir um grande volume de conheci-
professor. mento. Por essa razão, é fundamental que
o professor domine bem a matéria para
saber selecionar o que é realmente básico
e indispensável para o desenvolvimento da
capacidade de pensar dos alunos.

FONTE: Adaptado de Libâneo (1994, p. 78).

Nesse sentido, o conhecimento não é algo que se extrai dos recursos


didáticos, mas da ação do sujeito sobre o objeto, aliados à mediação do professor.
Percebemos que o sujeito realmente aprendeu pelos seus mecanismos de
assimilação, ação e transformação de seu meio como de si próprio. Assim, nada
externo é imposto sem que o organismo reaja.

Os recursos didáticos em sala de aula são muitas vezes interpretados pelo


docente como único meio para desenvolver o conhecimento, como se os livros ou
o uso das tecnologias fossem os responsáveis pela promoção das aprendizagens.
Eles são fortes aliados dos saberes, mas desde que utilizados com a participação
ativa do aluno, respeitando seu contexto cultural e seus processos cognitivos. E,
ainda assim, não garantem o conhecimento.

A contradição sempre está posta nos processos educativos:


o ensino só se concretiza nas aprendizagens que produz! E
as aprendizagens, em seu sentido alargado e bem estudadas
pelos pedagogos cognitivistas, decorrem de sínteses
interpretativas realizadas nas relações dialéticas do sujeito
com seu meio. Não são imediatas, não são previsíveis,
ocorrem por interpretação do sujeito, dos sentidos criados, das
circunstâncias atuais e antigas. Enfim, não há correlação direta
entre ensino e aprendizagem. Quase que se pode dizer que as
aprendizagens ocorrem sempre para além, ou para aquém do
planejado; ocorrem nos caminhos tortuosos, lentos, dinâmicos
das trajetórias dos sujeitos (FRANCO, 2015, p. 604).

16
Capítulo 1 A Centralidade da Aprendizagem nas
Práticas Educativas Escolares

Não podemos falar de garantias de conhecimentos, porque não há. Como


teremos a certeza que em uma sala com trinta alunos, todos aprenderão sobre
adição e subtração, por exemplo? Arriscamos dizer que uns aprenderão, outros
estarão no processo e, outros ainda terão mais dificuldades. Isso porque os
recursos didáticos para uns chegam como estímulo e desenvolvem conexões
relevantes a seu aprendizado, para outros não fazem sentido algum. É na relação
dos processos internos e externos que criamos as conexões e estimulamos a
aprendizagem.

Ainda sobre os recursos didáticos acompanhe a leitura complementar:

OS RECURSOS DIDÁTICOS NA APRENDIZAGEM MATEMÁTICA

Os recursos didáticos parecem exercer considerável influência


na aprendizagem matemática, como elucidam Freitas e Bittar (2004),
afirmando que não acreditam que as dificuldades para o aprendizado
da Matemática tenham origem na Matemática em si, pois ela é rica
em coerência interna, além de ser útil para resolver problemas da
realidade. Para os autores, essas dificuldades também não estão nas
pessoas, na capacidade de gostar ou não, de sair-se bem ou mal em
Matemática, pois confiam que todos têm condições de compreender
e de produzir matemática.

Deste modo o problema estaria na forma como um


(matemática) é apresentado ao outro (aluno), ou seja, na
metodologia que o professor adota para mediar os conteúdos,
envolvendo os recursos didáticos utilizados. Jesus e Fini (2005)
enfatizam que os recursos e materiais de manipulação podem
fazer com que o aluno focalize com atenção e concentração o
conteúdo matemático a ser aprendido, atuando como catalisadores
do processo natural de aprendizagem, aumentando a motivação,
estimulando-o, de modo a aumentar sua aprendizagem quantitativa
e qualitativamente.

Lorenzato (2006) destaca que com o auxílio do material


didático é possível conseguir uma aprendizagem com compreensão,
diminuindo assim a imagem da Matemática como uma disciplina para
alguns privilegiados, muito difícil; com o temor e a ansiedade sendo
substituídos pela satisfação e prazer de aprender com confiança,
e o mais importante, melhorando a autoimagem do aluno. O autor

17
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NO AMBIENTE ESCOLAR

ressalta que cada aluno tem um modo próprio de pensar, que varia
em cada fase da vida e está em constante processo de mudança,
portanto, a aprendizagem por compreensão é um processo pessoal
e único que acontece no interior de cada um, embora influenciado
por fatores externos. “As interações do indivíduo com o mundo
possibilitam-lhe relacionar fatos, estruturar ideias e organizar
informações, internalizando-as” (LORENZATO, 2006, p. 43). Assim,
através de experiências matemáticas bem-sucedidas e da interação
com objetos e situações do cotidiano, o aluno desenvolve o gosto
pela descoberta, a coragem para enfrentar desafios, o conhecimento
de maneira que consiga agir autônomo.

Nogueira (2005) alerta para a necessidade de utilizar os


materiais manipuláveis como mediadores da passagem das ações
concretas para a abstração dos conceitos, cabendo ao professor
garantir essa passagem com compreensão, para que a utilização
de materiais manipuláveis não se torne mais uma aula expositiva e
mecanizada apesar de contar com a presença dos materiais.

FONTE: Disponível em: <http://www.diaadiaeducacao.pr.gov.br/


portals/pde/arquivos/2164-8.pdf>. Acesso em 8 jun. 2018.

Podemos, então, considerar que entre os autores que mencionam os


recursos didáticos em sala de aula, todos corroboram a mesma opinião. Os objetos
utilizados como mediação das aprendizagens só terão êxito se combinados a uma
série de fatores, entre eles a participação ativa do aluno, pois o contexto de sujeito
da zona urbana é diferente da indígena, ou da rural, além disso, cada sujeito é
único e autêntico, com potenciais e limitações.

QUADRO 4 – O ENSINO

Crítica Possíveis soluções


O ensino somente transmissivo não cuida O verdadeiro ensino, ao contrário, busca
de verificar se os alunos estão preparados a compreensão e assimilação sólida das
para enfrentar matéria nova e, muitas matérias; para isso, é necessário ligar o
vezes, de detectar dificuldades individuais conhecimento novo com o que já se sabe,
na compreensão da matéria. Com isso, bem como promover os pré-requisitos,
os alunos vão acumulando dificuldades e caso seja necessário. A avaliação deve ser
assim, caminhando para o fracasso. permanente, de modo que as dificuldades
vão sendo diagnosticadas aula a aula.

FONTE: Adaptado de Libâneo (1994, p. 78).

18
Capítulo 1 A Centralidade da Aprendizagem nas
Práticas Educativas Escolares

Vemos muitas vezes propostas inovadoras que, ao se ressignificarem


no chão da escola, pela forma que o professor as conduz, acabam por se
transformar em aulas tradicionais marcadas pela repetição de conteúdos, ou
ações desarticuladas dos objetivos. Para que o ensino alcance seu propósito, que
é construir o conhecimento, é necessário que haja a reflexão crítica e o poder de
argumentação do aluno, que deve ser orientado a investigar sempre, pesquisar e
transformar os saberes. O aluno também deve ser estimulado a fazer conexões
com outras áreas, dialogar, partilhar, comunicar e vivenciar entre pares, pois é na
troca, na partilha, que nascem novos questionamentos, dúvidas, fazendo surgir
outros olhares e, consequentemente, novos conhecimentos.

Vejamos o exemplo de dois grandes educadores que deixaram marcas na


história da educação, por apresentarem uma perspectiva de ensino dinâmico em
que o conhecimento é vivenciado pela criança.

O educador Frederich Froebel, em 1983, criou o que ele chamou de


kindergarten (jardim de infância), com um ambiente preparado para estimular
as potencialidades da criança, a liberdade, a expressão e a criatividade.
Esta proposta se tornou um grande marco na educação da primeira infância,
expandindo-se, mais tarde, para a Inglaterra e os Estados Unidos.

Importante também falarmos de Maria Montessori, uma médica que deu


início ao seu trabalho de levar educação às crianças das áreas carentes de Roma,
com base no respeito à vida mental delas e na apreciação do seu potencial para
autonomia e aprendizagem. Seu método é ativo, dando ênfase ao trabalho e
à uma educação baseada no desenvolvimento dos sentidos. O aluno, nesta
perspectiva, é visto como um observador, um explorador capaz de descobrir o
ambiente que o cerca.

Para esses dois educadores, o ambiente deve estar organizado com materiais
preestabelecidos que agucem os sentidos e a experimentação, pois educar é permitir
a expressão e o potencial intelectual da criança e prepará-la para a vida prática.

QUADRO 5 – O PROFESSOR

Crítica Possíveis soluções


O trabalho docente fica restrito às paredes O trabalho docente, portanto, deve ter
da sala de aula, sem preocupação com a como referência, como ponto de partida e
prática da vida cotidiana das crianças fora como ponto de chegada, a prática social,
da escola (que influem poderosamente nas isto é, a realidade social, política, econô-
suas condições de aprendizagem) e sem mica, cultural da qual tanto o professor,
voltar os olhos para o fato de que o ensino como, os alunos, são parte integrante.
busca resultados para a vida prática, para o
trabalho, para a vida na sociedade.

FONTE: Adaptado de Libâneo (1994, p. 78).

19
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NO AMBIENTE ESCOLAR

O professor é um mediador considerável na ponte entre os novos saberes,


é o “fio condutor”, podemos dizer metaforicamente que ele é o “fio externo”, que
orienta, norteia, abre caminhos, conduz os múltiplos olhares, constrói e desconstrói
conceitos, mas o “fio interno”, ou seja, as capacidades cognitivas, emocionais e
biológicas provêm do aluno. Por isso é tão importante a noção da totalidade do
sujeito. A partir desta visão, o professor poderá planejar o ensino baseando-se
sempre num conjunto de dimensões sociais, cognitivas, psicológicas, físicas e
estéticas (saberes sensíveis).

FIGURA 1 – SÁTIRA DA MAFALDA SOBRE ESCOLA E CONHECIMENTO

FONTE: Disponível em: <https://profwagnerbueno.wordpress.com/2011/10/17/


voce-sabe-como-surgiu-o-dia-do-professor/>. Acesso em: 8 jun. 2018.

Muitas vezes o professor induz os alunos à automação dos velhos e


repetitivos discursos que limitam novos conhecimentos. Essa automação traz
o silêncio velado das vozes das crianças, dos jovens e adolescentes, de seus
desejos, indagações, inspirações e emoções. A formação do professor, talvez,
seja a causa desse desencontro entre teoria e prática, pois a forma que ele foi
orientado nos bancos da faculdade implicará diretamente em sua prática, ou seja,
se o professor não foi conduzido a pensar, refletir e argumentar, como ele poderá
ter essa consciência e consequentemente formar sujeitos com tais habilidades?
São os antigos problemas se repetindo.

A crise atual é também decorrente de uma crise de


conhecimento, da ignorância de como ocorre o processo
de construção do conhecimento. A física quântica oferece a
visão da totalidade, esclarece a multidimensionalidade do
processo educativo, mostrando que o conhecimento decorre
dos aspectos inseparáveis e simultâneos que envolvem os
aspectos físico, biológico, mental, psicológico, cultural e social.
Enfatiza a consciência da inter-relação e a interdependência
essencial entre todos os fenômenos da natureza, o que
implica a concepção da realidade a ser transformada,
a formulação de conceitos e modelos interligados e, ao
mesmo tempo, o desenvolvimento de organizações sociais
compatíveis com esses princípios. A visão de totalidade
envolve o reconhecimento da conexidade dos problemas
educacionais, que não podem ser vistos isoladamente,

20
Capítulo 1 A Centralidade da Aprendizagem nas
Práticas Educativas Escolares

e oferecem também uma construção teórica de como ocorre


a participação do sujeito na construção do conhecimento,
compreendendo-o como algo que está sempre em processo de
construção, uma abstração de um fluxo total e único (MORAES,
2010, p. 22, grifos nossos).

Nessa mesma linha de pensamento, Zilberman e Rosing (2009) apontam em


seus estudos as velhas crises e novas alternativas. Eles se referem à problemática
da leitura nas escolas, mas essa deficiência não está isolada, vem de um conjunto de
situações que foram negligenciadas ou não vistas. O interessante é que as autoras
já falavam há 30 anos sobre essa mesma problemática e, atualmente, revisitando
seus escritos, os velhos problemas continuam em pauta. De acordo com elas:

Os problemas educacionais permanecem, tendo-se somado


novas razões às antigas queixas. O empobrecimento da escola
pública é visível em todo o país, ampliando-se a clivagem
entre as instituições de ensino destinadas às classes pobres,
localizadas na periferia urbana, e as que atendem às camadas
superiores. A depauperação dos professores, submetidos
a maus salários e ao desdém por parte do poder público, se
evidencia em ambas as circunstâncias. Contudo, recaem sobre
o professor e sobre o sistema escolar as maiores cobranças,
seja pelos velhos problemas persistirem, de que resultam
performances negativas em avaliações contínuas, seja por
não saberem se posicionar perante os novos desafios, os
que são colocados pelas mudanças tecnológicas e científicas
(ZILBERMAN; ROSING, 2009, p. 13).

A partir dessa discussão sobre escola e ensino, esclarecemos que o


conhecimento exige do sujeito dinamismo, habilidades e competências frente
ao mundo, numa atuação cônscia e transformadora de sua identidade e de seu
coletivo. Para isso, é necessário posicionamento crítico diante das discussões,
inovações e questões sociais, e neste aspecto, o maior desafio da instituição
escolar é formar sujeitos conscientes de seu papel no mundo, entendendo a sua
responsabilidade consigo, com os outros e com a natureza.

Atividades de Estudos:

1) Escolha três autores já citados e forme a sua opinião sobre as


questões a seguir:

a) Com toda inovação e recursos tecnológicos que poderia levar


nossos alunos a produzirem conhecimentos para atender a um
mercado tão inovador, qual o motivo de ainda apresentarmos
baixo nível de escolarização?

21
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NO AMBIENTE ESCOLAR

____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________

b) Quais são as principais fragilidades do atual modelo educacional


na construção do conhecimento?
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________

Pesquise mais sobre “Uma breve história da educação e do


nascimento da escola”, disponível em: <https://goo.gl/6dB5AF>.
Acesso em: 8 jun. 2018.

3 O Conhecimento em Rede e as
Aprendizagens na Escola
A partir dos estudos de Moraes (2010), o paradigma científico atual traz a
concepção de mundo como um fluxo em contínuo movimento, impulsionado pelo
conhecimento, mas não um conhecimento restrito a pequenos grupos de poder,
estamos falando de uma rede de conhecimentos, como uma teia, em que todos
estão interligados de alguma forma.

Nessa teia interconexa que representa os fenômenos observados


descritos por conceitos, modelos e teorias, não há nada que seja
primordial, fundamental, primário ou secundário, pois já não existe
mais nenhum alicerce, fixo e imutável. Isso significa que não existe
uma ciência, ou uma disciplina, que esteja acima e outra abaixo,
que não há conceitos em hierarquias ou algo que seja mais

22
Capítulo 1 A Centralidade da Aprendizagem nas
Práticas Educativas Escolares

fundamental do que qualquer outra coisa. O enfoque disciplinar


atual é fruto do racionalismo científico que modelou o pensamento
humano durante séculos. Este gerou a especialização em razão
da grande variedade do conhecimento humano, especialmente a
partir da revolução científica (MORAES, 2010, p. 75).

Ao considerarmos que o processo do conhecimento é movimentado por uma


grande rede, ou seja, tudo está interligado, podemos perceber o quanto a estrutura
curricular está ultrapassada pela fragmentação das disciplinas em conteúdos. Assim,
entender o conhecimento é compreender através de uma consciência coletiva e
individual, cada um com suas especificidades atuando numa rede de complexidades.

CONSTRUINDO CONHECIMENTO EM REDE

Professores discutem novas estratégias e possibilidades de ensino


diante das alternativas digitais da atualidade e do acesso à grande
quantidade de informação permitida por elas. Ferramentas não faltam.

Celulares, tablets, notebooks e outros eletrônicos quer queiram, quer


não, fazem parte da vida de crianças e jovens em boa parte do mundo.

Em vez de vê-los como obstáculo à educação, é hora de


enxergar o seu potencial como ferramenta para aprimorar o ensino.
O conectivismo é uma das poucas teorias de aprendizagem que
estão em sintonia com essa nova realidade. Idealizado por George
Siemens, parte do pressuposto de que o conhecimento é construído
por meio de redes e interações e busca responder à seguinte
questão: como podemos ajudar o estudante a aprender?

“Aprender, é criar redes”, reafirma o colombiano Diogo Leal.


Especialista em redes sociais na educação, Leal participou do
congresso PeopleNET in Education, realizado no mês de março, em
São Paulo, com o objetivo de estimular a reflexão e o bom uso das
novas mídias em sala de aula.

Na ocasião, ele lembrou que a aprendizagem e o conhecimento


se apoiam em uma vasta gama de informações provenientes de
diferentes fontes, acrescentando: “Não é possível controlar as redes,
mas pode-se influenciá-las”.

Pesquise mais em: <https://goo.gl/gRgc9u>.

23
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NO AMBIENTE ESCOLAR

Falamos anteriormente da estrutura curricular que, mesmo na era do


conhecimento compartilhado, insiste na fragmentação dos saberes em disciplinas.
Discussões sobre novas formas de organizar o currículo vêm aos poucos se
construindo com bases mais integradoras, apesar de termos muito a fazer ainda.
Vamos entender essa tendência por meio da pesquisa de Prado (2000).

A educação básica no Brasil é organizada em três etapas: educação infantil,


ensino fundamental e ensino médio. Contudo, com a problemática da evasão
escolar, tornou-se necessário criar um programa de educação de jovens e adultos,
para atender aos que por algum motivo estavam fora da escola. O programa que
era para ser provisório passou a ser contínuo. Atender a esta população que não
teve acesso é imprescindível, mas alertamos que o ideal seria a extinção desta
situação atual, ou seja, programas de prevenção e não de remediação. Uma
educação de qualidade envolve igualdade, e enquanto o programa continuar, é
sinal de que não vencemos nesse quesito.

As tentativas seguem em frente. Já temos um olhar voltado para as diversidades,


por exemplo, o caso das comunidades indígenas. Entendendo que o conhecimento
é para todos, a Constituição reconheceu e passou a garantir-lhes o direito de fazer
uso de suas línguas maternas, bem como suas formas próprias de aprendizagem.
Falar de conhecimento é falar de qualidade, e qualidade de educação é igualdade.
Nesse caso, os currículos trazem a valorização da expressão dos conhecimentos,
tradições e valores que uma sociedade precisa para tornar autêntico o percurso
educativo de suas crianças e jovens (PRADO, 2000).

Questões relacionadas a conhecimentos e valores vêm sendo discutidas e


alteradas nos últimos anos. As crises ou mudanças sociais acarretam em novas
formas de organizar a educação, com exigências na qualidade educativa, que
recai consequentemente no quesito curricular, nas ações das escolas e numa
nova forma de entender o conhecimento.

Dessa forma, referências nacionais de educação devem solucionar antigos


problemas da educação, apontando os novos desafios trazidos pela conjuntura
mundial e pelas novas características da sociedade, considerando as diversidades,
sendo elas regionais, culturais ou políticas.

Para entender o paradigma atual do conhecimento, veremos a seguir a


concepção pedagógica subjacente, com a nova proposta curricular trazida por
Prado (2000):

24
Capítulo 1 A Centralidade da Aprendizagem nas
Práticas Educativas Escolares

• A escola existe, antes de tudo, para os alunos aprenderem o


que não podem aprender sem ela. Nesse aspecto a escola não
é detentora do saber, mas a propulsora das aprendizagens, tendo
a responsabilidade do ensinar: a pesquisar, a não aceitar qualquer
argumento sem fundamento, mas com muita investigação, a respeitar
a diversidade e a natureza, a liderar e a trabalhar em grupo.

• O professor organiza a aprendizagem, avalia os resultados,


incentiva a cooperação, estimula a autonomia e o senso
de responsabilidade dos estudantes. A tarefa do professor
é essencial no que diz respeito ao incentivo e ao estímulo às
potencialidades do aluno. Na perspectiva da inclusão, não só
sujeitos com deficiências, mas todos, com dificuldades ou sem,
precisam serem reconhecidos e valorizados no ambiente escolar,
tendo as mesmas chances de se desenvolverem, considerando
suas competências e habilidades, como também trabalhando suas
fragilidades. É na escola que devemos aprender que o erro é uma
alternativa para o acerto e não uma desaprovação ou interpretação
negativa, que acaba muitas vezes rotulando o aluno.

• Nada substitui a atuação do próprio aluno no processo de


aprendizagem. Por mais que a escola ofereça condições do aluno
aprender, se não houver a interação do sujeito com seu meio,
dificilmente poderá ocorrer a aprendizagem. O conhecimento é
movido pelo interesse, que muitas vezes precisam ser estimulados.
E nesse caso é fundamental o professor entender que cada aluno
é especial e que traz um contexto de vida. O estímulo para uns
pode significar repulsa para outros. Um exemplo bem simples é
a palavra “pão”, para uns remete à saciedade e para outros, no
entanto, a dor da fome. Isso mostra que somos diferentes não só
pelo DNA, mas por uma condição de vida. O professor deve ser
sensível a essas diferenças.

a) O ponto de partida é sempre o conhecimento prévio do aluno

Você já deve ter ouvido muito que devemos reconhecer o que o aluno
traz de bagagem, mas como isso se ressignifica na prática? Como é possível
compreender e considerar cada contexto, cada cultura através de tantos
conteúdos disponíveis? Analise a evolução dos questionamentos no Quadro 6:

25
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NO AMBIENTE ESCOLAR

QUADRO 6 – QUANTIDADE DE TESES E DISSERTAÇÕES


SOBRE CULTURA ESCOLAR
ANO FREQUÊNCIA PERCENTUAL
1987 A 1992 0 0%
1993 1 0,28%
1994 0 0%
1995 2 0,56%
1996 5 1,38%
1997 6 1,66%
1998 4 1,11%
1999 5 1,38%
2000 11 3,05%
2001 19 5,26%
2002 27 7,48%
2003 35 9,70%
2004 65 18%
2005 49 13,57%
2006 61 16,90%
2007 71 19,67%
TOTAL 361 100%
FONTE: Capes (1987/2007).

Essa pesquisa demonstrou a crescente preocupação em considerar as culturas


de contexto no ambiente escolar. Damke e Simon (2011) destacam que a instituição
de ensino está preocupada em seguir as regras e disciplinas, tendo controle do tempo
e o espaço com seu funcionamento rigoroso, expondo assim uma discrepância entre
a instituição que se tem e a que se almeja. Destacam ainda que “a educação não
pode ser planejada de forma isolada da cultura, pois ela existe em uma cultura que
trata de poder, de diferenças e de recompensas” (DAMKE; SAIMON, 2011, p. 5385).
Mesmo que os educadores atuem em um ambiente determinista, com regulamentos
e exigências de conteúdos, isso não impede que os inovem, por meio de práticas que
vinculem a cultura e a diversidade a partir do contexto do aluno.

b) A avaliação é um instrumento de melhoria do ensino e não uma arma


contra o aluno

A avaliação deixou de ter um caráter reprovador e negativo para ser elemento de


reconhecimento das fragilidades e transformadora de potenciais. Haja vista que é pelo
erro que superamos nossos equívocos. Nesse sentido, a escola que produz conhecimento
com respeito à individualidade preconiza o erro como um saber em construção.

c) A aprendizagem bem-sucedida promove a autoestima do aluno; o


fracasso ameaça o aprender e é o primeiro passo para o desinteresse

26
Capítulo 1 A Centralidade da Aprendizagem nas
Práticas Educativas Escolares

Um ponto muito importante sobre a produção do conhecimento no espaço


escolar é que o aluno com dificuldade muito provavelmente apresentará desinteresse
e desistência pelos estudos. Essa preocupação deve ser constante do professor, uma
vez que se trata de autoestima, sendo esta a mola-mestra para os impulsos das ações.

A partir desse entendimento destacamos alguns pontos importantes:

O desenvolvimento da autonomia e responsabilidade é essencial não só para


o aluno entender que ele é o “gestor de sua aprendizagem”, mas também para a
formação de uma consciência responsiva para com seu papel na sociedade em
que atua. O processo do conhecimento lida com as novas perspectivas: a partir
do que o aluno já sabe, por exemplo, ele aprende a aprender por meio de outros
pontos de vistas; compartilhando suas experiências e aprendendo a pesquisar,
construir e transformar seu ambiente, gerando assim novos conhecimentos.

A instituição escolar foi constituída na história da humanidade


como o espaço de socialização do conhecimento formal historicamente
constituído. O processo de educação formal possibilita novas formas
de pensamento e de comportamento: através das artes e das ciências
o ser humano transforma sua vida e a de seus descendentes. A escola
é assim, um espaço de ampliação da experiência humana, devendo,
para tanto, não se limitar às experiências cotidianas das crianças, mas
trazer, necessariamente, conhecimentos novos, metodologias e áreas
de conhecimento contemporâneas. O currículo se torna, assim, um
instrumento de formação humana (LIMA, 2009).

Leia mais em: LIMA, Elvira Souza. Currículo, cultura e


conhecimento. São Paulo: Inter Alia, 2009.

4 O Conhecimento em Processo
As transformações vistas na sociedade estão cada vez mais aceleradas e
disso não duvidamos. Moraes (2010) afirma que o conhecimento está em processo,
numa transição que integra um conjunto de saberes, desmistificando verdades
fixas, inabaláveis. Hoje, entende-se que o conhecimento é um eterno “vir-a-ser”.

O conhecimento como processo em um contexto dinâmico de “vir-a-ser”,


também foi destacado por Piaget e Dewey. Um processo de reorganização
reflexiva que facilita a abertura de um conhecimento menor para a circunstância

27
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NO AMBIENTE ESCOLAR

de conhecimento maior e mais completo. Nesse aspecto, Piaget propôs


compreender os problemas epistemológicos e ressaltar o papel ativo da criança no
desenvolvimento dos saberes. Identificou que seu desenvolvimento cognitivo vem
de um processo de elaboração fundamentalmente baseado na ação da criança,
e não na unificação de informações acumuladas. A partir daí, Piaget passou a
aprofundar seus estudos na ação da criança, a qual denominou como processos
de funcionamento de toda organização viva.

Essa ação é considerada forma de adaptação de um organismo


ao meio por intermédio dos esquemas motores, o que seria a
condição de estruturação do mundo pela criança. Na interação
da criança com o seu ambiente, ela desenvolve estruturas por
meio de “esquemas de ação”. Esquema seria uma sequência
bem definida de ações físicas e mentais. É a ação que se
desenvolve com ordem e coerência, que se refere a um tipo
regular de ação que a criança aplica a vários objetos. É algo
transponível, generalizável, diferenciável de uma situação para
outra; algo comum às diversas aplicações da mesma coisa
(MORAES, 2010, p. 92).

Aprender pela ação, segundo Hohmann e Weikart (2007), significa que a


aprendizagem ocorre mediada pela iniciativa pessoal, ou seja, ninguém aprende
se não tocar, mexer, manipular, falar, experimentar, cheirar. Enfim, aprender
significa envolver-se. No entanto, a aprendizagem só acontece quando pais,
professores e responsáveis disponibilizam oportunidades de aprendizagem ativa.
Dessa forma, acreditar na aprendizagem ativa é, antes de tudo, acreditar que as
crianças são pessoas competentes.

Hohmann e Weikart (2007) consideram a aprendizagem ativa como uma


aprendizagem pela ação e que esta é uma condição necessária para a reestruturação
cognitiva e para o desenvolvimento humano. No contexto da educação infantil,
a aprendizagem ativa pode ser melhor observada por meio da brincadeira. Na
brincadeira a criança cria e recria desafios, desenvolvendo sua capacidade de
representar as situações-problema e as ações que realizou para resolvê-las.

É o primeiro dia de aula de Kelo, no Chade, na África. As crianças


caminham pela estrada. ‘Vou ganhar um caderno?’, pergunta Tomás. ‘Vou
ganhar um lápis? Vou aprender a ler como vocês? Mas quando ele e as
outras crianças chegam à escola, não há sala de aula, nem carteiras. Apenas
uma professora. ‘A primeira lição é construir a nossa escola’, diz ela.

Acesse o livro: RUMFORD, James. Escola de Chuva.


São Paulo: Brinque Book, 2012.

28
Capítulo 1 A Centralidade da Aprendizagem nas
Práticas Educativas Escolares

5 Há Diferença Entre o Conhecimento


Social e o Conhecimento Escolar?
Segundo Young (2007), a escolaridade abrange a possibilidade de acesso ao
saber especializado em diferentes áreas. Nesse sentido, o autor traz as seguintes
indagações:

• Há diferenças entre o conhecimento escolar e o cotidiano?


• Há diferenças e relações entre domínios do conhecimento?
• Há diferenças entre o conhecimento especializado (por exemplo, física
ou história) e o conhecimento com tratamento pedagógico (por exemplo,
física escolar ou história escolar para diferentes grupos de alunos)?

Young (2007) explica que há dois tipos de conhecimentos, um que é o


conhecimento vinculado ao contexto, que se processa ao entender situações
práticas e específicas no dia a dia, por exemplo, consertar um chuveiro elétrico, ou
achar um determinado endereço no mapa, que também pode ser procedimental,
como um manual ou conjunto de regras de saúde e segurança. O conhecimento
condicionado ao contexto faz com que o indivíduo execute funções específicas e
lide com situações detalhadas, ou seja, mais objetivas e não subjetivas.

Já o conhecimento independente de contexto ou conhecimento teórico


envolve generalizações e busca a universalidade. “Ele fornece uma base para se fazer
julgamentos e é geralmente, mas não unicamente, relacionado às ciências. É esse
conhecimento independente de contexto que é, pelo menos potencialmente, adquirido
na escola e é a ele que me refiro como conhecimento poderoso” (YOUNG, 2017, s.p.).

Algumas escolas vêm falhando no sentido de preparar os alunos a expandir


para o conhecimento poderoso.

Temos que considerar que a cultura do aluno pode influenciar no sucesso ou


insucesso escolar. Todavia, cabe à escola suprir essa desigualdade tornando o
espaço educativo em propostas democráticas e igualitárias.

[...] se as escolas devem cumprir um papel importante em promover


a igualdade social, elas precisam considerar seriamente a base
de conhecimento do currículo, mesmo quando isso parecer ir
contra as demandas dos alunos (e às vezes de seus pais). As
escolas devem perguntar: “Este currículo é um meio para que os
alunos possam adquirir conhecimento poderoso?”. Para crianças
de lares desfavorecidos, a participação ativa na escola pode ser
a única oportunidade de adquirirem conhecimento poderoso
e serem capazes de caminhar, ao menos intelectualmente,
para além de suas circunstâncias locais e particulares. Não há
nenhuma utilidade para os alunos em se construir um currículo
em torno da sua experiência, para que este currículo possa
ser validado e, como resultado, deixá-los sempre na mesma
condição (YOUNG, 2017, s.p.).

29
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NO AMBIENTE ESCOLAR

Assim, o currículo deve superar as condições básicas de conhecimento para


elevar o potencial dos alunos. Um currículo que atende somente ao que é necessário
não proporciona o “conhecimento poderoso” como cita o autor anteriormente.

Vamos entender melhor o conceito de conhecimento escolar:

CONCEITUANDO O CONHECIMENTO ESCOLAR

A tentativa mais aceita e original de se conceituar o conhecimento


escolar é a desenvolvida pelo sociólogo inglês Basil Bernstein (1971;
2000). Sua visão específica foi a de enfatizar o papel central das
fronteiras do conhecimento, como uma condição para a aquisição de
conhecimento e como uma incorporação das relações de poder que
estão necessariamente envolvidas na pedagogia. Bernstein começa
conceituando as fronteiras em termos de duas dimensões.

Primeiramente, ele faz uma distinção entre a  classificação do


conhecimento – ou o grau de isolamento entre domínios de conhecimento
– e o enquadramento  do conhecimento – o grau de isolamento entre
o conhecimento escolar ou o currículo e o conhecimento cotidiano
que os alunos trazem para a escola. Em segundo lugar, ele sugere que
a  classificação  do conhecimento pode ser  forte – quando os domínios
são altamente isolados um do outro (como no caso de física e história) –
ou fraca – quando há baixos níveis de isolamento entre domínios (como
nos currículos de humanidades ou ciências).

Da mesma forma, o enquadramento pode ser forte – quando o


conhecimento escolar e o não escolar são isolados um do outro, ou fraco,
quando as fronteiras entre o conhecimento escolar e o não escolar são
diluídas (como no caso de muitos programas de educação adulta e alguns
currículos planejados para alunos menos capazes). Posteriormente, em
seu trabalho, Bernstein (1996; 2000) passa de um foco nas relações entre
domínios para a estrutura dos domínios em si, ao apresentar a distinção
entre estruturas verticais e horizontais de conhecimento.

Essa distinção refere-se à maneira como os diferentes domínios


do conhecimento incorporam diferentes ideias de como o conhecimento
evolui. Enquanto nas estruturas de conhecimento verticais (tipicamente
as ciências naturais) o conhecimento evolui para níveis mais elevados
de abstração (por exemplo, das leis da gravidade de Newton à teoria da
relatividade de Einstein), nas estruturas de conhecimento horizontais ou
segmentais, como Bernstein expressa (como as ciências sociais e as
humanidades), o conhecimento evolui ao desenvolver novas linguagens
que apresentam novos problemas.

30
Capítulo 1 A Centralidade da Aprendizagem nas
Práticas Educativas Escolares

Alguns exemplos são inovações da teoria literária ou abordagens à


mente e à consciência. O interesse de Bernstein era, em primeiro lugar,
desenvolver uma linguagem para pensar em diferentes possibilidades
de currículo e suas implicações. Seu segundo argumento crucial
era fazer a conexão entre estruturas de conhecimento, fronteiras e
identidades de alunos. Sua hipótese era de que fronteiras fortes entre
domínios de conhecimento e entre o conhecimento escolar e o não
escolar exercem um papel crítico no suporte às identidades dos alunos
e, portanto, são uma condição para que progridam.

Contudo, há muitos aspectos específicos de como Bernstein usa


a ideia das fronteiras, e todos esses aspectos podem ser vistos em
Durkheim (MOORE, 2004). Primeiramente, as fronteiras referem-se
às  relações entre conteúdos, não aos conteúdos do conhecimento
em si. Em segundo lugar, embora as fronteiras fortes tenham sido
expressas historicamente em disciplinas escolares, do ponto de vista
de Bernstein, esse é um fato histórico e as disciplinas que conhecemos
não são a única forma que as fronteiras fortes podem ter.

Em terceiro lugar, as fronteiras fortes entre os conteúdos terão


consequências distributivas ou, em outras palavras, serão associadas a
certas qualidades negativas dos resultados. Em quarto lugar, a inovação,
seja ela associada a criar novo conhecimento (na universidade) ou ampliar
a aquisição de conhecimento poderoso para novos grupos de alunos,
demandará que cruzemos fronteiras e coloquemos identidades em
questão. Em outras palavras, a melhoria das escolas sob essa perspectiva
irá envolver tanto a estabilidade quanto a mudança, ou, como descrito
neste capítulo, a relação entre a manutenção e o cruzamento da fronteira.

Fonte: Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/es/v28n101/


a0228101.pdf>. Acesso em: 1 maio 2018.

Atividades de Estudos:

1) Explique com suas palavras o que é conhecimento em rede.


________________________________________________
________________________________________________
________________________________________________
________________________________________________
________________________________________________
________________________________________________

31
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NO AMBIENTE ESCOLAR

6 Cultura e Aprendizagens:
Ressignificação nas Práticas Educativas
Ao lidar com educação e cultura, presentes em várias dimensões da vida social,
percebemos o quanto a sua relação estimula a construção de novos conhecimentos
e, consequentemente, surgem novas práticas culturais que se ressignificam não só
na instituição educativa como em outros espaços de aprendizagem, formal e informal.

De acordo com o Plano Nacional de Cultura (BRASIL, 2018), os saberes


culturais devem ser vistos como componentes essenciais na educação formal,
proporcionando ao aluno os múltiplos olhares, aguçando seus sentidos e a
formação do saber sensível. As ações do PNC apontam para:

[...] a necessidade de fortalecer e estruturar a inter-relação entre


cultura e educação. Assim, mostram a importância de articular
agendas compartilhadas entre instituições de educação e de cultura,
e de ampliar as possibilidades de colaboração e complementaridade
nos diferentes níveis de governo, ministérios e secretarias. Buscam
aproximar as redes de ensino e de cultura, com a efetiva inserção
das artes no sistema ensino regular e a transformação das escolas
e universidades em polos de fruição e produção cultural. Tais ações
propõem também a formação de pesquisadores e capacitação de
profissionais no campo cultural, com a promoção de cursos livres, de
novos cursos técnicos e superiores de atualização e gestão cultural.
Nesse sentido, apontam a importância de reconhecer os saberes e
fazeres na área da cultura. São propostas ainda iniciativas de incentivo
a projetos de pesquisa, buscando, assim, produzir e aprimorar
conhecimento sobre o campo da cultura (BRASIL, 2018, s.p.).

Desta forma, a relação entre cultura e aprendizagem traz a compreensão e a


interpretação da realidade pelos alunos e/ou crianças vinculadas a sua experiência
cultural, aos seus conhecimentos prévios, à cultura acumulada historicamente
pela humanidade e à cultura contemporânea.

Para você compreender melhor, há um conceito de criança apontado pelos


Parâmetros Nacionais de Qualidade da Educação Infantil que afirma que “A criança é
um sujeito social e histórico que está inserido em uma sociedade na qual partilha de uma
determinada cultura. É profundamente marcada pelo meio social [...], é um ser único,
completo e ao mesmo tempo em crescimento e desenvolvimento” (BRASIL, 2006,
p. 14). Na mesma linha, Sarmento e Pinto (1997) define que a criança é um cidadão
com direitos, é um sujeito sócio-histórico cultural que, em função das interações entre
aspectos biológicos e culturais, apresenta especificidades no seu desenvolvimento.

Lendo com atenção estes conceitos, você pode observar que é preciso
garantir a indissociabilidade nos aspectos cognitivos, emocionais, fisiológicos
e culturais. Portanto, a criança é um sujeito competente e de direitos, capaz de
interagir e produzir história e cultura no meio em que vive. A escola deve conceber
os alunos como coconstrutores de conhecimento e cultura.

32
Capítulo 1 A Centralidade da Aprendizagem nas
Práticas Educativas Escolares

Para finalizar os estudos dessa unidade recomendamos o filme:


“Amor impossível”.

O filme ensina sobre a vida acadêmica?

O pano de fundo desta comédia romântica é o trabalho de um


estudioso altamente especializado em um campo que tem muito
de experimental. Segundo o consultor Marco Oliveira, o filme é
interessante por mostrar os bastidores da pesquisa acadêmica e os
desafios da sua implementação. “Salmon fishing in the Yemen”.

7 Algumas Considerações
Ao pensar na produção de conhecimento na escola, é importante considerar um
currículo integrado e interdisciplinar que move toda uma ação educativa. Um currículo
que se organiza em torno de temas relevantes para os alunos e para sua realidade,
que flexibiliza as fronteiras entre as disciplinas, entre os horários e espaços escolares,
sempre num clima de diálogo colaborativo entre a escola e a comunidade. Para tanto,
é preciso levar em conta o protagonismo do educando e as múltiplas percepções de
mundo. Também não podemos esquecer que a função do professor constitui um papel
fundamental na produção do conhecimento ao selecionar conteúdos, elaborar a rotina,
organizar o espaço físico da sala de aula, e organizar projetos. Nos próximos capítulos
aprofundaremos a discussão sobre a produção do conhecimento e seus autores.

Referências
BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Política
Nacional de Educação Infantil: pelo direito das crianças de zero a seis anos à
educação. Brasília: MEC, SEB, 2006. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.
php?script=sci_arttext&pid=S0101-73302007000400002>. Acesso em: 1 maio 2018.

______. Plano nacional de cultura: educação e produção de conhecimento.


2018. Disponível em: <http://pnc.culturadigital.br/consultapublica/tema/educacao-
e-producao-de-conhecimento>. Acesso em: 10 abr. 2018.

BUENO, W. Você sabe como surgiu o dia do professor? Disponível em:


<https://profwagnerbueno.wordpress.com/2011/10/17/voce-sabe-como-surgiu-o-
dia-do-professor/>. Acesso em: 8 jun. 2018.

33
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NO AMBIENTE ESCOLAR

DAMKE, A. S.; SIMON, I. Práticas, experiências, cultura escolar: questões


que envolvem a prática docente. 2011. X Congresso Nacional de Educação-
EDUCERE. Disponível em: <http://educere.bruc.com.br/CD2011/pdf/5819_3021.
pdf>. Acesso em: 5 mar. 2018.

FERREIRA, A. P. O.; NOGUEIRA, C. M. I.; OLIVEIRA, L. L. A. Os recursos


didáticos como mediadores dos processos de ensinar e aprender
matemática. Disponível em: <http://www.diaadiaeducacao.pr.gov.br/portals/pde/
arquivos/2164-8.pdf>. Acesso em: 8 jun. 2018.

FRANCO, M. A. S. Práticas pedagógicas de ensinar-aprender: por entre


resistências e resignações. 2015. Disponível em: <https://www.revistas.usp.br/ep/
article/viewFile/105640/104329>. Acesso em: 3 abr. 2018.

GRAY, P. Uma breve história da educação e do nascimento da escola. Tradução


de Pedro Ribeiro Nogueira. Disponível em: <http://educacaointegral.org.br/
reportagens/uma-breve-historia-da-educacao-da-escola/>. Acesso em: 8 jun. 2018.

HOHMANN, M; WEIKART, D. Educar a criança. 4. ed. Lisboa: Fundação


Caloustre Gulbenkian, 2017.

LIBÂNEO, J. C. Didática. Campinas; SP. Ed. Papirus, 1994.

MORAES, M. C. O paradigma educacional emergente. Campinas/SP: Papirus, 2010.

PEREIRA, L. C. História da educação. 2017. Disponível em: <https://www.


infoescola.com/pedagogia/historia-da-educacao/>. Acesso em: 10 mar. 2018.

PIAGET, J. A equilibração das estruturas cognitivas. Problema central do


desenvolvimento. Trad. Álvaro Cabral. Rio de Janeiro: Zahar, 1974.

PRADO, I. G. A. O MEC e a organização curricular. São Paulo. Perspec. vol.


14 n. 1 São Paulo. jan./mar. 2000. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.
php?script=sci_arttext&pid=S0102-88392000000100011>. Acesso em: 11 jun. 2018.

SARMENTO, Manuel Jacinto; PINTO, Manuel. As crianças, contextos e


identidades. Braga, Portugal. Universidade do Minho. Centro de Estudos da
Criança. Ed. Bezerra, 1997.

YOUNG, M. Para que servem as escolas? Educ. Soc. vol.28 no.101 Campinas Sept./


Dec. 2007. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_
arttext&pid=S0101-73302007000400002>. Acesso em: 1 maio 2018.

ZILBERMAN, R.; RÖSING, T. K. Escola e leitura: velha crise, novas alternativas.


São Paulo: Global, 2009.

34
C APÍTULO 2
O Conhecimento e a Era das
Relações: Quais as Novas Pautas?

A partir da perspectiva do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes


objetivo de aprendizagem:

� Identificar a perspectiva atual do conhecimento.

� Reconhecer o processo da aprendizagem na era das relações.

� Comparar a perspectiva do conhecimento de acordo com os modelos de ciência


em cada época e suas implicações na educação atual.
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NO AMBIENTE ESCOLAR

36
Capítulo 2 O Conhecimento e a Era das Relações:
Quais as Novas Pautas?

1 Contextualização
O estudo sobre o conhecimento deve ser entendido não só pela
As formas de
perspectiva atual da educação, mas pelo seu contexto na história. As conceber o
formas de conceber o conhecimento de uma época não sustentam os conhecimento de
dias de hoje. Há uma relação intrínseca do paradigma científico com uma época não
os modelos educativos. Nesse aspecto, as formas de conhecimento sustentam os dias
ressignificado nos ambientes de aprendizagem precisam atender aos de hoje. Há uma
relação intrínseca do
novos desafios sociais e isso requer que o conhecimento seja pautado
paradigma científico
numa perspectiva dinâmica, reflexiva e crítica, fundamentada nos com os modelos
valores humanos. educativos.

2 Aprender e Ensinar na Era Das


Relações: Quais Conhecimentos
Nos Trouxeram Até Aqui?
Para a maioria dos estudiosos da área, o conhecimento serve para que os
sujeitos compreendam o mundo em que vivem e o transformem em benefício de
uma coletividade. No entanto, os saberes em tempos anteriores eram conduzidos
apenas como uma adaptação ao meio, ou seja, as pessoas eram educadas com
o propósito de atender aos moldes sociais de uma determinada cultura, já que o
conhecimento estava agregado às práticas de trabalho.

Esta forma de conhecimento nos serviu como meio de sobrevivência ao longo


dos anos, afinal, era substancial passar às gerações atividades que garantissem
as necessidades básicas, por exemplo, a caça, a pesca, o plantio, entre outros. O
conhecimento aplicado aos nossos antepassados serviu para que aprendêssemos
a construir formas de tornar eficientes o transporte, a alimentação, a moradia,
a comunicação, entre outros. E nossos saberes atuais, ou seja, o que hoje
estamos discutindo, pesquisando e transformando, servirão como escada para as
futuras gerações, trazendo as próximas evoluções. Para você ter uma ideia dos
avanços, considerando apenas o conhecimento agregado às comunicações que
foi transmitido de geração em geração, até alcançarmos a comunicação atual,
analise o texto ilustrativo a seguir:

37
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NO AMBIENTE ESCOLAR

FIGURA 1 – EVOLUÇÃO DA COMUNICAÇÃO

FONTE: Disponível em: <https://tenhaumatoalha.wordpress.com/2015/02/20/da-


pedra-a-internet-o-desenvolvimento-da-comunicacao/>. Acesso em: 15 maio 2018.

38
Capítulo 2 O Conhecimento e a Era das Relações:
Quais as Novas Pautas?

FIGURA 2 – EVOLUÇÃO DA COMUNICAÇÃO

FONTE: Disponível em: <https://tenhaumatoalha.wordpress.com/2015/02/20/da-


pedra-a-internet-o-desenvolvimento-da-comunicacao/>. Acesso em: 15 maio 2018.

39
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NO AMBIENTE ESCOLAR

O conhecimento, então, vem sendo construído desde a gênese


Somos
influenciados pela da história atendendo às demandas atuais, mas atrelado a um modelo
história e por meio de ciência, a um paradigma. No contexto educacional não é diferente,
dela constituiremos somos influenciados pela história e por meio dela constituiremos novas
novas formas formas de conceber os saberes. Vamos entender então a evolução do
de conceber os conhecimento, destacando como e por que evoluímos para a era das
saberes.
relações. Para tanto, precisamos compreender o modelo de ciência de
cada época que influenciou na forma de conceber o conhecimento.

3 A Era Orgânica (Idade Média)


Entre os anos de 450 a 1400, a ideia de mundo que se instaurava na Europa
da Idade Média e em grande parte de outros continentes era a orgânica, ou seja,
reforçava-se a relação entre natureza, homem, espírito e matéria. Esse modelo de
ciência colocava Deus como centro de tudo.

A estrutura científica que predominava nessa visão de mundo


orgânica estava assentada no naturalismo aristotélico e na
fundamentação platônico-agostiniana, e depois tomista, que
consideravam de maior significância as questões referentes
a Deus, à alma humana e à ética. Naquela época, o objetivo
principal da filosofia era servir de base à teologia e tinha
como causa de suas preocupações religiosas a salvação
da alma após a morte. Esse pensamento foi denominado
Teocentrismo. [...] Foi uma época em que também predominava
o autoritarismo na organização social – o respeito cego às
autoridades, aos textos bíblicos e gregos. Foi também um
período de muita repressão, no qual muito pouco se inovou
em termos de desenvolvimento científico. Aquele que inovava,
tentando discordar dos textos bíblicos, arriscava-se a morrer
na fogueira para expiar bruxarias e alquimistas associados às
reais novidades (MORAES, 2010, p. 33).

O entendimento de mundo desta época era vinculado às leis divinas, trazendo


circunstâncias de aproveitamento e manipulação das informações. Podemos dizer
que este modelo científico limitava a expansão do conhecimento, uma vez que as
leis divinas eram obedecidas sem questionamentos.

Após os séculos XVI e XVII, o modelo de ciência medieval já não sustentava


as demandas sociais impostas pelo pensamento teocentrista, passando a exigir
fortes mudanças. A ideia de um mundo orgânico e espiritual perdeu forças para a
perspectiva de mundo máquina, que surgiu pela influência da física e astronomia,
desenvolvidas por Copérnico, Galileu e Newton (MORAES, 2010).

40
Capítulo 2 O Conhecimento e a Era das Relações:
Quais as Novas Pautas?

4 Era Material (Idade Moderna)


Esse modelo de ciência coloca o homem como centro de tudo. “[...] o homem
como senhor do mundo podia transformar a natureza, explorá-la, e ela deveria
servi-lo, ser escravizada e obedecer” (MORAES, 2010, p. 33). Tinha como
principal objetivo a exploração da natureza, devendo atender às necessidades
humanas a qualquer preço. Nesse contexto, o valor excessivo ao racionalismo
reflete não só nas atitudes das pessoas, como em sua relação com a natureza,
com o sagrado, consigo próprio e os outros.
A visão do mundo
A visão do mundo máquina deu origem a um novo
método de investigação, defendido por Francis máquina deu origem
Bacon, que envolve a descrição matemática a um novo método
da natureza. O espírito desse modelo mudou de investigação,
profundamente a compreensão da natureza e o defendido por
objeto de investigação que, desde a antiguidade, Francis Bacon, que
objetivava a sabedoria, a ordem natural, a vida em envolve a descrição
harmonia com o universo e a realização da ciência matemática da
para maior glória de Deus (MORAES, 2010, p. 34).
natureza.

Esse período passou a ser chamado de Revolução Científica, quando Nicolau


Copérnico (1473-1543) questionou a Bíblia, se opondo à ideia geocêntrica,
derrubando um paradigma de mais de mil anos, ao apresentar que a Terra e o ser
humano não eram mais o centro do mundo, e sim o Sol.

Descartes e Newton foram também dois grandes colaboradores da era


material (mundo máquina) da Idade Moderna. Uma era que teve seus vínculos
fortes com o racionalismo e a fragmentação do conhecimento. Entendia-se que
para conhecer algo era preciso fragmentar o objeto de estudo em muitas partes até
chegar ao ponto inicial. Essa lógica repercutiu em muitas áreas do conhecimento,
pois foi a maneira de entender o mundo daquela época. Atualmente, na educação,
podemos perceber essa influência fragmentada na estrutura curricular, que
apresenta os conhecimentos em disciplinas, conteúdos e temas. Uma forma
eficiente de organizar o estudo, que serviu para o contexto daquela época, e que
continua vivo em muitas escolas brasileiras até hoje.

41
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NO AMBIENTE ESCOLAR

FIGURA 3 – REFLEXÕES E TEORIAS

FONTE: Disponível em: <http://philosophia-ensinomedio.


blogspot.com/2014/>. Acesso em: 6 jul. 2018.

FIGURA 4 – REFLEXÕES E TEORIAS

FONTE: Disponível em: <https://terrademordor.wordpress.


com/2011/08/03/isaac-newton-e-o-tetris/>. Acesso em: 6 jul. 2018.

Conheça um pouco mais sobre os estudos de Descartes e Newton para


compreender a influência da era material na produção do conhecimento:

42
Capítulo 2 O Conhecimento e a Era das Relações:
Quais as Novas Pautas?

QUADRO 1 – ERA MATERIAL

RENÉ DESCARTES (1596-1650) ISAAC NEWTON (1642-1727)

Filósofo, matemático francês, foi Foi o físico inglês Isaac Newton que
considerado o fundador da ciência completou o pensamento de Descartes,
moderna, pai do racionalismo moderno. dando a visão do mundo como máquina
Fundamentava-se na razão como perfeita ao desenvolver uma completa
única base segura para que possamos formulação matemática da concepção
compreender o homem e a natureza. mecanicista da natureza.

Afirmava que era preciso decompor uma Ele trouxe também outras contribuições,
questão em outras mais fáceis até chegar entre elas, o cálculo infinitesimal, o
a um grau de simplicidade suficiente para desenvolvimento das leis de reflexão
que a resposta ficasse evidente. e refração luminosa e a teoria sobre a
natureza corpúscula da luz.
Para ele, a natureza funcionava de acordo
com as leis mecânicas exatas. De acordo com Newton, Deus criou as
partículas materiais, a força entre elas
e as leis fundamentais do movimento.
Tudo isso funciona como uma máquina
governada por leis imutáveis que
controla a natureza e leva a ciência a
pressupor a existência do determinismo
universal, ou seja, o universo funciona
sempre da mesma maneira.
FONTE: Adaptado de Moraes (2010, p. 38).

O universo mecanicista trouxe muitas contribuições para a compreensão


do conhecimento, por exemplo, o processo lógico-dedutivo que está presente na
matemática. E desse determinismo universal surgiu o conhecimento utilitário e
funcional, abrangendo a ideia de que o mundo deveria ser entendido e modificado pela
técnica. “Ao servir de base para a Revolução Industrial, a técnica aumentou também
o poder de manipulação do homem sobre a natureza, e a atividade humana foi, aos
poucos, abrindo espaço para o processo de industrialização” (MORAES, 2010, p. 39).

43
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NO AMBIENTE ESCOLAR

Ao acompanharmos a evolução dos fatos, observamos a supervalorização dos


conhecimentos técnico-científicos, que repercutiram positivamente para grandes
descobertas científicas, mas que, por outro lado, desprezaram o conhecimento dos
saberes sensíveis e estéticos, relacionados à consciência de um todo integrado.

O conhecimento, especialmente o científico, desligou-


se (muitas vezes, reconheça-se, por especificidades
metodológicas e objetivas) de percepções harmônicas do
mundo, de percepções que levavam em conta os sentidos
diários do homem comum ou, ao menos, a ele se ligavam ou
lhe faziam referência (DUARTE JR, 2004, p. 173).

As implicações deste modelo de ciência vêm causando, até hoje, impactos


em nossas vidas, como também nas mais diferentes áreas do conhecimento.

Vamos entender como essa era influenciou o conhecimento nas mais


diferentes áreas:

QUADRO 2 – INFLUÊNCIA DA ERA MATERIAL PARA O CONHECIMENTO

Biologia Medicina Psicologia Educação


A atual A visão do corpo Atualmente Na escola,
farmacoterapia humano como sabemos que a continuamos limitando
ainda é newtoniana uma máquina noção de saúde nossas crianças nos
no sentido de complexa ainda é um fenômeno espaços reduzidos
operar sob apenas prevalece multidimensional, às suas carteiras.
um ponto de vista. na medicina envolvendo a Apesar de estudiosos
Entende o corpo tradicional, que sensação de apontarem novos
humano como não considera integridade física, caminhos para a
um mecanismo com a devida mental, espiritual, educação, a escola
complicado seriedade as em busca de um atual continua
constituído por dimensões equilíbrio entre influenciada pelo
órgãos físicos, psicológicas tudo aquilo que universo estável
substâncias das doenças e compõe o nosso e mecanicista de
químicas, enzimas suas influências organismo e entre Newton, pelas regras
e receptores de na matéria este meio ambiente. metodológicas
membrana. corporal. É essa sensação de Descartes,
No entanto, essa de integridade e pelo determinismo
visão é incompleta, equilíbrio que se mensurável, pela
pois ignora as perdeu em nossa visão fechada de um
forças vitais cultura ao longo universo linearmente
que animam a desses 300 anos. concebido, que
bioquímica ligada divide conhecimentos
uma às outras. em assuntos,
especialidades e
subespecialidades.

FONTE: Adaptado de Moraes (2010, p. 51).

44
Capítulo 2 O Conhecimento e a Era das Relações:
Quais as Novas Pautas?

Apesar das críticas anteriormente apontadas e das influências presentes


na linha tradicional, alguns estudiosos já concebem o sujeito em sua inteireza,
entendendo, por exemplo, a correlação entre mente, corpo e emoção, num todo
integrado. Entenda esta afirmação na leitura complementar a seguir:

OS INDICADORES SOMÁTICOS

Damásio realizou várias experiências com pessoas que


tinham lesões cerebrais no lóbulo pré-frontal para demonstrar sua
tese de que as emoções têm um papel essencial na racionalidade
humana. Uma das experiências constituiu em observar pacientes
que apresentavam esse tipo de lesão e compará-los com pacientes
saudáveis para medir a condutividade de sua pele ao mostrar
a ambos os grupos a mesma sequência de fotografias. Essas
fotografias incluíram imagens banais, como publicidade e fotografias,
além de imagens perturbadoras (violência, sangue, acidentes, sexo
etc.). Os resultados obtidos por Damásio foram contundentes:
enquanto as fotografias perturbadoras provocavam uma alta resposta
na condutividade da pele das pessoas saudáveis, não houve uma
resposta importante nas pessoas com lesões cerebrais. Apesar de
estas pessoas entenderem perfeitamente, em nível racional, o horror
dessas fotografias, não mostraram nenhuma resposta emocional. Um
dos pacientes entendeu perfeitamente que diante dessas fotografias
ele não apresentava nenhuma reação emocional e, mesmo assim,
não mostrou nenhum sinal de perturbação.
“A redução das
Segundo Damásio: “A redução das emoções pode ser emoções pode
uma causa igualmente importante de comportamento ser uma causa
irracional”. O raciocínio, sem emoções, deixa de ser raciocínio. igualmente
importante de
Os pacientes perdem a capacidade de escolher o plano de ação
comportamento
mais favorável, apesar de manterem intactas as capacidades irracional”. O
mentais analíticas. Não basta saber analisar, é preciso saber raciocínio, sem
sintetizar e escolher, ou seja, tomar decisões. emoções, deixa de
ser raciocínio.
FONTE: Damásio (1996 apud AGÜERA, 2008, p. 84).

45
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NO AMBIENTE ESCOLAR

Atualmente, já se entende que problemas emocionais podem trazer danos à


saúde, ou seja, o mundo mental interfere no mundo físico. Mas este conhecimento
não surgiu de um dia para o outro. Décadas de estudos, de questionamentos,
e principalmente a partir da tese de Einstein, derrubavam a visão de mundo
centrado numa perspectiva fragmentada e mecanicista da ciência moderna, para
uma perspectiva de totalidade indivisa.

Todo esse movimento começou com dois artigos que


revolucionaram o pensamento moderno. Um deles sobre a
teoria da relatividade da simultaneidade de acontecimentos e o
outro sobre a maneira de conceber a radiação eletromagnética
que caracterizava a teoria dos fenômenos atômicos. [...] Com
a teoria da relatividade surgiu uma nova noção de estrutura
da matéria ao se descobrir que massa é energia, modificando,
assim, a ideia de um corpo rígido. [...] O mundo passou então
a ser concebido em termos de movimento, fluxo de energia e
processo de mudança (MORAES, 2010, p. 59).

Nesse sentido, precisamos entender o movimento dos fatos por meio da


construção histórica, pela qual se estruturam os saberes, os contextos e as
conexões que variam entre o permanente e o transitório. Assim, vamos entender o
conhecimento a partir dos dois modelos de ciência e seus respectivos paradigmas
que influenciaram a educação.

QUADRO 3 – PERSPECTIVAS DO CONHECIMENTO

Perspectiva mecanicista Perspectiva de totalidade


(era material) (era das relações)
Acreditava-se que as Esta perspectiva considera que o observador
descrições científicas influencia o objeto a ser observado. Ambos possuem
eram objetivas, isto é, uma interação e o reconhecimento da participação
independentes do observador pessoal é inescapável.
humano e do processo
de conhecimento. Este Existe, portanto, uma interdependência entre o
modelo de ciência excluía o observador, processo de observação e o objeto
pensador de seu pensar, o observado.
construtor de sua obra.
O conhecimento é um produto de uma relação
Nesta perspectiva, o indissociável entre essas três variáveis que constituem
conhecimento científico um único sistema, devendo ser tratado como partes
poderia alcançar a certeza integrantes do mesmo todo.
absoluta e final.
Nessa perspectiva o conhecimento científico baseia-
se em teorias (pontos de vista) e não em verdades
absolutas. Nesse sentido, devemos reconhecer o
pensamento humano como um modo de ver o mundo e
não uma cópia verdadeira da realidade como ela é.
FONTE: Adaptado de Moraes (2010).

46
Capítulo 2 O Conhecimento e a Era das Relações:
Quais as Novas Pautas?

É importante salientar que os fatos históricos e sua repercussão no mundo


não têm começo, meio e fim, mas processos que coexistem e se ressignificam
conforme os contextos e demandas sociais de uma determinada época. Isso
quer dizer que uma era não se encerra para que nasça outra. Ao contrário,
elas dependem umas das outras, pois os saberes transitam em ciclos, de um
modelo científico ao outro, de um paradigma ao outro. Afinal, o que se discute na
atualidade, sobre a inteireza do ser humano, mente, corpo e espírito, desvalorizado
na era mecanicista, já fez parte de nossa história na Idade Pré-moderna.

Na Idade Pré-moderna, o conhecimento absorvia os saberes do intelecto e


os saberes sensíveis numa relação harmoniosa, da arte com a ciência, corpo e
mente, interior e exterior, sujeito e objeto, num processo dialógico. Retomando
esses valores perdidos na Idade Moderna, a era das relações emerge dos
impactos tecnológicos e ressignifica os saberes do contexto atual. Vamos
compreender melhor no próximo tópico a era das relações no contexto educativo.

Atividades de Estudos:

1) Descreva quais características diferenciam o conhecimento entre _


a era material (Idade Moderna) e a era das relações (atualmente):
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
_____________________________________________________

2) Aponte as contribuições positivas e negativas da visão mecanicista


trazida por Descartes e Newton para o modelo educacional de hoje.
_______________________________________________
_____________________________________________________
_______________________________________________
_______________________________________________
_______________________________________________
_______________________________________________
_______________________________________________
_____________________________________________________

47
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NO AMBIENTE ESCOLAR

A educação de pequena árvore

Nos anos 30, numa sociedade cheia de preconceitos, o índio


cherokee Pequena Árvore cresce sob os cuidados dos avós e dos
ensinamentos de seu povo. As diferenças com a educação local o
obrigam a frequentar uma escola tradicional e a mudar de nome, mas
nada é suficiente para tirá-lo de suas origens.

5 Era das Relações e os Sujeitos


da Aprendizagem
O contexto sobre o que é conhecimento, na era das relações, insere o
sujeito como principal responsável de seu processo, tornando-se um pesquisador
e transformador do seu ambiente. O entendimento de um determinado assunto
abrange muito mais que uma área, pois envolve contextos, significados históricos
e culturais. Nesse aspecto, a fragmentação não sustenta os saberes integrados,
uma vez que um saber fragmentado é um saber frágil. Não queremos dizer que
todo aprendizado anterior não seja válido, pelo contrário, é essencial, mas é
preciso reconstruí-lo, ressignificá-lo às novas demandas sociais. E isso traz uma
nova posição dos sujeitos que ensinam e aprendem.

O poder atual está na teia de relações representada pelo


conjunto de informações e conhecimentos disponíveis, está
nos poderes da mente sobre a força bruta, o que, em última
instância, significa que o poder está sendo transferido para o ser
humano, o indivíduo, compreendido como um ser de relações,
como tudo o que existe na natureza (MORAES, 2010, p. 210).

O conhecimento Morin (1998) salienta que sujeito é o núcleo de todos os conhecimentos,


possui duas ciências e saberes. Reconhece a relação consciente e complexa entre
dimensões do saber,
sujeito e objeto, sendo ao mesmo tempo, objetivo e subjetivo, em vários
que se relacionam
ao objeto de estudo sentidos e níveis. Nesse sentido, então, o conhecimento possui duas
e ao sujeito. dimensões do saber, que se relacionam ao objeto de estudo e ao sujeito.

Estamos caminhando em direção a uma Era das Relações,


que envolve a unicidade com o real, com o eu, a integração
do homem com a natureza, a crença na inexistência de
partes distintas e o prevalecimento de formas mais elevadas
de cooperação entre viventes e não viventes. É uma era de
autoconsciência, de respeito ao espírito humano e à diversidade
cultural (MORAES, 2010, p. 210).

48
Capítulo 2 O Conhecimento e a Era das Relações:
Quais as Novas Pautas?

Nesse aspecto, as novas pautas para a educação, no que diz respeito


ao conhecimento, sugerem o resgate dos valores humanos, em consonância
com a natureza, e tudo que a envolve. Essa integração do homem, natureza e
universo também implica nas diferentes áreas do saber, uma vez que prioriza
uma consciência coletiva em busca de melhorias para o mundo. “[...] alguns tipos
de conhecimentos são mais valiosos que outros, e as diferenças formam a base
para a diferenciação entre conhecimento curricular ou escolar e conhecimento
não escolar” (YOUNG, 2007, p. 1293). O individualismo, a fragmentação e a
desarticulação dos saberes, portanto, inserem o conhecimento a uma regressão,
visto que o movimento que ascende ao processo da inteligência da razão e da
criação, da era relacional, exige do sujeito o pensamento de qualidade superior,
em busca da unicidade, inteireza e diálogo.

A Era das relações indica, portanto, uma nova fase de evolução


da humanidade, em que prevalece o poder do indivíduo e das
sociedades. Demonstra a predominância nos novos cenários
dos mais diferentes sistemas de comunicações, caracterizados
pelos sistemas não só tecnológicos e interpessoais, mas também
intra e transpessoais, cujas explicações também foram dadas
pela própria física quântica ao esclarecer o funcionamento do
pensamento individual e coletivo (MORAES, 2010, p. 210).

Diante disso, como a educação pode facilitar esta transição entre a era
material e a era relacional, contribuindo para tornar o mundo mais justo, equilibrado
e consciente de seu papel na produção do conhecimento para benefício de todos?

Não é uma tarefa simples, mas é preciso começar, é preciso estruturar todo
um fazer pedagógico em consonância com os valores pretendidos. Nesse sentido,
vamos compreender como é educar para a era das relações:

FIGURA 6 – A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NA


ERA DAS RELAÇÕES E AS NOVAS PAUTAS

Autonomia, cooperação e criticidade. Uma proposta educativa que reflita e


Trazendo um enfoque mais reflexivo englobe tanto dimensões materiais quanto
nas práticas pedagógicas. espirituais que busque a superação dos
problemas sociais.
Vivências de trabalho em grupo na
busca de soluções para problemas Operações de reciprocidade,
propostos. complementaridade e correspondência,
incentivando o diálogo e a troca dos saberes.
Preparar os indivíduos para que
reconheçam a interdependência dos
processos individuais e coletivos, Educar para a diversidade, para a cidadania,
para a transpessoalidade dos criando ambientes de aprendizagens que
contatos entre os seres vivos, entre o facilitem a vivência dos processos intuitivos
ser humano e o mundo da natureza e criativos, possibilitando a autoconfiança e
da qual ele é integrante. capacidade de gerenciar conflitos.

FONTE: Moraes (2010, p. 198).

49
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NO AMBIENTE ESCOLAR

Assim, o sujeito de que necessitamos para superar a crise do


Assim, o sujeito de
que necessitamos conhecimento não pode mais ser entendido como aquele que reproduz
para superar a crise seus saberes, mas aquele que idealiza, cria, pensa e transforma seu
do conhecimento entorno, em benefício de todos, atendendo às leis da natureza e o
não pode mais ser respeito ao próximo.
entendido como
aquele que reproduz [...] se as escolas devem cumprir um papel importante em
seus saberes, promover a igualdade social, elas precisam considerar
mas aquele que seriamente a base de conhecimento do currículo, mesmo
quando isso parecer ir contra as demandas dos alunos (e
idealiza, cria,
às vezes de seus pais). As escolas devem perguntar: “Este
pensa e transforma currículo é poderoso?” Para crianças de lares desfavorecidos,
seu entorno, em a participação ativa na escola pode ser a única oportunidade
benefício de todos, de adquirirem conhecimento poderoso e serem capazes de
atendendo às leis caminhar, ao menos intelectualmente, para além de suas
da natureza e o circunstâncias locais e particulares. Não há nenhuma utilidade
respeito ao próximo. para os alunos em se construir um currículo em torno da sua
experiência, para que este currículo possa ser validado e, como
resultado, deixá-los sempre na mesma condição (YOUNG,
2007, p. 1297).

Para tanto, o conhecimento deve servir para elevar o aluno, tornando-o um


sujeito sensível às fragilidades do mundo, buscando de forma consciente uma
cultura planetária, lançando seu olhar ao universo e ao particular ao mesmo tempo,
pois um dos maiores desafios da educação atual é a tarefa do conhecimento
lógico conceitual, mas também expandir sua área de atuação para os campos
corporais e sensíveis que herdamos com a existência (DUARTE JR., 2004).

A Idade Moderna aspira a um tipo de conhecimento,


supostamente livre da interferência dos sentidos e sentimentos,
centrado na ´razão pura´. Razão hipertrofiada, já que pretende
responder pelos mais íntimos setores de nossa vida, desconsiderando
o saber sensível e embotando o desenvolvimento da sensibilidade
dos indivíduos. Essa ´anestesia´ que sofre o homem contemporâneo
precisa ser revertida através de uma educação da sensibilidade. O
que possibilitaria a criação de uma razão mais ampla, na qual os
dados sensíveis fossem levados em conta, gerando conhecimentos
mais abrangentes. É este o tema desta obra de Duarte Júnior.

DUARTE JÚNIOR, João-Francisco. O sentido dos sentidos: a


educação (do) sensível. 3. ed. Curitiba: Criar, 2004

50
Capítulo 2 O Conhecimento e a Era das Relações:
Quais as Novas Pautas?

Vamos conhecer uma escola que conseguiu romper os paradigmas de uma


sociedade pautada nas regras impostas por um sistema tradicional, transformando
por meio dos saberes sensíveis uma comunidade de alunos, bem como todo um
projeto educativo. Acompanhe a pesquisa a seguir:

6 Os Sujeitos da Aprendizagem e o
Atual Paradigma Educacional a Partir
da Escola da Ponte (OFFIAL, 2012)
Querida Alice... Era uma vez um reino encantado junto ao mar. Encantado
porque uma fada má havia transformado todos os seus habitantes em pássaros. No
reino encantado havia cidades e, para além dos muros das cidades, outras cidades e
outras escolas. Essas escolas de aprender a voar eram quase todas iguais. E iguais a
essas eram outras escolas dentro das cidades das aves (PACHECO, 2010, p. 18).

Nessa epígrafe, retirada do livro Para Alice com amor, José Pacheco conta
um pouco da trajetória do projeto que chamou de “Fazer a Ponte”. Essa obra relata,
por meio de metáforas, as experiências do autor nos tempos anteriores à entrada
de Alice, sua neta, na escola. O educador descreve como eram as escolas em que
havia trabalhado, relembra o cotidiano escolar, os problemas e os desafios que
encontrou na longa jornada rumo ao desejo de uma escola de qualidade.

Os personagens dessa história são pássaros: pássaros bons, pássaros


encantados, pássaros com limitações, pássaros diferentes, pássaros inteligentes,
pássaros tristes, pássaros felizes. Vivem em um reino encantado junto ao mar e
frequentam uma escola de pássaros, onde recebem aulas de piação, aulas de
voo, sendo os manuais iguais para todos. Lá, há, também, abutres, com suas
“almas empedernidas”, os papagaios, falsos negrelas, e muitos outros pássaros
insensíveis. Todos obedecem aos comandos e às regras de uma fada muito má
(metáfora usada para indicar o método).

Na história, antes de Alice entrar na escola, todos seguiam os mesmos manuais,


repetiam as mesmas lições. Os alunos (pássaros) não eram valorizados pela
diferença, muito menos pela sua experiência sociocultural. Pelo contrário, tinham que
se submeter a métodos e padrões preestabelecidos. Os manuais aos quais se refere
eram ultrapassados e longe da realidade dos alunos. Mesmo não fazendo sentido,
esses manuais tinham que ser seguidos obrigatoriamente. Periodicamente esses
alunos eram submetidos a testes. Esses testes, aplicados igualmente a todos, no
mesmo espaço e tempo, limitavam os alunos aos mesmos padrões.

51
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NO AMBIENTE ESCOLAR

Nessa caminhada, a escola encontrou mais interrogações que certezas:


professores e alunos distantes da comunidade, exclusão social, indisciplina
generalizada e a falta de um projeto coerente com a prática. Há escolas onde
tudo é negação da cidadania. Nessas escolas, a solidão dos professores é da
mesma natureza da solidão dos alunos, que passam de sala em sala, no ritmo
pautado por uma campainha, e deparam com professores afáveis ou permissivos,
uns exigentes, outros autoritários.

Foram anos de persistência em busca de uma escola que se diferenciasse


das tradicionais, desde a organização dos espaços até as alterações de modelos
pedagógicos. Uma mudança na educação é algo complexo, principalmente porque
envolve políticas educacionais, a comunidade, todo o corpo docente e, sobretudo,
o apoio de todos esses envolvidos. Pacheco (2004) relata suas experiências no
processo que chama de “fazer a Ponte”. Ele conta que na escola havia um grupo
chamado de turma do lixão, eram jovens entre 13 e 15 anos. Essa turma não
sabia ler, nem escrever e, conforme seu relato, não eram jovens violentos, eram
violentados, pois, segundo o autor, a violência não nasce com a pessoa, aprende-
se com ela. É a esse tipo de concepção escolar que um grupo de docentes da
Escola da Ponte opôs-se e procurou transformar.

Diante de tantos problemas, viu-se a necessidade de buscar alternativas de


forma coletiva, e nessa procura, um grupo de formação deu início ao projeto. Com
o desejo de tornar possível o sonho de uma escola mais humanizada, democrática,
com professores e alunos participantes, solidários, críticos e autônomos, foram
definidos os objetivos no grupo de formação, chamado de “círculo de estudos”
(PACHECO, 2010). Esse era o nome adotado por grupos de professores que
promoviam uma reflexão sobre as práticas pedagógicas. É necessário esclarecer
que o processo de formação, em especial o “círculo de estudos”, partiu de um
grupo de docentes preocupados com um contexto escolar bastante conturbado.

Contaram com o apoio de professores, destinados a enfrentar desafios


de repensar e transformar uma prática escolar. Por meio da reflexão e ação,
conquistaram uma equipe de pensadores, abertos para repensar sobre sua
prática. A formação continuada de docentes é considerada por Pacheco (2010)
um meio e não um fim em si mesmo, as discussões devem servir para influenciar
práticas, sair do papel, pois formação não se destina somente a capacitar os
professores, estes são mediadores de formação em desenvolvimento que
passam da identificação e valorização do saber à sua partilha, ou seja, as ideias
e as possíveis soluções que se discutem em grupos de formação devem ser
partilhadas e postas em prática.

No modelo desse círculo de estudos não há um líder apenas, todos são


atuantes e participantes do processo. Discutem formas de resoluções de conflitos

52
Capítulo 2 O Conhecimento e a Era das Relações:
Quais as Novas Pautas?

encontrados e vivenciados pelos próprios professores. Foi assim, por meio


do círculo de estudos, que o Projeto da Ponte teve sua gênese. Os objetivos
propunham mudanças quanto à diversificação das aprendizagens centradas em
uma política de direitos humanos; quanto ao desenvolvimento da autonomia e da
solidariedade, promovendo transformações nas estruturas de comunicação entre
instituições e agentes educativos locais.

Para isso, segundo Pacheco (2010), foi necessário questionar modelos de


práticas pedagógicas, como também levar à comunidade valores humanos, pois uma
prática escolar não se altera sem seus pares, professores, educandos e famílias.

O modelo de formação utilizado na Escola da Ponte está ligado à resolução


de reais problemas do cotidiano escolar e desenvolve-se com a participação
crítica e reflexiva dos professores. Estes, integrantes desse círculo de estudos,
compreendem que os modelos de formação devem ter direta conexão com a
prática, partir da reflexão da ação, identificar os problemas, discutir, dialogar,
tornar claros os objetivos e questionar possíveis soluções.

Nessa esteira, os autores, Freire (1996) e Pacheco (2010), comungam da


ideia de uma racionalidade reflexiva em torno da prática. Contudo, não há como
sustentar uma prática sem teoria, assim como não há mudança ou intervenção da
realidade sem a influência da prática, e diante disso, Freire sustenta que:

Esta busca nos leva a surpreender, nela, duas dimensões:


ação e reflexão, de tal forma solidárias, em uma interação tão
radical que, sacrificada, ainda que em parte, uma delas, se
ressente, imediatamente, a outra. Não há palavra verdadeira
que não seja práxis. Daí que dizer a palavra verdadeira seja
transformar o mundo (FREIRE, 1996, p. 89).

A transformação dessa escola se deu a partir de problemas e experiências


de uma prática mal resolvida com o apoio de grandes teóricos que marcaram
a história da educação, a saber: Pestalozzi, Rogers, Montessori, Freire, Freinet,
Decroly, dentre outros.

A organização atual da escola é estruturada de acordo com seus “O importante é


princípios, pautada em uma educação solidária, responsável e autônoma. permitir que as
Devido a isso, os alunos são responsáveis pelo seu aprendizado: crianças descubram
“O importante é permitir que as crianças descubram por si mesmas o por si mesmas
o conhecimento
conhecimento de que mais necessitam” (MORAES, 2010, p. 140). Dessa
de que mais
forma, os discentes são incentivados a pesquisar os conteúdos com necessitam”
os quais eles próprios se comprometem em estudar. Quem planeja é o (MORAES, 2010,
aluno e a pesquisa é um dos principais recursos para auxiliar os estudos. p. 140).

53
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NO AMBIENTE ESCOLAR

FIGURA 7 – GRUPO DE ESTUDOS

FONTE: Offial (2012).

A escola passou por várias mudanças. Rompeu com um modelo escolar


no qual as aulas eram centradas no professor. Envolveu os alunos nas tomadas
de decisões, coletivas e individuais. Permitiu ao aluno dirigir sua própria
aprendizagem. Trocou uma organização hierárquica por uma escola com
princípios democráticos e não autoritários. Nesse processo, a escola lidou com
grandes desafios, a iniciar pelas diretrizes impostas pelo Ministério de Educação
de Portugal (ME). Foram muitas lutas até alcançar a autonomia, apesar de ter
vínculo estadual. No entanto, na base sólida do grupo de estudos, encontrou
forças e apoio para dar continuidade ao projeto.

Os poderosos de todos os tempos sabiam que a ponte tem


sua pedra angular, mas ignoravam que uma pedra sozinha não
se segura num arco. Nesse segredo residia a força da ponte.
Poderia vergar sob o peso de uma moral caduca feita de tabus
e superstições, mas não cedia. E, se havia quem quisesse
destruir o ato criador das gaivotas da escola das aves, as
pontes para o futuro da Escola resistiam na sólida consistência
das pedras fundadoras (PACHECO, 2010, p. 58).

Por meio dessa metáfora, o autor expressa que os obstáculos encontrados


no percurso não foram suficientes para romper o desejo de “fazer a ponte”, pois o
círculo de estudos, a qual se refere como “Pedra Angular”, foi o que sustentou e
sustenta até hoje o projeto. A figura a seguir representa a dinâmica da formação
de modelo escolar e o círculo de estudos do atual projeto.

54
Capítulo 2 O Conhecimento e a Era das Relações:
Quais as Novas Pautas?

FIGURA 8 – SÍNTESE DOS CONTRASTES ENTRE O CONCEITO


DE CÍRCULO E A FORMAÇÃO DE MODELO ESCOLAR

AO INVÉS DE UTILIZA-SE

COORDENADOR
PROFESSOR
DE CÍRCULO
(Formador Externo)
(Monitor Interno)

ALUNO PARTICIPANTE

LIÇÃO REUNIÃO

ENSINO ESTUDOS

MATERIAL DE
LIVRO DIDÁTICO
ESTUDO

PLANO DE ESTUDO
CURRÍCULOS

ÉPOCA DE ESTUDO
PERÍODOS

FONTE: Offial (2012).

O esquema acima demonstra a mudança não só de nomenclatura, mas


de transformação de uma prática. Percebe-se que, entre o primeiro modelo e o
segundo, a diferença está na valorização do aluno e na sua inserção como sujeito
principal no meio escolar. No modelo anterior, professores e currículos eram o
centro do processo educativo.

Hoje, nessa escola, o aluno expressa-se atuante e consciente no Freire (1996)


processo de sua formação. Não é raro encontrarmos práticas escolares comenta que é
baseadas no primeiro modelo, também não é raro vermos os mesmos necessário que o
docente tenha a
problemas repetirem-se e muito menos raro depararmo-nos com um
clareza do seu papel
estado de acomodação generalizado. Diante disso, Freire (1996) de educador e altere
comenta que é necessário que o docente tenha a clareza do seu papel sua prática em
de educador e altere sua prática em benefício do aluno. benefício do aluno.

55
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NO AMBIENTE ESCOLAR

Para o autor, pensar em benefício do aluno é “pensar certo”. O autor traz


constantes indagações sobre o ato de ensinar e ressalta que é possível e, de certa
forma urgente, que professores atuantes interfiram em sua realidade escolar, pois
“[...] o mundo não é. O mundo está sendo” (FREIRE, 1996, p. 76). Todavia, mudanças
não ocorrem de um dia para o outro, ainda mais quando se trata de um processo
educacional, que é de tamanha complexidade. As alterações realizadas na Escola da
Ponte concretizaram-se em parcerias, que eram os “pássaros bons, inovadores”:

Foi o amor sempre presente no canto das almas sensíveis que


comoveu as almas empedernidas dos abutres, dos papagaios,
dos porquenãos, dos borogóvios e das falsas negrelas, e
redimiu-as do pecado da ignorância e da maldade. A doce
paciência das almas sensíveis ajudou os pássaros doentes a
não terem medo da luz diurna, a não fechar os olhos à claridade
(PACHECO, 2010, p. 85).

Hoje, a Escola da Ponte é uma entidade pública estatal, de ensino básico,


integrada com jardim de infância. Recebe alunos desde o 1º até o 9º ano. Em
2011, duzentos e vinte alunos frequentavam a escola. Os alunos são organizados
em grupos heterogêneos, não há lugares fixos e todos trabalham em equipe,
professores e alunos, todos com todos. Conforme os documentos pesquisados no
site oficial, a escola organiza-se de acordo com a estrutura que segue:

FIGURA 9 – ORGANIZAÇÃO EDUCACIONAL DA ESCOLA DA PONTE

INSTRUMENTOS DE AVALIAÇÃO
PLANO DE REGISTRO
RELATÓRIO
ÁLBUM
COLETÂNEA DE TEXTO
BIBLIOGRAFIAS NÚCLEOS
FICHA DE AUTO-AVALIAÇÃO INICIAÇÃO
TESTE SELECIONADO PELOS ALUNOS CONSOLIDAÇÃO
REGISTRO DE DISPONIBILIDADE APROFUNDAMENTO
ATA
COMUNICAÇÃO
QUADRO DE SOLICITAÇÕES
TESTE SOCIOMÉTRICO
INVENTÁRIO DE ATITUDES

ESCOLA

INSTRUMENTOS PEDAGÓGICOS
DIREITOS E DEVERES
ARTICULAÇÃO CURRICULAR ASSEMBLEIAS
DIMENSÃO LÓGICO MATEMÁTICA COMISSÃO DE AJUDA
DIMENSÃO LINGUÍSTICA BIBLIOTECA
DIMENSÃO ARTÍSTICA CAIXINHA DE SEGREDOS
DIMENSÃO NATURALISTA CAIXINHA DE TEXTOS INVENTADOS
DIMENSÃO IDENTIRÁRIA EU JÁ SEI
DIMENSÃO PESSOAL E SOCIAL EU PRECISO DE UMA AJUDA
PROFESSOR TUTOR
GRUPO DE RESPONSABILIDADES

FONTE: Offial (2012).

56
Capítulo 2 O Conhecimento e a Era das Relações:
Quais as Novas Pautas?

Esta forma de organização demonstra uma proposta diferenciada, a


qual, segundo os documentos, vai além dos dispositivos pedagógicos e o
desenvolvimento curricular, pois a veiculação desses instrumentos torna possível
o trabalho em grupo heterogêneo, a cooperação, a autonomia e a vivência de
uma cidadania responsável. A organização curricular dessa escola articula-se
por meio de dimensões Lógico Matemática, Naturalista, Linguística, Identitária,
Artística, Pessoal e Social.

Diferentemente de um currículo tradicional, na Escola da Ponte, os


conteúdos a serem trabalhados são escolhidos pelos próprios alunos. Os critérios
são selecionados pelos orientadores das dimensões, cada qual na sua área. Os
conteúdos são fixados em murais para que os alunos visualizem e percebam o
que precisam trabalhar.

O Núcleo da Iniciação subdivide-se em três grupos: o grupo da Primeira


Vez, o grupo dos Cientistas Malucos e o grupo das Seis Estrelas. A divisão desse
núcleo em outros grupos dá-se por uma questão de espaço, pois não há um grande
galpão que comporte todos os alunos, a intenção é a integração para que os alunos
produzam e compartilhem as aprendizagens, suas dúvidas e experiências.

Para um aluno avançar de núcleo precisa estar preparado, demonstrando


características que se referem a responsabilidades, à autonomia, a
relacionamentos, à criatividade, à autodisciplina, à persistência e à concentração
nas tarefas, à participação em debates, ao comprometimento etc. Cada núcleo
aprofunda esses saberes, levando em conta a faixa etária e o avanço de cada
aluno em particular, sendo avaliados e observados no decorrer das atividades,
dos projetos e das atitudes. Essa organização, por núcleos com diferentes idades,
foi muito contestada pelo Ministério da Educação (ME) de Portugal, como também
por educadores que não compreendiam a proposta, conforme se apresenta no
fragmento de texto a seguir:

Não acredito! Como é possível não estar colocado num 3º ou


4º ano!
O miúdo contestou: O senhor não entendeu. O que eu disse foi
que na minha escola não se faz como em outras, não se divide
os meninos por turmas e por anos. Porque isso não interessa...
O universitário cortou-lhe a palavra e atirou, num tom a roçar
o cinismo: Está bem! Eu já ouvi essa ladainha. Vá lá! Diz em
que ano estás!
O moço respirou fundo e olhou na direcção do seu professor,
como quem pergunta: o que hei-de fazer desta criatura? O
professor encolheu os ombros. E o aluno que fazia a palestra
respondeu: O senhor não sabe mesmo em que ano eu estou?
Triunfante, o universitário usou o imperativo com ênfase
redobrada: Não sei. Diz lá!
O jovem obedeceu e disse: Estou no mesmo ano em que o
senhor está – no ano de 1996! (PACHECO, 2010, p. 10).

57
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NO AMBIENTE ESCOLAR

Esse diálogo representa uma pequena parcela das vezes que a Escola da
Ponte precisou provar e comprovar sua forma de organizar-se. Essa diferente
organização desperta a curiosidade de pesquisadores inicialmente por não
ter alunos divididos por séries, ao invés disso, núcleos. Em cada Núcleo, há
professores das diferentes áreas para atender aos alunos na disciplina específica.
Por isso, podemos perceber a variedade de áreas em um mesmo núcleo. Sobre
isso, Pacheco esclarece e argumenta:

Na Ponte, há muitos anos, concluímos que seria urgente


extinguir o “professor único” nos primeiros quatro anos de
escolaridade. O professor generalista possui “conhecimentos
superficiais, que acarretam, quase automaticamente,
comportamentos livrescos, repetitivos, ou reprodutores”. Na
Ponte, o generalista foi substituído pelo mediador (PACHECO,
2010, p. 72).

Dessa forma, todos os alunos podem trabalhar com todos os professores. Os


alunos são organizados em grupos heterogêneos. Também não há lugar fixo, pois
nessa escola há muita movimentação, variando conforme os grupos com os quais
os alunos estão envolvidos, dentre eles, o das responsabilidades.

Pacheco Pacheco (2010) pontua a necessidade de um melhor


(2010) pontua aproveitamento dos espaços abertos para potencializar o convívio e
a necessidade expansão de aprendizagens. Ele percebe que o fato de a Escola da
de um melhor Ponte possuir menos paredes que as demais não indica que estão
aproveitamento dos mais inseridos em um convívio que não seja a sua própria instituição.
espaços abertos O autor traz à tona essa questão, mas não apresenta argumentos que
para potencializar o legitimem essa fragilidade. Contrapondo essa análise, verificamos
convívio e expansão
que há na Escola muitas atividades e projetos que contemplam aulas
de aprendizagens.
dinâmicas e fora do ambiente escolar.

Apesar de a Escola da Ponte ser estadual, ela conquistou a autonomia com


o Ministério da Educação para selecionar os professores. Sobre esse assunto,
há contradição ao comparar a pesquisa de Santa Rosa (2008) e Mariana (2008)
a respeito da seleção dos professores. Santa Rosa afirma que a escola possui
autonomia para escolha dos docentes e Mariana cita que essa ação foi derrubada
pelo ME. Considerando que as duas pesquisas foram concluídas no mesmo
ano, a questão parece não estar resolvida, ou sofreu alterações no decorrer
do ano. No entanto, em entrevistas e conversas informais com professores,
obtivemos informações de que a escola possui autonomia para a contratação dos
professores.

Os instrumentos pedagógicos e os instrumentos de avaliação são chamados


também de dispositivos, ou seja, estratégias pedagógicas que ajudam o aluno
não só a nortear seus estudos, como também seu processo de avaliação. Os
instrumentos de avaliação são dispositivos para auxiliar no desenvolvimento

58
Capítulo 2 O Conhecimento e a Era das Relações:
Quais as Novas Pautas?

contínuo do aluno. Diferentemente das escolas tradicionais, cuja avaliação


baseia-se em apenas provas, testes, exercícios, na Escola da Ponte, o aluno pode
escolher como e quando será feita a sua avaliação. Sobre esse tipo de avaliação,
Freire nos diz:

Os sistemas de avaliação pedagógica de alunos e de


professores vêm se assumindo cada vez mais como discursos
verticais, de cima para baixo, mas insistindo em passar por
democráticos [...] A questão que se coloca a nós é lutar em
favor da compreensão e da prática da avaliação enquanto
instrumento de apreciação do que-fazer de sujeitos críticos a
serviço, por isso mesmo da libertação e não da domesticação.
A avaliação em que se estimule o falar a como caminho de falar
com (FREIRE, 1996, p. 116).

O educador refere-se a uma avaliação que está a favor do aprendiz, pois ao


lidar com o diálogo permite o aluno expressar-se com liberdade. Nessa prática, o
aluno tem o direito de ser avaliado pelo que sabe. Os direitos, nessa escola, são
sempre acompanhados de compromissos. Dessa forma, a liberdade vem sendo
orientada pela responsabilidade. Todos têm compromisso em deixar em dia o plano
da quinzena. Nesse plano, é o próprio aluno que orienta os conteúdos a serem
estudados e pesquisados. Os professores são somente mediadores do processo
ensino- aprendizagem. Interferem quando percebem o não comprometimento do
aluno com os estudos, ou sempre que é requisitado para esclarecer dúvidas. O
plano da quinzena é visto todos os dias e assinado pelo professor e no dia da
tutoria é revisado pelo tutor de cada grupo.

FIGURA 10 – PLANO DA QUINZENA

FONTE: Offial (2012).

59
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NO AMBIENTE ESCOLAR

Uma vez por semana, um tutor responsável por um determinado grupo


acompanha o andamento das tarefas, pesquisas e exercícios que os alunos
realizam no decorrer dela. Dessa forma, o tutor consegue estar mais próximo das
necessidades do educando para auxiliá-lo no processo de aprendizagem. Cada
aluno possui uma pastinha com um plano quinzenal e exercícios de acordo com o
conteúdo estudado. Essa pastinha é verificada e assinada pelo tutor. Essa é uma
prática, assim como as demais, que inclui todos da escola, inclusive os alunos
especiais – quanto aos alunos “especiais”, para a escola, todos são especiais e
realizam o mesmo tipo de trabalho, sendo respeitados pela diferença. Todos são
tratados iguais e recebem o apoio de que necessitam (PACHECO, 2010).

Na pesquisa de observação percebemos uma interação muito espontânea


entre todos, não fazem distinção entre os que apresentam síndromes, ou qualquer
tipo de comportamento diferente, não percebemos qualquer discriminação, pelo
contrário, comprovamos a inclusão e o respeito entre eles. Há uma preocupação
com o outro muito forte nessa escola. Sentimos que o coletivo é algo real entre os
educandos e educadores, como se pode observar na figura a seguir:

FIGURA 11 - GRUPOS DE AJUDA

FONTE: Offial (2012).

Aceitar e respeitar a diferença é uma dessas virtudes sem que


a escuta não se pode dar. Se discrimino o menino ou menina
pobre, a menina ou menino negro, o menino índio, a menina
rica; se discrimino a mulher, a camponesa, a operária, não posso
evidentemente escutá-las, e se não as escuto, não posso falar
com eles, mas a eles, de cima para baixo (FREIRE, 1996, p. 120).

É nesse contexto que os alunos da Ponte se formam. Não pensando para


um dia exercerem a cidadania, mas educados no exercício da cidadania, e isso
o projeto político educacional enfatiza claramente. A educação para a cidadania,

60
Capítulo 2 O Conhecimento e a Era das Relações:
Quais as Novas Pautas?

segundo Freire (2009), implica em um movimento dinâmico, dialético na sua


relação com a prática e a teoria, relacionada aos limites dos vínculos que homens
e mulheres estabelecem entre si e com o mundo. Moraes (2010, p. 139) afirma:

[...] além de reintegrar o sujeito na construção do conhecimento,


resgata também a importância do processo ao reconhecer que
pensamento e conhecimento, como tudo na natureza, estão
em holomovimento. Ao mesmo tempo valoriza a experiência
e o faz de um modo diferente, como um princípio básico na
construção do conhecimento. Há uma imanência em todo
o conhecimento que depende da ação do sujeito, de seus
processos internos.

A Escola da Ponte oportuniza aos educandos essa relação da prática com


a teoria por meio de diferenciadas estratégias que chamam de dispositivos
pedagógicos. No início de cada ano são discutidos em assembleia projetos, direitos
e deveres, grupos de responsabilidades, dentre outros assuntos. No caso dos grupos
de responsabilidades, segundo coordenadora da Dimensão Linguística, os alunos
inscrevem-se para qual responsabilidade irão comprometer-se: biblioteca/material
comum; bar; computadores e música; murais; recreio bom; correio da Ponte; visitas
da Ponte; arrumação e material comum; jogos de mesa; terrário e jardim; jornal. Essa
ação permite que o aluno desenvolva suas competências nas diversas áreas do
conhecimento em uma conectividade com a realidade, ampliando sua cultura.

Há, em todos os espaços, estantes com materiais para pesquisa. A escola


adota diversificados livros didáticos para não se limitar a um só autor, pois a
finalidade é que o aluno (participante) descubra outras fontes de um mesmo
assunto. Há murais com desenhos dos alunos e dispositivos pedagógicos:
“Pesquisa em casa”, “Eu já sei”, “Acho bem”, “Acho mal”, “Posso ajudar em”,
“Clube dos leitores”, “Preciso de ajuda”.

FIGURA 11 - GRUPOS DE AJUDA

FONTE: Offial (2012).

61
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NO AMBIENTE ESCOLAR

No “Eu já sei”, os alunos (participantes) escrevem o tema dos assuntos em


que já demonstram maior domínio. Essa prática auxilia aos demais colegas que
apresentam dúvidas relacionadas ao mesmo assunto a ajudarem-se. Facilita,
também, para o professor identificar os conteúdos que o educando conseguiu
compreender e programar a avaliação. Esta é discutida em conjunto com o aluno
sobre a forma de ser apresentada: oral, descritiva, PowerPoint etc. É o próprio
aluno que deve perceber quando está seguro sobre o conteúdo que pesquisou.
Embora, em alguns casos, o aluno precise de maior orientação e acompanhamento
do professor até desenvolver por si só a autonomia e a responsabilidade para os
estudos – é o exemplo dos alunos que iniciam na escola no grupo “Primeira Vez”.
Em cada núcleo, há professores das diferentes áreas para atender os alunos na
disciplina específica. Por isso, podemos perceber a variedade de áreas em um
mesmo núcleo. E sobre isso, Pacheco (2010, p. 72) esclarece e argumenta:

Na Ponte, há muitos anos, concluímos que seria urgente


extinguir o “professor único” nos primeiros quatro
anos de escolaridade. O professor generalista possui
“conhecimentos superficiais, que acarretam, quase
automaticamente, comportamentos livrescos, repetitivos
ou reprodutores”. Na Ponte, o generalista foi substituído
pelo mediador.

Os fatores que levaram essa escola a conseguir legitimar um projeto coletivo de


qualidade, sendo uma escola estadual, foi tese de doutorado de Santa Rosa (2008),
a qual direcionou sua pesquisa na compreensão do Projeto Político-Pedagógico
(PPP) da Escola da Ponte por meio de análise documental e observações a campo.
A pesquisadora procurou elencar os elementos matriarcais que estão presentes na
prática dos envolvidos na Escola para a efetivação do PPP.

Um projeto não se sustenta isolado, muito menos distante de seu contexto


social. Eis aí sua fragilidade, o que não é o caso da escola em questão. Segundo a
pesquisadora (2008), ela tem seus alicerces muito bem ancorados na coletividade
de Líderes, Equipe e Família. Essa força humana em consonância com os princípios
voltados à inclusão são os pilares da Ponte e que direcionam um PPP dialógico.

Mariana (2008), também em sua tese de doutorado, identificou alguns


componentes que ajudam a potencializar o projeto educativo da Ponte. Destaca
três elementos que fortalecem uma educação integral, e que são desenvolvidos
nessa escola, são eles: “a realização periódica de assembleias e a cogestão de
escola pelos estudantes; o estímulo ao autodidatismo através da diluição do ensino
seriado em grupos de estudos; o envolvimento da escola com a comunidade”
(MARIANA, 2008, p. 116). As atividades não são separadas por turmas ou idades
e partem do interesse dos alunos, e isso é muito positivo para o educando.

62
Capítulo 2 O Conhecimento e a Era das Relações:
Quais as Novas Pautas?

Ambas pesquisadoras mencionadas reconhecem elementos que servem de


referência para muitas escolas. A autonomia, a solidariedade, a fraternidade e a
responsabilidade que dizem respeito a uma formação estética.
Nesse aspecto, as
Nesse aspecto, para entender a aquisição do conhecimento novas pautas na
como principal foco da escola para o aluno, deve-se elencar quais os era das relações
inserem o sujeito
conhecimentos que se transformarão em instrumentos para que ele
como atuante de
desenvolva a consciência e compreenda seu papel no mundo, pois o seu processo de
conhecimento é uma das condições eficazes para o aluno se apoderar conhecimento,
de seu universo social. desenvolvendo
autonomia,
Nesse aspecto, as novas pautas na era das relações inserem o responsabilidade
e relação dialógica
sujeito como atuante de seu processo de conhecimento, desenvolvendo
com seus pares.
autonomia, responsabilidade e relação dialógica com seus pares.

O Universo do conhecimentoI, com Edgar Morin: <https://www.


youtube.com/watch?v=kzHjJd3cJCg>

7 Algumas Considerações
Por mais que percebamos mudanças relacionadas ao contexto educativo,
tentando um modelo educacional capaz de estimular os conhecimentos sensíveis
e inteligíveis, ainda constatamos o quanto a escola se distancia dessa prática.
Nesse sentido, a produção do conhecimento para esta nova era deve atender aos
princípios pautados na autonomia, responsabilidade e formação de sujeitos ativos,
críticos e transformadores de seu entorno, em benefício da sociedade e da natureza.

Portanto, a desconexão entre currículo, prática pedagógica e contexto do


aluno podem ser os vilões da aprendizagem, do conhecimento. E um ambiente
educacional que não oferece ao aluno a pesquisa, a autonomia e a liberdade de
escolha compromete a relação dialógica, que deve ser crítica, transformadora,
pois é a partir do diálogo que se constroem, que se problematizam e que se
encontram possíveis soluções.

63
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NO AMBIENTE ESCOLAR

Referências
AGÜERA, L. G. Além da inteligência emocional: as cinco dimensões da mente.
São Paulo: Cengage Learning, 2008.

DUARTE JÚNIOR, João Francisco. O sentido dos sentidos: a educação do


sensível. 3. ed. Curitiba: Criar, 2004.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática


educativa. 15. ed. São Paulo: Paz e Terra, 1996.

_____________. A importância do ato de ler: em três artigos que se


completam. 48. ed. São Paulo: Cortez, 2009.

MARIANA, F. B. Educação e ecologia: práticas de autonomia social ou


renovados discursos do poder do capital transnacional? 2008. 180f. Tese.
(Doutorado em Educação). Universidade de São Paulo. Faculdade de Educação.
São Paulo, 2008.

MORAES, M. C. O paradigma educacional emergente. Campinas/SP: Papirus,


2010.

MORIN, E. Sociologia: A sociologia do microssocial ao macroplanetário. Sintra,


Portugal: Europa América, 1998.

OFFIAL, P. C. P. Formação de leitores do literário: uma experiência na Escola


da Ponte. 2012. 135f. Dissertação. (Mestrado em Educação) – Universidade do
Vale do Itajaí, UNIVALI, Itajaí, 2012.

PACHECO, José. Escola da Ponte: formação e transformação da educação. 3.


ed. Petrópolis: Vozes, 2010.

SANTA ROSA, C. S. R. Fazer a ponte: para a escola de todos (as). 2008. 336f.
Tese (Doutorado em Educação). Programa de Pós-Graduação em Educação.
Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2008.

YOUNG, M. Para que servem as escolas? Educação & Sociedade. v.


28, n. 101. Campinas Sept./Dec. 2007. Disponível em: <http://www.scielo.
br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-73302007000400002>.
Acesso em: 1 maio 2018.

64
C APÍTULO 3
A Relação Professor-Aluno na
Produção do Conhecimento

A partir da concepção do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes


objetivos de aprendizagem:

� Compreender a produção do conhecimento em diferentes teorias e ambientes


de aprendizagem.

� Descrever a centralidade relacional da aprendizagem dialógica na produção do


conhecimento.

� Identificar as implicações da relação professor-aluno na produção do


conhecimento.

� Conhecer os dados de pesquisas atuais sobre a relação professor-aluno e seus


efeitos no desempenho acadêmico.
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NO AMBIENTE ESCOLAR

66
Capítulo 3 A Relação Professor-Aluno na
Produção do Conhecimento

1 Contextualização
Melhorar as relações dos alunos com os professores tem implicações
importantes, positivas e duradouras, tanto para o desenvolvimento acadêmico
quanto para o desenvolvimento social dos alunos. Evidentemente, não é apenas
o aprimoramento do relacionamento dos alunos com seus professores que
produzirá ganhos na realização acadêmica e no conhecimento produzido. No
entanto, os alunos que mantêm relações próximas, positivas e de apoio com os
professores, atingem níveis mais elevados de aproveitamento do que os alunos
com mais conflitos em seus relacionamentos.

Imagine um estudante que sente uma forte conexão pessoal com o seu
professor, conversa com ele com frequência e recebe orientação e feedbacks
mais construtivos do que apenas críticas. É provável que esse estudante confie
mais em seu professor, mostre mais envolvimento na aprendizagem, se comporte
melhor em sala de aula e alcance níveis acadêmicos mais elevados. As relações
professor-aluno positivas atraem os alunos para o processo de aprendizagem
e promovem seu desejo de aprender. É claro que tal relação deve, no contexto
escolar, estar associada a um processo de ensino-aprendizagem em que o material
de conteúdo da aula seja envolvente, adequado à idade e que corresponda bem
às habilidades do aluno, pois a instrução acadêmica de alta qualidade é projetada
para ser apropriada aos níveis educacionais dos alunos. Sendo que isso também
cria oportunidades para pensar e analisar, utilizar o feedback de forma eficaz para
orientar o pensamento dos alunos e assim ampliar o conhecimento prévio destes.
O conhecimento que é produzido, então, como fruto dessa relação professor-aluno
positiva, neste contexto, certamente será mais significativo e de maior amplitude.

O propósito no presente capítulo é primeiramente contextualizar como


distintas abordagens educacionais percebem a produção do conhecimento,
enfatizando as contribuições da aprendizagem dialógica. Na abordagem dialógica
da aprendizagem, o conhecimento é produzido através das relações, ele é
relacional em sua essência. Após apresentar esta visão sobre a aprendizagem e o
conhecimento, vamos explorar as implicações diretas da relação professor-aluno
no desempenho e êxito acadêmico e delinear a centralidade desta relação para a
produção de um conhecimento significativo.

67
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NO AMBIENTE ESCOLAR

2 Teorias e Ambientes de Aprendizagem

A organização das salas de aula, uma vez que a escola se tornou parte
dos sistemas educacionais, tem assumido importantes variações de acordo
com a evolução das sociedades e das teorias da aprendizagem. Tomando
abordagens educacionais baseadas principalmente no conhecimento produzido
pela psicologia, destacaremos três escolas de pensamento que influenciaram as
práticas escolares desde a segunda metade do século XX.

Na primeira escola de pensamento, encontramos teorias psicológicas que


veem a aprendizagem como algo que resulta e depende de modelos “adequados”
e “avançados” de pensamento e comportamento, modelos incorporados na figura
do professor ou especialista. Nesta perspectiva, a programação da exposição,
relacionamentos, materiais e interações desencorajam alternativas de trabalho
em grupo ou de interação entre pares em sala de aula, exceto na forma de tutoria.
Nas interações entre pares, o aluno mais avançado serviria como um parâmetro
para o menos avançado, e assim seria uma fonte para o outro aprender.
A produção do
Supõe-se que os mais capazes nunca se beneficiaram desse tipo de
conhecimento aqui,
portanto, ocorreria interação, mas de fato correram o risco de regredir (ROSENTHAL;
antes da própria ZIMMERMAN, 1972). O conhecimento neste contexto, entendido como
relação professor- originário de uma única fonte estável e autorizada, passa pelo escrutínio
aluno, pois viria do professor, um agente estável de autoridade. Este conhecimento,
do professor então, é transferido ao aluno, tendo este o dever de apreendê-lo
como produto
uniformemente. A produção do conhecimento aqui, portanto, ocorreria
já organizado e
acabado. antes da própria relação professor-aluno, pois viria do professor como
produto já organizado e acabado.

Mais tarde, numa direção diferente e preocupada com o estudo e a


compreensão dos processos de significação típicos da cognição humana, as
abordagens construtivistas começaram a afetar fortemente a organização das
escolas e das salas de aula (LIMA, 1990). Como um todo, as teorias construtivistas
mostraram que diversas fontes de conhecimento e diferentes experiências estão
em jogo em uma sala de aula, e que o professor deve parar de assumir o papel
de um filtro de conhecimento a ser transmitido ao aluno, ou de um organizador do
material de aprendizagem a ser utilizado pelo aluno, adotando, ao invés disso, o
papel de organizador da relação do aluno com o conhecimento e entre si.

Partindo de pressupostos muito diferentes sobre inteligência e produzindo


teorias muito diferentes e resultados escolares igualmente divergentes, vamos
apresentar duas teorias construtivistas, a piagetiana e a ausubeliana. Estas
teorias compartilham uma visão comum da inteligência como algo individual, mas
diferem entre si sobre a sua constituição.

68
Capítulo 3 A Relação Professor-Aluno na
Produção do Conhecimento

Na teoria construtivista de Piaget, as estruturas e funções do


Na teoria
desenvolvimento humano são universais, ocorrendo em estágios construtivista de
sequenciais inalteráveis, com indivíduos variando apenas em seu ritmo Piaget, as estruturas
de aprendizagem de acordo com suas interações com o ambiente e funções do
físico e social (PIAGET, 1987; FLAVELL, 1988). Esse ritmo pode ser desenvolvimento
modificado pela interação entre pares cujos níveis de aprendizagem humano são
universais.
diferem um do outro. Além disso, os pontos inicial e final, mesmo em
ritmos diferentes, são comuns a todos.

Na perspectiva ausubeliana, a inteligência individual é determinada


Na perspectiva
pelo background social do indivíduo (incluindo suas origens culturais, ausubeliana,
raciais e de gênero), o que determinaria sua maior ou menor propensão a inteligência
à aprendizagem escolar, uma vez que cada nova lição aprendida individual é
depende de conhecimento preexistente ao qual a nova lição pode ser determinada pelo
vinculada (AUSUBEL, 1968; AUSUBEL; NOVAK; HANESIAN, 1980). background social
do indivíduo.
Assim, a inteligência é equiparada a modos de pensar escolarizados,
que postula grupos socialmente marginalizados como grupos que
são menos capazes. Caberia ao professor ou aos professores preparar a aula,
os cursos de treinamento ou o material didático com base em dois elementos:
o nível de conhecimento prévio do aluno e a estrutura dos conteúdos a serem
aprendidos, organizando a sala de aula com base na aprendizagem significativa.
Na perspectiva ausubeliana, são principalmente programas individuais baseados
no conhecimento prévio de cada aluno que são mais valorizados. As escolhas de
trabalho em grupo, nesta perspectiva, consideram a possibilidade de se juntar
estudantes que compartilham o mesmo tipo de origem, experiência e níveis de
habilidade na mesma sala de aula, ou estabelecem diferentes salas de aula de
acordo com o nível de habilidade. Considerando que os alunos têm pontos de
partida desiguais, espera-se que os pontos de chegada também sejam desiguais.
Contudo, todas as pesquisas sobre agrupamento de habilidades demonstraram
que esse agrupamento de estudantes é ineficaz em elevar os níveis de realização
e desempenho dos menos favorecidos (OAKES, 1985).

De acordo com as teorias construtivistas piagetiana e ausubeliana, o


conhecimento científico-acadêmico sintetiza a realidade, mas sua apreensão é
determinada pela capacidade interpretativa do aluno. Em outras palavras, o aluno
apreende e aprende o conhecimento: a) de acordo com os estágios consecutivos
e universais do desenvolvimento; b) dependendo de seu grupo de origem
e motivação intrínseca; c) pelo estágio em que ele está; e d) de uma maneira
determinada pelo ponto cognitivo inicial. Nesse contexto, as interações servem
para gerar conflito cognitivo entre pares no mesmo estágio de desenvolvimento
ou na fronteira entre dois estágios (FERREIRO, 2001). Tais interações servem
para adaptação entre pares em níveis semelhantes que colaboram entre si, ou
entre pares em níveis desiguais para motivar os menos avançados através de um
efeito mais afetivo do que cognitivo. No geral, ambas as abordagens ilustram que,
69
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NO AMBIENTE ESCOLAR

na escola construtivista de pensamento da psicologia, passamos de um diagrama


vertical da relação entre conhecimento, professor e aluno, para um diagrama
triangular de relações, que é conhecido como “triângulo interativo”.

Mais recentemente, investigando mais profundamente a relação entre


conhecimento e significado, principalmente sob a influência da escola soviética,
as abordagens construtivistas da psicologia concentraram-se no estudo da
relação entre significado e sentido nos processos de aprendizagem, o que levou
os estudiosos construtivistas a apontarem para a necessidade de considerar as
perspectivas dialógicas e comunicativas das interações.

As críticas à teoria piagetiana sobre a atenção insuficiente aos aspectos


culturais do desenvolvimento humano levaram o próprio Piaget a se engajar em
novos estudos em diferentes culturas (PIAGET, 1966). Ensaios clínicos sobre
conservação (quantidade, massa e volume) tornaram-se um ponto focal na
psicologia, para verificar a universalidade das estruturas de pensamento, e foram
reconhecidos como o modelo mais adequado para o estudo da inteligência em
diferentes culturas. Sob críticas teóricas e metodológicas (COLE; SCRIBNER,
1974), pesquisadores da chamada área de estudos transculturais ou interculturais
produziram um conjunto de conhecimentos que levaram ao avanço da compreensão
dos fenômenos psicológicos em relação às culturas que geram significações e
significados específicos. Segundo Zittoun, Mirza e Perret-Clermont (2007, p. 67),
em referência aos métodos de investigação e os resultados encontrados:

A descentralização tratada pela pesquisa intercultural revela


uma dimensão até então invisível: a significação da tarefa não
é dada em si mesma. A pessoa a quem a tarefa é designada a
interpreta e a (re)constrói, fazendo uso de sua “cultura pessoal”,
ou seja, as linguagens, regras e modos de pensamento com os
quais ela cresceu e aos quais ela tem acesso.

O grupo de origem O grupo de origem e de convivência de cada pessoa é assim


e de convivência considerado como fontes e arquivos de conhecimento que se
de cada pessoa é desdobram em qualquer ação dos indivíduos, que dão significado ao
assim considerado outro, às suas expectativas e às suas ações, permitindo-lhe interagir
como fontes com os objetos em atividades específicas, ou para se comunicar com
e arquivos de
outros, se a tarefa exigir cooperação na atividade. Ao contrário de
conhecimento.
Ausubel, Novak e Hanesian (1980), que consideram as culturas de
base como subculturas – portanto, menos complexas e causando ambientes nos
quais as inteligências menos dotadas são produzidas –, estudos interculturais e
transculturais trouxeram elementos fundamentais da cultura como contexto para o
desenvolvimento psicológico bem-sucedido dos indivíduos.

Voltando à perspectiva piagetiana, o foco de análise e compreensão está nas


estruturas mentais do indivíduo, construídas por meio de constantes interações

70
Capítulo 3 A Relação Professor-Aluno na
Produção do Conhecimento

com o meio ambiente – físico e social – durante o seu desenvolvimento. A mente


da criança é primária e egocêntrica e, portanto, a partir dessa perspectiva, há
primazia do indivíduo em relação às trocas sociais e ao ambiente cultural.

 Na outra posição, estão as abordagens socioculturais ou histórico- A interação social


culturais, que consideram a mente humana como social e cultural é constitutiva do
(VYGOTSKY; LURIA; LEONTIEV, 1988). Nesta perspectiva, cada ato da desenvolvimento
criança é visto como ocorrendo em um ambiente construído culturalmente humano e dos
através da história da humanidade. Assim, a interação social é constitutiva processos mentais
dos indivíduos.
do desenvolvimento humano e dos processos mentais dos indivíduos.

Zittoun, Mirza e Perret-Clermont (2007) organizam as produções de


abordagens históricas socioculturais ou culturais, que denominam pós-
piagetianas, em quatro perspectivas distintas, a saber: (a) que se concentra em
narrações e obras culturais (BRUNER, 2001); (b) que enfoca a atividade como
um conceito central na análise da cultura e da mente (SCRIBNER; COLE, 1981;
ROGOFF, 1990, 2003); (c) que enfoca os processos semióticos (VALSINER,
2000; LAWRENCE; VALSINER 2003); (d) que enfoca os processos dialógicos,
onde são agrupados os autores dedicados à análise de processos discursivos
e de negociação de entendimento e reposicionamento nas relações grupais
(PONTECORVO, 2004; MULLER; PERRET-CLERMONT, 1999).

Quais são as consequências dessas contribuições mais recentes para


a organização da sala de aula, processos de aprendizagem e produção de
conhecimento na escola? Como elas apoiam as redes sociais que os indivíduos
precisam para o seu desenvolvimento? A seguir, responderemos a essa questão
por meio de teorias relacionadas ao conceito de aprendizagem dialógica.

3 Aprendizagem Dialógica
No contexto atual, a produção de conhecimento acadêmico é intensa, pois a
informação é amplamente disseminada e incorporada aos sistemas de produção
e à vida social. As novas tecnologias de informação e comunicação geram redes
de criação, difusão e incorporação de conhecimento em processos de produção
em tempo real (CASTELLS, 1999; FLECHA, 2000; AUBERT et al., 2008). Na
Sociedade da Informação e do Conhecimento, ter acesso às redes de informação e
conhecimento, saber selecionar, dentre a multiplicidade de elementos acessíveis,
analisar o que é encontrado através do escrutínio crítico, para utilizá-lo, torna-se
essencial para o funcionamento eficaz em muitas esferas sociais. É importante
ressaltar que a democratização da Sociedade da Informação e do Conhecimento
também depende de todos os estudantes desenvolverem essas habilidades.

71
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NO AMBIENTE ESCOLAR

Além disso, nas sociedades atuais existe uma demanda crescente por
diálogo como forma de negociar diferentes aspectos da vida e como forma de
construir a convivência em diferentes espaços sociais. Esse fenômeno tem
sido descrito como a “virada dialógica” das sociedades (FLECHA; GÓMEZ;
PUIGVERT, 2003). A violência surge quando o diálogo é evitado, aumentando
as desigualdades. Assim, a incorporação do diálogo na construção de melhores
alternativas na sociedade é um requisito para garantir direitos iguais e uma vida
melhor para todos.

A virada dialógica da sociedade também encontrou expressão nas teorias da


aprendizagem. Nesse sentido, alguns estudiosos falam sobre uma virada dialógica
da psicologia educacional (RACIONERO; PADRÓS, 2010). Esta virada implica,
por um lado, colocar a interação e o diálogo no centro das atuais explicações da
aprendizagem humana e de produção de conhecimento, projetando ambientes
interativos de aprendizagem que respondam como as pessoas aprendem em
sociedades dialógicas.

Assista ao vídeo Aprendizagem Dialógica, no qual a


professora doutora Roseli Mello, coordenadora do NIASE (Núcleo
de Investigação e Ação Social e Educativa), da Universidade
Federal de São Carlos, introduz a Concepção Comunicativa/
Aprendizagem Dialógica. Disponível em: <https://www.youtube.com/
watch?v=dNvj1u0Vee8>.

4 Base Teórica Dos Ambientes de


Aprendizagem Dialógica

A mente e a Uma visão essencial das teorias do ensino e aprendizagem


cognição, e, dialógica é que a mente e a cognição, e, portanto, o conhecimento,
portanto, o se desenvolvem na interação social. Vygotsky (1996) contribui para a
conhecimento, se compreensão de que a mente é formada socialmente, assumindo um
desenvolvem na
movimento que é inicialmente interpessoal e depois se torna intrapessoal.
interação social.
O processo de desenvolvimento de cada indivíduo ocorre por meio de
suas relações com os outros em seu entorno, com os adultos mais experientes
na cultura assumindo um papel de liderança. Sob a influência de Vygotsky,

72
Capítulo 3 A Relação Professor-Aluno na
Produção do Conhecimento

Bruner (2001, p. 98, 99) define cultura como “um conjunto de ferramentas com
técnicas e procedimentos para entender seu mundo e lidar com ele”, ou “uma
maneira de lidar com problemas humanos: com transações humanas de todos os
tipos representadas por símbolos”. Ao fornecer essa definição, Bruner pode ser
considerado um dos principais teóricos do conceito de mente social (CORREIA,
2003). Para ele, a comunicação entre os indivíduos em um processo
de interação mobiliza e produz conhecimento, porque “fazendo uso A comunicação
da linguagem para alcançar seus fins, as crianças têm mais do que entre os indivíduos
em um processo
domínio de um código de comunicação; elas negociam procedimentos
de interação
e significados e, quando fazem isso, estão aprendendo o caminho da mobiliza e produz
cultura, bem como o caminho da linguagem” (ALVES et al., 2007, p. conhecimento.
328). Rogoff (1990) também foi central na explicação do papel da cultura
no desenvolvimento; para ela, o indivíduo e a cultura são vistos como estando em
constante desenvolvimento, dinamicamente vinculados e inseparáveis​.

Se a intersubjetividade é a base para a construção da subjetividade e da


inteligência, a interação, a relação, é um fator que impulsiona o desenvolvimento.
Mas todos os tipos de interação são igualmente eficazes na condução da
aprendizagem? Que tipo de interação, relação, leva a uma construção mais
profunda do conhecimento?

Habermas (1987) nos ajuda a responder a essa pergunta. É na interação


entre diferentes indivíduos que se encontram, tendo cada um o seu conhecimento
inquestionável, conhecimento este que pertence ao mundo da vida do indivíduo
e é dado como assegurado por ele. É nesta interação que tal conhecimento se
torna problematizado, permitindo que os indivíduos o considerem e o examinem,
e então façam escolhas deliberadas sobre sua pertinência. Assim, quando
seu conhecimento básico é questionado, os indivíduos se sentem desafiados,
um processo que conecta a produção de conhecimento e a interação ao
desenvolvimento da identidade.

Cada indivíduo é constituído de mundos da vida, cujo conhecimento ele


constitui e reproduz, mas isto é questionado quando tal conhecimento é removido
do consenso geral, uma situação gerada apenas pela interação, e mantido
pela relação entre indivíduos diferentes ou por situações que confrontam o que
é tomado como garantido. Quando isso ocorre, dois caminhos são
A mente, o
possíveis: aquele do conflito, se o diálogo entre os indivíduos não puder
conhecimento
ser estabelecido porque não há vontade de alcançar entendimento ou e a ação no
consenso comunicativo; ou aquele da ação comunicativa, produzindo mundo são assim
novos conhecimentos intersubjetivos que permitam a ação conjunta no permanentemente
mundo compartilhado. A mente, o conhecimento e a ação no mundo constituídos nos
são assim permanentemente constituídos nos processos de ação processos de ação
comunicativa.
comunicativa (HABERMAS, 1987).

73
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NO AMBIENTE ESCOLAR

A relação profunda entre conhecimento, seu contexto de produção e seu


uso pretendido é enfatizada tanto por Habermas (1987) quanto por Paulo Freire
(1987, 2000). No entanto, enquanto Habermas está mais preocupado com o
uso racional que é feito do conhecimento e das técnicas e tecnologias, Freire
se concentra mais na questão do propósito da produção. Freire (1987, 1996)
oferece uma perspectiva crítica sobre o conhecimento a ser produzido, ensinado
e aprendido. Busca compreender a favor/contra quem e para o que/quem tal
conhecimento é produzido. Habermas (1987) deposita elementos de criticidade
na presença da maior diversidade possível de pessoas ao analisar a eficácia e
correção da aplicação de conceitos, técnicas e tecnologias a diferentes contextos.
A discussão entre diferentes indivíduos, assumindo a racionalidade comunicativa
no processo de argumentação permeada pela pretensão de verdade, adequação
e autenticidade, é o caminho para alcançar entendimentos mais profundos da
realidade e o resultado de alcançar um estado de intersubjetividade.

O conceito de intersubjetividade é central para ambos os teóricos. Habermas


(1987) e Freire (2000) formularam teorias que ontologicamente entendiam o
indivíduo e o sistema como inseparável. Essa perspectiva é compatível com teorias
psicológicas que consideram a mente e a inteligência como sociais, entendendo
os processos de aprendizagem e subjetividade como intersubjetivos. Habermas
(1987) expressa essa inseparabilidade na formulação teórica da relação entre o
mundo da vida e o sistema. Freire (2000) expressa a dialética entre indivíduos e
sistemas ao conceber a objetividade e a subjetividade na relação dialética, ou a
ligação consciência-mundo como inseparável.

Em Freire (2003), o conceito de “unidade na diversidade” é central e incorpora


a noção de que o diálogo e a unidade, a relação, entre pessoas diferentes, a
unidade na diversidade de suas origens e projetos de vida são necessários para
capacitar os indivíduos a lutar por condições de vida decentes e respeitar modos
diferentes de ser. O oposto é o que produz desigualdades (FREIRE, 2000). Esta
análise mostra como a sociedade e a cultura estão presentes na constituição
das identidades. Note que Freire (2003) chama a atenção para o fato de que o
multiculturalismo não é um processo “natural”, mas um produto do colonialismo,
dominação e guerras. Portanto, para ser vivenciada como fonte de conhecimento e
enriquecimento humano, deve-se tomar uma decisão política sobre como alcançar
a coexistência e a proteção daqueles que são diferentes. Para Habermas (1987),
a coexistência de diferentes culturas, não apenas lado a lado, mas também entre
si, requer comunicação entre elas. O autor afirma a necessidade de democracia
deliberativa para garantir os direitos dos cidadãos com diferentes origens culturais
para viver sob os mesmos direitos.

74
Capítulo 3 A Relação Professor-Aluno na
Produção do Conhecimento

Assista ao vídeo Princípios da Aprendizagem Dialógica, no qual


Maria Teresa Cala, membro do CREA e gestora escolar, fala sobre os
princípios da Aprendizagem Dialógica. Disponível em: <https://www.
youtube.com/watch?v=hp2EdM2hh3o>.

5 Os Sete Princípios da
Aprendizagem Dialógica

O conceito de aprendizagem dialógica (FLECHA, 2000; AUBERT et al.,


2008) é fortemente apoiado pelas teorias mencionadas e une as mais importantes
contribuições interacionistas e dialógicas da psicologia, antropologia, sociologia,
pedagogia etc. para explicar como as pessoas aprendem melhor nas
A aprendizagem
sociedades dialógicas atuais. Podemos dizer que a aprendizagem
dialógica ocorre
dialógica ocorre quando uma série de sete princípios se desenvolvem quando uma série
na interação social (e que, sugerimos, devem ser desenvolvidas na de sete princípios
relação professor-aluno), a saber: diálogo igualitário, inteligência se desenvolvem na
cultural, transformação, dimensão instrumental, criação de significado, interação social.
solidariedade e igualdade de diferenças.

O diálogo igualitário pressupõe que as afirmações e proposições de cada


participante são consideradas tendo em conta o valor de suas contribuições e não
dependendo de sua situação em relação à idade, profissão, gênero, classe social,
nível educacional etc. Em ambientes concebidos sobre a noção de aprendizagem
dialógica, os participantes são frequentemente autorizados a usar sua inteligência
cultural (FLECHA, 2000), ou seja, o conjunto de habilidades acadêmicas, práticas
e comunicativas, para se engajar na construção do conhecimento. É possível
perceber nitidamente aqui a proposta freireana da relação professor-aluno como
aquela entre aprender/ensinar e ensinar/aprender, na qual todos os sujeitos
participam ativamente da produção do conhecimento. Freire (1996) chega a criar
o neologismo, que torna esse aspecto dialógico mais explícito nesta relação,
“Didocente” e “Dodiscente”. Mas isso ocorre em ambientes de aprendizagem
onde três condições são favorecidas e atendidas: a) autoconfiança interativa, b)
transferência cultural de habilidades não acadêmicas para ambientes acadêmicos,
e c) criatividade dialógica (novos conhecimentos resultantes do diálogo que
integram as habilidades de todos envolvidos).

75
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NO AMBIENTE ESCOLAR

É importante ressaltar que, ao compartilhar diferentes pontos de vista e


formas de resolver problemas através do diálogo guiado por reivindicações de
validade, a transformação ocorre em dois níveis: intrapsicológico e interpsicológico.
Intrapsicológico, porque, apesar do diálogo, o conhecimento existente é
transformado e expandido. Interpsicológico, porque o que é compartilhado
mentalmente é o resultado da adição do conhecimento de cada pessoa em diálogo
com o conhecimento dos outros, o que gera um novo estado mental geral, a
aprendizagem dialógica é voltada para a transformação, pessoal e sociocultural,
para a produção de conhecimentos novos e significativos, e não para a adaptação.

A transformação exige ênfase na dimensão instrumental do


A transformação
exige ênfase diálogo como meio de produção de conhecimento. Essa dimensão
na dimensão instrumental refere-se àqueles aspectos do conhecimento escolar que
instrumental do são necessários para atravessar as portas do acesso socioeconômico à
diálogo como meio Sociedade da Informação e do Conhecimento (APPLE; BEANE, 2007).
de produção de A participação na aprendizagem dialógica surge como um importante
conhecimento.
instrumento para a criação de significado. Diante de várias escolhas
possíveis de como viver, é difícil projetar um único projeto para todos os grupos ou
pessoas e é difícil para a escola saber quais valores adotar, mas, geralmente, os
grupos dominantes impõem seus pontos de vista e discursos também nas escolas,
e isso gera crises de significado. No entanto, em diálogos em que diferentes pontos
de vista emergem e são reconhecidos no terreno da argumentação, os indivíduos
passam a conhecer mais possibilidades e assim escolhem mais livre e criticamente.
Tal processo cria mais oportunidades para ganhar maior coerência entre os sonhos
e a vida real. Por sua vez, isso se relaciona com o princípio da solidariedade.
Em ambientes de aprendizagem dialógica, os participantes compartilham seus
conhecimentos para o benefício de todos os membros do grupo.

O diálogo igualitário, a inteligência cultural, a transformação, a dimensão


instrumental, a criação de significado e solidariedade são também acompanhados
pelo princípio da igualdade de diferenças ou, como Freire (2003) propôs, “unidade na
diversidade”. Este princípio rompe com a inércia que o relativismo cultural impõe às
pessoas de diferentes grupos culturais, transformando as tradições em um
Através da
molde ao qual seus membros devem se conformar, perpetuando não apenas
aprendizagem
dialógica, as relações de poder e domínio dentro de suas próprias culturas, mas
cada pessoa também as relações de poder da cultura dominante sobre os outros. Através
constrói novos da aprendizagem dialógica, cada pessoa constrói novos entendimentos
entendimentos sobre a vida e o mundo e reflete sobre sua cultura e a dos outros, ganhando
sobre a vida e o maior liberdade para escolher seu modo de viver e relacionar-se com os
mundo.
outros, além de criar respeito pelos diferentes modos de viver.

76
Capítulo 3 A Relação Professor-Aluno na
Produção do Conhecimento

Os sete princípios da aprendizagem dialógica estão relacionados entre


si, apesar de cada um existir por si mesmo. Em cada um deles, o significado,
experiências de vida, emoção, cognição, cultura e outros elementos se juntam,
envolvendo diferentes pessoas com as quais os alunos interagem, entre estas
pessoas, o professor. Isso, novamente, diferencia a aprendizagem dialógica das
concepções prévias de ensino e aprendizagem. Do ponto de vista da aprendizagem
dialógica, a rede de interações e relações que se forma em torno de cada aluno
deve ser vista como um poderoso gerador da aprendizagem, que não é mais
estável e meramente triangular, como foi conceituado na abordagem construtivista.
As trajetórias de desenvolvimento dos alunos estão inseridas em redes complexas
que devem ser compreendidas e levadas em conta na organização das escolas,
incluindo a da sala de aula, como um espaço que promove a intersubjetividade.

6 As Relações Professor-Aluno
Os professores que promovem relacionamentos positivos, no contexto
dialógico, com seus alunos criam ambientes de sala de aula mais propícios
à aprendizagem e atendem às necessidades acadêmicas, emocionais e de
desenvolvimento dos alunos. Para compreender melhor este ponto, vamos pensar
em alguns exemplos concretos de proximidade entre um professor e um aluno.

Imagine que um estudante do Ensino Médio decide compartilhar a notícia


com seu professor de que recentemente se inscreveu para participar de uma
peça teatral em sua comunidade, e faz isso porque sabe que seu professor
demonstrará interesse genuíno em seu sucesso. Imagine um garoto da
quarta série que está com dificuldades em matemática e demonstra sentir-se
confortável ao admitir ao professor que ele precisa de ajuda para multiplicar e
dividir as frações, mesmo que a maioria dos alunos da turma já tenha avançado
nesses exercícios. Finalmente, imagine uma menina do Ensino Médio
As relações
que experiencia bullying de outros estudantes e se aproxima de seu
positivas professor-
professor para discutir esse assunto, porque ela confia que o professor aluno contribuem
vai ouvir e ajudar sem fazê-la sentir-se socialmente inepta. Em para o ajustamento
todos estes exemplos, podemos observar que as relações positivas escolar, assim como
professor-aluno contribuem para o ajustamento escolar, assim como para o desempenho
para o desempenho acadêmico e social. acadêmico e social.

Os relacionamentos positivos entre professor e aluno – evidenciados por


relatos de baixo conflito, alto grau de proximidade e apoio e pouca dependência
– foram comprovados em promover a adaptação dos alunos à escola,
contribuir para suas habilidades sociais, promover desempenho acadêmico e
estimular a resiliência dos alunos neste desempenho acadêmico (BATTISTICH;

77
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NO AMBIENTE ESCOLAR

SCHAPS; WILSON, 2004; HAMRE; PIANTA, 2001). Além disso, professores


que vivenciam relacionamentos próximos com alunos relatam que seus alunos
tinham menos probabilidade de evitar a escola, pareciam mais autodirecionados,
mais cooperativos e mais envolvidos com a aprendizagem (DECKER; DONA;
CHRISTENSON, 2007). Por isso, os professores que usam mais práticas
dialógicas e centradas no aluno (ou seja, práticas que mostram sensibilidade às
diferenças individuais entre os alunos, incluem alunos na tomada de decisões
e reconhecem as necessidades desenvolvimentais, pessoais e relacionais dos
alunos) produzem maior motivação em seus alunos do que aqueles que usam
menos dessas práticas (DANIELS; PERRY, 2003).

Alunos que frequentaram salas de aulas, das mais distintas disciplinas, que
tenham maior apoio emocional relatam maior envolvimento na aprendizagem
dessas matérias. Por exemplo, em uma pesquisa, alunos do quinto ano disseram
que estavam dispostos a se esforçar mais para entender a lição de matemática.
Eles relataram que gostaram de pensar e resolver problemas em matemática
e estavam mais dispostos a ajudar seus pares a aprender novos conceitos
(RIMM-KAUFMAN et al., 2015). Isto também ocorre entre as crianças nas séries
iniciais, em que os estudantes relataram em uma pesquisa gostarem mais da
escola e sentirem menos solidão quando têm uma relação próxima com seus
professores (BIRCH; LADD, 1997). Além disso, crianças das séries iniciais com
melhores relações professor-aluno mostram melhor desempenho em medidas de
habilidades acadêmicas iniciais.

Isto nos leva a avaliar que a qualidade das primeiras relações


A qualidade das
professor-aluno tem um impacto duradouro. Especificamente, os alunos
primeiras relações
professor-aluno que têm mais conflito com seus professores ou demonstram mais
tem um impacto dependência dos professores nas séries iniciais também acabam tendo
duradouro. menor desempenho acadêmico e mais problemas comportamentais
(HAMRE; PIANTA, 2001). Outros trabalhos indicam que as crianças
das séries iniciais com mais proximidade e menos conflitos com os professores
desenvolvem melhores habilidades sociais à medida que se aproximam dos
anos do Ensino Médio do que as crianças das séries iniciais com experiências
de relacionamento mais conflituosas no passado (BERRY; O’CONNOR, 2009).
Um estudo recente, examinando as relações aluno-professor ao longo do Ensino
Fundamental (do primeiro ao quinto ano), constatou que a proximidade professor-
aluno está vinculada a ganhos no desempenho da leitura, enquanto o conflito
professor-aluno relaciona-se a níveis mais baixos de desempenho de leitura
(MCCORMICK; O’CONNOR, 2014).

Na prática, poderíamos apontar algumas ações de professores que


possibilitariam desenvolver relacionamentos positivos com seus alunos na sala de
aula. Por exemplo:

78
Capítulo 3 A Relação Professor-Aluno na
Produção do Conhecimento

• Mostrar o seu prazer e entusiasmo em lecionar a disciplina aos alunos.


• Interagir com os alunos de forma ágil e respeitosa.
• Oferecer aos alunos ajuda (por exemplo, respondendo perguntas em
tempo hábil, oferecendo apoio que corresponda às necessidades dos
alunos) para alcançar objetivos acadêmicos e sociais.
• Ajudar os alunos a refletir sobre suas habilidades de pensar e aprender.
• Conhecer e demonstrar conhecimento sobre o contexto de cada estudante,
seus interesses, suas forças emocionais e seus níveis acadêmicos.
• Evitar mostrar irritabilidade ou agravamento em relação aos alunos.
• Reconhecer a importância dos pares nas escolas incentivando os alunos
a serem cuidadosos e respeitosos uns com os outros.

Por outro lado, podemos também apontar ações que devem ser evitadas.
Os professores que têm relacionamentos negativos com um aluno mostram
evidências de frustração, irritabilidade e raiva em relação a esse aluno. Os
professores podem mostrar sua negatividade através de comentários maliciosos
e sarcásticos para o aluno ou descrever a sensação de que estão sempre lutando
ou em conflito com um aluno em particular. Frequentemente, os professores
descrevem um aluno específico como “aquele que os tira a paciência” ou “que os
deixa sentindo esgotados”.

As relações negativas professor-aluno podem ser ampliadas As relações


quando os professores demonstram irritabilidade e raiva em relação professor-aluno
a alguns ou muitos dos alunos em sala de aula. Nestas situações negativas são
em sala, os professores podem recorrer a gritos e severos controles estressantes para
punitivos. A comunicação entre professor-aluno pode parecer sarcástica professores e
alunos e podem ser
ou desrespeitosa. Assim como a vitimização de estudantes ou o
prejudiciais para o
bullying podem ser ocorrências comuns em salas de aula negativas. As desenvolvimento
relações professor-aluno negativas são estressantes para professores acadêmico e
e alunos e podem ser prejudiciais para o desenvolvimento acadêmico e socioemocional
socioemocional dos alunos. (MCCORMICK; O’CONNOR, 2014) dos alunos.

7 Cultivar Relacionamentos
Positivos em Sala de Aula
As pesquisas indicam, de modo prático, coisas que o professor deveria fazer
para cultivar relacionamentos positivos em sala de aula, tais como: fazer um esforço
para conhecer e se conectar com cada aluno; sempre chamar os alunos pelos seus
nomes; descobrir informações sobre seus interesses; e se esforçar para entender o
que eles precisam para ter sucesso na escola (WHITLOCK, 2006).

79
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NO AMBIENTE ESCOLAR

Partindo desse pressuposto, o professor pode esforçar-se também para


passar o tempo individualmente com cada aluno, especialmente aqueles que são
mais difíceis ou tímidos. Isso ajudará o docente a criar um relacionamento mais
positivo com eles. O professor deve também estar ciente das mensagens explícitas
e implícitas que está dando aos seus alunos e ter o cuidado de mostrar a eles que
deseja que se saiam bem na escola por meio de ações e palavras. Além disso,
o professor deve criar um clima positivo em sua sala de aula, concentrando-se
não apenas em melhorar seus relacionamentos com seus alunos, mas também em
melhorar os relacionamentos entre eles (DONAHUE; PERRY; WEINSTEIN, 2003).

É importante que o professor esteja ciente de que está modelando o


comportamento de seus alunos, intencionalmente ou não. Os alunos observam
o estilo de interação do professor. Eles percebem se este demonstra simpatia e
respeito em relação a eles, aos outros alunos e aos adultos da sua escola. Os
alunos também identificam os métodos que o professor usa para gerenciar
O professor deve
emoções fortes. Eles percebem estratégias positivas, como respirar fundo
sempre estar
ciente de que os ou falar sobre suas frustrações. Da mesma forma, eles também percebem
alunos muitas estratégias negativas, como gritar com os alunos ou fazer piadas
vezes adotam as desrespeitosas sobre os colegas (JONES; BOUFFARD; WEISSBOURD,
estratégias que ele 2013). Portanto, o professor deve sempre estar ciente de que os alunos
mesmo usa. muitas vezes adotam as estratégias que ele mesmo usa.

Entretanto, o docente não deve presumir que ser gentil e respeitoso com
os alunos é suficiente para reforçar as realizações acadêmicas e a produção de
conhecimentos significativos. As salas de aula ideais têm mais do que um único
objetivo, os professores devem esforçar-se para manter os alunos em padrões
acadêmicos adequados e oferecer a eles a oportunidade de uma conexão
emocional com eles mesmos, outros professores, colegas e a escola como um
todo, criando um ambiente integrado e dialógico.

Nos casos com alunos mais difíceis, o docente não deve desistir muito
rapidamente de seus esforços para desenvolver relacionamentos positivos. Esses
alunos se beneficiarão de um bom relacionamento professor-aluno tanto quanto seus
pares com mais facilidade de se conviver (BIRCH; LADD, 1998). Do mesmo modo, o
professor não deve presumir que interações respeitosas e sensíveis são importantes
apenas para alunos da Educação Infantil. Alunos do Ensino Fundamental, Médio e
Superior também se beneficiam dessas relações (ALLEN et al., 2013).

Muitos docentes pensam que os relacionamentos são irrelevantes. Contudo,


algumas pesquisas sugerem, por exemplo, que crianças em idade pré-escolar
que têm muito conflito com seus professores mostram aumentos nos hormônios
do estresse quando interagem com esses professores (LISONBEE et al.,
2008). O docente não deve ficar indiferente a isso e simplesmente esperar que

80
Capítulo 3 A Relação Professor-Aluno na
Produção do Conhecimento

comportamentos e interações negativas ocorram na sala de aula para então


intervir. Em vez disso, deve adotar uma postura proativa na promoção de uma
experiência social positiva incluindo os alunos em discussões sobre interações
pró-sociais e modelando consistentemente essas interações positivas para eles
(JENNINGS; GREENBERG, 2009).

O professor deve conhecer os interesses de um aluno e, a partir disso,


poderá ajudá-lo a construir conhecimentos que correspondam a esses
interesses. Por exemplo, se um aluno que ama futebol chega até seu professor
com uma pergunta sobre um problema de matemática, ele poderá responder ao
aluno com um problema envolvendo futebol. Se um aluno que fala originariamente
espanhol, ou alemão, ou alguma outra língua nativa em casa for até seu professor
com uma pergunta sobre vocabulário em português, ele poderá responder à
pergunta e depois perguntar qual é a palavra na língua de sua origem, como ele
a usaria numa frase. Esse tipo de resposta específica mostra que o professor se
importa com o aluno como pessoa e que está ciente de suas forças individuais.

Outro ponto a ser ressaltado é o conhecimento do temperamento do aluno, pois


isso pode ajudar o professor a construir oportunidades de aprendizagem apropriadas.
Por exemplo, se uma garota da turma é particularmente distraída, o professor pode
apoiar seus esforços para se concentrar, oferecendo-lhe uma área mais tranquila
para trabalhar. Se um menino da sala de aula é muito tímido, parece engajado, mas
nunca levanta a mão para fazer perguntas, o professor pode avaliar seu nível de
compreensão de um conceito em uma conversa cara a cara, no final da aula.

Um aspecto central é que o professor forneça aos alunos um Um aspecto central


feedback significativo. Por isso, o professor deve observar a maneira é que o professor
como está oferecendo os feedbacks aos seus alunos. Deve analisar se forneça aos alunos
um feedback
está dando aos alunos um feedback que diz que se importa com eles e
significativo.
com o aprendizado deles, ou se está constantemente dizendo aos seus
alunos para se apressarem. Se em suas conversas está se concentrando no que
seus alunos realizaram ou se seus comentários estão se concentrando no que eles
ainda não dominaram. Para fornecer um feedback significativo, o professor deve
também observar a sua própria linguagem corporal, expressão facial e tom de voz,
e mostrar aos alunos que está interessado neles como pessoas.

O professor deve também certificar-se de dar tempo para seus alunos


vincularem os conceitos e as habilidades que estão aprendendo às suas próprias
experiências. Para isso, o docente pode incluir diversão nas coisas que faz em
sua sala de aula. Planejando atividades que criem um senso de comunidade para
que seus alunos tenham a oportunidade de ver as conexões entre o que eles já
sabem e as novas coisas que estão aprendendo.

81
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NO AMBIENTE ESCOLAR

8 Relação Professor-Aluno com


Alunos Difíceis
Alunos difíceis exigem mais energia de um professor. O docente pode precisar
passar um tempo com eles individualmente para conhecê-los melhor – para
entender os interesses deles e também o que os motiva. Isso não apenas permitirá
que ele adapte sua instrução aos interesses e motivação deles, mas o tempo gasto
com os alunos também lhes permitirá desenvolver confiança. Pesquisas recentes
com estudantes do Ensino Médio que apresentavam problemas frequentes e
intensos de disciplina mostram que quando os adolescentes percebem que seus
professores são pessoas de confiança, eles demonstram um comportamento
menos desafiador (GREGORY; RIPSKI, 2008). Conflitos persistentes de professor-
aluno durante os anos elementares aumentam a probabilidade de que as crianças
exibam comportamentos negativos externalizantes (O’CONNOR et al., 2012), por
isso é importante que os professores construam relacionamentos próximos em
tenra idade com crianças em risco de questões comportamentais.

Há, pelo menos, três perspectivas teóricas – teoria do apego, teoria social
cognitiva e teoria do autossistema – que ajudam a explicar por que os alunos se
comportam de certas maneiras na sala de aula e como o professor pode usar seus
relacionamentos com eles para melhorar a aprendizagem e assim permitir uma
produção de conhecimento significativo.

A teoria do apego explica como os alunos usam seus relacionamentos


Os alunos com
positivos com os adultos para organizar suas experiências (BOWLBY,
relações próximas
com seus 1990). A questão central dessa teoria é que os alunos com relações
professores os veem próximas com seus professores os veem como uma “base segura” a
como uma "base partir da qual poderão explorar o ambiente de sala de aula. Na prática,
segura" a partir os alunos com essa “base” se sentem seguros ao cometer erros​​
da qual poderão aceitando os desafios acadêmicos necessários para a aprendizagem.
explorar o ambiente
Relações fortes e positivas entre professor e aluno podem atuar como
de sala de aula.
um amortecedor contra os efeitos potencialmente adversos que o apego
inseguro entre pais e filhos pode ter no desempenho acadêmico dos estudantes
(O’CONNOR; MCCARTNEY, 2007).

A teoria social cognitiva postula que os alunos desenvolvem uma ampla gama de
habilidades simplesmente observando outras pessoas executarem essas habilidades.
Assim, o comportamento de modelagem pode ser uma modalidade positiva e eficaz
para o ensino (BANDURA; AZZI; POLYDORO, 2008). Aplicado ao ambiente de sala
de aula, os professores desempenham um papel fundamental como modelos vivos,
dos quais os alunos podem aprender comportamentos sociais e habilidades de
comunicação positivas. A teoria social cognitiva também esclarece a importância do

82
Capítulo 3 A Relação Professor-Aluno na
Produção do Conhecimento

feedback e encorajamento dos professores em relação ao desempenho


Os professores
dos alunos. Os professores servem como modelos e ajudam a regular o servem como
comportamento dos alunos por meio de interações e relacionamentos. modelos e ajudam
a regular o
A teoria do autossistema enfatiza a importância da motivação dos comportamento dos
alunos e, ao fazê-lo, explica a importância das relações professor- alunos por meio
de interações e
aluno (HARTER, 2012; MCCOMBS, 1986). Os alunos chegam à sala
relacionamentos.
de aula com três necessidades psicológicas básicas – competência,
autonomia e relacionamento –, que podem ser encontradas em uma sala de aula
por meio das interações dos alunos com os professores e com o ambiente de
aprendizagem dialógica.

As práticas de sala de aula que promovem os sentimentos de competência,


autonomia e relacionamento provavelmente produzirão o envolvimento e a
motivação necessários para o aprendizado e o sucesso acadêmico. A competência
refere-se à necessidade do aluno de se sentir capaz de desenvolver o trabalho
acadêmico. A autonomia sugere um sentimento de que ele ou ela tem alguma
escolha e capacidade de tomar decisões. O relacionamento implica que um
estudante se sente socialmente conectado aos professores ou aos colegas.

Os relacionamentos positivos professor-aluno ajudam os alunos a atender


a essas necessidades. Os professores devem, portanto, oferecer feedback aos
alunos para apoiar seus sentimentos de competência. Conhecer os interesses e
preferências de seus alunos e demonstrar respeito por essas diferenças individuais,
reforçando os sentimentos de autonomia dos alunos. Devem também estabelecer
um relacionamento pessoal e atencioso e promover interações sociais positivas
dentro de suas salas de aula para atender às necessidades de relacionamento dos
alunos. Assim, os relacionamentos efetivos professor-aluno confirmam aos alunos
que os professores cuidam deles e apoiam seus esforços acadêmicos.

Ainda sobre a relação professor-aluno com alunos difíceis, podemos observar


que houve um interesse crescente em métodos para apoiar o desenvolvimento
de autocontrole dos alunos. O funcionamento executivo é um componente do
autocontrole que se refere à memória de trabalho dos alunos, à capacidade de
direcionar a atenção e à capacidade de controlar suas respostas em diferentes
situações. Por meio de seus relacionamentos e interações com os alunos,
os professores podem ajudar a desenvolver e melhorar as habilidades de
funcionamento executivo dos alunos e os comportamentos que surgem por causa
dessas habilidades. Por exemplo, um maior grau de apoio emocional fornecido
pelo professor em sala de aula está associado a uma redução no comportamento
desviante da tarefa dos alunos (RIMM-KAUFMAN et al. 2009). Além disso, uma
pesquisa apontou que os alunos com baixo controle de esforço têm um desempenho
semelhante ao das crianças com alto controle de esforço (ou seja, a capacidade
de substituir uma resposta automática ou imediata por uma mais apropriada, como
83
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NO AMBIENTE ESCOLAR

As relações levantar a mão em vez de gritar) em testes de leitura e matemática, se


professor-aluno eles experimentam relacionamentos positivos com seus professores
ajudam os alunos (LIEW; CHEN; HUGHES, 2010), ou seja, as relações professor-aluno
a desenvolver ajudam os alunos a desenvolver habilidades de funcionamento executivo,
habilidades de independentemente de terem poucas ou muitas dessas habilidades no
funcionamento
início do ano letivo.
executivo.

Outra contribuição das relações professor-aluno positivas e


dialógicas pode ser vista na resiliência dos alunos. Frequentemente, assumimos
que fatores difíceis de mudar, como tamanho da turma, experiência do professor
ou disponibilidade de suprimentos instrucionais, são cruciais para prever o
desempenho do aluno. Na verdade, esses fatores não são tão importantes
quanto ter relacionamentos positivos. Em um estudo com quase 4.000 estudantes
(que eram de grupos étnicos minoritários e de famílias pobres), a presença de
relacionamentos positivos com professores e a experiência de um ambiente
escolar positivo e ordenado no Ensino Fundamental e Médio foram fortes
preditores de ganhos em resultados de matemática, muito mais forte do que o
tamanho da turma, a experiência do professor ou a disponibilidade de suprimentos
instrucionais (BORMAN; OVERMAN, 2004). Em outro estudo, alunos do Ensino
Médio com problemas comportamentais e emocionais foram designados para
uma intervenção envolvendo interações semanais com professores, chamadas
telefônicas mensais para os alunos em casa e um aumento de feedbacks positivos.
Os alunos envolvidos na intervenção apresentaram médias de notas mais altas ao
longo do período de intervenção de cinco meses em comparação com seus pares
que não estavam recebendo a intervenção (MURRAY; MALMGREN, 2005).

Sabemos também que os comportamentos e emoções que as crianças pequenas


exibem quando interagem com os colegas desempenham um papel crítico em seu
envolvimento com o bullying ao longo dos anos escolares. Contudo, as pesquisas
sugerem que os professores têm a capacidade de reduzir os comportamentos de
bullying que ocorrem na sala de aula, estabelecendo um clima positivo no qual as
ações pró-sociais são incentivadas e recompensadas (HANISH et al., 2004). Através da
relação professor-aluno, os professores podem ajudar os alunos a entender e regular
melhor as emoções que estão sentindo. Os professores também podem envolver os
alunos na discussão de estratégias alternativas para lidar com conflitos
Os alunos serão sociais e no estabelecimento de regras pró-sociais para a sala de aula.
mais engajados
e motivados se
Estudos como estes descritos apontam para uma mensagem
os professores
atenderem às importante – em qualquer faixa etária, em uma variedade de graus de
necessidades dificuldades (contextuais, comportamentais, estruturais etc.), e em todas
essenciais dos as áreas de conteúdo e produção de conhecimento, os alunos serão mais
alunos para a engajados e motivados se os professores atenderem às necessidades
conexão social. essenciais dos alunos para a conexão social.

84
Capítulo 3 A Relação Professor-Aluno na
Produção do Conhecimento

9 Características Relevantes Dos


Alunos e Dos Professores
Múltiplos fatores determinam as relações professor-aluno, entre estes, as
características do professor e as características do aluno desempenham um
papel importante na previsão da qualidade das interações que os professores têm
com os alunos individualmente. Embora menos estudados, outros fatores, como o
clima social escolar, as políticas escolares, entre outros, também contribuem para
a qualidade dessas relações.

Melhorar as relações professor-aluno constitui apenas um primeiro passo


para criar uma comunidade de sala de aula dialógica que seja propícia ao
desenvolvimento acadêmico e social do aluno. Lembrando que a aprendizagem
dialógica ocorre em um contexto relacional e integrado, que não se reduz à
relação professor-aluno, mas atravessa esta relação, incluindo todos os atores e
agentes comunicativos do mundo do aluno.

Por isso o professor deve sempre atentar para as diversas características


do estudante, de si mesmo e do meio circundante que sejam possíveis fatores de
risco e óbices para relacionamentos positivos e construtivos que visam à produção
de conhecimentos significativos.

Sobre este tema, podemos apontar algumas questões que envolvem as


características de gênero. Pesquisas indicam que os meninos geralmente têm
mais conflitos e menos proximidade em seus relacionamentos com os professores
do que as meninas (HUGHES; CAVELL; WILSON, 2001). Além disso, outras
pesquisas indicam que altos níveis de conflito professor-aluno podem afetar
meninas e meninos de maneira diferente. Por exemplo, o conflito professor-aluno
parece afetar mais negativamente o aproveitamento de matemática para as
meninas do que para os meninos (MCCORMICK; O’CONNOR, 2014).

Outras características dos alunos são também relevantes para


compreendermos certos obstáculos para relacionamentos positivos. Pesquisas
indicam que os alunos com mais problemas internalizantes (por exemplo,
que sofrem de depressão, ansiedade) mostram maior dependência de seus
professores (HENRICSSON; RYDELL, 2004), enquanto estudantes com mais
problemas externalizantes (por exemplo, agressividade elevada, comportamentos
disruptivos) mostram mais conflitos com professores (O’CONNOR et al., 2012).

Ainda sobre esta classe de características, as pesquisas indicam que os


alunos que apresentam mais problemas comportamentais em casa e na escola

85
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NO AMBIENTE ESCOLAR

tendem a desenvolver relacionamentos mais conflituosos e menos próximos


com seus professores (BIRCH; LADD, 1998; O’CONNOR et al., 2012), assim
como alunos com distúrbios emocionais ou deficiência intelectual leve têm
relacionamentos mais negativos com os professores do que os estudantes sem
esses problemas (MURRAY; GREENBERG, 2001).

Rudasill et al. (2010) identificaram que alunos com comportamentos


desafiadores nas séries iniciais, com habilidades linguísticas pouco desenvolvidas,
são percebidos por seus professores como tendo mais relacionamentos
conflituosos. Por outro lado, estudantes mais tímidos nas séries iniciais com
melhores habilidades linguísticas são percebidos por seus professores como mais
dependentes deles.

Para os alunos que apresentam maiores riscos de desenvolver


relacionamentos problemáticos professor-aluno, os professores precisam fazer
esforços extras para oferecer apoio social e emocional que os ajude a
Os professores enfrentar os desafios da vida escolar. Entretanto, os professores variam
variam em sua
em sua capacidade de criar relacionamentos positivos professor-aluno.
capacidade de criar
relacionamentos Alguns professores simplesmente têm mais facilidade em desenvolver
positivos professor- relacionamentos positivos com os alunos, por questões de traços da
aluno. personalidade, sentimentos em relação aos alunos, ou suas próprias
histórias de relacionamento podem desempenhar um papel importante.

Algumas características pessoais dos professores foram identificadas


como importantes preditores de relações positivas professor-aluno no Ensino
Fundamental. Pesquisas comparativas e interculturais, por exemplo, descobriram
que professores das séries iniciais têm maior probabilidade de desenvolver
relacionamentos próximos com alunos que compartilham sua mesma origem
étnica. Assim como professores que lembram de sua própria educação como
cuidado e relacionamentos positivos também tinham maior probabilidade de
vivenciar proximidade com os alunos em suas salas de aula (KESNER, 2000).

As crenças dos professores e os tipos de práticas pedagógicas


As crenças dos
professores e os que os professores preferem também influenciam no processo e no
tipos de práticas resultado da produção de conhecimento em sala de aula. Professores
pedagógicas que das séries iniciais que usam práticas de ensino mais adequadas à idade
os professores e centradas no aluno relataram menos relacionamentos conflitantes
preferem também com seus alunos do que aqueles que usam estratégias didáticas mais
influenciam no
centradas no professor (MANTZICOPOULOS, 2005).
processo e no
resultado da
produção de
conhecimento em
sala de aula.

86
Capítulo 3 A Relação Professor-Aluno na
Produção do Conhecimento

10 Relação Professor-aluno e
Habilidades Sociais
A qualidade das relações professor-aluno é surpreendentemente estável
ao longo do tempo. Em outras palavras, se um professor das séries iniciais, no
primeiro ano, tiver um relacionamento conflituoso com um aluno, é provável que
os professores do segundo ou terceiro ano também experimentem conflitos em
sua relação com a mesma criança. Essa estabilidade é mais evidente quando os
relacionamentos são conflitantes e não quando os relacionamentos são próximos
ou dependentes (PIANTA; STUHLMAN, 2004). Muito provavelmente, a estabilidade
decorre do “modelo de trabalho interno” que os estudantes criam em sua mente
sobre como as relações com os adultos normalmente deveriam funcionar.

Uma estratégia efetiva ocorre quando o docente utiliza um método de ensino


que complementa o estilo de aprendizagem dos alunos e os motiva, por exemplo,
a fazer perguntas e engajar-se na produção de conhecimento em uma interação
dialógica. O professor permite que os alunos questionem seu pensamento,
trazendo os questionamentos de suas próprias realidades, um tipo de
questionamento que promove a aprendizagem significativa. Esta é a perspectiva
dialógica, não apenas uma via bidirecional, entre o professor e os alunos, mas
a interação de todos os sujeitos envolvidos no processo, fornecendo estímulo e
engajamento entre os alunos, e melhorando a relação professor-aluno, permitindo
assim a produção de um conhecimento significativo.

Os relacionamentos positivos entre professor e aluno podem de fato


promover relacionamentos aprimorados entre colegas em suas salas de aula
por meio de abordagens diretas e indiretas. Os professores podem promover
diretamente comportamentos sociais positivos orquestrando os relacionamentos
dentro de uma sala de aula de maneira positiva (BATTISTICH; SCHAPS; WILSON,
2004). Os professores podem também usar relações positivas professor-aluno
indiretamente para promover os relacionamentos entre pares. Os alunos tendem
a aceitar mais os colegas que demonstram engajamento nas tarefas escolares
(por exemplo, mostrar atenção, participar de atividades em sala de aula) e
relacionamentos positivos entre professor e aluno aumentam o engajamento
dos alunos, melhorando a aceitação do estudante para alunos nos anos atuais e
futuros (HUGHES; KWOK, 2007).

A produção de conhecimento escolar significativo também está, As relações


portanto, relacionada ao clima da sala de aula. Algumas pesquisas professor-aluno
afetam como o clima
apontam que as relações professor-aluno afetam como o clima de
de sala de aula se
sala de aula se desenvolve. Por exemplo, quando os professores do desenvolve.

87
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NO AMBIENTE ESCOLAR

primeiro ano usam práticas que demonstram cuidado com os alunos e práticas
que estimulam as habilidades interpessoais entre os alunos, os alunos são menos
propensos a rejeitar um ao outro (DONAHUE; PERRY; WEINSTEIN, 2003). Além
disso, os alunos agressivos que têm relações positivas com os professores são
mais propensos a serem aceitos pelos colegas do que os estudantes agressivos
que não têm relações positivas com seus professores (HUGHES; CAVELL;
WILSON, 2001). Em última análise, as relações construtivas professor-aluno têm
uma influência positiva importante nas habilidades sociais, tanto de alunos com
comportamentos disruptivos quanto de alunos com comportamentos típicos. Tais
descobertas sugerem que o aprimoramento das relações professor-aluno tem
efeitos benéficos e cumulativos para outros aspectos da vida em sala de aula.

Todavia, melhorar o relacionamento professor-aluno é apenas o primeiro passo


para atender às necessidades emocionais e relacionais dos alunos. Um professor
também deve trabalhar na produção de uma comunidade atenciosa de alunos. Tais
esforços melhoram a natureza das interações entre os estudantes e promovem o
engajamento dos estudantes na escola, permitindo uma aprendizagem dialógica e
a produção de conhecimentos significativos (HAMRE; PIANTA, 2005)

11 Estressores na Relação
Professor-Aluno
As relações professor-aluno são importantes em todos os níveis de ensino.
Sentir uma conexão e um senso de parentesco com um professor representa
uma necessidade essencial de todas as crianças e adolescentes (GREGORY;
RIPSKI, 2008). No entanto, vale a pena notar que a natureza das relações
positivas professor-aluno muda dependendo da idade do aluno envolvido. Em
outras palavras, os comportamentos precisos que podem ser percebidos por uma
criança nas séries iniciais, como o carinho e o cuidado (por exemplo, um sorriso
amoroso, um abraço), em contraste, podem ser percebidos pelos adolescentes
como invasivos ou exagerados. Também é importante perceber que, nos primeiros
anos de escola, a percepção dos alunos sobre sua relação com os professores,
e a percepção dos professores desses mesmos relacionamentos, é bastante
semelhante. À medida que as crianças crescem e se desenvolvem, a lacuna entre
suas percepções dos professores e a dos professores sobre elas cresce e se
amplia (MCCOMBS; MILLER, 2006).

Por isso, é importante para o professor compreender estas mudanças


desenvolvimentais e suas implicações na evolução do relacionamento, que
é sempre dinâmico. Os estudantes, por exemplo, experimentam estressores

88
Capítulo 3 A Relação Professor-Aluno na
Produção do Conhecimento

à medida que crescem e se desenvolvem. Se os relacionamentos conseguem


manter-se positivos e saudáveis, ​​podem ajudar os alunos nas transições de
desenvolvimento que eles experimentam.

Os relacionamentos positivos entre professor e aluno podem


Os relacionamentos
compensar alguns dos estressores normais que os alunos positivos entre
experimentam à medida que crescem e se desenvolvem. A transição professor e aluno
para o Ensino Médio, por exemplo, pode ser um momento estressante podem compensar
para as crianças; os alunos do Ensino Fundamental geralmente alguns dos
apresentam declínios na motivação, na autoestima, no desempenho estressores normais.
acadêmico e, portanto, na produção de conhecimentos significativos
(FELDLAUFER et al., 1988).

Reddy, Rhodes e Mulhall (2003) observaram que alunos que percebem


maior apoio de seus professores experimentam menos depressão e têm mais
crescimento na autoestima entre o sexto e o oitavo ano. Uma outra pesquisa
apontou que os alunos que percebem seus professores como respeitosos,
ansiosos para apoiar sua autonomia, focados em estabelecer expectativas
realistas e individualizadas para o desempenho, e oferecer feedback estimulante
e construtivo, são mais motivados na escola e, consequentemente, alcançam
maior êxito acadêmico (WENTZEL, 1997). Mais especificamente, se um aluno
acredita que “meu professor confia em mim” ou “meu professor me chama para
dar a resposta”, ele ou ela está mais propenso a se interessar pelas aulas,
mais propenso a se adequar às normas sociais positivas da sala de aula, e
mais disposto para dominar o material acadêmico sendo ensinado, produzindo
conhecimentos escolares sólidos.

Como outros profissionais em papéis exigentes, os professores podem


experimentar esgotamento e o aumento do estresse ou burnout. Professores com
exaustão física e emocional se esforçam para manter um forte relacionamento
com os alunos (JENNINGS; GREENBERG, 2009). Os professores, em sua prática
educativa, estão desenvolvendo pessoas e sua saúde psicológica é crucial para seu
sucesso na sala de aula, especialmente sua capacidade de criar relacionamentos
de alta qualidade com os alunos (RIMM-KAUFMAN; HAMRE, 2010). Por isso, os
docentes precisam ter tempo para cuidar de si mesmos e receber apoio de outras
pessoas para melhorar sua capacidade de trabalhar com os alunos.

89
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NO AMBIENTE ESCOLAR

Burnout é a resposta a um estado prolongado de estresse, ocorre


pela cronificação deste, quando os métodos de enfrentamento falharam
ou foram insuficientes. Está relacionado com o mundo do trabalho. Pode
levar à Síndrome de Burnout, que é caracterizada como um conjunto de
sintomas, incluindo um estado de exaustão, despersonalização, fadiga
física e mental, falta de entusiasmo pelo trabalho e pela vida, sentimento
de impotência e inutilidade e baixa autoestima.

FONTE: BENEVIDES-PEREIRA, Ana Maria T. (Org). Burnout:


quando o trabalho ameaça o bem-estar do trabalhador.
São Paulo: Casa do Psicólogo, 2002.

Durante os tempos difíceis, uma importante fonte de apoio para os


professores deve ser encontrada na comunidade adulta dentro da escola (BRYK
et al., 2010). O aumento da colaboração e da comunicação entre professores e
outros profissionais da educação pode fornecer o apoio social necessário para
reduzir os sentimentos de estresse e renovar a energia dos professores. Os
professores que se sentem positivos em relação à sua própria capacidade de
lidar com situações desafiadoras e de formar relacionamentos próximos com os
outros têm maior probabilidade de fornecer ambientes de melhor qualidade que
aprimorem os resultados acadêmicos de seus alunos e assim, juntos, produzam
conhecimentos sólidos e significativos.

Atividades de Estudos:

1) A relação professor-aluno é fundamental no processo de


aprendizagem e no desenvolvimento das habilidades sociais. Nesse
contexto, analise as afirmativas e assinale a alternativa correta:

I. Se um professor das séries iniciais, no primeiro ano, tiver um


relacionamento conflituoso com um aluno, é provável que os
professores do segundo ou terceiro ano também experimentem
conflitos em sua relação com a mesma criança.
II. Se um professor das séries iniciais, no primeiro ano, tiver um
relacionamento conflituoso com um aluno, nos próximos anos

90
Capítulo 3 A Relação Professor-Aluno na
Produção do Conhecimento

dificilmente os demais professores terão também.


III. Uma estratégia efetiva ocorre quando o docente utiliza um método
de ensino que complementa o estilo de aprendizagem dos alunos
e os motiva, por exemplo, a fazer perguntas e engajar-se na
produção de conhecimento em uma interação dialógica.

Agora assinale a alternativa correta:

a) As alternativas I e II estão corretas.


b) Somente a alternativa II está correta.
c) As alternativas I e III estão corretas.
d) Somente a alternativa I está correta.

2) Na primeira escola de pensamento, encontramos teorias


psicológicas que veem a aprendizagem como algo que resulta e
depende de modelos “adequados” e “avançados” de pensamento
e comportamento, modelos incorporados na figura do professor
ou especialista. Quais tendências decorrem desta perspectiva?
Assinale V para verdadeiro e F para falso nas sentenças que
seguem:

( ) A programação da exposição, relacionamentos, materiais e


interações desencoraja alternativas de trabalho em grupo ou
de interação entre pares em sala de aula, exceto na forma de
tutoria.
( ) Nas interações entre pares, o aluno mais avançado serviria
como um parâmetro para o menos avançado, e assim seria
uma fonte para o outro aprender.
( ) Supõe-se que os mais capazes nunca se beneficiarão desse
tipo de interação, mas de fato correrão o risco de regredir.
( ) O conhecimento neste contexto, entendido como originário de
uma única fonte estável e autorizada, passa pelo escrutínio do
professor, um agente estável de autoridade.

Agora assinale a opção correta:

a) V, V, F, V.
b) F, V, F, F.
c) V, V, V, V.
d) F, F, F, V.

91
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NO AMBIENTE ESCOLAR

12 Algumas Considerações
Neste capítulo pudemos contextualizar como distintas abordagens
educacionais percebem a produção do conhecimento. Discorremos sobre as
contribuições das teorias construtivistas e a sua transição em direção a uma nova
teoria, àquela da aprendizagem dialógica.

Vimos que na abordagem dialógica da aprendizagem, o conhecimento


é produzido através das relações, ele é relacional em sua essência. Esse
novo contexto dialógico de produção do conhecimento abriu o caminho para
explorarmos as implicações diretas da relação professor-aluno no desempenho e
êxito acadêmico e delinearmos a centralidade desta relação para a produção de
um conhecimento significativo.

Referências
ALLEN, J. et al. Observations of effective teacher-student interactions in secondary
classrooms: predicting student achievement with the Classroom Assessment Scoring
System – Secondary. School Psychology Review, v. 42, n. 1, p. 76-98, 2013.

ALVES, A. C. S et al. Faz-de-conta e teoria da mente. Psicologia em estudo.


Maringá, v. 12, n. 2, p. 325-334, 2007.

APPLE, M. W.; BEANE, J. (Eds.) Democratic schools: lesson in powerful


education. 2. ed. Portsmouth, NH: Heinemann, 2007.

AUBERT, A. et al. Aprendizaje dialógico en la sociedad de la información.


Barcelona: Hipatia, 2008.

AUSUBEL, D. P. Educational psychology: a cognitive view. New York: Holt,


Rinehart and Winston, 1968.

AUSUBEL, D. P.; NOVAK, J. D.; HANESIAN, H. Psicologia educacional. Rio de


Janeiro: Interamericana, 1980.

BANDURA, A.; AZZI, R. G.; POLYDORO, S. Teoria social cognitiva: conceitos


básicos. Porto Alegre: Artmed, 2008.

BATTISTICH, V.; SCHAPS, E.; WILSON, N. Effects of an elementary school


intervention on students’ “connectedness” to school and social adjustment during
middle school. The Journal of Primary Prevention, v. 24, n. 3, p. 243-262, 2004.

92
Capítulo 3 A Relação Professor-Aluno na
Produção do Conhecimento

BERRY, D.; O’CONNOR, E. Behavioral risk, teacher-child relationships, and social


skill development across middle childhood: a child-by-environment analysis of
change. Journal of Applied Developmental Psychology, v. 31, n. 1, p. 1-14, 2009.

BIRCH, S. H.; LADD, G. W. Children’s interpersonal behaviors and the teacher-


child relationship. Developmental Psychology, v. 34, n. 5, p. 934-946, 1998.

______. The teacher-child relationship and early school adjustment. Journal of


School Psychology, v. 55, n. 1, p. 61-79, 1997.

BORMAN, G.; OVERMAN, L. Academic resilience in mathematics among poor and


minority students. Elementary School Journal, v. 104, n. 3, p. 177-195, 2004.

BOWLBY, J. Apego e perda: apego. Trad. de A. Cabral. 2. ed. São Paulo:


Martins Fontes, 1990. V. 1.

BRUNER, J. A cultura da educação. Porto Alegre: Artmed, 2001.

BRYK, A. S. et al. Organizing schools for Improvement: lessons from Chicago.


Chicago, IL: The University of Chicago Press, 2010.

CASTELLS, M. A sociedade em rede. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1999. v. 1.

COLE, M.; SCRIBNER, S. Culture and thought: a psychological introduction.


New York: John Wiley, 1974.

CORREIA, M. F. B. A constituição social da mente. Estudos de Psicologia, v. 8,


n. 3, p. 505-513, 2003.

DANIELS, D. H.; PERRY, K. E. “Learner-centered” according to children. Theory


Into Practice, v. 42, n. 2, p. 102-108, 2003.

DECKER, D. M.; DONA, D. P.; CHRISTENSON, S. L. Behaviorally at-risk African


American students: the importance of student-teacher relationships for student
outcomes. Journal of School Psychology, v. 45, n. 1, p. 83-109, 2007.

DONOHUE, K. M.; PERRY, K. E.; WEINSTEIN, R. S. Teachers’ classroom


practices and children’s rejection by their peers. Applied Developmental
Psychology, v. 24, p. 91-118, 2003.

FELDLAUFER, H. et al. Student, teacher, and observer perceptions of the


classroom environment before and after the transition to junior high school.
Journal of Early Adolescence, v. 8, n. 2, p. 133-156, 1988.

93
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NO AMBIENTE ESCOLAR

FERREIRO, E. Com todas as letras. São Paulo: Cortez, 2001.

FLAVELL, J. H. A psicologia do desenvolvimento de Jean Piaget. São Paulo:


Livraria Pioneira Editora, 1988.

FLECHA, R. Sharing words. Lanham, M. D: Rowman & Littlefield, 2000.

FLECHA, R.; GÓMEZ, J.; PUIGVERT, L. Contemporary sociological theory.


New York: Peter Lang, 2003.

FREIRE, P. Pedagogia da esperança: um reencontro com a pedagogia do


oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2003.

______. A pedagogia da indignação: carta pedagógica e outros escritos. São


Paulo: UNESP, 2000.

______. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. 25.


ed. São Paulo: Paz e Terra, 1996.

______. Pedagogia do oprimido. 17. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987.

GREGORY, A.; RIPSKI, M. Adolescent trust in teachers: Implications for behavior


in the high school classroom, School Psychology Review, v. 37, n. 3, p. 337-
353, 2008.

HABERMAS, J. The theory of communicative action: lifeworld and system: A


critique of functionalist reason. Boston: Beacon Press, 1987. v. 2.

HAMRE, B. K.; PIANTA, R. C. Can instructional and emotional support in the first-
grade classroom make a difference for children at risk of school failure? Child
Development, v. 76, n. 5, p. 949-967, 2005.

______. Early teacher-child relationships and the trajectory of children’s school


outcomes through eighth grade. Child Development, v. 72, p. 625-638, 2001.

HANISH, L. D. et al. Bullying among young children: the influence of peers and
teachers. In: ESPELAGE, D. L.; SWEARER, S. M. (Eds). Bullying in American
schools: a social-ecological perspective on prevention and intervention. Mahwah,
New Jersey: Lawrence Erlbaum Associates, 2004. p. 141-150.

HARTER, S. The construction of the self: developmental and sociocultural


foundations. 2. ed. New York: Guilford Press, 2012.

94
Capítulo 3 A Relação Professor-Aluno na
Produção do Conhecimento

HENRICCSON, L.; RYDELL, A. Elementary school children with behavior


problems: teacher-child relations and self-perception. Merrill-Palmer Quarterly,
v. 50, n. 2, p. 111-138, 2004.

HUGHES, J. N.; CAVELL, T. A.; WILSON, V. Further support for the


developmental significance of the quality of the teacher-student relationship.
Journal of School Psychology, v. 39, n. 4, p. 289-301, 2001.

HUGHES, J.; KWOK, O. Influence of student-teacher and parent-teacher


relationships on lower achieving readers’ engagement and achievement in the
primary grades. Journal of Educational Psychology, v. 99, n. 1, p. 39-51, 2007

JENNINGS, P. A.; GREENBERG, M. T. The prosocial classroom: teacher social


and emotional competence in relation to student and classroom outcomes.
Review of Educational Research, v. 79, n. 1, p. 491-525, 2009.

JONES, S. M.; BOUFFARD, S. M.; WEISSBOURD, R. Educators’ social and


emotional skills vita to learning. Phi Delta Kappan, v. 94, p. 62-65, 2013.

KESNER, J. E. Teacher characteristics and the quality of child-teacher


relationships. Journal of School Psychology, v. 28, n. 2, p. 135-149, 2000.

LAWRENCE, J.; VALSINER, J. Making personal sense: an account of basic


internalisation and externalisation processes. Theory & Psychology, v. 13, n.6,
p. 723-752, 2003.

LIMA, E. O conhecimento psicológico e suas relações com a educação. Em


Aberto, v. 9, n. 48, p. 2-24, 1990.

LISONBEE, J. et al. Children’s cortisol and the quality of teacher-child


relationships in child care, Child Development, v. 79, n. 6, p. 1818-1832, 2008.

LIEW, J.; CHEN, Q.; HUGHES, J. N. Child effortful control, teacher-student


relationships, and achievement in academically at-risk children: additive and
interactive effects. Early Childhood Research Quarterly, v. 25, p. 51-64, 2010.

MANTZICOPOULOS, P. Conflictual relationships between kindergarten children


and their teachers: associations with child and classroom context variables.
Journal of School Psychology, v. 43, n. 5, p. 425-442, 2005.

MCCOMBS, B. L. The role of the self-system in self-regulated learning.


Contemporary Educational Psychology, v. 11, p. 314-332, 1986.

95
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NO AMBIENTE ESCOLAR

MCCOMBS, B. L.; MILLER, L. The journey to learner-centered practices: a


series for teachers and administrators. Thousand Oaks, CA: Corwin Press, 2006.

MCCORMICK, M. P.; O’CONNOR, E. E. Teacher-child relationship quality and


academic achievement in elementary school: does gender matter? Journal of
Educational Psychology, v. 107, n. 2, 2014.

MULLER, N.; PERRET-CLERMONT, A.-N. Negotiating identities and meanings


in the transmission of knowledge: analysis of interactions in the context of
a knowledge exchange network. In: BLISS, J.; SÄLJÖ, R.; LIGHT, P. (Eds).
Learning sites, social and technological resources for learning. Earli:
Pergamon. 1999. p. 47-60

MURRAY, C.; GREENBERG, M. T. Relationships with teachers and bonds with


school: social and emotional adjustment correlates for children with and without
disabilities. Psychology in the Schools, v. 38, n. 1, p. 25-41, 2001.

MURRAY. C.; MALMGREN, K. Implementing a teacher-student relationship


program in a high-poverty urban school: effects on social, emotional and
academic adjustment and lessons learned. Journal of School Psychology, v.
43, n. 2, p. 137-152, 2005.

OAKES, J. Keeping tracking: How schools structure inequality. New Haven: Yale
University Press, 1985.

O’CONNOR, E. et al. Behavior problems in late childhood: the roles of early


maternal attachment and teacher-child relationship trajectories. Attachment &
Human Development, v. 14, n. 3, 265-288, 2012.

O’CONNOR E.; MCCARTNEY, K. Examining teacher-child relationships


and achievement as part of the ecological model of development. American
Educational Research Journal, v. 44, n. 2, p. 340-369. 2007.

PIAGET, J. Seis estudos de psicologia. Rio de Janeiro: Forense-Universitária,


1987.

______. Nécessité et signification des recherches comparatives en psychologie


génétique. International Journal of Psychology, v. 1, p. 3-13, 1966.

PIANTA, R. C.; STUHLMAN, M. W. Teacher-child relationships and children’s


success in the first years of school. School Psychology Review, v. 33, n. 3, p.
444-458, 2004.

96
Capítulo 3 A Relação Professor-Aluno na
Produção do Conhecimento

PONTECORVO, C. Thinking with others: the social dimensions of learning


in families and schools. In: PERRET-CLERMONT, A.-N. et al. (Ed.). Joining
society: social interactions and learning in adolescence and youth. Cambridge:
Cambridge University Press, 2004. p. 227-240

RACIONERO, S.; PADRÓS, M. The dialogic turn in educational psychology.


Revista de Psicodidáctica, v. 15, n. 2, p. 143-162, 2010.

REDDY, R.; RHODES, J.; MULHALL, P. The influence of teacher support on


student adjustment in the middle school years: A latent growth curve study.
Development and Psychopathology, 15, 119–138, 2003.

RIMM-KAUFMAN, S. E., et al. To what extent do teacher-student interaction


quality and student gender contribute to fifth graders’ engagement in mathematics
learning? Journal of Educational Psychology, v. 107, n. 1, p. 170-185, 2015.

______. The contribution of children’s self-regulation and classroom quality to


children’s adaptive behaviors in the kindergarten classroom. Developmental
Psychology, v. 45, n. 4, p. 958-972, 2009.

RIMM-KAUFMAN, S. E.; HAMRE, B. The role of psychological and developmental


science in efforts to improve teacher quality. Teacher College Record, v. 112, n.
12, p. 2988-3023, 2010.

ROGOFF, B. The cultural nature of human development. New York: Oxford


University Press, 2003.

______. Apprenticeship in thinking. New York: Oxford, 1990.

ROSENTHAL, T. L.; ZIMMERMAN, B. J. Modeling by exemplification and


investigation in training conservation. Development Psychology, v. 6, n. 3, p.
392-401, 1972.

RUDASILL, K. M. et al. A longitudinal study of student-teacher relationship quality,


difficult temperament, and risky behavior from childhood to early adolescence.
Journal of School Psychology, v. 48, n. 5, p. 389-412, 2010.

SCRIBNER, S.; COLE, M. The psychology of literacy. Cambridge, MA: Harvard


University Press, 1981

VALSINER, J. Culture and human development. London: Sage, 2000.

97
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NO AMBIENTE ESCOLAR

VYGOTSKY, L. S. Teoria e método em psicologia. São Paulo: Martins Fontes, 1996.

VYGOTSKY L. S.; LURIA, A. R.; LEONTIEV, A. N. Linguagem,


desenvolvimento e aprendizagem. São Paulo: Editora da Universidade de São
Paulo, 1988.

WHITLOCK, J. L. Youth perceptions of life at school: Contextual correlates of


school connectedness in adolescence. Applied Developmental Science, v. 10,
n. 1, p. 13-29, 2006.

ZITTOUN, T.; MIRZA, N. M.; PERRET-CLERMONT, A. Quando a cultura é


considerada nas pesquisas em psicologia do desenvolvimento. Educar, Curitiba,
v. 30, p. 65-76, 2007.

WENTZEL, K. Student motivation in middle school: the role of perceived


pedagogical caring. Journal of Educational Psychology, v. 89, p. 411-419, 1997.

98
C APÍTULO 4
Contextos Atuais e Desafios Sobre
o Conhecimento na Escola

A partir da concepção do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes


objetivos de aprendizagem:

� Compreender as mudanças atuais no contexto social e escolar e suas


implicações para a produção de conhecimento.

� Descrever os modos de produção de conhecimento e sua relação com a


disciplinaridade e interdisciplinaridade.

� Identificar os principais desafios das mudanças atuais na produção de


conhecimento para o currículo escolar.

� Conhecer os debates atuais sobre o retorno da centralidade do conhecimento


como conteúdo nas instituições de ensino.
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NO AMBIENTE ESCOLAR

100
Capítulo 4 Contextos Atuais e Desafios Sobre
o Conhecimento na Escola

1 Contextualização
Vivemos em um momento de questionamento e reforma em relação ao currículo
e à ampla missão das escolas, universidades e outras instituições de ensino e, em
particular, em relação ao papel destas instituições como mediadoras do processo de
ensino e aprendizagem e construtoras de novos conhecimentos. Este capítulo analisa
algumas ideias e pesquisas que enquadram a “questão do conhecimento” para
escolas e universidades hoje. Começamos com um breve tópico sobre o contexto
em mudança que impacta nessa questão e, em seguida, analisamos várias linhas de
argumentação que abordam o papel de disciplinas escolares.

O conhecimento em si é um termo ambíguo que atravessa esses debates.


Escolas e universidades estão preocupadas com, pelo menos, três maneiras
diferentes de abordar o conhecimento em seus programas e propósitos. A primeira
relaciona-se ao objeto de estudo que constitui o currículo dessas instituições. Nela,
as decisões são tomadas embasadas no que deve ser conhecido ou aprendido,
sobre o que é delimitado como relevante no mundo. Isso inclui decisões sobre
qual gama de estudos é exigida, bem como sobre o peso relativo a ser dado ao
“saber-como” e ao “saber-que” ou variantes desses saberes.

Uma segunda preocupação é sobre as características particulares que


distinguem o conhecimento da “mera” crença ou “habilidade inata” e similares, o
sentido em que o conhecimento é visto como um tipo especial de aprendizagem
ou reivindicação cognitiva com poder especial. Esta preocupação representa
a aspiração das instituições de disponibilizar aos alunos algo mais poderoso,
confiável, verdadeiro e valioso do que teriam de outra forma. Aqui as instituições de
ensino devem abordar a estrutura ou a forma associada aos modos de conhecer
que são mais poderosos, incisivos, confiáveis ​​ou conceitualmente astutos.

A terceira questão seria a forma com que as escolas e universidades lidam


com o conhecimento, como elas levam em conta as práticas sociais associadas
ao conhecimento no sentido que acabamos de mencionar. Aqui podemos incluir a
atenção dada a como disciplinas ou campos de conhecimento operam, ou a como
o conhecimento é utilizado no local de trabalho, ou o reconhecimento da maneira
pela qual o conhecimento está ligado ao poder e ao capital. Estas questões
também estão subjacentes e são implicitamente tratadas pelas formas e reformas
das escolas e universidades. E cada um desses enfoques sobre o conhecimento
tem sido objeto de considerável debate no final do século XX e na atualidade.

Até certo ponto, é evidente que as escolas e universidades estão localizadas


de maneira diferente em relação ao conhecimento, mas ambas têm enfrentado
versões de algumas questões semelhantes que serão analisadas neste capítulo.

101
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NO AMBIENTE ESCOLAR

2 O Contexto em Mudança
Embora os sistemas de ensino básico e universitário em países como o
Brasil tenham, por muito tempo, uma história em que se busca inspiração de
outros países (particularmente dos Estados Unidos da América, da Alemanha e da
França) sobre suas instituições de ensino, a partir do final do século XX, começou-
se a assumir uma nova forma. Preocupações sobre o desemprego e o bem-estar
econômico nacional tornaram-se enquadradas em um contexto de competição
global e dentro de uma perspectiva em que recursos, incluindo recursos humanos,
foram avaliados global e comparativamente. Ao mesmo tempo, os
Os economistas economistas começaram a enfatizar o papel da educação como um
começaram a
fator central na força econômica (SHARMA, 2004). Assim como um
enfatizar o papel da
educação como um crescente corpo de influentes medidas supranacionais, através da
fator central na força Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico
econômica. (OCDE), do Banco Mundial e das classificações (ranking) internacionais
dos sistemas de ensino em todos os níveis, ofereceu algumas novas
lentes padronizadas de alto perfil sobre o que os sistemas educacionais, tanto o
ensino básico quanto o superior, estavam atingindo.

O impacto dessa lente econômica comparativa global tem sido amplamente


sentido no rápido crescimento e nas aspirações de sistemas de ensino em vários
países do globo. No Brasil, por exemplo, a expansão e democratização da rede de
ensino básica se depara com as mudanças provocadas pela reforma do Ensino
Médio, que visam explicitamente atender às demandas políticas e econômicas
(ROSA; LOPES; CARBELLO, 2015; PASCHOETO; LEITE, 2018). Além disso,
há uma expansão acelerada do setor de Ensino Superior privado em território
nacional, com uma forte presença de financiamento internacional de vários
setores (FRANCA, 2017). Diante disso, vemos fenômenos similares na China
e outros países asiáticos em desenvolvimento. Fenômenos estes que fazem
ressurgir debates públicos sobre padrões e qualidade nas redes de ensino, como
vemos acontecendo nos EUA, na Europa e na maioria das regiões do mundo
(HOPMANN, 2013; YATES; GRUMET, 2011).

Esse posicionamento do conhecimento como um recurso econômico


comparativo sustenta, por um lado, uma atenção constante a processos de
benchmarking (processo de comparação de produtos, serviços e práticas em
busca das melhores que conduzam ao desempenho superior), testes, métricas
de pesquisa e afins; e, por outro, uma preocupação constante sobre que tipos
de conhecimento são economicamente potentes e devem ser priorizados nas
escolas e universidades – por exemplo, capacidade empreendedora, idiomas
e capacidade de trabalhar em equipe. O foco na educação e no conhecimento
como um bem competitivo econômico tem sido acompanhado por expectativas de

102
Capítulo 4 Contextos Atuais e Desafios Sobre
o Conhecimento na Escola

uma educação mais extensa, onde os países mais desenvolvidos agora esperam
ter a conclusão escolar como norma, em vez de apenas para uma minoria, e
a graduação se torna uma busca mais massiva do que em tempos anteriores.
Associado a isso, o papel e a função do Ensino Médio e do Ensino Superior têm
sofrido consideráveis reformulações, em termos de duração, de função genérica
ou de preparação vocacional, e sua relação com o ensino de pós-graduação.

3 Mudança Tecnológica
As discussões sobre conhecimento e educação no final do século XX e
início do século XXI são marcadas pela necessidade de envolver-se com um
mundo material em rápida mudança e capacidades tecnológicas dramaticamente
modificadas (COPE; KALANTZIS, 2009; SUGRUE, 2008). Comparado
com um mundo onde o conhecimento era principalmente comutado em O poder, a
papel ou em reuniões face a face, o poder, a velocidade e as formas velocidade e as
formas de novas
de novas tecnologias impõem desafios à educação em todos os níveis,
tecnologias impõem
especialmente em relação ao que é agora fundamental. Por exemplo, desafios à educação
o poder dos computadores para trabalhar com uma enorme quantidade em todos os níveis.
de dados e a forma distribuída de parte desse trabalho globalmente
colocam questões sobre as direções de influência entre teoria e cálculo, que têm
ramificações para o currículo de ciências da escola de ensino básico, assim como
no currículo e treinamento em pesquisa na graduação. As mudanças levantam
questões sobre a localidade do conhecimento e sobre os vários agentes do
conhecimento (humanos e não humanos). Em relação ao estudo de história, por
exemplo, a disponibilidade de novos tipos de capacidades de busca, novos tipos
de arquivos on-line, capacidade de pesquisar e trabalhar com textos visuais e
registros orais e similares também é potencialmente transformadora, em termos
do que os alunos podem precisar aprender ou ser capazes de fazer.

Um outro grande impacto da internet e das novas capacidades de


busca e comunicação tem sido levantar questões sobre o papel (ou mesmo a
existência continuada) de escolas e universidades tradicionais em comparação à
aprendizagem informal, novos empreendimentos comerciais e novas entidades,
como MOOCs (Massive Open Online Courses) e outras formas de aprendizagem
on-line (GRIFFIN et al., 2012; GÓMEZ, 2015).

103
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NO AMBIENTE ESCOLAR

4 Movimentos Sociais e a Política


do Conhecimento
Os currículos das escolas e universidades nunca reproduzem
A partir de meados
do século XX, a simplesmente um dado ou uma dedução do seu cenário nacional e
política do que conta histórico. Eles sempre representam algumas escolhas, propósitos e
como conhecimento interesses deliberados, e tradicionalmente, especialmente no caso do
tem sido objeto de Ensino Superior, refletem alguma orientação aos interesses e papéis
contestações. sociais das elites, mas a partir de meados do século XX, a política do
que conta como conhecimento tem sido objeto de contestações muito
mais vigorosas.

Os movimentos sociais preocupados com gênero e raça direcionaram sua


atenção ao conteúdo e à linguagem do currículo como fontes de discriminação.
Eles argumentaram e ganharam apoio considerável para a compreensão de que
o que estava sendo transmitido como conhecimento era, na verdade, ideológico
e ele mesmo contribuía para a contínua marginalização e desvantagem das
mulheres e dos grupos não favorecidos. O ataque à política do conhecimento nas
escolas e universidades e sua relação com o poder também ficaram evidentes
em ataques mais amplos, por exemplo, nos escritos de Paulo Freire, Ivan Illich e
outros em relação às escolas; e também nas manifestações dos estudantes em
maio de 1968, em relação ao Ensino Superior.

Mais tarde, quando a política mundial mudou da configuração da guerra fria


para novos tipos de conflitos, uma série de escritos identificou e criticou suposições
que foram consideradas como subjacentes ao conhecimento moderno ocidental e
iluminista. Estas críticas levantaram questões sobre sistemas de conhecimento
seculares e não seculares e os modos como os sistemas de conhecimento no
Ocidente foram orientados para o interesse das grandes potências do “norte
global” (CONNELL, 2007; SAID, 1979).

5 Internacionalização e Fluxos de
População Globais
No século XXI, um tema importante para o currículo dos sistemas de
ensino básico e superior tem sido a globalização, incluindo os fluxos globais
e os movimentos das populações para migração e busca de emprego, e as
oportunidades e medos associados a isso. Em sistemas educacionais como o do
Brasil, já podemos perceber a preocupação com a necessidade de se orientar para

104
Capítulo 4 Contextos Atuais e Desafios Sobre
o Conhecimento na Escola

um mundo do século XXI onde os estudantes viajarão, interagirão e trabalharão


com pessoas de outras partes do mundo (GADOTTI, 2007; COSTA, 2004). Esta
realidade é vista em várias partes do mundo (PETERS, 2010; RIZVI, 2011).

Arjun Appadurai (2004) introduziu a imagem dos fluxos


globais de ideias, práticas, instituições e pessoas que interagem
com as populações locais. O autor utiliza termos próprios, como
etnopaisagem, mediapaisagem, financiopaisagem, ideopaisagem e
tecnopaisagem.

Em grandes centros universitários, nos mais diversos países, Podemos


podemos perceber uma competição global por estudantes internacionais perceber uma
como fonte de sua viabilidade financeira, mas também por talentos para competição global
construir sua capacidade de pesquisa. Internacionalmente, há também por estudantes
uma crescente conscientização do crescente significado econômico de internacionais
como fonte de
países em desenvolvimento e com potencial econômico para o século XXI.
sua viabilidade
E tudo isso traz novas ênfases ao trabalho de conhecimento das escolas e financeira.
universidades. Um dos problemas a ser focado no currículo escolar é como
este deve se basear e trabalhar com a diversidade de tradições, origens linguísticas e
conhecimento que os alunos trazem. E a questão de que tipo de pessoa e de escola
cidadã deve ter como objetivo formar – como alcançar a integração social com uma
população diversificada – adquiriu maior visibilidade.

As universidades anunciam suas preocupações para se internacionalizarem,


mas o que isso significa em termos de experiência para os alunos e para o
currículo em si não está claro. O que significa, por exemplo, “internacionalizar” o
currículo em ciências? Isso é um conceito significativo?

Este tópico quase não tocou a superfície de algumas mudanças importantes


que atravessam os debates e fazem parte dos desenvolvimentos que agora
ocorrem neste contexto. Vamos a um debate que estimulou e encapsulou uma
boa parte do pensamento sobre a finalidade da “criação do conhecimento” no
trabalho das instituições de ensino no contexto do século XXI, e continuaremos
com um tópico que aborda algumas formas em que esse contexto em mudança
tem sido abordado na pesquisa, na política e nas reformas do currículo escolar.

105
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NO AMBIENTE ESCOLAR

6 Modos 1 e 2 da Produção do
Conhecimento

Em 1994, um grupo de observadores sociológicos das mudanças da cena


da produção de conhecimento publicou um livro intitulado The New Production of
Knowledge: the dynamics of science and research in contemporary societies (A nova
produção de conhecimento: a dinâmica da ciência e da pesquisa nas sociedades
contemporâneas) (GIBBONS et al., 1994). Este livro cunhou uma distinção amplamente
discutida e influente entre a produção de conhecimento do “modo 1” e do “modo 2”.

O “Modo 1” é um
O “Modo 1” é um termo aplicado ao que é considerado a forma
termo aplicado ao
que é considerado mais tradicional de construção de conhecimento e pesquisa dentro das
a forma mais universidades. É hierárquico, especializado e opera em uma amplitude
tradicional de considerável por ter uma forma limitada e autorreferencial. Busca
construção de refinamento e criação trabalhando no interior e construindo sobre o foco e
conhecimento os modos das linhas de pesquisa já estabelecidas (tal como as disciplinas).
e pesquisa.

A produção de conhecimento do “Modo 2” está associada ao tipo de inovação que


antes era mais característico na indústria e no governo: conhecimento desenvolvido
em “contextos de aplicação”, ou seja, as preocupações sociais e econômicas são
construídas desde o início e fazem parte dos critérios de avaliação do conhecimento.
O conhecimento aqui também é construído de forma colaborativa, muitas
Produções de
vezes reunindo sujeitos com diferentes tipos de treinamento e interesses.
conhecimento do
Modo 2 estavam se Gibbons et al. (1994) argumentaram que as produções de conhecimento
tornando muito mais do Modo 2 estavam se tornando muito mais proeminentes no final do
proeminentes no século XX, e cada vez mais o trabalho nas universidades, embora não em
final do século XX. todas, estava começando a assumir essa forma.

Hessels e Van Lente (2008) resumem os principais elementos que compreendem


as formas divergentes de produção de conhecimento, como podemos ver na Tabela 1.

TABELA 1 – ATRIBUTOS NA PRODUÇÃO DE CONHECIMENTO

Modo 1 Modo 2
Contexto acadêmico Contexto de aplicação
Disciplinaridade Transdisciplinaridade
Homogeneidade Heterogeneidade
Autonomia Reflexividade/Responsabilidade social
Controle de qualidade tradicional (peer Controles de qualidade originais
review)
FONTE: Adaptado de Hessels e Van Lente (2008, p. 741).

106
Capítulo 4 Contextos Atuais e Desafios Sobre
o Conhecimento na Escola

Os argumentos no livro original de 1994 foram desenvolvidos e refletidos


tanto por alguns dos autores originais quanto por muitos outros (NOWOTNY et
al., 2001; PEREIRA, 2007; MOURA, 2011). Nowotny et al. (2001) argumentaram
que está ocorrendo uma “desdiferenciação” – o enfraquecimento das fronteiras
entre ocupações e domínios de conhecimento – nas esferas sociais
A pesquisa de
(estado, mercado, cultura), com mudanças observáveis ​​nos modos
Modo 2
de operação das universidades e institutos de pesquisa do governo e (contextualizada)
conselhos de pesquisa. Eles argumentam que a pesquisa de Modo 2 produz
(contextualizada) produz conhecimento socialmente robusto e que essa conhecimento
forma de conhecimento agora fala de volta à ciência e é um referente socialmente robusto.
central das políticas de inovação do governo.

Em sua revisão de um grande corpo de literatura relacionada ao modo 1 e


modo 2 de produção de conhecimento, Hessels e Van Lente (2008) identificam
uma série de outras teorias e linhas de argumentação que anteciparam ou que se
sobrepõem ou são aliadas aos argumentos da “nova produção de conhecimento”.
Por exemplo, alguns falam de pesquisa estratégica, tripla hélice, capitalismo
acadêmico, sistemas de inovação e vários outros. Eles concluem
A a estrutura da
que a estrutura da nova produção de conhecimento não é única
nova produção
nem conceitualmente rígida, e que pesquisas mais empíricas sobre de conhecimento
mudanças reais são necessárias. Mas eles também reconhecem a não é única nem
saliência amplamente sentida dos desenvolvimentos reunidos nesses conceitualmente
novos modos de produção de conhecimento. rígida.

Grande parte da discussão em toda a literatura aceita a crescente visibilidade


de práticas associadas ao Modo 2 e sua relação mais próxima com contextos
de aplicação, preocupações sociais e econômicas e trabalho colaborativo que
cruza fronteiras universitárias e disciplinares (PEREIRA, 2007; MOURA, 2011). O
que está em questão é se essa distinção é inteiramente nova, pois sabemos que
alguns campos da ciência, engenharia e afins, sempre foram mais aplicados e
colaborativos em seus relacionamentos e agendas.

Outra questão levantada é se o Modo 2 da nova produção de conhecimento


possibilita uma mudança de equilíbrio relativo entre os dois modos (o Modo 1
e o Modo 2), com ambos continuando presentes no trabalho das instituições de
ensino. Se assim não for, poderíamos perceber o Modo 2 como parte de uma
tendência em que o que resta da inquirição disciplinar (Modo 1) estaria apenas
contido e circunscrito pelos mecanismos e critérios de avaliação do Modo 2
(WEINGART; PADBERG, 2014).

Uma questão adicional levantada na literatura é a extensão em que as


discussões de uma nova produção de conhecimento funcionam como uma
posição de normatividade ou de defesa ao gerar novas visões do que deveria

107
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NO AMBIENTE ESCOLAR

ser (para os políticos em particular), bem como as práticas políticas associadas e


instanciações políticas. Aqui, questões sobre o que está sendo ganho e perdido
em contextos de mudança da produção de conhecimento são importantes. Estes
são um ponto de discórdia em muitos escritos recentes sobre a mudança de
formas do Ensino Superior (BLACKMORE et al., 2010; KING et al., 2013; PETERS,
2007), bem como em argumentos sobre disciplinaridade, interdisciplinaridade e
transdisciplinaridade (SOBRAL, 2001).

7 Disciplinaridade e
Interdisciplinaridade
Anterior às discussões sobre a nova produção de conhecimento, e
continuando ao lado delas, está um corpo de literatura preocupado com
Interesse em
as dimensões social, epistêmica e histórica das disciplinas acadêmicas,
disciplinas,
diferenças na forma de estudos etnográficos (BECHER, 1989; KNORR-CETINA,
disciplinares e 1999) e estudos preocupados com as estruturas organizacionais, de
suas implicações construção de conhecimento e autoridade das universidades (ABBOTT,
para a formação 2001; KAGAN, 2009). Um interesse em disciplinas, diferenças
escolar acadêmica disciplinares e suas implicações para a formação escolar acadêmica
e de pesquisa tem
e de pesquisa tem recebido nova atenção através do despertar do
recebido nova
atenção. interesse do século XX e início do século XXI pela “interdisciplinaridade”
(FAZENDA; GODOY, 2014; KLEIN, 1996; TROWLER et al., 2012).

As “disciplinas” são tradições de investigação socialmente construídas que


se originaram no século XIX e que foram formalizadas dentro de estruturas de
sistemas de ensino, especialmente no Ensino Superior, e através de associações
de profissionais, revistas científicas, conferências e similares, e distinguidas
por conceitos, metodologias e às vezes por seus objetos de investigação. Eles
desempenham funções culturais e organizacionais, bem como propósitos
epistemológicos (LOPES; MACEDO, 2013; ABBOTT, 2001). Kagan (2009, p. 3)
observa que a maioria dos esforços intelectuais consiste em três componentes
que são diferenciados entre diferentes disciplinas:

(1) Um conjunto de premissas inquestionáveis ​​que criam


preferências por questões particulares e respostas igualmente
particulares, (2) uma coleção favorecida de ferramentas
analíticas para coletar evidências e (3) um conjunto preferido
de conceitos que são o núcleo de explicações.

Mas ele também argumenta que as disciplinas são realmente diferenciadas


umas das outras em termos de nove dimensões diferentes:

108
Capítulo 4 Contextos Atuais e Desafios Sobre
o Conhecimento na Escola

1. As principais questões colocadas, incluindo o grau em que


a previsão, explicação ou descrição de um fenômeno é o
principal produto da investigação
2. As fontes de evidências nas quais as inferências são
baseadas e o grau de controle sobre as condições nas quais
as evidências são coletadas
3. O vocabulário utilizado, [...] incluindo o grau em que
se presumia que uma relação funcional generalizava as
configurações ou era restrito ao contexto de observação
4. O grau em que as condições sociais, produzidas por eventos
históricos, influenciam as questões
5. O grau em que os valores éticos penetram nas perguntas
feitas e as conclusões inferidas ou deduzidas
6. O grau de dependência do apoio financeiro externo do
governo ou indústria
7. A probabilidade de o acadêmico trabalhar sozinho, com um
ou dois outros, ou como um membro de uma grande equipe
8. A contribuição para a economia nacional
9. Os critérios que os membros de cada grupo usam quando
julgam um corpo de trabalho elegante ou bonito (KAGAN,
2009, p. 2-3).

Essa lista representa critérios em termos de quais campos ou disciplinas


potencialmente ou frequentemente desenvolvem conhecimento de forma
diferente um do outro. Se eles são geridos institucionalmente de maneiras que
pressupõem critérios uniformes de desempenho ou normas organizacionais
(por exemplo, 2, 3, 4 e 7, na lista anteriormente citada, devem se parecer com a
ciência – ou pelo menos alguns campos da ciência), isso terá consequências para
os diferentes campos e este é um dos rumos da governança e da administração
nos últimos tempos.

Ao mesmo tempo, as disciplinas, embora sejam sempre estabilizadas por


suas funções científicas, educacionais, administrativas e profissionais plurais,
nunca são estruturalmente estáticas, mas sujeitas a processos de diferenciação
e desdiferenciação (STICHWEH, 1992). Um dos temas do presente período
é que este é um período em que os processos de diferenciação,
As disciplinas nunca
desdiferenciação e mudança para a interdisciplinaridade se aceleraram são estruturalmente
consideravelmente, mas não apenas os processos endógenos de estáticas, mas
diferenciação e desdiferenciação proliferaram e aceleraram, também sujeitas a processos
as pressões exógenas de mudança se tornaram cada vez mais de diferenciação e
complexas e poderosas. desdiferenciação.

Um outro ponto é que, na realidade, os limites entre as disciplinas costumam


ser confusos. O Relatório do Conselho Nacional de Pesquisa dos Estados Unidos
de 1986, por exemplo, observou que a interface entre física e química “tem sido
cruzada com tanta frequência que sua localização exata é obscura”, e ainda

109
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NO AMBIENTE ESCOLAR

observou que “o grau de interação direta colaborativa entre físicos e químicos nos
EUA, especialmente nas universidades, se manteve surpreendentemente limitado”
(KLEIN, 1996, p. 6). Tudo isso coloca desafios significativos para as autoridades
educacionais e para os órgãos de financiamento da pesquisa. Devem ser tomadas
decisões sobre quais fundamentos curriculares e formas organizacionais são
importantes como facilitadores do conhecimento e sobre os papéis apropriados das
disciplinas, comparados a outras perspectivas de enquadramento.

Uma questão para a prática e política de educação é entender a estrutura ou


forma em que o conhecimento é desenvolvido em diferentes campos. Tanto a literatura
internacional como as ações orientadas para a gestão reconhecem frequentemente
a necessidade de diferenciar as disciplinas “STEM” (ciência, tecnologia, engenharia
e matemática) das disciplinas “HASS” (humanidades e ciências sociais)
Diferenciação, muito
e estas, por sua vez, dos campos profissionais (preparação de médicos,
utilizada entre STEM
e HASS, também professores, contadores e afins). No entanto, essa diferenciação, muito
ignora as grandes utilizada entre STEM e HASS, também ignora as grandes diferenças
diferenças entre entre as disciplinas e subdisciplinas que estão dentro de ambos os
as disciplinas e agrupamentos (considere a matemática comparada à zoologia, por
subdisciplinas. exemplo; ou economia comparada à literatura).

Em termos de nosso foco neste capítulo, que são as questões educacionais


da produção de conhecimento, podemos encontrar na obra de Julie Thompson
Klein (1996) uma elucidativa discussão sobre uma série de diferenças significativas
em como os campos disciplinares têm operado. Estas incluem diferenças entre os
campos das ciências sociais que têm operado com uma busca de leis abrangentes
comparadas a aquelas que atentam mais para o simbólico e o interpretativo; e a
questão de até que ponto as disciplinas têm conceitos e metodologias distintos.
Klein (1996, p. 39) argumenta que “dois tipos de disciplinas, a aplicada e a
sinótica, estão associadas a uma permeabilidade tão alta que são frequentemente
descritas como ‘inerentemente interdisciplinares’”.

Podemos pensar, como exemplo, na disciplina de história, que seria


indiscutivelmente considerada sinótica e “inerentemente interdisciplinar”, pelo
menos em alguns elementos. No entanto, outras vozes na literatura sobre
disciplinas e interdisciplinaridade (ABBOTT, 2001; BECHER, 1989; KAGAN,
2009) argumentariam que mesmo disciplinas que são sinóticas criam identidades
e limites inerentes à forma como elas incorporam elementos interdisciplinares, e
em termos de como elas produzem conhecimento.

As perspectivas e tipologias sociológicas sobre as formas de conhecimento e


as mudanças nas disciplinas formam um pano de fundo para as discussões sobre
a produção de conhecimento nos sistemas de ensino no século XXI, e isto ocorre
de duas maneiras, como veremos a seguir.

110
Capítulo 4 Contextos Atuais e Desafios Sobre
o Conhecimento na Escola

Em primeiro lugar, este é um período de agitação e mudança na governança


das instituições de ensino de todos os níveis, especialmente das universidades,
e nas estruturas de financiamento associadas a elas. Se existem algumas
diferenças importantes nas formas de conhecimento promovidas através de
diferentes disciplinas – no que é necessário como estudo fundamental, ou em sua
forma de desenvolvimento durante o ciclo educacional, ou na forma de publicação
que melhor represente suas realizações –, isso é provável ser uma questão em
que as universidades passem a adotar avaliações de produtividade uniformes,
semelhantes a modelos, ou reformas curriculares abrangentes.

Em segundo lugar, por sua natureza, as tipologias são formas


As tipologias são
rudimentares de entender o que é importante em um campo. Por formas rudimentares
exemplo, poderíamos perguntar como professores e pesquisadores de entender o que
de campos disciplinares distintos veem seus campos hoje – em que é importante em um
sentido eles entendem isso como hierárquico ou horizontal, os tipos campo.
de coisas que eles veem como fundamentais, como eles pensam e
trabalham em um fluxo de nova especialização, diferenciação e desdiferenciação.

A literatura sociológica sobre disciplinas concentrou-se tanto no aspecto


social quanto no epistemológico e, na maioria dos casos, chamou a atenção tanto
para o que é produtivamente avançado pelas formas disciplinares de investigação
e relações sociais, como também reconheceu os elementos conservadores que
estão associados a estas formas (ABBOTT, 2002).

Uma questão importante que ficou evidente nos debates do Ensino Superior no
século XXI, sinalizada no tópico anterior sobre o conhecimento do “Modo 2”, tem sido
a extensão em que disciplinas, como história e física, por exemplo, devem manter seu
lugar como um importante fundamento e fluxo especificado de estudo. Os departamentos
tradicionais baseados em disciplinas são importantes, ou faz sentido transformá-los de
novas maneiras – por exemplo, como “ciência dos materiais” ou “nanotecnologia” – ou
enquadrá-los em termos de tópicos ou desafios sociais? (WEINGART; PADBERG, 2014).

Essas questões foram um foco de interesse em uma conferência sobre o


futuro da universidade realizada nos EUA no início deste século (BRINT, 2002).
Abbott (2002) argumentou, nesta conferência, que, apesar dos novos desafios e
interesses investidos nos departamentos disciplinares que formavam o coração
das universidades americanas, estes provavelmente persistiriam porque, além
de seus interesses pessoais em autoperpetuar, formam modos de administrar e
enfocar a investigação que permite que formas mais poderosas de compreensão
se desenvolvam. O autor argumentou também que as disciplinas proporcionam
um conhecimento “problema-portátil” em contraste com um currículo “problema-
focado”, cujo aprendizado seria de natureza mais aplicada a curto prazo, menos
profundo e menos duradouro em relação a novos problemas.

111
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NO AMBIENTE ESCOLAR

Todavia, mais ou menos uma década depois, muita coisa mudou nas
instituições de ensino, e principalmente nas universidades, em todo o mundo,
e mais mudanças parecem estar em andamento. Ressaltamos, portanto, a
necessidade de inquirir como os profissionais educadores e pesquisadores veem
a forma e o lugar de seus campos disciplinares. Seria importante que fossem
preservados em sua forma tradicional como algum tipo de suporte para novas
atividades colaborativas? As disciplinas estão mudando ou sendo forçadas a
mudar à medida que as instituições de ensino enfrentam um novo fluxo de alunos
e novos tipos de demandas sobre o que elas produzem para esses alunos?

8 O Currículo Escolar
Historicamente, tem havido considerável variação nacional e filosófica
Tem havido
considerável nas abordagens escolares ao conhecimento e aos propósitos da escola,
variação nacional incluindo experimentos com diferentes formas de pedagogias progressistas
e filosófica nas ou radicais ou comportamentalistas. No entanto, os debates sobre como
abordagens dar sentido a quais fundamentos importantes para os jovens de hoje
escolares ao ganharam nova vida nas últimas décadas, na esteira dos desdobramentos
conhecimento e aos
observados na primeira parte deste capítulo e diante de um apelo cada vez
propósitos da escola.
maior sobre o que as escolas deveriam ensinar ou ser responsáveis.

Em contraste às instituições de Ensino Superior, o escopo geral e


Há muita
preocupação sobre a forma do que é mandatório é uma questão-chave para as escolas. Há
como responder aos muita preocupação sobre como responder aos desenvolvimentos rápidos
desenvolvimentos em conhecimento e tecnologias, à explosão do conhecimento e às novas
rápidos em maneiras pelas quais as pessoas no século XXI podem trabalhar, viajar e se
conhecimento e envolver com outras pessoas. Argumentos sobre o currículo superlotado,
tecnologias.
as possibilidades e o significado dos computadores, que conhecimento
ou habilidades devem ser considerados fundamentais, sustentam uma
miríade de revisões e reformas do currículo em todo o mundo.

Uma abordagem para transpor essas grandes mudanças no mundo e o


problema do “currículo superlotado” é encontrar um tipo diferente de concepção
básica para o currículo e sua estrutura, em vez de tentar alterar ou elaborar o
currículo passado e os assuntos que ele continha. Várias versões diferentes
foram oferecidas – chamadas de “capacidades”, “competências”, “aprendizagens
essenciais”, “habilidades do século XXI”, “novos fundamentos” e muito mais
(LOPES; MACEDO, 2013; CARBONELL, 2016).

Existem diferenças significativas entre essas abordagens – por exemplo,


podemos ter a abordagem focada em capacidades que estão relacionadas ao

112
Capítulo 4 Contextos Atuais e Desafios Sobre
o Conhecimento na Escola

amplo corpo de trabalho de Amartya Sen sobre direitos humanos (SEN,


Várias linhas
2000, 2001; NUSSBAUM; SEN, 2010), enquanto parte da literatura de pensamento
de competências é derivada de relatórios setoriais encomendados começam
sobre o que os empregadores esperaram dos trabalhadores, mas, em tentando identificar
linhas gerais, essas várias linhas de pensamento começam tentando qualidades do
identificar qualidades do cidadão/trabalhador que serão eficazes no cidadão/trabalhador
que serão eficazes
século XXI e construirão o currículo sobre elas, ou tentando buscar
no século XXI
semelhanças ou maior integração de habilidades e capacidades que e construirão o
estão dentro do currículo baseado em disciplinas, e focar diretamente currículo sobre elas.
nessas capacidades ou habilidades como uma maneira de dar
coerência e mais unidade ao que as escolas devem fazer.

Assista ao vídeo O currículo precisa preparar os alunos


para a vida, que apresenta uma entrevista, durante o Seminário
Internacional sobre a Base Nacional Comum, com o CEO da
Curriculum Foundation. Disponível em: <https://www.youtube.com/
watch?v=NW9itH3AgC0&t=22s>.

De passagem, devemos observar aqui que a ideia de um currículo “tradicional”


(baseado em disciplinas/conteúdos) pode ser enganoso. Existem variações
nacionais e locais de quais foram as normas em termos da variedade de assuntos
comumente incluídos (LOPES; MACEDO, 2013; TRÖHLER, 2016). Algumas
disciplinas escolares estão intimamente ligadas a disciplinas universitárias ou de
pesquisa com o mesmo nome, outras têm uma filiação mais frouxa com diferentes
propósitos. Em muitos países, por exemplo, o conteúdo disciplinar nominado pela
língua nacional (por exemplo, língua portuguesa, língua inglesa, língua espanhola)
tem um propósito mais amplo e diferente daquele da disciplina de graduação do
mesmo nome – incluindo elementos de educação cívica, além de alfabetização
básica e introdução a estudos de literatura. A disciplina escolar de mesmo nome
pode não incluir ou pode resistir a mudanças agora consideradas convencionais
na disciplina cognata do ensino superior.

Em alguns lugares, por exemplo, a filosofia, a psicologia ou os estudos


de tecnologia podem ser um conteúdo duradouro para os alunos no ensino
básico, e em outros lugares são somente encontrados no Ensino Superior.
Neste capítulo, somente poderemos apontar que questões de escopo geral do
currículo (abrangência) e sua estrutura influenciam diretamente no conhecimento

113
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NO AMBIENTE ESCOLAR

que é produzido em todos os níveis de ensino. Por exemplo, se pensarmos nas


disciplinas de história e de física, como esses dois conteúdos são inclusões
duradouras no currículo do ensino básico, como também do Ensino Superior e na
pesquisa universitária, a questão de como professores e acadêmicos entendem
os propósitos e formas dos conteúdos que ensinam – e o tipo de desenvolvimento
necessário em diferentes níveis da educação – é algo que deve ser investigado.

Comumente, as reformas curriculares escolares não são simplesmente


elaboradas por especialistas em disciplinas ou conteúdos, mas têm uma
participação profissional, comunitária ou política mais ampla. Tais reformas
geralmente tentam acomodar uma avaliação voltada para fora, para o que é
importante para os alunos além da escola, bem como alguma representação do
que é importante dentro dos conteúdos (BELTRÁN LLAVADOR, 1991; LOPES;
MACEDO, 2013).

As propostas em mudanças e reformas dos currículos nos sistemas


As propostas
em mudanças de ensino podem desenvolver-se a partir de abordagens bem diferentes,
e reformas dos mesmo tendo uma mesma finalidade, como a de fundamentar um
currículos nos currículo em “aprendizagens essenciais”. Por exemplo, já houve
sistemas de ensino tentativas de construir propostas curriculares de baixo para cima, a partir
podem desenvolver- de consultas comunitárias sobre quais conhecimentos ou habilidades
se a partir de
são importantes hoje em dia. Por outro lado, a busca pelos padrões
abordagens bem
diferentes. essenciais de aprendizagem pode representar uma tentativa profissional
de mapear habilidades e processos subjacentes como uma matriz
entre as diferentes disciplinas e campos de estudo (BELTRÁN LLAVADOR, 1991;
LOPES; MACEDO, 2013). Portanto, nomes de propostas semelhantes podem ter
subjacente tipos muito diferentes de abordagens à questão do currículo escolar.

A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE)


também patrocinou uma série de relatórios relacionados com as “habilidades do
século XXI” (OCDE, 2005). Em outro lugar, um consórcio internacional de acadêmicos
e grandes empresas de tecnologia (CISCO, Intel e Microsoft), liderado por Patrick
Griffin (GRIFFIN et al., 2012), vem desenvolvendo protocolos e materiais relacionados
a como avaliar e medir habilidades do século XXI como equipes, resolução de
problemas e afins. Comumente, o trabalho nesse modo faz referência aos tipos
de contexto em mudança que foram descritos no início deste capítulo e pressupõe
um mundo onde haverá considerável mobilidade global e onde o futuro trabalhador
precisará ser flexível e aprendente vitalício (COLOMBO, 2011).
Houve revisões
e reformas
Em uma perspectiva histórica sobre as abordagens adotadas
curriculares muito
frequentes no final pelos diferentes países no globo (BELTRÁN LLAVADOR, 1991; LOPES;
do século XX e MACEDO, 2013), podemos identificar que houve revisões e reformas
início do século XXI. curriculares muito frequentes no final do século XX e início do século XXI.

114
Capítulo 4 Contextos Atuais e Desafios Sobre
o Conhecimento na Escola

Alguns países mantiveram uma estrutura bastante tradicional do currículo escolar


baseada em disciplinas, alguns tentaram formas importantes de alternativas não
baseadas no conteúdo e muitos incluíram alguns elementos de ambos. Na prática,
muitos planos curriculares formais hoje tentam incluir tanto algumas especificações
baseadas em disciplinas quanto em domínios, e algumas habilidades ou
rastreamento de capacidades, muitas vezes expressas como uma matriz.

Em resumo, uma das grandes questões para o currículo escolar nos


Uma das grandes
últimos tempos tem sido “qual conhecimento é importante atualmente?”. questões para o
Isto tomou a forma de tentar adicionar disciplinas (por exemplo, estudos currículo escolar
de computação, ou disciplinas de linguagem diferentes) ou disciplinas nos últimos tempos
transversais, para mudar o conteúdo de disciplinas tradicionais (por tem sido “qual
exemplo, em relação ao ambiente, ou para um foco mais internacional) ou conhecimento
é importante
para focalizar uma série de competências ou habilidades ou capacidades
atualmente?”.
como questões centrais, mas qualquer que tenha sido a direção tomada,
dois temas foram frequentemente observados. Um é o problema de um “currículo
superlotado” – em que a expansão do que se pretende cobrir é minada pela
impossibilidade de se fazer isso de maneiras não superficiais; o segundo é a questão
dos professores e da prática curricular. Propostas para grandes mudanças no currículo
(por exemplo, afastar-se de uma estrutura disciplinar no Ensino Médio) muitas vezes
ignoram as identidades e experiências profissionais existentes dos professores quando
introduzem grandes mudanças com pouco tempo e apoio aos professores.

9 Trazendo de Volta o Conhecimento


Do ponto de vista sistêmico, o currículo escolar, em todos os
O currículo escolar,
níveis de ensino, é construído para servir a uma função social em em todos os
relação à população, preparando as pessoas para sua vida futura e níveis de ensino,
coletivamente para o que é visto como necessidades da nação. Nos é construído para
países democráticos, a questão das desigualdades e oportunidades servir a uma função
promovidas pelo currículo tem sido uma das principais preocupações social em relação à
população.
e tornou-se tema central da sociologia da educação. Entretanto, nos
últimos tempos, uma linha de estudos denominada de Realismo Social emergiu
na sociologia da educação e argumenta que o papel do conhecimento das escolas
e das instituições de Ensino Superior tem sido inadequadamente priorizado, tanto
na ampla literatura de pesquisa da sociologia da educação quanto na reforma
curricular, mediado por agendas políticas e vários grupos de interesse:

Qual é o conhecimento importante que os alunos devem poder


adquirir na escola? Se, como teóricos do currículo, não podemos
responder a essa pergunta, não está claro quem pode, e é mais
provável que ela seja deixada para as decisões pragmáticas e
ideológicas de administradores e políticos (YOUNG, 2013, p. 103).

115
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NO AMBIENTE ESCOLAR

Em um corpo de trabalho que começou amplamente no final da década


de 1990, um número de sociólogos argumentou que a corrente dominante da
sociologia da educação que se preocupa com desigualdades e reprodução na
educação tem se enganado, tanto em sua descrição inadequada do conhecimento
em si quanto na sua incapacidade de impactar a desigualdade via educação. A
abordagem do realismo social parece ter iniciado com um artigo de Moore e Muller
(MOORE; MULLER 1999), e uma subsequente elaboração em artigos e livros deles
e de outros autores (MOORE, 2007; MORGAN, 2014; MULLER, 2000; YOUNG;
MULLER, 2013), mas também adquiriu especial destaque com a publicação de um
livro de Michael Young (2008), Bringing knowledge back in (Trazendo de volta o
conhecimento). Este livro foi particularmente proeminente porque Michael Young era
bem conhecido como o editor de uma publicação anterior de 1971, Conhecimento
e Controle, um dos textos marcantes sobre o foco na política do conhecimento no
currículo e que se tornou agora o assunto de sua crítica e retratação.

Assista ao vídeo Construindo uma Base Curricular Comum,


com o pensador Michael Young, em sua participação no seminário
Construindo uma Base Nacional Comum. Disponível em: <https://
www.youtube.com/watch?v=Q9ZH4AcW0y0>.

Em certo sentido, a alegação de que o conhecimento está sendo


negligenciado pode parecer estranha. Do que se tratam todas essas avaliações
e reformas curriculares se não sobre o conhecimento? E pode parecer bastante
exagerada, dado que apesar de todo repensar evidente nos debates discutidos
anteriormente, muitos comentaristas afirmam que a educação foi mais distinguida
por sua continuidade reconhecível do que por sua diferença dramática, e que os
professores, pelo menos no ensino básico, e os acadêmicos são ainda
Os argumentos
amplamente ensinados e comprometidos com assuntos e disciplinas
feitos no corpo
desta abordagem particulares e com o conhecimento associado a eles, mas os
do "realismo social" argumentos feitos no corpo desta abordagem do “realismo social” estão
estão relacionados relacionados à perda da “voz do conhecimento” e não são simplesmente
à perda da "voz do superficiais. Eles desafiam algumas outras linhas de pensamento sobre
conhecimento". o papel da educação hoje.

Para começar, eles desafiam os sociólogos que veem o currículo escolar


apenas como um sistema de mensagens (transmitindo mensagens sobre quem
é importante ou sobre sexismo ou racismo, por exemplo). Os sociólogos realistas

116
Capítulo 4 Contextos Atuais e Desafios Sobre
o Conhecimento na Escola

sociais argumentam que as consequências dessa perspectiva são que ela pode
identificar o que a escola pode estar fazendo mal, mas poderia fazer mais do que
substituir por outras mensagens mais positivas. Todavia, eles argumentam que
o potencial do conhecimento, em relação às mensagens, não é reconhecido por
meio de tal abordagem. Isso levanta a preocupação de que a educação continue
a ser esperada por assumir a responsabilidade por uma gama ilimitada de coisas
e práticas sociais que são consideradas problemáticas.

Um pano de fundo para os debates aqui são os desafios para as políticas


de conhecimento associadas aos movimentos sociais da segunda metade
do século XX: feminismo da segunda onda, movimentos antirracistas e pós-
coloniais, movimentos pelos direitos das pessoas com deficiência e estudos do
gênero. Resumindo, esses movimentos não apenas fizeram afirmações sobre
sua opressão ou marginalização na sociedade, mas identificaram
A sociologia da
conhecimento, linguagem e currículo, como um elemento-chave educação tornou-
nessa opressão. A sociologia da educação tornou-se particularmente se particularmente
interessada no currículo como um “sistema de mensagem”, em que interessada no
tanto a seleção do conhecimento quanto a forma do que era considerado currículo como
conhecimento avançado em comparação com o conhecimento de baixo um "sistema de
mensagem".
status contribuíam para a perpetuação das elites.

A ação curricular associada a essas preocupações assumiu várias formas.


Incluiu o desenvolvimento de novos temas (Estudos de Gênero, Estudos
Indígenas) e diferentes seleções do que deveria ser ensinado dentro dos assuntos
(história social e movimentos populares, em vez de história política, por exemplo);
textos diferentes para as aulas de ciências, tornando a presença das mulheres
cientistas mais visível, mas incluiu argumentos muito mais abrangentes sobre as
formas de conhecimento que estavam sendo valorizadas na escola. Bourdieu e
Passeron (1982) argumentaram que o conceito de racionalidade valorizado na
escola era tendencioso, aumentando as chances de que os estudantes da classe
trabalhadora, mulheres e minorias pudessem ser reconhecidos como “sujeitos
racionais” adequados.

Assista à entrevista com Pierre Bourdieu, realizada em 2000,


pelo Canal Universitário com apresentação da antropóloga Maria
Andrea Loyola (UERJ). Disponível em: <https://www.youtube.com/
watch?v=F2WXVTdfAOk>.

117
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NO AMBIENTE ESCOLAR

Richard Teese (2000), seguindo Bourdieu, sugeriu que o tipo de disposição


necessária para comprometer-se com o conhecimento mais valorizado pelas
escolas (por exemplo, as formas mais abstratas de física e similares) era o que
tornava mais impossível o sucesso para os estudantes da classe trabalhadora.
Grande parte desse trabalho assumiu uma postura crítica, com o objetivo
de expor a injustiça e os efeitos negativos do que o currículo fez, em vez de
promover diretamente práticas diferentes. Onde as alternativas eram defendidas,
elas estavam preocupadas em mostrar maneiras para os estudantes em grupos
marginalizados "resistirem" às formas dominantes, ou com o objetivo de ensinar
"pedagogia crítica" de vários tipos, para que os estudantes pudessem identificar a
política naquilo que contava como conhecimento.

Muitas abordagens enfatizaram a necessidade de se concentrar nos


próprios entendimentos dos alunos sobre seu mundo e construir a partir disso. Ao
mesmo tempo, um movimento semelhante para concentrar mais as discussões
curriculares escolares nos alunos e sua aprendizagem e menos na seleção
e prescrição do currículo também foi construído a partir de outra fonte não
diretamente política: um interesse pelas teorias construtivistas da aprendizagem e
a ideia de um aprendente ativo em vez de corpos de conhecimento como centrais
para o processo da educação (HATTIE, 2008).

Em suma, o argumento associado ao “realismo social”, “trazer o conhecimento


de volta” e “conhecimento poderoso” (MULLER, 2000; MOORE, 2013; YOUNG,
2008, 2011, 2013, 2016) foi que os sociólogos da educação ficaram muito
preocupados em rastrear a quem representa o conhecimento no currículo, à custa
de que tipo de conhecimento/desenvolvimento intelectual os estudantes estavam
tendo acesso. Eles argumentam que o foco no construtivismo social, na diferença,
nos resultados, na relevância e competências sociais, ofereceu a todos os alunos
(mas especialmente àqueles de menor nível socioeconômico) acesso a uma
forma de educação empobrecida. Subjacente a isso, havia alegações de que a
ideia de que o conhecimento estava irremediavelmente ligado à política e aos
interesses de grupos estava errada.

Mas os argumentos realistas sociais também criticavam a visão


O tipo de
conhecimento que extremada positivista de que o conhecimento é algo fora da atividade
tem sido associado social humana e imutável. Em vez disso, o tipo de conhecimento que
às disciplinas é visto tem sido associado às disciplinas é visto como de origem social, mais
como de origem organizado, focado e refinado ao longo do tempo, de uma forma que
social. lhe confere uma força epistêmica e um poder particulares. Diferentes
grupos sociais podem ter mais capital de conhecimento desse tipo do
que outros, mas é uma associação contingente, não uma característica inerente
dessa forma de conhecimento poderoso ou mais confiável em si.

118
Capítulo 4 Contextos Atuais e Desafios Sobre
o Conhecimento na Escola

O argumento "realista social" aplicado às disciplinas é que estas são, na origem,


socialmente construídas (nesse sentido, não essencialistas ou realistas) e, portanto,
falíveis. Entretanto, foram desenvolvidas, desafiadas, estendidas de forma disciplinada,
por uma comunidade disciplinar e processos organizados ao longo do tempo, e ao
fazê-lo, construíram um poder epistemológico e autoridade diferente do
É necessário
conhecimento "voltado para o exterior", que é orientado para processos aprender o foco, as
genéricos e problemas concretos. Para obter acesso a essa maneira mais metodologias e o
poderosa e confiável de compreender o mundo, é necessário aprender o modo de proceder
foco, as metodologias e o modo de proceder dessas formas disciplinadas dessas formas
de conhecimento, em vez de apenas escolher partes e fragmentos que disciplinadas de
possam parecer relevantes para o que os alunos estão interessados​. conhecimento.

Em resumo, esta abordagem está formulando a seguinte alegação


O que se entende
sobre o conhecimento e o currículo escolar: (1) o desenvolvimento do
por conhecimento
conhecimento, em vez de uma ampla gama de propósitos sociais, deve é o tipo de formas
ser reconhecido como a tarefa central do que a educação faz; (2) o que se poderosamente
entende por conhecimento é o tipo de formas poderosamente refinadas de refinadas de
compreensão, contidas em disciplinas/conteúdos, como matemática, ciência, compreensão,
história, literatura, música (contrastando, por exemplo, com aprendizagem contidas em
de “habilidades de comunicação” ou “competências voltadas ao trabalho” disciplinas/
conteúdos.
e similares); (3) levar a sério o valor dessas formas de conhecimento tem
implicações para a estrutura e sequenciamento dos sujeitos que as representam; e (4)
as desigualdades e diferenças entre os alunos são desafios reais para as escolas, mas
essa é uma questão pedagógica para estas instituições, e não um motivo para evitar a
tarefa central de dar aos alunos acesso às formas de conhecimento que não obteriam
de outra forma (YOUNG et al., 2014; YOUNG, 2000, 2011, 2016).

Estes argumentos atraíram alguma atenção favorável no Brasil (MOREIRA,


1990), no Reino Unido e outros países da Europa (BECK, 2013; PRIESTLY;
SINNEMA, 2014), África do Sul (SHAY, 2012), Austrália (WHEELAHAN, 2010) e Nova
Zelândia (RATA, 2012). Os autores que responderam criticamente alegaram que
esses argumentos sobre o conhecimento são de fato conservadores, muito ligados a
tradições específicas do Ocidente e não abordam formas mutáveis ​​de conhecimento
dentro das disciplinas existentes ou através delas (BALARIN, 2008; YATES, 2009).

Os críticos continuaram a argumentar que a desigualdade e a diferença entre os


estudantes, na prática, serão reproduzidas se esses argumentos forem abordados
(WHITTY, 2010). E eles apontam também que os argumentos que estão sendo feitos
no trabalho de Moore, Muller e Young podem ter valor em alguma reformulação ampla
da discussão ("trazendo o conhecimento de volta"), mas deixam muitas questões
específicas não bem tratadas (por exemplo, a relação entre conteúdos escolares
e “disciplinas” e a questão sobre o que importa agora com mudanças significativas
no interior das disciplinas). Essas perguntas são centrais para compreendermos os
contextos atuais e os desafios sobre o conhecimento na escola.

119
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NO AMBIENTE ESCOLAR

Uma outra questão é a linha excessivamente aguda que essa abordagem


de raciocínio "realista social" parece estabelecer entre o papel do conhecimento
na educação e seu papel de formação social ou pessoal. Embora os argumentos
realistas sociais enfatizem a necessidade de aprender sobre disciplinas e modos
de investigação, não apenas tratam o currículo como um sistema de mensagens.
Isso não implica que as mensagens refletidas na seleção de tópicos e afins sejam
irrelevantes – por exemplo, se as mulheres são visíveis em materiais científicos;
que história da nação e do mundo é transmitida no currículo de história; e
similares. Estas questões são potencialmente relevantes para a forma como
diferentes grupos de alunos se envolvem na produção de conhecimento e para
quais tipos de entendimentos cívicos são formados.

Atividades de Estudos:

1) Um grupo de sociólogos publicou em 1994 um livro cuja


discussão envolvia a nova produção de conhecimento,
impactando na dinâmica da ciência e da pesquisa nas sociedades
contemporâneas. Nesse contexto, apresentaram dois tipos
de produção de conhecimento, a do “modo 1” e do “modo 2”.
Explique a diferença entre a produção de conhecimento entre
cada um dos modos:
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________

2) Considerando uma perspectiva histórica sobre as abordagens


adotadas pelos diferentes países na questão da produção do
conhecimento, podemos identificar que:

120
Capítulo 4 Contextos Atuais e Desafios Sobre
o Conhecimento na Escola

Agora assinale V para verdadeiro e F para falso:

( ) Houve revisões e reformas curriculares muito frequentes no


final do século XX e início do século XXI.
( ) Alguns países mantiveram uma estrutura bastante tradicional
do currículo escolar baseada em disciplinas.
( ) Alguns países tentaram formas importantes de alternativas não
baseadas no conteúdo, e muitos incluíram alguns elementos de
ambos.
( ) Muitos planos curriculares formais hoje tentam incluir tanto
algumas especificações baseadas em disciplinas quanto
em domínios, e algumas habilidades ou rastreamento de
capacidades, muitas vezes expressas como uma matriz.

Agora assinale a opção correta:

a) V, V, V, V.
b) F, F, V, V.
c) V, F, V, V.
d) F, V, F, F.

10 Algumas Considerações

Neste capítulo, apresentamos algumas das reflexões sobre o conhecimento,


as disciplinas, o papel e conteúdos escolares em todos os níveis de ensino que
estão formando um contexto para as práticas atuais.

Mas há sérias preocupações também sobre o valor de campos disciplinares


específicos na educação escolar, assim como preocupações sobre como as
mudanças que estão ocorrendo podem afetar o sucesso acadêmico e a produção
de conhecimento dos aprendentes.

Além disso, neste capítulo vimos que os pesquisadores que estudaram


disciplinas (e a interdisciplinaridade) reconhecem algumas características
distintamente diferentes de como diferentes campos são constituídos, e que
esta é uma questão potencial para um período que visa direcionar a produção
de conhecimento educativo de forma mais deliberada. Nas escolas, a questão

121
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NO AMBIENTE ESCOLAR

da diferença entre estudantes, a desigualdade e o que o currículo deve fazer em


relação a tudo isso são questões-chave, repetidamente revividas.

Contudo, percebemos fortes impulsos em direção a um sentido de novos


tempos que exigem novas abordagens organizacionais se as escolas e as
instituições de Ensino Superior quiserem aproveitar as possibilidades das novas
tecnologias, novos conhecimentos e novos desafios das sociedades humanas.

Referências
ABBOTT, A. The disciplines and the future. In: BRINT, S. (Ed.). The future of the
city of intellect: the changing american university. Stanford: Stanford University
Press, 2002, p. 205-230.

______. Chaos of disciplines. Chicago: The University of Chicago Press, 2001.

APPADURAI, Arjun. Dimensões culturais da globalização: a modernidade sem


peias. Trad. Telma Costa. Lisboa: Teorema, 2004.

BALARIN, M. Post-structuralism, realism and the question of knowledge in


educational sociology: a Derridian critique of social realism in education. Policy
Futures in Education, v. 6, n. 4, p. 507-527, 2008.

BECHER, T. Academic tribes and territories: intellectual enquiry and the


cultures of disciplines. Bristol: Open University Press, 1989.

BECK, J. Powerful knowledge, esoteric knowledge, curriculum knowledge.


Cambridge Journal of Education, v. 43, n. 2, p. 177-193, 2013.

BELTRÁN LLAVADOR, Francisco. Política y reformas curriculares. Valencia:


Universidad de Valencia, 1991.

BLACKMORE, J. et al. Repositioning university governance and academic


work. Rotterdam: Sense Publishers, 2010.

BOURDIEU, P.; PASSERON, J.-C. A reprodução: elementos para uma teoria do


sistema de ensino. 2. ed. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1982.

BRINT, S. (Ed.). The future of the city of intellect: the changing american
university. Stanford: Stanford University Press, 2002.

CARBONELL, Jaume. Pedagogias do século XXI: bases para a inovação

122
Capítulo 4 Contextos Atuais e Desafios Sobre
o Conhecimento na Escola

educativa. Trad. de Juliana dos Santos Padilha. 3. ed. Porto Alegre: Penso, 2016.

CENTRE FOR CONTEMPORARY CULTURAL STUDIES. The empire strikes


back: race and racism in 70´s Britain. London: Hutchinson, 1982.

COLOMBO, S. S. et al. Desafios da gestão universitária contemporânea.


Porto Alegre: Artmed, 2011.

CONNELL, R. Southern theory: the global dynamics of knowledge in social


science. Cambridge: Polity Press, 2007.

COPE, B.; KALANTZIS, M. Ubiquitous learning: an agenda for educational


transformation
Urbana: University of Illinois Press, 2009.

COSTA, O. T. A educação no mundo globalizado. Rio de Janeiro: Universidade


Cândido Mendes, 2004.

FAZENDA, I. C. A.; GODOY, H. P. (Orgs). Interdisciplinaridade: pensar,


pesquisar, intervir. São Paulo: Cortez, 2014.

FRANCA, A. G. Educação e mercantilização: um estudo sobre a expansão do


setor de Ensino Superior privado no Brasil a partir da década de 1990. Revista
Brasileira de Ensino Superior, Passo Fundo, v. 3, n. 1, p. 98-111, ago. 2017.

GADOTTI, M. O Mercosul educacional e os desafios do século 21. Brasília:


Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, 2007.

GIBBONS, M. et al. The new production of knowledge: the dynamics of


science and research in contemporary societies. London: Sage, 1994.

GÓMEZ, A. I. P. Educação na era digital: a escola educativa. Trad. de Marisa


Guedes. Porto Alegre: Penso, 2015.

GRAUF, E. New basics: Queensland trails a curriculum for tomorrow. Paper


presented at the ACSA 2001 Curriculum Conference: Education Futures and New
Citizenships, Canberra, Australian Capital Territory, 2001. Disponível em: <http://
www.acsa.edu.au/pages/images/2001_new_basics_qld_ trials_a_curriculum.rtf.
doc>. Acesso em: 21 jul. 2018.

GRIFFIN, P. et al. (Eds.). Assessment and teaching of 21st century skills.


Dordrecht: Springer, 2012.

123
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NO AMBIENTE ESCOLAR

HATTIE, J. Visible learning: a synthesis of over 800 meta-analyses relating to


student achievement. Hoboken: Taylor and Francis, 2008.

HESSELS, L. K.; VAN LENTE, H. Re-thinking new knowledge production: a literature


review and a research agenda. Research Policy, v. 37, n. 4, p. 740-760, 2008.

HOPMANN, S. T. The end of schooling as we know it? Journal of Curriculum


Studies, v. 45, n. 1, p. 1-3, 2013.

KAGAN, J. The three cultures: natural sciences, social sciences and the
humanities in the 21st century. Cambridge: Cambridge University Press, 2009.

KING, R. et al. The globalization of higher education. Cheltenham, UK: Edward


Elgar, 2013.

KLEIN, J. T. Crossing boundaries, knowledge, disciplinarities,


interdisciplinarities. Charlottesville: University of Virginia Press, 1996.

KNORR-CETINA, K. Epistemic cultures: how the sciences make knowledge.


Cambridge, MA: Harvard University Press, 1999.

LINGARD, R. et al. Queensland school reform longitudinal study: final report.


Brisbane: Education Queensland, 2001.

LOPES, A. C.; MACEDO, E. Teorias de currículo. São Paulo: Cortez, 2013.

LUKE, A. et al. New basics project technical paper. Brisbane: Education


Queensland, 2000.

MATTERS, G. Good data, bad news, good policy making. QTU Professional
Magazine, v. 21, p. 18-24, 2006.

MOORE, R. Social realism and the problem of the problem of knowledge in the
sociology of education. British Journal of Sociology of Education, v. 34, n. 3,
p. 333-353, 2013.

______. Sociology of knowledge and education. London: Continuum


International Publishing Group, 2007.

MOORE, R.; MULLER, J. The discourse of voice and the problem of knowledge
and identity in the sociology of education. British Journal of Sociology of
Education, v. 20, n. 2, p. 189-206, 1999.

124
Capítulo 4 Contextos Atuais e Desafios Sobre
o Conhecimento na Escola

MOREIRA, A. F. B. Sociologia do currículo: origens, desenvolvimento e


contribuições. Em Aberto, Brasília, ano 9, n. 46. abr./jun. 1990.

MOURA, B. A. Interfaces entre modos 1 e 2 de produção de conhecimento e o


modelo da tripla hélice: considerações sobre a reconfiguração da pesquisa na
universidade americana no século XX. Revista Tecnologia e Sociedade, v. 7, n.
13, jul./dez., 2011.

MULLER, J. Reclaiming knowledge: social theory, curriculum and education


policy.
London: Routledge, 2000.

NOWOTNY, H.; SCOTT, P.; GIBBONS, M. Re-thinking science: knowledge and


the public in an age of uncertainty. Cambridge: Polity Press, 2001.

NUSSBAUM, M.; SEN, A. The quality of life. New York: Routledge, 2010.

OCDE. Definition and selection of key competencies – executive summary.


Paris: Organisation for Economic Cooperation and Development (OECD), 2005.
Disponível em: <https://www.oecd.org/pisa/35070367.pdf>. Acesso em: 22 jul. 2018.

PASCHOETO, Luiza Angélica; LEITE, Vitória Pereira da Silva. Reforma do


Ensino Médio. Simpósio, [s. l.], n. 6, fev. 2018. ISSN 2317-5974. Disponível em:
<http://revista.ugb.edu.br/index.php/simposio/article/view/735>. Acesso em: 25
jul. 2018.

PEREIRA, D. C. Nova educação na nova ciência para a nova sociedade.


Porto: Universidade do Porto, 2007.

PETERS, M. A. Cultural exchange, study abroad and discourse of the other. In:
MARGINSON, S.; MURPHY, P.; PETERS, M. A. (Eds.). Global creation: space,
mobility and synchrony in the age of the knowledge economy. New York: Peter
Lang, 2010.

______. Knowledge economy, development and the future of higher


education. Rotterdam: Sense Publishers, 2007.

PRIESTLEY, M.; SINNEMA, C. Downgraded curriculum? an analysis of


knowledge in new curricula in Scotland and New Zealand. Curriculum Journal,
v. 25, n. 1, p. 50-75, 2014.

RATA, E. The politics of knowledge in education. British Educational Research


Journal, v. 38, n. 1, p. 103-124, 2012.

125
A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO NO AMBIENTE ESCOLAR

RIZVI, F. Theorizing student mobility in an era of globalization. Teachers and


Teaching, v. 17, n. 6, p. 693-701, 2011.

ROSA, C. de M.; LOPES, N. F. M.; CARBELLO, S. R. C. Expansão,


democratização e a qualidade da educação básica no Brasil. Poiesis
Pedagógica, Catalão-GO, v. 13, n. 1, p. 162-179, jan/jun. 2015.

SAID, E. W. Orientalism. New York: Vintage, 1979.

SEN, A. K. Desigualdade reexaminada. Rio de Janeiro: Record, 2001.

______. Desenvolvimento como liberdade. São Paulo: Companhia das


Letras, 2000.

SHARMA, B. R. Strategies of non-formal education. New Delhi: Sarup &


Sons, 2004.

SHAY, S. Conceptualizing curriculum differentiation in higher education:


a sociology of knowledge point of view. British Journal of Sociology of
Education, v. 34, n. 4, p. 563-582, 2012.

SOBRAL, F. A. da F. A Universidade e o novo modo de produção do


conhecimento. Caderno CRH, Salvador, n. 34, p. 265-275, jan./jun. 2001.

STICHWEH, R. The sociology of scientific disciplines: on the genesis and stability


of the disciplinary structure of modern science. Science in Context, v. 5, n. 1, p.
3-15, 1992.

SUGRUE, C. (Ed.). The future of educational change: international


perspectives. London; New York: Routledge, 2008.

TEESE, R. Academic success and social power: examinations and inequality.


Carlton, VIC: Melbourne University Press, 2000.

TRÖHLER, D. Curriculum history or the educational construction of Europe in the long


nineteenth century. European Educational Research Journal, v. 15, n. 3, p.
279-297, 2016.

TROWLER, P. et al. (Eds.). Reconceptualising tribes and territories in higher


education: practices in the 21st century. London: Routledge, 2012.

WEINGART, P.; PADBERG, B. University experiments in interdisciplinarity:


obstacles and opportunities. Bielefeld: Transcript, 2014.

126
Capítulo 4 Contextos Atuais e Desafios Sobre
o Conhecimento na Escola

WHEELAHAN, L. Why knowledge matters in curriculum: a social realist


argument. Abingdon, Oxon; New York: Routledge, 2010.

WHITTY, G. Revisiting school knowledge: some sociological perspectives


on new school curricula. European Journal of Education, v. 45, n. 1, p.
28-45, 2010.

YATES, L. From curriculum to pedagogy and back again: knowledge, the


person and the changing world. Pedagogy, Culture & Society, v. 17, n. 1,
p. 17-28, 2009.

YATES, L.; COLLINS, C.; O’CONNOR, K. (Eds.). Australia’s curriculum


dilemmas: state cultures and the big issues. Carlton, VIC: Melbourne
University Press, 2011.

YATES, L.; GRUMET, M. (Eds.). Curriculum in today’s world: configuring


knowledge, identities, work and politics. New York: Routledge, 2011.

YOUNG, M. Por que o conhecimento é importante para as escolas do


século XXI? Cadernos de Pesquisa, v. 46, n.159, p. 18-37 jan/mar. 2016.

______. Overcoming the crisis in curriculum theory: a knowledge-based


approach. Journal of Curriculum Studies, v. 45, n. 2, p. 101-118, 2013.

______. O futuro da educação em uma sociedade do conhecimento: o


argumento radical em defesa de um currículo centrado em disciplinas.
Revista Brasileira de Educação, v. 16, n. 48, set./dez. 2011.

______. Bringing knowledge back in: from social constructivism to social


realism in the sociology of education. London: Collier MacMillan, 2008.

______. O currículo do futuro: da “nova sociologia da educação” a uma


teoria crítica do aprendizado. Campinas: Papirus, 2000.

______. (Ed.). Knowledge and control: new directions for the sociology
of education. London: MacMillan, 1971.

YOUNG, M.; MULLER, J. On the powers of powerful knowledge. Review


of Education, v. 1, n. 3, p. 229-250, 2013.

YOUNG, M. et al. Knowledge and the future school: curriculum and


social justice. London: Bloomsbury Publishing, 2014.

127

Você também pode gostar